Você está na página 1de 2

UNIVERSIDADE DE PASSO FUNDO

INSTITUTO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS


CURSO DE LETRAS
DISCIPLINA: ENUNCIAÇÃO E DISCURSO
PROFESSOR: DR. ERNANI CÉSAR DE FREITAS
ACADÊMICO: FELIPE QUEVEDO GIOVANONI

CHARAUDEAU, P. Linguagem e discurso: modos de organização. São Paulo: Contexto, 2008. p. 43-63.

O ato de linguagem como ato interenunciativo

1. O ato de linguagem, como evento de produção e interpretação, depende “dos saberes supostos
que circulam entre os protagonistas da linguagem”. Estes saberes são correlativos à dupla
dimensão Explícito/Implícito do fenômeno linguageiro.
○ O TU não é um simples receptor de mensagem, mas sim um sujeito que constrói uma
interpretação em função do ponto de vista que tem sobre as circunstâncias de discurso e,
portanto, sobre o EU (interpretar é sempre instaurar um processo para apurar as
intenções do EU).
○ Correlativamente, esse TU-interpretante (TU’) não é o mesmo que o TU-destinatário (TU)
ao qual se dirige o EU. Como consequência o TU’, ao fazer sua interpretação, reflete o
EU com uma imagem (EU’) diferente daquela que o EU acreditava (queria?) ter.
○ Em outras palavras, o EU dirige-se a um TU-destinatário que o EU acredita (deseja) ser
adequado ao seu propósito linguageiro.
2. Assim, o ato de linguagem não deve ser concebido como um ato de comunicação resultante da
simples produção de uma mensagem que um emissor envia a um receptor. Tal ato deve ser
visto como um encontro dialético (encontro esse que fundamenta a atividade metalinguística de
elucidação dos sujeitos da linguagem) entre dois processos:
○ Processo de produção, criado por um EU e dirigido a um TU-destinatário;
○ Processo de interpretação, criado por um TU-interpretante que constrói uma imagem do
EU’ do locutor.
3. O ato de linguagem torna-se então um ato interenunciativo entre quatro sujeitos (e não 2), lugar
de encontro imaginário de dois universos de discurso que não são idênticos.

Zona de
EU processo de produção => TU intercompreensão
suposta

EU’ <= processo de


interpretação TU’
Definição dos sujeitos da linguagem

1. O TUd (sujeito destinatário) é o interlocutor fabricado pelo EU como destinatário ideal, adequado
ao seu ato de enunciação.
2. O TUi (sujeito interpretante) é o sujeito responsável pelo processo de interpretação que escapa,
devido a sua posição, do domínio do EU.
○ O TUi tem por tarefa, em seu ato interpretativo, recuperar a imagem do TUd que o EU
apresentou e, ao fazer isso, deve aceitar (identificação) ou recusar (não identificação) o
estatuto do TUd fabricado pelo EU.
3. Apenas o sujeito percebido (construído) pelo TUi é esse EU’ que chamaremos de EUe (sujeito
enunciador). EUe é uma imagem de enunciador construída pelo sujeito produtor da fala (EUc).
○ Independentemente do lado em que esteja em foco, o EUe (assim como o TUd) é um ser
que existe no e pelo ato de produção-interpretação
4. O EUc (sujeito comunicante) é, como o TUi, um sujeito agente que se institui como locutor e
articulador da fala. É o iniciador do processo de produção, processo construído em função das
circunstâncias de discurso que o ligam ao TU e que constituem a sua intencionalidade.

Os dois circuitos do ato de linguagem e o esquema de representação

SITUAÇÃO DE
(Finalidade)
COMUNICAÇÃO
(Projeto de fala)

EUe Dizer TUd


Locutor Enuncia Destinat Receptor
EUc dor ário TUi
(sujeito (ser de (ser de (Sujeito
comunican fala) Espaço interno fala) interpretan
te - ser te - ser
social) social

Espaço externo

O que é analisar um ato de linguagem?

1. Analisar um ato de linguagem não pode consistir em dar conta apenas da intenção do sujeito
comunicante (EUc).
2. A análise de um ato de linguagem não pode pretender dar conta da totalidade da intenção do
sujeito comunicante.
3. Deve-se, sim, dar conta dos possíveis interpretativos que surgem (ou se cristalizam) no ponto de
encontro dos dois processos de produção e de interpretação. O sujeito analisante está em uma
posição de coletor de pontos.
○ Possíveis interpretativos constituem as representações linguageiras das experiências dos
indivíduos que pertencem aos grupos sociais ou comunidades humanas,
enquantosujeitos individuais ou coletivos.

Você também pode gostar