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Direito Fiscal I
Direito Fiscal I:
INTRODUÇÃO:
Só quando assume uma posição característica, inconfundível com as posições dos particulares,
no exercício da sua actividade financeira, é que o estado se subordina a normas jurídicas próprias, cujo
complexo tem sido designado por Direito Financeiro.
Trata-se da definição jurídica dos poderes das entidades públicas na obtenção e no emprego dos
meios económicos destinados à realização dos seus fins.
Este conceito baseia-se numa ideia central de limitação de poderes das entidades públicas, como
tais.
Como disciplina jurídica da utilização de meios económicos pelas entidades públicas, o Direito
Financeiro abrange um amplíssimo sector de receitas públicas (o das receitas públicas não apenas pelo
destino, mas também pela natureza, pela origem), todo o sector das despesas públicas e a coordenação das
despesas e das receitas públicas.
O Direito Financeiro compreende três ramos que, embora, cada um deles, sem autonomia
científica, são nitidamente separáveis – o direito das receitas, o direito das despesas e o direito da
administração financeira. Por sua vez, estes ramos de Direito Financeiro admitem divisões. E entre elas
ganham particular relevo, no Direito das Receitas, o Direito dos Impostos, o Direito Tributário ou o
Direito Fiscal.
O Direito dos Impostos, Tributário ou Fiscal formou-se através de um longo processo evolutivo,
Direito Fiscal I
a) Direito Constitucional Fiscal (CRP) regula a formação da lei fiscal, o exercício da soberania
financeira (arts. 103 e 104 CRP). Esta é a garantia primeira da legalidade dos impostos e da
liberdade individual dos contribuintes contra abusos do legislador ordinário. Na última
revisão constitucional foi consagrada expressamente a irretroactividade da lei fiscal. Os
impostos são criados por lei (da A.R.). A liquidação e cobrança dos impostos pode ser feita
por lei (da A.R. ou do Governo).
d) núcleo central do Direito Fiscal é constituído pelas normas que disciplinam o nascimento,
desenvolvimento e extinção do vínculo jurídico obrigacional que surge entre o Estado e os
cidadãos, vínculo este que surge quando se verificam os pressupostos integradores contidos
na lei fiscal. O sujeito activo é o Estado e o sujeito passivo os particulares, o contribuinte.
g) Processo Fiscal corresponde às normas adjectivas que prevêem a forma pela qual os
contribuintes se podem opor aos actos administrativos definitivos e executórios da
Administração Fiscal e que regulam ainda o modo de aplicação das sanções fiscais e a
Direito Fiscal I
Em resumo, importa precisar a posição do Direito Fiscal, tanto no plano científico, como no
plano didáctico. Seria possível defini-lo como complexo de normas disciplinadoras das relações
tributarias. Mas tal definição não viria solucionar os problemas que cumpre sejam apreciados. Limitar-se-
ia a desconhecê-los provisoriamente, projectando-os para a análise do conceito de relação tributária.
Aliás, já conhecemos um conceito de relação juridico-tributária, restrito, para o qual esta será o
vínculo obrigacional que liga o contribuinte ao Estado, ou a outra entidade pública, e tem por objecto
mediato a prestação de imposto. Mas parece duvidoso que o Direito Fiscal deva limitar-se à disciplina
dessas relações. Entende-se geralmente que ele abrange também as normas disciplinadoras de operações
destinadas a tornar possível, ou facilitar, a cobrança dos impostos, sem contudo, dizerem respeito à
estrutura do vínculo jurídico de imposto. E bem assim as normas que estabelecem sanções pelo não
cumprimento de deveres tributários, que fixam os meios de defesa do contribuinte, etc.
Assim, Direito Fiscal será o sistema de normas jurídicas que disciplinam as relações de imposto
e definem os meios e processos pelos quais se realizam os direitos emergentes daquelas relações.
Esta definição visa remover uma limitação do Direito Fiscal à disciplina da relação tributária
stricto sensu - vínculo obrigacional que liga o contribuinte a uma entidade pública credora do imposto. É
certo que essa disciplina constitui o aspecto nuclear, central, e mais característico, do Direito Fiscal; mas
não o esgota.
Determinados autores, atendendo à natureza das normas de Direito Fiscal, dividem-no em dois
ramos, o Direito Fiscal material e o Direito Fiscal formal.
Assim, Direito Fiscal material é o conjunto de normas que regulam a existência orgânica do
imposto, bem como as obrigações que derivam da respectiva relação jurídica de imposto, tendo em vista
os seus titulares, objecto e configuração pormenorizada (p.ex., direito constitucional fiscal, normas que
regulam o núcleo central do direito fiscal, direito penal fiscal,...).
Por sua vez, Direito Fiscal formal é o conjunto de normas instrumentais, disciplinadoras do
processo de determinação e percepção do imposto e também as normas que regulam a tutela jurisdicional
(p.ex., normas de processo fiscal ou tributário e normas de carácter administrativo respeitante à liquidação
e cobrança de impostos.
Quer se adopte o critério dos interesses, quer o da situação relativa dos sujeitos, quer o critério da
qualidade dos sujeitos, os autores são unânimes em considerar que o Direito Fiscal é um ramo de Direito
Público. O sujeito activo (o Estado) aparece na sua veste de ente público, revestido das garantias e
poderes - ius imperium – de que não beneficia o sujeito passivo.
Põe-se a questão de saber se o Direito Fiscal terá autonomia legislativa, didáctica e científica. A
resposta é, obviamente, sim. Desde logo, tem autonomia didáctica, pois se não tivesse não existiria nos
cursos de Direito a cadeira denominada “Direito Fiscal”.
A resolução desta questão radica na estrutura das respectivas relações jurídicas desta área do
Direito e assim a resposta à questão tem de ser positiva.
Para o Dr. Brás Teixeira, as relações do mundo jurídico em geral integram-se num de três tipos:
ou são obrigacionais, ou são reais (de tipo real – direitos reais), ou ainda pessoais (de tipo pessoal). Estas
relações, embora mantenham a sua estrutura (objecto, sujeito, ...), são objecto de regimes jurídicos
diversos, conforme o ramo de Direito a que pertencem.
Ao lado do Direito das Obrigações, dos Direitos das Pessoas e dos Direitos Reais (Direito
Comum Conjunto, para o autor), existem outros ramos do Direito, como o Direito da Família, o Direito
das Sucessões, o Direito Comercial, Direito Fiscal... Aqui, as relações jurídicas têm a mesma natureza,
mas um regime jurídico que se afasta do regime do Direito Comum.
Direito Fiscal I
Para o Dr. Brás Teixeira é legítimo substituir as classificações dos ramos de Direito por uma
classificação genérica que separe o Direito Comum (Direito das Obrigações, Direitos Reais e Direitos
Pessoais) dos Direitos Institucionais (Direito da Família, Direito Fiscal,...). Em todo o caso, cada corpo de
normas ordenado para um fim comum “vive ao lado” dos direitos institucionais.
Ainda para o Dr. Brás Teixeira, o fundamento de autonomia de qualquer ramo de Direito só se
pode encontrar ao nível teleológico, ou seja, ao nível dos fins das normas.
Correspondendo o Direito Fiscal a um conjunto de normas com um fim comum (relações
jurídicas que dão lugar à percepção dos impostos) tem carácter institucional. E é deste carácter
institucional (fim diferenciado que unifica num corpo dinâmico essas normas) que derivam os princípios
e institutos que individualizam o Direito Fiscal dos outros ramos do Direito, isto é, que dão autonomia ao
Direito Fiscal, tornando-o um verdadeiro ramo de Direito.
