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| i } LUMEN4JURIS: www lumenjuris.com,br Eprrones Joao de Almeida Joao Luiz da Silva Almeida Consetxo Eprrontat Alexandre Freitas Camara Amilton Bueno de Carvalho Antonio Becker Augusto Zimmermann Eugénio Roea Fauzi Hassan Choukr Firly Nascimento Filho Flavio Alves Martins Francisco de Assis M. Tavares Geraldo L. M, Prado Gustavo Sénéchal de Goffredo J. M, Leoni Lopes de Oliveira Letécio Jansen ‘Manoel Messias Peixinho Marcos Juruena Villela Souto Paulo de Bessa Antunes Salo de Carvalho Rio de Janeiro Rua da Assombiéia, 98 ‘alas 21 a 204 Rio de Janeiro, RI ~ CEP 2901-000 ‘elefone (23) 2232-1059 / 2222-1866 Sao Paulo Rua Camerio, 95, Conjunto 2 ‘Batra Funds - So Paula, SP ‘CEP 01169-020. ‘Tlefono (11) 9664-8578 ConseuHo Consuurrvo Alvaro Mayrink da Costa Aurélio Wander Bastos Cinthia Robert Elida Séguin Gisele Cittadino Humberto Dalla Bernardina de Pinho José dos Santos Carvalho Filho José Pamando C. Farias José Ribas Vieira Marcello Ciotola Marcellus Polastri Lima Omar Gama Ben Kauss Sergio Demoro Hamilton Rio Grande do Sul Rus Cap. Jose de Olivera Lima, 160 Sento Antonio da Parulhe ~Fitersciros ‘CEP 95600.000 ‘Teetone (51) 662.7247 Subsolo 408 ~ Asa Norte CEP 7087-500 ‘Befones (61) 340-9550 / 240.0926 Fax (61) 380-2748 t ANDRE-JEAN ARNAUD Datnar Lopes JR, Organizndores Je wine cvo NixLas LUHMANN: . Do Sistema SOcIAL A SocIoLoaiA Juripica ‘Tradugées de Dalmir Lopes Jr., Daniele Andréa da Silva Mando e Flavio Elias Riche ev Eprora LUMEN Juris Rio de Janeiro 2004 I FILOSGFIAE Teowia } A Restituigao do Décimo Segundo Camelo’ Do Sentido de uma Analise Sociolégica do Direito” Niklas Luhmann i [No mundo prético e profissional dos juristas é uso comum discutir quostées dificeis a partir de casos concretos. Bu gostaria de utilizar a seguir essa prética, O caso que deve servir como modelo possivel- mente nao se encontra em nenhuma coleténes juridica, mas ele ¢ bem conhecido ¢ atenderd satisfatoriamente sua finalidade!. Um rico beduino estabeleceu a sucessdo por testamento a seus trés filhos. A ppartilha fol estabelecida em torno de seus camelos. O filho mais velho, ‘Achmed, deveria receber a metade, O segundo filho, Ali, ficaria com um quarto do previsto. O filho mais novo, Benjamin, teria apenas um sexto. Essa disposigdo [a principio] parece [resultar) numa diviséo desigual, arbitraria e injusta. [Porém,] ela corresponde mais exatamente ao valor proporcional dos filhos sob a perspectiva histérica de perpetuacao do cla, e esta coresponde precisamente & alegria do pai com o nascimen- tode cada um deles: o segundo filho seria privilegiado somente no caso de o primeiro morrer sem deixar descendente varao ete. Dai a propor- go de diminuigao das partes. Entretanto, e devido a imprevistos, 0 niimero [total] de camelos foi reduzido consideravelmente antes da morte do pai. (Assim|, crando ele morteu, restavam apenas onze camelos. Como deveriam dividir? Alt [sicl}"* reivindicou, sob protesta, seu privilégio de filho mais velho, ou soja, sous seis [camelos]. Porém, isto seria mais que a metade. Os ‘outros [por isso] protestaram. O conflto foi levado ao juiz, o qual fez @ + Gyadugte do alemao por Daimir Lopes Junior 1 Bedevo a reeordagio desse caso a una conferéncia de Jean Pierre Dupuy. Leutenamie ot la complenité sociale, Montpelier 1 de mato de 1964. {het} aga parece que Luhmasa fez uma poquona confosio, uma ves que o filo ait ‘lho 6 Achmed e no Al. Bote etre no entamte ndo ze repetira novemente no decoret fo taco. 2 Nikias Luhmann: Do Sisteme Social Sociologia Julien seguinte oferta: eu ponho um camelo meu A vossa disposigao, e vocés estituir-me-do, se Alé quiser, o mais répido possivel. Com doze ca- melos a divisdo ficou simples. Achmed recebeu a metade, quer dizer, seis, Ali ecebeu seu quarto, ou seja, trés. Benjamin néo fot prejudica: do, recebendo seu sexto, ou soja, dois. Assim os onze camelos foram divididos eo décimo segundo pade ser