Você está na página 1de 11

Brazilian

Vol. 3, Nº 3Journal Estudos de Coorte e de Caso-Controle na Era da Medicina Baseada em Evidência Editorial
115
of Videoendoscopic
Surgery

Estudos de Coorte e de Caso-Controle na


Era da Medicina Baseada em Evidência
Cohort and Case-Control Studies in the Evidence-Based
Medicine Era
MARCO AURÉLIO PINHO DE OLIVEIRA1; RAPHAEL CÂMARA MEDEIROS PARENTE2

1
Doutor em Epidemiologia pelo Instituto de Medicina Social da Universidade do Estado do Rio de Janeiro.
Chefe do Setor de Ginecologia da UERJ; 2 Doutor em Ginecologia pela UNIFESP (Reprodução Humana).
Mestre em Epidemiologia pelo Instituto de Medicina Social da Universidade Estadual do Rio de Janeiro.

Um estudo de coorte é um estudo observacional onde os indivíduos são classificados (ou selecionados) segundo o
status de exposição (expostos e não expostos), sendo seguidos para avaliar a incidência da doença em determinado
período de tempo. Os estudos de coorte também podem ser utilizados para avaliar os riscos e benefícios do uso de
determinada medicação.
Bras. J. Video-Sur, 2010, v. 3, n. 3: 115-125 Aceito após revisão: Setembro, 2010.

1. As fases principais de um estudo de estudo 3. Os estudos de coorte têm algumas


de coorte são as seguintes: desvantagens:
a. Identificar as pessoas sadias no início do a) É do tipo observacional (assim como o
estudo; caso-controle), trazendo todas as fragilidades do
b. Montar grupos de indivíduos expostos e não desenho observacional (quando comparados aos
expostos; estudos experimentais – ensaios clínicos
c. Seguimento da coorte para avaliação randomizados);
da incidência da doença a ser estudada nos dois b) Pode ser ineficiente para o estudo de do-
grupos; enças raras ou aquelas com longos períodos de
d. Comparar a incidência (risco) em cada latência;
coorte. c) Geralmente caros e difíceis de
operacionalizar (em estudos etiológicos);
2. Os estudos de coorte têm certas vantagens: d) A perda de participantes ao longo do se-
a) Podem discernir as relações temporais guimento pode comprometer a validade dos resulta-
entre a exposição e o desfecho devido ao fato da ex- dos.
posição preceder o desfecho;
b) Podem ser usados para avaliação de des- Visão geral do projeto de um estudo de coorte:
fechos múltiplos; Os estudos de coorte são um tipo específico
c) Permitem o cálculo direto das medidas de de desenho de estudo observacional que possuem um
incidência nas coortes de expostos e não expostos; nível de evidência maior que os outros observacionais
d) O status do desfecho não influencia a me- tais como: série e relato de casos, caso-controle e
dida do status de exposição ou seleção de indivíduos estudos transversais (mas menor nível de evidência
(coorte concorrente); que os estudos experimentais).
e) São menos sujeitos a viéses de seleção do
que os estudos de caso-controle; Os estudos de coorte são realizados em três
f) Alguns estudos permitem ainda que vá- etapas fundamentais:
rias exposições possam ser avaliadas (coortes de 1. Montar ou identificar grupos de indivíduos
população geral ou de grupos populacionais res- expostos e não expostos que são livres da doença em
tritos). estudo;

115
116 Oliveira et al. Bras. J. Video-Sur., July / September 2010

2. Observar cada coorte ao longo do tempo Apuração dos dados do estudo:


para a avaliação do desenvolvimento da doença nos A partir do momentoem que os investigado-
grupos estudados; res decidiram sobre as variáveis e desfechos especí-
3. Comparar os riscos de surgimento da do- ficos para o estudo, eles devem usar os métodos mais
ença entre os grupos de expostos e não-expostos; acurados possíveis para medir estas características e
O primeiro passo para um estudo de coorte é disponibilizando-os para todos os participantes. Con-
identificar grupos de expostos e de não expostos. Uma siderações importantes na medição dos dados do es-
coorte é um grupo de pessoas, oriundas da população tudo são a validade das medições, tempo entre as
em estudo, que partilha uma experiência comum ou medições e a disponibilidade de medidas uniformes
condição e cujo resultado é desconhecido no início para a população em estudo.
do estudo. Nos estudos de coorte, os pesquisadores
observam status de exposição, que ocorre “natural- Validade das medições:
mente” (ou seja, o pesquisador não interfere ativa- A validade de uma medição refere-se a quão
mente). Em contraste, nos ensaios clínicos, os pes- perto os dados medidos representam os dados verda-
quisadores atribuem (experimentamente) a exposição deiros. Ela deve ser a mais próxima da realidade pos-
aos participantes do estudo. sível.

