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XI ENCONTRO AMAZÔNICO DE AGRÁRIAS

PRODUÇÃ O SUSTENTÁ VEL:


ESTRATÉ GIAS PARA A REDUÇÃ O DE IMPACTOS AMBIENTAIS NA AMAZÔ NIA
1 A 5 DE JULHO – UFRA BELÉ M

POLÍTICAS PÚBLICAS E DINÂMICAS SOCIOAMBIENTAIS COMUNITÁRIAS: O


CASO DE BOA VISTA, BONITO-PA

Dayla Carolina Rodrigues Santos1; Nazareno de Jesus Gomes de Lima2; Lucas Lima
Raiol3;Luiz Cláudio Moreira Melo Júnior4.

RESUMO

O objetivo da pesquisa foi analisar as relações entre políticas públicas e dinâmicas


socioambientais no contexto da comunidade rural de Boa Vista, Bonito-Pará. O trabalho foi
feito por meio de visitas exploratórias e aplicação de questionários junto a atores-chave,
utilizando amostragem “bola de neve”. Foram levantadas as problemáticas socioambientais
locais, segundo a percepção dos comunitários, no que diz respeito ao acesso da população a
serviços básicos de uso público, como os de saúde e educação, além das relações da
comunidade com o empreendimento de dendeicultura, de grande porte, localizado no entorno
do território comunitário. Constatou-se um deficiente acesso da população aos serviços de uso
público, enfraquecendo o sistema social local. Também a relação empresa e comunidade não
tem cumprido um papel de gerar desenvolvimento e melhoria da qualidade de vida para os
comunitários, haja vista a pouca geração de empregos locais, a insegurança nas vias de
acesso, em virtude do aumento no tráfego de veículos carregados de dendê, e a falta de
diálogo entre a empresa e a comunidade.

PALAVRAS-CHAVE: Estudos de comunidade. Políticas públicas. Monocultura de dendê.

ABSTRACT

The objective of the research was to make changes in public and social policies in the context
of the rural community of Boa Vista, Bonito-Pará. The work was done through exploratory
visits and application of questionnaires in conjunction with the use of snowballs. They were
taken as local socio-environmental problems, such as health care, attention to population
access, basic health services, education and education, as well as community needs with the
development of small-scale aquaculture located near the community territory. Poor public
access to public services was found, weakening the local social system. The company and
communities have not yet fulfilled a role of generating development and improving the
quality of life for young people, due to the low generation of local jobs, insecurity in access
roads, palm oil, and the lack of dialogue between the company and the community.

KEYWORDS: Community studies. Public policy. Palm monoculture

INTRODUÇÃO

1
Discente do curso de Agronomia da Universidade Federal Rural da Amazônia- Campus Capanema, E-mail:
daylas70@gmail.com
2
Discente do curso de Engenharia Ambiental e Energias Renováveis da Universidade Federal Rural da
Amazônia- Campus Capanema
3
Discente do curso de Engenharia Ambiental e Energias Renováveis da Universidade Federal Rural da
Amazônia- Campus Capanema
4
Professor Adjunto da Universidade Federal Rural da Amazônia- Campus Capanema
1
XI ENCONTRO AMAZÔNICO DE AGRÁRIAS
PRODUÇÃ O SUSTENTÁ VEL:
ESTRATÉ GIAS PARA A REDUÇÃ O DE IMPACTOS AMBIENTAIS NA AMAZÔ NIA
1 A 5 DE JULHO – UFRA BELÉ M

Este trabalho aborda as relações entre políticas públicas e dinâmicas socioambientais


no contexto da comunidade rural de Boa Vista, Bonito-Pará. Tratou-se de investigar as
problemáticas socioambientais locais, segundo a percepção dos comunitários, no que diz
respeito ao acesso da população a serviços básicos de uso público, como os de saúde
educação, além das relações da comunidade com o empreendimento de dendeicultura, de
grande porte, localizado no entorno do território comunitário.
Nesse cenário, o Programa Nacional de Produção do Biodiesel (PNPB) surgiu com o
propósito de implementar, de forma sustentável, artifícios que levem à produção do
combustível e ao desenvolvimento econômico e social. Entretanto, na comunidade de Boa
Vista, a partir da expansão da monocultura do dendê, notou-se uma disparidade entre o
desenvolvimento proposto no programa e a realidade dos atores envolvidos, haja vista uma
mudança nas dinâmicas produtivas, além de não gerar muitos empregos locais.
Vale ressaltar que a gestão de políticas públicas no âmbito rural no Brasil tem
caminhado por meio de incentivos às grandes empresas produtoras de commodities agrícolas,
como a palma de óleo. Trata-se de ações que buscam somente o crescimento econômico,
deixando às margens desse crescimento as pequenas comunidades, situadas próximos a esses
empreendimentos, gerando um ambiente propício à geração de conflitos socioambientais
(BONAL & MALUF 2010).
Rigotto et al. (2012) afirmam que a introdução das monoculturas desafia as
populações atingidas a lidar com os impactos desse modelo na expropriação das terras,
proletarização e relações de trabalho precárias, degradação e contaminação ambiental,
adoecimento das pessoas, desaparecimento e mudanças no modo de vida das comunidades
camponesas, trazendo a público o “outro lado” do desenvolvimento no campo e questionando,
com suas lutas, os níveis toleráveis de subordinação e de exploração.
Desta forma, este artigo teve como objetivo realizar uma análise das relações entre
políticas públicas e dinâmicas socioambientais no contexto da comunidade rural de Boa Vista,
Bonito-Pará, com destaque para o acesso da população aos serviços básicos de uso público e
para as problemáticas socioambientais locais.

