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FINCHELSTEIN, Federico. Orígenes ideológicos de la “guerra sucia”.

Buenos Aires:
Sudamericana, 2016.
--

[Ebook; Kindle]
(I. Introducción: Del fascismo a los campos de concentración)

- “O pensamento fascista define a “guerra suja”. O fascismo proporcionou a base para


os princípios e práticas da violência que o governo argentino desatou contra grupos dos
seus cidadãos na década de 1970”

- “Como muitos outros argentinos, estou tratando de compreender os crimes de lesa


humanidade cometidos pelo governo de Videla: as desaparições, os campos de
concentração, os cidadãos torturados, drogados e logo arremessados ao Atlântico desde
aviões militares. Os cálculos oficiais oscilam entre 10.000 e 15.000 assassinados.
Segundo a maioria das organizações de direitos humanos, as vítimas foram 30.000, o
que tem de se somar o roubo de recém nascidos de mães detidas ilegalmente”

- “Sensivelmente, quero buscar os fatores ideológicos que levaram os assassinos a


matar. Por isso escrevi este livro”

- “Na América Latina, Videla é amplamente reconhecido como a versão argentina de


Hitler, mas a diferentemente do ditador fascista alemão, Videla nunca se pensou como
um personagem quase divino ou como o líder sagrado de uma religião política fascista”

- “De fato considerava a si mesmo como o representante político de Deus em solo


argentino. Mas o Deus de Videla, assim como sua missão terrena, tinha características
especiais; Se converteu no líder de uma das ditaduras mais assassinas da história e nesse
derramamento de sangue ele via a redenção do futuro para seu país, um futuro que faria
regressar a Argentina à civilização cristã. Como líder, Videla combinava a repressão
política extrema com uma versão selvagem de medidas de austeridade e desregulação
econômica. Todas estas medidas eram tomadas em nome da religião”

- “[...] a Igreja católica foi um dos principais apoios da junta militar”

- “A ditadura interpretava estas ações como parte de uma empresa cristã contra a
“subversão ateia” cuja justificação era eclesiástica e cujas ações eram militares”

- “[...] o Papa Francisco, que como padre Bergoglio era o jesuíta mais importante do
país, nunca falou contra isto. [...] Foi esta combinação de apoio e indiferença
eclesiástica que criou as condições ideológicas para os assassinatos perpetrados pelo
Estado”

- “Tanto a Igreja como os militares consideravam que a Guerra Suja era uma guerra
real, essencial para sua sobrevivência”

- “Quando se produziu o golpe de Estado de 1976, os laços entre a igreja e os militares


eram quase estruturais. Se viam a si mesmos como a essência da nação: o sagrado laço
argentino entre a cruz e a espada”

- “Este livro regressa a um passado que tem sido reprimido. A maioria dos
argentinos hoje divide com os historiadores profissionais a opinião que a ditadura levou
a cabo um ataque devastador contra uma das sociedades civis mais progressistas e não
seculares da América Latina. Esta opinião negativa acerca da junta militar não sempre
foi predominante na Argentina. Em seu momento chegou a ser muito popular, sobretudo
durante as primeiras etapas do golpe de Estado, no início de 1976, e durante as
celebrações do triunfo da Argentina na Mundial de Futebol de 1978”

- “A Guerra Suja não foi uma verdadeira guerra, mas uma militarização ilegal da
repressão estatal. Esta é uma expressão popularizada que tem que ser explicada em
relação com a genealogia fascista do país. Desde uma perspectiva histórica, a Guerra
Suja não tinha como protagonistas a dois combatentes, mas a vítimas e assassinos. A
verdade é que o Estado fez a “guerra” contra seus cidadãos. Este terror autorizado pelo
Estado tinha suas raízes nos movimentos fascistas dos anos do entreguerra que levaram
até seus campos de concentração”

- “A via da Argentina até o fascismo foi construída nas décadas de 1920 e 1930 e desde
então passou por muitas reformulações e personificações políticas e ideológicas, desde o
peronismo (1943-1955) até as organizações terroristas de direita nas décadas de 1960 e
1970 (especialmente Tacuara y Triple A) e a última ditadura militar (1976-1983)”

- “Esse livro analisa estas perguntas mostrando as maneiras com que o significado de
“fascismo” mudou em diferentes momentos da história”

- “Na atualidade, os especialistas usam “fascismo” no sentido amplo para descrever


qualquer regime autoritário, o terrorismo internacional (o chamado “islamofascismo”),
ou as atitudes repressivas por parte do Estado, mas esta amplitude é problemática do
ponto de vista histórico. Na América Latina o termo tem sido usado com frequência
mais como um instrumento de crítica política do que como uma ferramenta para a
análise crítica. Tem sido aplicado a figuras políticas que vão de Juan Domingo Perón
até Hugo Chávez e do general argentino Videla até o general chileno Augusto
Pinochet”

- “No caso da Argentina, é possível, por suposto, comparar a ditadura militar (1976-
1983) com as de Mussolini e Hitler. Não há nenhuma dúvida de que todos estes
regimes suprimiram a democracia. Todos mataram seus próprios cidadãos. Todos
promoveram a guerra (interior e exterior) como um instrumento político, quer dizer,
como a continuação da política por outros meios. Ademais, todas estas ditaduras
reprimiram os sindicatos de trabalhadores e outras formas de oposição ao regime.
Porém, as diferenças entre as ditaduras italiana e alemã e as da Argentina, e o
mesmo vale para qualquer outra ditadura política recente na América Latina e
outros lugares, são importantes que suas semelhanças. O fascismo alemão e o
italiano eram radicais em seu objeto de transformar o mundo conquistando-o. Itália e
Alemanha queriam forjar um novo Império Romano e um Reich de mil anos. Também
se esforçam por esquecer, de uma vez por todas, o legado da Revolução Francesa,
instaurando uma alternativa ao capitalismo e ao comunismo. Finalmente, os nazis e os
fascistas aspiraram a construir um estado de guerra permanente, quer dizer, uma guerra
total por meio da qual, como dizia Mussolini, aqueles governados pelos fascistas se
converteriam em novos homens. A ditadura argentina compartilhou algumas
dimensões ideológicas com Hitler e Mussolini, mas os argentinos foram mais
modestos. Queriam silenciar e de eliminar de forma seletiva toda oposição, concentrar o
capital econômico e político, e, ao final, ganhar uma guerra convencional no Atlântico
sul”

- “Ao fim das contas, o nazismo e fascismo italianos eram totalitários. Queriam
estabelecer uma forma extrema de governo, uma que busca o controle total da
sociedade. Como ocorre com “fascismo”, o conceito de “totalitarismo” é usado
frequentemente como um termo político mais que como uma categoria conceitual
histórico”

- “Neste sentido, o fascismo tem que ser considerado uma criação do entreguerras que
se caracteriza por uma política revolucionária específica orientada em direção as massas
e uma forma extrema de nacionalismo dotado de uma ideologia própria”
- “Este livro sustenta que esta ideia fascista do sagrado constitui uma dimensão central
da larga história argentina da violência no século XX”

- “O fascismo influenciou o peronismo, mas este não era necessariamente fascista.


Perón se mostrava como um estudioso de Mussolini. [...] Os elementos principais do
fascismo: nacionalismo e exclusivismo extremos, racismo, xenofobia e antissemitismo,
política de massas, rechaço ao legal do iluminismo, “imperialismo proletário” e anti-
imperialismo, violência política, terrorismo de Estado, ditadura e a sublimação da
guerra apareceram simultaneamente na América Latina e na Europa. Portanto, seria
difícil argumentar que o fascismo da Argentina era um produto importado. Havia muito
de apropriação, reformulação e distorção na recepção argentina do fascismo, e esta
recepção já estava “preparada” pelas ideologias intolerantes locais que a haviam
precedido”

- “Fascismo e extrema direita se converteram em sinônimos na Argentina”

- “A ideia do inimigo foi um elemento primordial do fascismo argentino. Também


constituiu um de seus legados mais horripilantes e duradouros. Os campos de
concentração da última ditadura argentina foram o lugar de sua consagração final em
nome de Deus, da espada e da pátria”

- “[...] Marcos Novaro e Vicente Palermo, o decisivo apoio da hierarquia católica a


repressão militar, ou seja, ao assassinato de 30.000 cidadãos, foi um elemento central do
plano militar para erradicar seus inimigos reais e inventados. Outra dimensão central do
plano era a aberta negação dos assassinatos. Esta negação era uma tentativa de borrar
a ideologia que o fazia possível”

- ““[...] As valas comuns são de pessoas que morreram sem que as autoridades as
conseguissem identificar. Desaparecidos? Não confunda as coisas. Você sabe que hoje
vivem tranquilamente na Europa [fala do cardeal Juan Carlos Aramburu, 1982]”. A
negação adquiriu seu significado por uma ideologia clerical ditatorial de genealogia
fascista”

- “O fascismo foi uma experiência mundial, mas na Argentina estava essencialmente


inserido nas tradições intelectuais e políticas nacionais”

- “De todos modos, os assassinatos cometidos pelo Estado na década de 1970 também
devem ser entendidos em relação com a genealogia argentina da violência que os
fizeram possíveis. Em último caso da última ditadura militar, o discurso e prática da
morte constituíam uma reformulação das ideologias e práticas já postas em prática pelos
fascistas argentinos nas décadas de 1920, 1930 e 1940”

- “O livro enfatiza as dimensões genocidas da perseguição de vítimas judias argentinas.


Proporcionalmente, a última ditadura argentina castigou os judeus argentinos mais que a
outros setores da população. Ainda que os judeus constituam menos de um por cento da
população, foram entre dez e quinze por cento das vítimas da ditadura militar. O livro
explica por que e como isto foi possível”

(II. As orígenes ideológicos de la argentina fascista)

- “Os nacionalistas da década de 1920 e 1930 eram a variante local argentina do


fascismo transnacional”

- “Sem dúvida, intelectuais do século XIX como Domingo Faustino Sarmiento, Juan
Bautista Alberdi y Bartolomé Mitre deram um significado nacional aos sentimentos
coletivos de pertencimento a um território específico. [...] E o que era mais importante:
tinham uma história comum. Esta história modelou o sentimento de pertencimento e,
com o tempo, criou novos mitos e reconstruções históricas”

- “Em outras palavras, esta era a ideologia da Argentina liberal”

- “A relação entre o nacionalismo inclusivo e aberto do século XIX e o exclusivo e


totalitário do século XX foi uma de acordos e colaboração, de laços afetivos e
afinidades eletivas. Embora durante o século XX muitos seguiram as dimensões mais
democráticas das ideias da razão do século XIX, outros preferiram explorar seus
elementos mais destrutivos”

- “Sarmiento, um campeão latino-americano do liberalismo e um dos fundadores da


Argentina moderna, exemplificava esta situação em 1844. Sentia “uma invencível
repugnância” pelos selvagens da América. Os via como “selvagens incapazes do
progresso” e propunha seu extermínio”

- “Na Argentina, a guerra de extermínio contra os povos indígenas patagônicos foi


empreendida para substitui-los por colonos brancos. Não foi uma guerra no sentido de
dois exércitos combatentes, mas uma guerra interna, um conflito beligerante em que o
Estado fez a guerra contra um segmento da população nacional, neste caso um grupo
étnico especial. Esta não seria a última vez”
- “O genocídio das populações nativas da Argentina foi executado por argentinos
modernos, não por conquistadores pré-modernos. O racismo e a ideia de que a
Argentina devia ser um laboratório do progresso, mas só para uma população europeia,
foi essencialmente uma ideia moderna. Os massacres patagônicos não foram um
produto da Argentina fascista mas de uma Argentina autoritária liberal com dimensões
destrutivas que anunciava e engendravam a possibilidade da primeira”

- “A bem verdade, a existência mesma do genocídio e da discriminação são sintomas da


falta de estruturas democráticas sólidas ou de sua instabilidade antes da chegada do
fascismo”

