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INSTITUTO FEDERAL DE EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E TECNOLOGIA

CURSO DE LICENCIATURA EM LETRAS A DISTÂNCIA


HABILITAÇÃO EM LÍNGUA PORTUGUESA

ANA ODILIA MARQUES ESTRELA DE ABRANTES

AMBIGUIDADE NA CONSTRUÇÃO DE SENTIDOS EM TIRINHA NOS LIVROS


DIDÁTICOS DE LÍNGUA PORTUGUESA

SOUSA-PB
2016
ANA ODILIA MARQUES ESTRELA DE ABRANTES

AMBIGUIDADE NA CONSTRUÇÃO DE SENTIDOS EM TIRINHA NOS LIVROS


DIDÁTICOS DE LÍNGUA PORTUGUESA

Artigo apresentado como requisito parcial para


a conclusão do Curso de Licenciatura em
Letras a Distância.

Orientador: Profª“MsC.” Sayonara Abrantes


de Oliveira Uchoa

SOUSA-PB
2016
ANA ODILIA MARQUES ESTRELA DE ABRANTES

AMBIGUIDADE NA CONSTRUÇÃO DE SENTIDOS EM TIRINHA NOS LIVROS


DIDÁTICOS DE LÍNGUA PORTUGUESA

Artigo apresentado como requisito parcial para


a conclusão do Curso de Licenciatura em
Letras a Distância
Orientador: Prof (a) “MsC.” Sayonara
Abrantes de Oliveira Uchoa

BANCA EXAMINADORA

_____________________________________________________________
Presidente: Sayonara Abrantes de Oliveira Uchoa
Orientador – IFPB

_____________________________________________________________
Examinador (a): Maria Leuziedna Dantas
Docente -IFPB

_____________________________________________________________
Examinador (a): Henrique Miguel da Silva Lima
Docente - UEPB
A minha família, fonte de inspiração. Sem eles
não teria trilhado esse caminho.
AGRADECIMENTOS

Primeiramente a Deus, que permitiu realizar um sonho que fora interrompido e hoje
concretizado, ser professora de Língua Portuguesa com muito orgulho e dedicação.

Ao Instituto Federal de Educação, Ciências e Tecnologia da Paraíba, pela oportunidade de


concluir o Curso de Licenciatura em Letras.

A minha orientadora, pelo incentivo constante e, mesmo diante da distância, sempre me


conduzindo por caminhos antes sonhados, hoje realizados.

Enfim, a todo o corpo docente do Curso de Licenciatura em Letras - IFPB, pela brilhante
maestria, competência e disponibilidade de conduzir um curso de alto nível, em pleno sertão
da Paraíba.

A vocês, meu eterno agradecimento.


RESUMO

O presente trabalho aborda a importância do estudo da ambiguidade como fenômeno


semântico, mobilizado na construção do gênero tirinha no livro didático de Língua
Portuguesa. Tendo em vista os desafios da escola em formar leitores competentes e, sabendo
das dificuldades encontradas no que diz respeito às várias possibilidades de interpretação que
podem emanar de uma palavra ou expressão, objetivamos destacar a importância do estudo da
ambiguidade como suporte para o ensino de língua, de forma contextualizada e com o aporte
do gênero tirinha. Enfatizamos que a mobilização de tirinhas, em livros didáticos, pode
contribuir para o processo de ensino/aprendizagem dos alunos de forma prazerosa e dinâmica,
melhorando sua capacidade de leitura, como também, ampliando o seu horizonte
interpretativo. O corpus deste trabalho é constituído por recortes de atividades envolvendo
tirinhas em livros didáticos de Língua Portuguesa, do 9º ano do ensino fundamental que são
analisados à luz da Semântica Lexical e das teorias de leitura. Consiste, pois, numa pesquisa
exploratória, de abordagem qualitativa, caracterizada basicamente como bibliográfica, visto
que analisa tirinhas construídas a partir dos fenômenos de ambiguidade e como esses são
explorados pelo livro didático, em prol do ensino de leitura. Para desenvolver o trabalho
proposto, ancoramo-nos em teóricos como Cançado (2012), Celso (2008), Henriques (2009),
Ilari (2006), entre outros. Por fim, refletiremos sobre a construção de sentidos nas tirinhas e
sua mobilização no livro didático com o propósito de chamar a atenção do leitor e
desenvolver a habilidade leitora. Neste sentido, este estudo contribui para o estabelecimento
de novos direcionamentos reflexivos sobre o tratamento dado aos fenômenos de ambiguidade
nos livros didáticos.
PALAVRAS-CHAVE: tirinhas; livro didático; ambiguidade; leitura.
ABSTRACT

