Gil Vicente termina com uma cena apoteótica que constitui a moralidade do
auto. Opõe os Cavaleiros que morreram a combater pela Fé aos que trabalhavam “pola
vida transitória”(v.830).
O facto de terem morrido a combater os Mouros é o suficiente para alcançarem o
Paraíso: “morremos nas Partes d’Além / e não queirais saber mais” (vv.849-850),
responde o 2º Cavaleiro ao Diabo quando este ousa interrogá-los. E o Anjo, ao declinar
da cena, diz claramente: ”… quem morre em tal peleja / merece paz eternal” (vv. 861 –
862).
Os Cavaleiros surgem no cais a cantar. A canção dirige-se aos vivos e, mais
especificamente, aos pecadores: “Senhores que trabalhais / pola vida transitória”, “
Vigiai-vos, pecadores”.
A cantiga aconselha a acreditar no “temeroso cais”, isto é, no momento do
julgamento final e da sentença, céu ou inferno. Relativamente aos pecadores diz
“Vigiai-vos” porque poderão sofrer “Dolores”. Para evitar este sofrimento convida “à
barca da vida”, ou seja, entrar na barca do Anjo, o que significa fazer o bem em vida.
Assim o grande conselho é a prática do bem para evitar sofrimentos futuros.
Contrariamente à crítica presente nas outras cenas, nesta parte Gil Vicente
exalta a luta contra os Mouros no Norte de África, em nome da difusão da fé
Cristã.
“Foi este o grande meio de que a Igreja lançou mão para coadjuvar eficazmente
os nossos reis, primeiro na luta contra os mouros do território metropolitano e depois
nos Descobrimentos e conquistas. Com efeito, a concessão de abundantes graças e
privilégios espirituais aos fiéis, que tomavam pessoalmente parte nessas empresas ou
para elas contribuíam com subsídios, e a cedência de uma parte dos rendimentos
eclesiásticos do Reino para as mesmas equipararem os nossos arrojados
empreendimentos às cruzadas da Terra Santa. Contribuindo de modo eficaz para serem
coroados de êxito. Deve, todavia, notar-se que os portugueses, do ponto de vista
religioso, foram sempre tolerantes com os vencidos, ao contrário do que fizeram muitos
cruzados estrangeiros, por exemplo, em Lisboa (1147 e 1190) e em Silves (1189).”
Exercícios
a) Os quatro Cavaleiros não têm nome próprio, porque são uma personagem colectiva.
b) Os Cavaleiros vão directamente à Barca do Anjo, pois já não tinham lugar na Barca
do Inferno.
c) Os Cavaleiros morreram em África a lutar pela santa fé católica.
d) A cantiga entoada pelos Cavaleiros é uma síntese da ideologia católica.
3. Com base na cantiga dos Cavaleiros, faz corresponder cada um dos elementos
que caracterizam a salvação aos elementos opostos que traduzem uma ideia de
condenação.
Salvação Condenação
Diabo Cavaleiros
5. Explica a evolução fonética do seguinte vocábulo: dolor > door (1) > dor (2).