O fim específico do Direito Fiscal é regular a percepção de receitas para o Estado. Soares
Martinez fala antes na autonomia do Direito Financeiro. Quando falamos de autonomia ela tem sempre
um carácter relativo.
Não se pode falar num sistema de normas fechado. As várias zonas do mundo jurídico
relacionam-se entre si, ou seja, qualquer conjunto de normas está ligado ao conjunto de todas as outras
normas. Também o Direito Fiscal se relaciona com outros ramos do Direito.
b) O Direito Fiscal liga-se também ao Direito Administrativo, pois apesar de o Direito Fiscal
ser independente deste, é nele que busca a forma para regular a actividade de percepção do imposto, além
dos órgãos da Administração Fiscal estarem integrados na AP, que é disciplinada pelo Direito
Administrativo.
c) O Direito Fiscal tem também afinidades com o Direito Penal, pois a teoria da infracção fiscal
é moldada pelos princípios da teoria da infracção penal (penas de prisão, multas, coimas).
d) O Direito Fiscal relaciona-se ainda com o Direito Processual, quer penal, quer civil, na
medida em que foi com base nestes ramos de direito que em Direito Fiscal se procedeu à estrutura do
processo tributário. Além disso, o CPCivil é subsidiário do CPTributário (Código de Processo Tributário)
(p.ex., processo de impugnação judicial, processo de transgressão, processo de execução fiscal,...).
e) O Direito Fiscal tem ainda afinidades com o Direito Privado (comum), porque o Direito
Fiscal, como Direito institucional que prossegue fins específicos, conceitos e institutos próprios, não
dispensa a contribuição do Direito Privado Comum (aceita conceitos como o de “obrigação” vindo do
Direito privado).
Por outro lado, existem outros institutos aos quais atribui um significado diferente de acordo com
os seus fins. P.ex., transmissão de um imóvel (por escritura pública). Se for um contrato-promessa com
traditio, o CSISA (Código da SISA)considera que a sisa deve ser paga a partir do momento em que há
traditio, pois considera que aí já há transmissão.
f) Por fim, o Direito Fiscal associado ao Direito Internacional tem como objectivo evitar a
dupla tributação dos produtos, para que haja maior e melhor circulação das mercadorias internacionais
(este é também o objectivo do GATT).
O que se pretende é um desenvolvimento internacional harmonioso entre os vários países e em
que o comércio internacional saia beneficiado. Por vezes, os países invocam restrições teóricas, que são
egoístas, para que o comércio sofra certos entraves (p.ex., proibir a importação de carros com faróis
redondos, só admitindo carros com faróis quadrados).
Por isso é que se celebram certos acordos internacionais, para que a saúde de cada Estado não
saia deteriorada e para que o comércio internacional não sofra também qualquer tipo de doença; o
objectivo é precisamente o contrário, ou seja, um comércio internacional saudável.
Direito Fiscal I
Ex.: A OCDE pretende evitar conflitos positivos de regulamentação (dupla tributação), pois tal
constitui obstáculo ao comércio internacional, e também evitar conflitos negativos, ou seja, um produto
pode nem sequer ser tributado, pois um país (Portugal, p.ex.) diz que a tributação do produto deve ser
feita no país de destino e outro país (o de destino) diz que o imposto deve ser pago na sede da entidade
comercial e, assim, o produto não é tributado nem no país de origem, nem no país de destino.
Ainda no âmbito da relação do Direito fiscal com o Direito internacional cumpre referir o
Direito Comunitário. De facto, não obstante as particularidades , as singularidades do Direito
Comunitário originado no Tratado de Roma de 1957, e cujas normas, desde 1982, são aplicáveis a
Portugal, em consequência do seu ingresso nas Comunidades Europeias, esse mesmo direito não deixa de
situar-se no plano do Direito Internacional, sem prejuízo da hipótese de, por via de uma federalização,
acabar por situar-se ao nível do Direito Interno.
Direito Fiscal I
Capítulo II – O imposto:
6. Conceito de Imposto:
Juridicamente, o imposto é uma prestação definitiva e unilateral, estabelecida pela lei, a favor de
uma pessoa colectiva de Direito Público para a realização de fins públicos; prestação esta que não
constitui sanção de um acto ilícito.
O conceito de imposto tem como elementos essenciais o objectivo, o subjectivo e o teleológico.
a) Quanto ao elemento objectivo, o imposto é uma prestação. A relação jurídica de imposto tem
um carácter obrigacional ou creditício, com objecto de natureza patrimonial, sendo que geralmente a
respectiva prestação tem carácter pecuniário. Contudo, nem sempre o imposto tem natureza pecuniária.
Ainda hoje existe um imposto que não tem natureza pecuniária, que é o imposto de selo.
O imposto tem carácter definitivo, ou seja, não dá ao sujeito passivo qualquer direito a um
reembolso, retribuição ou indemnização. Todas as importâncias que o sujeito passivo transfere para o
sujeito activo não são reembolsadas, a não ser que haja uma tributação indevida. Por isso é que o imposto
é diferente de empréstimo e de requisição administrativa, dada a sua natureza definitiva.
A prestação do imposto é também unilateral. A esta prestação não corresponde qualquer
contraprestação por parte do credor da receita (Estado), em termos directos. Assim se distingue o imposto
do empréstimo forçado e da taxa.
Na taxa existe a prestação de um serviço pelo Estado. O imposto é uma prestação imposta por lei
e só temos imposto quando os pressupostos que integram a previsão legal definida se verificam na prática.
Mesmo no caso de impostos locais, a própria fonte desses impostos está na lei, é legal (p.ex., a imposição
da derrama consta da lei).
A soberania fiscal exerce-se quando o Estado cria impostos. Quando o Estado aparece a exigir
um imposto já criado, ele aparece não como Estado soberano, mas como entidade administrativa.
O imposto não é uma sanção de um acto ilícito, ao contrário da multa ou da coima, apesar de
estas também serem definitivas.
b) Quanto ao elemento subjectivo, o imposto é uma prestação a favor de uma pessoa colectiva
de direito público, sendo sempre desta natureza o sujeito activo da relação de imposto.
Como entidades públicas activas da relação fiscal podemos ter o Estado e as autarquias locais (e
também as regiões autónomas, na opinião de Sá Gomes, enquanto Soares Martinez acha que não).
Segundo o prof. M. Vasconcelos, a posição de Sá Gomes foi reforçada pela revisão constitucional de
1997.
Sujeito passivo da relação pode ser qualquer pessoa singular ou colectiva. Pode até ser uma
pessoa colectiva pública, como o Estado. Por vezes, o Estado paga impostos a si mesmo (p.ex., quando o
Estado arrenda um prédio como se fosse um particular).
c) Por fim, o elemento teleológico tem a ver com o fim do imposto.
Até há alguns anos atrás entendia-se que os impostos tinham como finalidade dotar os entes
públicos com meios para a realização de tarefas – tarefa meramente fiscal. Com o alargamento da
intervenção do estado – Estado de Direito Social – o imposto aparece como mecanismo de redistribuição
da riqueza, de protecção da indústria, como elemento de intervenção nos rendimentos gerados pela
economia, etc.
O imposto tem, pois, finalidades fiscais (receitas do estado) e extra-fiscais (intervenção na
economia). A própria CRP, no art. 103, refere-se à afectação do imposto.
Direito Fiscal I
a) O imposto e o preço:
b) O imposto e a taxa:
No imposto, desde logo, não há contraprestação; na taxa já existe essa contraprestação, dado que
a taxa visa adquirir a prestação de um serviço.
[Questão polémica aqui é a da taxa de activação estabelecida pela “Portugal Telecom”, taxa esta
que suscita a questão de saber se é ou não constitucional, precisamente por se pôr em dúvida o carácter de
contraprestação desta nova taxa.]