The present paper discusses the importance of the study of ambiguity as semantic
phenomenon, mobilized in the construction of the comic genre in schools textbook of the
Portuguese Language. Considering the school challenges in making competent readers and
knowing the difficulties encountered regarding to the various possibilities of interpretation
that may emanate from a word or phrase, we aim to highlight the importance of ambiguity of
study as support for language teaching, in context, with the contribution of strip text gender.
We emphasize that the mobilization of comic strips, in textbooks, can contribute to the
teaching / learning process of students in a pleasant and dynamic way, improving their
reading skills, as well as expanding its interpretive horizon. The corpus of this work consists
of activities involving clippings strips in textbooks of English Language of the 9th grade of
elementary school that are analyzed in the light of Lexical Semantics and reading theories. It
consists, therefore, of an exploratory research, qualitative approach, charcterized primarily as
literature, since analyzes strips constructed from the ambiguity of phenomena and how these
are exploited by textbook in favor of the teaching of reading. To develop the proposed work,
we based our study in theoretical experts as Cançado (2012), Celso (2008), Henriques (2009),
Ilari (2006), among others. Finally, we will reflect on the construction of meaning in comic
strips and their mobilization in the textbook in order to draw the reader's attention and
develop the reading skill. Thus, this study contributes to the establishment of new directions
reflective of the treatment of ambiguity phenomena in textbooks.

KEYWORDS: comic strips; school textbook; ambiguity; reading.


LISTA DE FIGURAS

FIGURA 1: TIRINHA 1 19
FIGURA 2: TIRINHA 2 21
SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 10

1 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA 12
1.1 Gênero Textual: Tirinha 12
1.2 Ambiguidade: Polissemia X Homonímia X Vagueza 14
1.3 O lugar do Gênero Tirinha no Livro didático de Língua Portuguesa 17

2 ANÁLISE E DISCUSSÃO DE DADOS 19

3 CONSIDERAÇÕES FINAIS 24

4 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 25
10

INTRODUÇÃO

A ambiguidade consiste em um fenômeno semântico bastante utilizado em


propostas de atividades voltadas ao desenvolvimento da leitura, principalmente no
gênero tirinha, com o intuito de despertar nos interlocutores a percepção sobre as
diversas possibilidades de interpretação que podem emanar de uma palavra ou
expressão.
A leitura do gênero tirinha exige do leitor a capacidade de reconhecer diversas
interpretações, principalmente quando se utiliza da ambiguidade como recurso
semântico mobilizado em prol da construção dos sentidos, fortemente presente no livro
didático. Diante dessa constatação, vale ressaltar que nem sempre a mobilização do
fenômeno no gênero tirinha atende ao mesmo propósito, ou seja, são adotadas
abordagens diferentes em prol de objetivos educacionais também distintos.
As diferentes abordagens para o trabalho com as ambiguidades, presentes no
livro didático, levam o aluno a perceber esses fenômenos de maneiras diversas,
decorrente do propósito para o qual foi mobilizado.
Diante da reflexão apresentada, partimos da hipótese de que as tirinhas são
gêneros extremamente ricos para o desenvolvimento da leitura. No entanto, dependendo
da abordagem adotada para a percepção das ambiguidades, no livro didático, muitas
vezes o aluno é levado a percebê-las, em sua grande maioria, como erros e não como
fenômenos produtivos da linguagem.
A partir reflexão apresentada, este trabalho propõe-se a analisar a abordagem
dada ao fenômeno da ambiguidade no livro didático, mais especificamente aquelas
presentes no gênero tirinha. Para atingir seu objetivo maior, buscará reconhecer a
abordagem dada à ambiguidade em atividades didáticas e se estas são propositadamente
construídas para permitir horizontes interpretativos maiores por parte dos interlocutores
ou apenas pretextos para outros objetivos didáticos.
O trabalho está organizado de modo a apresentar uma breve fundamentação
teórica acerca de seus elementos norteadores, ou seja: concepção de leitura,
caracterização do gênero tirinha e ambiguidade. Seguidamente, será apresentado o
percurso metodológico que guiou a pesquisa, a análise dos dados obtidos e, por fim, nas
considerações finais, a síntese dos resultados obtidos.
A pesquisa aponta para a necessidade de perceber que leitura e a compreensão
de gêneros textuais construídos a partir de fenômenos de ambiguidade, frequentemente
11

mobilizados no gênero tirinha, consistem em aspectos altamente produtivos para o


ensino de leitura, fato que ainda não é amplamente explorado nos livros didáticos de
Língua Portuguesa.
12

