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QUETIAPINA

--- Farmacodinâmica:
. Forte afinidade pelos receptores serotoninérgicos subtipo 5Ht2 com uma moderada pelos
dopaminérgicos D2 (com uma das mais altas razões de antagonismo 5Ht2A /D2 entre os atípicos de
segunda geração, aproximando-se da clozapina) e fraca afinidade por 5Ht1A e por D1.
. Mostra ação em múltiplos receptores entre os quais, além dos já mencionados, figuram os
serotoninérgicos subtipo 5Ht6 , histaminérgicos H1, H2 , alfa1 e alfa2 –adrenérgicos.
. O bloqueio em H1 está vinculado a seus efeitos sedativos e em alfa2 à hipotensão. Nas doses
terapêuticas mostra agonismo nos receptores 5Ht1A ao qual se atribui potencial terapêutico sobre
os sintomas afetivos (secundários na Esquizofrenia e agravados pelos antipsicóticos típicos)
ampliando suas indicações com possível aproveitamento como estabilizador do humor.
. Uma dose única ocupa 42% dos receptores D2 (os antipsicóticos típicos de alta potência chegam a
promover ocupações de 70 a 80% ou mais) e 72% dos receptores 5Ht2. Este nível de ocupação tende
a manter-se por 8 a 12 h a despeito da queda acentuada das concentrações plasmáticas após 5
horas.

--- Farmacocinética:
. É bem absorvida por via oral, sofrendo pequeno efeito facilitador pela presença de alimentos
(aumentariam as concentrações em até 25%) e alcançando picos plasmáticos em 1,5 a 2h.
. Tem uma meia-vida terminal média de 6 a 7h o que torna recomendável seu emprego em 2 a 3
tomadas ao dia. Para maior segurança, pelos efeitos sedativos e hipotensão, pode ser útil reservar,
inicialmente, doses maiores para o período noturno e afastadas da última refeição.

--- Modo de usar:


. É imperativo iniciar-se o tratamento com pequenas doses (25 a 50mg no 1º dia), progressivamente
crescentes (50 a 100mg por dia nos dias subseqüentes) em 2 tomadas diárias (manhã e noite), até
alcançar a faixa considerada terapêutica (300 a 600mg/dia), no mínimo a partir do 4º dia, com a
dose máxima devendo situar-se em 750-800mg/dia embora haja relato na literatura de uso doses
maiores em monoterapia com boa tolerabilidade.
. Diante de insuficiência hepática e no caso de pacientes idosos e/ou fisicamente debilitados, é
conveniente iniciar com 25mg/dia, seguindo uma maior gradualidade nos incrementos, estabilizando
em doses máximas 40% menores.

--- Eficácia e Indicações:


. A quetiapina já comprovou equivalência terapêutica com o haloperidol na atenuação de sintomas
positivos da Esquizofrenia Aguda com risco de extrapiramidalismo muito inferior, similar ao
observado com placebo.
. Foi significativamente superior ao placebo na redução de sintomas negativos, mas esta
superioridade ainda não foi suficientemente comprovada sobre o haloperidol.
. Quanto aos sintomas cognitivos tem demonstrado eficácia diferencial com relação aos
antipsicóticos convencionais. Recentemente, em ensaio aberto com 2 anos de duração no Canadá
foram constatadas melhoras significativas no desempenho cognitivo nos jovens esquizofrênicos
ainda em primeiro surto.
. A quetiapina já pode figurar, certamente, entre os atípicos de segunda geração como primeira
opção à clozapina nos pacientes parkinsonianos com ou sem Demência associada não só por sua
segurança hematológica, autonômica (ausência de efeitos anticolinérgicos centrais e periféricos) e
metabólica superiores, mas sobretudo pela tolerabilidade extrapiramidal equivalente à clozapina,
que constituem garantias indispensáveis nesta faixa etária.
. Seu papel nos Transtornos Afetivos, embora bastante promissor. Um ensaio randomizado, duplo-
cego, controlado por placebo, em que a quetiapina (até 450mg/d) foi acrescida ao valproato em 30
adolescentes com Mania, revelou ganhos significativos em eficácia (87% versus 53% de resposta
clínica) com boa tolerabilidade do grupo com esta associação em comparação com o grupo
valproato + placebo.
. Um recente estudo multicêntrico norteamericano aberto, comparativo com a risperidona, em
doses flexíveis e com 4 meses de duração, encontrou resultados superiores em eficácia e
tolerabilidade por parte da quetiapina em pacientes psicóticos com sintomas depressivos.
. Relatos de seu emprego com sucesso na heteroagressividade e impulsividade de pacientes
esquizofrênicos e esquizoafetivos, e no Transtorno de Personalidade Borderline, sugerem a
conveniência de estudos controlados nestas indicações.
. Bons resultados com boa tolerabilidade têm sido relatados em ensaios abertos no tratamento de
sintomas psicóticos e alterações do comportamento na Doença de Alzheimer, degeneração lobar
fronto-temporal.