As taxas são prestações estabelecidas por lei, a favor de uma pessoa colectiva de Direito Público,
como retribuição de um serviço individualmente prestado, como retribuição pela utilização de
determinados bens de domínio público, ou ainda como remoção de determinado limite jurídico à
actividade dos particulares.
Do ponto de vista jurídico, a distinção passa pela existência ou não de uma contraprestação por
parte do ente activo da relação, isto é, passa pelo carácter unilateral do imposto e o carácter bilateral da
taxa.
O imposto resulta de se querer tributar um facto – a capacidade tributária – e a taxa resulta do
facto de se quer compensar uma actividade individualizada prestada por alguém (exs. de taxa são o
pagamento dos serviços de registo civil e predial).
Os tributos especiais são prestações exigidas pelo Estado em virtude de determinada vantagem
que o contribuinte vai retirar do funcionamento de um serviço público.
P.ex., na reforma fiscal actual pretende-se lançar tributos especiais na margem sul da Ponte
Vasco da Gama, nos terrenos aí situados, pois vão ser muito valorizados.
Soares Martinez considera que, como não há uma contraprestação individualizada ao utente, os
tributos especiais não são uma taxa, mas também não são impostos (quando muito são equivalentes a
estes). Assim, os tributos especiais são um tertius genus.
Por seu lado, Brás Teixeira considera os tributos especiais verdadeiros impostos, que
apresentam características diferenciadoras do conceito de taxa.
Direito Fiscal I
A figura do empréstimo público acha-se normalmente de tal modo distanciada do imposto que
poderá razoavelmente duvidar-se da necessidade de tentar uma destrinça entre os dois conceitos. Importa
ter presente, porém, que duas figuras híbridas reúnem elementos de ambos, em termos de tornar
aconselhável a separação. Referimo-nos ao imposto reembolsável e ao empréstimo forçado. O hibridismo
de tais figuras, só por si, justificará a destrinça, além de uma tomada de posição quanto à natureza dessas
mesmas figuras.
Os empréstimos públicos criam normalmente, para o Estado, o dever de reembolso, de uma só
vez, ou através de amortizações, e o de pagar juros. Os mesmos deveres de prestar decorrem dos
empréstimos forçados, algumas vezes emitidos pelo Estado por não lhe parecer favorável o mercado de
capitais. Aos particulares não é reconhecida liberdade para subscrever ou não os empréstimos forçados.
Quanto ao chamado imposto reembolsável, quando o reembolso resultasse da própria estrutura
da relação jurídica, tratar-se-ía, apesar da designação, de um empréstimo público forçado. Naqueles casos
em que o reembolso corresponde a uma mera faculdade do Estado, não há qualquer dever de prestar
específico, e, consequentemente, pode incluir-se a figura na noção de imposto.
A tendência é para aproximar do imposto o empréstimo forçado, baseada num critério
voluntarista, que levará a excluir do conceito de empréstimo relações cuja origem não é voluntária, não
parece justificar-se. Pela obrigação de reembolso e de pagamento de juros, o empréstimo forçado não
cabe nos quadros do imposto. Admite-se, no entanto, que também não caiba no conceito de empréstimo
público, devendo constituir, por isso, uma categoria distinta também deste.
A requisição administrativa consiste num acto pelo qual, em casos excepcionais, um órgão da
AP exige dos particulares, mediante justa indemnização, a prestação de determinado serviço, ou a acessão
de coisas móveis, ou ainda a utilização temporária de certos bens para acorrer a necessidades urgentes.
Assim, há um conjunto de diferenças a apontar.
O imposto é uma forma normal de obtenção de meios financeiros para satisfazer necessidades
públicas. A requisição administrativa tem carácter excepcional.
O imposto visa conseguir meios financeiros para acorrer a necessidades gerais. A requisição
administrativa destina-se a fazer face a determinadas necessidades concretas, de natureza urgente e
individualizadas.
O imposto tem carácter de prestação unilateral e definitiva, a que não corresponde, por isso,
qualquer contraprestação individualizada, nem dá direito a nenhuma retribuição ou indemnização. Por sua
vez, a requisição tem como elemento essencial o pagamento ao requisitado do preço dos bens ou uma
indemnização pelos danos sofridos.
A relação de imposto surge apenas quando se verificam os pressupostos da respectiva previsão
legal, não cabendo à administração fiscal qualquer apreciação sobre a oportunidade ou o modo de
cobrança. Na requisição pressupõe-se sempre uma prévia apreciação administrativa sobre a sua
necessidade e uma escolha dos meios sobre os quais deve incidir.
Por fim, enquanto no imposto, na generalidade dos casos, temos uma prestação pecuniária, a
requisição traduz-se numa prestação de serviços, ou na cedência de certas coisas, ou ainda na utilização
temporária de determinados bens.
O fim da expropriação por utilidade pública não consiste na realização de uma receita pública.
Dela emerge o dever de indemnizar os expropriados, além do direito de reversão (cfr. Código das
Expropriações – D.L. nº 438/91, de 9/Novembro).
Direito Fiscal I
Vários são os critérios distintivos que se podem adoptar para fazer a classificação entre impostos
directos e indirectos.
i – a primeira proposta de critério fez radicar a distinção no objecto do imposto. Assim, estamos
perante impostos directos se incidirem sobre uma manifestação imediata/directa da capacidade
retributiva. Estamos perante impostos indirectos se incidem sobre uma manifestação mediata/indirecta da
capacidade retributiva. Esta 1ª proposta foi feita pela Doutrina e Jurisprudência Italiana. Contudo, deve
ser afastada, pois ela baseia-se num critério que só faz referência ao elemento económico.
ii – uma segunda proposta faz radicar a distinção na diversa natureza do facto gerador da
obrigação fiscal. Nos impostos directos verifica-se alguma permanência no facto gerador da obrigação
fiscal. Já nos impostos indirectos, o facto gerador tem carácter transitório, temporário ou acidental,
consistindo numa atitude eventual do contribuinte. Também esta tese é de ser afastada, pois, tal como a
doutrina anterior, também esta se baseia exclusivamente em elementos económicos.
iii – uma outra posição faz a distinção com base no modo de determinação do sujeito passivo.
Estamos perante um imposto directo se a incidência desse imposto está prevista num rol nominativo de
contribuintes. Se não houver um rol nominativo de contribuintes, o imposto é indirecto. Mais uma vez,
esta tese é também de afastar. Isto porque esta doutrina é formulada a partir de um critério rigorosamente
jurídico, mas é excessivamente formal, tomando como elemento determinante o que não passa de uma
consequência acidental e não um factor distintivo.
iv – uma quarta proposta diz que é impossível estabelecer a distinção com referência a um só
elemento exclusivamente. A distinção deve ser referida a todos os elementos relevantes: o objecto, a
natureza da prestação, o processo administrativo de liquidação do imposto, o rol nominativo e a natureza,
grau e intensidade de privilégios creditórios de determinado imposto. A crítica é que esta tese conduz a
um resultado praticamente impossível, pois não é fornecido um elemento distintivo, um critério objectivo
único, mas vários elementos de distinção (“peca” por excesso).
v – ainda outra proposta afirma que a distinção deve procurar-se no tipo de relação jurídica que
constitui a fonte da obrigação fiscal. Se se trata de uma relação jurídica que dá lugar a uma prestação
isolada, o imposto é indirecto. Se, pelo contrário, há uma relação jurídica que dá origem a prestações
periódicas, então esse imposto deve ser considerado directo. Ainda esta tese deve ser afastada, pois
equivale à concepção que atende à natureza do facto gerador da obrigação fiscal (nada lhe acrescentando)
e ainda porque faz coincidir esta distinção com a distinção entre impostos periódicos e impostos de
obrigação única.
vi – Por fim, a tese, pelo menos actualmente, mais correcta tem por base os arts. 736 CC e 254
CRP. Da análise destes arts. concluímos que a nossa lei acolheu um critério económico para proceder à
distinção. Assim, são impostos directos aqueles que recaem sobre os rendimentos e o património (exs.:
IRS, IRC, Contribuição Autárquica, SISA, Imposto sobre Sucessões e Doações). São impostos indirectos
aqueles que recaem sobre o consumo e a despesa (exs.: IVA, Imposto de Selo, Impostos especiais sobre o
consumo – sobre a cerveja, sobre automóveis, sobre o tabaco, sobre produtos petrolíferos, impostos
aduaneiros,...).