1 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

Estudar os significados das palavras implica, necessariamente, analisar as


relações que elas estabelecem com outras e, refletir sobre os fenômenos da ambiguidade
na construção de sentidos dentro do gênero textual tirinha, permite-nos, enquanto
mediadores do processo de ensino/aprendizagem, refletir acerca de nossa prática em
sala de aula, no que se refere à forma como trabalhamos os textos com nossos alunos.
O fenômeno da ambiguidade é estudado por várias áreas da Semântica, mas
delimitamos abordá-lo à luz da Semântica Lexical visto que se propõe a estudar o
sentido linguístico com base nas unidades lexicais, expressões/termos simples e
codificados. Sobre esse fenômeno, Tamba (2006) explicita que “a semântica é o estudo
das palavras”.
Sendo assim, o texto encontra-se organizado contemplando, inicialmente, uma
reflexão teórica sobre o gênero textual tirinha, sobre os fenômenos envolvidos na
indeterminação dos sentidos, com ênfase na ambiguidade que se manifesta por meio da
polissemia, homonímia e vagueza. A partir destes aspectos, faremos uma discussão
mais específica, aliando teoria e análise de tirinhas, ancorados em dados obtidos e, por
fim, teceremos por meio das considerações finais a síntese dos resultados obtidos.

1.1 Gênero Textual: Tirinha

O mundo atualmente vive um momento de mudanças que alteraram


significativamente as maneiras de trabalhar, estudar e conviver na sociedade, tornando-o
cada vez mais competitivo e exigente.
Diante desse quadro, um dos instrumentos imprescindíveis para a formação de
cidadãos críticos, autônomos e atuantes seria a prática de leituras variadas que
promovam a sua inserção, de maneira direta ou indireta, no contexto social em que estão
inseridos.
Essa prática de leitura diversificada está intimamente ligada à variedade de
gêneros textuais, orais e escritos, que circulam cotidianamente na sociedade e no
ambiente escolar.
A esse respeito, Schneuwly (2004) apud Marcuschi (2005) compreende o gênero
textual como uma ferramenta, isto é, como um instrumento que possibilita exercer uma
ação linguística sobre a realidade. Para os autores, os gêneros sempre estão alicerçados
13

em alguma situação concreta. Sendo assim, consideram importante trabalhar enunciados


orais e escritos, a partir de situações reais, explorando o gênero como instrumentos que
incorporam a possibilidade de comunicação e de aprendizagem.
No ambiente escolar, os gêneros tornam-se um ponto de referência concreto para
os alunos, agindo como entidades intermediárias que possibilitam a interação entre o
leitor e o texto para que seja possível desenvolver competências de leitura e escrita
diversificadas.
Sendo assim, é por meio dos gêneros que as práticas de linguagem incorporam-
se nas atividades comunicativas dos alunos. Sobre esse aspecto:

O gênero é fundamental na escola. É ele que é utilizado como meio de


articulação entre práticas sociais e os objetos escolares, mais particularmente,
no domínio do ensino da produção de textos orais e escritos. No afã de
favorecer a aprendizagem da escrita de textos, a escola restringe seus
ensinamentos aos aspectos estruturais ou formais dos textos. É justamente
essa desconsideração de aspectos comunicativos e interacionais que contribui
para que os alunos e professores se preocupem mais com a forma do texto do
que com sua função e, consequentemente, o texto seja visto como formulário
preenchido (para leitura) ou a preencher (para escrita). (MARCUSCHI, 2005,
p.41)

