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INSTITUTO SUPERIOR DE GESTÃO, COMÉRCIO E FINANÇAS

CURSO DE LICENCIATURA EM DIREITO


ÉTICA E DEONTOLOGIA PROFISSIONAL (EDP)
ÉTICA E DEONTOLOGIA FORENSE
II Semestre 2019

AAA (3A)
- Apresentação Geral: Docente e Discentes;
- Apresentação do Plano Analítico;
- Apresentação das regras na sala de aulas (regras do jogo) – Introdução Geral

INTRODUÇÃO: A disciplina de Ética e Deontologia Profissional (EDP) existe para nos


fazer reflectir sobre a necessidade do dever de nos comportarmos e agirmos com princípios
éticos enquanto profissionais do Direito (forenses), enquanto gestores públicos e privados e
membros das mais variadas Instituições moçambicanas. Esta disciplina nos proporciona
formas de ser e de estar no meio da sociedade, isto é, no nosso relacionamento com os outros,
sobretudo no nosso ambiente profissional.
Como profissionais empresariais se nos é exigido uma forma adequada/um perfil que nos
deve caracterizar e que, por assim dizer, os outros irão exigir de nós.
Esta disciplina nos vai ajudar a resgatar aquilo que são os valores morais/éticos, as virtudes (e
combater os vícios), os bons hábitos e costumes, que hoje em dia se vão diluindo com o tão
propalado relativismo dos actos (cada um faz aquilo que sabe, que pode, como pode e com
quem pode) um autêntico maquiavelismo, deixando de lado os outros, os seus interesses em
detrimento dos nossos próprios. A ética nos vem despertar para uma nova forma de encarar o
mundo: no sentir, no pensar, no falar, no ser, no agir. O profissional do Direito deverá ser um
ícon, um ponto de referência e de inspiração; um exemplo de boa postura, de integridade e de
probidade.
Segundo alguns autores, como Heinemann, a ética procura dar resposta às seguintes

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perguntas: o que devo fazer? O que devo querer? O que devo escolher? Há hierarquia de
valores? Que tipo de homem/ mulher devo ser?

Assim, quando falamos da Ética e Deontologia Profissional se nos ressalta o conceito de


Sujeito Ético, isto é, aquele que sabe o que faz; aquele que conhece as causas e os fins de sua
acção (responsabilidade ética), o significado de suas intenções e de suas atitudes e a essência
dos valores morais. Sócrates afirma que apenas o ignorante é vicioso e incapaz de virtude,
pois quem sabe o que é o bem não poderá deixar de agir virtuosamente.

Ainda, a título de introdução, podemos dizer que a ética é basicamente constituída pelos
valores e obrigações que formam o conteúdo das condutas morais, isto é, as virtudes. Estas
são realizadas pelo sujeito moral, ou seja, a pessoa, principal constituinte da existência ética.

Portanto, como repisaremos em várias aulas, o significado da ética está inteiramente ligado a
acções e relações entre o ser e a sociedade, porém são essas acções que manifestadas pelo
indivíduo terão uma repercussão para com a mesma. Por fim, podemos denominar essas
acções como conduta ética ou conduta humana. Para que haja conduta ética ou conduta
humana é necessário que cada sujeito membro de uma sociedade distinga entre o certo e o
errado, o bem e o mal, o permitido e o proibido, entre outros. Porém para que esse sujeito
possa existir é necessário que preencha alguns requisitos os quais são:

 Ser consciente de si e dos outros; Ser doptado de vontades;


 Ser responsável; Ser livre.

Por esses factos, podemos constatar que o homem desde o princípio de sua gestão social se vê
obrigado a seguir alguns deveres impostos pela sociedade a fim de trazer a virtude, a
excelência moral à vida de seus próprios membros. Chauí (2002, p.342) afirma que:

A ética, portanto, é concebida como educação do carácter do sujeito ético para dominar
racionalmente impulsos, apetites e desejos, para orientar a vontade rumo ao bem e a
felicidade, e para formá-lo como membro da colectividade sóciopolítica. Sua finalidade é a
harmonia entre o carácter do sujeito virtuoso e os valores colectivos que também deveriam
ser virtuosos.

TPC – O que é ética e o que é a moral? Defina e apresente os pontos de encontro e de


diferença. Ética e moral são a mesta coisa/têm o mesmo significado?

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1. CONCEITOS DE ÉTICA E DE MORAL
Em todos os instantes, os meios de comunicação social, anunciam que é preciso mais ética
nas relações humanas, na política, nas relações internacionais, na globalização, na ciência,
nas empresas, nos bairros, no meio ambiente, em suma, em todos os âmbitos da vida. Afinal
o que é ética?

Ė difícil responder com exactidão à pergunta, porém, para respondê-la, vamos recorrer a
etimologia da palavra e ressaltar que a ética só existe após o surgimento da filosofia, primeira
forma racional de explicar a realidade.
Mas, antes de dar resposta a esta questão é importante referir que há uma grande discussão no
seio do discurso sobre a ética: se a ética e a moral são tem o mesmo sentido e o mesmo
significado ou se são duas realidades diferentes.
Nisto, há quem diga que são a mesma coisa, tomando-os por sinónimos, e há também quem
diga que são duas realidades diferentes mas que se complementam.
Para nós, para não termos que ficar neste discurso milenar de similitude ou de diferença,
vamos afirmar em nossas aulas que entre estes dois termos há sim uma diferença justa e
consequentemente, uma diferente significação. Senão vejamos:

1.1. Moral
O termo Moral, deriva do latim, como tradução do ethos grego em sua dupla forma
linguística, ou seja, do êthos-carácter e do éthos-costume, pelo vocábulo mos, moris, que
significa “costume”.
“ Moral não é um mero desejo dos fracos de se protegerem dos fortes, nem um recurso dos
fortes para dominarem os fracos, mas sim um factor de extrema importância que beneficia o
público em geral e o bem-estar de todos. Se na história da humanidade não se houvesse
pecado tanto contra a moral, muitos sofrimentos lhe teriam sido poupados.” (KRAFT apud
LEISINGER et SCHMITT, 2002: 17-18).
Segundo (LEISINGER et SCHMITT, 2002), por Moral se pode entender:
- Determinadas normas que orientam o comportamento prático (sobretudo para com o
próximo, mas também para com a natureza e para consigo mesmo).
- Moral se manifesta pelo facto de determinada conduta humana ser considerada “boa” ou
“má”.
A moral, portanto, é constituída de valores e normas. “As normas já pressupõem os
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valores…, o que as normas exigem é que os valores sejam realizados” (KRAFT apud
LEISINGER et SCHMITT, 2002: 18).
A moral, como tal, não é ciência, mas suas origens, fundamentos, evolução, podem ser
investigados racional e objectivamente (cientificamente). A moral de uma sociedade
manifesta-se nos costumes. Portanto, é o conjunto de costumes morais aceites por um
grupo. Tais constituem a moral dessa mesma comunidade humana.
A moral se refere ao comportamento adquirido ou modo de ser conquistado pelo
homem.
- A MORAL, cinge-se apenas ao comportamento individual tendendo a privilegiar a
subjectividade do agir, dentro daquilo que são as normas estabelecidas pelo grupo no qual o
indivíduo se encontra inserido, de tal forma que podemos falar da moral burguesa, moral dos
macuas, dos rongas, changanas, etc.; mais ainda, pode-se dizer o mesmo dos hábitos e
costumes de um grupo profissional, no sentido de que, os hábitos e costumes dos contabilistas
serão diferentes dos hábitos e costumes dos enfermeiros bem como os dos técnicos ou
engenheiros da informática.

1.2. Ética
A palavra Ética vem do grego ethos e possui dois significados: éthos- que significa costumes,
maneira habitual de agir, índole e êthos que significa carácter. Sentido semelhante é atribuído
à expressão latina mos, moris, da qual deriva a palavra moral.
Sem entrar na discussão semântica que levaria a matizes diferenciais inexpressivos, em
ambos os casos a Ética pode ser entendida como a ciência voltada para o estudo filosófico da
acção e conduta humana, considerada em conformidade ou não com a recta razão (GER
apud ARRUDA et all 2009: 29).
Embora com certa frequência se atribua à palavra moral uma dimensão religiosa, quando se
fala, por exemplo, de filosofia moral, ciência moral, etc., se prefere tratar ética e moral com o
mesmo sentido, substancialmente idêntico, como ciência prática que tende a procurar pura e
simplesmente o bem do homem (ARRUDA, 2009: 29).
As ciências humanas estudam, sob diferentes ângulos, o homem e suas acções. A psicologia,
por exemplo, analisa a natureza do entendimento e do conhecimento e a da vontade ou
apetência humana; a natureza da alma, seu modo de ser e de agir. A sociologia ocupa-se do
colectivo, como um aspecto da vida individual; a acção humana inter-individual, realizada
por um eu em relação com os outros indivíduos, de acordo ou não com os padrões e normas
sociais. A lógica estuda os princípios da razão humana, ordenado a vontade e corrigindo a
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forma dos actos cognoscitivos.
Assim, segundo Arruda (2009: 30) a ética é a parte da filosofia que estuda a moralidade dos
actos humanos, enquanto livres e ordenados a seu fim último. De modo natural, a inteligência
adverte a bondade ou malícia dos actos livres, haja vista o remorso ou satisfação que se
experimenta por acções livremente realizadas. No entanto, cabe sempre a dúvida sobre o que
é o bem e o mal, ou por que tal acção é boa ou má. A resposta a tais questões conduz a um
estudo científico dos actos humanos enquanto bons ou maus. Por isso, “ética é a parte da
filosofia que estuda a moralidade do agir humano; quer dizer, considera os actos humanos
enquanto são bons ou maus” (LUNO apud ARRUDA, 2009: 30).

A ética é uma ciência prática, e como tal não se detém no conhecimento da verdade em si,
mas em sua aplicação na conduta livre do homem, fornecendo-lhe as normas necessárias para
o recto agir. É, por esse aspecto, uma ciência normativa. Aristóteles já dizia que não se
estuda a ética “para saber o que é a virtude, mas para aprender a tornar-se virtuoso e
bom; de outra maneira, seria um estudo completamente inútil” (ARISTÓTELES apud
ARRUDA, 2009: 31).

A ética estuda a moral. Ela se depara com uma experiência de índole histórico-social no
terreno da Moral, ou seja, com um conjunto de práticas morais já em vigor e é partindo delas
que procura determinar realidades como a essência da Moral, a origem da Moral, as
condições objectivas e subjectivas do acto moral, as fontes da avaliação moral, a natureza e a
função dos juízos morais, os critérios de justificação dos juízos morais, o princípio que rege a
mudança e a sucessão dos diferentes sistemas morais, entre outras.
A ética é a teoria do comportamento moral dos seres humanos em sociedade, é o porquê do
comportamento moral dos seres humano. Ela é, pois, o saber de uma forma específica do
comportamento humano. E a propósito, há quem pense, que a Ética é a reflexão sobre a
Moral. (DIAS, 2004: 23). Vasquez (1970) afirma que a Ética é uma ciência, é a ciência da
Moral.
Segundo (LEISINGER et SCHMITT, 2002), a Ética, como ciência, ocupa-se com o tema da
moral, mas de uma forma descritiva e comparativa, e apresenta-se como uma avaliação
crítica da Moral.
A Ética nos leva à busca, a manutenção, à preservação da vida. A Ética nos leva à vida. Ela
nos leva à busca do bem, da solidariedade, da verdade e da liberdade de acção; a Ética
humaniza. A Ética nos leva ao conceito de “Biofilia” apresentado e defendido pelo padre
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Rupert Lay, filósofo e assessor empresarial. Segundo este, “o êxito da vida de uma pessoa
pode ser medido pela contribuição biófila que esta pessoa consiga realizar em sua vida:
Eu ajo e decido biofilamente na medida em que, no meu agir e decidir, aumento mas não
diminuo em mim e nos outros a vida pessoal, em todas as suas dimensões (como a dimensão
emocional, a dimensão social, as dimensões do rendimento profissional, as dimensões
morais, religiosas, intelectuais, musicais…) - ou crio condições para que este aumento se
torne possível. (LAY apud LEISINGER et SCHMITT, 2002: 21-22).

Podemos também definir a ética, como ciência do comportamento humano baseada na luz da
razão e que parte de um tipo de factos, visando descobrir-lhes os princípios gerais duma
forma racional. Ou ainda, a ética é um conjunto sistemático de conhecimentos racionais e
objectivos relacionados com o comportamento moral do homem. A ética corresponde a
princípios gerais e universais que regem os povos, sendo assim, a parte crítica da moral ou
seja, a reflexão sobre a moral.
A ÉTICA preocupa-se com a realidade histórica e social dos costumes, ou seja, a ética
corresponde ao comportamento do homem que se justifica pela razão, corresponde a
princípios gerais, universais que regem os povos. Podemos ver isso nesse exemplo: ajoelhar
diante do marido para lhe dar água e lavar as mãos, é moralmente válido e eticamente
não válido.
A ética é, portanto, um ramo do saber que reflecte sobre a acção humana e que tenta
identificar os princípios práticos que regulam essa acção. Por outras palavras, a ética é a
ciência que estuda a moral. A Ética é uma reflexão crítica sobre a moral, ou, é a ciência que
investiga a moral. Ela Procura o fundamento do valor que norteia o comportamento. E torna-
se, assim, na filosofia da moral.

Segundo alguns autores, como Heinemann, a ética procura dar resposta às seguintes
perguntas: o que devo fazer? Que devo querer?
O que devo escolher? Há hierarquia de valores? Que tipo de homem/ mulher devo ser?

2. OBJECTO DE ESTUDO DA ÉTICA


A ética estuda a forma do comportamento humano que os homens julgam valioso, e além
disso, obrigatório e inescapável. Estuda a moral da humanidade, o comportamento do
homem. Com o objectivo de fornecer a compreensão racional de um aspecto real, efectivo do
comportamento dos homens.
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2.1. O que é ser “ético”/Sujeito ético?

Ser ético, nada mais é do que agir correctamente; agir direito; proceder bem, sem prejudicar
os outros. É ser altruísta; é estar tranquilo com a consciência pessoal, consciência bem
formada.

"É cumprir com os valores da sociedade em que se vive, ou seja, onde mora, trabalha, estuda
etc. "Ética é tudo que envolve integridade, É SER HONESTO EM QUALQUER SITIO,
SITUAÇÃO OU CIRCUNSTÂNCIA, é ter coragem para assumir seus erros e decisões, ser
tolerante e flexível, é ser humilde. Todo ser ético reflecte sobre suas acções, pensa se fez o
bem ou o mal para o seu próximo. Concluindo, ser ético é ter a consciência “limpa".

3. ACTO DE HOMEM E ACTO HUMANO

Qualquer discurso sobre Ética, por referir-se ao comportamento humano, deve ter no seu
centro os actos que os homens praticam, pois são estes que determinam o tal comportamento,
uma vez que este manifesta-se através daqueles.

Ora, para a Ética nem todos os actos praticados pelo homem concorrem para se determinar o
seu comportamento: existem

1. Actos que o homem pratica inadvertidamente, ou seja, sem querer (ou porque estava
distraído, ou porque foi obrigado/coagido, ou porque não era isso que queria fazer, etc.).
Estes actos, mesmo o próprio sujeito agente não os pode assumir, a menos que alguma força
externa o obrigue a assumi-los.

2. Actos praticados pelo ser humano é composta por aqueles actos que o sujeito assume-os
tanto antes como depois de praticá-los, sem que alguma força externa o obrigue a fazê-lo.
Estes actos são caracterizados por lucidez (o individuo está consciente do que faz), vontade
(o individuo quer o que está a fazer) e liberdade (no que está a fazer, o individuo não foi nem
é obrigado por ninguém).

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Esta classificação inspira-se na explicação dada por São Tomas de Aquino, para quem “os
actos humanos (…) em si são de duas espécies, consoante são próprios do homem, ou
comuns ao homem e aos animais. (…) Os actos humanos só merecem esse título porque são
voluntários, e a vontade é um apetite racional específico do homem.”… (Inserir referencia
bibliográfica).