Exemplo: Os investigadores pretendem Tempo entre as medições:


avaliar se o fumo causa câncer de colo de útero. O tempo certo entre as medições da exposi-
Eles recrutam 2000 mulheres com útero intacto. ção e do desfecho dependerá do conhecimento pré-
Os pesquisadores usam um questionário para ve- vio sobre o desfecho. Em alguns casos, os pesquisa-
rificar o status de fumo para todos os sujeitos do dores podem estar interessados na associação entre
estudo e depois dividem a população de estudo a exposição recente e doença, particularmente se
em uma coorte de fumantes e outro grupo de não houver a preocupação de que a exposição pode mu-
fumantes. dar durante o estudo. Por exemplo, medicamentos
Eles observam cada coorte ao longo do tem- antiinflamatórios não-esteróides(AINH) podem cau-
po e comparam os riscos de incidência de câncer de sar rápida constrição das artérias renais, levando a
colo de útero entre os dois grupos. um aumento do risco de lesão renal aguda. Investiga-
Os estudos de coorte geralmente se con- dores que estudam a relação entre AINH e uso de
centram na incidência de casos da doença que ocor- medicamentos e lesão renal aguda podem concentrar
rem durante o seguimento. Para atingir esse objeti- seus esforços em obter uma estimativa válida de uso
vo, os pesquisadores geralmente excluem indivídu- recente de AINH em relação à ocorrência de lesão
os que têm a doença prevalente no início de um renal aguda. A verificação do uso de medicação re-
estudo de coorte (no nosso exemplo, quem já tives- cente pode ser obtida por frequência de atualização
se câncer de colo uterino seria excluída). A avalia- de status de cada participante durante o estudo. Há
ção dos resultados da incidência da doença ajuda a outros exemplos em que a associação de interesse é
estabelecer que a exposição de interesse precede a relação entre a exposição a longo prazo e a doença.
o desfecho (doença) e, portanto, pode representar Por exemplo, o tabagismo pode causar danos a um
uma causa da doença. transplante de rim por gradativo espessamento das
Nos estudos de coorte, os pesquisadores camadas íntima e média das artérias. Os investigado-
observam a exposição de interesse. Como resulta- res neste estudo podem, portanto, escolher para ava-
do, indivíduos expostos e não expostos podem vari- liar em longo prazo a história de tabagismo, tais como
ar em função de outras características. No nosso o número de maços-anos fumados após o transplan-
exemplo, por exemplo, pacientes que fumam po- te. Os estudos de coorte não são ideais para o estudo
dem ser mais propensas a serem portadoras de de exposições muito recentes ou muito antigas. Ex-
HPV que sabidamente é fator de risco para câncer posições antigas podem mudar ao longo do tempo,
de colo. O conceito de que fatores outros que não obscurecendo a sua relação com o resultado de inte-
a exposição podem influenciar os resultados do es- resse. Exposições muito recentes podem confundir a
tudo é chamado de fator de confusão ou de relação presumida temporal entre a exposição e o
confundimento. desfecho.
Vol. 3, Nº 3 Estudos de Coorte e de Caso-Controle na Era da Medicina Baseada em Evidência 117

Coleta de dados retrospectiva versus tre a exposição eo desfecho, desde que uma quanti-
prospectiva (coorte prospectivo x coorte dade razoável de tempo tenha decorrido entre a me-
retrospectivo): dição da exposição e a ocorrência do resultado. A
existência de uma relação temporal reforça a evidên-
Os estudos de coorte podem ser classifica- cia para a exposição ser uma causa possível da doen-
dos como concorrentes (prospectivos, clássicos) ou ça. Note-se que estabelecer uma relação temporal
não concorrentes (retrospectivos). Nos estudos não entre exposição e desfecho é inerente ao desenho do
concorrentes, todas as informações sobre a exposi- estudo e não podem ser resolvido por qualquer
ção e o desfecho já ocorreram antes do início do es- metodologia estatística.
tudo. Nos estudos concorrentes, a exposição pode (ou
não) já ter ocorrido, mas o desfecho ainda não ocor- Desvantagens dos estudos de coorte:
reu. a) Os estudos de coorte são estudos
Os problemas dos estudos não concorrentes observacionais, e portanto estão sujeitos a fatores de
são: viés de informação e a inabilidade para controlar confusão. Ou seja, outros fatores que estão relacio-
variáveis de confusão (falta de informação). Os ter- nados com a exposição de interesse podem explicar
mos prospectivo e retrospectivo geralmente se refe- algumas ou todas as associações que são observa-
rem a quando os dados do estudo foram coletados em das.
relação ao investigador. Um estudo prospectivo en- b) Incapacidade para examinar doenças que
volve a coleta de novos dados, muitas vezes, com o são raras ou que têm uma longa latência. Os estudos
propósito de abordar uma questão específica. A dis- de coorte podem ser ineficientes se o desfecho é raro
tinção entre os estudos retrospectivos e prospectivos ou a doença tem um longo período de latência.
é essencialmente descritiva, que não traz geralmente
impacto no plano de análise ou nos resultados do es- Exemplo 1: Investigadores querem investi-
tudo, além dos já citados. gar se uso de talco na infância aumenta o risco de
Uma grande vantagem dos estudos de coorte câncer de ovário na vida adulta. Usando uma coorte,
é a capacidade de avaliar múltiplos desfechos. Os a abordagem do estudo poderia ser a de recrutar
pesquisadores das coortes em estudo são livres para coortes de crianças com e sem uso de talco e seguir
estudar mais de um desfecho, desde que os sujeitos estes grupos para o desenvolvimento posterior do cân-
em estudo estejam livres de cada desfecho de inte- cer de ovário. No entanto, muitos anos de follow-up
resse quando o estudo começou. Como exemplo, num provavelmente seriam necessários para o desenvol-
estudo que avaliou a relação entre transplante de rim vimento do câncer até aidade adulta.
e fumo, os investigadores puderam também estudar Neste exemplo, o longo período de latência
se o fumo foi associado com o desenvolvimento de entre a exposição e o desfecho faria esse estudo muito
câncer nos rins ou na bexiga. caro e logisticamente difícil.
Um dos maiores estudos de coorte já condu-
zido foi o Nurses Health Study, que recrutou 127 mil Exemplo 2: Os investigadores pretendem in-
enfermeiras com idades entre 30 e 55anos. Avaliou vestigar se a dormir de bruços é uma causa potencial
entre as enfermeiras, por meio de questionários envi- da síndrome da morte súbita infantil (SMSI) em be-
ados a cada dois anos, diversas variáveis tais como: bês.
condições de saúde, a prescrição e uso de medicação Usando uma abordagem de estudo de coorte,
sem receita, os hábitos sociais, hábitos alimentares e eles poderiam identificar uma coorte de crianças que
físicos, entre outros. Este projeto de estudo de coorte dormem em decúbito ventral e uma coorte de crian-
aberta permitiu a criação de múltiplos estudos de coorte ças que dormem em posição supina e, em seguida,
que avaliaram fatores de risco para uma ampla gama comparar os riscos de SMSI entre as coortes. No
de doenças, incluindo: câncer, doenças cardíacas e entanto, a SMSI é relativamente rara, necessitando
fraturas, entre diversos outros desfechos. Esses es- do recrutamento de milhares de recém-nascidos para
tudos têm a capacidade de discernir a relação tempo- avaliar suficientes casos de SMSI para tirar conclu-
ral entre exposição e desfecho sões significativas. Nesse caso, um estudo de caso-
Ao contrário dos estudos transversais, estu- controle seria mais adequado. É possível superar as
dos de coorte podem revelar relações temporais en- limitações do estudo de coorte em doenças raras e de
118 Oliveira et al. Bras. J. Video-Sur., July / September 2010