Diante das dificuldades encontradas pelos alunos e professores, no que diz


respeito ao estudo de textos em sala de aula, o estudo do gênero é fundamental na escola
como suporte para o ensino de língua de forma contextualizada e coerente dentro de
uma proposta que possibilite o envolvimento dos alunos de forma prazerosa e, não
apenas em seus aspectos estruturais ou formais, por meio da escrita e da leitura.
Neste sentido, o trabalho com gêneros textuais deve ampliar o desenvolvimento
das habilidades e competências que estejam envolvidas com a leitura melhorando,
portanto, o poder de interpretação de texto e a construção de sentidos que podem
emanar de palavras e expressões.
Dentre a variedade de gêneros textuais, discutiremos propriamente sobre o
gênero tirinha e as suas principais características.
As tiras e demais formas de histórias em quadrinhos (charges, cartuns,
quadrinhos de terror, de super-heróis, infantis, de faroeste, entre outras) compartilham a
tendência de serem textos com sequências narrativas que mesclam elementos verbais e
não verbais, utilizam de um, três ou até quatro quadrinhos e, geralmente, envolve
personagens fixos, ou seja, um personagem principal em torno do qual giram outros.
Com relação à caracterização do gênero tirinha, destacamos a seguinte definição:
14

As tiras são um subtipo de HQ; mais curtas (até 4 quadrinhos) e, portanto, de


caráter sintético, podem ser sequenciais (capítulos de narrativas maiores) ou
fechadas (um episódio por dia). Quanto às temáticas, algumas tiras também
satirizam aspectos econômicos e políticos do país, embora não sejam tão
“datadas” como a charge. Dividimos as tiras fechadas em dois subtipos: a)
tiras-piadas, em que o humor é obtido por meio das estratégias discursivas
utilizadas nas piadas de um modo geral, como a possibilidade de dupla
interpretação, sendo selecionada pelo autor a menos provável; b) tiras-
episódio, nas quais o humor é baseado especificamente no desenvolvimento
da temática numa determinada situação, de modo a realçar as características
das personagens. (MENDONÇA, 2002, p. 199)

Tendo por base a conceituação do gênero tirinha apresentado por Mendonça,


podemos destacar a complexidade inerente ao gênero, constituído pela relação entre
verbal e o não verbal, deixando uma lacuna que poderá ser preenchida pelo leitor. A
esse respeito, destacamos que:

Nessa relação, a leitura do gênero tirinha exige uma interação profunda entre
leitor e texto para que seja possível a construção dos sentidos. Requer, pois,
um trabalho linguístico-cognitivo que envolva diferentes habilidades de
leitura. (UCHOA, 2015, p.100)

Pelo exposto, fica evidente que a leitura do gênero tirinha exige do leitor a
capacidade de explorar diversos significados e, estando presente a ambiguidade como
recurso semântico mobilizado em prol da construção dos sentidos, faz da leitura deste
gênero uma atividade complexa. Diante deste aspecto, passaremos a discutir os
fenômenos citados.

1.2 Ambiguidade: Polissemia X Homonímia X Vagueza

Dentro da abordagem dos fenômenos semânticos voltados ao ensino de Língua


Portuguesa, podemos destacar a ambiguidade que se manifesta através da polissemia,
homonímia e vagueza.
Antes de explorarmos os textos retirados dos livros didáticos de Língua
Portuguesa, é importante verificarmos como a ambiguidade é mobilizada nas tirinhas e
em atividades de leitura para que, em seguida, façamos uma abordagem sobre o
conceito dos fenômenos semânticos, bem como a sua relevância para o ensino da
língua.
Abordaremos, primeiramente, o fenômeno conhecido como ambiguidade ou, em
outras palavras, duplo sentido, múltiplas interpretações e, no sentido de conceituá-la,
apresentamos o pensamento de Ferrarezi Júnior (2008):
15

A ambiguidade é a possibilidade de um mesmo falante atribuir, a uma mesma


sentença, em um mesmo contexto e em um mesmo cenário, mais de um
sentido. Essa característica pode ser propositadamente construída por quem
formulou a sentença, ou estar lá sem querer. (FERRAREZI JÚNIOR, 2008,
p. 179)