Segundo Marciano Vidal (2000) os actos humanos são os que determinam o comportamento
do ser humano pois referem-se à responsabilidade das pessoas. Cf. Vidal (2000, p.22). A
responsabilidade implica a racionalidade, característica exclusiva do ser humano. E esta
característica deve orientar todas as outras características vistas acima para se determinar que
este ou aquele acto seja humano e não apenas de homem. Uma advertência importante
impõe-se neste discurso: Acto humano e acto de homem muitas vezes coincidem porque os
critérios de distinção não consistem na oposição, mas na diferença numérica dos elementos
constitutivos de uns e de outros. Os actos que são de homem e não são actos humanos
possuem menos características do que os actos que são humanos sem deixarem de ser de
homem. A fórmula que normalmente se adopta para resumir este discurso apresenta-se assim:

Todos os actos humanos são de homem, mas nem todos os actos de homem são actos
humanos. Ou dito de outra forma: Todos os actos humanos estão incluídos nos actos de
homem, mas nem todos os actos de homem entram no conjunto dos actos humanos. Estas
duas formulações (que possuem o mesmo conteúdo) demonstram que o conceito de acto de
homem é mais abrangente que o conceito de acto humano, o que recorrendo-se à
terminologia da Lógica Formal se explicaria afirmando-se que o conceito de acto de homem
tem maior extensão e menor compreensão que o acto humano e este, inversamente, tem maior
compreensão e menor extensão que aquele.

Para ilustrar ainda mais o discurso, veja-se a seguinte tabela com as características dos das
duas categorias de actos:

Actos humanos Actos de homem (não humanos)


São praticados pelo ser humano São praticados pelo ser humano
São praticados lúcida ou conscientemente Podem ser praticados inconscientemente
São sempre voluntários Podem ser involuntários
Devem ser livres Podem ser por coacção
Sempre incluem a racionalidade Podem excluir a racionalidade

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A IMPORTÂNCIA DA ÉTICA NA VIDA PROFISSIONAL

Normalmente a ética é definia pelo senso comum como um conjunto de regras que devem ser
cumpridas para o bem-estar de toda uma equipe de profissionais e entre profissionais e
clientes sendo assim sinônimo de respeito consigo mesmo e com o próximo.

Porém o sentido de ética profissional não se resume apenas as condutas normativas que
devem ser postas em prática como se fossem regras extremamente ditatórias, mas sim a um
conjunto de virtudes que fluem do super-ego do profissional as quais podemos tirar como
exemplos:

 HONESTIDADE
 COMPETÊNCIA
 COMPREENSÃO
 ÓPTIMISMO
 SIGÍLO
 PRUDÊNCIA
 HUMILDADE
 RESPONSABILIADE, etc.

Formando assim qualidades pessoais que condizem nos valores do homem, tornando-
o um profissional com alto poder de excelência.

 Como é ser um Profissional Ético?

Ser profissional ético nada mais é do que ser profissional mesmo nos momentos mais
inoportunos. Para ser uma pessoa/profissional ética, devemos seguir um conjunto de valores.
Ser ético é proceder sem prejudicar os outros. Algumas das características básicas de como
ser um profissional ético é ser bom, correcto, justo, adequado, honesto, ser corajoso para
tomar decisões, ser íntegro (agir de acordo com seus princípios), ser humilde.

 Código de Ética Profissional

Código de ética profissional é o conjunto de normas éticas, que devem ser seguidas pelos

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profissionais no exercício de seu trabalho, normalmente vem apresentada numa brochura.
O código de ética profissional normalmente é elaborado pelos Conselhos, que representam e
fiscalizam o exercício da profissão.
Todas as empresas éticas deviam pautar pela adopção de um código de ética e de conduta. O
Código de Ética deve ser simples, de fácil interpretação e aplicabilidade, senão será mais um
manual para deixar na gaveta sem utilizar. Trata-se de um instrumento indispensável onde se
fixam os valores humanos básicos sobre os quais se constrói a empresa. É fundamental que
exista correspondência entre a cultura empresarial e os ideais contidos no código, (Onebiz,
s/d).
Não basta criar o manual, há que pô-lo em prática através de reuniões periódicas, meios de
comunicação internos e acções de formação da rede. A sua aplicação deve ser rigorosa, quer
quando se trata de punir, quer quando se trata de premiar. Sem confiança na imagem da
marca os clientes mostrariam relutância em estabelecer negócios consigo e os seus
colaboradores sentiriam receio. A ética empresarial aborda produtividade e responsabilidade
social e é uma extensão estratégica de gestão, (Onebiz, s/d, p. 30).
Existe todo um conjunto de princípios deontológicos que podem ser inclusos neste Código de
Ética empresarial, e que são: Integridade, honestidade, boa-fé;
 Idoneidade: a empresa deve aceitar apenas as tarefas para que está apta;

 Independência: nas suas funções em relação aos parceiros e clientes;

 Responsabilidade: pelo trabalho a desempenhar e pelas funções desempenhadas pelos


colaboradores;

 Competência: actuar de forma diligente, inteligente, com conhecimento próprio e


responsável;

 Confidencialidade: sigilo professional;

 Equidade: igualdade de tratamento, quer para os colaboradores, quer para a sua


clientela, pese embora a empresa possa criar dentro da sua estratégia níveis de
tratamento em função da classificação que possa dar aos seus próprios clientes;

 Lealdade: actuar com correcção e civismo, (Onebiz, s/d, p. 30).

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 Ética no trabalho

A Ética e sua importância no trabalho


Na sociedade actual, lamentavelmente, o sucesso económico passou a ser a medida de todas
as coisas. Apenas a riqueza e o poder contam e separam os vencedores dos excluídos. As
pessoas são na sua maioria materialistas e individualistas e, por isso, pouco responsáveis e
solidárias.

Muitos, ingenuamente, pensam que para a ética ocorrer dentro de uma


empresa/associação/agência/firma/escritório, basta distribuir folhetos contendo um código de
ética/normas de conduta interna, que todos magicamente seguirão. Para exercê-la no contexto
laboral, seja ele qual for, mais do que palavras, é necessário acção. A premissa básica para
que isso aconteça é responder e agir em coerência com a resposta à seguinte pergunta:
- O que eu estou disposto a fazer para que este grupo seja mais feliz? - Ou, qual é o meu
compromisso para que a vida nesta empresa/associação/agência/firma/escritório, se torne
mais saudável e beneficie a todos?

Pensar em ética é pensar e agir de forma reflexiva, antes de tudo e de mais nada. É não se
sentar em cima de respostas prontas, feitas, predefinidas.
Para viver eticamente em qualquer ambiente é preciso primeiro mergulhar dentro de si
mesmo, assumir as escolhas e lutar por um mundo melhor. Acreditar que a felicidade é
possível, já que esse é o objectivo maior da ética.
Hoje em dia, é do interesse das entidades empregadoras agir sempre de maneira ética. Todos
os melhores funcionários e fornecedores, as melhores fontes de financiamento, tenderão a
preferir aquelas que costumam tratá-los bem. E os clientes que têm critério, que sabem
escolher, dificilmente serão leais a um produto de menor qualidade, ou um serviço que seja
pouco eficiente. A ética está directamente relacionada com valores morais, com o que é certo
ou errado. De acordo com Nash, falando da ética empresarial, afirmou que (1993, p. 04):
“São muitas as razões para a recente promoção da ética no pensamento empresarial. Os
administradores percebem os altos custos impostos pelos escândalos nas empresas: multas
pesadas, quebra da rotina normal, baixo moral dos empregados, aumento da rotatividade,
dificuldades de recrutamento, fraude interna e perda de confiança pública na reputação da
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empresa.”
Todos devemos ser éticos tanto na vida profissional como familiar, entre outras relações em
sociedade. Que nada mais é do que ser honesto, responsável, proceder sempre de forma que
se não puder ajudar, então, não atrapalhe. Ser ético é viver sempre com a consciência
tranquila.

Actuar eticamente, entretanto vai muito além de não roubar ou não fraudar a empresa.
Qualquer decisão ética tem por trás um conjunto de valores fundamentais. Eis alguns dos
principais:

1. Ser honesto- É a primeira virtude no campo profissional; é a conduta que obriga ao


respeito à lealdade para com o bem de terceiros. Um profissional comprometido com a
ética não se deixa corromper em nenhum ambiente, ainda que seja obrigado a viver e
conviver com ele.

2. Ter coragem, - pois ajuda a reagir às críticas, quando injustas, e a defender dignamente
quando está consciente de seu dever. Ajuda a não ter medo de defender a verdade e a
justiça, principalmente quando estas forem de real interesse para outrem ou para o bem
comum. Ter coragem ainda para tomar decisões, indispensáveis e importantes, para a
eficiência do trabalho, sem levar em conta a opinião da maioria.

3. Ser competente: oconhecimento da ciência, da tecnologia, das técnicas e práticas


profissionais é pré-requisito para a prestação de serviços de boa qualidade. Ser
competente é ser habilidoso para exercer uma determinada função.

4. Ser prudente: todo trabalho, para ser executado, exige muita segurança. A prudência
contribui para a maior segurança, principalmente das decisões a serem tomadas; é
indispensável nos casos de decisões sérias e graves, pois evita os julgamentos apressados
e as lutas ou discussões inúteis.

5. Ser perseverante: qualidade difícil de ser encontrada, mas necessária, pois todo trabalho
está sujeito a incompreensões, insucessos e fracassos que precisam ser superados,
prosseguindo o profissional em seu trabalho, sem entregar-se a decepções ou mágoas

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6. Ser humilde- o profissional precisa ter humildade suficiente para admitir que não é o
dono da verdade e que o bom senso e a inteligência são propriedade de um grande
número de pessoas. Só assim o profissional consegue ouvir o que os outros têm a dizer e
reconhecer que o sucesso individual é resultado do trabalho da equipe.

7. Manter o sigilo- é a completa, total, reserva quanto a tudo o que se sabe e que lhe é
revelado ou o que veio a saber por força da execução do trabalho. É a obrigatoriedade de
guardar silêncio diante de certas verdades a si confiadas.

8. Ser compreensivo: qualidade que ajuda muito um profissional, porque é bem aceito
pelos que dele dependem, em termos de trabalho, facilitando a aproximação e o diálogo,
tão importante no relacionamento profissional.

9. Ser imparcial: é uma qualidade tão importante que assume as características do dever,
pois se destina a se contrapor aos preconceitos, a reagir contra os mitos, a defender os
verdadeiros valores sociais e éticos, assumindo principalmente uma posição justa nas
situações que terá que enfrentar. Para ser justo é preciso ser imparcial, logo a justiça
depende muito da imparcialidade. É uma virtude que está associada ou diz respeito ao que
é justo ou à justiça.

10. Ser optimista: em face das perspectivas das sociedades modernas, o profissional precisa
e deve ser optimista, para acreditar na capacidade de realização da pessoa humana, no
poder do desenvolvimento, enfrentando o futuro com energia e bom-humor.

11. Ter atitude: Significa uma maneira organizada e coerente de pensar, sentir e reagir a
acontecimentos ocorridos em nosso meio circundante. Indica o que interiormente estamos
dispostos a fazer e a ser.

12. Ser íntegro- é agir dentro dos seus princípios éticos, seja em momentos de, por exemplo,
instabilidade financeira, seja na hora de apresentar óptimas soluções.

13. Ser tolerante e flexível: um líder deve ouvir as pessoas e avaliar as situações sem
preconceitos.

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Consciência profissional
Quando falamos da consciência profissional nos estamos a referir à Lucidez, lucidez esta que
o profissional precisar portar consigo no ambiente laboral.
Fazem parte dalgumas linhas gerais da consciência profissional as seguintes:
1. Compartilhe seus conhecimentos, pois só assim eles têm valor.
2. Confie nos colegas até que provem não merecer sua confiança . É mais produtivo para si e
para toda a equipe.
3. Não faça nada que você não possa assumir em público.
4. Caso um colega tente levar a fama e protagonismo por um projecto do qual você
participou, converse primeiro com ele. O diálogo é impossível? Não estará sendo
antiético se levar o problema aos seus superiores, de preferência acompanhada de mais
pessoas envolvidas na história. Só tome cuidado com acusações infundadas, fofocas,
dados distorcidos.
5. Escolha empresas éticas para trabalhar, aquelas que discutem sua missão, além de
princípios e valores, para chegar a um consenso que deve ser compartilhado com todos.
6. Se um subordinado seu for antiético , o passo a seguir é educar, orientar. Já, as
reincidências têm de ser tratadas com rigor.
7. Quanto mais poder a pessoa pouco ética tem dentro da organização, mais cuidados
devemos tomar. Muitas vezes a solução é buscar uma vaga em outro sector ou, em casos
extremos, denunciá-la ao departamento de recursos humanos.
8. Lembre-se que os valores sociais devem suplantar os individuais.
9. Por último, agir eticamente dentro ou fora da empresa sempre foi e será uma decisão
pessoal própria. Mesmo sujeito a deslizes e equívocos, você deve ter consciência de que
esse costuma ser um caminho sem volta. Para seu sucesso ou seu fracasso profissional.
De acordo com Jacomino (2000, p. 36): “Agir eticamente dentro (ou fora) da empresa
sempre foi e será uma decisão pessoal. Uma vez que você tenha despertado para o assunto,
mais e mais ele tende a ser considerado nas decisões, num processo permanente, sem fim. É
claro que sempre estamos sujeitos a deslizes e equívocos. Nunca se esqueça, porém, de que
esse costuma ser um caminho sem volta. Para o bem ou para o mal.”

Outros valores a considerar na ética do trabalho:


a. Identificar-se e dedicar-se com zelo no trabalho;
b. Conservar e desenvolver a cultura de trabalho;

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c. Preservar o bom conceito e o apreço social do trabalho;
d. Desempenhar sua profissão ou função nos limites de suas atribuições e de sua capacidade
pessoal de realização;
e. Empenhar-se junto dos organismos profissionais no sentido da consolidação da cidadania e
da solidariedade profissional e da coibição das transgressões éticas.

RELAÇÃO ENTRE ÉTICA E OUTRAS CIÊNCIAS

1) Ética na Filosofia
Ética na filosofia identifica-se com o estudo dos assuntos morais, do modo de ser e agir dos
seres humanos, além dos seus comportamentos e carácter. A ética na filosofia procura
descobrir o que motiva cada indivíduo de agir de um determinado jeito; diferencia também o
que significa o bom e o mau, o bem e o mal.
A ética na filosofia estuda os valores que regem os relacionamentos interpessoais, como as
pessoas se posicionam na vida, e de que maneira elas convivem em harmonia com as demais.
Para a filosofia clássica, a ética estudava a maneira de buscar a harmonia entre todos os
indivíduos, uma forma de conviver e viver com outras pessoas, de modo que cada um
buscasse seus interesses e todos ficassem satisfeitos. A ética na filosofia clássica abrangia
diversas outras áreas de conhecimento, como a estética, a psicologia, a sociologia, a
economia, pedagogia, política, e etc.
Com o crescimento mundial e o início da Revolução Industrial, surgiu a ética na filosofia
contemporânea. Diversos filósofos como Sócrates, Aristóteles, Epicuro e outros, procuraram
estudar a ética como uma área da filosofia que estudava as normas da sociedade, a conduta
dos indivíduos e o que os faz escolher entre o bem e o mal.

A Ética e a Filosofia têm uma relação intrínseca, na medida em que a ética é considerada
como parte da Filosofia. Ao longo do tempo ela foi se enraizando, ou seja, abarcando outras
actividades inerentes a outras ciências. Como vimos na definição a Ética é inerente a conduta
humana e este homem não pode ser visto de maneira isolda, mas sim como um ser social que
vive em determinada comunidade guiada por hábitos e costumes moralmente aceites dentro
da mesma; neste caso, a filosofia sendo aquela disciplina que vai a busca do saber vai
questionar e buscar trazer possíveis soluções dos problemas levantadas dentro desta
comunidade. Assim sendo, podemos dizer que estas duas disciplinas complementam-se, ou
seja, são intrínsecas.
15
2) Ética e Sociologia
SOCIOLOGIA “(in. Sociology-, fr. Socíologie; ai. Soziologic* it. Sociologia). É a ciência da
sociedade, entendendo-se por sociedade o campo das relações intersubjetivas. Esse termo foi
criado em 1838 por A. Comte, para indicar "a ciência de observação dos fenômenos sociais"
(Cours de phil. positive, IV, 1838), e é usado actualmente para qualquer tipo ou espécie de
análise empírica ou teoria que se refira aos factos sociais, ou seja, às efectivas relações
intersubjetivas, em oposição às "filosofias" ou "metafísicas" da sociedade, que pretendem
explicar a natureza da sociedade como um todo, independentemente dos factos e de modo
definitivo” (ABBAGNANO, 2007: 914).

