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Apontamentos sobre Direito Desportivo – por Marcílio Krieger

O desporto brasileiro é regido, no presente momento, pela Lei Geral Sobre Desportos _ Lei n°
9.615/98, a antiga Lei Pelé e suas alterações _ e Lei n° 10.671/03, que ficou conhecida como Estatuto
do Torcedor. Esses dois diplomas formam a espinha dorsal do nosso Direito Desportivo, havendo
outras leis que poderíamos chamar de complementares como, por exemplo, a de n° 9696/98, que
dispõe sobre a regulamentação da Profissão de Educação Física; a n° 6.354/76, sobre as relações de
trabalho do atleta profissional de futebol; a n° 10.220/01, que alçou o peão de rodeio a atleta
profissional; a n° 10.264/01, chamada de Queiroz/Piva, estabelecendo recursos para o desporto
Olímpico e Para­Olímpico; a n° 10.671/03, conhecida como "da responsabilidade do desporto
profissional" _ as três últimas incorporadas ao texto da LGSD. Neste exato momento tramita na
Câmara dos Deputados o Projeto de Lei denominado "Estatuto do Desporto", um alentado projeto que
engloba várias proposições sobre as diversas modalidades desportivas, com especial ênfase para ao
futebol. Seu Relator, Deputado Federal Gilmar Machado, pretende que a matéria seja colocada em
votação pelo Plenário da Câmara ainda neste segundo semestre de 2003, com o que passaríamos a
dispor de um documento unificado, uma verdadeira Consolidação do Direito Desportivo Brasileiro. 

O ESTADO NOVO E O DESPORTO 

É interessante observar que, a exemplo da legislação trabalhista, foi em pleno Estado Novo que
surgiram os primeiros dispositivos legais referentes ao desporto: Decreto­lei n° 526/38, que criou o
Conselho Nacional de Cultura, ao qual estava subordinada a educação física, que englobava a
ginástica e a prática desportiva. No ano seguinte, pelo Decreto­lei n° 1.056, era instituída a Comissão
Nacional de Desportos. Em 1941, o Decreto­lei n° 3.199 instituiu o Conselho Nacional de Desportos,
de âmbito nacional, e os Conselhos Regionais de Desportos, de abrangência estadual. É interessante
observar que a concepção do CND encerrava a própria ideologia estadonovista: o mesmo órgão
exercia, simultaneamente, as funções legislativas, executivas e judicantes, ideologia que, de certa
forma, viria a se repetir meio século depois com as edições de Medidas Provisórias sobre as mais
variadas questões, através das quais o Executivo assumia, e assume, o papel do Legislativo. Entre sua
criação, em abril de 1941, e sua extinção, em julho de 1993, o CND produziu mais de quatro centenas
de deliberações e resoluções estabelecendo, instituindo, determinando normas sobre, por exemplo,
futebol feminino de salão, natação, squash, limites de idade para participação infanto­juvenil em
competições de golfe, infrações e penalidades no páraquedismo, vôo livre, boliche, pilotos de
competições automobilísticas, estágio de atleta amador, natação, "prática de desportos pelas
mulheres", e, desde logo, futebol: intervalos mínimos entre partidas, publicidade nas camisas dos
jogadores, valor do passe, obrigatoriedade de recesso, fixando o número máximo de jogadores
estrangeiros por equipe... 

A CONSTITUCIONALIZAÇÃO DO DIREITO DESPORTIVO 

Em outubro de 1975, é editada a Lei n° 6.251, que instituiu normas gerais sobre desportos, e que
vigoraria até 1993, quando então a Lei Zico a revogou. Em 1976 surge a Lei n° 6.354, dispondo sobre
as relações entre jogador profissional de futebol e clube, que está ainda em vigor, embora alguns de
seus artigos tenham sido revogados expressa ou tacitamente pelas Leis Zico e Pelé. 

Foi em 1988, contudo, que o desporto brasileiro alcançou um patamar constitucional. No artigo 217
da Constituição Federal está insculpido que o desporto é um direito de cada um, cabendo ao Estado o
fomento da prática desportiva, seja ela fundada em normas e regras (prática formal) ou não. Ao longo
de quatro incisos são estabelecidos os referenciais dessa relação cidadão/Estado: as entidades
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desportivas dispõem de autonomia para se organizarem e funcionarem; os recursos públicos devem
ser canalizados prioritariamente para o desporto educacional e, em casos específicos, para o desporto
de alto rendimento; deve haver tratamento diferenciado entre desporto profissional e não­profissional;
proteção e incentivo às manifestações desportivas de criação nacional. Seguem­se três parágrafos, o
primeiro dos quais institui a Justiça Desportiva e, ao mesmo tempo, estabelece ser ela requisito de
admissibilidade para recursos ao Poder Judiciário quando a matéria a versar sobre questões afeitas à
disciplina ou às competições desportivas. O segundo parágrafo determina que a Justiça Desportiva
tem o prazo peremptório de sessenta dias, contados da citação das partes ("constados da instauração
do processo", diz o texto constitucional) para proferir decisão final. O terceiro parágrafo, por sua vez,
estabelece a correlação entre lazer e promoção social. 

