Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
acção?
o
que
é
o
personagem?
e
o
tempo?
e
o
espaço?
–
e
o
estabelecimento
concreto
de
projectos
de
«jeu»
a
partir
duma
cena
ou
dum
fragmento
de
texto.
No
primeiro
caso,
sou
eu
que
tenho
a
palavra.
No
segundo,
são
os
alunos:
fazem
propostas.
Mas
é
preciso
ainda
esclarecer
essas
propostas.
Estabelecer
a
escolha
dramatúrgica
em
que
assentam.
E
reconstruir,
alimentar
o
«jeu»
a
partir
dessa
escolha
–
como
forma
de
resposta
(entre
outras
igualmente
possíveis)
ao
texto
(e
não
como
tradução
deste).
Digamo-‐lo
em
termos
brechtianos:
através
do
seu
«jeu»,
o
actor
faz-‐me
uma
proposta;
dessa
proposta,
retiramos
uma
fábula;
o
«jeu»
reassume
essa
fábula,
deduz
dela
outras
propostas,
etc.
Na
melhor
das
hipóteses
–
aquela
em
que
vários
grupos
de
actores
atacam
o
mesmo
texto
–
o
confronto
entre
propostas
e
fábulas
diferentes
é
particularmente
produtivo.
Então,
essas
fábulas
constroem-‐se
a
partir
das
suas
diferenças.
O
leque
dramatúrgico
pode
abrir-‐se.
E
a
escolha
torna-‐se
mais
clara,
mais
aguda.
Uma
prática
de
passagem
responsável
Entendo
a
dramaturgia
não
como
uma
ciência
do
teatro
mas
como
uma
consciência
e
uma
prática.
A
prática
duma
escolha
responsável.
É
claro
que
se
alimenta
de
todas
as
ciências
que
podem
tomar
o
teatro
como
objecto,
mas
ela
converte-‐as
em
acto.
Ela
é
decisão
de
sentido.
Por
isso,
diz
respeito,
em
última
análise,
ao
actor.
Ele
é
o
seu
sujeito
privilegiado;
é
através
dele
que,
no
teatro,
tudo
ganha
sentido,
mas
ele
é
também
o
seu
instrumento
decisivo:
o
sentido
só
se
produz
através
do
seu
«jeu».
É
verdade
que
ele
opera
num
campo
definido
previamente:
o
da
encenação.
Mas
é
ele
que,
em
última
instância,
tem
o
poder
de
decisão
e
de
comunicação:
o
«jeu»
é
a
própria
carne
da
dramaturgia.
Dramaturgia,
encenação
A
nossa
concepção
moderna
da
dramaturgia
está
naturalmente
ligada
ao
surgimento
da
encenação.
Ela
é-‐lhe
mesmo
anterior,
anuncia-‐a.
Encontramos
as
suas
premissas
na
Dramaturgia
de
Hamburgo
de
Lessing.
Esta
obra
marca
a
transição
entre
a
dramaturgia
normativa
e
textual
que
era
de
regra
na
época
clássica
e
a
nossa
prática
dramatúrgica.
Registemos
também
que
ele
corresponde
a
uma
exigência:
a
criação
dum
teatro
nacional
alemão
que
fosse
mais
do
que
uma
pálida
cópia
do
teatro
francês.
A
sua
primeira
preocupação
era
de
independência.
O
encenador
inscreve-‐se
em
fundo
nos
textos
teóricos
de
Lessing,
como
nos
de
Diderot.
O
seu
aparecimento,
no
fim
do
século
passado,
e
depois,
durante
o
nosso
século,
a
afirmação
da
sua
primazia
coincidirão
com
o
desenvolvimento
da
prática
dramatúrgica.
Na
verde,
eu
não
faço
nenhuma
distinção
entre
encenação
(entendida
no
sentido
teórico)
e
dramaturgia:
são
simplesmente
duas
faces
da
mesma
actividade.
Esta
união
entre
escrita,
encenação
e
dramaturgia
está
no
cerne
da
obra
teatral
de
Brecht.
