Você está na página 1de 7

Arquitetura Bioclimática: A integração do cobogó ao ambiente

construído como ferramenta geradora de conforto térmico e lumínico


em regiões quentes e úmidas

Darllan Fabiani da Silva Santos


Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões - URI, Campus II - Erechim, Brasil.
E-mail: darllanfabiani@hotmail.com

Resumo: É de importância notória a aplicação da arquitetura bioclimática nos dias atuais, em que
está mais do que evidente a escassez energética e a necessidade de ações voltadas à sustentabilidade.
O cobogó se tornou elemento modular emblemático na arquitetura modernista brasileira, porém na
década de 60, passou a ser aplicado em fachadas posteriores, nas áreas de serviço, devido à sua
necessidade de ventilação permanente, o foi determinante para a sua desvalorização. Com o seu
valor resgatado nas últimas décadas, busca a adequação do projeto de arquitetura ao meio ambiente
natural, priorizando as soluções passivas de ventilação e iluminação, desde a sua fase de concepção.
Este artigo tem como propósito fomentar a integração do cobogó ao ambiente construído com a
adoção de conceitos bioclimáticos, através de revisão bibliográfica, cuja metodologia aplicada foi a
desk-research, com base em anais de Congressos, do Banco Digital de Teses bem como Livros, que
corroboram a sua eficiência energética ao proporcionar ventilação natural permanente e filtragem
dos raios solares, em regiões quentes e úmidas.

Palavras-chave: Arquitetura bioclimática; Eficiência energética; Sustentabilidade; Ambiente


construído.

Abstract: It’s of eminent importance to application of bioclimatic architecture today, which is more
than obvious energy shortage and the need for actions aimed at sustainability. The Cobogó became
emblematic modular element in the Brazilian modernist architecture, but in the 60s, is now applied in
later facades in the areas of service, due to their need for permanent ventilation, it was crucial to its
devaluation. With its value rescued in recent decades, seeking the adaptation of architectural design
to the natural environment, giving priority to passive solutions for ventilation and lighting, from its
design stage. This article aims to promote the integration of Cobogó the built environment with the
adoption of bioclimatic concepts through literature review, using methodology was the desk-research,
based on Congress proceedings, the Thesis Digital Bank as well as books, supporting its energy
efficiency by providing permanent natural ventilation and filtration of sunlight in hot and humid
regions.

Keywords: Bioclimatic architecture; Energy efficiency; Sustainability; Built environment.


1. INTRODUÇÃO
O crescimento populacional, o consumo exacerbado de bens e serviços e a exploração desenfreada dos
recursos naturais para atender a esta demanda de consumo são as fontes motivadoras das crises
energéticas e das alterações climáticas, que interferem no equilíbrio do planeta.
O Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC), órgão das Nações Unidas, responsável
por produzir informações científicas, afirma que há 90% de certeza que o aumento de temperatura na
Terra está sendo causado pela ação do homem (WWF Brasil, 2016).
Com a necessidade de uma nova postura frente aos problemas explicitados, surge o conceito de
sustentabilidade, que parte de um desenvolvimento econômico e material sem agredir o meio
ambiente, através do uso dos recursos naturais de forma inteligente, para que estes se preservem no
futuro.
Na construção civil, passam a ser adotadas ações voltadas ao consumo de energias renováveis e
incorporação de materiais, que proporcionam maior eficiência energética às edificações.
A arquitetura bioclimática fomenta a integração harmoniosa entre o ambiente construído, o clima e as
suas relações de trocas energéticas passivas, buscando o conforto ambiental do usufrutuário e podendo
este ser térmico, lumínico, acústico, entre outros. Como consequência, oferece valores significativos
de redução de energia, que comprovam a eficiência energética.
No Brasil, nota-se um crescimento notório na aplicação de conceitos bioclimáticos e de eficiência
energética, porém em regiões menos desenvolvidas, este crescimento ainda é pejoso.
O setor da construção civil é um dos que mais oneram o meio ambiente, devido ao seu grande
dispêndio de recursos naturais e grande consumo de energia elétrica.
Segundo Gauzin-Mullër (2011), as edificações consomem em torno de 50% dos recursos naturais,
40% da energia elétrica e 16% da água, além de produzirem mais resíduos de construção e de
demolição do que o lixo doméstico.
O cobogó, simples elemento pré-fabricado no início do século XX, em Pernambuco, forneceu grande
contribuição estético-funcional para a arquitetura moderna brasileira, ofertando iluminação natural e
ventilação permanente.
Este artigo tem como objetivo resgatar esta contribuição à arquitetura brasileira, por meio de revisão
bibliográfica, apresentar novas configurações como cores, materiais, desenhos, funções e como
justificativa, a grande relevância deste elemento para a busca da eficiência energética no ambiente
construído.