- “Estes sintomas (genocídio, racismo, repressão e desigualdade) poderiam ter


diminuído gradualmente, como ocorreu em outros lugares, mas de modo diferente se
fizeram mais profundos na Argentina do entreguerras. No processo, o nacionalismo
deixou de ser liberal”

Orígenes del ideal nacionalista

- “Como em todo argumento nacionalista, estas propostas eram uma expressão de


desejos político e não uma realidade. Segundo os nacionalistas, a Argentina moderna
necessitava uma forma ditatorial de governo. O fato de que nunca ter existido um
regime assim não era importante. Em sua percepção da necessidade de uma mudança
autoritária, os fascistas nacionalistas argentinos se viam a si mesmos como verdadeiros
revolucionários”

- “Leopoldo Lugones, o mais famoso e mais influente destes intelectuais, é


possivelmente o pai do fascismo argentino”

- “Através de Lugones, o nacionalismo se converteu em sinônimo de fascismo,


militarismo, ditadura e, ao fim de sua vida, da nação católica “argentina””

- “[...] Lugones depreciava a democracia que seus pares queriam promover. Se


considerava um revolucionário. [...] A posterior transição a direita de Lugones foi a
surpreendente adoção da forma autoritária de liberalismo promovida por importantes
membros da elite, como o general Roca, o general e presidente responsável do
genocídio patagônico. Lugones era muito próximo de Roca e se converteu no intelectual
mais brilhante da Argentina liberal”
- “Porém, durante toda a década de 1910 Lugones não foi fascista. De forma
semelhante, Mussolini não se fez fascista antes de 1919, também oscilando entre o
socialismo e os sentimentos belicistas e antidemocráticos. Lugones também passa de
uma ideologia a outra, mas isto não o tornava um oportunista. Sobretudo, igual a
Mussolini, baseava suas opiniões políticas em sentimentos e sensações não articuladas.
Ambos depreciavam as ideais sistemáticas e a democracia”

“O abismal contraste com os fascismo italianos e alemães, mas similar ao espanhol,


Lugones considerava as forças armadas como protagonistas chave da política. Entendia
o fascismo como militarista por natureza. Todos os fascismos necessitam de inimigos e
Lugones identificava os inimigos internos da pátria como argentinos que promoviam a
democracia”

Nacionalismo y dictadura

- “O fascismo oferecia uma nova forma de soberania, uma que tinha sua base no poder e
na violência. Para Lugones e outros fascistas, a soberania popular era coisa do passado.
Estava sendo substituída pelo que ele considerava uma forma mais autêntica de
legitimidade política”

- “Para fascistas como Lugones, esta forma de soberania não era mediada nem refletia
os resultados deliberativos e eleitorais. Portanto, a liberdade individual não era um tema
de preocupação global. O mundo buscava a “dominação” política, foi na forma de
“ditadura do capital, do proletariado ou do exército”. Afirmava que a “experiência”
demonstrava que a solução do problema social não se baseava em “concessões” mas no
emprego da força: “Lenin na Rússia e Mussolini na Itália tem suprimido a luta de
classes mediante a imposição da autoridade””

- “A Argentina democrática, para os nacionalistas, não era realmente argentina”

- “[Rodolfo Irazusta, 1928] “[...] A democracia é por natureza anticatólica. A


democracia é, pois, incompatível com as instituições argentinas”. Os nacionalistas
creiam na qualidade natural do caráter nacional argentino. A essência da nacionalidade
não era produto das ideias, das tradições ou das criações, mas de algo mais intrínseco,
como o ar ou o sangue, uma sorte de fé que provinha do que é natural e absoluto.
Qualquer outro conceito alternativo de “nação” foi descartado como artificial ou como
meras imitações”
- “Neste sentido, a Argentina representava o passado glorioso e autêntico de Europa, em
que a maneira fácil de ganhar a vida era desaprovada. A suposta solução era “dar a alma
um sentido heroico da vida” que evocara os tempos do império. A violência seria tanto
um meio como um fim, com a guerra civil e o golpe de Estado como suas manifestações
concentras, porque “nosso espírito não tem sido forjado na dor, que o único que faz
grandes os homens”

- “O êxito posterior da posição nacionalista, com sua adoração a Juan Manuel de


Rosas, aos caudillos e suas montoneras, era o produto de uma larga tradição que
aspirava a reformular o dilema de “civilização ou barbárie” de Sarmiento, associando o
primeiro com o liberalismo europeu e o segundo ao que é autenticamente argentino”

La primera dictadura de Argentina

- “O golpe de Estado de Uriburu iniciou a primeira ditadura moderna do país. Logo


abundaram os prisioneiros políticos, a tortura e inclusive as execuções de anarquistas
opositores. Que alternativa para a democracia propunha o ditador? Muitos nacionalistas
jovens se perguntavam isto. Uriburu era fascista? Para a esquerda, a resposta era
simples e afirmativa. Para os conservadores aliados com o general (radical
antiyrigoyenista e reformistas sociais), as atitudes de Uriburu não podiam ser
consideradas dessa maneira”

- “O general coincidia com a asseveração de Lugones a respeito da necessidade


absoluta da preeminência do exército na vida do país. Um jovem participante do golpe
de Estado, o capitão Juan Domingo Perón, via em Uriburu um homem honesto, não
necessariamente um fascista”

- “Uriburu era um leitor avido de Criterio e La Nueva República, um admirador do


fascismo italiano e amigo pessoa de Lugones e de jovens nacionalistas como Juan
Carulla, um médico ex-anarquista convertido ao fascismo. Lugones mesmo redatou a
proclama original do golpe de Estado”

- “Em 1931, Uriburu tratou de reformar a constituição e criar um sistema corporativo.


Ironicamente convocou eleições na província de Buenos Aires e perdeu. A medida que
perdia poder, Uriburu se aproximava cada vez mais do fascismo, apesar de que era mais
custoso de ser imposto”

Ejército y movimiento
- “Depois da perda de poder de Uriburu, os nacionalistas radicalizaram seu fascismo.
Criaram novas organizações, entre elas a Acción Nacionalista Argentina (ANA), a
Acción Antijudía Argentina (AAA), Aduna (Afirmación de uma Nueva Argentina),
Guardia Argentina, Partido Fascista Argentina (PFA) e a Alianza de la Juventud
Nacionalista (AJN). O nacionalismo consistia em um universo de grupos que
compartilhavam nomes, ideias e recursos, que girava em torno aos mesmos mitos e
ideologias, e era definido por um profundo militarismo e uma relação simbiótica com o
catolicismo”

- “De forma semelhante, em seus “propósitos” de 1933, Guardia Argentina, conduzida


por Leopoldo Lugones, postulava a centralidade do exército e a Igreja na “formação da
consciência publica”. O Partido Fascista Argentino e a Aliança de la Juventud
Nacionalista eram as mais radicalizadas e maiores entre estas organizações, e também
se identificavam com o Exército e a Igreja”

- “A ALN se mostrava como uma força nacionalista da classe trabalhadora que liderava
“a batalha da Pátria contra a antipátria encarnada no imperialismo estrangeiro, o
capitalismo internacional e o comunismo judaico”. Em 1943, a ALN apoiou o golpe
militar daquele ano e reclamou seu lugar como farol ideológico do nacionalismo”

- “A trajetória da ALN foi característica de um conglomerado nacionalista que, em


termos econômicos e sociais, corria paralela ao fascismo italiano: do projeto
moderadamente fascista e corporativista de Uriburu (1930-1932) ao fascismo social
de 1932-1945, exemplificado pela república de Saló (1943-1945). Mas os fascistas
argentinos eram talvez mais socialmente radicais em seu populismo que seus
homólogos italianos e nazistas”

- “Entre 1932 e 1945, os fascistas e os nacionalistas argentino, seguidores fanáticos do


falecido Uriburu, trataram de aproveitar sua situação fora do poder para planejar um
novo começo em sua busca pelo poder político. Formularam um mito fundacional
“uriburista” que, ao ressaltar a figura do líder morto, distorcia a realidade política e
garantia um futuro imaginário similar as realidades europeias contemporâneas do
fascismo italiano e o nazismo alemão”

- “O mito de Uriburu era um aspecto central do imaginário futuro nacionalista porque


definia seus objetivos políticos”
- “A figura mítica de Uriburu e seu golpe de Estado se converteram na base para a
justificação nacionalista dos golpes militares posteriores. O mito refletia o ideal fascista
do “movimento” que tinha que apoderar-se do Estado por meios violentos para levar a
cabo a transformação revolucionária. Aqui a “revolução” foi definida como “nacional” e
também como “socialista”, quer dizer, como uma combinação protopopulista, não
pluralista, dos postulados sociais da esquerda e a política totalitária de direita. Não é
casual que todos os golpes militares dessa época se definiram como
revolucionários. Em poucas palavras, os nacionalistas representavam a revolução
contra o século das revoluções e propunham uma ideia de ser argentino que eles
definiam a sua imagem e semelhança. [...] O Estado militar encontrou sua perfeita
encarnação em 1943 com a segunda ditadura argentina, que para os nacionalistas foi o
produto da hegemonia ideológica que o nacionalismo “inculcou na consciência do
exército””

(III. La ideología católica fascista en la Argentina)

- “O fascismo na Argentina foi ao mesmo tempo uma ideologia que vinha do outro lado
do Atlântico e uma experiência religiosa nacional”

- “Era mais especificamente local no sentido que os fascistas da Argentina criam que o
fascismo tinha que ter suas raízes no catolicismo. [...] Ademais, acreditavam que o
fascismo era uma ideologia universal com adaptações locais distintivas. Assim pois,
muitas vezes os nacionalistas davam ênfase no fato de que o fascismo tinha nomes
diferentes em países diferentes. Na Itália, lugar onde pela primeira vez ascenderam ao
poder, se chamava “fascismo italiano”, na Alemanha “nazismo” e na Argentina
“nacionalismo””

- “Na Argentina, o fascismo estava também arraigado na emoção: “O nacionalismo não


é um partido político, nem deve o ser; é mais que uma ideologia, um sentimento””

- “A confirmação do líder fascista de uma sociedade ideológica de primeiro nível com


os argentinos, reforçava uma crença chave do fascismo argentino: a existência do
fascismo transatlântico como um perigo claro e atual para o liberalismo
latinoamericano. Para Mussolini, a Argentina era um líder da nova ordem na América
do Sul e deixava claro que a Itália seria um aliado forte na cena mundial”
- “Os nacionalistas expressavam abertamente sua veneração por Mussolini e sua
admiração pelo movimento nacionalista de extrema direita”

- “Se a ideia de Mussolini como um ícone global do fascismo foi penetrante nos círculos
fascistas argentinos, outros lideres também eram apresentados como a encarnação ideal
da vontade do povo. [...] Neste sentido, o nacionalismo, de maneira igual o fascismo em
geral, não propunha uma democracia populista autoritária, mas uma ditadura
popularmente respaldada. [...] Em sua opinião, uma ideia divina de soberania também
tinha um papel para determinar a legitimidade de sua política. Para tanto, a diferença de
seus equivalentes europeus, os nacionalistas punham alguns limites a sacralização
fascista do líder como uma figura endeusada, insistindo no papel subordinado do
fascismo em relação com o divino. Para eles, o fascismo era o instrumento político
de Deus”

- “A violência nazista particularmente representava uma metáfora perfeita para esta


tendência geral do fascismo transnacional, como o escritor antifascista Jorge Luis
Borges tão acertadamente ilustrou em seu relato contemporâneo do Holocausto
Deutsche Requiem”

- “No catolicismo integrista, os nacionalistas encontram uma fonte de


conhecimentos e de inspiração. Ao fim e ao cabo, até na política, era Deus, e não
Mussolini ou Hitler, quem era o único todopoderoso”

- “Para os fascista argentino, o dilema existencial proposto por Uriburu entre o


comunismo e o fascismo legitimava a eleição do último. O padre Julio Meinville via
este dilema como algo baseado em dicotomias que juntas definiam o ser nacional e
seus inimigos”