Coloquemos um questionamento:
- Será possível uma sociedade viver sem Ética, ou hábitos e costumes moralmente aceites por
ela?
Este é o nosso ponto de partida que logo a priori mostram a vinculação entre a Ética e a
Sociologia. A sociologia sendo aquela ciência que se dedica as relações humanas que
pertencem a um grupo social necessita desta relação com a ética para melhor compreender e
reger os hábitos e costumes da sociedade.

3) Ética e Direito
DIREITO (gr. xò ôíicmov; lat. Jus; in. Lata, fr. Droit; ai. Recht; it. Dirittó). Em sentido geral
e fundamental, é a técnica da coexistência humana, isto é, a técnica que visa possibilitar a
coexistência dos homens. Como técnica, o Direito se concretiza em conjunto de regras (nesse
caso leis ou normas), que têm por objecto o comportamento inter-subjetivo, ou seja, o
comportamento dos homens entre si.
Na relação entre Direito e Ética importa referir que Aristóteles, na divisão dos campos
inerentes a ciência, “ pensou que um deles era composto pelas ciências políticas, que têm
como finalidade a acção exterior. Esta ciência era a Ética, que lidava com as virtudes do
indivíduo (práxis individual), e a política (práxis comunitária), que era inerente a vida da
comunidade. E com a génese da sociedade civil o ethos será expresso como ‘nómos’ (lei). A
sociedade, compreendida como associação, é formada por indivíduos possuidores de distintas
posições, cujas particularidades terão a lei como ponto de partida. Aqui se tem posto o Direito
como uma derivação dos costumes, do ethos, da ética”
(http://www.domtotal.com/colunas/detalhes.php). Como vimos nas abordagens anteriores a
16
ética tem como fim regular os hábitos e costumes de cada sociedade, razão pela qual
podemos mesmo dizer entre a Ética e o Direito existe uma complementaridade.

4) Ética e Política
Política (gr. 7IOÀ.ITIKIÍ; lat. Política; in. Politics; fr. Politique, ai. Politik, it. Política).
Com esse nome foram designadas várias coisas, mais precisamente:
1- A doutrina do direito e da moral;
2- A teoria do Estado:
3- A arte ou ciência do governo;
4- O estudo dos comportamentos intersubjetivos.
O primeiro conceito foi exposto em Ética, de Aristóteles. A investigação em torno do que
deve ser o bem e o bem supremo, segundo Aristóteles, parece pertencer à ciência mais
importante e mais arquitetônica: "Essa ciência parece ser a política. O segundo significado do
termo foi exposto em Política de Aristóteles: "Está claro que existe uma ciência à qual cabe
indagar qual deve ser a melhor constituição: qual a mais apta a satisfazer nossos ideais
sempre que não haja impedimentos externos; e qual a que se adapta às diversas condições em
que possa ser posta em prática. Como é quase impossível que muitas pessoas possam realizar
a melhor forma de governo, o bom legislador e o bom político devem saber qual é a melhor
forma de governo em sentido absoluto e qual é a melhor forma de governo em determinadas
condições" (Pol., IV, 1, 1288 b 21).

A Ética como a política servem e tem como fim o bem humano; ora vejamos: a Ética lida
com o dia a dia dos cidadãos, ou seja, lida com as virtudes que são inerentes ao homem e
paralelamente a ética está a política que lida com o dia da comunidade. Como podemos
constatar, a política e a ética são intrínsecos, pois ambas dizem respeito ao homem, mas
importa referir que, a política assume a primazia na medida em que ela se serve de todas as
ciências práticas isto pelas suas leis, ela incute a outras ciências sobre o que devem fazer ou
abster-se. Como se pode ver tanto a ética como a política abarcam outras ciências e juntas
contribuem para o bem estar do homem.

5) Ética e Educação
Para melhor entendermos sobre a relação existente entre a Ética com a Educação, vale a pena
ir a génesis da palavra. Do latim "educare", que significa “educar, instruir” e também “criar”.
Essa palavra era composta por "ex", fora, e "ducere", guiar, conduzir, liderar. Está patente a
17
idéia de que introduzir alguém ao mundo por meio da instrução era como “levar uma pessoa
para fora de si mesma, mostrar o que mais existe além dela, quer dizer ensinar aquilo o que
ela não sabe. Vista de outro modo a educação tem em vista a formação do próprio homem,
contribuíndo para o desenvolvimento do mesmo.

A educação do homem é feita mediante as directrizes éticas, ou seja, tem um cunho ético, o
que o possibilidade a integração no seio da comunidade no qual se encontra inserido. Assim
sendo, podemos dizer que a educação assume a exigência ética pois ajuda o homem na sua
relação com os demais elementos da comunidade, observando regras ou normas usais da
mesma, ou seja, hábitos e costumes meramente aceites dentro da comunidade em que se
encontra inserido. Portanto, para Vasquez (1996) a ética preocupa-se com o modo de como
legitimamos as nossas relações no seio da sociedade.

Portanto, a ética na educação tem como objectivo formar um indivíduo consciente de seus
deveres e direitos dentro de uma sociedade. Para um convívio regular entre as sociedades
sempre se exigiu um comportamento que, ao longo da história se baseia nas leis estabelecidas
nos pólis gregos e mais tarde, na idade média, baseadas em leis estabelecidas com
fundamentos no Cristianismo. Isto para proporcionar uma margem de respeito mútuo e a si
próprio, havendo assim a responsabilidade inerente de se repassar esses padrões a gerações
futuras, que através de instituições de ensino são dadas as bases para a adaptação na
sociedade actual. Dando-se assim a ética na educação e consistindo nesse objectivo de
formação de um indivíduo consciente de seus deveres e direitos dentro de uma sociedade.

6) Ética e Medicina/Ética na Enfermagem

No que diz respeito a relação entre a Medicina e a ética podemos colocar antes de mais em
evidência o que seja a medicina. Desde tempos mais antigos, o objectivo da Medicina é a
saúde do homem. É importante frisar que pensadores clássicos como Aristóteles, no âmbito
ético entendia que tudo o que a pessoa faz, seja a nível das artes ou qualquer outra disposição
de virtude está em vista a obtenção de algo, que é o bem e deve ser.
Ainda nesta vertente Aristóteles defende que a ética existe na relação ou vínculo entre as
pessoas, pois esta é inerente ao comportamento do homem na sociedade.

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Para uma melhor compreensão da relação entre a Ética e a Medicina, basta lembrarmo-nos do
juramento de Hipócrates (pai da Medicina), juramento este que hoje é feito pelos médicos: “
Juro por Apolo Médico, por Esculápio, por Higí, por Panaceia e por todos os Deuses e
Deusas que acato este juramento e que o procurarei cumprir com todas as minhas forças
físicas e intelectuais; honrarei o professor que me ensinar esta arte como os meus próprios
pais; partilharei com ele os alimentos e auxiliá-lo-ei nas suas carências; estimarei os filhos
dele como irmãos e, se quiserem aprender esta arte, ensiná-la-ei sem contrato ou
remuneração. A partir de regras, lições e outros processos ensinarei o conhecimento global
da medicina, tanto aos meus filhos e aos daquele que me ensina!; como aos alunos
abrangidos por contrato e por juramento médico, mas a mais ninguém. A vida que professar
será para benefício dos doentes e para o meu próprio bem, nunca para prejuízo deles ou com
malévolos propósitos. Mesmo instado, não darei droga mortífera nem a aconselharei;
também não darei pessário abortivo às mulheres. Guardarei castidade e santidade na minha
vida e na minha profissão. Operarei os que sofrem de cálculos, mas só em condições
especiais; porém, permitirei que esta operação seja feita pelos praticantes nos cadáveres.
Em todas as casas em que entrar fá-lo-ei apenas para benefício dos doentes, evitando todo o
mal voluntário e a corrupção, especialmente a sedução das mulheres, dos homens, das
crianças e dos servos; sobre aquilo que vir ou ouvir respeitante à vida dos doentes, no
exercício da minha profissão ou fora dela, e que não convenha que seja divulgado, guardarei
silêncio como um segredo religioso; se eu respeitar este juramento e não o violar serei digno
de gozar de reputação entre os homens em todos os tempos; se o transgredir ou violar que
me aconteça o contrário”. (HIPOCRATIS OPERA VERA ET ADSCRIPTA Tomus Quartus,
pág: 197-198-199, Lausanne MDCCLXXI).

7) Ética e Economia
O termo economia origina-se das palavras gregas oikos (casa) e nomos(normas). Na Grécia
antiga, Economia significava a arte de bem administrar o lar, levando-se em conta a renda
familiar e os gastos efetuados durante um período. Modernamente, define-se Economia como
a ciência que estuda o emprego de recursos escassos, entre usos alternativos, com o fim de
obter os melhores resultados, seja na produção de bens, ou na prestação de serviços. Em
outras palavras, trata-se da “ciência humana que analisa os comportamentos individuais
(micro) e coletivos (macro) na medida em que estes últimos se defrontam com o problema da
escassez, da falta e, da frustração humana” (http://www.comoviveremos.com/sobre-etica-e-
economia).
19
Numa abordagem histórica, a economia antes de ser tratada como ciência era enquadrada ou
inserida na Teologia e Política. Com a sua independência, ela mostrou que tinha ideais e
princípios meramente lógicos. Alguns pensadores mais influentes da actualidade, como é o
caso de Amartya Sen, acredita que na modernidade a relação da Ética com a Economia
ganhou uma distância, pelo simples facto da economia dar primazia a factos reais do que
juízos normativos. Apesar disso, tanto Sen com Nalini são de opnião de que ambas deviam
voltar a ter uma interação salutar, pois, para Nalini (2011) a economia é a ciência que está em
vista conceder a humanidade os bens materiais, razão pela qual necessita da Ética, quer dizer,
o mundo económico não pode se dissociar da moral, senão não será justo.

8) Ética e Gestão e Gestão Empresarial


A Ética oferece ao gestor princípios e formas de saber liderar e gerir os bens alheios e ou
institucionais. Oferece aos gestores instrumentos de gestão imparcial, justa e ética. A empresa
torna-se ética, é comprometida com valores sociais; respeita a ética do lucro e onde é
observada e a responsabilidade social.

9) Ética e Contabilidade
A Ética e a Contabilidade possuem um vinculo, na medida em que se esboça uma regra,
normas de conduta que vai reger tanto o profissional de contabilidade como a instituição no
seu todo. Estes códigos ou normas que são elaborados visam antes de mais, aquilo que se
pretende que seja cada um seja no exercício das suas actividades. Importa referir que um
código de ética não se resume numa simples compilação de deveres, limitações e punições, é
antes um princípio norteador, que deve reger toda a conduta dos elementos envolvidos por
ele, tal como fizemos menção anteriormente. A não observância do código de conduta no
exercício da profissão prejudica a priori o profissional e posteriormente a instituição, razão
pela qual a ética e contabilidade encontram um vínculo que acaba sendo uma mais-valia.

10) Ética e Gestão Ambiental


A ética ajuda os gestores ambientais na toma de consciência sobre a gestão ambiental, sobre a
consciência do uso e aproveitamento dos recursos, tendo encontra as gerações futuras, chama
a atenção para os problemas que afectam directamente ao meio ambiente: as poluições, a
desertificação, os aluimentos, as contaminações da terra, do ar e das águas, etc.

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DEONTOLOGIA PROFISSIONAL
Deontologia
É um termo que aparece da aglutinação de duas palavras gregas: “déon” e “logos”. Para os
gregos “déon” significa dever/o que deve ser feito e logos – estudo. Portanto, deontologia é a
ciência do dever ou a ciência do que deve ser feito e neste caso vertente, o que deve ser feito
enquanto agente, profissional de certa área de actividade laboral.
Neste caso, Deontologia seria o tratado do dever, ou o conjunto de deveres, princípios ou
normas adaptadas com um fim determinado: regular ou orientar determinado grupo de
indivíduos no âmbito de uma actividade laboral, para o exercício de uma certa profissão.
A par desta ideia de tratado, associado à regulamentação de uma profissão, estava implícita
uma certa Ética, aquilo a que posteriormente viria a ser entendido como a ciência do
comportamento moral dos homens em sociedade.
A história atribui ao filósofo utilitarista inglês Jeremy Bentham (1748-1832) como o
introdutor do termo “deontologia” no vocabulário filosófico, na sua obra (publicada
postumamente em 1834) Deontlogy or the science or morality, onde o autor procura
“transformar a teoria utilitarista numa espécie de aritmética da moral”, quantificando,
segundo critérios de intensidade, duração e outros, os somatórios dos prazeres intelectuais,
sociais, morais e altruísticos para a valoração dos princípios éticos.
Deontologia seria, pois, “a ciência do que é justo e conveniente”, aplicada e limitada ao
exercício de uma profissão concreta. É a ciência que identifica os valores mais morais
diretores de uma determinada actividade profissional. E enquanto ciência de factos de
natureza moral, a deontologia implica, pois, não só a enunciação do que é, mas também a
enunciação do que deve ser.
Assim, Ética e Deontologia profissional nada mais é que o comportamento, as atitudes que o
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profissional deve ter e ou apresentar no desempenho das suas atribuições ou tarefas, no seu
local de actividade. Ética e Deontologia Profissional são as obrigações que o profissional
ético deve cumprir enquanto tal e não deve deixá-las de lado enquanto profissional de tal
área.
IMPROBIDADE DA ÉTICA EMPRESARIAL/PROFISSIONAL

Improbidade significa desonestidade, má índole, mau-caráter, falta de probidade, isto é,


falta de honradez, de integridade, de lisura. Significa também maldade, perversidade,
atrocidade. Improbidade é um substantivo feminino, com origem do latim probitate. É
formada do prefixo latino im, que tem o sentido de negação, mais a palavra probidade que
significa honradez, integridade, honestidade, portanto, improbidade é a falta de probidade, é
uma prática desonesta, que denota mau-caráter e caminha contra a honradez, a boa-fé, a
integridade, o bom caráter.

1. INTOLERÂNCIA
A intolerância é uma atitude mental caracterizada pela falta de habilidade ou vontade em
reconhecer e respeitar diferenças, nem crenças, nem opiniões. Ou seja, as pessoas não
respeitam as diferenças ou as opiniões dos outros. E infelizmente no meio laboral tem sido
muito frequente.

2. CORRUPÇÃO
Corrupção é o efeito ou acto de corromper alguém ou algo, com a finalidade de obter
vantagens em relação aos outros por meios considerados ilegais ou ilícitos.
Etimologicamente, o termo "corrupção" surgiu a partir do latim corruptus, que significa o
"acto de quebrar aos pedaços", ou seja, decompor e deteriorar algo.

A acção de corromper pode ser entendida também como o resultado de subornar, prestando
favores, dando dinheiro ou presentes para alguém em troca de benefícios especiais de
interesse próprio.

A corrupção é um meio ilegal de se conseguir algo, sendo considerada grave crime em muitos
países, como é o caso de Moçambique. Normalmente, a prática da corrupção está relacionada
com a baixa instrução política da sociedade, que muitas vezes compactua com os sistemas
corruptos. 

22
A corrupção na política pode estar presente em todos os poderes do governo, como o
Legislativo, Judiciário e Executivo. No entanto, a corrupção não existe apenas na política,
mas também nas relações sociais humanas, como no trabalho, por exemplo. 

Para que se configure a corrupção, são precisos no mínimo dois atores: o corruptor e o
corrompido, além do sujeito conivente e o sujeito irresponsável, em alguns casos.