Direito Fiscal I
Os impostos directos distinguem-se entre impostos pessoais e impostos reais, conforme incidem
sobre o conjunto ou parte dos bens do contribuinte, tendo em conta, em maior ou menor grau, a situação
pessoal do contribuinte – estamos aqui perante um imposto pessoal; ou tributam os bens ou rendimentos
objectivamente considerados – estamos então perante impostos reais.
Nem sempre o estado é o credor do imposto, o sujeito activo da relação jurídico-tributária. Esta
constitui-se, muitas vezes, em benefício de uma autarquia local ou de um instituto público. Daí a
separação dos impostos estaduais dos não estaduais. A origem de uns e outros é legal e, portanto,
estadual, mas só em relação aos primeiros o estado se apresenta como credor.
Referem-se, frequentemente, a propósito da distinção estabelecida, os impostos parafiscais.
Contudo, as receitas parafiscais, entre as quais avultam as contribuições para a Segurança Social e as
“taxas” dos organismos de coordenação económica, caracterizam-se por algumas especialidades quanto à
orçamentação e quanto à contabilização, que, aliás, tendem a esbater-se, sem deixarem de oferecer
aspectos comuns ao impostos.
Note-se que os impostos não estaduais são os estruturados no sentido da sua atribuição a uma
entidade diversa do Estado 8impostos regionais, provinciais, municipais, paroquiais,...)Mas acontece
frequentemente que a receita de um imposto estadual seja cedida pelo Estado a outra entidade pública.
Essa cedência não altera a natureza estadual do imposto. É o que acontece com os impostos lançados e
cobrados pelo Estado nas áreas das Regiões Autónomas, de que estas podem “dispor” (art. 229, i) CRP),
porque o Estado lhes cede as respectivas receitas, que, por essa cedência, passam a constituir receitas
próprias das Regiões Autónomas (D.L. nº 22/77, 18/1, arts. 1º e 3º).
De modo semelhante, O Estado cede aos Municípios, juntamente com parte da receita de outros
impostos, a totalidade da receita da contribuição autárquica, da SISA e do imposto municipal sobre
veículos. Mas isso não parece modificar a natureza estadual destes impostos. Que o Estado ceda a uma
autarquia, ou a outra pessoa, uma parte ou a totalidade da receita de um imposto não afecta a natureza
deste.
Aliás, quando o Estado cria, lança, liquida e cobra um imposto, as relações jurídico-tributárias
respectivas estabelecem-se entre os particulares e o Estado somente. A entrega subsequente da receita a
outra entidade insere-se numa relação jurídica que nem sequer é de natureza tributária.
De qualquer modo, a distinção é feita com base na natureza do sujeito activo. Se temos impostos
cujo sujeito activo é o Estado temos impostos estaduais. Se, pelo contrário, o sujeito activo é outro ente
público que não o Estado, nomeadamente as autarquias locais, temos impostos não estaduais.
A distinção entre impostos gerais e impostos locais tem em conta o âmbito territorial de
aplicação dos tributos. Os impostos gerais abrangem todo o território nacional; os impostos locais
destinam-se a uma determinada zona ou autarquia.
Atende à natureza permanente ou acidental dos factos sobre os quais incidem os impostos. Os
impostos são periódicos se tributam situações ou actividades que duram no tempo, dando origem a
sucessivas obrigações tributárias. São impostos de obrigação única os que recaem sobre factos isolados,
sem carácter de continuidade.
Existe, como excepção à regra, um caso de um imposto de obrigação única, mas que tem carácter
periódico: é o imposto sobre sucessões e doações por avença, previsto no art. 182 CSISA e Imposto sobre
Sucessões e Doações.
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Direito Fiscal I
Derrama – 10%
(imposto acessório)
A reforma de 1988 veio reduzir bastante o nº de impostos directos que estão em vigor. Foram
abolidos a contribuição industrial, a contribuição predial, o imposto profissional, o imposto
complementar, imposto sobre a indústria agrícola, imposto sobre as mais valias,...
Por outro lado, foram introduzidos e mantidos o IRS e o IRC (em substituição da contribuição
industrial). Estes dois impostos vieram substituir e abolir todos os impostos acima referidos. E a eles se
circunscreve toda a tributação com carácter periódico.
Actualmente, também existe a contribuição autárquica. A contribuição autárquica (imposto sobre
o património) é cobrado periodicamente (anualmente), sendo suportado, em regra, pelo rendimento dos
prédios sobre que incide. A contribuição autárquica destina-se ao Município.
Dos impostos de prestação única e sobre o património destacam-se o imposto sobre sucessões e
doações e o imposto nacional de SISA (DL 41969 de 24/11/...). Estão ainda em vigor os impostos sobre a
despesa e o consumo, que são, desde logo, o IVA (DL 394-B/88) e o imposto de selo (DL 21916 de
28/11/32).
Por fim, temos os impostos especiais sobre o consumo, nomeadamente os que incidem sobre
bebidas alcoólicas, tabaco, bens petrolíferos,...
Sobre a desigualdade de taxas temos muitos outros – taxa de lixo, taxa de esgotos,... – que são
verdadeiros impostos ocultos.
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Direito Fiscal I
Conforme já foi referido, alguns autores têm procurado distinguir uma soberania fiscal
originária, do Estado, de uma soberania fiscal derivada, delegada em benefício de entidades públicas
menores, ou até, nalguns casos, em benefício de entidades privadas que exerçam funções públicas.
Mas actualmente – bem ou mal, posto que uma concepção pluralista dos poderes políticos e dos
ordenamentos jurídicos poderá conduzir a solução diversa – nenhuma entidade exerce poderes tributários
que lhe não sejam concedidos pelo Estado. À margem da autoridade deste não é concebível que alguém
exija de outrem prestações de tipo tributário.
Em suma, não há soberania fiscal delegada ou derivada. Porque as autarquias territoriais e as
outras entidades públicas não são soberanas. Nem no plano fiscal nem noutros. Apenas beneficiam de
créditos tributários constituídos ao abrigo de normas estaduais.
Com efeito, o Estado, por motivos de descentralização de funções públicas e para assegurar o
exercício de tais funções descentralizadas, faculta às entidades públicas menores receitas tributarias. E fá-
lo por três formas diversas.
Nuns casos, cedendo-lhes uma parte ou a totalidade da receita de um imposto [Constituição, art.
229, alínea i); art. 254 Estatuto Provisório da Região Autónoma dos Açores, aprovado pelo Decreto-Lei
n.0 318-B/76, de 30 de Abril, arts. 53, e 54; Estatuto Político-administrativo da Região Autónoma da
Madeira, aprovado pela Lei n.0 13/91, de 5 de Junho, art. 67; Código da Contribuição Autárquica,
aprovado pelo Decreto-Lei n.0 442-C/88, de 30 de Novembro, art. 1.; Decreto-Lei n.0 22/77, de 18 de
Janeiro; Lei n.0 1/79, de 25 de Janeiro, arts. 5 e 6; Estatuto Político-administrativo da Região Autónoma
dos Açores, aprovado pela Lei n.0 39/80, de 5 de Agosto, art. 82).