- “[...] Mussolini havia se apropriado da mesma maneira do termo “totalitarismo” dos


antifascistas. Se estes haviam apresentado o fascismo como tirania, Il Duce apresenta o
fascismo como uma forma integrista da política”

- “Os fascistas cordobeses, como os nacionalistas argentinos em geral, não distinguiam


entre os diferentes fascismos porque compreendiam, talvez melhor do que Mussolini, as
particularidades nacionalistas de cada um na estrutura universal do fascismo. Este
último ponto era definido por uma estrutura coletiva de sentimentos que se convertiam
em “normas de vida” para os indivíduos e para a nação como um todo”
Una religión fascista

- “Ao acreditar que eram guerreiros de Deus, os nacionalistas eram mais que uma
versão usual das chamadas “religiões políticas” modernas. Em suma, não só imitavam
os rituais e a linguagem da religião tradicional como fazem a maioria das religiões
políticas modernas”

- “Era, em resumo, a hora da redenção nacional. Os nacionalistas alegavam que só


depois da “noite escura” da violência, o nacionalismo veria a “luz”. A ideia da violência
redentora não era exclusiva do fascismo argentino, mas em particular neste contexto os
pensadores encontraram efetivamente na violência uma fonte de legitimidade ética
sagrada, uma força “moralizadora”. Os fascistas viam sua própria violência como
uma emanação do divino”

- “A metáfora da praga e das pestes como inimigos do país pertence a habitual retórica
do fascismo. A comissão corresponde ao parlamentarismo e ao liberalismo”

(IV. Antissemitismo, sexo y cristianismo)

- “Em um informe anônimo sobre a “questão judia”, a diplomacia nazista analisava o


que o antisemitismo podia esperar encontrar na Argentina. Este documento conta com
os elementos típicos da teoria conspiracionistas antisemita moderna. Na Argentina esta
forma de antisemitismo já tinha fervorosos apoiador e defensores”

- “Ao destacar o papel de Uriburu e da Igreja, o informe nazi apresentava a dupla


origem do fenômeno antisemita nas “teorias” da Igreja e nos grupos paramilitares e
fascistas criados por um governo de Uriburu. Os homens e as mulheres próximos a
Igreja Católica, junto com os nacionalistas, impulsionaram o antisemitismo, dando-o
uma legitimidade que nunca antes havia disfrutado”

- “O jornal liberal La Nación tinha ativos de antissemitismo no fim do século XIX. Tão
pouco o presidente liberal Sarmiento estava livre de antissemitismo, embora sua
intolerância era mínima comparada com o posterior antissemitismo fascista argentino.
Durante a chamada “Semana Trágica” de 1919, o antissemitismo fascista argentino foi
mais além dos textos racistas para converter-se uma prática vitimizadora. Com os
fascistas das décadas da 1930 e 1940 o nacionalismo antissemita começou a ocupar um
lugar destacado na sociedade argentina”

Una fe racista
- “O padre Francheschi não excluía soluções mais radicais. Sugeriu que a ideia da
expulsão de judeus e sua vitimização seria possível em um futuro próximo. Segundo o
sacerdote católico, a Argentina estava abarrotada pela “implacável penetração semita”
que abarrotava a indústria empobrecendo o “não hebreu”, que intervinha nos
“movimentos extremistas”, e que distribuía impunemente “propaganda pornográfica””

- “Em seu livro de 1936, El Judío, Meinville tentava provar a dominação judia da
política, da econômica, educação e da imprensa, e advertia sobre o pernicioso da
“mistura de judeus e cristãos”. Um dos aspectos mais preocupantes para Meinville se
relacionava com a mais grave das características judias: a ênfase extrema na
corporalidade e na sexualidade”

- “Talvez a falta de profundidade conceitual ou a tentativa de simplificar todavia os


argumentos antissemitas converteram ao cura Virgilio Filippo em um dos antissemitas
mais importantes e perigosos da sociedade argentina. [...] Filippo via aos judeus como
uma raça que lutava sem descanso para manter sua “pureza””

- “Para Filippo, a expressão pública da sexualidade era um elemento primordial da


“ignorância deste século”. Punha juntas a teoria psicanalítica do “propagandista judeu”
Freud, com as “teorias judias” de Marx, Lenin e Trotsky como um conjunto de
“descobrimento judeomasócomunista”. Para ele, Freud era o intelectual judeu
prototípico que introduziu o contágio secular da sociedade cristã e impulso desígnios
judeus onipresentes e ocultos”

- “Na mente do sacerdote argentino, Freud era um destacado expoente da perigosa


degeneração sexual judia que ele via como algo muito alarmante na Argentina”

- “Em Clarinada, as imagens tradicionais católicas de judeus como assassinos de Deus


se fusionavam com suas representações deles nus, doentes e prontos para transmitir
sexualmente seu contágio. A publicação foi citada pelos nazistas pelos nazistas de Der
Sturmer como um exemplo do ideal de antisemitismo porque se havia proposto enterrar
vivos os judeus”

- “Em poucas palavras, o inimigo também se construía em termos de papéis muito


tradicionais de gênero e as ideias fascistas da chamada “sexualidade anormal””

- “A ideia da democracia como senil e também como um sujeito feminino hiper


sexualizado operava junto a conexão fascista entre homossexualidade e antifascismo”
- “A construção de estereótipos antissemitas e sua relação com as práticas antissemitas
que se articularam durante as décadas de 1930 e 1940 construíram uma importante
genealogia para as atividades intelectuais de neofascistas e nacionalistas argentinos
depois de 1945. [...] Além de definir e emitir advertências sobre a contaminante e
constitutiva alteridade do “inimigo interno”, estabeleceram um cânon de leitura do
social e o cultural que era a sua vez marcadamente racista e católica”

- “No Clarinada se mostrava esta ideia de que os judeus representavam e eram artífices
de todo o que não era desejável desde o ponto de vista nacionalista. “Os inimigos do
nacionalismo” se dividiam em duas ramas: “judaísmo” e “conservadorismo”. A rama do
judaísmo estava composto pelo marxismo (socialismo, comunismo, anarquismo), a
maçonaria (liberalismo, democracia, esquerdismo, ateísmo) e o capitalismo (trusts,
mercadores e industriais, imperialismo inglês e americano). A rama do conservadorismo
abarcava o liberalismo (políticos, jornalistas e escritores e conferencistas profissionais),
a democracia (políticos conservadores, radicais, democratas), a maçonaria (partidos
políticos, funcionários públicos, magistrados), o capitalismo (trusts estrangeiros e do
país, donos de terra e latifundiários, exportadores comerciais e industriais,
imperialismo)”

- “O racismo argentino, a diferença do fascismo italiano ou nazismo, se baseava menos


em uma ideia exclusivamente racista que uma combinação de racismo com o tradicional
antissemitismo católico: “Clarinada no combate aos judeus porque são judeus, nem
pretende agitar lutas religiosas ou raciais. Clarinada combate aos judeus, porque eles
são inventores, organizadores, ditadores e apoiadores do comunismo em todo mundo.
Clarinada combate aos judeus, porque os judeus, cumprindo com as diretrizes dos
“Sabios de Sión” corromperam a moral cristã, estimulavam os vícios e os defeitos
humanos, para aniquilar a conquista espiritual da humanidade feita por Jesus, primeira
vítima dos JUDEUS DEICIDAS”

- “O inimigo interno, dado que era pensado como inimigo de Deus, era inimigo da
pátria. Para os fascistas argentinos, a presença de um inimigo racial, que era também um
inimigo religioso, justificava a relevância sagrada do nacionalismo”

- “Os judeus representavam para o nacionalismo o arquétipo inimigo interno e


irreconhecível. Seu destino devia ser a eliminação total, como defendiam em 1942 os
nacionalistas em Clarinada: “Que homenagem mais grandiosa seria brindar a Pátria
com o extermínio destes polvos”. “Como fazer? O que sucederia “no dia em que o
nacionalismo triunfe como um regime?” e em que os “bons argentinos” comecem a dar
o grito “Deus, pátria e família””

(V. Populismo peronista y fascismo)

- “A relação entre o peronismo e o fascismo é fundamental para a compreensão da


história da Argentina. Se a pergunta que se faz é se Perón era fascista, a resposta é
“não”. Mas o fascismo teve um papel importante na gênesis ideológica do populismo
peronista”

- “O antissemitismo clerical fascista, uma mescla criolla de racismo biológico e


teológica cristã, caracterizou particularmente a corrente argentina do fascismo. Este
aspecto do nacionalismo argentino não foi, porém, uma caracteristica geral do
peronismo”

- “Embora o fascismo fosse uma parte central da gênese do peronismo, a chegada de


Perón ao poder marcou uma ruptura com diversos precedentes tradicionais, incluindo o
nacionalismo fascista. Ainda assim, as continuidade ideológicas entre o fascismo
argentino e o fascismo italiano são notáveis na junta militar de Perón entre 1943 e 1946
e o primeiro regime peronista (1946-1955)”

- “O peronismo também teve uma recepção importante na Europa. Os fascistas italianos


viram no peronismo um sucessor das ideias de Mussolini no mundo do pós-guerra,
enquanto que muitos partisanos antifascistas italianos descreviam o governo militar
argentino de 1943 como um fascismo latino americano similar a aqueles contra haviam
lutado na Europa”

- “O peronismo foi o resultado inesperado para todos, incluindo a seu criador, de um


intento de reforma fascista da vida política argentina. O fascismo foi o modelo ao qual
Perón sempre havia mirado. Mas, como segure o historiador Tulio Halperín Donghi,
“se o exemplo do fascismo não pode dar orientações concretas ao movimento peronista,
de outro modo, contribuiu de maneira eficaz a desorientá-lo””

- “As reformas estruturais da base social realizadas por Perón e pela ditadura de 1943-
1946 não foram acompanhadas por avanços democráticos. Isto não poderia ser feito sem
deslegitimar sua liderança, até então baseada na ditadura. O resultado foi uma
democracia que combinava a expansão dos direitos sociais com a limitação dos
direitos políticos”

- “Esta nova forma de política mais tarde se converteu na forma clássica do populismo
latinoamericano. Uma versão autoritária da democracia eleitoral, o populismo invoca o
nome do povo para sublinhar uma forma de liderança vertical, para minimizar o diálogo
político e para resolver uma percebida crise de representação mediante a supressão dos
controles e equilíbrios democráticos. E o faz com o fim de fazer valer uma relação
direta entre “o povo” e o líder”

- “O populismo reforça a polarização social e política em nome do povo. Se deixam


cada vez menos espaço para a expressão das minorias políticas, que são apresentadas
como traidoras a vontade “real” da nação, ou pior ainda, como meros fantoches das
potências estrangeiras que conspiram contra o país. Por último, o populismo confunde
Estado e movimento, pondo em prática formas de clientelismo que mostram o líder
como a encarnação do povo”

- “A distância do fascismo clássico, que utiliza a democracia para que se destrua a


si mesma e estabeleça uma ditadura, o peronismo se originou de uma ditadura
militar, mas estabeleceu uma democracia autoritária populista”

- “O golpe de 1943 anunciou o poder dos militares inspirados por uma ideologia que era
nacionalista, neutra (quer dizer, pronazi e proalemanha em um contexto hemisférico
antinazi), autoritária, antiimperalista e cléricofascista. A Igreja apoiou o golpe como
uma causa sagrada”

De la dictadura a la democracia populista autoritaria

- “O peronismo utiliza o Estado para promover suas reformas autoritárias democráticas”

- “A ditadura militar de Perón e o GOU desmantelou os partidos políticos, estabeleceu a


propaganda religiosa em escolas secundárias, e tratou de restringir a liberdade de
imprensa. A intolerância religiosa e a censura de imprensa continuaram quando Perón
se converteu em democrático no começo de 1946”