 Corruptor: aquele que propõe uma acção ilegal para benefício próprio, de amigos ou
familiares, sabendo que está infringindo a lei;
 Corrompido: aquele que aceita a execução da acção ilegal em troca de dinheiro,
presentes, favores ou outros serviços que lhe beneficiem. Este indivíduo também sabe
que está infringindo a lei;
 Conivente: é o indivíduo que sabe do acto de corrupção, mas não faz nada para evitá-
lo, favorecendo o corruptor e o corrompido, no entanto sem ganhar nada em troca. O
sujeito conivente também pode ser atuado e acusado no crime de corrupção;
 Irresponsável: é alguém que normalmente está subordinado ao corrompido ou
corruptor e executa acções ilegais por ordens de seus superiores, no entanto sem ao
menos saber que esses actos são ilegais. O sujeito irresponsável age mais por amizade
do que por profissionalismo;

A corrupção ainda pode significar o desvirtuamento e a devassidão de hábitos e costumes,


tornando-os imorais ou antiéticos, por exemplo.

Tipos/Formas de corrupção:

 Corrupção ativa: quando um indivíduo oferece dinheiro a um funcionário público


em troca de benefícios próprios ou de terceiros;
 Corrupção passiva: quando um agente público pede dinheiro para alguém, em troca
de facilitações para o cidadão.

AINDA A CONSIDERAR SOBRE A CORRUPÇÃO

23
A Corrupção em Moçambique: Aspectos Gerais

O controlo da corrupção através da reacção penal em Moçambique é um aspecto central da


governação que ganhou maior relevância a partir da primeira metade dos anos 2000, altura
em que o volume de apelos para que o Governo pusesse em prática políticas e acções
tendentes a aumentar a transparência na gestão do bem público e reduzir os níveis de
corrupção subiu de tom. Isto verificou-se na sequência dos assassinatos do jornalista Carlos
Cardoso em 2000 e do economista Siba Siba Macuacua em 2001, os quais aconteceram sob
um pano de fundo de corrupção, tráfico de influências e fraudes bancárias.

O controlo da corrupção pressupõe a existência de leis e regulamentos que permitam uma


actuação efectiva das autoridades judiciais. Contudo, o estabelecimento de um quadro legal
abrangente que viabilizasse uma reacção penal efectiva contra a prática de actos de corrupção
nunca foi abordado de forma integrada e criteriosa, de modo a que as instituições da Justiça
ficassem dotadas dos instrumentos necessários para agirem.

Diferentemente de Moçambique, no contexto global, os Estados, seja a título individual como


colectivo (através de entidades multilaterais como as Nações Unidas ou a União Africana),
têm vindo a munir-se de instrumentos legais cujo objectivo é a prevenção e a punição de
delitos de corrupção e outros crimes a estes conexos. Mas em Moçambique, a engenharia
legal anticorrupção ainda é fraca.

Na viragem para a democracia nos meados dos anos 90, ensaios foram feitos para
viabilizarem a mudança na forma de organização do Estado e no carácter da governação,
estabelecendo-se algumas leis que visavam promover a transparência e a boa governação. Por
exemplo, em 1990 foi aprovada uma lei que introduziu novas Normas de Conduta, Deveres e
Direitos dos Dirigentes Superiores do Estado. E em 1998 uma outra lei , com mesmo alcance,
foi aprovada visando atingir os titulares dos cargos governativos. Os dois dispositivos
continham, entre outras, algumas regras fundamentais para a garantia da transparência numa
sociedade democrática: a declaração de bens e sua actualização anual.

Apesar destes ensaios, o quadro legal anticorrupção foi sempre precário até que em 2004 o
Governo aprovou uma Lei Anticorrupção (6/2004, de 17 de Junho), a qual veio definir a
corrupção em dois sentidos: a corrupção passiva como sendo a solicitação de vantagem
patrimonial ou não patrimonial por parte de funcionário ou agente do Estado para realizar ou
omitir acto contrário ou não contrário ao dever do seu cargo; e a corrupção activa como

24
sendo o oferecimento de vantagem patrimonial ou não patrimonial a funcionário ou agente do
Estado para realizar um acto contrário aos deveres do seu cargo.

Tipos de corrupção

As abordagens teóricas sobre corrupção têm distinguido a corrupção política (grande


corrupção) da corrupção burocrática (pequena corrupção). A grande corrupção acontece nos
altos níveis da autoridade política. Concretamente, acontece quando os políticos e os
decisores (chefes de Estado, Ministros e oficiais de topo), investidos da capacidade de
formular, estabelecer e implementar leis em nome do povo, tornam-se, eles próprios,
corruptos (DOIG, THEOBALD, 2000).

A grande corrupção lida com indivíduos situados em altas esferas do poder, os quais
exploram as suas posições para extraírem subornos das corporações nacionais e
internacionais, apropriando-se dos pay-offs de contratos, ou desviam largos montantes do
dinheiro público para contas bancárias localizadas geralmente no exterior.

A corrupção burocrática é aquela que ocorre na administração pública, no lado da


implementação das políticas. Esta corrupção de “nível baixo” ou “de rua” é aquela que os
cidadãos normais experimentam no seu dia-a-dia, nomeadamente na Administração Pública,
nos serviços como hospitais, escolas, locais de licenciamento de actividades comerciais,
polícia, alfândegas, autoridades fiscais, etc. As somas envolvidas nesta forma de corrupção
são geralmente modestas (ajustadas às condições locais) e, por isso, a corrupção burocrática é
geralmente referida como rotineira ou “pequena corrupção”, mesmo que as somas possam ser
consideráveis em casos particulares e em termos agregados.

A corrupção política e a corrupção burocrática tendem a seguir de mãos dadas. A corrupção


política é usualmente suportada por uma corrupção burocrática amplamente disseminada,
numa pirâmide invertida de extracção. E a corrupção nos altos níveis é contagiosa para os
níveis inferiores da Administração Pública, dado que estes vão seguir os exemplos
predatórios dos seus dirigentes (principais) ou seguirem as suas instruções (ANDVIG et al,
2000).

A busca de renda (rent-seeking) é muitas das vezes vista como corrupção. Na verdade, os
dois são conceitos que se sobrepõem. Enquanto a corrupção envolve o uso do poder público
para benefícios privados, a busca de renda deriva do conceito económico de renda, ou seja,

25
ganhos em excesso sem custos relevantes, e iguala ao que muitos pensam serem lucros de
monopólio.

A busca de renda, o esforço para adquirir renda, não é necessariamente banido por lei, nem é
sequer considerado imoral na sociedade. Também não tem efeitos perversos à economia em
termos de desenvolvimento, no caso de se verificar um investimento produtivo, mas é
largamente improdutivo e muitas vezes economicamente ineficiente (Rose-Ackerman, 2000).

Esta prática parece vigorar nos dias de hoje em Moçambique. A história dos créditos mal
parados, da delapidação da banca (Hanlon, 2001, Matando a Galinha dos Ovos de Ouro,
Metical) pode configurar práticas que se assemelham ao rent-seeking.

Se o acesso a esses créditos não foi feito de forma ilegal, a sua não devolução e a ausência de
investimentos na produção tiveram graves consequências ao nível das finanças públicas. Um
dos riscos fiduciários recentes do Estado moçambicano foi resultado da necessidade de se
cobrir os buracos financeiros na banca privatizada, originados por créditos bancários
atribuídos às elites políticas moçambicanas (Scanteam, 2004, Avaliação do Risco Fiduciário
Moçambique. Esboço/Projecto do Relatório. Oslo).

Numa economia de mercado onde os princípios da concorrência são sagrados até que ponto é
correcto o Estado financiar empresas privadas, sobretudo quando estamos perante um Estado
altamente endividado5? Coloquemos a questão doutra forma: imaginemos que o Estado
moçambicano é saudável, consegue financiar-se sem recurso à mão estendida, sem uma
dívida externa insustentável, sem um crescimento da dívida pública interna (crescimento
motivado pelo recursos a operações de Obrigações de Tesouro destinada a cobrir prejuízos
financeiros originados no roubo à banca), nesta situação, e admitindo que o Estado possa
financiar a economia, com que critérios é que isso seria feito? Quem teria direito a esses
financiamentos? Por concurso público? Como? Seriam elegíveis todas as empresas de
moçambicanos? Ou apenas as empresas ligadas a membros do Partido Frelimo e alguns
amigos estrangeiros?

A definição legal da corrupção em Moçambique

Não constitui objecto do presente trabalho discutir os vários conceitos de corrupção que têm

26
sido usados em variadas áreas do saber como a antropologia, a ciência política, a economia e
a sociologia. Essa abordagem pode ser objecto de um trabalho autónomo. Tendo em conta
que o presente estudo visa identificar as fragilidades da legislação anti-corrupção, faz sentido
que seja apresentada a noção legal (ou definição penal) de corrupção avançada pelo
legislador moçambicano, sem nos esquecermos de que o conceito de corrupção, fora do
espectro estritamente legal, é mais amplo e abrange realidades que não são necessariamente
captadas pela definição legal.

A Lei n.º 6/2004, nos artigos 7 e 9, define a corrupção em dois sentidos: primeiro, a
corrupção passiva como sendo a solicitação de vantagem patrimonial ou não patrimonial por
funcionário ou agente do Estado para realizar ou omitir acto contrário ou não contrário ao
dever do seu cargo; e corrupção activa como sendo o oferecimento de vantagem patrimonial
ou não patrimonial a funcionário ou agente do Estado para realizar um acto contrário aos
deveres do seu cargo.

Em termos de formas de corrupção patentes nesta noção, apenas ressalta a solicitação e o


oferecimento de suborno. Como vemos, nesta definição não cabem, por exemplo, as figuras
do desvio de fundos, tráfico de influências, enriquecimento ilícito e branqueamento de
proventos da corrupção.

O nº 1 do artigo 7 da Lei n.º 6/2004, em relação à corrupção passiva para acto ilícito, refere o
seguinte: As entidades previstas no artigo 2, que por si ou interposta pessoa, com o seu
consentimento ou ratificação, solicitarem ou receberem dinheiro ou promessa de dinheiro ou
qualquer vantagem patrimonial, que não lhes sejam devidos, para praticar ou não praticar
acto que implique violação dos deveres do seu cargo, serão punidos com a pena de prisão
maior de dois a oito anos e multa até um ano.

O artigo 9 da mesma lei refere o seguinte em relação à corrupção passiva para acto lícito: As
entidades previstas no artigo 2, que por si ou interposta pessoa, com o seu consentimento ou
ratificação, solicitarem ou receberem dinheiro ou promessa de dinheiro ou qualquer
vantagem patrimonial ou não patrimonial, que não lhes sejam devidos, para praticarem
actos não contrários aos deveres do seu cargo e cabendo nas suas funções, serão punidos
com pena de prisão até um ano. O artigo 9 da mesma lei refere o seguinte em relação a
corrupção activa: «Quem der ou prometer às entidades previstas no artigo 2 por si ou por
interposta pessoa, dinheiro ou outra vantagem patrimonial ou não patrimonial que a elas não

27
sejam devidos, com fins indicados no artigo 8, será punido com penas daquela disposição».

As entidades a que se refere o supra referido artigo 2 da Lei Anti-Corrupção são: dirigentes,
funcionários ou empregados do Estado ou das autarquias locais, das empresas públicas, das
empresas privadas participadas pelo Estado ou das empresas concessionárias de serviços
públicos.

3. ASSÉDIO
Assédio consiste numa perseguição insistente e inconveniente que tem como alvo uma pessoa
ou grupo específico, afetando a sua paz, dignidade e liberdade.

3.1. ASSÉDIO MORAL


Uma simples bronca (berro ou grito) não caracteriza assédio moral. Para se confirmar um
caso de assédio moral, ofensas e agressões devem ser constantes. Doutrinadores apontam que
o assédio moral se caracteriza como uma ofensa, uma agressão que ocorre de maneira
repetitiva e prolongada, durante o horário de trabalho e no exercício de suas funções,
transformando o local de trabalho num lugar hostil e de tortura psicológica e que gera um
dano a personalidade

É uma forma de violência no trabalho que consiste na exposição prolongada e repetitiva dos
trabalhadores a situações vexatórias, constrangedoras e humilhantes, praticadas por uma ou
mais pessoas. Ocorre por meio de comportamentos com o objetivo de humilhar, ofender,
ridicularizar, inferiorizar, culpabilizar, amedrontar, punir ou desestabilizar emocionalmente os
trabalhadores, colocando em risco a sua saúde física e psicológica, além de afetar o seu
desempenho e o próprio ambiente de trabalho.

O assédio pode assumir tanto a forma de acções diretas (acusações, insultos, gritos,
humilhações públicas) quanto indiretas (propagação de boatos, isolamento, recusa na
comunicação, fofocas e exclusão social). Porém, para que sejam caracterizadas como assédio,
essas ações devem ser um processo frequente e prolongado.

3.1.1. Alguns dos objetivos do assédio:

28
♦ Desestabilizar emocional e profissionalmente o indivíduo;

♦ Pressioná-lo a pedir demissão;

♦ Provocar sua remoção para outro local de trabalho;

♦ Fazer com que se sujeite passivamente a determinadas condições de humilhação e


constrangimento, a más condições de trabalho etc.

As práticas de assédio moral podem se dar tanto do chefe para seu(s) subordinado(s) (assédio
descendente), como do(s) subordinado(s) para seu(s) superior(es) (assédio ascendente), entre
os colegas de trabalho, ou podem ser mistas, isto é, entre superiores, colegas e/ou
subordinados.

As acções decorrem das relações interpessoais e/ou do assédio organizacional (quando a


própria organização incentiva e/ou tolera as ocorrências).

O assédio nem sempre é intencional. Às vezes, as práticas ocorrem sem que os agressores
saibam que o abuso de poder frequente e repetitivo é uma forma de violência psicológica.
Porém, isso não retira a gravidade do assédio moral e dos danos causados às pessoas, que
devem procurar ajuda para cessar o problema.

3.1.2. Considerações sobre a vítima

As vítimas de assédio moral não são necessariamente pessoas frágeis ou que apresentam
qualquer transtorno. Muitas vezes elas têm características percebidas pelo agressor como
ameaçadoras ao seu poder. Por exemplo, podem ser pessoas que reagem ao autoritarismo do
agressor ou que se recusam a submeter-se a ele. Além desses casos, as vítimas são
frequentemente identificadas em grupos que já sofrem discriminação social, tais como
mulheres, homossexuais, pessoas com deficiências, idosos, minorias étnicas, entre outros.

Existe diferença entre assédio moral interpessoal e assédio moral organizacional?

29
Sim. No assédio moral interpessoal, a finalidade está em prejudicar ou eliminar o trabalhador
na relação com o(s) outro(s), enquanto no assédio moral organizacional o propósito é atingir
o trabalhador por meio de estratégias organizacionais de constrangimento com o objetivo de
melhorar a produtividade e reforçar o controle.

Em alguns casos, o assédio moral organizacional ocorre com o objectivo de forçar o


trabalhador indesejável a pedir demissão, o que evita custos à organização (como não pagar
multas rescisórias). Esse tipo de assédio se dá por meio de práticas abusivas, tais como
cobranças exageradas e persistentes ou o estabelecimento de metas abusivas e crescentes por
parte de gestores ou representantes da organização, com o intuito de alcançar objectivos
organizacionais, por exemplo.

3.1.3. Tipos de Assédio Moral

Há duas modalidades de assédio moral: individual (contra uma pessoa), e colectivo (contra
um grupo de pessoas). No caso do assédio moral individual ele é chamado de vertical quando
praticado pelo chefe, diretor, gerente, encarregado, pelo dono da empresa ou seus familiares
contra um empregado (subordinado).

Quando praticado entre colegas de trabalho, trata-se de assédio moral horizontal. “Neste caso,
o assediador pode ser um ou vários empregados e, entre eles, ocorre geralmente disputa por
espaço por cargo ou uma promoção, corriqueiramente do mesmo nível hierárquico”, explica
Inácio. Há ainda, de acordo com o especialista, o assédio moral ascendente. “É mais raro,
pois é praticado por um ou por um grupo de empregados contra o superior hierárquico”, diz.

3.2. ASSÉDIO SEXUAL

“O assédio sexual consiste na abordagem repetida de uma pessoa a outra, com o objectivo de
obter favores sexuais, por imposição de vontade”, diz Inácio. O especialista explica alguns
aspectos que diferenciam o assédio sexual no trabalho do assédio moral. “Em relação ao
assédio moral, o assédio sexual se destaca pelos seguintes requisitos: presença do assediado
(vítima) e do assediador (agente); conduta sexual; rejeição da vítima e repetição da conduta
pelo assediador”, diz.