Noutros casos, permitindo às entidades publicas menores o lançamento de adicionais aos
impostos do Estado (Decreto-Lei n0 98/84, de 29 de Março, art. 12).
Noutros casos ainda, autorizando o lançamento e a cobrança de impostos autónomos, conforme
12
Direito Fiscal I
estabelecia o Código Administrativo (arts. 703 e ss), quanto ao imposto de prestação de trabalho, ao
imposto para o serviço de incêndios, e outros.
Nos dois primeiros casos, pode entender-se que não chegam a constituir-se relações entre as
entidades públicas menores e os contribuintes. A posição credora daquelas ou é meramente acessória da
posição tributária do Estado ou não chega mesmo a desenhar-se em relação aos contribuintes. Aquelas
entidades públicas menores serão credoras do Estado, que arrecadou certas receitas fiscais a elas
destinadas, e não credoras dos contribuintes. Mas na hipótese de lançamento de impostos autónomos já as
relações jurídico-tributárias constituídas se desenvolvem entre as entidades públicas menores, sujeitos
activos dessas relações, e os contribuintes, sujeitos passivos das mesmas.
Em qualquer dos três casos, porém, as manifestações soberanas são sempre estaduais. As
entidades públicas menores não poderão criar qualquer imposto, sendo “nulas as deliberações de qualquer
órgão das autarquias locais que determinem o lançamento de impostos, taxas, derramas ou mais-valias
não previstos na lei”.
O imposto predial romano e alguns aspectos predominantes dos sistemas tributários medievais
inspiraram uma teoria da tributação que atribui ao imposto a natureza de um direito real, de um direito
sobre coisas.
O príncipe, por direito de conquista ou de defesa da terra, seria proprietário de todo o solo; e,
quando cedia a outrem, a título perpétuo, direitos sobre qualquer fracção territorial, exigiria ao cessionário
uma prestação periódica, também perpétua, uma espécie foro enfitêutico, o imposto. Esta construção
reflecte a teoria do domínio eminente do príncipe, com raízes bem fundas nas instituições públicas do
passado, sobretudo as de inspiração germânica, projectada nalgumas normas do antigo Direito português
e que, de quando em vez, emerge nas instituições jurídicas da actualidade. Como, por exemplo, quando o
Estado afirma direitos sobre o subsolo de todas as fracções prediais do território estadual.
A referida construção circunscreve-se aos impostos prediais, pois quanto aos outros mais
dificilmente seriam de invocar os direitos de conquista, ou de defesa da terra, como base da tributação.
Tanto bastaria para considerar a teoria do domínio eminente não ajustada à fundamentação do poder de
tributar em face das modernas instituições jurídico-fiscais.
13
Direito Fiscal I
actividades que tornam possível a obtenção e o gozo dos rendimentos dos particulares.
d) As concepções ético-sociais:
No decurso do século XIX, passou a tentar fundamentar-se a soberania fiscal em razões ético-
sociais. O fundamento do poder de tributar residiria na exigência social de assegurar a cobertura
financeira das despesas do Estado, na própria satisfação das necessidades públicas.
Esta ideia de satisfação das necessidades públicas, situada no plano do fundamento do imposto,
abstraiu de qualquer princípio de troca, de "do ut des", ou de “do ut facias”.
As novas teorias, ditas ético-sociais, tentaram fixar critérios de repartição de encargos através
das ideias de capacidade contributiva, de igualdade de sacrifícios, de utilidade marginal; mas essas ideias,
menos precisas, são, sobretudo, de base política; e torna-se muito difícil aproveitá-las no plano da
construção jurídica.
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Direito Fiscal I
a) Os fins do Estado:
Os poderes fiscais do Estado, mesmo os poderes soberanos, acham-se limitados, não apenas de
facto, mas também de Direito. E a primeira limitação decorre dos próprios fins do Estado e das vantagens
que advêm da sua prossecução.
O Estado não pode criar impostos para satisfazer fins que não sejam os seus próprios, nem para
fazer face a despesas que não se traduzam em vantagens para a respectiva comunidade. Sem dúvida que
essas vantagens têm de ser apreciadas à face de critérios políticos. Mas definidos estes, com eles terá de
conformar-se o poder estadual; e terá, consequentemente, de admitir, à mesma luz, limitações à sua
capacidade de exigir impostos.
Quando o Estado visava apenas a manutenção da paz social, e esta era considerada em termos
restritos, como acontecia no século passado, o poder de tributar também não deveria exceder as
exigências indispensáveis à manutenção das forças armadas, dos serviços de diplomacia, das polícias e
dos órgãos jurisdicionais. Ao alargar a sua esfera de acção ao plano do fomento económico, mesmo
supletivamente, o Estado teve de alargar também o seu poder de tributar. E, quando os Estados se
propõem dirigir toda a vida das nações e o seu desenvolvimento económico, segundo planos gerais, os
poderes financeiros orientados no sentido da disposição dos patrimónios dos particulares, quando estes
sejam ainda admitidos, têm de ser muito mais extensos.
Os limites da soberania fiscal do Estado dependem, pois, dos seus próprios fins, e do complexo
de princípios e instituições que dominem a vida do país considerado. Mas, além destes limites, aos quais
deve atribuir-se relevo, não apenas moral e político, mas também jurídico, os poderes tributários do
Estado acham-se normalmente confinados dentro de fronteiras legais expressamente definidas.
A lei fundamental do Estado limita, embora transitoriamente, pelo tempo que a própria
Constituição vigorar, os poderes tributários estaduais, que também são restringidos por costumes
internacionais e por tratados, enquanto o Estado que os celebrou, ou a eles aderiu, os não denunciar.
Também à face da Constituição de 1976, poderá entender-se que o seu art. 13 veda ao Estado
qualquer forma de tributação assente nas discriminações sociais aí excluídas.
É de referir que quando Portugal aderiu à União Europeia criou um novo limite à legislação
tributária e à soberania do Estado.
c) A territorialidade do imposto:
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Direito Fiscal I
Assim, por exemplo, os documentos expedidos, ou passados, no estrangeiro só podem ser admitidos em
juízo, ou apresentados a qualquer autoridade portuguesa, desde que tenha sido pago imposto do selo, nos
casos em que este recai sobre documentos passados em Portugal (vd. Regulamento do Imposto do Selo,
art. 271). A circunstância de o acto que o documento titula, embora praticado no estrangeiro, ser invocado
perante a ordem jurídica portuguesa dá lugar a tributação.
São mais numerosas as excepções ao princípio da territorialidade do imposto no sentido da sua
restrição, as quais provêm de compromissos assumidos pelo Estado na ordem internacional, quer pela
aceitação de usos e costumes, quer pela celebração de tratados internacionais, ou pela adesão a estes. O
respeito pelos usos impedirá o Estado de tributar as entidades às quais o Direito Internacional reconhece
personalidade, assim como os agentes diplomáticos estrangeiros, pelas actividades exercidas nessa
qualidade. Quanto aos tratados internacionais com efeito na esfera da tributação, uns têm por objecto a
protecção de pessoas, bens e actividades, outros a solução de conflitos suscitados no plano internacional
relativamente a matérias tributárias.
Também a Convenção de Estocolmo de 1960, que instituiu a “Associação Europeia de Comércio
Livre” (E.F.T.A.) e foi assinada por Portugal, estabeleceu para os Estados signatários e aderentes diversas
limitações no campo fiscal, quanto à redução progressiva de impostos aduaneiros sobre a importação (art.