- “Apesar de que depois de 1943 Perón tratou de distanciar-se do fascismo, seus


vínculos ideológicos com este eram evidentes. Em suas retórica, o justicialismo era
similar ao fascismo italiano ao por a máxima ênfase em uma ideia totalitária de
sociedade e de Estado em que também contava com uma liderança vertical, carismática,
hipermítica. Os direitos dos cidadãos tinham menos valor para o peronismo que suas
supostas obrigações com o Estado, o líder e o movimento”

- “Em suma, o nacionalismo e o “fascismo cristão” inventado na Argentina constituem


uma dimensão fundamental na genealogia do peronismo”

- “O fascismo e o peronismo chegaram ao poder como resultado do fracasso dos


regimes liberais-democráticos que se criam sólidos ou bem estabelecidos. Ambos
regimes deram uma resposta totalitária que a crise da modernidade havia provocado na
percepção pública das leis, a economia e a legitimidade do Estado”

- “Os historiadores do fascismo estão de acordo que o fascismo foi três coisas em
momentos e países distintos: uma ideologia, um movimento e um regime”

- “O regime instalado por Uriburu em 1930 e o regime militar de 1943-1946 constituem


dois momentos em que são visíveis os intentos de instaurar regimes fascistas e
totalitários no sentido em que Mussolini usava o termo”

- “[...] o movimento populista do peronismo original não era fascista, mas a


“mentalidade” de Perón sim o era”

- “Este populismo foi definido pelo matrimonio da reforma social, o intervencionismo


do Estado, o nacionalismo e o antiimperialismo com a lógica do regime de partido
único, a polarização social, o clientelismo, a censura da imprensa, o ostracismo e a
perseguição dos opositores até, em alguns casos, a prisão e a tortura”

- “Em termos autoritários, as ditaduras e incluídos alguns governos civis depois de 1955
o superaram em violência política e proscrições antidemocráticas”

- “No peronismo, esta visão autoritária da democracia necessitava ser atualizada e


legitimada com o voto popular, a síntese do nacionalismo e socialismo cristão não
marxista. [...] Em suas memórias, Perón identicava claramente o fascismo italiano e o
nazismo com este “socialismo com um caráter nacional””

- “El discurso de Perón na Bolsa de Comércio de agosto 1944 é, neste sentido,


igualmente revelador. Sua mensagem aos donos das empresas foi que era necessário que
o Estado interveria como árbitro das relações entre o capital e o trabalho com o fim de
evitar uma revolução e eliminar a luta de classes”
- “A ideia de Perón, ao transcender as questões ideológicas tradicionais também servia
para evitar a acusação de fascista ou totalitária, uma acusação que seria mais difícil
negar logicamente. Perón era o líder de uma ditadura militar nacionalista que buscava
popularidade. Em Perón, a ditadura encontrou seu salvador, mas Perón via nela uma
base para lançar-se para chegar ao topo”

- “Um novo uso da cultura popular da cultura popular foi uma característica chave
da estratégia populista de Perón”

- “Durante este período de exitosa intenção de popularizar a ditadura militar, afirmou


em 1945: “Está morto todo prejuízo burguês e uma nova era tem nascido no mundo”.
Eva Perón representou esta lógica antiburguesa ao máximo”

- “Por certo, o complexo legado de Eva e Juan Perón incluiu a crença da massa feminina
do partido peronista e o direito ao voto feminino. Mas especialmente no pensamento e
na prática de Eva Perón, o discurso antiburguês se mesclava com o antiimperialismo da
direita, uma visão patriarcal das relações de gênero, um machismo exacerbado, e uma
nova compreensão da identidade nacional que vinha do período do entreguerras. A
domesticação da religião oficial teve um papel central nisto”

- “Perón trabalhava em conjunto com Deus. A religião tradicional foi simplesmente


fusionada com o universo peronista. Como declarou Eva Perón quando anunciou a
chegada de um Natal em 1946: “Eu venho do público, como o general Perón, e estou
encantada de ter levado neste Natal o bom pão doce de Perón e a cidra de Perón, a todos
os lugares que Perón tem restabelecido a suas alturas cristãs”

- “O surgimento do peronismo era uma espécie de mal menor para a Igreja, que apoiou
em seus primeiros anos, mas nunca lhe perdoou por a ter relegado a um lugar subalterno
na tutela ideológica”

- “O condutor era o líder político na Terra, não Deus. Estas diferenças de intepretação,
em suma, a vocação totalitária de Perón, explicam em grande medida o golpe de Estado
eclesiástico e militar contra o regime peronista em 1955”

- “O historiador José Luis Romero tem insistido de maneira convincente nas conexões
entre a doutrina nacionalista de “fascismo moderado” e a doutrina peronista”

La doctrina
- “A importância do Congresso de Mendoza não pode ser exagerada. Significou a
vontade peronista de estabelecer um terceiro caminho ideológico que superava a
dicotomia capitalismo-comunismo da Guerra Fria. Entre os assistentes internacionais
haviam bem conhecido os antifascistas Rodolfo Mondolfo da Universidade de Tucuman
e Karl Lowith da New School for Social Research de Nova York. Também estavam
presentes fascistas como o italiano Ugo Spirito e o membro francês das SS Jaime María
Mahieu (“exilado” na Argentina). Embora não estivesse presentes, Martin Heidegger,
Jacques Maritain, Benedetto Croce, Karl Jaspers e Bertrand Russell, entre outros,
enviaram apresentações”

- “A política, quando é experimentada através do movimento populista, transcendia o


indivíduo. “O indivíduo se faz interessante em função de sua participação no
movimento social, e são as características evolutivas deste as que reclamam atenção
preferencial”. Estas políticas “superam” a luta de classe devido ao projeto social. Esta
superação implicava uma transição na que “o transito do “eu” ao “nós” não funciona de
maneira meteórica como um extermínio das individualidades, mas como uma
reafirmação deles em sua função coletiva. [...] Esta função coletiva se opunha ao
liberalismo mas não era comunista”

- “A ruptura populista com o idealismo fascista era evidente. Os fascistas queriam matar
os “insetos”; Perón queria que eles deixassem de serem “insetos”. Hitler era mais
idealista que Perón”

- “A ideia do inimigo era tão extrema que Perón participava de batalhas verbais com
inimigos absolutos (internos e externos) aos que nunca nomeou nem identificou com
clareza: “[os inimigos] devem saber, porque caro lhes vai custar, se esquecem que neste
terra quando foi necessário impor o que o povo quis não importou o número de
argentinos que deveram morrer para impor-la”. [...] A guerra estava relacionada com
esses inimigos imaginários do peronismo e da nação. Perón delineava cuidadosamente a
ideia de um inimigo absoluto, mas nunca a atualizou. Advertia que em um momento
dado, os adversários políticos se convertiam em “inimigos da nação””

- “Por mais que o personalismo seja central na história argentina, Perón era um
narcisista revolucionário no sentido de que ele erigiu sua personagem como articulador
mítico de sua ideologia. O ritual peronista fortalecia a imagem de Perón como líder
carismático e enfatizava seu monopólio do poder”
- “No populismo peronista, o líder não era democrático no sentido mais amplo,
embora o era no sentido técnico: era eleito para confirma ritualmente seu papel
messiânico e não para fazer realidade os desejos particulares de seus eleitores. Ele tinha
uma visão militarista dos seguidores. Eram “os soldados do peronismo” em “luta
permanente contra a traição” e os traidores da nação”

- “Igualmente, Eva Perón, que em termos mais espontâneos também se converteu em


uma figura mítica, erigiu esta figura do líder como o primeiro em tudo: trabalhador,
mestre, diretor de destinos coletivos. Em um famoso discurso de 1951, a esposa do
general o elevou a posição de messias político de um povo: “Eu não tenho feito nada;
tudo é Perón. Perón é a pátria, Perón é tudo, e todos nós estamos a uma distância
sideral do Líder da nação. Eu, meu general, com a plenipotência espiritual que me dão
os descamisados da Pátria, os proclamo, antes que o povo os vote em 11 de novembro,
presidente de todos os argentinos. A Pátria está salva, porque está nas mãos do general
Perón””

- “O discurso de Eva Perón era um sintoma da falta de respeito populista pelas normal
e instituições democráticas. Evita defendeu que antes das eleições o líder havia sido
eleito por sua aclamação pessoal”

- “Em seu primeiro regime, Perón rompeu com esta tradição violenta, que seria seguida
pelos nacionalistas de Tacuara, por a peronista Triple A de seu último regime e pela
última ditadura militar (1976-1983)”

- “Para Perón, a queda do fascismo não se deveu a sua falta de liderança, mas a seu
esgotamento ideológico. O fascismo foi “um fenómeno irrepetível, um estilo clássico
para definir uma época precisa e determinada”. O fascismo não era um modelo a seguir
ou imitar [...]”

- “A originalidade do primeiro mandato peronista esteve marcada por suas tendências


autoritárias e inclusive sua vocação totalitária”

- “Desta maneira, a Argentina, contra a corrente do pos-guerra da Europa ocidental, se


submeteu a um processo de truncada modernização populista que, paradoxalmente,
ampliou a participação política e social da cidadania assim como também o
autoritarismo”

(VI. Bombas, muerte e ideologia: de Tacuara a La Triple A)


- “Desde seu começo, o peronismo teve uma relação próxima, mas conflituosa com o
fascismo argentino. Isto não é difícil de entender: ambos eram herdeiros da uma
ditadura militar; ambos estavam contra a democracia liberal, o imperialismo
estadunidense e britânico, e a esquerda”

- “Depois da eleição de Perón, a extrema direita se dividiu em dois campos distintos:


entre os intelectuais e políticos que apoiavam o regime estavam Virgilio Filippo,
Ernesto Palacio, Hugo Wast, Manuel Gálvez, Bonifacio Lastra, Leopoldo Marechal,
Ramón Doll, Delfina Bunge de Gálvez e Carlos Ibarguren, assim como os jovens
membros da Aliança Nacionalista (sucessora da AJN); o outro grupo era composto por
nacionalistas que se opunham ao peronismo porque não eram suficientemente
antissemita, porque era demasiado radical em termos sociais, o porque Perón os
considerava “piantavotos”, quer dizer, políticos que em última instância socavam o
movimento populista assustando os potenciais votantes e aos que em grande medida
ignoravam, a pesar de ter se reunido com eles em várias ocasiões”

- “Paradoxalmente, o fascismo triunfou em contextos democráticos (na Alemanha de


Weimar e na Itália democrática) que o fascismo pode usar a democracia contra ela
mesma”

- “Depois de 1955, muitos nacionalistas expressaram abertamente o que muitos


pensavam mas não se haviam atrevido a expressar: Perón e seus ideias haviam
convertido o legado da Revolução de 1943 em algo demasiado radicalmente populista
ou algo pior”

- “Após a queda de Perón o apoio nacionalista ao peronismo se desvaneceu. Houve


alguns que inclusive desestimaram os anos peronistas por completo”

- “Não é nenhuma coincidência que os líderes da guerrilha peronista (Mario


Firmenich, Fernando Abal Medina, Carlos Ramus, assim como conhecidos lutadores
como Rodolfo Galimberti e muitos outros) compartilham um passado fascista e
antissemita”

Tacuara

- “Tacuara representava o nacionalismo jovem no período posterior ao regime peronista.