Com base na percepção abordada, é possível afirmar que em uma atividade de


leitura, o falante pode interpretar uma sentença de várias maneiras, ou seja, ao se tratar
de situação de conversação entre pessoas que interagem normalmente, pode acontecer
que a interpretação venha a ser realizada de forma diferenciada, pois um dos
interlocutores pode dificultar a comunicação, complicando a identificação do
significado das palavras ou expressões.
Na escrita, a possibilidade de existir a ambiguidade é bem maior, já que as
palavras utilizadas no texto podem revelar significados que estão intrinsecamente
relacionadas com realidades distintas desde cultura, ambiente, entre outros fatores.
Sendo assim, as interpretações advindas do contexto possibilitam a abertura para
múltiplas interpretações.
Sobre esse fenômeno, Dubois (1978) apud Henriques (2011, p. 45) explica que a
ambiguidade pode ser do léxico, mas também pode “advir do fato de que a frase tenha
uma estrutura sintática suscetível de várias interpretações”.
Já Ferrarezi Júnior (2008), frente às discussões apresentadas, discute que a
ambiguidade do texto pode resultar de vários fatores.

1º) Ambiguidade causada pela polissemia de uma palavra: Ex.: “Em rio que
tem piranha, jacaré nada de costas.” A possibilidade de mais de uma
interpretação está no uso de palavras como “piranha” e “jacaré” com sentidos
ou além daqueles que apontam para o peixe e para o réptil, sucessivamente;
2º) Ambiguidade causada por anáforas ou catáforas de múltipla interpretação:
Ex.: “O gavião comeu o pardal em seu ninho.” Bem, ninho de quem? Do
gavião ou do pardal? O problema está no fato de que a palavra “seu”,
anafórica aqui, pode retomar tanto “gavião” como “pardal.”
3º) Ambiguidade pela possibilidade de múltipla interpretação estrutural: Ex.:
“Meu avô cuidou da planta doente.” A pergunta é: quem está doente? O avô
enquanto cuidava da planta ou a planta cuidada pelo avô? O problema está no
fato de que a palavra “doente”, numa estrutura como esta, pode funcionar
tanto em relação a “planta” como em relação a “avô.” (FERRAREZI
JÚNIOR, 2008, p. 180)

Pelo exposto, observamos que ao caracterizar a ambiguidade textual, Ferrarezi


Júnior (2008) já adianta a discussão sobre a diferenciação entre polissemia e
ambiguidade, tomados como fenômenos semânticos geradores de múltiplas
interpretações.
16

Assim compreendido, o sentido de uma palavra vai depender de associações


com outras palavras. Em contextos diferentes, o mesmo item lexical tem sentidos tão
diversos que se pode considerar que se trata de duas palavras distintas.
Desta forma, corrobora-se com a ideia de que:

Como contraparte estrutural da sinonímia, a polissemia é um dos recursos


mais produtivos que o falante possui na construção de seus textos. A
compreensão de seu funcionamento é essencial para a compreensão do que
seja a estrutura gramatical e o processo de atribuição de sentidos de uma
língua. Sem compreender a polissemia, não se pode dizer que se compreende
a estrutura e o funcionamento de uma língua natural. (FERRAREZI JÚNIOR,
2008, p. 166)

Com relação à homonímia, Cançado (2012) expressa que este fenômeno ocorre
quando os sentidos da palavra ambígua não são relacionados, como no item lexical
“manga” que pode designar uma fruta, parte do vestuário, terceira pessoa do presente do
indicativo do verbo mangar, entre outros sentidos.
Outro fenômeno, que também apresenta indeterminação semântica, é a vagueza,
que pode ser definida como aquele que “ocorre quando o uso de uma palavra gera casos
duvidosos de aplicação a certos seres ou situações” ( MOURA, 2001, p. 113).
Sobre esse fenômeno, Ferraz (2014) apud Uchoa (2015) esclarece que ocorre a
vagueza quando o emprego de um termo gera sentidos cuja aplicação é duvidosa, por
não haver um limite preciso de sua aplicabilidade. Como exemplo, podemos citar o
caso do adjetivo “bom” que denota uma propriedade que não se pode medir, pois não
existe um padrão que caracterize algo ou alguém como bom.
Vale salientar que o estudo da ambiguidade como ferramenta para o ensino de
leitura é de fundamental importância, pois direciona a abordagem da língua para algo
mais palpável e dinâmico voltada para o seu uso real. Ou seja, a compreensão e o
funcionamento da língua à luz da Semântica Lexical e das teorias de leitura permitem
por parte dos interlocutores uma interpretação que esteja relacionada em sentenças que
foram propositadamente, ou não, construídas para permitir horizontes interpretativos
relacionados aos muitos sentidos das palavras ou expressões de uma língua.
É, pois, dentro desse escopo sobre as diversas possibilidades de interpretação
que podem emanar de uma palavra ou expressão que analisaremos, a partir do livro
didático de Língua Portuguesa, as propostas de atividades organizadas a partir de
fenômenos de ambiguidade.
17