Este
constatava,
a
propósito
do
seu
trabalho
com
Charles
Laughton
sobre
a
versão
americana
de
A
Vida
de
Galileu
(Galileo
Galilei),
que
«L.
manifestava
muito
ostensivamente
e
por
vezes
brutalmente
uma
indiferença
pelo
livro
de
que
o
autor
de
teatro
nem
sempre
dava
mostras.
Aquilo
que
nós
fazíamos
era
um
libreto;
a
representação
era
tudo.
Impossível
levá-‐lo
a
traduzir
partes
a
que
o
escritor
de
teatro
renunciava
para
a
representação
em
vista
mas
que
queria
guardar
para
o
livro!
O
importante
era
a
noite
de
teatro,
o
texto
só
tinha
que
a
tornar
possível;
no
decurso
da
representação
tinha
lugar
a
usura
do
texto,
ele
consumia-‐se
nela
como
a
pólvora
no
1
fogo
de
artifício!» .
No
limite,
em
Brecht
não
existia
diferença
entre
dramaturgia
e
encenação.
Eram
a
mesma
coisa.
Assim,
em
A
Compra
do
latão,
os
interlocutores
são
o
filósofo,
o
dramaturgo,
o
actor
e
a
actriz
e,
de
passagem,
o
operário
de
teatro
(o
electricista).
O
encenador
não
figura.
Confunde-‐se
com
o
dramaturgo.
A
dramaturgia
como
instituição
Paradoxalmente,
é
em
boa
parte
ao
Berliner
Ensemble
que
se
deve
a
instituição
do
dramaturgo.
O
surgimento
nos
nossos
teatros
de
«dramaturgos»
residentes,
distintos
dos
encenadores.
E
a
delimitação
da
dramaturgia
como
um
sector
de
actividade
específico.
Os
primeiros
dramaturgos
franceses
(Bataillon,
Jourdheuil,
etc.)
foram
inicialmente
de
inspiração
brechtiana.
É
sabido:
a
existência
dum
sector
dramatúrgico,
distinto
da
encenação
mas
mais
ou
menos
subordinado
a
esta,
é
regra
nos
teatros
alemães
e
em
todos
os
teatros
da
Europa
de
Leste.
Generaliza-‐se
também
agora
em
França.
Não
duvido
que
uma
tal
colaboração
entre
encenadores
e
dramaturgos
seja
muitas
vezes
frutuosa.
Peter
Stein
não
seria
o
que
é
e
não
teria
montado
os
espectáculos
que
realizou
sem
o
seu
trabalho
em
comum
com
dramaturgos
como
Dieter
Sturm
ou,
no
passado,
com
Botho
Strauss.
De
resto,
este
último
não
seria
o
escritor
que
é
agora
sem
a
sua
actividade
de
dramaturgo
na
Schaubuhne.
E
poderia
citar
muitos
mais
exemplos...
Mas
não
penso
que
se
possa
deduzir
daí
uma
independência,
nem
sequer
uma
especificidade
da
actividade
dramatúrgica
–
face
à
do
encenador.
A
dramaturgia
como
instituição
é
apenas
uma
questão
de
divisão
do
trabalho.
Não
de
definição
dum
campo
de
actividade
distinto
do
conjunto
da
realização
teatral.
Volto
ao
que
disse:
a
dramaturgia
é
um
estado
de
espírito.
Uma
prática
transversal.
Não
uma
actividade
em
si.
O
dramaturgo:
uma
profissão
de
transição
Direi
portanto
que
o
trabalho
de
dramaturgo
é
um
trabalho
de
transição.
Também
ele
tem
de
ser
«consumido»
no
fogo
de
artifício
da
representação.
É,
literalmente,
um
lugar
de
passagem.
Duvido
que
se
possa
ser
dramaturgo
uma
vida
inteira.
A
dramaturgia
não
se
pode
contentar
consigo
mesma.
Ela
tem
de
abrir,
seja
para
a
escrita,
seja
para
a
realização
de
espectáculos.
Talvez
nem
passe
de
uma
actividade
pedagógica.
Ela
ensina
um
estado
de
espírito.
Convida
os
prático
do
teatro
a
tomarem
consciência
da
sua
actividade.