Sua base teórica tinha suas raízes na ideia nacionalista da Cruz e Espada tomada por
Meinville e do exemplo histórico do fascismo argentino do período do entreguerras”
- “Isto não quer dizer que as origens intelectuais da “guerra suja” da Argentina
tivera uma genealogia de “dois demônios”, mas só de um: o legado ideológico do
fascismo argentino. Como o estudioso argentina Hugo Vezzetti tem assinalado,
segundo esta visão militarista, a política é um só conflito com uma única possível
solução: uma guerra santa de aniquilamento”

- “Este legado fascista não se limitou a gênese do líder montonero [...] O núcleo do
itinerário assassinato da ideia fascista da história argentina é a continua reformulação da
direita da aliança de longa data entre nacionalismo, o exército e a Igreja. Estas alianças
finalmente conduziram a formulação da Triple A e ao terrorismo de Estado da última
ditadura militar (1976-1983)”

- “Houve uma diferença substancial entre o movimento guerrilheiro esquerdista e o


terrorismo de Estado. Por sua própria definição, os guerrilheiros estavam contra a lei”

- “O terrorismo de Estado, pelo contrário, atacava a lei e se apropriava dela, a menos


fazendo-a desaparecer por completo, como sempre foi a intenção do nacionalismo. Os
guerrilheiros queriam uma nova ordem normativa, enquanto que o terrorismo de Estado
desejava um estado de exceção para suas ações que logo cairiam por cima da ordem
normativa das coisas. Para o nacionalismo, e para o fascismo em geral, nunca houve um
vínculo sólido entre legitimidade e legalidade. Na ditadura, a ideologia nacionalista
esteve ligada ao aparato estatal e a lei se converteu em seu mero instrumento”

- “O tipo de violência política radical da ditadura não era tanto um resultado das
preocupações francesas e norteamericanas pela seguridade nacional [...] mas, a bem
dizer, um produto da genealogia histórica do nacionalismo fascista argentino”

- “A base ideológica do fascismo estava nas tradições facciosas anteriores da Argentina.


Vários caudilhismos e guerras civis precederam o fascismo”

- “Embora Tacuara era uma organização neofascista, ou inclusive neonazista, que


defendia o fascismo e o nazismo, assim como o franquismo e outras variantes do
fascismo transatlântico, principalmente se considerava herdeira do nacionalismo fascista
argentino do período do entreguerras”

- “[...] não se considerava que o nacionalismo fora uma forma de fascismo, mas que
viam o fascismo e o nazismo como formas de nacionalismo”
- “Tacuara se caracterizou por seu antissemitismo extremo (responsável por sequestrar,
ferir gravemente e assassinar jovens ativistas de esquerda e judeus), pela defesa da
herança fascista (incluindo o Holocausto) e pela visão exclusiva de uma Argentina
católica e militarizada que seu supunha que viria a ser o país líder da América Latina”

- “Quando Tacuara sequestrou a Graciela Sirota, uma jovem argentina, judia e


estudante universitária de 19 anos e a marcaram com uma suástica no peito, estava
antecipando uma prática ideológica explícita de inscrições biológicas que mais tarde
seria comum nos campos de concentração argentinos”

- “Quando o Estado de Israel capturou a Eichmann em 1960 e o levou a Israel para ser
julgado por seus crimes, os membros da Tacuara picharam as paredes do país com
grafites que diziam “Viva Eichmann! Morram os judeus”, e Ezcurra defendeu que
Tacuara só estava defendendo “valores católicos” contra “o imperialismo capitalista
marxista-judeu-liberal-masoquista””

- “Houve pelo menos três grupos claros de tacuaras que tiveram uma influência de
grande alcance, pois entre eles se encontravam os futuros líderes do movimento
guerrilheiro, de a Triple A e aos paramilitares “grupos de tarefa” da última ditadura.
Alguns antigos tacuaras inclusive ocuparam cargos no governo peronista de Carlos
Menem (1989-1999) e um Tacuara se converteu em juiz da Corte Suprema na década de
1990”

- “O grupo de “esquerda”, fundado em 1962, se chamou Movimiento Nacionalista


Revolucionario Tacuara (MNRT). O MNRT foi peronista desde seu início, mas
conservou alguns traços do antissemitismo de Tacuara”

- “Como Eduardo Galeano assinalava em 1967, a violência em nome de Deus era


central na autoidentificação tacuara. Como escreviam as paredes e nas revistas
argentinas: “Honre a pátria. Mate um judeu!””

- “Inclusive depois de que as atividades da Tacuara e da GRN foram proibidas


oficialmente em 1963, estas continuaram operando abertamente, o igual que muitas
outras organizações políticas de extrema direita”

A Triple A
- “A Triple A e a Tacuara compartilharam muitos membros. Os dois grupos também
compartilhavam uma estreita relação com as forças de segurança e o exército, assim
como conexões com setores “duros” do sindicalismo peronista”

- “Diferente da Tacuara, a Triple A teve a benção explicita de Juan Perón e de Isabel


Perón e esteva dirigida pelo secretário pessoal de Perón, José Lopez Rega. [...] Com a
regresso de Perón ao poder, em 1973, a Triple A se converteu em uma organização
paraestatal”

- “O massacre de mais uma centena de pessoas em Ezeiza em 1973 quando Perón


retornou ao país demonstrou que a Triple A havia se convertido no principal inimigo da
esquerda peronista”

- “Com Perón e el Brujo [Lopez Rega] no poder, a Triple A se tornou um organização


paramilitar do governo populista peronista. Sem dúvida, a luta constante entre os
diferentes setores do peronismo de direita e esquerda se reproduzia no gabinete
nacional, no sindicalismo e na crescente tensão entre o líder e os Montoneros. Mas
também é claro que a Triple A finalmente conseguiu se impor. Principalmente após a
morte de Perón em 1974 e a presidência de sua terceira esposa (1974-1976), Isabel
Perón, López parecia uma das figuras mais poderosas da política argentina”

- “A ideologia da Triple A era claramente cléricofascista, como havia sido o caso de


todas as demais formações nacionalistas no passado, desde os uriburistas até Tacuara.
Para a Triple A, a argentina era essencialmente católica e por tanto qualquer oposição
visível a Cristo estava claramente contra o país. Diziam: “A Argentina é Deus””

- “O antissemitismo era um componente chave da formação ideológica da Triple A,


unido ao seu anticomunismo e a ideia de inimigos externos do nacionalismo. Os
membros da Triple A pediam por pogrons de judeus argentinos”

- “A obsessão da Triple A com a sexualidade das pessoas e as ansiedades relacionadas


com ela frente às formas tradicionais de respeitabilidade burguesa eram claras em sua
desvalorização da psicanálise como uma fusão de Freud, judaísmo e perversão. Dito de
maneira simples, de maneira similar aos seus predecessores da década d 1930, viam a
sexualidade como uma ferramenta primária da imaginada conspiração judeu-marxista-
capitalista. Neste contexto, a psicanálise freudiana ia “contra a doutrina de Deus””
- “A diferença de Tacuara ou do nacionalismo clássico de entreguerras, a Triple A foi de
todo peronista. Também estava profundamente vinculada com os sindicatos peronistas
de direita e intelectuais peronistas fascistas, assim como membros ativos das forças
armadas”

- “Quando se converteu em presidente da Argentina, Isabel Perón foi a chefe formal da


Triple A e, nesse sentido, se converteu na primeira mulher líder a nível mundial de uma
organização fascista. Como disse o The New York Times: “O espírito do fascismo vive
no regime da senhora de Perón””

- “Como Meinvielle havia dito, “mesclar o cristianismo com Freud e Marx”


representava uma “luta contra o sagrado”. [...] Além do teóricos críticos europeus, para
a Triple A os psicanalistas argentinos estava no centro da conspiração “sinárquica”.
Eram “os médicos do engano” que queriam “castrar intelectual e moralmente o
indivíduo”. Contra o universo textual da esquerda e sua estratégia putativa de
emasculação antiargentina, a Triple A afirmava que a violência era a única coisa de
“machos”. Assim pois, a Triple A uniu a designação de Ottalagano e a campanha
intelectual e religiosa contra as teorias críticas com numerosas ações terroristas dentro e
fora da universidade. Ottalagano participou na expulsão de 1350 professores. Sem
rodeios lhes disse para irem “ensinar Freud em Paris e Marx em Moscou””

- “Em 7 de novembro de 1974, o governo de Isabel Perón decretou o estado de sítio


por tempo indefinido. Em geral, o governo negou a existência da Triple A, embora em
1974 quase todos argentinos conheciam sua existência. [...] Em fevereiro de 1975,
Isabel Perón enviou o exército para reprimir o movimento guerrilheiro do ERP na
província de Tucumán. Como destaca o historiador Luis Alberto Romero, “O
genocídio estava em marcha”. [...] Depois do golpe militar de 1976, desapareceu a
utilidade da Triple A. Muitos de seus membros, que eram assassinos, foram
incorporados aos paramilitares dos “grupos de tarefa” ou receberam cargos de honra no
exército”

- “A lista de ações da Triple A oferece uma perspectiva única sobre a genealogia da


Guerra Suja da ditadura militar. Entre julho e setembro de 1974 houve 220 ataques da
Triple A contra seus inimigos preconcebidos (quase três por dia), incluindo
bombardeios, violações, 60 assassinatos (um cada 19 horas), 44 vítimas com feridas
grave ou violadas, e 20 sequestros (um a cada dois dias). No total, desde 1973 até 1976,
A Triple A executou mais de 900 pessoas que considerava inimigas, incluindo
parlamentares, jornalistas, militantes e advogados dos direitos humanos, exilados
latinoamericanos na Argentina, intelectuais, sindicalistas e militantes de esquerda e
guerrilheiros”

- “Com o golpe de Estado, os recém-desempregados assassinos da Triple A encontraram


trabalho no terrorismo de Estado” Para a extrema direita, apoiar a ditadura era a coisa
mais natural. Assim foi como o escritor e militante montonero Rodolfo Walsh
descreveu a relação entre a ditadura e extrema direita em uma carta aberta à ditadura,
escrita pouco antes de ser assassinado: “As três A são hoje as 3 Armas, e a Junta que
vocês presidem não é o fiel da balança entre “violências de distintos signos” nem um
arbitro justo entre “dois terrorismos”, mas a fonte mesma do terror que perdeu seu
caminho e só pode balbuciar o discurso da morte””

(VII. Terrorismo de Estado: la ideologia de la dictadura argentina)

- “A última ditadura militar da Argentina (1976-1983) foi muitas coisas. Fora de seus
campos de concentração, mostrava a fachada de um típico Estado autoritário. Dentro
deles, porém, era fascista. O legado do nacionalismo reinava nesses campos. Dentro
deles, a longa tradição argentina da ideologia fascista de violência foi plenamente posta
em prática. [...] Os campos definem o legal da junta ditatorial. Eles não só eram uma
metáfora da ditadura em seu conjunto, mas também uma representação de seu mundo
ideal, um lugar onde não havia nenhuma transação com a realidade”

- “As juntas militares sistematicamente sequestraram, torturaram e assassinaram entre


10.000 e 30.000 cidadãos argentinos, assim como pessoas de outras nacionalidades
europeias e latinoamericanas. Estes assassinatos não foram azar, mas sim
cuidadosamente planejados nos níveis superiores do governo militar”

- “As palavras “desaparecer” e “desaparecidos” se convertem em eufemismos de


assassinatos de inimigos reais e imaginários da ditadura, sancionados pelo Estado. Estes
assassinatos não eram reconhecidos pelo Estado, daí o uso da categoria de
desaparecidos já que eram oficialmente reconhecidos como tais pelo Estado”

- “A ideologia que provocou esta violência tinha raízes argentinas, europeias,


norteamericanas, sobretudo a teoria de Segurança Nacional em suas encarnações
francesa e estadunidense. Os argentinos tinham uma longa história de apropriação e
reformulação de teorias de ambos lados do Atlântico, mas a influência de uma corrente
particular de ideologia nacionalista católica fascista argentina deve ser considerada
como central”

- “O antissemitismo, o anticomunismo e a ideia do inimigo interno como um “outro”


não argentino foram elementos chave na ideologia da Junta. Os supostos inimigos eram
considerados como a personificação da “antipatria” e, portanto, opostos a fusão entre
argentina de Deus e a pátria que o Estado militar representava”

- “[...] a última ditadura era a combinação de ideologia nacionalista e tradição


econômica de livre mercado adotada pelas classes altas argentinas. A ditadura também
se uniu a extrema direita e a hierarquia católica que estava quase totalmente identificada
com os projetos ideológicos desta direita. No ciclo anterior da extrema direita (1932-
1976), esta ideologia estava a serviço de um discurso nacionalista e em ocasiões se
manifestava em atos específicos de violência, tortura e repressão. Mas nos campos de
concentração da ditadura, a ideologia se converteu na realidade mesma”