3º), quanto à incidência de quaisquer impostos sobre as mercadorias importadas (art. 6º), quanto à
aplicação do regime aduaneiro de “draubaque” (art. 7º), quanto à proibição de impostos sobre as
exportações (art. 8º).
O ingresso de Portugal na “Comunidade Económica Europeia”, ou “Mercado Comum Europeu”
– hoje, União Europeia ou Comunidade Europeia -, determinou também outras, e mais acentuadas,
limitações do poder de tributar, em obediência ao Tratado de Roma, de 1957, que instituiu aquela
“Comunidade”, designadamente por força dos arts. 2º, 3º, 12 a 28 e 95 e seguintes desse Tratado.
Nas últimas dezenas de anos foram celebradas muitas convenções internacionais que visam os
conflitos de tributação suscitados, ou que possam suscitar-se, no plano internacional. Esses conflitos
resultam da adopção pelas várias ordens jurídicas de critérios diferentes na definição dos pressupostos
tributários. Quando uma situação se acha ligada, pela diversidade dos seus elementos, a mais de uma
ordem jurídica, essa disparidade na definição de pressupostos tributários pode determinar ou que mais de
um Estado tribute tal situação ou que nenhum a tribute, quando, normalmente, sem essa bilateralidade de
conexões, ela seria tributada. No primeiro caso, o conflito é positivo, dele resultando uma duplicação de
impostos; no segundo caso, o conflito é negativo, e dá lugar a uma evasão fiscal, nalguns casos provocada
por Estados que, com o fim de atraírem pessoas ou capitais aos seus territórios, procuram, através das
suas legislações, criar os designados “paraísos fiscais”.
Mas os conflitos positivos verificam-se mais frequentemente; e oferecem inconvenientes sérios,
do ponto de vista da manutenção e do desenvolvimento das relações económicas internacionais. Portanto,
para não correrem o risco de serem tributados por dois ou mais Estados, na base de uma mesma e só
situação, muitos contribuintes evitam estabelecer actividades conexas com mais de uma ordem jurídica.
Com efeito, é fácil avaliar quanto poderá ser gravoso para uma sociedade comercial ser tributada pelo
Estado em cujo território tem a sua sede, por todos os rendimentos obtidos, e ser tributada, por esses
mesmos rendimentos, nos diversos Estados onde não tenha sede, mas exerça actividades. Ou para
qualquer indivíduo que resida em país diverso daquele onde os seus rendimentos são produzidos, ser
tributado por um Estado, em razão de aí receber os seus rendimentos, e noutro Estado, por motivo de nele
terem origem esses mesmos rendimentos.
A questão suscitou também o maior interesse à O.C.D.E., cujo “Comité” Fiscal elaborou, em
1963, um modelo-tipo de convénios tendentes a evitar as duplas tributações dos rendimentos e dos
patrimónios, no plano internacional, que já foi revisto em 1977. Também a Organização das Nações
Unidas cometeu o estudo destes problemas a um grupo de trabalho que, em 1974, publicou um relatório
sobre as questões de dupla tributação.
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Direito Fiscal I
Não sendo o Estado uma pessoa física, tem de servir-se de órgãos no exercício dos seus poderes
tributários, como, aliás, de outros. Mas poderão suscitar-se dúvidas quanto à natureza desses órgãos.
As origens das instituições fiscais e a feição própria que lhes é característica parece exigirem que
os órgãos da soberania fiscal sejam representativos do sentido da comunidade política e ofereçam
garantias de justiça e de objectividade na definição do equilíbrio indispensável entre as necessidades
públicas e os direitos patrimoniais dos particulares. Deste princípio se tem extraído a conclusão de que os
órgãos da soberania fiscal hão-de ser colegiais e constituídos por membros designados através de um
sufrágio directo e universal. Os órgãos da soberania fiscal hão-de ser representativos do sentido da
comunidade, nos termos em que, segundo as ideias políticas dominantes, naturalmente reflectidas nos
textos constitucionais, esse sentido deva manifestar-se.
À face dos regimes constitucionais vigentes, tanto nos países ditos capitalistas como nos ditos
socialistas, são geralmente as assembleias políticas representativas das comunidades que, ao menos
formalmente, manifestam a vontade soberana do Estado em matéria tributária. Tanto pela votação dos
impostos, ou, ao menos, das normas gerais a que estes hão-de subordinar-se, como pelas autorizações
concedidas aos governos para a cobrança das receitas fiscais.
O Estado actua através de órgãos de soberania fiscal. Estes órgãos são colegiais e constituídos
por membros eleitos por sufrágio directo e universal. Estes órgãos devem ser independentes na apreciação
dos sacrifícios patrimoniais a exigir à nação e na própria repartição da carga tributária pelas diferentes
regiões que compõem o Estado.
Durante alguns séculos, os poderes tributários foram repartidos entre os monarcas e as
assembleias políticas. Só com a Revolução Francesa de 1789 é que a ideia de “Parlamento” ou
“Assembleia” foi instituída.
Entre nós, foi a Constituição de 1822 que deslocou os poderes tributários soberanos dos
monarcas para as Cortes (que na altura eram constituídas por membros eleitos pelos cidadãos). Na
Constituição de 1976 há um afrouxamento da protecção dos particulares em matéria tributária. Isto,
porque as normas tributárias na nossa CRP não se encontram no capítulo dos direitos, liberdades e
garantias, mas no capítulo da organização política.
Quanto à questão de saber quais são, afinal de contas, os órgãos de soberania fiscal eles são
todos de onde emana a lei (art. 103 e 104 CRP), pelo que cabe à A.R. fazer as leis sobre todas as
matérias, com excepção das atribuídas ao governo (art. 161 e 198/2 CRP). Portanto, na nossa ordem
jurídica, a AR é o órgão máximo de soberania fiscal. Cabe-lhe criar impostos e a sua incidência, bem
como assegurar as garantias (graciosas, contenciosas e judiciais) dos contribuintes e os benefícios fiscais.
O Governo pode legislar em todas as áreas que não sejam reservadas à AR. Pode ainda legislar sobre as
matérias da competência da AR, desde que esta aprove uma lei de autorização legislativa ao Governo (lei-
quadro de autorização).
a) Evolução Histórica:
Também em Portugal, na sequência das liberdades reconhecidas aos povos pelos Direitos
visigótico e leonês, os poderes tributários soberanos começaram por ser exercidos pelos Reis e pelas
Cortes, assembleia política representativa da Nação. Mas as Cortes não reuniram em Portugal desde 1698.
A partir de então, e até 1821, data em que se reuniram novamente Cortes, embora estas de feição diversa,
os poderes tributários soberanos foram exercidos exclusivamente pelos monarcas. E em termos
ostensivos, com desconhecimento completo de quaisquer poderes das Cortes, desde o reinado de D. José.
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Direito Fiscal I
de 1791, deslocou os poderes tributários soberanos do Rei para as Cortes, assembleia política constituída
por deputados eleitos pelo sufrágio dos cidadãos eleitores.
Assim, à face da Constituição de 1822, o órgão da soberania fiscal era a assembleia política
designada por Cortes.
A Constituição de 1911:
A Constituição republicana de 1911 incluiu no seu artigo 3º, entre os direitos garantidos a
portugueses e estrangeiros residentes no país, o de não serem obrigados “a pagar contribuições que não
tenham sido votadas pelo poder legislativo ou pelos corpos administrativos, legalmente autorizados a
lançá-las, e cuja cobrança se não faça pela forma prescrita na lei” (nº 27).
À face da Constituição de 1911, o órgão da soberania tributária era o Congresso da República,
constituído pela Câmara dos Deputados e pelo Senado, ambos eleitos por sufrágio directo dos cidadãos.