grande latência usando fontes de dados que facilitem camento). Independentemente do número de coortes,
o estudo de grandes populações. deve-se primeiro calcular a incidência da doença em
cada grupo, ou como proporção de incidência ou
Estudos de coorte para avaliação do uso de como taxa de incidência. Isso deve ser feito levan-
medicações: do-se em conta o tempo em que cada participante
foi seguido no estudo, dando como resultado para
Os estudos de coorte podem ser uma fer- cada indivíduo um valor de pessoa-tempo. A falta de
ramenta importante para estudar os riscos e bene- consideração para pessoa-tempo pode levar a um
fícios de determinada medicação. Estes estudos viés, que descreve uma sistemática distorção do re-
podem fornecer informações específicas sobre os sultado verdadeiro. Por exemplo, suponha que em
medicamentos que podem não serem obtidas a par- determinado estudo sobre fumantes e não fumantes,
tir de ensaios clínicos. Em primeiro lugar, estudos os fumantes abandonam o estudo mais
de coorte podem avaliar os riscos e benefícios dos freqüentemente do que os não fumantes (tabagismo
medicamentos entre populações que tendem a ser pode ser uma indicação de abandono) de tal forma
excluídas dos ensaios randomizados tais como, por que os fumantes são seguidos por menos tempo do
exemplo: pacientes com deficiências físicas e men- que os não fumantes.Nestas condições, seria possí-
tais, pessoas com insuficiência renal avançada, ou vel observar uma menor incidência de doenças en-
aqueles com doença hepática. Em segundo lugar, tre os fumantes, simplesmente porque eles são se-
estudos de coorte podem avaliar desfechos clíni- guidos por menos tempo. O tempo de seguimento no
cos e colaterais indesejados dos medicamentos denominador da taxa de incidência padroniza as ta-
aprovados pela identificação de coortes muito gran- xas da doença por tempo através de gerações, eli-
des de usuários de medicamentos a partir de dados minando esse problema em potencial.
dos sistemas automatizados de farmácias. A prin-
cipal limitação dos estudos observacionais de uso Risco Relativo:
de medicamentos é a dificuldade em separar o efei- Assim que determinamos a incidência da do-
to de uma medicação a partir das características ença em cada coorte, podemos comparar essas inci-
básicas das pessoas. Por exemplo, estudos dências. Muitos tipos de comparações são possíveis,
observacionais sobre terapia hormonal (TH) mos- as mais comuns são o risco relativo e o risco atribuí-
traram que mulheres que usaram a TH tinham bai- vel.
xos riscos de eventos cardiovasculares em compa- O risco relativo é definido como a incidência
ração com mulheres que não usaram. Ensaios clí- (proporção ou taxa) em uma coorte dividida pela inci-
nicos não corroboraram esses resultados mostran- dência na coorte de referência. Por exemplo, num
do, ao contrário, um maior risco de eventos estudo hipotético, a taxa deincidência de insucesso do
cardiovasculares em usuárias de TH. transplante de rim é 82,6 falhas por 1.000 pessoas-
A segunda desvantagem de estudos de ano entre os fumantes e 55,3 falhas por 1.000 pesso-
farmacoepidemiologia é a sua tendência para avaliar as-ano entre os não fumantes.
usuários de medicação crónica, em vez de novos usu-
ários. Apesar de suas limitações, os estudos de Usando os não fumantes como a coorte de
farmacoepidemiologia continuam a ser uma importante referência, o risco relativo seria:
ferramenta para avaliar os medicamentos que são
usados na prática clínica. 82,6 falhas por1000 pessoas-ano
—————————————————
Proporção de incidência versus taxa de 55,3 falhas por1000 pessoas-ano
incidência:
Os estudos de coorte geralmente envolvem RR = 1,49 (comparação entre fumantes com
duas coortes de comparação, mas podem ter apenas não fumantes)
uma (comparação com outros grupos informais publi- O risco relativo também pode ser expresso
cados ou dados históricos) ou mais de duas (por exem- utilizando os fumantes como a coorte de referência:
plo, diferentes grupos de níveis séricos de determina- RR = 0,67 (comparação entre os não-
do marcador sérico ou diferentes doses de um medi- fumantese fumantes)
Vol. 3, Nº 3 Estudos de Coorte e de Caso-Controle na Era da Medicina Baseada em Evidência 119