Responsabiliza-‐os.
Torna-‐os
moralmente
responsáveis
do
ou
dos
sentidos
das
suas
realizações.
1
Cf.
«Composition
d’un
rôle:
le
Galilée
de
Laughton»,
em
Écrits
sur
le
théâtre,
texto
francês
de
Jean
Tailleur,
Gérald
Eudeline
e
Serge
Lamare,
l,Arche,
Paris,
1963.
p.
158.
2
Bernard
Dort
–
O
Estado
de
espírito
dramatúrgico
Os
actores:
dramaturgos
em
acção
Não
é
preciso
voltarmos
ao
meu
trabalho
no
Conservatório.
Concebo
a
minha
aula
de
dramaturgia
como
uma
espécie
de
laboratório
de
leituras
–
mas
de
leituras
compreendidas
no
sentido
que
se
dá
à
palavra
nos
Conservatórios
de
música.
O
texto
está
lá.
Trata-‐se,
evidentemente,
de
o
representar
(«jouer»).
Pode-‐se
fazê-‐lo
de
diversas
maneiras.
É
preciso
escolher
a
maneira.
Construí-‐la,
articulá-‐la.
Descobrir-‐lhe
no
mesmo
movimento
a
legitimidade
e
a
coerência.
Não
estabelecemos
um
projecto
dramatúrgico
prévio.
No
máximo,
fazemos
por
vezes
um
levantamento
de
escolhas
possíveis
(evocando,
por
exemplo,
a
história
das
interpretações
de
tal
ou
tal
texto
ou
recordando
as
grandes
opções
da
prática
teatral
actual
sobre
eles).
Mas
é
aos
alunos
que
compete
fazer
propostas
–
concretamente,
representando
(«en
jouant»).
São
eles
que
fazem
a
escolha,
que
a
inventam.
Só
então,
uma
vez
essa
proposta
feita,
podemos
abarcar
melhor
o
projecto.
Talvez
até
escrevê-‐lo:
enunciar
a
«fábula».
A
partir
daí,
o
actor
começa
a
interpretar.
Também
aqui
é
de
tomada
de
consciência
que
se
trata.
O
actor
dá-‐se
conta
e
dá-‐nos
conta
do
que
está
a
fazer.
Ele
assume
o
sentido
que
propôs
–
de
forma
deliberada
ou
não.
E
toda
a
turma
com
ele.
A
dramaturgia
no
espectáculo
Porque
o
actor
não
pode
ser
o
executante
dum
projecto
dramatúrgico
concebido
fora
dele
e
que
lhe
escaparia.
Dramaturgo,
encenador
e
actores
só
podem
produzir
juntos
esse
projecto
que,
ele
próprio,
não
passará
de
um
momento
–
momento
decisivo
porque
é
o
da
escolha
–
na
realização
da
representação
em
que
se
apagará,
em
que
será
também
«consumido».
Esta
responsabilização
do
actor
é
hoje
um
fenómeno
geral.
Os
actores
recusam-‐se
cada
vez
mais
a
ser
simples
executantes
em
espectáculos
cuja
concepção
lhes
escaparia
completamente.
Já
nem
se
consideram
apenas
intérpretes
de
personagens
que
existiriam
fora
deles
(também
a
noção
de
personagem
se
tornou
problemática).
Eles
são
parte
envolvida
num
conjunto
que
é,
2
precisamente,
a
representação.
Enquanto
tais,
eles
carregam,
juntos,
a
responsabilidade
dessa
representação.
Partilham-‐na.
O
projecto
dramatúrgico
elabora-‐se
assim
em
comum.
Não
antes
dos
ensaios.
Mas
durante.
Parte-‐se
talvez
duma
hipótese.
Duma
aposta
sobre
um
sentido
possível.
Essa
hipótese,
os
ensaios
vão
confirmá-‐la
ou
infirmá-‐la.
Enriquecê-‐la,
em
todo
o
caso.
A
dramaturgia
é
obra
de
todos,
no
próprio
acto
do
teatro.
Ela
é,
repito-‐o,
a
sua
consciência.
Lugares
de
dramaturgo?