- “Esta ideologia se destacou no uso de um vocabulário simbólico. [...] Não é de


nenhuma maneira irônico que a Junta Militar chamara o seu regime de Processo de
Reorganização Nacional. Enquanto que o “proceso” era claramente nacionalista na sua
ideologia, a forma que “livrava” sua guerra e sua visão dos inimigos, em outros aspectos
seguia uma lógica burocrática e autoritária como a das ditaduras militares da década de
1960 e sua defesa tecnocrática e autoritária da forma clássica de neocapitalismo de livre
mercado”

- “Esta combinação de economia de livre mercado e política nacionalista de tradição


fascista levou a uma repressão social sem precedentes. O aparato de extermínio estava
ao serviço das corporações. Ford e Citibank, por exemplo, colaboraram na desaparição
de trabalhadores que haviam participado das exigências feitas por sindicatos de
esquerda”

- “Produto de duas vertentes de origens distintas (economia de livre mercado e


nacionalismo clérigo-fascista), este híbrido ditatorial rechaçava todas as tendências
“sociais” populistas da ideologia nacionalista e amplificava a ideia do inimigo através
de suas práticas fanáticas e explícitas”
- “A ditadura contou com o apoio civil generalizado. Em março de 1976 com o golpe
de Estado, em 1978 com a Copa do Mundo e em 1982 com a Guerra das Malvinas a
ditadura foi tão popular quanto havia sido o regime de Perón na década de 1940 e em
princípios de 1950. A Praça de Maio cheia de milhares de pessoas comemorando a
guerra de 1982 constituiu uma operação ideológica fortemente apoiada, única na
história argentina”

- “Os regimes fascistas apoiam primeira uma guerra interna e logo depois uma guerra
externa. Na ideologia fascista, a guerra é entendida como um bem coletivo, uma fonte
compartilhada de regeneração nacional”

(Enemigos de Dios)

- “A ideia do inimigo interno é um legado central do nacionalismo”

- “Como seus antecessores nacionalistas, o ditador Jorge Rafael Videla entendia este
inimigo como um desafio a ideia mesma de nação: “Porque subversão, não é nem mais
nem menos que isso: subversão dos valores essenciais do ser nacional” (25 de maio de
1976). Videla prometia que a luta contra a subversão finalmente ia “extirpá-la”. Já
em 1976, a guerrilha havia sido derrotada militarmente graças à repressão ilegal iniciada
durante o governo peronista anterior”

- “De acordo com este ponto de vista, as vitimas queriam provocar uma “modificação
total das estruturas políticas, sociais e económicas da nação de acordo com sua
concepção materialista, ateia e totalitária”, como defendia o general Roberto Viola, o
segundo líder da ditadura, em 1977”

- “As ideias pseudocientíficas e patológicas abundavam na ideologia da junta. Se a


nação era concebida como uma entidade física, os inimigos, “subversivos
internacionais”, eram vistos como um vírus que teria de se que eliminar. A ideia da
contaminação era apresentada em avisos de televisão”

- “Era uma luta de tudo ou nada contra a subversão que trabalhava contra o “destino
nacional... nossa fé e estilo de vida””

- “A ideia de um inimigo cujo único destino possível era a morte estava justificada pela
impossibilidade de restaurar a humanidade deste [...]”
- “Em uma típica projeção totalitária, o ataque contra o inimigo era apresentado como
um ato letal de autodefesa”

- “Aos membros da junta as metáforas bíblicas pareciam apropriadas para a situação. O


general Viola defendia que a Argentina transitava em uma “via crucis”. Os “sem Deus e
sem pátria” haviam desafiado a nação”

- “Não havia limites para a Guerra Suja dos militares. Para o tenente Hugo Ildebrando
Pascarelli, “a história de nossa terra não havia contemplado jamais uma luta
semelhante a que hoje enfrentamos, que não reconhece limites morais nem naturais,
que se realiza além do bem e do mal””

- “A morte abria o caminho para uma nova Argentina da paz, uma em que, como
manifestou Videla, os “direitos humanos” eram defendidos pelo sangue argentino. O
sangue dos soldados argentinos que eram sacrificados por Deus”

- “Em certo sentido, o eu e o inimigo se converteram em objetos sacrificiais. Haviam


distintas fontes de redenção nacional. Especialmente a morte do inimigo era justificável
e servia para justificar a ideologia. Isto é o que Hugo Vezzetti entende que a
criminalização do Estado que em nome da fé e da civilização cristã “consagrava o
poder redentor da violência”. Muitos teriam que morrer, profetizou Videla em 1975,
para que a nação esteja em paz. A ideia de que os atos criminais da repressão e
assassinato eram em realidade uma “guerra santa” estava estritamente ligada a ideia de
um sacrifício purificado”

- “A ideia do exército como instrumento político da vontade de Deus foi repetida pelo
diretor da Escola Superior de Guerra, general Juan Manuel Bayón [...]”

- “Em 1976, os intelectuais da ditadura como Mariano Grondona apresentavam esta


aliança entre Deus e o Exército como uma possível resposta ao abismo: “O que
acontecerá na Argentina sem a espada e sem a cruz? [...] A Argentina é católica e
militar. Nenhuma responsabilidade é maior que essa ai””

- “É igualmente sintomática de uma ideologia apocalíptica que fusionava a religião e a


política, e prometia a redenção prometida através da destruição de todo aquele que
pensava de outra maneira”

- “[...] muitos outros membros da Igreja estavam ativamente envolvidos na repressão.


Monsenhor Emilio Graselli, secretário do vicariato militar, tinha arquivos com
informações sobre os desaparecidos. Apresentava aos familiares versões falsas dos
campos de concentração e também uma defesa ideológica da ditadura que justificava a
morte daqueles que não poderiam ser reformados ou salvos”

- “A igreja na Argentina teve uma relação quase orgânica com as desaparições. De fato,
em muitos casos a hierarquia católica sabia destas desaparições e poderia ter impedido
que ocorressem, coisa que em geral não fez, sobretudo quando os sequestrados eram
sacerdotes”

- “A base deste “perigo”, que ao que parece foi aceito por Bergoglio, que iria se
converter no principal cardeal da Argentina e mais tarde no papa Francisco I, se apoiava
em uma ideia aceita pela maioria dos bispos: qualquer condenação às violações dos
direitos humanos era uma ameaça para a pátria e para Deus”

(Muerte e ideología)

- “As teorias nacionalistas da ditadura não eram, de nenhuma maneira, originais.


Constantemente se repetiam argumentos de velha data. A Cruz e a Espada seguiam
articulando a ideia de nação. Por conseguinte, a prática do extermínio adquiriu novos
significados, ampliando sua ideologia e convertendo-se em um postulado ideológico.
[...] A tortura generalizada, a violência e a morte foram fontes de regeneração
ideológica nacional”

- “Se se comparam as práticas nazistas de extermínio total com as da ditadura, as


diferenças quantitativas e inclusive as “qualitativas” são mais importantes que as
similitudes. [...] os militares argentinos e os nazistas estava fascinados pelo segredo
e utilizavam uma linguagem rica em eufemismos. Isto não foi uma casualidade mas
sim o produto de uma afinidade eletiva. [...] Entre as características próprias das práticas
de extermínio na Argentina, estava o roubo de crianças, coisa aparentemente não
ocorreu nos regimes fascistas europeus”

- “A ideia de botim de guerra permitiu ao militares levar a “desaparição” um passo


além. Se as vitimas perdiam sua identidade sob a tortura degradante e desumanizante,
essa situação culmina no máximo sacrifício da identidade representada na morte como
desaparecido. Para Videla, a irrealidade dos desaparecidos assegurava que os
militares fossem donos do destino dos prisioneiros, inclusive a morte: “Os
desaparecidos são isso, desaparecidos; não estão vivos nem mortos; estão
desaparecidos”

- “Se os nazistas, por exemplo, destruíram todo rastro de suas vitimas mediante a
destruição da memória da unidade familiar, a ditadura argentina se conformou com o
sacrifício dos pais e a apropriação da identidade de seus filhos”

- “A subtração de crianças, que garantia aos “irrecuperáveis” o castigo último de saber


que seus filhos não saberiam quem haviam sido seus pais, estava organizada de
acordo a pautas muito claras e sistemáticas”

- “Em geral, os novos “pais” eram escolhidos entre os grupos que apoiavam a ditadura.
Eram pessoas com vínculos ideológicos, religiosos e financeiros com os militares, como
se narra tão efetivamente nos filmes La historia oficial (1985) e Cautiva (2003)”

- “O sacrifício das vitimas era a recompensa ideológica para aqueles pais que estavam
dispostos a receber os filhos do desastre e dar-lhes uma versão deformada de amor
familiar. [...] A conexão entre o mito nacionalista e a realidade era, todavia, tênue. O
caso dos filhos sequestrados pela ditadura, a marca ideológica secreta deveu ser imposta
por gerações”

- “Enquanto justificava as desaparições e o roubo de crianças, o nacionalismo


glorificava ideias fascistas que determinavam quem vivia e quem morria. Fora dos
campos, esta ideologia da morte adquiria outra forma, tratando de adaptar-se a uma
sociedade que podia participar do racismo na prática diária, mas não ia tolerar uma
articulação explícita de ideias racistas. A sociedade em geral preferia o silêncio. [...] O
racismo explicitou tomou a forma de um reconhecimento aberto da necessidade de
erradicar outras expressões “não europeias” da nação. A profundidade e o alcance deste
desejo se manifestaram, uma vez mais, nos campos”

(El antisemitismo y el radicalmente “otro”)

- “O racismo era um componente crítico dos campos. [...] O racismo também se


relacionava com uma imagem sexualizada do inimigo; o inimigo era definido
geralmente como sexualmente heterodoxo, como mulheres heterodoxas e/ou prostitutas
ou como homens homossexuais. Às vezes, prisioneiros masculinos eram obrigados a se
vestir como mulheres. Os insultos eram comuns já que seus corpos serviam como
metáforas ideológicas”
- “Se para a família da vítima averiguar onde estava enterrado seu familiar desaparecido
era um passo importante para a elaboração do trauma, para o perpetrador a desaparição
da vítima tinha de significar um trauma constante e, portanto, o repressor identificava o
pai que encontrava a tumba do filho com a morte do pai. Na realidade a mensagem
implica uma projeção do desejo do assassino. Não é o pai da vítima, mas o perpetrador
que se degrada se o local da tumba do filho é encontrado”

- “O que para os assassinos é uma vitória sobre a morte que deve se repetir uma e outra
vez, é para os parentes uma ferida aberta que os assassinos não querem que sare”

- “A Argentina não experimentou o genocídio no sentido clássico, mas as experiências


em campos de concentração de judeus argentinos tiveram dimensões de genocídio. Fora
dos campos, os judeus argentinos não foram atacados por serem judeus, mas uma vez
dentro dos campos, a situação se altera. A razão principal por trás do antissemitismo de
Estado dentro dos campos estava arraigada nas tradições argentina de ideologia
fascista”

- “O ex-secretário de Estado Henry Kissinger cria que “não existem dúvidas que
existem muitas tendências antissemitas na Argentina, mas não no sentido nazista””

- “A preocupação militar sobre as atividades judias na Argentina tinha suas origens em


velhas teorias de conspiração da ideologia fascista da Argentina. Timerman recordava
que foi acusado de ser um dos líderes da seção argentina da conspiração judia”

- “Fernández continua: “Aos judeus se castigavam apenas por ser judeus [...] Contra os
judeus se aplicava toda classe de torturas, mas especialmente uma que era
extremamente sádica e cruel: o “rectoscopio”, que consistia na inserção de um tubo no
ânus da vitima ou da vagina de uma mulher, e dentro do tubo se colocava um rato. O
roedor buscava a saída e tratava de morder os órgãos internos da vítima”. [...] Esta
tortura reforçava a suposta animalidade das vítimas judias. Não é de se estranhar que a
maioria dos testemunhos destas práticas provenham de testemunhos de não judeus que
sobreviveram aos campos. A maioria dos prisioneiros judeus não saíram com vida”. [...]
O exemplo nazista foi uma fonte de inspiração para os perpetradores”