A Constituição de 1933:
b) A Constituição de 1976:
É frouxa a defesa dos particulares, em face das exigências fiscais, no texto da Constituição de
1976. Sobretudo em confronto com o interesse e a minúcia que lhe mereceram outros aspectos de defesa
dos direitos e liberdades.
Sublinhe-se também que as disposições constitucionais respeitantes a impostos, ao contrário da
tradição constitucional, tanto próxima como remota, deixaram de encontrar cabimento na parte
respeitante aos “direitos, liberdades e garantias”. Foram inseridas apenas sob as rubricas “organização
económica” e “organização do poder político”. No entanto, substancialmente, não parece que o
tratamento reservado a tais matérias tenha mudado em termos radicais com a Constituição de 1976.
Segundo esta, “os impostos são criados por lei, que determina a incidência, a taxa, os benefícios fiscais e
as garantias dos contribuintes” (art. 106, nº 2).
Neste artigo, e na sequência das Constituições de 1911 e de 1933, reconhece-se o direito de não
pagar impostos que não tenham sido criados nos termos da Constituição.
Segundo o citado artigo 106, “os impostos são criados por lei, que determina a incidência, a taxa,
os benefícios fiscais e as garantias dos contribuintes”. Daqui se conclui que órgãos da soberania fiscal
serão aqueles dos quais dimana a lei. Ora é à Assembleia da República que cabe “fazer leis” sobre todas
as matérias, salvo, segundo o texto constitucional primitivo, as reservadas pela Constituição ao Conselho
da Revolução ou ao Governo (art. 164, alínea d)).
Após a revisão de 1982, desapareceram do texto constitucional as referências ao Conselho da
Revolução, abolido, pelo que as dúvida quanto à competência legislativa da Assembleia da República se
põem apenas em relação ao Governo. Mas a conclusão é manifestamente a mesma que se impunha à face
do texto primitivo.
Também à Assembleia da República compete, por lei, criar impostos (art. 106, nº 2). Este
preceito não deverá interpretar-se no sentido de que só os impostos inteiramente novos devem sei
estruturados por lei. Qualquer alteração de incidência de um imposto velho corresponde à criação de um
imposto; de outro modo, sempre poderiam os governos, aproveitando designações anteriores e alguns
pressupostos já definidos, modificar por completo as condições de tributação.
Da delimitação constitucional de matérias tributárias reservadas à lei resulta que o Governo
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Direito Fiscal I
poderá legislar quanto a essas matérias desde que não se trate de criação de impostos, de definição da
incidência, da taxa, dos benefícios fiscais e das garantias das contribuintes.
É de notar que, nos termos dos arts. 168 e 201 nº 1, alínea b) da Constituição, o Governo pode
“fazer decretos-leis em matérias de reserva relativa da Assembleia da República, mediante autorização
desta”. Em cujo caso, o Governo poderá legislar sobre todas as matérias tributarias (art. 168, nº 1, alínea i)
CRP). Nem mesmo assim, porém, se justificará atribuir ao Governo a qualidade de órgão da soberania
fiscal; porque os poderes que assume em tal matéria lhe são delegados pela Assembleia da República, à
qual cabe “definir o objecto, o sentido, a extensão e a duração da autorização” (art. 168, nº 2), e que
poderá, inclusivamente, não delegar tais poderes, que a Constituição reserva àquela Assembleia.
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Direito Fiscal I
➥ Parecer dos Drs. Miguel Vasconcelos e Miguel Judice sobre a criação do imposto de 12%
dos serviços de restauração.
Para já ainda vigora a tributação do destino (ou seja, o IVA é cobrado à taxa do país de destino
do bem), mas pretende-se o regime da Tributação Definitiva, que se destina a tributar os produtos no país
de origem, para os sujeitos passivos do imposto. Por isso se diz que vivemos num regime de IVA
transitório (pois vigora o tradicional e pretende-se alcançar o regime definitivo).
Só através de lei da AR se pode criar impostos e definir ou alterar a sua incidência. Também só
através de lei da AR se pode condenar certa conduta fiscal como crime.
O Decreto-Lei, com excepção das leis de autorização que permitem ao Governo legislar sobre
matéria reservada à AR, só poderá desenvolver e completar os princípios e as bases definidas por lei ou
disciplinar os restantes elementos do imposto.
Por meio de lei da AR pode regular outros elementos da relação jurídico-tributária, além dos
tradicionais – lançamento, liquidação, cobrança – bem como a disciplina dos chamados deveres fiscais
acessórios.
No que respeita às matérias referidas no nº2 do art. 103 e na al. i) do nº1 do art. 165 CRP, a
competência da AR é exclusiva, não podendo o Governo dispor por decreto-lei contra o preceituado na
lei, sob pena de inconstitucionalidade material.
Já quanto às restantes matérias, a competência da AR e do Governo é concorrente (art. 112/2
CRP). Assim sendo, nada impede o Governo de alterar por via de DL o que estiver disposto em lei
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Direito Fiscal I
anterior da AR.
d) Regulamento:
O carácter geral e abstracto dos chamados “despachos genéricos”, das instruções e circulares,
emanados de diversas entidades (Ministro e Secretários de Estado do Departamento das Finanças,
Directores-Gerais das Contribuições e Impostos, das Alfândegas, etc.) sobre matérias tributárias, tem
levado, por vezes, a considerar a questão de saber se tais “resoluções meramente administrativas”, pois
essa é a sua natureza, serão fontes de Direito Fiscal.
Não parece que o sejam, porquanto a força vinculativa de tais diplomas se acha circunscrita a um
sector da ordem administrativa. E essa mesma força vinculativa resulta tão somente da autoridade
hierárquica dos agentes de onde provêm, e dos deveres de acatamento dos subordinados aos quais se
dirigem.
Assim, por exemplo, os “despachos genéricos”, as instruções e as circulares, emanados de um
Secretário de Estado, e tendo por destinatários os funcionários da Direcção-Geral das Contribuições e
Impostos, só vinculam aqueles mesmos funcionários, e em razão do seu dever de obediência hierárquica.
Tais diplomas não têm por destinatários os particulares, os cidadãos, os contribuintes. O que,
evidentemente, não obsta a que, no plano prático, os contribuintes tenham o maior interesse em conhecer
tais instruções, circulares e despachos. Porque é segundo os critérios ai definidos, nomeadamente quanto
à interpretação da lei fiscal aplicável, que os funcionários hierarquicamente vinculados a essas ordens de
serviço vão apreciar os casos sobre os quais lhes cumpre decidir. E, na generalidade das situações, ou
porque os critérios adoptados são correctos, ou por resignação em face das eventuais incorrecções, os
contribuintes conformam-se com a orientação definida no plano administrativo. Tal orientação, porém,
não os vincula. Nem aos Tribunais, que tratam de interpretar e aplicar as leis fiscais sem qualquer
dependência dos critérios adoptados pela Administração fiscal através dos referidos “despachos
genéricos”, das circulares e das instruções.
Assim, se os contribuintes inconformados com aqueles critérios não conseguirem convencer a
Administração do bem fundado das suas razões contrárias, resta-lhes a via judicial, para através dela
fazerem vingar os seus pontos de vista. E, frequentemente, por tal forma o conseguem.