--- Efeitos Adversos:


. Os efeitos motores extrapiramidais foram tão freqüentes no grupo com quetiapina quanto aquele
com placebo e, portanto, muito inferiores aos observados nos grupos com haloperidol e
clorpromazina, igualando-se neste aspecto, à clozapina. Na clínica, tem talvez a menor propensão
entre os novos antipsicóticos em causar acatisia, além de outros efeitos extrapiramidais de curto e
longo prazo.
. Diferentemente da clozapina, não carrega risco importante de granulocitopenia, mas podem
ocorrer, como observado com outros antipsicóticos, reduções leves e reversíveis dos leucócitos nas
primeiras semanas de tratamento. Nos ensaios clínicos iniciais, leucopenia assintomática transitória
reversível ocorreu em 1,6% dos casos e ocasionalmente verificou-se eosinofilia, mas não houve
registro de neutropenia ou agranulocitose.
. Por não ter ação sobre receptores muscarínicos (M1) seria desprovida de efeitos anticolinérgicos
centrais ou periféricos, o que lhe concede importantes vantagens para uso em pacientes idosos.
. Não obstante esta virtual ausência de afinidade muscarínica, constipação, taquicardia e boca seca
foram registrados com relativa freqüência nos ensaios clínicos iniciais, sugerindo a participação dos
bloqueios histaminérgicos e alfadrenérgicos.
. No geral, observa-se o rápido desenvolvimento de tolerância aos efeitos sedativos e hipotensores,
determinados por bloqueio histaminérgico H1 e alfadrenérgico.
. Outros efeitos adversos podem lembrar os da clozapina, como a sialorréia, determinada por
bloqueio alfa2-adrenérgico central, que, em casos mais intensos, pode exigir o emprego de
clonidina, substância com ações mistas de agonismo/antagonismo alfadrenérgico periférico
(agonismo central alfa2-adrenérgico, nos neurônios noradrenérgicos do locus ceruleus) para sua
correção. A ação alfadrenérgica também foi responsabilizada pela ocorrência de priapismo em caso
de superdosagem.
. Nos ensaios clínicos iniciais, os efeitos adversos registrados mais freqüentemente foram:
sonolência (17,5%); tonteiras (10%); constipação (9%); boca seca (7%); hipotensão postural (7%);
taquicardia sinusal (7%) (com aumento médio, habitualmente, de 3 a 5 bat/min); aumento
transitório das enzimas hepáticas nas duas primeiras semanas (6%). Foi registrada também elevação
dos níveis de triglicérides séricos e colesterol total (aumento de 17 e 11% respectivamente, nas taxas
basais) o que continua sendo confirmado com registros recentes na literatura atual.
. Um perfil de melhor tolerabilidade metabólica (hiperglicemia e risco de Diabetes, ganho ponderal e
dislipidemias) por parte da quetiapina vem se confirmando cada vez mais com relação à olanzapina e
à clozapina. Mostra tendência bem menor ao ganho de peso que clozapina e olanzapina e talvez
também risperidona.
. O ganho de peso nas primeiras semanas dos ensaios iniciais, por exemplo, foi constatado em 23%
dos pacientes, mas variando apenas entre 1.7 a 2.3kg, contra 0.1kg no grupo placebo e sem
aumentos posteriores nos ensaios abertos com maior duração. Este é um padrão bem inferior ao
registrado com a clozapina e olanzapina, e até mesmo com a risperidona, tendendo a igualar-se à
ziprasidona.
. Não se registraram elevações nas concentrações de prolactina nos ensaios clínicos com o uso das
faixas de doses terapêuticas de como ocorre com a clozapina.
. Foram observadas pequenas quedas, dose-dependentes, nos hormônios da tireóide,
particularmente T4 e T4 livre nas primeiras 2 a 4 semanas, estabilizando-se após, e que se
mostraram reversíveis com a interrupção do tratamento. Alterações significativas na concentração
de TSH ao longo do tempo só ocorrereram em 0,4% dos casos, mas pacientes com risco de
desenvolverem hipotireoidismo devem ser clinicamente monitorados.
. As anormalidades eletroencefalográficas registrada com a quetiapina foram inferiores às
observadas com a clozapina e olanzapina além de outros antipsicóticos típicos. Convulsões foram
registradas em apenas 0,8% dos pacientes (0,5% com placebo) nos ensaios clínicos iniciais.
. Apesar da tolerabilidade extrapiramidal próxima à da clozapina (com uma freqüência de acatisia,
acinesia, tremor, rigidez em roda-dentada equivalente à do placebo nos ensaios clínicos), não deixou
de ter registro na literatura, aliás como todos os demais antipsicóticos típicos e atípicos inclusive a
clozapina, de ocorrência de Síndrome Neuroléptica Maligna (0,1% dos pacientes dos ensaios iniciais).