Ambos os riscos relativos estão corretos. para cada 1.000 pessoas-ano em receptores de trans-
Você pode escolher um grupo para ser o grupo de plantes que fumam.
referência. Note-se que o risco relativo não tem uni-
dades. A interpretação do primeiro risco relativo de ESTUDOS CASO-CONTROLE
1,49 seria, “transplante de rim em pacientes que fu-
mam têm 49% mais probabilidade de desenvolver in- Para introduzir o conceito do estudo de caso-
suficiência em transplantes em relação aos não-fu- controle, podemos fazer a seguinte pergunta:
mantes“. “Dizemos que tem “ 49% mais probabilida- O consumo de álcool aumenta a incidência
des “ porque 1,49 é 49% maior do que 1,0. de câncer de pâncreas? Estudo caso-controle publi-
Uma interpretação do segundo risco relativo cado em 1989 mostrou aumento significativo da do-
seria “não-fumantes com um transplante de rim têm ença em quem consumia maiores quantidades de cer-
33% menos probabilidade de desenvolver insuficiên- veja 1. Considerando esta possibilidade, podemos de-
cia renal em relação aos fumantes. O segundo risco linear um estudo caso-controle hipotético, como
relativo demonstra uma associação com um menor exemplificado a seguir.
risco de doença, pois o valor é inferior a 1,0. Primeiro vamos considerar como seria a abor-
Porque fumar é associado com 49% mais ris- dagem de um estudo de coorte para este problema.
co de insucesso no transplante, mas entre não fuman- Os pesquisadores conseguiram identificar uma coorte
tes, com apenas um risco 33% menor de insucesso? de 1.000 adultos que ingerem regularmente álcool e
Em poucas palavras, porque não são os riscos relati- outra coorte de 1.000 adultos que não ingerem álcool.
vos aditivamente simétricos para a mesma exposição? Após a exclusão de adultos com problemas no pâncres
Note-se que riscos relativos, como todas as propor- no início do estudo, os pesquisadores observaram cada
ções, podem assumir valores variando de 0 a infinito; coorte para o desenvolvimento do câncer de pâncre-
No entanto, 1.0 define o valor da unidade. É mais as (CP) durante o seguimento. Os dados obtidos com
difícil obter os riscos relativos que são muito menos esta abordagem são apresentados na Tabela 1.
do que 1,0, porque eles são limitados a 0. Por esta Estes dados não indicam uma diferença na
razão, os riscos relativos que são inferiores a 1,0 indi- incidência de câncer de pâncreas, comparando adul-
cam associações mais fortes do que as associações tos que consomem álcool com aqueles que não con-
simétricas que são maiores do que 1,0. somem, porém, existem poucos casos de câncer de
pâncreas neste estudo para chegarmos a uma con-
Risco Atribuível (também chamado de clusão significativa. Neste exemplo, o desenho do
“diferença de risco” ou “excesso de risco”): estudo de coorte é ineficiente porque o desfecho (cân-
O risco atribuível é definido como a incidên- cer de pâncreas) ocorre com pouca freqüência.
cia (proporção ou taxa) em uma coorte diminuída a E se o desenho do estudo de coorte fosse
incidência do outro grupo. Para o exemplo de trans- revertido? Se em vez de começar com coortes de
plante de rim e fumar, o risco atribuível de insucesso expostos (os que consomem álcool) e não expostos
do transplante comparando fumantes com não fuman- (os que não consomem álcool), os investigadores co-
tes seria: 82,6 falhas transplante por 1.000 pessoas- meçassem identificando adultos com e sem o desfe-
ano (fumantes) - 55,3 falhas transplante 1.000 pes- cho de interesse, ou seja, o câncer de pâncreas?
soa-ano (não-fumantes) = 27,3 falhas transplante por Podemos pensar em um estudo, no qual os
1.000 pessoas-ano. pesquisadores identificaram 1.300 adultos com cân-
Note-se que o risco atribuível, ao contrário cer de pâncreas, numa base eltrônica de boa qualida-
do risco relativo, mantém as mesmas unidades que
estão sendo comparadas. Tabela 1 – Consumo de cerveja e câncer de pân-
Se a exposição de interesse for acausadora creas: um estudo de coorte.
da doença, o risco atribuível descreve a quantidade
de risco adicional ou extra que se deve à exposição. Câncer de Pâncreas
Por exemplo, se fumar realmente causa a falha de Consumo de cerveja Sim Não Total
transplante renal, em seguida, a interpretação do ris-
co atribuível para o tabagismo seria:”há risco de insu- Sim 5 995 1.000
ficiência renal de 27,3 transplantes renais adicionais Não 6 994 1.000
120 Oliveira et al. Bras. J. Video-Sur., July / September 2010