- “Timerman afirma que, entre outras “piadas”, diziam que estavam enviando os
prisioneiros judeus a câmaras de gás. Os perpetradores argentinos estabeleceram uma
espécie de diálogo fascista transhistórico. Normalmente diziam a suas vítimas judias,
“vamos mostrar aos nazistas como se fazem as coisas”. [...] Este tipo de humor se
conectava com temas favoritos nacionalistas”

- “Na Argentina, a certeza sobre a magnitude do desastre gerado pelo inimigo foi
sentida em toda a cadeia de mando. Os assassinos compartilhavam a ideia de que seu
sacrifício era um rito na história da pátria. [...] o brigadeiro Agostí relaciona a versão
militar da história com a necessidade de recuperação constante: “os povos sem memória
estão condenados a sofrer constantemente os mesmos erros”. Para Nicolaides e Agosti,
e para muitos outros, seu próprio significado histórico como atores dos acontecimentos
recentes parecia ser evidente”

- “Videla explicou a existência de um plano sistemático de extermínio. A verdade das


desaparições era propriedade exclusiva de um grupo que não podia nem explicá-lo nem
responder as perguntas sobre o que havia ocorrido. O único que podia fazer era defendê-
la: “Não, não se podia fuzilar. Pensemos um número, pensemos em cinco mil. A
sociedade argentina não bancaria os fuzilamentos: terá dois em Buenos Aires, hoje seis
em Córdoba, amanhã quatro em Rosário e assim até cinco mil. Não havia outra
maneira de fazê-lo. Todos estiveram de acordo com isto1””

(Trauma, muerte y la memoria del Holocausto en los campos argentinos)

- “Com a ditadura, a maquinaria de morte se converteu em um símbolo de consagração


ideológica mediante a degradação de suas vítimas. Igualmente aos campos de
concentração nazista, a necessidade de levar a ideologia até suas últimas consequências,
explicava o impulso de humilhar as vítimas. [...] A figura do “quebrado” se converteu
em um signo de poder ideológico”

- “Por certo, os sobrevivente de outros genocídios também se referem ao Holocausto


como um marco de referencia. Mas no lugar de dar ênfase em questões estruturais (quer
dizer, as similitudes históricas entre os dois regimes e suas campanhas de extermínio),
os sobreviventes argentinos destacavam que os autores faziam referência explícita ao
Holocausto como algo a ser emulado e também como marco de referência que deve ser
superado”

- “As referências ao Holocausto (por parte das vítimas e dos perpetradores) eram os
sintomas do que poderia se definir como uma presença transgeracional do trauma”

1
SEOANE, Maria; MULEIRO, Vicente. El dictador, p.231.
- “Sua disposição ideológica de se apresentar como “continuação” do Holocausto
demonstra um tipo único de situação transhistórica em que o trauma e a ideologia se
completam mutuamente. As vítimas não podem distinguir se estão em campos de
concentração nazista ou dos argentinos. Não podem definir a diferença entre o passado e
o presente. [...] Nisto radica um dos aspectos mais singulares dos campos argentinos:
pensavam que os campos deviam produzir o contexto do Holocausto em um
mundo pós-holocausto. Ainda que vários genocídios repitam certos elementos do
Holocausto, só na Argentina os perpetradores afirmavam suas ações de sequestro e
extermínio como uma recreação do Holocausto”

- “Foi sua lembrança de Auschwitz (que eles viam como algo totalmente positivo) o que
os levou a justificar seus assassinatos antissemitas. Um dos seus sequestradores disse a
Timerman: “Hitler perdeu a guerra. Nós vamos ganhar”. De sua cela, uma vítima da
ditadura, Adolfo Pérez Esquivel, recordava as conexões transhistóricas com o genocídio
nazista como uma particularidade ideológica dos campos argentinos: “Uma das coisas
que realmente me impactou foi [o pensamento] ‘Estou na Argentina ou na Alemanha
nazista’. Havia uma enorme parede que estava quase completamente coberta por uma
suástica pintada nela, e debaixo dela se lia a palavra “nacionalismo” escrita com Z””

- “Nos campos de concentração argentinos, o universo de Auschwitz era apresentado


como a consagração de um ideal patriótico. Se, sob os nazistas, os judeus podiam
simplesmente não existir por suas supostas ações contra a raça ariana, na Argentina os
assassinatos estavam justificados pela grande tradição do fascismo argentino, que
combinava o tipo nazista de antissemitismo com uma vertente mais tradicional do
antissemitismo religioso. [...] um sentimento ideológico, uma visão circular de mundo.
Os perpetradores argentinos a levaram a cabo com a prática antissemita dos campos.
Este foi, em definitivo, o legado da ideologia fascista argentina, feita realidade nos
campos”

(Cultura, violencia e ideología)

- “Esta tradição argentina mesclava o catolicismo com uma particular ideia antissemita
do inimigo. Esta fusão foi extrema na medida em que deu forma a uma velho tipo de
fascismo argentino. Mas sem ser fascista, a sociedade argentina em geral ainda
comparte um padrão significativo desta cultura política, a saber, a ideia de que a
Argentina é essencialmente cristã e os inimigos não o são”
- “Embora por razões diferentes, a ditadura militar foi, igualmente o governo de
Uriburu, não de todo fascista. De todo modo, herdou do fascismo, e pois em prática, o
imaginário ideológico do nacionalismo fascista definido como uma aliança entre a Cruz
e Espada. [...] Como ocorreu durante o regime de Uriburu, a ditadura reprimiu os
trabalhadores embora sua repressão fosse muito mais dura do que qualquer outra coisa
no passado”

- “Fora dos campos de detenção, a ideologia da ditadura teve bastante êxito, embora não
pudesse impor o universo vertical total como fez dentro deles”

- “Fora dos campos, os torturadores simbólicos eram figuras de imprensa, vozes da


ideologia militar. De uma posição supostamente moderada, jornalistas como Mariano
Grondona difundiam os temas ideológicos nacionalistas que, na maioria dos meios
nacionalistas como Cabildo, se faziam mais explícitos. Em sua revista, Carta política,
Grondona colocava o “problema judeu” e denunciava a influência de Marx e de Freud;
seus argumentos diferiam pouco dos de Filippo, Lugones, Castellani e seus seguidores”

- “Em concordância com uma ideologia nacionalista que imaginava como inimigo
Freud, cuja estratégia implicava conquistar aos argentinos durante a noite, enquanto
estavam sonhando, o próprio almirante Massera disse uma conferência em uma
universidade em 1977: “O século XIX, Marx publicou três volumes de O Capital e com
ele pôs em dúvida a sanidade da propriedade privada; no início do século XX, a sagrada
esfera intima do seu humano foi atacada por Freud em Interpretação dos sonhos. E
como se isso não fosse suficiente para questionar os valores positivos da sociedade,
Einstein, em 1905, publicou sua teoria da relatividade, que põe em crise a natureza
estática da matéria”. Massera pronunciou o discurso em um ato acadêmico depois de
receber um doutorado honorário da jesuíta Universidade del Salvador em Buenos
Aires”

- “Do mesmo modo, monsenhor Guillermo Bolatti, bispo de Rosário, afirmou que a
entrega ao “prazer sexual desenfreado” favorecia a subversão “consciente ou
inconsciente” [...] Pediu a Virgem Maria que “livrasse” os argentinos desta “penetração
ideológica”, das “armas homicidas” do inimigo. Então a Argentina alcançaria um futuro
com a “Paz que o Senhor nos tem dado””

- “As forças armadas e seus aliados estavam lutando uma cruzada ideológica contra as
forças desenfreadas do sexo, as drogas e os desejos políticos radicais”
- “A paz só era possível quando o inimigo tiver sido exterminado. A paz significava a
morte do Outro. Este ia ser um momento de purificação argentina. Sinalizaria o
ressurgimento de uma autenticidade nacional absoluta, em que a cultura seria restaurada
como um elemento central do espirito “ocidental e cristão”. [...] Para a ideologia da
ditadura este espirito não estava morto, mas simplesmente estava desativado e
manipulado pelo plano inimigo de Freud, Marx e Einstein. A maioria dos ideólogos
militares acreditavam que a psicanálise, como assegurava o Cabildo, buscava “destruir
o conceito cristão de família”. O ataque era parte de uma projeção conspiratória maior
contra os judeus argentinos”

- “Em termos da relação entre a violência e a política, em termos de racismo, e inclusive


em termos da condenação da conspiração freudiano-marxista-judia ficcional, diferiam
pouco dos fascistas do passado. Para todos eles, se Marx proporcionava a base
teórica para a subversão, a psicanálise constituía sua estratégia cultural. [...]
Durante a ditadura, muitos psicanalistas e marxistas foram perseguidos e assassinados”

- “A luta contra o inimigo não tinha limites. Em 1976, o general Videla destacou a
natureza global do desafio: “A luta contra a subversão não se esgota em uma dimensão
puramente militar. É um fenômeno mundial. Tem dimensões políticas, economicas,
sociais, culturais e psicológicas”. Fora dos campos, a família era um cenário central
desta luta”

- “No mundo da alta cultura, como em todas as esferas sociais, a ditadura contou com o
apoio de importantes figuras. Por exemplo, em 1976, Videla desfrutou de um almoço
com os escritores Ernesto Sábato e Jorge Luis Borges e o sacerdote Leonardo
Castellani. Mais tarde, Borges disse a imprensa: “Lhe agradeci pessoalmente pelo golpe
de 24 de março, que salvou o país da ignominia e manifestei minha simpatia por ter
enfrentado as responsabilidades do governo”. Sábato, que mais tarde seria um dos
arquitetos do Nunca Más, declarou: “O general Videla me deu uma excelente
impressão. Trata-se de um homem culto, modesto e inteligente. Me chamou a atenção a
amplitude de critério e cultura do presidente”. Castellani recorda que Borges, Sábato e
Videla haviam falado de “a guerra” como uma atividade purificadora”

- “Fechou editoriais, periódicos e revistas, lançou uma verdadeira campanha contra os


livros e, em geral, contra a cultura liberal em seu conjunto. A esta cultura secular
liberal, os militares opunham sua fé em uma cultura homogênea e sagrada que, como
Videla havia dito, “nos pertence a todos nós e não é só privilégio de uns poucos”. Esta
foi uma sorte de inversão simbólica. [...] a repressão e a censura foram também aspectos
importantes da visão da cultura que tinha a ditadura. Em suma, sua cultura era
igualmente definida por aquilo a que se opunha, como pelo que apoiava”

- “A queima de livros e a proscrição de autores suspeitos. [...] Os autores considerados


perigosos eram estrangeiros ou acusados rapidamente de sê-lo. Obras de Marx, Pablo
Neruda, O Pequeno Príncipe de Antoine de Saint-Exupéry e inclusive o texto
altamente suspeito de Stendhal Vermelho e Preto estavam na lista de livros proibidos.
Outros autores proibidos eram Perry Anderson, Armand Matterlart, Talcott Parsons,
David Viñas, Herbert Marcuse e Ariel Dorfman, assim como uma variedade de
teóricos marxistas e psicanalítico”

- “[...] esta ideologia nacionalistas que via o inimigo como oposto a pátria foi levada ao
campo de futebol. Durante a Copa do Mundo de Futebol, o técnico da equipe argentina,
César Luis Menotti, agradeceu ao almirante Massera pelo “apoio moral inestimável”
que deu a equipe. A ideia de que o futebol estava conectado de alguma maneira ao tipo
de nacionalismo promovido pela ditadura foi amplamente compartilhava durante o
evento”