Lugares
de
dramaturgo
nos
nossos
teatros?
Já
há.
Haverá
com
certeza
mais.
Nos
programas
dos
espectáculos
encontra-‐se
cada
vez
mais
uma
rubrica
«dramaturgia».
Tudo
isso
me
parece,
em
termos
gerais,
positivo.
Mas
cuidado.
A
multiplicação
dos
lugares
de
dramaturgo
pode
não
ser
a
melhor
resposta
possível
à
questão
duma
verdadeira
reflexão
dramatúrgica
na
actividade
teatral.
Por
um
lado,
criar
um
lugar
de
dramaturgo
só
pode
querer
dizer
que
se
sente
a
necessidade
de
escolhas
dramatúrgicas
na
elaboração
dum
espectáculo.
Pelo
menos
enquanto
hipóteses
prévias.
Nada
de
mais
necessário.
Um
espectáculo
não
é
evidente.
Tem
de
ser
motivado.
Por
outro
lado,
a
criação
desses
lugares
não
comportará
o
risco
de
fixar,
de
cristalizar
o
processo
dramatúrgico?
De
restringir
a
responsabilidade
dos
práticos,
em
vez
de
a
alargar?
Tem-‐se
um
dramaturgo.
É
a
ele
que
compete
a
tarefa
do
sentido.
Dá-‐se-‐lhe
a
tarefa...
e
não
nos
preocupamos
mais.
Depois,
é
o
encenador
que
tem
a
última
palavra.
No
pior
dos
casos,
o
dramaturgo
exprime-‐se
no
programa,
e
o
encenador
no
espectáculo...
Não
há
dúvida
de
que
uma
verdadeira
reflexão
dramatúrgica,
de
momento,
tem
de
passar
por
esse
especialista
que
é
o
dramaturgo
titular.
Mas
mais
uma
vez,
só
pode
ser
uma
passagem.
Essa
reflexão
tem
de
ultrapassar
também
essa
especialização.
O
dramaturgo
é
transitório.
Ele
só
lá
está
para
comunicar
as
suas
preocupações
aos
outros.
Uma
vez
o
estado
de
espírito
dramatúrgico
partilhado
por
todos,
o
dramaturgo
será
supérfluo.
Nada
seria
mais
nefasto,
neste
domínio
–
como
em
muitos
outros
–
que
uma
burocratização
da
dramaturgia.
Não
se
anda
muito
longe
disso,
por
vezes,
na
Alemanha...
«Conselheiro
literário»
No
Teatro
Nacional
de
Estrasburgo
não
sou
dramaturgo.
Sou
«conselheiro
literário».
Não
se
trata
duma
mera
questão
de
palavras.
Este
título
foi
escolhido
com
conhecimento
de
causa.
Precisamente
para
sublinhar
bem
o
que
diferencia
o
meu
trabalho
do
trabalho
dum
dramaturgo.
Darei
rapidamente
as
razões.
A
primeira
é
material
e
muito
circunstancial.
É
que,
se
faço
parte
do
pessoal
do
T.N.S.,
não
trabalho
lá
a
tempo
inteiro.
As
minhas
obrigações
no
Conservatório
e
o
meu
trabalho
pessoal
não
mo
permitiriam.
Não
posso
por
isso
assistir
a
todos
os
ensaios
dum
espectáculo.
Ora,
ser
dramaturgo
num
espectáculo
supõe
evidentemente
estar
presente
na
totalidade
do
trabalho.
No
meu
caso,
está
excluído.
Não
digo
que
não
o
lamento.
É
uma
experiência
que
gostaria
de
fazer,
pelo
menos
uma
vez.
A
segunda
razão
tem
a
ver
com
a
própria
concepção
da
função
em
Estrasburgo.
Ser
conselheiro
literário
é
participar
na
definição
da
política
de
conjunto
da
casa
–
artística
em
primeiro
lugar
mas
também
de
organização
da
empresa
T.N.S..
Num
teatro,
nada
é
separável:
sinto-‐me
envolvido
em
tudo
o
que
é
o
T.N.S.
(incluindo
a
escola).