de, em um determinado país. Eles usaram a mesma trole realizados corretamente podem ser usados para
base de dados para determinar se os casos eram con- sugerir relações causais importantes.
sumidores habituais de álcool antes do desenvolvimen-
to do câncer de pâncreas. Estudos Caso-Controle
Os dados da tabela 2 demonstram uma pro-
porção aparentemente alta (77%) de consumo de ál- O primeiro passo para a realização de um bem
cool nos pacientes que sofrem de câncer de pâncre- sucedido estudo caso-controle é a seleção cuidadosa
as. O próximo passo seria comparar essa proporção dos casos e dos controles.
com pacientes semelhantes (em idade,sexo, etc..), mas
que não tenham CP. SELEÇÃO DOS CASOS
Os pesquisadores usaram a mesma base de
dados para obterem os dados que constam da Tabela A. Especificar bem a doença em questão
3. Esta tabela demonstra que a proporção de adultos Uma definição bem específica da doença é
sem CP e que consomem álcool (71%) é discreta- desejada em estudos caso-controle para garantir que
mente mais baixo que o grupo com CP (o que fala a a doença em questão está realmente presente entre
favor do álcool ser fator de risco para CP). os indivíduos que estão sendo definidos como casos.
Os resultados do estudo são mais bem apre- Esta estratégia pode exigir a exclusão de indivíduos
ciados através da apresentação conjunta dos dados com formas mais leves de uma determinada doença
relativos aos doentes e aos não doentes. Os dados da (ou incluí-los e melhorar a precisão diagnóstica), a
tabela 4 ilustram este conceito. O estudo caso-con- fim de se concentrar em casos mais avançados, que
trole começa com doentes e indivíduos não doentes e, podem ser diagnosticados com maior segurança. Em
em seguida, verifica os seus status de exposição pré- contrapartida, é geralmente menos importante dedi-
vio ao desenvolvimento da doença. Estudos caso-con- car recursos extras para confirmar que os indivíduos
do grupo controle são verdadeiramente livres da do-
Tabela 2 – Consumo de álcool entre os 1300 pa- ença em questão. Os estudos caso-controle geralmen-
cientes com CP. te investigam doenças raras (de baixa incidência, difí-
ceis de serem estudadas em uma coorte), pouco pro-
Consumo de álcool váveis de estarem presentes nos indivíduos selecio-
nados aleatoriamente para o grupo controle.
Sim 1000 (77%)
Não 300 (23%) B. Selecionar casos incidentes
Total 1300 Normalmente, o objetivo dos estudos caso-
controle é estudar o desenvolvimento da doença; por-
tanto, casos incidentes (novos) da doença são geral-
Tabela 3 – Consumo de álcool entre os 4500 adul-
mente preferidos do que os casos crônicos, de longa
tos sem CP.
duração. Uma razão para focar nos casos incidentes
é estabelecer se a exposição de interesse (p.ex., con-
Consumo de álcool
sumo de álcool) esteve claramente presente antes da
Sim 3200 (71%) ocorrência da doença.
Não 1300 (29%) Por exemplo, a seleção de adultos com CP
Total 4500 de longa data pode dificultar a comprovação de con-

Tabela 4 – Consumo de álcool e câncer de pâncreas: estudo caso-controle.

Câncer de Pâncreas
Consumo de álcool prévio Sim Não Total
(N=1300) (N=4500)
Sim 1000 (77%) 3200 (71%) 4.200
Não 300 (23%) 1300 (29%) 1.60
Vol. 3, Nº 3 Estudos de Coorte e de Caso-Controle na Era da Medicina Baseada em Evidência 121

sumo de álcool antes do desenvolvimento da doença B. Os controles devem ter a mesma


