Como o mestrado que frequentamos se encontra directamente ligado à
educação, achámos que seria pertinente fazer uma breve reflexão sobre a realidade educativa portuguesa na actualidade. A nosso ver, a educação é importante não só a nível económico como também a nível político e social. A nível económico, porque a certificação concedida pelo ensino permite formar cidadãos com mais competências, o que lhes confere mais oportunidades de emprego no mercado de trabalho, que também acaba por beneficiar. A nível político, porque com a avaliação dos alunos está-se a avaliar também o sistema educativo, no qual estes mesmos alunos se inserem e isso permite ter uma ideia das medidas que deverão ser implementadas em prol da crescente qualidade do ensino nas escolas, permitindo às entidades políticas justificar aos cidadãos o uso do dinheiro público. A nível social, pois os cidadãos, na posse do seu direito por um ensino de qualidade, poderão constatar o grau dessa qualidade. É óbvio que a avaliação no ensino vai originar competitividade, não só a título individual, mas também a título institucional, isto é, as próprias escolas vão competir entre si. Neste sentido, a realização de rankings – principal objecto de avaliação das escolas, alunos e professores - vem fomentar e acentuar esta competição entre escolas e permite distinguir, através de valores quantitativos, o carácter qualitativo de cada instituição de ensino existente a nível nacional, sendo o ranking «a única avaliação possível da escola e, simultaneamente, do trabalho dos professores» (Alves e Tomé 2006: 242). A nosso ver, numa sociedade que se caracteriza pela hierarquização, o ranking das escolas pode acabar por ser uma forma de incentivar as assimetrias sociais, levando à discriminação. Isto porque o ranking, ao hierarquizar as escolas, atribui-lhes um determinado estatuto que, consequentemente, irá repercutir-se sobre os alunos que frequentam essas mesmas instituições. Esta discriminação social é, também, referida por David 1 Justino, quando afirma que as «escolas mais fracas, com piores resultados seriam vítimas dos mecanismos de discriminação social, acentuando assim a diferenciação entre escolas socialmente elitizadas e escolas estigmatizadas» (Justino, 2004: 7). Ora, na nossa opinião, se a igualdade é um direito e um dever associado à educação, a elaboração de rankings não virá contrariar este carácter equitativo da educação? Cremos que sim, pois ao hierarquizar as escolas estão a ser criadas (ou até acentuadas) as assimetrias sociais, políticas e económicas. Na realidade, o que é importante avaliar são as competências dos alunos, mas os rankings avaliam sobretudo as escolas e, consequentemente, o desempenho dos professores. Um estudo realizado por Alves e Tomé 1 dá-nos a conhecer a percepção que os professores têm relativamente à realização de rankings. Todos os professores discordam da realização de rankings nas escolas. Foram seis os argumentos apresentados por estes para defenderem a sua posição relativamente a este assunto: primeiro, a injustiça dos rankings, visto que comparam realidades diferentes; segundo, os rankings não contemplam o trabalho desenvolvido no interior da escola para promover, por exemplo, melhores condições de estudo ou o sucesso nos resultados escolares; terceiro, os rankings não têm em consideração que os critérios de avaliação nas escolas podem ser diferentes dos critérios de avaliação nos exames nacionais; quarto, os rankings não têm em conta o facto de muitos alunos de classes sociais favorecidas poderem ter tido apoio extra- curricular, contribuindo assim para o bom desempenho escolar desses mesmos alunos; quinto, os rankings não incluem nos seus dados as expectativas do aluno no que se refere ao seu futuro profissional e, finalmente, o sexto argumento é que «a tipologia de alunos é mais importante do que a instituição escolar para estabelecer níveis de resultados escolares» (Alves e Tomé, 2006: 246). Ainda de acordo com os mesmos autores, os resultados dos rankings das escolas pressionam de certa forma os professores a ter de «avançar na matéria» de forma a cumprirem o programa curricular, na tentativa de prepararem melhor 1 ALVES, M. P.; TOMÉ, I.M. (2006). «Os rankings das escolas secundárias em Portugal: da(s) intencionalidade(s) política(s) à sua representação nos professores». Revista portuguesa de pedagogia, Ano 40-3. 2 os alunos para os exames nacionais a que serão sujeitos; isto retira ao professor uma certa autonomia no que se refere à metodologia aplicada na sala de aula que é, maioritariamente, de carácter expositivo. Valorizando metodologias expositivas (e podemos comprovar esta afirmação com a nossa experiência pessoal), o professor acaba por condicionar o desenvolvimento da capacidade crítica dos alunos, tornando-os «alunos passivos face ao saber» (Alves e Tomé, 2006: 249). Esta situação vem comprovar que os rankings das escolas acabam por ser um processo de avaliação dos professores e da instituição de ensino e muito pouco dos alunos. A leitura do referido estudo permitiu-nos descodificar três níveis de contradições entre os ideais educativos e a realidade: ao nível micro, o facto de os professores condicionarem a sua metodologia e práticas docentes em função da nota; ao nível meso, o facto de as escolas se preocuparem cada vez mais com a sua imagem, permitindo-nos falar de marketing educativo; e ao nível macro, o facto de, sendo a educação controlada pelo Estado, a autonomia das escolas poder ser encarada como uma mera ilusão. De tudo isto podemos concluir que há uma enorme contradição entre a Lei de Bases do Sistema Educativo e a realidade, tornando aquela num objectivo ideal, utópico e não confirmado pela realidade.