devolvido. A questo que eu gostaria de examinar 6 dupla, a saber, (1): 0 d6- cimo segundo camelo seria necessério? [Se a resposta for afirmatival, em que caso ele seria necessério? E esta questo esté rigorosamente vinculada a seguinte: ele seria restitu(do? Tal qual a vontade de Ala? Se © décimo segundo cameto nao fosse necessério para a pattilha, entéo tampouco seria necessério apés? Como serla se esta divisao ulterior fosse contestada? Dever-se-ia reclamar para este caso, como camelo processual (Prozefkamel), para qualquer que seja o fim, o servigo {desempennado} polo camelo? Foder-se-ia decidir sobre a restituigao, sem conhecer a razéo do camelo ser necessério? Os juizes t@m quo ter camelos para emprestar? Isto é algo préximo do que chamariamos, usando uma expresso da moda: legitimagéo? O camelo tem que fornecer 0 real acima de tudo, ou a ficgdo j4 seria suficiente? Nés nos isentamos, pelo menos provisoriamente, desse problema através da afirmagio de que 0 décimo segundo camelo seria endo serla necessdrio. Para comegar, contentamo-nos com tma caracteristica geral./O décimo segundo camelo executa uma fungég operativa da mais alta importancia, ole torna possiveis as decisdes/Além do mais, nfo se trata de ser um simbolo para qualquer coisa, nem de um pro- grama de deciséo © tampouco de uma modelizacéo do ambiente no interior do sistema, As normas do testamento néo so contirmadas nem modificadas. . Ademaic, o sistema havetia de ter uma complexidade adequeda: em sous conceitos e representagdes, em seus valores e em seus programas Gecisionais. Neste sentido, o camelo néo é simbolo algum, apenas executa por si mesmo uma operacéo simbélica E como o simbolo da eperacao de sua prépria possibilidade. Ele é, em outras palavras, a| auto-referéncia localizada dos sistemas, na qual néo se pode mais| distinguir entfe operagio e resultado. “Sem so admitir interpretacées arriscadas, pode-se caracterizar essa fungio do camelo simbélico, no minimo, num sentido mais pre- cisof/Cada operacéo de um sistema tem que se apoiar sobre pres- supostos, que nao poileréo ser colocados em questo com essa propria operacagf Isto ¢ simplesmente inevitavel. © que também é valido para* ‘A Tsttuigko da Décimo Segundo Cameo: Da Sentide de uma “Anilise SocoiSpica do Dito operagses que seguidamente obstinam-se em duvidar de tais pres- supostos, quer para considerar ou mesmo para [querer] impor sua modificagio. Essa proposigao geral de reflexividade do conhecimento nao nos conéuz muito longe. Nao obstante, ela ajuda a compreender Juma certa “mais-valia” especifica do camelo. Q tipo de pressuposto due tratamos aqui, ¢ sobre.o qual se deve admitir a divida sempre, ndo pode ser fixado logicamente no sistema. Ble varia com as.operagées. Caso 0 designemos como “esséncia”, como “norma suprema” ou como aridvel essencial” etc., sugere-se mais do que uma anélise apro- fundada pode oferecer, Contucio, uma tal fixagdo nko parece ser um e120 que temos que evitar, se acaso quisermos chegar a um conhecimento ‘mais correto. A exigéneia do décimo segundo camelo remete-nos a este pro- blema, em que se sugere uma certeza que ndo 6 propriamante ad- uirida. © sistema utiliza 0 camelo sem 0 possuir. As operagdos de empréstimo e restituigéo simbolizam esta ambivaléncia, Q_sistema Jamece-«-possibilidade de se orientar pelo camelo como critério fixo de socisic.