(p.ex., pode ter começado a beber depois que soube oportunidade de serem selecionados como
da doença há alguns anos e não antes – mais difícil de casos se, ao invés de saudáveis, fossem ou se
diferenciar com o passar do tempo). Uma segunda tornasssem doentes
razão para a escolha dos casos incidentes é que a No estudo do CP, os controles tiveram a mes-
alternativa, a seleção de casos crônicos, pode atrapa- ma oportunidade de serem diagnosticados como ca-
lhar o estudo da etiologia da doença caso esta interfi- sos porque faziam parte do mesmo sistema de saúde
ra na sobrevida do indivíduo. Para ilustrar este con- que capturou os doentes, utilizando códigos de diag-
ceito, considere um estudo caso-controle, que avalia nóstico. Um método para assegurar que os casos e
se os marcadores séricos do estresse oxidativo estão os controles derivam da mesma população subjacente
relacionados com o acidente vascular cerebral (AVC). e que vão ter a mesma oportunidade de serem diag-
Os investigadores começam pela identificação de in- nosticados com uma doença é fazer um estudo caso-
divíduos com AVC (casos) e aqueles sem AVC (con- controle aninhado. Este desenho de estudo seleciona
troles) e, em seguida, medem os marcadores do os casos e controles a partir de um estudo de coorte
estresse oxidativo em amostras de soro que foram maior. Por exemplo, o Cardiovascular Health Study
coletadas há 10 anos. Se os pesquisadores selecio- (CHS) recrutou 5.800 idosos a partir de quatro comu-
nassem como casos os indivíduos com AVC crônico, nidades e obteve avaliação sorológica da função re-
eles estariam estudando os “sobreviventes do AVC”, nal entre todos os participantes2. Um estudo caso-
cuja sobrevivência poderia estar relacionada com cer- controle aninhado no CHS pode facilmente identifi-
tas características saudáveis, incluindo menores ní- car os casos com disfunção renal e controles com
veis de marcadores séricos do estresse oxidativo. O função renal normal, baseados em dados de laborató-
resultado poderia ser uma associação negativa artifi- rio que foram obtidos usando métodos idênticos. Os
cial (quanto maiores os níveis dos marcadores, meno- investigadores poderiam então tentar estimar a fre-
res as chances de AVC) entre os marcadores séricos qüência do uso de determinado anti-inflamatório (que
do estresse oxidativo e o AVC. pudesse prejuducar os rins) entre os casos e os con-
troles usando dados previamente coletados sobre a
SELEÇÃO DOS CONTROLES prescrição médica.

A. Selecionar controles da mesma base C. Pareamento


populacional dos casos Os estudos de caso-controle muitas vezes
Os estudos caso-controle comparam a freqüên- usam o pareamento para aumentar o grau de seme-
cia da exposição (p.ex., consumo de álcool) entre os lhança entre os casos e os controles. No estudo do
indivíduos que tem uma doença e os indivíduos que não CP, um exemplo de pareamento seria primeiro esco-
tem a doença. A interpretação dos resultados de um es- lher um indivíduo com CP e, em seguida, identificar
tudo caso-controle depende do pressuposto de que o grupo um controle que não tem CP, mas que tem a mesma
controle foi obtido de uma população adequada para es- idade e sexo do referido caso. Utilizando técnicas
timar a freqüência da exposição. O objetivo geral é a analíticas apropriadas, o pareamento pode reduzir a
obtenção de controles que derivam da mesma base da possibilidade de que outros fatores atrapalhem a as-
população que os casos. No exemplo do estudo do CP, sociação entre a exposição e o desfecho (denomina-
os casos do estudo poderiam ter sido selecionados a par- do confundimento; p.ex, no caso do CP, o fumo pode-
tir do sistema nacional de saúde da Suécia, onde o banco ria aumentar a chance de CP e quem ingere álcool
de dados tem boa qualidade e a ingestão de álcool é normalmente fuma mais; ou seja, o fator de risco para
relativamente alta. Se os investigadores, em vez de sele- CP em quem ingere álcool seria, na verdade, o taba-
cionarem o grupo controle da Suécia, selecionassem os gismo, mais prevalente em quem bebe).
controles de um país diferente, onde a ingesta de álcool
é menos comum (p.ex, países mulçumanos), teriam ob- D. Número de controles
servado uma maior proporção de consumo de álcool entre Em um estudo caso-controle, a doença de
os casos (da Suécia, que na média ingerem mais álcool), interesse é geralmente rara, logo, encontrar casos é
levando à conclusão falsa de que a ingesta de álcool é muitas vezes o passo limitante do processo. Não há
mais comum entre os portadores de CP. regras específicas sobre o número de controles que
122 Oliveira et al. Bras. J. Video-Sur., July / September 2010