1.3 O lugar do Gênero Tirinha no Livro didático de Língua Portuguesa

Na ótica escolar, os gêneros se tornam um ponto de referência concreto para os


alunos, pois permitem que o processo de ensino/aprendizagem seja entendido como
uma ferramenta que amplia a competência leitora dos alunos, tanto na produção quanto
na compreensão de textos adequados à esfera de circulação, uma vez que os gêneros
fazem parte do cotidiano das pessoas.
Dessa forma, sendo o gênero textual um instrumento eficaz para a aprendizagem
da língua materna e também por proporcionar o desenvolvimento das habilidades
inerentes à leitura, interpretação e produção de texto, faz-se necessário que os livros
didáticos de língua portuguesa utilizem dessa prática como forma de melhorar a
competência leitora dos alunos.
Os Parâmetros Curriculares Nacionais (1998) colocam para os professores de
língua uma proposta de estudo pautada nos textos que por sua vez deve estar inserido
dentro de um gênero específico.
A escolha pelo gênero tirinha foi impulsionada uma vez ser de fácil acesso e por
estar presente no âmbito escolar, principalmente em livros didáticos como forma de
chamar a atenção do leitor e também ser um material interessante para tratamento sobre
a língua, já que as tirinhas podem apresentar conteúdos diversificados e levar o aluno a
uma interpretação crítica gerada pela presença do humor como principal elemento
incitador do interesse e desencadear o processo interpretativo das palavras, requerendo
do leitor a mobilização das habilidades de leitura para chegar ao sentido gerador do
humor.
Sobre esse aspecto, Antunes (2012) enfatiza que:

O que faz da linguagem uma realidade complexa é essa sua bipolaridade, no


sentido de que é sistemática e, ao mesmo tempo, imprevisível; definida e, ao
mesmo tempo, inexata. Consequentemente, o que deixa o falante competente
é sua habilidade para administrar essa complexidade e dela se aproveitar
sempre que quiser. (ANTUNES, 2012, p. 97)

Nesta perspectiva, no momento em que o leitor depara-se com essa linguagem


“bipolar”, por meio de textos confeccionados de forma ambígua e imprevisível,
mobilizar os sentidos associados às palavras e percebe qual delas é direcionadora para
compreender o sentido do texto, já que nossa atitude enquanto falante de uma língua é
18

sempre dinâmica e criativa e os seus significados, por serem flexíveis e passíveis de


mudança de acordo com o contexto de uso, “às palavras são associados significados
básicos que constituem, isso mesmo, a base para a derivação de outros significados,
próximos, associados, afins” (ANTUNES, 2012, p. 29).
Toda essa dinâmica promove condições para que o aluno constitua-se um leitor
ativo, construtor de suas próprias estratégias de leitura.
19

2 ANÁLISE E DISCUSSÃO DE DADOS

Com o intuito de abordar a importância de estudar a ambiguidade como


fenômeno semântico, mobilizado na construção de gênero tirinha, analisamos os livros
didáticos Vontade de Saber Português (ALVES, R.; BRUGNEROTTO T., 2012) e
Português: Linguagens (CEREJA&MAGALHÂES, 2012), ambos do 9º ano do
ensino fundamental e deles fizemos os recortes de atividades que formam o corpus deste
trabalho.

TIRINHA 1

Fonte: ALVES, R.; BRUGNEROTTO, T. Vontade de Saber Português. 9º ano-p. 214.