Sendo
bem
entendido
que
o
poder
de
decisão
cabe
a
Jacques
Lassalle,
enquanto
director.
2
Nota
da
redacção
[de
T/P].
Em
Le
retour
des
comédiens-‐2,
Bernard
Dort
desenvolve,
a
propósito
da
evolução
recente
dos
actores,
as
ideias
que
aqui
recorda:
t/p
66,
Novembro
de
85.
3
Bernard
Dort
–
O
Estado
de
espírito
dramatúrgico
É
certo
que
no
meu
título
também
há
o
adjectivo
«literário».
Ele
indica,
se
não
uma
especialização,
pelo
menos
uma
direcção
do
meu
trabalho.
A
minha
preocupação
preferencial
é
no
domínio
dos
textos,
do
repertório.
Preparo
a
escolha
das
peças
que
serão
montadas,
proponho-‐a,
reaprecio
as
propostas
que
são
feitas
por
outros...
e
tenho
também
uma
palavra
a
dizer
sobre
a
programação,
os
espectáculos
convidados
–
sempre
numa
perspectiva
de
repertório...
Nesta
área,
tenho
evidentemente
um
papel
de
leitor
(mas
insisto:
a
minha
função
de
conselheiro
literário
não
se
resume
a
isso).
Dirijo
o
comité
de
leitura
do
T.N.S..
Esforçamo-‐nos,
efectivamente,
por
ler
as
peças
que
nos
são
enviadas.
Esforço-‐me
mesmo
por
responder,
de
forma
breve,
aos
seus
autores.
Uma
tal
actividade,
considerável,
nem
sempre
parece
frutuosa.
Muitos
dos
textos
recebidos
são
de
interesse
muito
reduzido.
E
as
nossas
possibilidades
de
montar
peças
novas
são
muito
limitadas.
Mesmo
assim,
tentamos
organizar
leituras
públicas
a
partir
dos
textos
seleccionados
pelo
comité.
Também
não
é
fácil.
E
ainda
é
preciso
que
haja
público
para
as
leituras.
Mas,
para
além
de
me
parecer
fazer
parte
da
missão
dum
teatro
nacional
manter
contacto
com
os
autores
virtuais,
não
penso
que
este
comité
de
leitura
seja
inútil:
ele
junta
membros
do
T.N.S.
(escola
incluída)
muito
diferentes
e
assim
uma
parte
do
pessoal
lê.
Aí,
interrogamo-‐nos
de
modo
informal
sobre
as
peças
que
nos
chegam,
levantamos
a
questão
do
repertório.
Em
suma,
a
reflexão
sobre
os
textos
extravasa
para
lá
do
circuito
fechado
do
director,
assistentes
e
conselheiro
literário...
Há
que
dar
um
lugar
mais
importante
ao
texto
na
actividade
teatral.
Não
se
ficar
pelas
peças
a
montar,
evocar
outras
peças,
evocar
outras
escolhas
possíveis.
Não
perder
o
contacto
com
a
escrita
contemporânea
–
com
as
escritas
de
hoje.
Acrescente-‐se
que,
idealmente,
as
nossas
leituras
não
se
deveriam
limitar
aos
textos
que
recebemos.
Elas
poderiam
incluir
também
os
textos
do
passado,
as
obras
do
nosso
repertório
nacional
caídas
no
esquecimento,
as
de
outros
repertórios...
Em
suma,
o
meu
sonho
é
um
comité
de
leitura
que
seja
também
uma
célula
de
reflexão
dramatúrgica.
É
claro
que
ainda
estamos
muito
longe
disso.
Temos
que
despachar
em
primeiro
lugar
os
«textos
correntes».
Mas
não
penso
que
a
transformação
deste
comité
numa
espécie
de
comité
de
repertório
seja
apenas
uma
utopia.
Seria
mais
uma
maneira
de
fazer
da
reflexão
dramatúrgica
aquilo
que
ela
deve
ser:
uma
questão
de
todos.
Em
terceiro
lugar,
a
maneira
como
Jacques
Lassalle
trabalha
exclui
a
colaboração
dum
dramaturgo.
Um
dramaturgo,
se
ouso
dizer,
«no
terreno».