2. O COBOGÓ
Criado em 1929, por um comerciante português Amadeu Oliveira Coimbra, um alemão Ernest August
Boeckmann e um engenheiro pernambucano Antônio de Goés, que moravam em Recife. O nome
cobogó são as iniciais dos sobrenomes dos seus criadores e foi elaborado para amenizar as condições
climáticas presentes nos interiores das residências nordestinas, por meio de paredes, que permitem ao
ambiente uma ventilação permanente e uma redução na incidência de luz solar, sendo este material
indicado para climas quentes e úmidos.
Vieira, et al., (2013) define o cobogó como elemento prático-construtivo inovador e apropriado
largamente, desde 1935, sendo hoje um marco de composição utilitária e estético-funcional no Brasil.

A caixa d’água de Olinda (fig. 01), projetada pelo arquiteto Luiz Nunes, foi o primeiro edifício de
expressão, que se utilizou do cobogó. Com o formato de um grande paralelepípedo verticalizado,
aplicado sobre pilotis e possui uma fachada frontal cega e duas empenas laterais com módulos de pré-
fabricados aplicados.

FIGURA 1 – Caixa d’água de Olinda-PE, 1937.

Fonte: Blog da arquiteta (2016).


A obra de Luiz Nunes ficou marcada pelo seu pioneirismo na implantação da arquitetura moderna no
Brasil. Na caixa d’água de Olinda podemos identificar alguns princípios corbusianos como: lajes
planas, pilotis, estrutura independente e fluidez espacial (plantas livres).

3. ARQUITETURA MODERNISTA BRASILEIRA


O período homérico da arquitetura nacional surge no mesmo da Semana de Arte Moderna de 1922 e
da Revolução de 1930, sendo possível criar uma linguagem própria da arquitetura moderna brasileira,
com a implantação do cobogó ao ambiente construído, pelo arquiteto Luiz Nunes e posteriormente por
outros arquitetos, uma solução construtiva adequada para regiões quentes e úmidas, baseada nos
muxarabis e gelosias, que são oriundas da arquitetura mourisca e trazidas pela colonização portuguesa.

Mais ao sul do país, jovens arquitetos passam a assumir posições inovadoras, modernas e negar o
tradicionalismo conservador. Entre estes arquitetos estão Oscar Niemeyer, Rino Levi, Afonso Eduardo
Reidy, com a condução de Lúcio Costa.
Borba, et al., (2013) a experiência foi o prenúncio do que seria uma presença corrente na arquitetura
moderna brasileira- protagonizada nacionalmente por Lúcio Costa, Oscar Niemeyer e seguidores, mas
principalmente por obras no nordeste brasileiro, não apenas do arquiteto Luiz Nunes, mas por outros
arquitetos.
Entre as edificações, destacam-se: O Conjunto Residencial Prefeito Mendes de |Moraes / RJ, Também
conhecido como Edifício Pedregulho, projeto do arquiteto Afonso Eduardo Reidy, em 1947 e o Parque
Guinle – Edifícios Residenciais / RJ, projeto de Lúcio Costa, em 1948 (fig: 02)

FIGURA 2 – Lado esquerdo - Edifício Pedregulho-RJ, 1954 e Lado direito - Parque Guinle-RJ, 2015.

Fontes: Arch Daily (2016) e Arqguia (2016) respectivamente.


O cobogó foi muito utilizado entre as décadas de 40 e 50, disponibilizando ao ambiente construído
ventilação permanente e iluminação natural e foi muito usado na construção da nova capital, podendo
ser encontrado em residências e prédios públicos do plano piloto. Porém, com a sua aplicação em
áreas de serviço, local com necessidade de constante ventilação, passou a ter uma imagem
depreciativa.

Duarte e Gonçalves (2006) ressaltam que a arquitetura modernista brasileira, em especial, no período
de 1930 a 1960, utilizou-se de soluções bioclimáticas, como o emprego de brises e cobogós.

4. ARQUITETURA BIOCLIMÁTICA
A arquitetura bioclimática surgiu na década de 60 com o propósito de adequar o projeto arquitetônico
ao meio ambiente natural, disponibilizando ao ambiente construído, soluções passivas de conforto
térmico, lumínico e acústico e por consequência, maior eficiência energética. Como exemplo o cobogó
(fig: 03).
FIGURA 03 – Esquema ilustrando como o cobogó oferta ventilação permanente e a filtra os raios
solares.
Fonte: Autor (2016).
Contudo, esta solução de aproveitar os recursos naturais disponíveis, já era partilhada entre nossos
ancestrais, com o propósito de sobreviver às diversas variações climáticas e ficou conhecida como
arquitetura vernacular. Nas cavernas, encontravam proteção do frio, das chuvas e de ataques de
animais.

Atualmente, a arquitetura bioclimática busca fornecer conforto, qualidade de vida e evitar algumas
doenças, através de inúmeras soluções passivas (fig.04).

Fig: 04 - Esquema do sistema bioclimático.

Fontes: Blog angelusbahia (2016).

Na busca de soluções relacionadas ao clima e às zonas climáticas, são considerados alguns dados
meteorológicos, como temperatura do ar, umidade absoluta e relativa do ar, vento, radiação solar e
umidade. E na busca de soluções voltadas à implantação, são considerados os ventos dominantes, os
tipos de cobertura do solo, a taxa de ocupação do terreno, as fontes de ruído, a orientação solar, entre
outros.

