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CAP – II – MONTEIRO, Nuno Gonçalo. A ocupação da terra.

→[p. 67-91]

CAP – III – SÁ, Isabel dos Guimarães. O trabalho.

→[p. 93-121] “peso esmagador do trabalho agrícola na economia portuguesa. Com


exceção de Braga, Lisboa, Évora e respectivo termo e o caso de Portimão (onde o
número de trabalhadores indiferenciados parece excessivo), o grosso da mão de obra
insere-se no sector primário” [97]. No tocante à divisão regional desse setor, “no Norte,
sobretudo no Minho, predomina a figura do lavrador que trabalha terras suas ou
arrendadas, prescindindo geralmente de trabalhadores rurais contratados a termo. Até ao
concelho da Feira, o número de jornaleiros permanece sempre abaixo dos 10%;
contudo, nas unidades seguintes, o seu número corresponde já a mais de 40% dos
trabalhadores agrícolas. Em contrapartida, à medida que caminhamos para o Sul,
diminui o número de lavradores”. “Embora não forçosamente proprietários da terra que
cultivavam, os lavradores exploravam uma ou mais herdades, enquanto os seareiros se
responsabilizavam pelo cultivo de simples courelas, distinguindo-se dos assalariados
pela posse de um capital fixo. Na hierarquia do trabalho da terra, os lavradores
constituíam trabalhadores enraizados, estando claramente acima dos seareiros e
assalariados, que constituíam a massa esmagadora dos trabalhadores do campo no
Portugal mediterrânico”. “A forma de exploração da terra reflete a grande dimensão das
propriedades fundiárias” [100]. Em relação ao quadro da agricultura, “a pesca tem uma
expressão reduzida, uma vez que apenas se representam três localidades do litoral com
atividade significativa (Póvoa do Varzim, Matosinhos e Cascais)”. “Não será excessivo
frisar uma vez mais o carácter irregular e inconstante do trabalho agrícola, onde os
tempos mortos alternavam com períodos de grande azáfama, possibilitando aos
habitantes das zonas rurais a participação numa gama de actividades tanto industriais
como comerciais” [101].

CAP – V - SERRÃO, José Vicente. Agricultura.

→[p. 145-175] “Talvez em nenhuma outra época da história de Portugal se tenha


discutido e escrito tanto sobre a agricultura como nos finais do século XVIII e
princípios do século XIX. Para as elites econômicas, administrativas e políticas, a
reflexão sobre a situação e os destinos da economia do país passava na ordem do dia e,
o que é mais, tinha sido hegemonizada por preocupações e concepções agraristas. Daí
resultou uma abundante literatura, publicada ou não, composta por largas dezenas de
escritos de toda a espécie (opúsculos, memórias acadêmicas, pareceres, consultas,
cartas, relatórios, planos, projetos, etc.) dedicados à agricultura ou onde esta, de uma
forma prioritária ou não, é objeto de atenção” [145]. De onde surge tamanho interesse?
Tem a ver com um diagnóstico de fracasso ou com uma preocupação relativa à remoção
dos obstáculos para seu contínuo avanço? “Por outras palavras: [esses escritos]
reportavam-se a uma agricultura decadente e que havia fracassado ou a uma agricultura
em crescimento que se confrontava com fatores de bloqueio?” Talvez um pouco de tudo
isso tenha sido referido, com tendência forte a frisar o atraso. Mas do ponto de vista dos
fatos, “na globalidade, pode-se dizer que o século XVIII foi um bom século agrícola”
[147]. “Visto do lado do setor agrário, o século XVIII apresenta assim uma quadro
macroeconômico que, simplificando muito, se poderia caracterizar do seguinte modo:
havia mais gente para alimentar e querer terra; havia mais dinheiro para investir nela;
havia mais oportunidades de mercado; e havia até, devido à ‘abundância’ de meios de
pagamentos das importações, a oportunidade para abdicar de atividades agrícolas menos
rentáveis”. O contexto era, portanto, de crescimento populacional e de divisas,
proporcionadas em grande monta pelo ouro brasileiro [149]. Mais ainda, o que vinha
animar a agricultura portuguesa era a expansão do mercado, seja interno, impulsionado
pelo aumento dos rendimentos monetários de uma parte da população, seja ele externo,
puxado pelo Brasil e pela Inglaterra, principalmente [152]. “Recapitulando:
enriquecimento e reconversão da paisagem e do produto agrícola, alargamento da área
cultivada, aumento da produção, algumas novidades técnicas, maior investimento na
agricultura, maior dependência e boa reação aos estímulos do mercado, revalorização
comparativa da agricultura no quadro geral da economia portuguesa. O balanço é,
portanto, globalmente positivo”. Mas havia gargalos: alguns deles diziam respeito à
“estrutura da propriedade, com sua distribuição social e com os regimes de apropriação
da renda agrícola, onde se destacavam as restrições ao investimento e à mobilidade do
mercado fundiário impostas pelos vínculos, pelos bens de mão-morta e pelos direitos
coletivos, bem como o efeito de descapitalização da atividade agrícola provocado pelos
direitos senhoriais e contratuais”. Outros gargalos derivavam de uma infraestrutura
precária e de um modo de vida de autoconsumo de comunidades alheias aos impulsos
do mercado. Mas o que era mais frisado era a falta de pão, entendida como
consequência do problemático uso do solo ou do seu não uso, o que levava à importação
de cereais estrangeiros [154]. Até que ponto os críticos da época tinham razão? “o
século XVIII não conheceu uma tendência única: registrou períodos de expansão da
produção, períodos de declínio e períodos de verdadeira crise. Tanto para o conjunto da
agricultura como naquilo que diz respeito especificamente ao setor cerealícola, está,
portanto, fora de questão tomar o século XVIII como uma época de declínio sistemático
da produção, ou de crise, ou de decadência – os dados existentes não dão sustentação a
essa tese. Aliás, na maioria dos casos em que é possível fazer a comparação, verifica-se
que a produção cerealífera era mais elevada no século XVIII do que no XVII” [161].
Mas então os críticos da época não tinham razão alguma em suas admoestações
relativas à carência de cereais e à submissão portuguesa nesse tocante às importações
advindas das mais diversas regiões europeias e inclusive dos EUA a partir do final da
década de 1770? “a dependência frumentária do exterior existia, sem dúvida, mas, no
cômputo nacional, ela nada tinha de dramático. Apenas no que respeitava ao
abastecimento da capital era flagrante a prevalência dos cereais importados, e, a serem
corretos os valores de 1729, pode dizer-se que esse fenômeno se tinha acentuado no
decurso do século. A questão foi muito empolada pelas elites intelectuais e políticas da
segunda metade do século XVIII. Mais familiarizadas com a situação de Lisboa, que era
a que conheciam melhor, e mais dominadas por preconceitos de ordem política ou moral
(a defesa do ‘interesse público’, do ‘bem comum’ e da soberania), terão tomado a parte
pelo todo, construindo a partir daí uma imagem muito criticada do conjunto da
agricultura, carregada de tons negros e genericamente pessimistas”. Portanto, “há que
rever seriamente essa visão tradicional que os publicistas da época nos legara (e da qual
a própria historiografia tem tido dificuldades em se libertar), segundo a qual o país
padecia de uma grave dependência frumentária, sinal de crise profunda da
cerealicultura, ou mesmo, nalgumas generalizações ainda mais ousadas, sinal de que
toda a agricultura portuguesa chegou ao final do século XVIII mergulhada na crise”
[172].

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