A primeira tirinha que analisamos foi retirada do livro Vontade de Saber


Português e, mais, especificamente, abordada na seção AMPLIANDO A
LINGUAGEM que trata a Polissemia como assunto motivador para o estudo da
linguagem, amplamente trabalhada na seção PRATICANDO.
20

Nesse contexto, a ambiguidade está sendo apresentada por meio da polissemia,


através do enfoque a uma palavra e mais de um significado. Sendo assim, podemos
perceber que a tirinha desperta no interlocutor a possibilidade de várias interpretações.
No 1º quadrinho, encontramos o vocábulo “pega” que pode significar, neste
contexto, S1: segurar, agarrar; S2: prender, colar; S3: obter. Ou seja, a abordagem do
fenômeno da ambiguidade está sendo usado na construção de conhecimento da língua
por meio do seu caráter dinâmico, produtivo, criativo, inesgotável” não é possível
considerar as palavras como símbolos vazios de significados (UCHOA, 2015, p.106).
Diante da análise, podemos destacar como positivo o modo pelo qual o livro
didático aborda a polissemia, conceituando-a e, por meio de atividades levando o aluno
a conhecer, reconhecer e empregar de modo adequado os recursos da língua em seus
vários níveis, no que diz respeito tanto as suas regras gerais como em seu caráter
semântico.
De acordo com Cançado (2005, p.57), essa visualização dos sentidos somente é
possível porque “[...] é mais fácil definir uma palavra se esta é dada pelo contexto de
uma sentença”, uma vez que os seus efeitos contextuais podem orientar o significado
das palavras por caminhos diferentes.
No caso em questão, Zé que assume a função de goleiro deveria “agarrar” a
bola, porém, ele a “segura” e a leva consigo, deixando claro que o termo polissêmico
“pega” instiga o leitor a compreender o jogo de sentidos que representa.
Assim, para identificar o sentido que a palavra expressa, é preciso recorrer ao
contexto em que está sendo utilizado.
A esse respeito, Oliveira (2008) enfatiza que:

Se os significados das palavras não existem a priori, cabendo ao leitor


produzi-los a partir de sua interpretação durante o ato de leitura, pode-se
concluir, naturalmente, que o leitor dá o significado que quiser às palavras e
aos textos. Afinal, ele é o produtor de significados, não é? (OLIVEIRA,
2008, p. 141)

De posse dos dados apresentados, podemos afirmar que o fenômeno da


ambiguidade foi percebido, pois a partir do momento em que os alunos identificam a
variedade de significados que podem emanar de uma palavra, como também a sua
interpretação diante do contexto onde estão inseridos.
Além da ambiguidade ser exposta pelo léxico como recurso humorístico,
percebemos que também é apresentada para que o aluno concluísse, à respeito das
21

interpretações possíveis, os recursos textuais utilizados na tirinha, os efeitos


mobilizados possíveis a cada situação comunicativa e elegesse o humor como condição
para a construção das possíveis interpretações advindas.
Oliveira (2008, p. 165) destaca a importância de inserir atividades que envolvam
a ambiguidade, seja ela lexical ou pela estrutura sintática, na sala de aula, sob a
fundamentação de que “um fator importante para o sucesso na produção e na
compreensão de textos é estar o mais consciente possível a respeito das estratégias
utilizadas nesses dois processos textuais”.
Outro exemplo deste fenômeno pode ser visualizado na tirinha de Laerte.

TIRINHA 2

Fonte: ALVES, R.; BRUGNEROTTO, T. Vontade de Saber Português. 9. Ano. p. 174.

Analisando a tirinha apresentada, podemos concluir que o duplo sentido é


gerado pela homonímia do item lexical “ponta”, visto que no 1º quadrinho, em
“tecnologia de ponta” refere-se à S1: tecnologia de última geração. Ao se referir à ponta
no último quadrinho, o personagem refere-se a S2: uma peça da nave espacial, a ponta
dela.
22

A este respeito, Cançado (2012, p. 71) nos relata que “a homonímia ocorre
quando os sentidos da palavra ambígua não são relacionados”. Consiste, pois, em um
fenômeno muito significativo que ressalta a complexidade da língua quando
encontramos uma palavra que tem significados diferentes.
Pelo exposto, encontramos um mesmo item lexical “ponta”, porém cada item
com sentidos diferentes. No 1º quadrinho, ao fazer essa afirmação, o personagem dá um
tapa na nave. Com isso, a ponta da nave cai no chão, mostrando que ela não apresenta
condições tão avançadas assim, portanto, ativando o gatilho do humor por meio dos
scripts acionados pelo léxico.
No referido livro didático, a ambiguidade está sendo apresentada no sentido
mais amplo sob o conceito de ser um VÍCIO DE LINGUAGEM, incentivando o aluno a
compreender a ambiguidade como um “erro” linguístico, o que pode ser um equívoco,
tendo em vista que, em tirinhas, a ambiguidade é usada como recurso para enriquecer o
texto e provocar o humor.
Ao passo em que a ambiguidade é mobilizada como recurso humorístico,
também é apresentada como um problema da construção, exemplificado por meio de
atividades que levam o aluno a perceberem um vício da língua, remetendo a um erro e
revelando com isso uma visão prescritiva da língua.
Tal fato demonstra uma fragilidade do livro didático na hora de abordar a
semântica, quase sempre desvalorizada pela maioria dos autores, pois ela pode auxiliar
os alunos a aprimorarem a competência leitora.
A esse respeito, Oliveira (2008, p. 165) afirma que:

O último ponto que considero importante abordar em sala de aula é a


ambiguidade. Vimos que ela pode ser causada por palavras polissêmicas
(ambiguidade lexical) ou pela estrutura sintática (ambiguidade sintática ou
estrutural). Às vezes, os estudantes não prestam atenção a isso e elaboram
textos com sentenças ambíguas inconscientemente. Um fator importante para
o sucesso na produção e na compreensão de textos é estar o mais consciente
possível a respeito das estratégias utilizadas nesses dois processos textuais.
(OLIVEIRA, 2008, p. 165)

É de suma importância destacar, ainda, que na escrita, quando não há propósitos


comunicativos de uso da ambiguidade, como no caso do humor, que os alunos elaborem
sentenças que sejam condizentes com o que queiram afirmar, evitando, portanto uma
diversidade de interpretações.
23

Após analisados os livros didáticos acima mencionados percebemos que apenas


em um deles foi dado destaque nas seções “Praticando” e “Vício de linguagem” os
fenômenos semânticos da ambiguidade: polissemia e homonímia.
Relativo à seção “Praticando”, os autores ALVES, R.; BRUGNEROTTO, T.
abordaram à língua tendo em vista o seu caráter positivo, dinâmico e criativo.
Ressaltamos a dificuldade de encontrar exemplos de tirinhas nos livros didáticos
que abordassem o fenômeno da ambiguidade como escopo para a compreensão e
interpretação da língua.
Entendemos que essa lacuna deixada pelos livros didáticos na caracterização dos
significados dentro do ensino da linguagem é uma falha que deve ser suprimida, tendo
em vista a inserção de fenômenos semânticos na construção de conhecimentos
linguísticos.
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3 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A pesquisa propôs-se a estudar o fenômeno da ambiguidade com o aporte do


gênero tirinha explorado nos livros didáticos, atentando a sua abordagem como
ferramenta principal para o desenvolvimento da competência leitora no aluno.
Levar o aluno a interpretar o gênero tirinha chega a ser um recurso produtivo na
construção de efeito de sentido desejado, principalmente quando se utiliza o humor e a
ambiguidade como ferramentas metodológicas que formam leitores competentes
capazes de decodificar e compreender o código linguístico.
Como estratégia para introduzir os alunos no universo da leitura, a abordagem da
ambiguidade é um fator preponderante que auxilia a compreensão do gênero tirinha,
como também no estudo dos sentidos quando explora os significados das palavras,
principalmente em atividades propostas nos livros didáticos que têm como objetivo
maior apresentar a língua como um fenômeno produtivo, inovador e que está sempre em
movimento para melhorar a interação entre os seus interlocutores.
Destacamos a dificuldade de encontrar exemplos de tirinhas que mobilizassem o
fenômeno da ambiguidade, o que foi observado apenas no livro do 9º ano de ALVES,
R.; BRUGNEROTTO, T. Vontade de Saber Português, por sinal com uma
discrepância enorme, pois a obra ora expõe a ambiguidade de maneira positiva,
revelando a possibilidade de uma só palavra ter várias interpretações; ora apresenta o
mesmo fenômeno sob uma ótica negativa, como um vício de linguagem demonstrando
uma abordagem que não condiz com a anterior.
Pelas constatações deste estudo, percebemos que a ambiguidade como fenômeno
semântico pode ser trabalhado em sala de aula por meio do gênero, no sentido de
induzir o aluno à reflexão e ao uso da língua em suas várias formas de manifestação,
revelando ser o livro didático um instrumento que amplia os horizontes interpretativos
por dispor de elementos que colocam o aluno frente a uma zona de compreensão dos
fenômenos constitutivos dos sentidos.
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