Para ser definido assédio sexual, diz Inácio, é necessário que haja relação de emprego ou de

30
hierarquia entre o assediador e a vítima. Se o acto praticado for grave, não há a necessidade
de provar-se a repetição da conduta.

3.2.1. Quando um olhar ou uma paquera no ambiente de trabalho se transformam em


assédio sexual? 

Apenas quando favores de ordem sexual são impostos como condição clara para dar ou
manter o emprego, ou usados para influir nas promoções na carreira ou para prejudicar o
rendimento profissional, humilhar, insultar ou intimidar a vítima. Para a Organização
Internacional do Trabalho – (OIT) o assédio sexual é definido como actos de insinuações,
contactos físicos forçados, convites impertinentes, mediante ameaça de demissão ou em troca
de uma vantagem, promoção ou contratação. “Ele pode ocorrer por intimidação ou por
chantagem”, explica Inácio.

3.2.2. Como é possível provar na Justiça o assédio sexual?

“Os requisitos são os mesmos que ocorrem para se provar assédio moral e geralmente
dependem de prova testemunhal”, diz Inácio. Você pode comprovar assédio sexual
apresentando depoimento de testemunhas, documentos, gravações, emails, por exemplo.

4. A ÉTICA E O PROFISSIONAL DO DIREITO

A ÉTICA E A PROFISSÃO FORENSE – DEONTOLOGIA JURÍDICA

A ÉTICA NA PROFISSÃO JURÍDICA

Todas as profissões reclamam proceder ético. A disseminação de códigos deontológicos de


muitas categorias profissionais - médicos, engenheiros, dentistas, jornalistas, publicitários,
dentre outros - apenas evidencia a oportunidade e relevância do tema, por si permanente.

Na actividade profissional jurídica, porém, essa importância avulta. Pois o homem das leis
"examina o torto e o direito do cidadão no mundo social em que opera; é, a um tempo,

31
homem de estudo e homem público, persuasivo e psicólogo, orador e escritor. A sua aCção
defensiva e a sua conduta incidem profundamente sobre o contexto social em que atua.1
Mercê da intensa intimidade entre ética e direito, não é fácil delimitar a fronteira entre o
moral e o jurídico. É nas ciências jurídicas que as normas dos deveres morais se põem com
toda a nitidez. Por isso é pertinente a elaboração de um código de regras a que se
convencionou chamar Deontologia Forense.

A expressão pode aparecer também designada como Deontologia Jurídica ou Deontologia


das Profissões Jurídicas. Como tal, "A deontologia jurídica há de compreender e
sistematizar, inspirada em uma ética profissional, o “status” dos distintos profissionais e
seus deveres específicos que dimanam das disposições legais e das regulações
deontológicas, aplicadas à luz dos critérios e valores previamente decantados pela ética
profissional. Por isso, há que distinguir os princípios deontológicos de carácter universal
(probidade, desinteresse, decoro) e os que resultam vinculados a cada profissão jurídica em
particular: a independência e imparcialidade do juiz, a liberdade no exercício profissional
da advocacia, a promoção da justiça e a legalidade cujo desenvolvimento corresponde ao
Ministério Público etc. "2

A DEONTOLOGIA FORENSE

Deontologia é a teoria dos deveres, como já vimos acima. Deontologia profissional se chama
o complexo de princípios e regras que disciplinam particulares comportamentos do integrante
de uma determinada profissão. Deontologia Forense designa o conjunto das normas éticas e
comportamentais a serem observadas pelo profissional jurídico: advogados, magistrados
(judiciais e procuradores), procuradores, conservadores e notários superiores.

As normas deontológicas não se confundem com as regras de costume, de educação e de


estilo. Estas são de cumprimento espontâneo. R. Danovi oferece um elenco de preceitos que
não são deontológicos, mas se inserem naqueles concernentes à boa educação. Assim as

1
CARLO LEGA, Deontologia Forense, Milano, 1975, p. 17, apud PASQUALE GIANNITI, Principi ... , cit.,
idem, p. 4.
2
MANUEL SANTAELLA LÓPEZ, Ética de las profesiones jurídicas Textos y materiales para el debate
deontológico, Servicio de Publicaciones Facultad de Derecho Universidad Complutense Madrid, Madrid:
Universidad Pontificia Comillas - Facultad de Derecho, 1995, "La Deontologia, entre la Moral y el Derecho", p.
20-25.

32
relações entre colegas: o respeito e a deferência dos mais jovens quanto aos mais antigos, a
ajuda e a assistência prestada ao colega enfermo, a participação nos funerais de um advogado
falecido, a pontualidade nas reuniões com os colegas, a hospitalidade ao colega em visita
profissional ao escritório, a entrega de documentos ao colega sem exigir recibo, o telefonema
ao colega em caso de sua ausência a uma audiência. Todas estas regras são desprovidas de
conteúdo preceptivo. Caracterizam o profissional educado, polido. Mas faltar em relação a
qualquer delas não constitui, segundo a maior parte da doutrina, verdadeira infração ética.3

A esfera da conduta ética não é, contudo, delineada de maneira precisa. Muitas posturas há
que podem restar na fronteira entre a conduta ética e a conduta não-ética. Manzini preferia
afirmar que, "para conduzir-se dignamente, o defensor não tem senão que seguir a própria
consciência, os conselhos dos colegas mais respeitados e as regras da educação moral. O
bom senso, a prudência, a discreção, a retidão, a civilidade são coisas que não se podem
ensinar com um elenco de preceitos ou com a casuística". 4 Em tempos de consciência em
letargia, ou de freios atenuados pela impossibilidade de qualquer proibição, talvez a dicção
esteja a merecer complemento. Parece mais prudente assegurar a viabilidade de uma
transmissão contínua de preceitos que aprimorem a educação moral de cada presente ou
futuro integrante de uma carreira jurídica. Essa transmissão se faz não só mediante o estudo
da patologia, extraída dos julgamentos dos tribunais éticos, institucionalizados ou não, mas
também através da recordação permanente dos valores sobre os quais se erigiu a profissão
jurídica.

PRINCÍPIO FUNDAMENTAL DA DEONTOLOGIA JURÍDICA

À deontologia profissional e, particularmente, à deontologia forense, entendamos aqui,


deontologia jurídica, aplica-se um princípio fundamental: agir segundo ciência e
consciência. Essa idéia força a inspirar todo o comportamento profissional.

Ciência, significa o conhecimento técnico adequado, exigível a todo profissional. O


primeiro dever ético do profissional é dominar as regras para um desempenho eficiente na
actividade que exerce. Para isso, precisará ter sido um aprendiz aplicado, seja no processo
educacional formal, seja mediante inserção direta no mercado de trabalho, onde a experiência
é forma de aprendizado.
3
R. DANOVI, Curso de ordenamento forense e deontologia, Milano, 1989, p. 226, apud PASQUALE
GIANNITI, Principi ... , cit., p. 14.
4
VINCENZO MANZINI, Trattato di diritto processuale penale, Torino : Utet, 1968, v. lI, p. 533.

33
Além da formação adequada, o profissional deverá manter um processo próprio de educação
continuada. Os avanços e as novas descobertas influem decisivamente em seu trabalho.
Profissões tradicionais deixam de existir e outras surgem para substituí-las. O ser humano
precisa estar preparado para novas exigências do mercado. Estar intelectualmente inativo não
representa apenas paralisação. É retrocesso que distancia o profissional das conquistas em seu
ramo de actuação.

Mas além da ciência, ele deverá actuar com consciência. Existe uma função social a ser
desenvolvida em sua profissão. Ele não pode estar dela descomprometido, mas reclama-se-
Ihe empenho em sua concretização.

À consciência se reconhece um primado na vida humana. Sobre isso, afirmou Paulo VI:
"Ouve-se frequentemente repetir, como aforismo indiscutível, que toda a moralidade do
homem deve consistir no seguir a própria consciência. Pois bem, ter por guia a própria
consciência não só é coisa boa, mas coisa obrigatória. Quem age contra a consciência está
fora da reta via".5

Com isso não se resolvem todos os problemas morais. Há limites postos ao princípio da
consciência. Ela não é o último ou o absoluto critério. Uma consciência enferma ou mal
orientada poderia conduzir o ser humano a errar ou a se equivocar. "A consciência é
intérprete de uma norma interior e superior; não é a fonte do bem e do mal: é a advertência,
é a escuta de uma voz. é o reclamo à conformidade que uma acção deve ter com uma
exigência intrínseca do homem".6 E a consciência não tem o dom da infalibilidade. O homem
é falível. A criatura tem uma fissura intrínseca chamada pelo filósofo Emmanuel Kant de mal
radical. Ser finito, condicionado a debilidades, o homem pode ter uma consciência
vulnerável e não inclinada naturalmente ao bem. Portanto, e por isso, a consciência deve ser
objecto de contínuo aperfeiçoamento. Mediante exercício permanente, ela se manterá
orientada. A tendência natural será a sua lassidão, o seu afrouxamento e a auto-indulgência
própria ao egocentrismo humano.

Os estudiosos de ética natural se utilizam da expressão consciência "para significar não já o


juízo sobre a moralidade das acções singulares que competem ao sujeito, mas, acima disso,
o modo habitual de julgar em uma certa matéria no campo ético: fala-se então de

5
PAULO VI, alocução de 12.11.1969, apud PASQUALE GIANNm, op. cit., p. 94-95.
6
PAULO VI, alocução cit., idem, ibidem.

34
consciência reta (aquela que sói judicar exatamente), de consciência [assa (aquela que sói
julgar lícito e bom também aquilo que é ilícito e mau) e de consciência escrupulosa (aquela
que sói julgar ilícito e mau até aquilo que é lícito e bom)" 7 A consciência é o resultado do
trabalho individual, na reiteração dos actos singulares de juízo, como se cada julgamento fora
ponto palpável na edificação de um produto consistente.

Ninguém poderá se substituir a outrem na missão de construir sua consciência. "É este o
primeiro dever que o homem tem em relação a si mesmo: formar uma consciência, ou seja,
instruir, educar a própria ciência moral, o próprio juízo moral, o próprio hábito de
moralmente julgar. "A consciência - afirma Paulo VI - tem necessidade de ser instruída: a
pedagogia da consciência é necessária." Se, de facto, a consciência não é umafulguração
mística, um estro genial, um 'a priori' gnoseológico, um carisma sobrenatural, mas é razão e
vontade que se apropriam da norma e sobre ela avaliam, com segurança, qualquer ato, bem
se vê como a educação da consciência importa toda uma disciplina da razão e da vontade.
Importa ciência e prudência. Importa retidão de conhecer e do querer. Se, pois, se trata de
consciência cristã, importa, por outro lado, a luz da fé e a força da graça. "8

Formar a consciência é o objectivo mais importante de todo o processo educativo. Ela é que
avalia o acerto das acções, ela é que permite reformular o pensamento e as opções. Somente
ela permitirá coerência ao homem, propiciando-lhe comportar-se de acordo com a própria
consciência. Por isso é que a formação da consciência, além de ser o objectivo mais
importante, resume em si todo o inteiro processo educativo.9

OS PRINCÍPIOS GERAIS DA DEONTOLOGIA FORENSE

Além do princípio fundamental - agir segundo ciência e consciência - há princípios gerais


relativos a deontologia forense. Dentre eles, podem ser mencionados:

a) O princípio da conduta ilibada

7
PASQUALE GIANNITI, Principi ... , cit., p. 95.
8
PASQUALE GIANNm, Principi ......, cit., idem, p. 95-96.
9
PASQUALE GIANNITI, Principi ..., cit., idem, p. 96.

35
O aspecto moral impregna qualquer das carreiras jurídicas. A conduta ilibada é o
comportamento sem mácula, aquele sobre o qual nada se possa moralmente levantar. 10 O
advogado deve observar o seu Código de Ética, de onde se extrai a necessidade de uma
conduta límpida. Em relação ao juiz, a Lei Orgânica da Magistratura reclama conduta
irrepreensível11 na vida pública e na vida particular.

O conceito de conduta ilibada é impreciso. Em tempos idos, pessoa divorciada - sobretudo


se mulher - se via barrada no acesso a muitas carreiras jurídicas. A situação hoje é diversa. A
separação e os posteriores casamentos ou formação de convivências estáveis parecem não
mais concernir com a moral.

A despeito da imprecisão, a expressão possui carga semântica específica. Não se trata de


mera boa conduta. Ao qualificá-la de ilibada, o sistema está a reclamar do profissional do
Direito algo superlativo em relação às demais profissões.

Existe uma tendência a desconsiderar os problemas da vida particular do profissional, quando


estes não reflitam no exercício de sua actividade. Embora a privacidade seja valor protegido
pela ordem jurídica, nem sempre as fronteiras entre vida profissional e vida íntima são
perfeitamente delineadas. À medida que pessoas se dedicam ao exercício de actividades
diferenciadas, também despertam atenção maior de parte da comunidade. Ela costuma nutrir
uma expectativa de comportamento vinculada à profissão exercida. É quase que uma carga
mítica a envolver determinadas funções. Assim, espera-se de todo sacerdote que seja santo,
de todo médico que seja milagroso, de todo advogado que seja hábil para vencer causas
impossíveis e de todo juiz revista o dom da infalibilidade.

Podem coexistir situações de contraste a depender da região, das dimensões da comunidade -


os costumes da metrópole parecem atenuados diante do conservadorismo da micro
comunidade, ressalvada a influência televisiva - e de certos valores sustentados em
verdadeiros guetos religiosos. Mas há um núcleo comum a caracterizar a conduta ilibada
dos profissionais do direito. Pelo mero facto de se dedicarem ao cultivo do direito, acredita-
se actuem retamente. Deseja-se que os integrantes de uma função forense venham a se
caracterizar pela incorruptibilidade, sejam merecedores de confiança, possam desempenhar

10
O artigo 2.° da Lei Complementar Federal brasileira 35, de 14.03.1979, a Lei Orgânica da Magistratura,
menciona a conduta ilibada como um dos requisitos para o brasileiro ser Ministro do Supremo Tribunal Federal.
11
Lei Complementar Federal 35, de 14.03.1979, artigo 35, inciso VIII Sobre o tema, examinar JOSÉ RENATO
NALINI, Curso de deontologia da magistratura, São Paulo: Saraiva, 1992.

36
com dignidade o seu papel de detentores da honra, da liberdade, dos bens e demais valores
tutelados pelo ordenamento.

b) O princípio da dignidade e do decoro profissional

Decoro - Comportamento decente; decência. Respeito às normas morais; dignidade. Forma


correta de se portar; compostura. Maneira de agir ou de falar que denota pudor; moralidade
ou resguardo. Todas as profissões são dignas. As actividades exercidas com o objectivo de
viabilizar a coexistência das pessoas revestem igual distinção e merecem idêntico respeito.
Este, portanto, é um dos princípios gerais que pode estar presente em qualquer desempenho
humano.

Nas profissões do foro, todavia, o dúplice dever concentra toda a normativa dos deveres.
Reclama-se dignidade e decoro também na vida privada, para que um comportamento
indigno e indecoroso não venha a respingar a beca e a toga. É o que sublinha Santaella
López: "A dignidade é também um princípio deontológico de carácter geral. A dignidade
constitui um valor inerente à pessoa humana, que deve ser protegido e respeitado. A
projecção desse valor no exercício profissional é o que proporciona o decoro à corporação
ou colégio profissional. Destaforma, a dignidade no desempenho da profissão por parte de
um de seus membros afeta, tanto em suas manifestações positivas como nas negativas, o
decoro dos demais. Este princípio deontológico se baseia, em determinadas profissões
especialmene, no âmbito estrito da prestação dos serviços profissionais e pode referir-se à
própria vida pessoal, familiar e social do profissional em questão12".

Ambos os conceitos são mais intuídos do que descritos. Está-se novamente na esfera de uma
indeterminação ou vagueza decorrente da plasticidade conceitual. Quase sempre se chega a
eles diante de episódios concretos de condutas que os malferiram.

