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A aposentadoria do engenheiro

por Sidnei Machado 1

1. Os ataques sistemáticos à seguridade social que se deram nos últimos anos no


bojo das reformas previdenciárias, a pretexto de evitar a quebra dos regimes das
aposentadorias, provocaram alterações sucessivas das regras solidificadas há
décadas e produziram enorme incerteza quanto ao sagrado direito à
aposentadoria. Situação no mínimo paradoxal, pois a previdência foi
historicamente construída para evitar a imprevidência do futuro. O direito à
aposentadoria especial dos engenheiros é um dos exemplos dos impactos desse
processo na política social brasileira. Passados mais de dez anos de reiteradas
reformas, o direito à aposentadoria dos engenheiros foi duramente restringido e, as
regras remanescentes, ainda são fonte de muitos questionamentos quanto a sua
correta aplicação.

2. Os engenheiros conquistaram o direito à aposentadoria especial aos 25 (vinte e


cinco) anos de trabalho em 1964, através do Decreto n. 53.831/64, o qual
compreendia os trabalhadores em “engenharia”, para os serviços e atividades
profissionais de “engenheiros de construção civil, de minas, de metalurgia e
eletricistas”.2 Em de 10.09.68, o Decreto n. 63.230, excluiu o direito à
aposentadoria dos “engenheiros químicos, metalúrgicos e de minas”, porém estes
foram novamente incluídos através da Lei n. 5.527, de 08.11.68. A lei não fez
menção apenas aos engenheiros “mecânicos”, porém os tribunais e o INSS já
vinham admitindo o mesmo direito por aplicação analógica da lei. Enquanto a
aposentadoria especial era garantida para os trabalhadores em geral somente
quando expostos a risco à sua saúde ou a integridade física (local insalubre,
perigoso e penoso), aos profissionais engenheiros havia a presunção legal de que
a atividade era dessa natureza. Assim, para o gozo da aposentadoria era
necessário que o engenheiro comprovasse junto ao INSS, através de um
formulário próprio (denominado SB-40, DSS 8030 ou DIRBEN 8030) possuir
contrato de trabalho na função “engenheiro”, em uma das especialidades
contempladas pela lei. Não eram amparados pelo os engenheiros autônomos e os
empresários.

3. Em 1995, mesmo antes de iniciarem as discussões acerca da reforma da


previdência, o governo, através da Lei 9.032, de 28 de abril, alterou a Lei n.
8.213/91, condicionando o direito à aposentadoria especial a partir de então à
comprovação de exposição permanente, não intermitente nem ocasional, a
agentes nocivos à saúde e à integridade física. Com essa lei o INSS passou a
1
- Advogado, especialista em Direito Previdenciário, assessor jurídico do Senge-Pr.
E-mail: sidnei@machadoadvogados.com.br - site: www.machadoadvogados.com.br
entender que todos aqueles que tinham direito à aposentadoria em razão da
categoria profissional, tal como os engenheiros, perderam o direito à presunção
legal. Com isso, foi revogada a lei que assegurava a aposentadoria especial par ao
engenheiro. A partir de então, subsiste ao engenheiro a possibilidade de cômputo
da aposentadoria especial mediante comprovação de exposição efetiva aos
agentes nocivos, mediante laudo técnico de condições ambientais contemporâneo,
assinado por médico do trabalho ou engenheiro de segurança da empresa
empregadora. No entanto, a relação das atividades constante do Decreto 3.048/99
é hoje bastante reduzida; já que os agentes nocivos (físicos, biológicos e químicos)
arrolados não contemplam a totalidade dos produtos e agentes perigosos
existentes nos ambientes de trabalho, tampouco coincidem com a atividades
reconhecidamente insalubres. Na lista estão previstos, por exemplo, pouco mais
de vinte agentes químicos, enquanto se sabe, segundo a Organização Mundial da
Saúde, que existem no mercado aproximadamente oito mil produtos químicos
nocivos à saúde dos trabalhadores. Além disso, a interpretação dos laudos
técnicos pelos serviços médicos do INSS é bastante restritiva, o que dificulta ainda
mais o enquadramento da aposentadoria especial pelo critério da exposição ao
agente nocivo.

4. Mas permanece intacto o exercício do direito adquirido à contagem da


aposentadoria especial do engenheiro por dois critérios: a) aos 25 anos de serviço
na função de engenheiro, se completos até 28.04.1995, ou; b) a contagem de
tempo especial até 28.041995, com a conversão em tempo comum para fins de
soma com períodos posteriormente contribuídos, com vistas ao implemento da
aposentadoria integral por tempo de contribuição aos 30 ou 35 anos
(mulher/homem). É bom lembrar que não há mais a aposentadoria proporcional
aos 25 ou 30 (mulher/homem), extinta em 15.12.1998 (Emenda Constitucional n.
20). Porém resta a possibilidade de exercício da aposentadoria proporcional caso
o trabalhador pague um “pedágio” de tempo, equivalente a 40% de adicional de
tempo faltante em 15.12.1998 para atingir os 25 ou 30 anos (mulher/homem) e,
cumulativamente, possua idade mínima de 48 ou 53 anos (mulher/homem).

5. O direito à aposentadoria especial que descrevemos constava do chamado


Regime Geral de Previdência Social - RGPS, ou seja, do regime dos trabalhadores
do setor privado. Desse modo, não estão amparados pela aposentadoria especial
os engenheiros que ostentam a condição de servidores públicos, pois estes estão
vinculados aos regimes estatutários, próprios do Município, Estado ou União para
o qual prestam serviços e, nestes regimes não existia a previsão do benefício da
aposentadoria especial para os engenheiros. Portanto, como regra o servidor
público engenheiro não conta com o direito à contagem da aposentadoria especial,
mesmo até 28.04.1995. Há, no entanto, uma exceção para os servidores públicos
que no passado trabalharam regidos pelo regime celetista (CLT) e, assim,
contribuíram para o INSS. O caso exemplar é dos engenheiros no Estado do
Paraná, os quais até dezembro de 2002 eram vinculados ao INSS e,
posteriormente tiveram seu cargo convertido para o regime estatutário. Para estes
há possibilidade de postular perante o INSS a expedição de Certidão de Tempo de
Contribuição – CTC para fins de contagem no regime próprio do Estado (contagem
recíproca) com a conversão do tempo especial. O INSS, em razão de instrução
normativa interna nega esse direito, porém há jurisprudência no STJ e no STF
favoráveis à conversão do tempo especial nestes casos. Cabe, então, ao
engenheiro que se enquadrar nessa situação requerer administrativamente a
emissão da CTC e, em seguida, após a negativa, ajuizar processo judicial contra o
INSS por meio de advogado. Não havendo mais regras diferenciadas para as
aposentadorias dos engenheiros, sejam eles pertencentes setor público ou ao
setor privado, resta apenas assegurar a contagem do tempo especial pela
conversão até 28.04.1995. O documento exigido pela lei para o enquadramento
até essa data continua sendo os formulários SB-40, DSS 8030 ou DIRBEN 8030.

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