{muito} embora se reserve igualmente a possibilidade. de ‘operar com premissas futuantes, Entdo a questao é: como podemos decidir em geral, € o que sig- nifiea quando se decide? Cada herdeiro tinha negécios para tgdos os ‘camelos, em parte para os obter, e, em parte para [o caso de] nao os obter. N&o se pode dividir sem perder. Seguindo uma escolha metodolégica de bifurcago, onde se exclui a igualdade e se toma a deciséo um ato de coagéo (Gewalt), em que ela deve recordar as possibilidades que exclui. A divisdo muda apenas a forma da unidade que esté sendo dividida. No meta-nivel (Metaebene) da unidade do Aireito, [esta] unidade permanece preservada ao mesmo tempo em que ela se legitima como divisao. A diviséo confirma, como operacéo do sistema, a indivisibilidade do mesmo, O décimo segundo camelo ercorre todos os caminhos que, ao mesmo tempo, se bifurcam. Assim |como se pode ler em “Ei jardin de senderos que se bifurcan" 2 ha, por isso, essa simultaneidade de sentidos (porque significaria a opcéo de juma bifurcagao a ser percorrida em detrimento das outras) que ndo ficam mencionados, e o sentido dos textos que menciona o que nao é Imencionado, tem quo se tornar indexado (verschiiisselt) Toige Luis Borges. Reciones, Madsid, 1972, p. 101-136, | | | Niklas Lunmann: De Sistema Social Sociologia Juridica Nesta perspestva de um observador que andlsa togicamente estas aelegoes) 9 carole binbolco sparecp como paradoxe. Dessa Shndize do dette se dove partir © abstair/O paradoxo contém ama indecsdo consututva ~e neste sentido que nio € postivel deci, aso tenhamnes que eecoler polo patedexo om si ou pola des-parado: Stongdo do divi Poder seia pensar em tm creo mais elevado para Gr cameloe ~tal/como o dizeito consitcional mas Isto nos leva stovamente ao paradexo do ditelto que te establece om rezio do prone dete, © [por aso] néo se pode decir Se osse dret-que-dé- Retoastmesmo (Sich-selbet Recht geben) § ou néo 6 lito (rechumatig) Decero qu vemos ax elagies n centro do seta do forma diferente de um observador externo, e [é] desta forma que se) Satateloce aifrenga onto 9 Todo pelo ual furstas © soiclogos Shservain o area. u [ozo 6 peadonalmoneconstofpor sao camel 60 280 6 Lo ieee Getto snaitase part cnanreogto dos arenios « retietonciusoo inter do sistone, Nés pderames, num pret seat Garage pela elog ent novmn dose A total: ‘gao" (Vertextung) dafs normas sugere sua dissociabilidade do proceso de decisio. As normas tomam-se.o objeto de decisées préprias, as cf™iais seguem a6 normas que, umna-vez-textualizedas,-se-podem tomar ‘o objeto de decisbes proprias. Assim, tem-se caminhado praticamente para uma discussie inocente e [que conduz] a uma regressio infinita. Pode-se simplesmente parar de seguir essa regtessdo, © o pragma- ‘ismo filos6fice forneceu, de certo modo, uma respesta eventual a esse problema: o que resulta disso? What makes a difference? Mas com isso nao se disse tudo. Reconsiderando a simples relagéo entre norma e decisdo, nés nos encontramos em presenga de um circulo auto-referencial, Nao se trata apenas de uma simples interagao. [A decisao nao seria decisao, caso ela nao reagisse a expectativa da norma, O cumprimento da norma é uma decisao, porque [este compor- tamento (de observar a norma)] é escolhide contra [a possibilidade de) TPITA patavra ndo ensostra um correlative satisfatrio, © sentido de Vertextung é de igo que soi um procerso do concrcizagso, Como wm melodia em que so pede par eracor uma letra Neste cavo, «melodia oy "eatualisada". Passou de um plano abstrato {Ge sous) para tomar a forme de um toto. ‘A Restitazo do Décime Segundo Camel Do Sento de uma “Analisa Socvoogica do Din um deseo om relaséo 8 prépria norma, eisto sé pode ser assim, pelo fato de existir uma norma geral (Uberhaupt}?. Inversamente, a norma nao seria norma, caso a decisdo nao fosse produzida, A textualizagao gera a ilusdo da norma ser-em- (An-und-far-sich-Seins), mas formas tornam as decisoes possiveis porque as decisées tomar as hormas possiveis//Ao mesmo tempo podeaos afimar quo a perfeigao pao € possivel, sendo apenas a ovolugdo. Uma norma/decisio do sistema é capaz de evoluir gragas a este circulo quando, ¢ na medida fem que, é capaz de se manter aberta em ambos os sentidos. Pade pierarquizar-se essa relaga do.de niveis logicos. As normas so decididas, desta forma, num plano superior. Seu sentido é mais geral e por issot!) Jeulto individual Desde Glde, sabe-se que isto ndo 6 a solugdo para Wigs os problemas, mas [ao

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