É truísmo afirmar que fere a dignidade profissional a prática de crimes como o estelionato 13,

12
MANUEL SANTAELLA LÓPEZ, Ética de las profesiones jurídicas Textos y materiales para el debate
deontológico, Servicio de Publicaciones Facultad de Derecho Universidad Complutense Madrid, Madrid:
Universidad Pontificia Comi lias - Facultad de Derecho, 1995, "La Deontologia, entre la Moral y el Derecho", p.
20-25.
13
Estelionato é uma palavra oriunda do termo em latim stellionatu, que significa uma prática criminosa, que
ocorre quando alguém vende, hipoteca ou cede alguma coisa para mais de uma pessoa, enganando as duas.

37
a falsidade, a receptação14 e outros, para mencionar aquelas ameaças mais comuns à
categoria. O decoro resta vulnerado quando o profissional se apresenta mal vestido, de
maneira a não honrar o prestígio da profissão abstratamente considerada.

O princípio do decoro e da dignidade profissional é ainda suscetível de ser lesado quando se


pleiteia remuneração excessiva. Ou quando se actua maliciosa e insinceramente, com abuso e
falta de escorreição, quando o facto já não constitua crime.

É também indecorosa a publicidade exagerada, a captação de clientela, em carreiras que se


baseiam na confiança e não em relações de comércio. Pois "o advogado deve imprimir à sua
actividade a discrição e reserva, as quais contrastam com uma publicidade do tipo
comercial".15 A questão da publicidade dos serviços de advocacia é tormentosa. A divulgação
de textos científicos, artigos doutrinários e mesmo noticiário objectivo, sério e decoroso, não
pode ser considerada publicidade se conduzir o leitor a vincular o autor a determinado
escritório.

A necessidade de especialização faz com que a parte necessite de outros esclarecimentos a


respeito do profissional, insuficiente a velha placa à porta do escritório. Modernas técnicas de
divulgação podem ser usadas sem malferir preceitos éticos. Assim as promoções culturais
patrocinadas por empresas de advogados, dando-se a conhecer à comunidade científica de
maneira institucional e não agressiva. As observações em relação à publicidade valem
também para as Faculdades de Direito, para as editoras especializadas em publicações
jurídicas e para empresas vinculadas à área.16

A questão de publicidade concerne mais a advogados, mas não pode deixar de interessar a
outras carreiras, quando seu integrante seja extremamente vulnerável à vaidade de se ver
continuamente estampado nos jornais de classe, que passam a ser órgãos de divulgação
pessoal e não da categoria.

É também lesivo ao decoro o uso de expressões chulas, inconvenientes e vulgares.


Inadmissíveis em sentenças, despachos ou pareceres, também não podem constar de
quaisquer das peças insertas em processo. O ordenado e correto exercício da profissão
14
Acto de receptar, de encobrir ou esconder objetos furtados: a receptação de furtos constitui cumplicidade.
15
E. RICCIARDI, "Pubblicità, specializzazione ed attività c.c. dominanti nell'esercizio della professione
forense", Foro It. 1991, V.c.543-ss, apud PASQUALE GIANNITI, Principi ... , cit., idem, p. 107.
16
Eticamente questionável a distribuição de preservativos por uma editora jurídica, ao divulgar seus códigos
junto ao alunado de algumas das Faculdades de Direito em São Paulo.

38
forense não se coaduna com excessos, repudia a arrogância e a presunção, reclama
moderação aos ímpetos da defesa e aos impulsos do carácter.17

c) O princípio da incompatibilidade

A carreira jurídica é daquelas raramente acumuláveis com outras, excepção feita ao


magistério. A dignidade da missão forense inadmite seja ela exercida como plus a qualquer
outra. Exige, em regra, dedicação exclusiva de seu titular.

É racional estabelecer-se a incompatibilidade do exercício forense com outro qualquer. A


segunda actividade provocaria interferência na esfera profissional jurídica, propiciaria
captação de clientela, geraria confusão nas finalidades de actuações diversas ou estabeleceria
vínculos de subordinação vulneradores do princípio da independência. Até actividades não
profissionais podem incidir negativamente sobre a liberdade de determinação do profissional
do direito, sacrificando as exigências de autonomia e prestígio da classe. Assim, por exemplo,
algumas legislações enxergam incompatibilidade entre o exercício da advocacia e o
ministério sacerdotal de toda confissão religiosa. Essa proibição "é voltada a impedir a
confusão entre sacro e profano, a evitar a possibilidade de confundir, não a finalidade ética,
as notícias secretas apreendidas em uma e em outra função; a excluir que os particulares
poderes próprios do ministro, acumulando jurisdição e cura de almas, possam incidir
negativamente sobre a liberdade de determinação do profissional, pondo-se em contraste
com as exigências de autonomia, de prestígio e de eficiência da classe forense "18

Seria desabonador para a função jurídica ver-se como actividade secundária de profissional
cuja subsistência é auferida no exercício de outro mister. A lição evangélica é sensata:
ninguém serve a dois senhores. Aquele que não conseguir sobreviver mercê de sua
actividade estritamente jurídica, deverá dedicar-se a atribuição diversa. As funções que
concernem ao Direito são absorventes e pressupõem dedicação plena, excluídas todas aquelas
próprias a outras profissões.

17
PASQUALE GIANNITI, Principi... cit., idem, p. 114. O autor remete a R. DANOVI, Corso, p. 242-243, que
elencou interessantes expressões tiradas de processos italianos. Os jornais brasileiros, quando em vez publicam,
à guisa de folclore ou anedotário, utilização vernacular exótica. Essa divulgação em nada contribui para
evidenciar a seriedade da Justiça e para incrementar sua credibilidade perante o universo dos destinatários.
18
PASQUALE GIANNITI, Principi..., cito p. 120.

39
d) O princípio da correção profissional

Todas as profissões jurídicas observam um complexo de comportamentos deontológicos


próprios. A actuação forense não pode se desvincular de certo ritual, inspirado na origem da
realização do justo. Esse ritualismo se exterioriza no processo, instrumento de administração
da justiça, e se reflete na conduta dos profissionais do foro.

A correcção se caracteriza de muitas formas, nem todas elas de igual intensidade


deontológica. O profissional correcto é aquele que actua com transparência, no
relacionamento com todos os protagonistas da cena jurídica ou da prestação jurisdicional.
Age no interesse do trabalho e da Justiça, não se descuidando do interesse imediato das
pessoas às quais serve. Não se beneficia com a sua função ou cargo. Não se vangloria.
Condói-se da situação daquele que necessita de seus préstimos ou recorre ao insubstituível
direito de exigir justiça.

É um comportamento sério, sem sisudez; discreto, sem ser anônimo; reservado, sem ser
inacessível; cortês e urbano, honesto, inadmitindo-se para isto qualquer outra alternativa.
Pautar-se-á por uma orientação moral acima de qualquer suspeita, principalmente em relação
aos jejunos nas ciências jurídicas, mais vulneráveis à incorreção dos profissionais do Direito.

e) O princípio do coleguismo

O núcleo comum a todos os integrantes das carreiras e exercentes das funções jurídicas é
haverem igualmente passado pelos bancos de uma Faculdade de Direito. A identidade de
origem não poderia deixar de gerar verdadeira comunidade, todos imbuídos da consciência
comum de se irmanarem no desempenho de uma e única missão: realizar a justiça.

Tal sentimento já se encontrava nos antigos grupamentos e se tomou muito explícito no


funcionamento das Corporações de Ofício medievais. Lá, como hoje, "os membros do grupo
estão ligados entre si por um vínculo orgânico que lhes estimula e lhes obriga a ter
determinados comportamentos homogêneos com o objectivo de salva-guardar o bem comum
sectorial. Segundo a tradição, tais comportamentos se caracterizam pelos conceitos de
fidelidade, lealdade, camaradagem, confiança recíproca e solidariedade, que podem

40
considerar-se confluentes no conceito genérico de coleguismo".19

Não se entenda coleguismo como um companheirismo superficial, próprio àqueles que, na


contingência de partilha de um espaço social comum, obrigam-se a um relacionamento
amistoso, que pode chegar à pândega. O coleguismo, sob enfoque deontológico, é mais
consistente. É um sentimento derivado da consciência de pertença ao mesmo grupo, a
inspirar certa homogeneidade comportamental, encarada como verdadeiro dever. "Este
sentido de dever, enquanto pertence ao grupo, se denomina de várias formas (Kamaraderie,
confraternité, colegialidad), se bem que com diversos matizes de significado e se traduz de
várias maneiras em comportamentos recíprocos de fidelidade, de lealdade, de solidariedade,
de confiança, de respeito, de cortesia, de estima e de ajuda mútua".20

Difere o coleguismo da solidariedade. Esta se manifesta em geral fora do processo e se


fundamenta sobre a consideração da dignidade humana do colega. É solidário o colega que
defende o outro quando injustamente atacado em sua honra, ou que auxilia o colega enfermo.
Já o coleguismo guarda vinculação extrema com o exercício profissional. Seus exemplos:
substituir em audiência colega adoecido ou impedido, fornecer a outrem livros e revistas
jurídicos, partilhar o conhecimento de novas teses doutrinárias ou nova jurisprudência, dar
orientação de carácter técnico para a solução de um complexo problema jurídico.

O coleguismo se traduz também no tratamento respeitoso dos profissionais mais jovens


quanto aos mais experientes. Estes não podem olvidar sua condição de guia para os neófitos.
Falta de coleguismo é disputar cargos ou clientes, concorrer de maneira pouco leal, estimular
ou calar-se diante da maledicência, comentar erro do colega. Falso coleguismo é acobertar
erro do colega, mesmo que dele advenha prejuízo a terceiro ou ao bom nome da Justiça.

f) O princípio da diligência

O profissional do direito em regra é accionado quando alguém se vê atormentado por


vulneração injusta a algum direito. Somente agora delineia-se com nitidez maior a
compreensão de que o direito deve estar sempre na cogitação das pessoas, actuando
preventivamente e não apenas restaurar situações fenomenicamente irrestauráveis.
19
CARLO LEGA, Deontologia de la profesión de abogado, 2: ed.,. Madrid: Civitas, 1983. p.168-169.
20
CARLO LEGA, Deontologia ... , cit., idem, p. 169.

41
Por actuar num o ambiente social, o profissional do direito deve ser diligente. Deve ser
pronto e ter presteza ao cuidar do interesse alheio vulnerado. Aliás, o dever de diligência está
na base de toda relação humana.21 O profissional não pode ser indolente, insensível, desidioso
e acomodado ao exercer a função que escolheu como opção de vida.

O conceito de diligência compreende aspectos eminentemente pessoais, "quais o zelo e o


escrúpulo, a assiduidade e a precisão, a atenção e a solércia etc. - que afloram de vez em
vez, seja na execução técnica das prestações, seja em todos aqueles comportamentos de
contorno que são do domínio da deontologia" 22 Esse dever impede que se falte a
compromisso assumido ou ao trabalho, se atrase para reuniões ou actos do ofício, se deixe de
telefonar em seguida quando procurado por alguém. Mas vai muito além. Impõe ao
profissional do direito o dever de completar a sua formação, inserindo-se num processo de
educação continuada. A sociedade contemporânea reclama constante atualização, pena de o
profissional não poder se exprimir em nível técnico adequado.

É negligente quem não se empenha no auto-aprimoramento, acompanhando a edição


legislativa, a produção doutrinária e a construção pretoriana. 23 O dever de diligência clama
por tratamento igual a casos menores e outros considerados mais relevantes, a mesma atenção
a partes humildes e poderosas. E todos os operadores jurídicos têm um especial compromisso
derivado do princípio da diligência: pecado inescusável da Justiça brasileira é a lentidão. Ela
não será vencida sem particular empenho de parte de todos os responsáveis: juízes,
promotores, advogados e servidores da justiça. Uma diligência potencializada se reclama dos
responsáveis por milhões de processos cuja tramitação em ritmo inadmissível para a
modernidade faz com que se desacredite da Justiça.

g) O princípio do desinteresse

Por princípio do desinteresse é conhecido o altruísmo de quem relega a ambição pessoal ou a


aspiração legítima, para buscar o interesse da Justiça. Esse é um princípio inspirador dos

21
R. DANOVI, Codice, p. 72-73, CARLO LEGA, Deontologia ... , cit., p. 172, ambos citados por PASQUALE
GIANNITI, Principi ... , cit., idem, p. 140.
22
S. RODOTÀ, "Diligenza", Diritto Civile, Enciclopedia deI Diritto, Milano, 1964, t. XII, p. 544, apud
PASQUALE GIANNITI, Principi. .. , cit., idem, p. 141.
23
G. GORLA, "Dovere professionale di conoscere la giurisprudenza e mezzi d'informazione", Temi rom., 1967,
p. 338, apud PASQUALE GIANNITI, Principi ... , cit., idem, p. 141.

42
chamados a integrar as carreiras jurídicas - Magistratura, Ministério Público, Procuradorias,
Defensoria Pública, Polícia e mesmo o Magistério Jurídico. Sabe-se da insuficiência da
remuneração, diante da relevância das funções exercidas. Mesmo assim, continua a juventude
a disputar cargos nos concursos, consciente das dificuldades a serem enfrentadas, das
restrições impostas e da renúncia a atingir tranquila situação económica.

O princípio do desinteresse inspira ainda um dos critérios informadores da profissão do


advogado. O dever do advogado é tentar sempre a conciliação, antes de propor a lide,
previamente ao início da instrução e a qualquer tempo, sem se preocupar com eventual
redução de seus honorários que disso decorra. O profissional do direito há de conscientizar-se
de que "toda lide, mesmo conduzida com a máxima ausência de paixão, constitui sempre um
mal para as partes litigantes (para as quais a matéria da contenda constitui um trauma
psíquico) e para a inteira coletividade (enquanto incrementa o fenômeno da litigiosidade,
contribui a reduzir os valores éticos e constitui inútil dispêndio de despesa)".24

Pode parecer utopia pregar o desinteresse numa era denominada neo-liberal, eufemismo para
o desenfrear do capitalismo, calcado sobre a idéia de lucro e, portanto, de interesse. Cumpre,
todavia, conservar o mínimo ético garantidor das conquistas civilizatórias da Humanidade.
Dentre elas, a concepção de que, na repartição de funções pelos membros da comunidade,
misteres há muito aproximados a um sacerdócio. Retirar à carreira jurídica o seu status de
missão, transcendente e indispensável à harmonia, será reduzi-la a actuação inexpressiva,
facilmente substituível por alternativas menos dispendiosas e complexas de solucionar os
conflitos humanos.

h) O princípio da confiança

O operador jurídico ainda exerce uma artesania do direito. Prevalece o carácter


essencialmente individual de qualquer das actuações no campo do direito, onde o
profissional é escolhido mercê de atributos personalíssimos e não intercambiáveis. Essa
realidade é muito mais próxima à advocacia do que às carreiras jurídicas públicas. O cliente
constitui seu advogado o profissional que lhe merece confiança. Será o detentor de seus
segredos, terá acesso a informações íntimas, terá em suas mãos a chave da resolução dos
problemas que o atormentam.

24
PASQUALE GIANNITI, Principi..., cit., p. 146.

43
Existe, assim, um carácter fiduciário na relação advogado/cliente. O advogado tem ainda o
dever da fidelidade em relação ao cliente, pois foi por este escolhido em razão de
particularíssima confiança em seus méritos, capacidade e pessoa.

Já os juízes, promotores e demais integrantes de carreiras jurídicas públicas são impostos às


partes. Estas não podem escolhê-los. Haveria ainda lugar para o princípio da confiança?

A resposta é positiva. A confiança, aqui, não recai sobre a pessoa individual do juiz, senão
sobre a pessoa colectiva da Magistratura. Os juízes devem ser considerados pelas partes
pessoas confiáveis, merecedoras de respeito e crédito, pois integram um estamento
diferenciado na estrutura estatal. Espera-se, de cada juiz, que seja fiel à normativa de regência
de sua conduta, sobretudo em relação aos preceitos éticos subordinantes de seu
comportamento.

Por isso é que as falhas cometidas pelos juízes despertam interesse peculiar e são divulgadas
com certa ênfase pela mídia. Tais infracções não atingem exclusivamente o infractor.
Contaminam toda a Magistratura e a veiculação do acto isolado se faz como se ele fora
conduta rotineira de todos os integrantes da carreira.

i) O princípio da fidelidade

Correlato ao princípio da confiança, o princípio da fidelidade é outro dos atributos cobráveis


aos detentores de função jurídica. Fidelidade à causa da justiça, exigível a todo e qualquer
profissional do direito. Fidelidade à verdade e à transparência. Fidelidade aos valores
abrigados pela Constituição, que tanto prestígio e relevo conferiu ao direito, convertendo a
advocacia em função indispensável à administração da Justiça:, ao lado do Judiciário, do
Ministério Público e de outras instituições.