Porque
Lassalle
não
parte
dum
projecto
pré-‐estabelecido
de
espectáculo.
Evidentemente,
quando
escolhe
montar
uma
peça,
fá-‐lo
por
um
certo
número
de
razões
e
numa
certa
perspectiva.
Tem
o
seu
próprio
discurso
de
homem
de
teatro.
A
sua
escolha
inscreve-‐se
nesse
discurso.
E
articula-‐se
com
uma
hipótese
de
espectáculo.
Mas
esse
espectáculo
só
ganha
corpo
e
forma
no
trabalho
com
os
actores,
portanto
progressivamente,
no
decurso
dos
ensaios.
Aí,
Lassalle
é
simultaneamente
encenador
e
dramaturgo:
ele
propõe
e
escolhe,
em
função
das
respostas
concretas
dos
actores.
Evidentemente,
a
minha
intervenção
foi
mais
especificamente
dramatúrgica
no
caso
das
duas
peças
que
eu
próprio
traduzi
e
que
ele
montou:
Woyzek
e
Emilia
Galotti.
Neste
caso
também
não
participei
na
realização
do
espectáculo.
Apenas
estive
presente
por
ocasião
das
primeiras
leituras
à
mesa.
Mas
foi
antes,
na
elaboração
definitiva
do
texto
francês,
que
Lassalle
e
eu
colaborámos
de
forma
propriamente
dramatúrgica.
Numa
fase
essencial:
a
duma
releitura
comum
do
primeiro
estado
do
texto
francês
que
eu
tinha
redigido.
Eu
lia
e
Lassalle
fazia-‐me
perguntas.
Então
eu
justificava
o
meu
texto
ou
modificava-‐o.
Pouco
a
pouco,
entre
nós,
uma
espécie
de
fantasma
do
futuro
espectáculo
ganhava
forma.
O
texto
previa
o
espectáculo
e
o
espectáculo
informava
o
texto...
Era
um
começo
de
«jeu».
Mas
não
mais
que
isso:
eu
era
apenas
o
responsável
do
texto
em
francês
e
o
encargo
do
espectáculo
era
integralmente
de
Jacques
Lassalle.
Mantínhamos
a
nossa
autonomia.
Mas
entre
nós
havia
um
claro
projecto
dramatúrgico
comum.
Resumindo,
nem
no
Conservatório
nem
no
T.N.S.
sou
dramaturgo,
se
se
entender
por
aí
uma
função
especializada.
A
função
de
alguém
que
diria
como
se
deve
representar,
que
é
detentor
duma
verdade
sobre
o
texto...
Mas,
aqui
e
ali,
sinto-‐me
envolvido
num
empreendimento
de
responsabilização
teatral
porque
o
teatro
não
se
pode
demitir
de
se
colocar
a
questão
do
seu
próprio
poder
de
representar.
De
se
interrogar,
dentro
da
sua
própria
prática,
sobre:
o
que
é
representar?
o
que
é
«jouer»
um
texto?
É
isso
que
eu
gostaria
de
chamar
a
minha
vocação
dramatúrgica.
Declarações
recolhidas
por
O.O.,
Paris,
22
de
Abril
de
1985,
texto
revisto
por
Bernard
Dort
in
Théâtre/public
67,
Janvier-‐Février
1986
Tradução
para
uso
em
aulas
de
Luís
Varela
Nota
do
tradutor:
ao
contrário
de
outros
textos,
em
que
uso
a
expressão
«dramaturgista»,
entendo
aqui
manter
a
ambiguidade
da
expressão
«dramaturgo»,
o
que
se
entenderá
facilmente
à
leitura
das
declarações
de
B.
Dort
neste
documento;
entendo
também
não
traduzir
a
palavra
francesa
«jeu»
(que
poderia
ser
traduzida
por
«representação»,
«interpretação»,
«trabalho»,
«jogo»...)
e
outras
palavras
e
expressões
associadas
(«jouer»,
«en
jouant»),
deixando
ao
leitor/estudante
a
tarefa
de
encontrar,
caso
a
caso,
a
palavra
portuguesa
mais
adequada.
4