são necessários em cada estudo, no entanto, mais estudo poderiam explorar outros fatores de risco para
controles geralmente fornecem uma estimativa mais CP.
precisa da freqüência de exposição no grupo controle
e podem aumentar o poder de estudo (a capacidade DESVANTAGENS DOS ESTUDOS
de detectar uma associação se ela está realmente CASO-CONTROLE
presente). Os recursos financeiros normalmente de-
terminam o número de controles que podem ser sele- A. Desenho de estudo observacional
cionados por cada caso. Há um aumento acentuado Como em estudos de coorte, estudos caso-
do poder do estudo quando mais controles são adicio- controle são desenhos de estudos observacionais e
nados, até atingir cerca de três a quatro controles por podem sofrer confundimento. Os casos podem diferir
cada caso, ponto a partir do qual a adição de mais dos controles em outros fatores além da exposição de
controles tem pouco efeito sobre o poder do estudo. interesse. O confundimento ocorre quando um outro
fator, que não a exposição de interesse, distorce a
VANTAGENS DOS ESTUDOS CASO- associação entre a exposição e o desfecho, limitando
CONTROLE assim a inferência de que a exposição causa a doen-
ça.
A. Estudos caso-controle podem ser ideais
para o estudo de doenças raras ou com longo B. Viés de memória
período de latência Como em estudos de coorte, estudos caso-
Os estudos de coorte e ensaios clínicos controle podem obter os dados do estudo usando uma
randomizados podem ser difíceis de executar quando variedade de fontes, incluindo prontuários, questio-
o desfecho de interesse é raro ou o período de latência nários, entrevistas e exames laboratoriais. Como nos
entre a exposição eo desfecho é longo (p.ex., pode estudos de coorte, os estudos caso-controle buscam
levar anos entre a ingesta de álcool e CP). mensurações válidas, precisas e uniformes da expo-
Os estudos de caso-controle podem ser úteis sição e do desfecho. Uma consideração importante
para estudar os processos em que o período de tempo para mensurações em estudo caso-controle é o uso
compreendido entre a exposição e o desenvolvimento de entrevistas ou questionários para verificar o status
da doença é particularmente longo e se os dados an- de exposição prévio, pois estes procedimentos po-
teriores sobre a exposição estão disponíveis ou po- dem levar a um tipo específico de viés conhecido
dem ser facilmente obtidos. Por exemplo, pode de- como viés de memória. O viés de memória ocorre
morar anos para que certos fatores dietéticos, como quando os casos e os controles lembram-se do seu
o óleo de peixe, possam produzir benefícios status de exposição de forma diferente (ou diferen-
cardiovasculares. Um estudo caso-controle poderia cial). No caso do CP, os casos (com câncer de pân-
identificar indivíduos com e sem doença coronária creas) poderiam se lembrar de terem bebido mais
cardíaca e depois questioná-los quanto à freqüência e álcool que o grupo saudável (por estarem doentes
quantidade de consumo prévio de óleo de peixe (obvi- acabam tentando buscar com mais afinco algum
amente controlando para fatores de confusão). culpado). A melhor solução para minizar o viés de
memória em estudos caso-controle é a utilização de
B. Estudos de casos e controles permitem o dados que foram colhidos de forma sistemática, an-
estudo de múltiplas exposições tes do desenvolvimento da doença (p.ex. prontuári-
Os estudos de coorte identificam indivíduos os organizados e completos, usados em um sistema
com base em seu status de exposição e, de saúde eficiente).
subsequentemente, seguem as coortes para observar
o desfecho de interesse. Em contraste, estudos caso- C. Estudos caso-controle de fornecem apenas
controle identificam indivíduos com base em seu status informações sobre o risco relativo (razão de
de doença, permitindo o estudo de várias exposições chance – odds ratio) da doença
dentro de um grupo pré-definido de casos e de con- Os estudos de coorte podem determinar a
troles. Por exemplo, uma vez que casos de CP e con- incidência da doença entre os expostos e indivíduos
troles sem CP são identificado, os investigadores do não expostos e então comparar esta incidência usan-
do uma proporção (risco relativo) ou uma diferença
Vol. 3, Nº 3 Estudos de Coorte e de Caso-Controle na Era da Medicina Baseada em Evidência 123

Tabela 5 - Consumo de álcool e câncer de pâncreas: estudo de coorte.

Câncer de Pâncreas
Consumo de álcool prévio Sim Não Total
(N=1300) (N=4500)
Sim 1000 150.000 151.000
Não 300 55.000 55.300
Total 1300 205.000 206.300

(risco atribuível). Os estudos caso-controle podem incidência (proporção) de CP em cada grupo:


fornecer somente uma estimativa (aproximação) do Incidência no grupo de consumo de álcool =
risco relativo. Eles não podem ser utilizados para cal- 1000/150.000 = 0,66%
cular risco atribuível, nem podem ser utilizados para Incidência no grupo sem consumo de álcool
calcular a incidência específica da doença em qual- = 300/55.300 = 0,54%
quer grupo. Como estamos analisando um estudo de
coorte hipotética, podemos usar a incidência (propor-
ANALISE DOS DADOS EM ESTUDOS ção) para calcular o risco relativo de CP em que inge-
CASO-CONTROLE re álcool = (0.66/0.54) = 1,22. Uma interpretação do
risco relativo seria: “a ingesta de álcool está associa-
A. Teoria do odds ratio (OR) da com um risco aumentado de 22% para câncer de
Os dados do estudo caso-controle do CP de- pâncreas”. Comparando os dados dos estudos de
monstraram que 77% dos adultos com CP possuiam coorte e de caso-controle, vemos que os 4.500 con-
história de ingesta de álcool e que 71% dos adultos troles representam apenas uma fração dos 205 mil
sem CP possuiam esta mesma história. Normalmente indivíduos que não tem CP. No estudo caso-controle,
estamos interessados na associação “qual é o risco os pesquisadores selecionaram 4.500 indivíduos do
de CP comparando adultos que ingerem álcool para grupo controle baseados em seus recursos, poder do
aqueles que não?”. Podemos estimar essa informa- estudo e praticidade. Esta seleção “arbitrária” de 4.500
ção a partir de dados de estudos caso-controle utili- controles torna impossível calcular a verdadeira inci-
zando o odds ratio (razão de chances). Para desen- dência de CP entre os indivíduos que estão expostos
volver o conceito de odds ratio, imagine que temos ou não à ingesta de álcool. Não podemos afirmar que
um financiamento ilimitado e recursos para estudar a incidência de CP nos que ingeriram álcool é de 1000
os adultos no sistema de saúde sueco. Realizamos / 4200 = 23,8% (ver tabela 4). Esta incidência é bem
um enorme estudo de coorte sobre consumo de álco- maior do que a incidência real de 0,66% e seria ainda
ol e CP. Dados hipotéticos são apresentados na Ta- diferente, dependendo do número de controles esco-
bela 5. lhido pelo investigador. Da mesma forma, não pode-
Depois de recrutar mais de 200.000 indivídu- mos afirmar que a incidência de CP entre os adultos
os no estudo da coorte hipotética, podemos calcular a que não ingerem álcool é de 300 / 1600 = 18,7%, pela