--- Interações Medicamentosas:


. Substâncias com ação depressora do sistema nervoso central como narco-analgésicos, anestésicos,
hipnóticos, ansiolíticos, antidepressivos sedativos e antipsicóticos de baixa potência, devem ser
evitadas em associação com a quetiapina pela potencialização das ações sedativas e hipotensoras. É
preciso lembrar adicionalmente que a quetiapina pode reduzir em até 20% o clearence do
lorazepam.
. A associação com lítio em estudo aberto de pouco mais de 3 semanas com dez pacientes
portadores de Transtorno Bipolar (n = 8), Esquizofrenia (n = 1) ou Transtorno Esquizoafetivo (n = 1),
revelouse segura e bem tolerada, acompanhando-se de concentrações inalteradas de ambas as
substâncias, muito embora sonolência (90%) e astenia (70%) tenham sido freqüentemente
relatadas.
. O tabagismo, condição prevalente em esquizofrênicos, costuma induzir a atividade da CYP 1A2
(pelos hidrocarbonetos poliaromáticos e não pela nicotina) reduzindo as concentrações de
olanzapina (09) em até 40% nos pacientes masculinos jovens, mas não as de risperidona ou
quetiapina, metabolizadas preferêncial e respectivamente por CYP 2D6 e CYP 3A3/4. Os dois últimos
atípicos devem, portanto, gozar de preferência nestes pacientes tanto por razões de segurança
quanto de custo, relevantes quando se considera seu emprego em grande escala.

--- Superdosagens:
. Nas superdosagens, parece possuir um perfil diferencial de segurança, sem o registro de grande
número de óbitos que possam ser, inequivocamente a ela atribuídos, e relatos de recuperação sem
seqüelas em casos de ingestão de doses tão grandes quanto de 3 gramas (142) ou até mesmo de
10g.
. Um novo relato de óbito por superdosagem foi publicado na edição de dezembro de 2002 do
American Journal of Psychiatry (47), mas a literatura também registrou recentemente (julho de
2002) o caso de uma préadolescente de 11 anos com ingestão de 1300mg (22.2mg/kg) que após
letargia apresentou agitação, inadvertidamente tratada com a administração de lorazepam, mas que
evoluiu para completa remissão ao final de 16 horas de sonolência, sem maiores intercorrências
cardiológicas ou laboratoriais.
. Não possui antídoto específico e a conduta deve envolver os procedimentos rotineiros protocolares
de terapia intensiva para superdosagens por medicamentos psicoativos, como a garantia de
desobstrução das vias aéres superiores (incluindo evitar o uso de manobras ou medicamentos para
provocar vômitos pelo risco de aspiração), oxigenação e ventilação mecânica se necessário,
promovendo aspiração do conteúdo gástrico por meios de sondagem, com reidratação adequada,
além de monitorização constante para correção de anormalidades cardiovasculares. Além de
hipotensão severa, já foi observada, em um dos 7 casos não-fatais registrados, a instalação de
bloqueio de primeiro grau, havendo relatos de prolongamento do intervalo QTc.

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