MATERIAL E MÉTODOS

A área de estudo está localizada na comunidade de Boa Vista, distante 12 km da sede


do município de Bonito, no nordeste paraense, com latitude S01°27’07’’ e longitude

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W047°23’56’’. A comunidade é cortada pela Rodovia PA-322, que liga os municípios de


Bonito a São Miguel do Guamá. Na comunidade, atualmente, residem 72 famílias, que
povoam as margens da rodovia.
O trabalho foi feito por meio de visitas exploratórias e aplicação de questionários junto
a atores-chave, tais como professores, agentes de saúde, agricultores, pescadores,
trabalhadores assalariados e comerciantes. Utilizou-se a amostragem do tipo “bola de neve”,
na qual um comunitário indicou o próximo a ser entrevistado. Trata-se de uma estratégia
metodológica de caráter não probabilístico, cujo objetivo é recolher as informações em
cadeias de referência, o que possibilita o estudo de comunidades que possuem grupos
específicos, como os denominados “atores-chave”, sujeitos com o perfil necessário para a
caracterização da comunidade. Ao todo, foram aplicados 14 (quatorze) questionários
semiestruturados, contendo 12 (doze) perguntas sobre temáticas como família, uso dos
recursos naturais, mudança de paisagem e sistemas sociais. As informações obtidas foram
tabuladas no programa Microsoft Office Excel 2010, e correlacionadas com a fundamentação
teórica.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Com a expansão da monocultura do dendê no município de Bonito, particularmente na


comunidade de Boa Vista, ocorreu uma mudança na oferta de terra disponível para os
comunitários, devido ao crescimento da monocultura de dendê ao entorno da mesma. Nesse
sentido, Nahum e Santos (2013) afirmam que no estado do Pará existem quatro caminhos que
as empresas adquirem a terra e produzem o dendê, sendo um deles a compra. Desse modo, no
contexto da histórica concentração de terra, até então, esquecida no âmbito das discussões do
desenvolvimento territorial rural, da geração de emprego e renda, da inclusão social e da
recuperação de áreas degradadas pela pecuária, o que se vê é a perpetuação da concentração e
da centralização de terra, sendo agora as empresas de dendê os novos atores (NAHUM &
SANTOS, 2016).
A relação das famílias da comunidade de Boa vista com o dendê evidencia a mudança
do camponês tradicional, adaptando-se a outras atividades, que, até então, não desenvolvia.
Quanto à composição da renda familiar dos entrevistados, 30% deles vivem, exclusivamente,
da aposentadoria, e outros 20 % de bolsa e salário e as demais atividades correspondem a 10%
cada (Tabela 1).

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Tabela 1- Composição da renda familiar


Atividade Distribuição da atividade (%)
Aposentadoria 30
Comércio 10
Assalariado 10

Atividade Distribuição da atividade (%)


Bolsas e assalariado 20
Lavoura e comércio 10
Lavoura e aposentadoria 10
Lavoura, aposentadoria e bolsas 10
Fonte: Resultados da pesquisa (2019)

Conforme Nahum e Santos (2016), o movimento da dendeicultura na agricultura


familiar acentua processos anteriormente existentes nesses espaços rurais, tais como a crise na
produção familiar de alimentos, envelhecimento do agricultor familiar, enfraquecimento da
pluriatividade no campo, dependência e subordinação dos lugares à dinâmica das empresas,
enfraquecimento dos movimentos sociais e das lutas pela reforma agrária, entre outros, que
são objeto de investigação, análise e interpretação da geografia agrária e dos movimentos
sociais.
Os agricultores da comunidade de Boa Vista, em decorrência da expansão do dendê,
buscaram novas alternativas para a composição da renda familiar, com destaque para o
fortalecimento do comércio como fonte de ocupação entre os comunitários. Outra
problemática é a pouca inclusão dos comunitários na ocupação de cargos nas empresas de
monocultura, não sendo esta geradora de emprego para as comunidades em seu entorno, como
prevê o Programa Nacional de Produção e Uso do Biodiesel (PNPB).
Sobre o sistema de saúde, a comunidade não possui posto de saúde. Existe apenas um
agente social comunitário (ACS), que visita as famílias com frequência mensal. Para ter
acesso aos serviços de atendimento médico, os comunitários deslocam-se para a comunidade
vizinha, São João de Panelas, distante cerca de 3 km e que possui um posto de saúde em
condições precárias. De acordo com o ACS, nessa unidade, são oferecidos serviços básicos de
enfermagem e de atendimento médico, uma vez na semana. Os atendimentos mais complexos
e graves são encaminhados para a sede municipal de Bonito ou para munícipios próximos,
como Capanema e São Miguel do Guamá.
Assim, percebe-se uma invisibilidade e inacessibilidade do subsistema de saúde da
comunidade, fato que não se modificou após a introdução do dendê na comunidade. O que
evidencia que o estímulo ao “desenvolvimento”, por meio dos empreendimentos de dendê, em