O cobogó propicia ventilação permanente por diferença de pressão (solução passiva), promovendo a
renovação de ar, resfriamento do ambiente e iluminação natural por meio de filtragem dos raios
solares.

Para Corbella e Corner (2010) evidencia que será possível o usufruto da ventilação cruzada no
ambiente construído, quando houver diferença de pressão entre as aberturas.
Bras, et al., (2004) A boa iluminação de um edifício, sobretudo com luz natural é essencial ao seu bom
funcionamento energético e ao conforto dos seus ocupantes. Aproximadamente 25% do consumo
energético em edifícios são utilizados no sistema de iluminação.

5. O RETORNO DO COBOGÓ

Depois de desvanecer das fachadas, que eram moda nos anos 60, o cobogó vem retornando à
construção civil, mas de forma muito introvertida, nos últimos anos. Atualmente, pode ser encontrado
em sua antiga configuração, concreto e em novos materiais como mármore, vidro, cerâmica, resina,
PVC e acrílico. Podemos encontrá-lo em muros, paredes internas (fig: 05) e até em peças de design.

Fig: 05- Paredes internas com aplicação do cobogó.

Fontes: Blog anual do design (2016).

Fig: 06- Exemplos de design de mobiliário com aplicação do cobogó.

Fontes: Blog anual do design (2016).

Contudo, torna-se indispensável, uma maior divulgação do material e seus benefícios ao ambiente
construído. Ademais, a criação de soluções inovadoras, que envolvam o uso do cobogó, material
genuinamente brasileiro e que precisa ser mais valorizado.

6. CONCLUSÕES

Por intermédio da revisão bibliográfica, foi possível resgatar a história do cobogó, material
genuinamente nacional, criado em Recife e confirmar a sua notória importância na arquitetura
modernista brasileira, ao fornecer ao ambiente construído, ventilação permanente e iluminação natural.
Passou por um período de desvalorização, devido à sua aplicação em áreas de serviço, mas que
conseguiu retornar, ainda de forma tímida ao mercado, com sua integração ao ambiente construído, na
arquitetura bioclimática.
Por fim, foi identificada de forma categórica, a necessidade de divulgação do material e seus
indiscutíveis benefícios ao ambiente construído. Além da necessidade de criar novos usos e técnicas,
que ratifiquem o compromisso do ramo da construção civil, em adotar soluções sustentáveis, que
fomentem a eficiência energética e o conforto ambiental das construções.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
As mudanças climáticas. Disponível em:
<http://www.wwf.org.br/natureza_brasileira/reducao_de_impactos2/clima/mudancas_climaticas2/>.
Acesso em: 17 out. 2016.

Benefícios da Arquitetura Bioclimática em cidades úmidas. Disponível em:


<http://angulusbahia.blogspot.com.br/2013/10/beneficios-da-arquitetura-bioclimatica.html >. Acesso
em: 18 out. 2016.

BRAZ, R.; GAMA, P.; LANHAM, A. Arquitetura Bioclimática Perspectivas de Inovação e Futuro.
Lisboa, 2004.

Clássicos da Arquitetura: Conjunto Residencial Prefeito Mendes de Moraes (Pedregulho) / Afonso


Eduardo Reidy. Disponível em: < http://www.archdaily.com.br/br/01-12832/classicos-da-arquitetura-
conjunto-residencial-prefeito-mendes-de-moraes-pedregulho-affonso-eduardo-reidy Acesso em: 17
out. 2016.

CORBELLA, O.; CORNER, V. Manual da Arquitetura Bioclimática Tropical para a Redução do


Consumo Energético. Rio de Janeiro, 2012.

DUARTE, D. H. S.; GONÇALVES, J. C. S. Arquitetura Sustentável: uma integração entre ambiente,


projeto e tecnologia em experiências de pesquisa, prática e ensino. Ambiente construído. Porto Alegre,
2006.

GAUZIN-MULLËR, D. Arquitetura Ecológica. São Paulo: Editora Senac, 2011.

LAMBERTS, R.; DUTRA, L.; PEREIRA, F. O. R. Eficiência Energética na Arquitetura. 3ª. ed.:
PROCEL, ELETROBRÁS, MME, 2013.

Luis Nunes. Disponível em: <http://arquitetablog.blogspot.com.br/2011/03/luiz-nunes.html>. Acesso


em: 17 out. 2016.

O uso do cobogó na arquitetura bioclimática. Disponível em: <http://sustentarqui.com.br/dicas/o-uso-


do-cobogo-na-arquitetura-bioclimatica/> Acesso em: 17 out. 2016.

Parque Guinle / Edifícios Residenciais. Disponível em: <http://arqguia.com/obra/parque-guinle-


edificios-residenciais/?lang=ptbr >.Acesso em: 17 out. 2016.

VIEIRA, A.; BORBA, C.; RODRIGUES, J. Cobogó de Pernambuco. 1ª. Ed. Recife, 2013.

Você também pode gostar