Table 6

Câncer de Pâncreas
Consumo de álcool prévio Sim Não Total
(N=1300) (N=4500)
Sim 1000 (77%) 3200 (71%) 4.200
Não 300 (23%) 1300 (29%) 1.600
O odds ratio é calculado como (1.000 / 3.200) / (300/1300) = 1,35.
124 Oliveira et al. Bras. J. Video-Sur., July / September 2010

Table 7

Cêncer de Pâncreas
Consumo de álcool prévio Sim Não Total
(N=1300) (N=4500)
Sim a. 1000 b. 3200 4.200
Não c. 300 d. 1300 1.600
O odds ratio é calculado como (1.000 / 3.200) / (300/1300) = 1,35.

mesma razão. Como o erro ao estimar a incidência é C. Odds ratio e Risco relativo
semelhante nos expostos e não-expostos, a razão en- Usando a abordagem do estudo de coorte,
tre essas (falsas) incidências aproxima o risco relati- verificou-se que o risco relativo (RR) do CP, compa-
vo para a doença. Este razão de (falsas) incidências rando quem ingere álcool com quem não o faz, foi de
não é propriamente um risco relativo, ao invés disso 1,22. Usando a abordagem de caso-controle, obser-
tem um nome diferente, a razão de chances (odds vou-se que o odds ratio do CP, comparando quem in-
ratio). O odds ratio é a principal medida de risco em gere álcool com quem não o faz, foi de 1,35. Essas
um estudo caso-controle. estimativas são semelhantes, mas não exatamente a
mesma. O principal fator que determina a concor-
B. Cálculo prático do odds ratio (OR) dância entre o risco relativo e a razão de chances é a
Na realidade, o odds ratio é calculado usando raridade do desfecho em questão. Quanto menor a
o número de controles (pessoas sem doença), como o prevalência da doença na população, maior a concor-
denominador. Considerando os dados do estudo caso- dância entre o OR e o RR No exemplo da ingesta de
controle do câncer de pâncreas (Tabela 6) álcool, o CP é relativamente raro na população, pois
há apenas 1.300 casos entre 206.300 indivíduos
Interpretações igualmente corretas da razão (prevalência = 0,63%). Não existe um valor de corte
de chances incluem: específico para definir o “raro”, mas geralmente es-
1. A ingesta de álcool está associada com tudos de caso-controle com a prevalência da doença
chance 35% maior de CP. <5% irão fornecer um odds ratio que se aproxima
2. As chances de CP são 35% maiores entre bastante do risco relativo.
os que ingerem álcool em comparação com aqueles
que não o fazem.
3. O odds ratio (ou a razão de chances) de LEITURA SUPLEMENTAR
CP é de 1,35, comparando os que ingerem álcool com
aqueles que não ingerem álcool. Greenland S (1987). Interpretation and choice of effect measures
Existe um método simples para o cálculo do in epidemiologic analyses. Am J Epidemiol 125: 761-8.
odds ratio dos dados obtidos dos estudos de caso-con-
trole. Primeiro, deve ser criada uma tabela de contin- Greenland S, Thomas DC (1982). On the need for the rare disease
assumption in case-control studies. Am J Epidemiol 116:
gência com a doença/sem a doença na parte superior
547-53.
e expostos/não expostos do lado esquerdo. Dada essa
configuração, as células da tabela são referidas como Kleinbaum DG, Kupper LL, Morgenstern H (1982).
a, b, c, d, conforme mostrado na tabela acima (Tabela 7). Epidemiologic research. Principles and quantitative methods.
O odds ratio é calculado a partir desta tabela como Belmont, CA: Lifetime Learning Publications.
(a x d) / (b x c).
Note que não foi feito nenhum ajuste para Miettinen OS (1976). Estimability and estimation in case-referent
outros fatores neste estudo, tais como idade, raça ou studies. Am J Epidemiol 103: 226-35.
sexo. Como consequência, esta razão de chances é
também chamado de “odds ratio “bruto”, ou “odds Pearce N (1993). What does the odds ratio estimate in a case-
ratio não ajustado”. control study? Int J Epidemiol 22: 1189-92.
Vol. 3, Nº 3 Estudos de Coorte e de Caso-Controle na Era da Medicina Baseada em Evidência 125

Prentice RL (1986). A case-cohort design for epidemiologic cohort Endereço para correspondência:
studies and disease prevention trials. Biometrika 73: 1-11. MARCO AURELIO PINHO DE OLIVEIRA
Rua Coelho Neto, 55 / 201
Rothman KJ, Greenland S (1998). Modern epidemiology. 2nd ed. Laranjeiras - Rio de Janeiro - RJ
Philadelphia: Lippincott-Raven. Tel.: (21) 9987-5843
E-mail: maurelio@infolink.com.br

Brazilian Journal of Videoendoscopic Surgery - v. 3 - n. 3 - Jul/Sep 2010 - Subscription: + 55 21 3325-7724 - E-mail: revista@sobracil.org.br
ISSN 1983-9901: (Press) ISSN 1983-991X: (on-line) - SOBRACIL - Press Graphic & Publishing Ltd. Rio de Janeiro, RJ-Brasil

Você também pode gostar