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Bonito, não assistiu as comunidades afetadas pelas atividades da monocultura. Portanto, o


Programa de Produção Sustentável de Óleo de Palma (PSOP), não está inserido, na prática, na
comunidade, principalmente considerando a dimensão da inclusão social comunitária.
O acesso aos programas básicos de saúde é um direito de todos, garantido pela
Constituição Federal (CF) de 1988. Dessa forma, o Ministério da Saúde, com o
estabelecimento do Sistema Único de Saúde (SUS), afirma que para as políticas de saúde
serem aplicadas em sua potencialidade, faz-se necessário uma articulação entre o poder
público municipal e os agentes de saúde para o estabelecimento de medidas que busquem
atender as necessidades mínimas das populações rurais. No caso de Boa Vista, não há essa
garantia do direito mínimo à qualidade de vida para a população.
Já o sistema educacional é constituído por uma escola, que está presente na
comunidade desde antes da implantação do dendezal, a qual abrange do ensino pré-escolar ao
quarto ano do fundamental. A escola possui apenas 2 (duas) professoras e 42 (quarenta e dois)
alunos matriculados. A continuidade dos estudos das crianças e adolescentes da comunidade
se dá por meio do deslocamento dos mesmos para a sede do município, na qual se acessa os
níveis posteriores de ensino. Um dos problemas identificados é a proximidade geográfica dos
plantios de dendê com a sede da escola, surgindo conflitos relacionados à segurança das
pessoas no translado até a mesma, devido ao constante tráfego de veículos pesados em alta
velocidade pela via, a qual gera insegurança dos pais e professores, principalmente nos
horários de lazer das crianças, pois a estrutura é limitada, não possuindo separação da estrada
com a área da escola.
Outra problemática observada pelos comunitários é a poeira decorrente da passagem
de veículos pesados e da temperatura elevada, pelo fato de não haver ventiladores na sala de
aula, dificultando as atividades da escola. Questões como a falta de merenda escolar também
afetam a qualidade do ensino, visto que, na ausência da merenda, as crianças são dispensadas
da escola mais cedo.

CONCLUSÕES

Conclui-se que a expansão da monocultura de dendê na comunidade da Boa Vista não


gerou melhorias na qualidade de vida da população local. Dessa forma, notou-se que a PNPB
apresenta apelo somente econômico, muito aquém das expectativas de inclusão social
comunitária. Ademais, segundo a percepção dos moradores, a chegada do empreendimento de

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dendê não veio acompanhada do fortalecimento do acesso aos serviços básicos de uso
público, como os de saúde e educação. A monocultura acabou gerando impactos apenas
pontuais, a exemplo do crescimento do comércio local, a despeito da desarticulação da
agricultura familiar da comunidade. Enfim, trata-se de estratégias de desenvolvimento
incipientes na promoção do bem-estar social comunitário.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BONNAL, Philippe & MALUF, Renato S. Do uso das noções de multifuncionalidade e


território nas políticas agrícolas e rurais no Brasil. Brasil rural em debate: coletânea de artigos
/ Nelson Giordano Delgado (org.). Brasília; CONDRAF/MDA, 2010. 363p.

Brasília, DF, 2004. BRASIL. Programa Nacional de Produção e Uso do Biodiesel- PNPB,


documento básico, Secretaria Especial de Agricultura Familiar e do Desenvolvimento Agrário
(Sead), Comissão Executiva Interministerial (CEIB), Governo Federal.

Brasília, DF, 2010. BRASIL. Programa de Produção Sustentável de Óleo de Palma


(PSOP), documento básico, Secretaria Especial de Agricultura Familiar e do
Desenvolvimento Agrário (Sead), Comissão Executiva Interministerial (CEIB), Governo
Federal.

RIGOTTO, Raquel Maria et al. O verde da economia no campo: desafios à pesquisa e às


políticas públicas para a promoção da saúde no avanço da modernização agrícola. Ciência &
Saúde Coletiva, v. 17, p. 1533-1542, 2012.

NAHUM, J. S.; SANTOS, C. B. Impactos socioambientais da dendeicultura em comunidades


tradicionais na Amazônia Paraense. ACTA Geográfica, Boa Vista, Ed. Esp. Geografia
Agrária, p. 63-80, 2013.

NAHUM, J. S.; SANTOS, C. B. A dendeicultura na Amazônia paraense. Geousp – Espaço e


Tempo (Online), v. 20, n. 2, p. 281-294, mai/ago. 2016.

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