A partir da promulgação da Carta Magna, o Direito Desportivo começa a se firmar como um ramo
autônomo, aperfeiçoando­se e ampliando sua abrangência, indo buscar subsídios e amparos no Direito
Civil (contratos de imagem; de franchising), no Direito do Trabalho (as relações de trabalho
jogador/entidade de prática desportiva), Direitos Penal e Processual Penal (a punibilidade; a
dosimetria da pena); Direitos Tributário, Previdenciário, Fundiário ... 

A Lei Geral Sobre Desportos, em seu art. 1°, § 1°, dita que "A prática desportiva formal é regulada
por normas nacionais e internacionais e pelas regras de prática desportiva de cada modalidade, aceitas
pelas respectivas entidades nacionais de administração do desporto". Assim, quando a Federação
Internacional de Vôlei, por exemplo, alterou uma de suas regras, eliminando a "vantagem" e
estabelecendo que em cada set o escore iria até 25 pontos, tal alteração foi imediatamente posta em
prática no Brasil _ diferentemente do que acontecera no futebol, em 1984. Para legalizar a introdução
dos cartões amarelo e vermelho nessa modalidade, foi necessária a edição da Portaria 27/84 do então
Ministério de Educação e Cultura, a quem estava afeita as coisas do desporto. 

A JUSTIÇA DESPORTIVA 

Instituída pela própria Constituição Federal, a Justiça Desportiva está regulada pela LGSD. Sua
competência é limitada ao processo e julgamento das infrações disciplinares e às competições
desportivas, isto é, às transgressões cometidas pelos vários atores das diferentes modalidades como
jogadores, técnicos, massagistas, pessoal de apoio (gandulas, maqueiros etc.) dirigentes e, também,
pelos árbitros e auxiliares. Por determinação do mesmo diploma legal estão excepcionados dessas
disposições o Comitê Olímpico e o Comitê Paraolímpico Brasileiros, os quais se regem pela Carta
Olímpica Internacional e Carta Paraolimpica Internacional , respectivamente. 

A Justiça Desportiva compõe­se do Superior Tribunal de Justiça Desportiva, correlato a cada entidade
dirigente nacional; do Tribunal de Justiça Desportiva, correspondente à cada entidade dirigente
regional ou estadual. Tanto o STJD quanto o TJD podem constituir tantas Comissões Disciplinares
quantas sejam necessárias para o bom andamento das suas funções jurisdicionais­desportivas. Tanto
os STJDs quanto os TJDs compõem­se de nove membros, chamados de auditores, indicados
respectivamente, pela entidade dirigente correlata (2), pelas entidades de prática participantes das
competições oficiais da divisão principal (2); pela OAB, Nacional ou Estadual, conforme o caso (2);
pelos atletas (2); pelos árbitros (1). Já as CDs, que constituem a primeira instância da Justiça
Desportiva, são compostas por cinco auditores indicados pelo tribunal respectivo. Em ambos os casos,
o mandato é de quatro anos, permitida uma recondução. As decisões finais dos Tribunais de Justiça
Desportiva são impugnáveis na forma da lei, desde que respeitados os pressupostos constitucionais do
art. 217. Mas o recurso ao Poder Judiciário, diz o art. 52, § 2° da LGSD, "...não prejudicará os efeitos
desportivos validamente produzidos em conseqüência da decisão proferida pelos Tribunais de Justiça
Desportiva". No artigo 50 da referida Lei, estão relacionadas as penas a que estão sujeitos os
infratores, sejam eles pessoas físicas (atletas, atores desportivos em geral) ou jurídicas (entidades de
prática ou de direção desportiva): advertência; eliminação; exclusão do campeonato ou torneio;
indenização; interdição da praça de desportos; multa; perda do mando de campo; perda de pontos;
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perda de renda; suspensão por partida; suspensão por prazo. A organização, o funcionamento e as
atribuições da Justiça Desportiva são definidos em códigos específicos para o desporto profissional e
o não­profissional. Enquanto não forem aprovados os novos códigos, continuam vigentes o Código
Brasileiro Disciplinar do Futebol/CBDF, para o futebol, instituído pela Portaria n° 702, de 1981, do
MEC, com alterações pela Portaria 328/87, também do MEC, e o Código Brasileiro de Justiça e
Disciplina Desportivas/CBJDD, anexo à Portaria MEC n° 629/86, para todas as outras modalidades
desportivas. 

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