O operador jurídico responsável pelo patrocínio de causas junto à Justiça deve igualmente
lealdade a seu constituinte e aos demais operadores, notadamente o juiz e o promotor. Nas
relações com o cliente, deverá também portar-se com lealdade. Assim não fora e inexistiria o
patrocínio infiel, a faculdade de abster-se de prestar testemunho sobre o que lhe foi confiado
pelo cliente ou o que conheceu em virtude da profissão.

Esse é um capítulo de singular delicadeza. Já se afirmou que "o advogado não deve
desmascarar o acusado defendido por ele que mente ao juiz; que deve fixar suas conclusões

44
com base no que resulte do processo e não com base na confissão recebida de seu cliente;
que não deve revelar ao juiz a verdade, inclusive se seu cliente acusa falsamente a um
terceiro, do delito que ele estava acusado (cometendo, portanto, um delito de calúnia)" 25 Tais
posições pertinem exclusivamente ao advogado. O requisito da fidelidade, porém, como
atributo derivado da confiança que as pessoas devam nutrir em relação aos operadores do
direito, deve ser encontrado no patrimônio moral de qualquer de seus profissionais.

A fidelidade é um conceito que precisa ser repensado. Pois "a fidelidade não é um valor
entre outros: ela é aquilo por que, para que há valores e virtudes. Que seria a justiça sem a
fidelidade dos justos? A paz, sem a fidelidade dos pacíficos? A liberdade, sem a fidelidade
dos espíritos livres? E que valeria a própria verdade sem afidelidade dos verídicos? Ela não
seria menos verdadeira, decerto, mas seria uma verdade sem valor, da qual nenhuma virtude
poderia nascer. Não há sanidade sem esquecimento, talvez; mas não há virtude sem
fidelidade".26

Mas de qual fidelidade se fala? Está-se a pensar, por óbvio, na fidelidade ao bem. Pois a
fidelidade ao mal é má fidelidade. É infidelidade ao bem. Cumpre, então, sempre indagar: "A
fidelidade é ou não louvável? Conforme, ou seja, depende dos valores a que se é fiel. Fiel a
que ?(...) Ninguém dirá que o ressentimento é uma virtude, embora ele permaneça fiel a seu
ódio ou a suas cóleras; a boa memória da afronta é uma má fidelidade. Tratando-se de
fidelidade, o epíteto não é tudo? E há ainda a fidelidade às pequenas coisas, que é
mesquinha e tenaz memória das bagatelas, repisamento e teima (...) A virtude que queremos
não é, pois, toda fidelidade, mas apenas a boa fidelidade e a grande fidelidade". 27 A
fidelidade do operador jurídico é a fidelidade das boas causas, a fidelidade à justiça e a
fidelidade do direito.

j) O princípio da independência profissional

Por independência se concebe a ausência de quaisquer vínculos interferentes na ação do

25
E. SANGUINETI, Teoria e pratica da procuratore, Milano, 1974, p. 358, apud CARLO LEGA, Deontologia
... , cit., idem, p. 184-185. Carlo Lega abriga certas dúvidas sobre a licitude da última solução.
26
ANDRÉ COMTE-SPONVILLE, Pequeno tratado das grandes virtudes, São Paulo: Martins Fontes, 1996, p.
25-26.
27
V. JANKÉLÉVITCH, Traité des vertus. II: Les vertus et I' amour, Flammarion, 1986, t. I, capo 2, p. 140,
apud ANDRÉ COMTE-SPONVILLE, Pequeno tratado das grandes virtudes, cit., idem, p. 26-27.

45
profissional do direito, capazes de condicionar ou orientar sua atuação de forma diversa ao
interesse da Justiça. "Todo intento de violação da independência da profissão compromete
mesmo sua função social".28 A independência é atributo consagrado ao juiz, ao promotor, ao
advogado e aos demais operadores.

A independência não há de ser tal que fuja ao controle ético. Toda a atividade humana, ao
reivindicar sua própria e legítima autonomia, não pode deixar de reconhecer a harmonia e a
subordinação ao critério supremo, que é o critério ético. 29 A independência não exclui, mas
em lugar disso postula enfaticamente, estrita dependência à ordem moral.

Ruy de Azevedo Sodré, legendário cultor da ética dos advogados, já afirmou que a melhor
garantia da independência desses operadores é a observância aos preceitos éticos: "Os
cânones éticos, a que estamos vinculados e que balizam a nossa conduta, asseguram a nossa
reputação, propiciam a nossa liberdade moral, efetivam a nossa independência. À sua
sombra, abriga-se o advogado das tentações que o cercam, de que fala Couture e das que
exemplifica Angel Ossório".30 A subordinação à ética é a um tempo garantia e limite para a
independência profissional. Não se concebe uma independência direcionada a malferir o
ordenamento moral daqueles que exercem profissão forense, caracterizada pela prática
indistinção de muitas regras morais perante as regras técnico-jurídicas.

k) O princípio da reserva

O homem de bem é um homem discreto. Desprestigia-se - e à categoria - o profissional que


comenta com terceiros aquilo de que tomou conhecimento no exercício profissional. Fala-se
que o princípio da reserva é mais abrangente do que o princípio do segredo ou sigilo. Este
imporia silêncio quanto à controvérsia ou processo. Já o princípio da reserva se estende a
todas as demais circunstâncias nas quais parte ou terceiro venham a ser direta ou
indiretamente implicados. "De onde o princípio da reserva não se exaurir no só silêncio, mas

28
Artigo lO do Código Deontológico Forense de Ferrara, Palermo e Lombardia, citado por CARLO LEGA,
Deontologia ... , cit., idem, p. 77.
29
PASQUALE GIANNm, Principi..., cit., p. 157. Invoca o magistério de PIO XII e o do Concílio Vaticano lI,
sobretudo na Constituição Pastoral Gaudium et Spes, no sentido de que nenhuma atividade humana está liberada
à solicitude moral.
30
RUY DE AZEVEDO SODRÉ, "O advogado, seu estatuto e a ética profissional", 2." ed., São Paulo: RT,
1967, p. 138. A menção a Angel Ossório se completa com a reprodução de um texto extraído de Alma de la
toga:

46
exigir também comportamentos ativos a serem exercitados em toda circunstância da qual
emerge a exigência de salvaguardar a intimidade do interessado”31 O ideal é uma conduta
inspirada em uma absoluta reserva, uma circunspecção, prudência na conduta, discreção e
recato no trato das coisas profissionais.

O ser humano levado à Justiça ou a servir-se dela, partilha intimidades com os profissionais
em contato com sua causa. Estes são credenciados pelo Estado para a realização do bem
supremo da Justiça. Não se pode tolerar que, em lugar da solução para os problemas, ou ao
menos de um encaminhamento rumo a ela venham a afligir ainda mais o aflito, fazendo
chegar a outrem informações protegidas pela privacidade.

Embora reserva e segredo não se confundam, "entre a regulação jurídica do segredo


profissional e o princípio deontológico de reserva existem vínculos estreitos". 32 Prudencial a
conduta do operador jurídico no sentido de preservar os protagonistas do drama que se lhe
apresenta, evitando tratar de assuntos profissionais em lugares diversos do foro, mesmo em
sedes de associações de classe, onde se presume estejam os profissionais buscando o lazer ou
interesses associativistas, não a continuidade do trabalho. Também procurando coibir o
excesso de confiança e intimidade com partes e demais operadores.

Gianniti contempla como outras expressões do princípio da reserva:

1. O dever de tratar a prática profissional no foro e não em lugares públicos;

2. O dever de manter reserva sobre todos os documentos ou objetos do processo;

3. O dever de vigiar a fim de que funcionários, digitadores, assistentes ou escreventes,


mantenham reserva sobre tudo aquilo de que tomem conhecimento por motivo do trabalho;

4. Dever de reserva em relação ao endereço do cliente;

5. Dever de não externar opinião sobre processo a si confiado, mesmo em família.33

Para o autor, o fundamento lógico desse princípio satisfaz a exigência de garantir a todo
cidadão a liberdade de poder recorrer à Justiça com a plena confiança de que se manterá a
31
A. DE CUPIS, "Riservatezza e segreto" (diritto a), Nov. Dig. It., Torino, 1976, v. XVI, p. 121, apud
PASQUALE GIANNITI, Principi ... , cit., idem, p. 162.
32
CARLO LEGA, Deontologia ... , cit., idem, p. 148.
33
PASQUALE GIANNITI, Principi..., cit., idem, p. 162.

47
máxima discrição sobre o que lhe confiará ou que virá a ser de conhecimento de seus
operadores, durante o decorrer da demanda.

Ao lado do princípio da reserva, existe para alguns o princípio da informação, que o não
contradiz. O princípio da informação postula a amplitude de conhecimento de factos,
notícias e circunstâncias conducentes ao exercício da defesa. O profissional encarregado de
oferecer resistência aos pleitos formulados contra seu constituinte saberá selecionar, dentre
todas as informações por este fornecidas, aquelas essenciais ao desenvolvimento de seu
mister e outras cuja divulgação se mostra inviável. "Todas as torpezas, todas as traficâncias,
manejos de que os homens lançam mão para ofenderem-se reciprocamente, na honra e na
propriedade, vêm a ser liquidadas no foro e é ao advogado a quem a Sociedade deu a
incumbência de lavar esta roupa suja e apresentá-la limpa aos olhos do mundo". o avanço
tecnológico oferece faces insuspeitas para o princípio da reserva. Tanto no âmbito do
Judiciário, como das dependências vinculadas à administração da Justiça, como para os
próprios advogados, a possibilidade de armazenamento de dados é ilimitada. A divulgação de
dados que só interessam ao indivíduo é coibida, por força de preceito constitucional que
protege a privacidade. Todos os responsáveis têm o dever de adotar as precauções mais
rigorosas para o acesso à informação, de manter o interessado cientificado e de cancelar as
informações quando concluída a relação ou a operação para a qual sua coleta se mostrou
necessária.34

l) O princípio da lealdade e da verdade

Deflui do sistema jurídico o dever de atuar com lealdade, pois o direito civil brasileiro,
inspirado na fonte romano-germânica, premia a boa-fé e a correção. A lealdade é uma regra
costumeira, desprovida de sanção jurídica, mas eticamente sancionada pela reprovação
comunitária.

A lealdade precisa inspirar toda a atuação jurídica, notadamente a processual. O juiz deve se
portar com lealdade, corolário da imparcialidade, recusando-se a silenciar quando se lhe
reclama franqueza para advertir qualquer das partes sobre equívoco ou erronia. Não fora
dever processual de conduzir o processo para uma finalidade hígida e constituiria dever
deontológico o de enfrentar as preliminares e questões prejudiciais, não permitindo que lides

34
F. GRANDE STEVENS, "Nuovi contenuti della deontologia professionale", Rassegna degli Avvocati
Italiani, 1983/2, p. 10, apud PASQUALE GIANNITI, Principi ... , cit., idem, p. 163.

48
temerárias alcancem estágio avançado, com dispêndio de tempo e de recursos materiais para
todos.

O promotor deve se pautar com lealdade para com o juiz e para com o advogado, atuando
com transparência e não guardando trunfos para surpreender qualquer deles. O advogado,
além da lealdade para com o juiz e promotor, deve tê-la em relação ao colega e aos clientes.
Estes precisam ser advertidos do êxito ou temeridade da demanda, necessitam de
esclarecimentos precisos sobre a conciliação e suas conseqüências, sobre o andamento da
causa e sobre as estratégias adotadas pelo profissional para o bom desempenho de seu mister.

A lealdade se insere numa concepção de processo sob a ótica de uma estrutura cooperativa. O
processo, instrumento de consecução de um bem da vida chamado justiça, deve deixar de ser
encarado como pugna civilizada, ou como verdadeira luta entre contendentes irados e prontos
a qualquer crueza, para ser concebido como expressão da democracia. Todos os envolvidos
no processo querem o mesmo: a realização possível do justo humano. A parte, mesmo se vier
a sucumbir, deverá resignar-se, pois se realizou o direito e ela foi tratada com dignidade,
como deve ser o tratamento dispensado aos seres humanos. O réu, mesmo condenado, deverá
estar consciente de que se realizou justiça e de que não havia alternativa diversa ao juízo,
diante da contundência do elemento de prova amealhado contra ele.

A lealdade imporia a todos os operadores jurídicos o dever da verdade. A dificuldade


primeira é a conceituação da verdade. Para Santo Tomás, "a verdade tem contornos
cambiantes e cada um a reconhece, à sua maneira, através de estados íntimos, nem sempre
transferíveis e tampouco comunicáveis"35 Existe, para o operador jurídico, o dever absoluto
de dizer a verdade?

Calamandrei sustenta que a lealdade processual é apenas a lealdade reclamada para o jogo. A
emulação de habilidade é ilícita, assim como não é lícito atuar de qualquer maneira maliciosa.
Conclui,36 melancolicamente, que a vitória do mais astuto não é a do mais justo. Também
Calogero admite a mentira, quando com fins benéficos,37 enquanto Carlo Lega se posiciona
contrariamente. A mentira viola os princípios da ética forense e compromete a função social

35
RUY DE AZEVEDO SODRÉ, O advogado e seu estatuto e a ética profissional, cit., idem, p. 253.
36
PIERO CALAMANDREI, "11 processo come gioco", apud CARLO LEGA, Deontologia ... , cit., idem, p.
161.
37
CALOGERO, "Probità, lea1tà, veridicità nel processo", in Riv. Dir. Froc.

49
da profissão.38 Consoante Eduardo Couture, "existe, efetivamente, um dever de dizer a
verdade, com texto expresso ou sem texto expresso, com sanções especíjicas". 39 Pois, como
diz o notável uruguaio, o processo é a realização da Justiça e nenhuma justiça pode apoiar-se
na mentira. Civ., 1939, v. I, p. 136 e ss, citado por CARLO LEGA, Deontologia ... , cit.,
idem, p. 161, nota 13.

m) O princípio da discricionariedade

A profissão jurídica é exercida por alguém que obteve formação em grau universitário.
Parcela ainda mínima da população brasileira chega ao terceiro grau na escolarização
convencional. O bacharel em ciências jurídicas é, presumivelmente, alguém provido de
discernimento para exercer uma profissão liberal. Esta se pontua pela discricionariedade de
seu exercente, poder de atuar com liberdade na escolha de sua conveniência, oportunidade e
conteúdo.40

Mesmo subordinado à lei, o operador jurídico possui uma vasta área para selecionar o
momento, as estratégias e as formas de sua atuação. O juiz tem discricionariedade no mais
amplo espectro do exercício de sua missão. Para conceder ou não a medida liminar, para
julgar no estado ou permitir a instrução, para fixar os pontos controvertidos da causa, para
determinar, de ofício, a realização de mais provas. Para se convencer, em um sentido ou no
seu antípoda, quanto ao pleito que lhe foi formulado.

É um poder terrível, que encontra freios éticos muito nítidos. O juiz não é um escravo da lei,
operador insensível e despreocupado com as conseqüências de suas decisões. Precisa estar
convicto de que à autoridade que lhe foi conferida corresponde responsabilidade também
diferenciada. O exercício consciente da jurisdição acarreta deveres de ordem constitucional,
legal e disciplinar. Os mais angustiantes, porém, são os deveres da esfera ética. Nem sempre
a solução adotada, embora conforme com a lei, foi a mais satisfatória para os reclamos
morais de uma inteligência sensível.

O promotor de justiça tem uma discricionariedade até mais dilargada. Pode, em tese, arquivar
38
CARLO LEGA, Deontologia ... , cit., idem, p. 162.
39
RUY DE AZEVEDO SODRÉ, O advogado ... , cit., idem, p. 256.
40
HELY LOPES MEIRELLES, Direito administrativo brasileiro, 16." ed., 2.tiragem, São Paulo: RT, 1991, p.
97.