- “A Copa do Mundo foi uma das ocasiões em que a ditadura e seu “processo de paz”
tiveram um apoio massivo. Quando a Argentina ganhou, o povo saiu às ruas, ocupando-
as com uma mensagem de alegria pela vitória. Esta mensagem foi rapidamente
apropriada pela propaganda, que o vinculou a ditadura”

- “A vitória no Mundial, essa “festa de todos os argentinos”, mostrada no filme de


propaganda de mesmo nome do diretor Sergio Renán, foi equiparada com o que o
jornalista Roberto Maidana chamado de “ganas de ser” dos argentinos. Para Maidana a
ditadura havia iniciado um novo processo histórico, uma refundação do país. [...] O
filme de Renan é um exemplo de cinema nacionalista e, como o crítico Santiago
García assinalou ao citar o capitão Jorge Bittleston, o diretor, designado pelos
militares pelos militares, do Instituto Nacional de Cinematografia, o cinema
nacionalista queria dizer “todas as películas que exaltam os valores espirituais,
cristãos, morais e históricos ou atuais da nacionalidade ou que afirmem os conceitos
da família, da ordem, de respeito, de trabalho, de esforço fecundo e responsabilidade
social buscando criar uma atitude popular, otimista para o futuro”. Outro filme da
ditadura, Brigada en acción (1977), dirigida por Ramón “Palito” Ortega, inclui a
seguinte canção: “Pobre dessa gente que não sabe onde vai; os que se alijaram da luz
da verdade; esses que deixaram de crer também em Deus; os que renunciaram a
palavra amor; Pobre dessa gente que esqueceu sua religião; esses que a vida não lhe
dão valor algum; os que confundiram a palavra liberdade; os que caíram para sempre
em solidão””

- “A relação entre a religião e a verdade, por uma parte, e a situação de estar “sempre
só” – uma clara referência aos desaparecidos –, por outro, são um sintoma do que a
ditadura entendia como uma guerra entre aqueles que, ao “esquecer” sua religião,
também esqueceram sua inata argentinidade, e os verdadeiros argentinos, aos que a
ditadura defendeu”

- “Como aponta García, os filmes de Ortega fazem referência implícita aos atos mais
extremos da ditadura. Em Que linda és mi familia! (1980) Ortega “faz o papel de um
filho adotivo cujo pai adotivo... negava o pai biológico quando este vem buscá-lo”. No
cinema da ditadura não há negociações com a realidade e a realidade ideológica
dos campos de concentração se reproduz na narrativa cinematográfica”

- “Ortega, que após a volta da democracia ia se converter em um governador peronista


da província de Tucumán, foi um dos grandes propagandistas da ditadura. Em
propagandas televisivas apoiou a ditadura porque “unidos temos tomado consciência da
necessidade de defender nossa soberania e proteger nossos direitos””

- “Segundo o argumento nacionalista, a Guerra das Malvinas era uma luta anticolonial
por Deus e pela Pátria. Morrer por algumas ilhas que formam parte do Império
Britânico se tornou algo significativo para maioria da população, que com grande
entusiasmo apoiou a ditadura nesta nova aventura. Mas desta vez o inimigo eram
soldados armados que se opunham e se negavam a desaparecer apesar da insistência
ideológica do “estamos vencendo”, dita vez ou outra nos meios de comunicação
argentinos”

- “A ineficiência militar da ditadura foi demonstrada em sua derrota no que seria sua
única zona verdadeira de competência. Mas, em termos da ideologia nacionalista, a
Guerra das Malvinas de 1982 foi claramente uma batalha ideológica”
- “Se nos campos de concentração a ideologia nacionalista se apoiava nos perseguidos,
ou mais precisamente em seus corpos torturados, na Guerra das Malvinas essa ideologia
foi insuficiente na hora de afirmar a ideia nacionalista de uma Grande Argentina frente a
um exército britânica que derrotou com facilidade suas tropas. A justificação da guerra
não era original; os nacionalistas já a haviam usado na década de 1930. A originalidade
estava na prática de uma guerra que não se podia ganhar, diferentemente da Guerra Suja
contra cidadãos indefesos e um movimento guerrilheiro que havia sido derrotado antes
do golpe”

(VIII. Epilogo: pasado y presente)

- “Os campos de concentração argentinos foram lugares de realização ideológica. [...]


Tortura e morte eram elementos chave destes laboratórios de fascismo cristianizado. [...]
Nos campos havia frases de Rosas escritas nas paredes, como se a luta deste movimento
contra o inimigo interno fosse uma continuação do feito por esse caudilho no século
XIX”

- “No contexto do “humanismo de Hitler”, o legado autoritário de Rosas foi integrado


ao nacionalismo militar do futuro. Para o general Ramón Díaz Bessone, se Rosas foi um
“tirano”, também foi defensor da soberania nacional”

- “A CONADEP foi criada pelo governo democraticamente eleito de Raúl Ricardo


Alfonsín em 1984 com o objetivo de investigar e informar as violações dos direitos
humanos da ditadura e da junta militar e suas conclusões foram utilizadas como prova
nos juízos. A comissão incluía membros de muitos setores da sociedade argentina e
estava presidida pelo escritor Ernesto Sábato, que, apesar de seu apoio inicial a ditadura
militar, se converteu em um ícone da luta pela punição dos crimes dos militares”

- “Portanto, seguiu-se o impasse infame com a aprovação de leis de perdão aos militares
em 1986 e 1987 durante o governo Alfonsín e as anistias presidências dadas pelo
presidente Carlos Menem em 1989 e 1990, o ressurgimento das investigações e
processos dos perpetradores na década de 2000 [...]”

- “Mas isto “significa que a ideia fascista na Argentina se foi para sempre? [...] Por
certo, os grupos nacionalistas entre os militares intentaram derrubar a democracia e
fracassaram na década de 1980”
- “A origem dessa cultura política radica parcialmente no nacionalismo de extrema
direita, quer dizer, no fascismo ao estilo argentino. Neste sentido específico, o legal
nacionalista encarnado na ditadura segue vivo”

- “A ditadura era parte integrante de uma sociedade da qual surgiu e que lhe aceitou. [...]
A sociedade argentina prefere não lembrar seu papel na Guerra Suja, seja passivo ou de
uma justificação ativa. Assim, pois, segundo a ideologia nacionalista, a historiografia
profissional se converte em uma parte da conspiração contra a eterna Argentina cristã e
a única postura defensável é uma combinação entre negação e “reconciliação”, um
encerramento do passado”

- “Um aspecto central da herança nacionalista é a ideia de que a Igreja e seus


representantes devem desempenhar um papel centra na política argentina”

- “A ideia de que os políticos devem consultar a religião organizada sobre assuntos


políticos rompe com a tradição da ilustração de estrita separação das crenças religiosas e
o Estado”

- “No começo do século XXI, esta ideia era ainda mantida por políticos que, sobre a
base da religião, tratavam de articular projetos neoclássicos ou neopopulistas para o
país. Isto não deveria surpreender já que na cíclica histórica argentina em outros
momento decisivos se operou da mesma maneira, com ou contra Perón, as coalisões
políticas foram até a Igreja para construir frentes de oposição. Por exemplo, se a última
ditadura argentina legitimou seus crimes aproveitando o apoio da Igreja e dos ideais
nacionalistas, a democracia argentina as vezes poderia seguir um caminho similtar”

- “Em outra entrevista, o ditador [Videla] concluía: “Minha relação com a Igreja foi
excelente. Tínhamos uma relação cordial, sincera e aberta”. O apoio se combinava com
o silêncio. Na maioria dos casos, o silêncio da Igreja sobre os delitos militares se
conectava com a ideia da Guerra Fria de que as vítimas eram “inimigos internos” da
Cruz e da Espada”

- “A Igreja, cujas hierarquias apoiaram ativamente e justificaram os piores crimes da


ditadura, não sofreram a mesma diminuição de prestigio e influência que sofreram seus
aliados, os militares”

- “A persistência da ideologia clérigo-fascista que deu origem ao fascismo ao estilo


argentino é parte da resposta história a esta questão. Diferentemente de outros países
latino-americanos, a hierarquia da Igreja na Argentina trabalhou ativamente para
silenciar as vozes dissidentes desde dentro e, em muitas vezes, as fez desaparecer”

- “Desde então, muitas coisas se alteraram na Argentina, mas a Argentina segue sendo
antes de tudo uma nação católica. Constantes referências a política do sagrado e a
exaltação da fusão argentina de anti-imperialismo, caudilhismo, nacionalismo e as
disputas territoriais atravessaram o espectro político”

- “O mito explicativo dos “dois demônios” é uma manifestação ideológica


internalizada. Ao limitar a responsabilidade do Estado, este mito culpa e, de fato,
constrói como inimigos aqueles que levaram a cabo atos delitivos, incluindo atos de
terrorismo urbano e o sequestro, e que, portanto, deveriam ter sido legalmente
processado ao invés de fuzilados conforme a história da perseguição e extermínio,
tema deste livro. Este mito minimiza a extrema vitimização de todo os que foram
enviados ilegalmente a campos de concentração e logo desapareceram. Por último,
como assinala Vezzeti, para a sociedade que o produziu, este mito ser para
“confirmação de sua inocência e ingenuidade frente à barbárie que ocorria ante seus
olhos2””

- “Os esforços de “reconciliação” com o passado se tem convertido, para quem os


impulsiona, em uma negação do trágico legado da ideia fascista na Argentina”

- “[...] a ditadura se converteu no máximo insulto político, um meio populista de


polarização política. Igualmente problemáticos foram os esforços dos governos
Kirchner para mostras as vítimas como heróis. Em efeito, isto marcou a mudança da
percepção legal dos perpetradores e das vítimas durante e regime para uma percepção
moral de uma verdadeira “guerra” entre heróis e vilões”

- “A presidenta Cristina Fernández de Kirchner e seu esposo, e antecessor, Néstor


Kirchner, viram a si mesmos como outro lado desta guerra, como guerreiros contra o
mal absoluto, embora nenhum deles tenha tido um papel visível na resistência a
ditadura. Assim pois, a história como melodrama populista apresentava uma visão
das vítimas passadas como protopartidários da política atual”

- “A ideia de redimir as vítimas de seu passado serve ao propósito de legitimar correntes


muito diversas do populismo peronista. Existem deficiências histórias graves nestas

2
VEZZETTI, H. Pasado y Presente, p.15.
imagens do passado. Os crimes de Estado só teriam sentido para os autores. Da
perspectiva das vítimas, sua vitimização não tinha sentido em absoluto. Nenhuma
vítima iria encontrar nos campos de concentração a conotação política que muitos
intérpretes políticos populistas, mais tarde, atribuíram a suas experiências [...] A história
da vitimização radical (especialmente o Holocausto e o comparativo genocídio e
assassinato massivo de cidadãos por parte do Estado) evita analisar as vítimas como
principal fonte de motivação do perpetrador. As subjetividades étnicas e/ou políticas das
vítimas (serem judias, maias ou comunistas) não eram a principal razão de seus autores.
Na realidade, a principal força impulsionadora por detrás de seus assassinatos era a
ideologia absoluta dos assassinos. Neste sentido, na Argentina não houve uma
verdadeira guerra, mas assassinatos em massa de cidadãos que foram sancionados pelo
Estado, como no Camboja, Chile, na Espanha fascista e na Guatemala”

- “Ademais, esforços recentes para ver as identidades políticas das vítimas como raiz de
seu assassinato, põem anacronicamente os crimes de Estado dentro da esfera política.
[...] Em contraste com esta história oficial, neste livro defendemos que a fusão da
ideologia e a violência na tradição do nacionalismo segue sendo a causa principal
da Guerra Suja e dos campos de concentração”

- “Esta investigação se propôs a estudar a poderosa influência do prisma nacionalista e


fascista na história argentina do século XX. [...] A ideologia nacionalista reescreve a
história e, repetindo ideias do passado, tem buscado negar os aspectos trágicos desta
história. As origens intelectuais da ditadura são as do “fascismo cristianizado”, um
fascismo ao estilo argentino com poderes perduráveis”

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