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Fabrício Souza
O texto original dos sonetos sobre discussão, bem como a tradução proposta e as
traduções de Ivo Barroso e de Jorge Wanderley encontram-se no final deste trabalho. Na
discussão a seguir supõe-se a leitura do original e de todas estas traduções.
Uma outra característica do soneto é o destaque dado aos dois últimos versos. Até
visualmente eles se destacam, devido à diferença de tabulação. Outros pontos de interesses:
é comum o uso dos dois pontos para destacar/isolar os dois versos finais ou mesmo
apenas o último em geral a rima nestes versos acontece em monossílabos ou com a última
sílaba tônica
Assim nos parece interessante procurar manter também esta característica na tradução
proposta.
Um outro ponto de interesse seria qual métrica utilizar. Parece-nos que pela
característica da métrica original e pela relativa coloquialidade do original inglês, a métrica em
dodecassílabos seria a mais adequada, permitindo-se mais facilmente a manutenção das
características do original. Já a métrica em decassílabos obriga a um certo “enxugamento” do
conteúdo dos versos originais: é difícil para cada verso traduzir todo o conteúdo do original, que
se aproveita da métrica menos restrita, do uso de contrações (mais comuns no inglês), de um
certo poder expressivo do inglês que parece permitir que mais coisas seja ditas com menos
fonemas, e é claro do talento de Shakespeare. Apesar destes fatores, preferimos na tradução
proposta adotar a forma do decassílabo, já que esta forma é a consagrada na língua
portuguesa para sonetos pela sua sonoridade, é a adotada na maioria das traduções e desta
maneira (o que é lúdico) o desafio da tradução fica maior e mais interessante. Um outro
aspecto de interesse é que deste modo as traduções cotejadas são todas em decassílabos, o
que nos parece mais adequado para os objetivos deste exercício.
Passemos agora para a análise das traduções segundo cada um dos aspectos
destacados acima.
Soneto I:
Analisando o soneto original, vemos que o primeiro verso não é tão claro em expressar
qual o desejo do poeta (que Southampton tenha filhos para preservar sua beleza). O 1 o. verso
tem uma certa ambigüidade que só no 4 o. verso se explicita: só o herdeiro permite que a beleza
do mais velho sobreviva. Deste modo preferimos na tradução proposta manter esta estrutura
do original (o primeiro verso ficando: “ao mais raro desejamos que cresça”, ao invés de
explicitar o significado deste verso como nas duas outras traduções: “Dos raros, desejamos
descendência”, “Dos seres ímpares ansiamos prole”.
Já a tradução de Ivo Barroso para estes dois versos é menos fiel, perde em sonoridade
e entendimento, precisa mudar a pontuação e continuar o primeiro verso no verso seguinte:
“Piedade, senão ides, tu e o fundo Do chão, comer o que é devido ao mundo.”.
Numa análise geral, verso a verso, a tradução de Jorge Wanderley parece ser a mais
fiel.
A questão sobre a manutenção da estrutura de rimas dos dois versos finais (rima na
última sílaba tônica) já foi discutida no item anterior.
Em todas as traduções, as rimas são bem feitas. Quase todas as rimas são em 3 ou
mais fonemas, o que preserva a sonoridade do original inglês. Assim temos com 3 ou mais
fonemas
O fonema “s” no final é ignorado para efeito de rimas nas traduções de Wanderley
(alias/havia, consomes,/nome, ornamento/suprimentos), o que é aceitável em Português,
especialmente nas sílabas átonas finais. De qualquer modo evitamos este recurso na tradução
proposta. Ivo Barroso rima fonemas próximos: prole/colhe. Parece também razoável já que
Shakespeare também faz isto no original (não nos aprofundaremos sobre esta questão neste
trabalho). Também procuramos evitar a utilização deste recurso na tradução proposta.
Um problema da tradução proposta é que a maior parte das rimas é feita com verbos,
merecendo talvez por isto um retrabalho.
Barroso introduz nos versos 4 e 5 as idéias de rosa e botão para representar noções
como “beleza”/“herdeiro”/”fugacidade da vida”, recuperando palavras (rosa e botão) que em
verdade estão presentes em outros versos. A “morte do maduro”(“riper decease”) no original é
apresentada como “a rosa madura que o tempo colhe”. É menos fiel ao original, mas introduz
interessantes efeitos.
Wanderley apresenta uma interessante imagem no verso 5: “mas tu, que só ao teu olhar
te alias”. Engenhosamente destaca o egoísmo de Southampton, aproximando-o de Narciso. Na
tradução proposta temos um efeito interessante no verso 3: “maduro/apodresça”.
Uma avaliação geral do soneto como um todo: valor estético e sua sonoridade
A tradução de Ivo tem algumas belas imagens. Mas parece pecar em alguns pontos,
principalmente nos dois últimos versos. O verso 7 também parece fraco “Tu, que do mundo é
hoje o galardão”.
A tradução proposta parece perder nas imagens poéticas evocadas, no uso de algumas
palavras prosaicas. O melhor verso parece ser: “Enterra em botão teu contentamento”. O mais
fraco: “Desperdiça em acumular dinheiro”.
SONNET 1