50
o inquérito ou denunciar. Insistir nas diligências. Iniciar procedimentos averiguatórios, de tão
angustiantes conseqüências para as pessoas. É-lhe conferido iniciar ações civis públicas,
defender as minorias e ocupar um espaço muito importante na mídia. A necessidade de
permanente vigilância ética mostra-se imprescindível para o Ministério Público. A Instituição
cresceu e sedimentou-se como braço essencial à administração da Justiça. Essa consolidação
institucional tem o contraponto de um desgaste acentuado, se não conviver com o zelo
intransigente da qualidade humana de seus integrantes. Pois é hoje a instituição jurídica
mais poderosa e, portanto, aquela que corre mais riscos de abusar de uma força a si atribuída
pelo pacto constituinte de 1988.

O advogado também tem discricionariedade para persuadir o cliente de iniciar uma lide ou de
imediatamente propô-la. É dele a discricionariedade típica de eleger a estratégia de combate
ou de defesa nos autos. Ele o encarregado de encontrar a alternativa jurídica mais eficaz para
determinado problema concreto. Atua com extrema liberdade e esse caráter converte a
profissão em campo minado de deslizes éticos.

Com alguma atenuação, o profissional encarregado da defesa do Estado também é munido de


poderes discricionários. E o delegado de polícia é, talvez, o exercente de função jurídica mais
aquinhoado pelo sistema dessa atuação quase completamente livre. Tanto que a polícia tem
sido, no mundo todo, a profissão em que a fronteira discricionariedade/arbitrariedade se
mostra mais tênue e movediça.

OUTROS PRINCÍPIOS ÉTICOS DAS CARREIRAS JURÍDICAS

A enunciação de princípios éticos gerais, aplicáveis às profissões forenses, é sempre algo de


discricionário. Poder-se-ia multiplicar a relação dos princípios, incluindo-se inúmeros outros,
alguns lembrados por autores que também se dedicaram ao estudo da ética.

Dentre eles, mencionem-se os princípios da informação, da solidariedade, da cidadania, da


residência, da localização, da efetividade e da continuidade da profissão forense, o
princípio da probidade profissional, que pode confundir-se com o princípio da correção,41 o
41
SANTAELLA LÓPEZ, op.cit., idem, ibidem, faz uma síntese preciosa sobre a probidade: "A probidade é
simples e claramente a honradez. Um profissional destinado ao serviço dos demais, há de ser, antes de tudo,
uma pessoa honesta. A probidade vem a constituir, dessa forma, um compêndio das principais virtudes morais.
Supõe uma consciência moral bem formada e informada dos princípios éticos e da normativa especificamente

51
princípio da liberdade profissional, da função social da profissão, a severidade para
consigo mesmo, a defesa das prerrogativas profissionais, o princípio da clareza, pureza e
persuasão na linguagem, o princípio da moderação e o da tolerância.

Todos eles se prestam ao serviço de atilar a postura prudencial dos operadores jurídicos,
favorecendo-os a um exame de consciência para constatar como pode ser aferido eticamente
o próprio comportamento. Na maior parte das vezes, esse profissional é o único árbitro de sua
conduta. Além de se tomar, com isso, mais escrupuloso, deve ter em mente que os cânones
dos códigos éticos, a recomendação da doutrina e a produção pretoriana dos respectivos
tribunais éticos não excluem deveres que resultam de sua consciência e do ideal de virtude,
inspiração maior do profissional do direito.

deontológica".
BITTAR, Eduardo C. B. Curso de Ética Jurídica: ética geral e profissional. 2ª. ed. São Paulo; Saraiva: 2004.

52
Mais subsídios de leitura sobre a Deontoloia jurídica:

ÉTICA E PROFISSÃO JURÍDICA

Assim como toda profissão, a profissão jurídica encontra seus mandamentos basilares
estruturados em princípios gerais de actuação, de acordo com as especificidades dessa
atividade social e de acordo com os efeitos dessa atividade em meio às demais 42. Ao conjunto
de regras e princípios que regem as atividades profissionais do direito se chama deontologia
forense43.

O que há de peculiar nesse métier é que as profissões jurídicas são, senão em sua totalidade,
ao menos em sua quase-totalidade, profissões regulamentadas, legalizadas, regidas por
normas e princípios jurídicos e éticos, de modo que seu exercício, por envolver questões de

42
O próprio direito do trabalho encontra-se atrelado a esse compromisso ético na atualidade, conforme se vê
aqui descrito: "Ética e Direito são dimensões recíprocas da vida humana, referenciais para as relações na
sociedade. De pronto envolvem a nobreza com que conduzimos nossas ações e o respeito com que tratamos o
semelhante. É precisamente no contexto atual que Ética e Direito contabilizam a busca de marcos de referência,
de propostas éticas no Direito que cuidam dos anseios e realizações sociais. A preocupação é hoje na direção de
uma sociedade eticamente bem regulada contra as discriminações, as violações dos direitos humanos, a
corrupção, as enormes diferenças, a exploração e a impunidade no atual contexto. A ética cristã caminhou pela
história, estreitamente ligada ao Direito do Trabalho" (Cássio Mesquita Barros Júnior, A ética no direito do
trabalho, in Martins (coord.), Ética no direito e na economia, 1999, p. 55).
43
"Deontologia é a teoria dos deveres. Deontologia profissional se chama o complexo de princípios e regras que
disciplinam particulares comportamentos do integrante de uma determinada profissão. Deontologia Forense
designa o conjunto das normas éticas e comportamentais a serem observadas pelo profissional jurídico" (Nalini,
Ética geral e profissional, 1999, p. 173).

53
alto grau de interesse coletivo, não são profissões de livre exercício, mas sim de exercício
vinculado a deveres, obrigações e comportamentos regrados. Esses comportamentos regrados
vêm expressos em legislação que regulamenta a profissão, ou em códigos éticos, ou em
regimentos internos, ou em portarias, regulamentos e circulares, ou até mesmo em texto
constitucional. O que se encontra implícito nos princípios deontológicos é explicitado por
meio de comandos prescritivos da conduta profissional jurídica.

Se se pode dizer que existem mandamentos éticos comuns a todas as profissões jurídicas 44,
isso se deve ao fato de todas desempenharem importante função social. É de interesse da
coletividade o efetivo controle dos atos dos operadores do direito. Porém, não existe uma
regra que domine e resolva de modo formular todos os problemas éticos dos profissionais das
diversas carreiras jurídicas (públicas e privadas). Cada qual possui suas peculiaridades, e
respeitá-las significa adentrar nas minúcias que delineiam sua identidade45.

Existem, pois, regramentos específicos que impedem que se fale em uma ética comum a
todas as carreiras jurídicas, mas, mesmo assim, podem-se enunciar alguns princípios gerais e
comuns a todas as carreiras jurídicas, a saber, entre outros: o princípio da cidadania, segundo
o qual se deve conferir a maior proteção possível aos mandamentos constitucionais que
cercam e protegem o cidadão brasileiro; o princípio da efetividade, segundo o qual se deve
conferir a maior eficácia possível aos atos profissionais praticados, no sentido de que surtam
os efeitos desejados; o princípio da probidade, segundo o qual se deve orientar o profissional
pelo zeloso comportamento na administração do que é seu e do que é comum; o princípio da
liberdade, que faz do profissional ser altaneiro e independente em suas convicções pessoais e
em seu modo de pensar e refletir os conceitos jurídicos; o princípio da defesa das
prerrogativas profissionais, com base no qual o profissional deve proteger as qualidades
profissionais de sua categoria com base nas quais se estabelecem as suas características

44
Apesar de, por vezes, a própria lei se utilizar da expressão "ética profissional" como um gênero universal a
todos comum. Veja-se neste exemplo: Lei n. 7.210, de 11-7-1984 (DOU, 13-7-1984) (Institui a Lei de Execução
Penal): Título 11 - Do Condenado e do Internado (arts. 52 a 60), Capítulo I Da Classificação (arts. 52 a 92), "Art.
92 A Comissão, no exame para a obtenção de dados reveladores da personalidade, observando a ética
profissional e tendo sempre presentes peças ou informações do processo, poderá: I - entrevistar pessoas; 11
requisitar, de repartições ou estabelecimentos privados, dados e informações a respeito do condenado; 111
realizar outras diligências e exames necessários".
45
Veja-se, a título exemplificativo, o que dispõe o seguinte decreto acerca da especificidade do Código de Ética
Profissional: Decreto n. 2.134, de 24-1-1997 (DO U, 27-1-1997) (Regulamenta o art. 23 da Lei n. 8.159, de 8-1-
1991, que dispõe sobre a Categoria dos Documentos Públicos Sigilosos e o Acesso a Eles, e dá outras
providências): Capítulo VI - Das Disposições Finais (arts. 32 a 35), "Art. 32. Os agentes públicos responsáveis
pela custódia de documentos sigilosos estão sujeitos às regras referentes ao sigilo profissional e ao seu código
específico de ética".

54
intrínsecas; os princípios da informação e da solidariedade, para que haja clareza, publicidade
e cordialidade nas relações entre profissionais do direito e, inclusive, outros profissionais46.

Respeitando-se e obedecendo-se às nuances que caracterizam e diferenciam as carreiras


jurídicas entre si é que se dedicará espaço somente para a discussão do estatuto ético de cada
uma das principais carreiras do direito. Assim, prevê-se uma discussão específica sobre os
principais mandamentos e as prescrições fundamentais que estão a reger o comportamento
dos seguintes profissionais jurídicos: agentes e funcionários públicos; advogados, defensores
públicos e procuradores do Estado; juízes, ministros e desembargadores; promotores e
procuradores de justiça; professores, cientistas do direito e juristas.

DEONTOLOGIA JURÍDICA
Como visto acima, a deontologia engloba os deveres de qualquer profissional, e para aqueles
que atuam no ramo do Direito não seria diferente. Vale trazer ao bojo desta escrita, as
palavras de Luiz Lima Langaro, consoante ao conceito de deontologia jurídica, a saber:
"Podemos, então, dizer que, etimologicamente, o conceito de deontologia é a "ciência dos
deveres" ou simplesmente "tratado de deveres". Consequentemente, Deontologia Jurídica é a
disciplina que trata dos deveres e dos direitos dos agentes que lidam com o Direito, isto é, dos
advogados, dos juízes e dos promotores de justiça, e de seus fundamentos éticos e legais."
A deontologia não se estreita apenas em pertencer à filosofia moral, onde é claro detém seus
fundamentos, mas consolida-se como um ramo, uma especialização da ciência do direito.
Sendo ciência, cuida das normas jurídicas e princípios doutrinários, com o fim específico de
regular a conduta dos operadores do Direito, no que é concernente aos seus deveres de ordem
profissional.
O âmago da deontologia jurídica é o de procurar usar o direito com ética, com

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"A enunciação de princípios éticos gerais, aplicáveis às profissões forenses, é sempre algo de discricionário.
Poder-se-ia multiplicar a relação dos princípios, incluindo-se inúmeros outros, alguns lembrados por autores que
também se dedicaram ao estudo da ética.
"Dentre eles, mencione-se os princípios da informação, da solidariedade, da cidadania, da residência, da
localização, da efetividade e da continuidade da profissão forense, o princípio da probidade profissional, que
pode confundir-se com o princípio da correção, o princípio da liberdade profissional, da função social da
profissão, a severidade para consigo mesmo, a defesa das prerrogativas profissionais, o princípio da clareza,
pureza e persuasão na linguagem, o princípio da moderação e o da tolerância.
"Todos eles se prestam ao serviço de atilar a postura prudencial dos operadores jurídicos, favorecendo-os a um
exame de consciência para constatar como pode ser aferido eticamente o próprio comportamento. Na maior
parte das vezes, esse profissional é o único árbitro de sua conduta. Além de se tornar, com isso, mais
escrupuloso, deve ter em mente que os cânones dos códigos éticos, a recomendação da doutrina e a produção
pretoriana dos respectivos tribunais éticos não excluem deveres que resultam de sua consciência e do ideal de
virtude, inspiração maior do profissional do direito" (Nalini,Ética geral e profissional, 1999, p. 193-194).

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comportamento moral, bem como estimular o profissional a tratar sua profissão com zelo,
com consciência.
Como dito alhures, a deontologia, não aplica-se somente aos advogados, mas a todas aquelas
profissões interligadas ao ramo do direito, como os juízes, promotores, serventuários da
justiça. No que tange a ética do juiz, esta vem sendo assunto constante. Pois inúmeros são os
casos de magistrados que recebem "pequenas gratificações" das partes para um andamento
mais célere de determinado litígio. As funções exercidas pelo magistrado implicam em
deveres de ordem salutar, pois a causa que está em suas mãos pode ser decisiva para a vida do
litigante. "A ética do juiz funda-se, de outra parte, em postulados elementares de certos
valores úteis, fundamentais e absolutos, como o respeito à vida, ao direito, à dignidade, à
honra da pessoa. Também cortesia às partes e a probidade, sendo vão querer todos os aspectos
englobar. São todos os valores transmitidos pela tradição e que se encontram na primeira
página de qualquer código deontológico."
Sendo assim, cabe ao juiz definir sua estratégia profissional, e adequar-se, de certa forma, a
multiplicidade de missões que lhe são confiadas pela sociedade, bem como pelas partes em
conflito, para que seja feita a devida justiça por parte do Estado.
Para os integrantes do Ministério Público, o dever deontológico se faz estritamente necessário
no exercício pleno de suas funções, seja no âmbito cível ou criminal. O Ministério Público é
figura permanente e essencial à função jurisdicional, como a própria Carta Magna trás em seu
bojo, defendendo os anseios sociais e fiscalizando a aplicação da lei. A actuação e
intervenção do Ministério Público deve ocorrer de forma coerente e necessária. "Em nenhum
momento deve ser levado pela paixão, relegando o caráter técnico-jurídico a segundo plano e
ferindo de morte a dignidade da sua nobre função. Já se foi a época do Promotor de Justiça
ser um cego e sistemático acusador público, perseguidor implacável do réu, profissional que
representava a sociedade e tentava a todo custo uma condenação, pouco importando que
tivessem sido dadas ao réu as condições plenas de provar a sua inocência".
Não pode o Ministério Público intervir de forma arbitrária, com o simples pensamento de
uma condenação, bem como não pode agir fora de seus limites. Assim como os advogados, os
promotores também possuem seu código ético, denominado Código Nacional de Ética do
Ministério Público, o qual norteia o exercício sadio da profissão.
A deontologia jurídica pode ser orquestrada como um ramo do direito, pois se funda em
regular a conduta dos operadores do direito através de princípios doutrinários e normas, como
por exemplo o Código de Ética e disciplina da OAB e das carreiras da Magistratura e do
Ministério Público. Sendo assim, compete-lhes fazer justiça com dever ético e moral.
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Bibliografia
AAVV. Manual de Ética Empresarial. Onebiz, creating business. SL. SD.
GIANNETTI, Eduardo. Vícios privados, benefícios públicos: a ética na riqueza das nações.
São Paulo: Cia. das Letras, 1993.
_____. Nada é tudo: ética, economia e brasilidade. Rio de Janeiro: Campus, 2000. HUME. Os
pensadores. São Paulo: Nova Cultural, 1999.
LIPOVETSKY, Gilles. O crepúsculo do dever: a ética indolor dos novos tempos
democráticos. Lisboa: Publicações Dom Quixote, 1994.
SROUR, Robert Henry. Ética empresarial. Rio de Janeiro: Campus, 2000. Revista Você S/A,
julho/2000.
WEBER, Max. Ciência e política: duas vocações. São Paulo: Cultrix, 1968.
MORELLI, Mariano G. Ética Empresarial. Instituti San Ignacio. Córdoba Argentina, 2006.
SILLANPAA, Maria e JACKSON, Charles. Conducting a Social Audit, lessons from the
Body Shop experience, SD.
MELENDO, Tomás. Las Claves de la eficacia empresarial. SL. SD.

Bibliografia complementar:
MELE, Domenec, III Coloquio de Ética Empresarial y Económica. Editorial EUNSA,
Pamplona, 1994.
PÉREZ, Rafael Gómez. Ética Empresarial: Teoria y Casos. Ediciones Rialp S.A., Madrid,
1982.
VELASQUEZ, Manuel G. Business Ethics. Editorial Prentice Hall, New Jersey, 1998.

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