Já se tem procurado atribuir a natureza de regulamentos e de fontes de Direito às referidas
ordens internas da Administração. Mas integração de lacunas ou a interpretação das leis fiscais que elas
visam não cabe na função regulamentar. E a limitação do poder vinculativo a uma esfera hierárquica
retira-lhes a qualidade de fonte de Direito.
f) Costume:
Há ramos de Direito cujas normas vão sendo elaboradas pelos próprios destinatários,
constantemente, através do ajustamento quotidiano de critérios de justiça, espontaneamente definidos, às
situações concretas que se sucedem no tempo. E os legisladores, na sua função de descobrir as normas já
existentes, ou em formação, numa sociedade, acabam, com maior ou menor lentidão, por formular essas
normas assim criadas por via consuetudinária. Em tais esferas jurídicas, o costume - "tacitus consensus
populi longa consuetudine inveteratus" há-de afirmar-se como fonte de Direito. Mas não parece que
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Direito Fiscal I
aconteça no campo tributário, onde as normas não são criadas espontaneamente pelos destinatários.
O problema da natureza das deliberações das entidades públicas menores sobre matérias
tributárias prende-se com o da natureza, soberana ou não, dessas mesmas entidades, embora não se
confunda com ele.
Aquelas entidades têm frequentemente de definir a sua posição relativamente às situações
tributárias que o Estado lhes faculta, deliberando quanto ao “lançamento” de adicionais aos impostos do
Estado, ou quanto ao “lançamento” de impostos autónomos, conforme estabelecia o Código
Administrativo (arts. 703 e ss). E, mesmo relativamente às regiões autónomas, deverá entender-se que é
da sua competência decidir, através de actos-condição, ainda que sob a forma de decretos legislativos
regionais, se um regime tributário, se uma ou outra norma de incidência é ou não aplicável nos territórios
respectivos.
Poderá entender-se que as referidas deliberações têm a natureza de actos que condicionam a
aplicação das normas pelas quais se definiram as situações jurídicas objectivas correspondentes. Assim,
se os órgãos de uma entidade pública menor que, nos termos legais, possa “lançar” um determinado
imposto local, ou possa “lançar” um adicional sobre as colectas de um imposto do Estado, não
deliberaram no sentido daquele “lançamento”, o imposto, ou o adicional, não será cobrado na
circunscrição territorial respectiva, por não se verificar uma condição legal estabelecida pela norma
tributária - a deliberação da entidade pública menor à qual cabe “lançar” esse imposto, ou esse adicional.
Contudo, não parece fazer sentido que se atribua natureza regulamentar a um acto cujo conteúdo
consista apenas na decisão de “lançar” ou não “lançar” um imposto local legalmente criado. Ou na
fixação da taxa de um adicional, dentro dos limites legais.
h)Normas internacionais:
i) Jurisprudência e Doutrina:
Nem a jurisprudência nem a doutrina constituem fontes imediatas de Direito Fiscal. No entanto,
a jurisprudência e a doutrina desempenham um papel do maior relevo como fontes mediatas de Direito
Fiscal, pela influência que exercem na evolução dos sistemas de Direito positivo. E esta influência é ainda
mais marcada no campo do Direito Fiscal, por se tratar de um ramo de Direito que tem sofrido
ultimamente, e está a sofrer, grandes e profundas alterações, as quais são muito frequentemente
influenciadas pela opinião dos doutrinadores e pelas orientações jurisprudenciais.
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Direito Fiscal I
Tal como acontece no Direito Comunitário, o Direito Fiscal disciplina uma realidade cujas
condicionantes políticas, económicas e sociais se encontram em permanente mutação. Nisto radica a
dificuldade de codificação desta área do saber.
A 1ª grande codificação do direito Fiscal ocorreu em 1919, na Alemanha e ficou a dever-se a
Becker, grande jurista alemão. A legislação alemã de 1919, pela definição de conceitos, sistematização e
conceptualização de leis que operou foi um trabalho que se revelou muito importante pelo impulso que
deu à Doutrina e à Jurisprudência não só alemãs, mas de todo o mundo europeu.
Em Portugal, a codificação tende a ser parcelar (imposto a imposto). Cada código consagra as
normas relativas a um imposto, com excepção do Código de Imposto de SISA, que legisla sobre dois
impostos (imposto municipal da SISA e imposto sobre sucessões e doações).
As normas de Soberania Fiscal são o conjunto de normas que definem o poder de tributar e
estabelecem limites a tal poder (art. 103 e 104 CRP).
b) As normas de incidência:
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Direito Fiscal I
c) normas de lançamento:
d) normas de liquidação:
Normas de liquidação são aquelas que regulam as operações que consistem na aplicação da taxa
de imposto à matéria colectável com vista ao apuramento da colecta. São normas de liquidação as normas
dos arts. 77 a 79 CIRS, 70 a 81 CIRC, 18 a 21 CCAutárquica.
São as normas que disciplinam as operações de arrecadação das receitas tributárias, ou seja,
disciplinam a cobrança de impostos pelo Estado e o pagamento dos impostos por parte dos contribuintes.
➥ arts. 90 a 104 CIRS, 82 a 93 CIRC, 22 e 23 CCAutárquica, 120 e 121 CSISA.
g) normas de fiscalização:
Entre as normas tributárias de fiscalização há que distinguir duas espécies. Umas respeitam à
fiscalização dos serviços e essas são, nitidamente, de natureza administrativa. Outras respeitam à
fiscalização dos contribuintes e de terceiros, que se julgue disporem de elementos susceptíveis de
possibilitar, ou facilitar, as operações fiscais orientadas para uma regular percepção dos impostos.
Só por comodidade se têm incluído umas e outras normas de fiscalização na mesma categoria,
porquanto a natureza administrativa e o carácter interno da primeira espécie não suscitam os mesmos
problemas que poderão levantar-se relativamente às normas de fiscalização que implicam deveres e
sujeições para os particulares, as quais, por esse motivo, e em defesa das liberdades, poderão exigir
especiais cautelas, nalguns aspectos não diversas das que hão-de rodear as normas de incidência.
➥ cfr. arts. 75 CPTributário, 122 e 130 CIRS, 107 a 110 CIRC, 25 a 30 CCAutárquica.
h) normas de sanção:
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Direito Fiscal I
Normas de sanção são aquelas que prevêem as sanções correspondentes aos actos ilícitos
praticados pelos contribuintes. Este tipo de normas tem natureza penal, daí que se lhes apliquem os
princípio de Direito Penal. As sanções fiscais podem ser a pena de prisão, coimas ou multas.
➥ cfr. RJIFA (DL 376-A/89, de 25/10) e RJIFNA (DL. 20-A/90, de 15/1) – no âmbito da actual
reforma fiscal está prevista a fusão destes dois diplomas e a criação de um só abrangendo os dois tipos de
infracções.
i) normas de contencioso:
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Direito Fiscal I
Vem já do Direito Romano a orientação doutrinária segundo a qual, na dúvida, a norma fiscal
deveria interpretar-se contra o Fisco, em termos favoráveis ao contribuinte. Donde o enunciado do
princípio “in dubio contra fiscum”, cujo fundamento poderá encontrar-se no carácter “odioso” atribuído
às normas fiscais. Na base daquele carácter “odioso”, admitido mais ou menos pacificamente até ao
século XVII, também já se pretendeu que se aplicaria às normas fiscais o princípio “odiosa restringenda,
devendo, pois, ser restritiva a sua interpretação.
Essa parece ter sido também doutrina assente entre os jurisconsultos portugueses dos séculos
XVII e XVIII", afirmando Agostinho Barbosa, seguindo a opinião comum dos doutores, que “gabeloe jus
est odiosum et recipit stríctam interpretationem".
Não se confunde o princípio “in dubio contra fiscum”, o qual pressupõe dúvidas de
interpretação, com o princípio da interpretação restritiva, de aplicação permanente às normas fiscais, seja
a sua interpretação duvidosa ou não, desde que se entenda que elas são “odiosas”. Mas ambos têm andado
frequentemente confundidos, ou ligados, e têm sido também, de um modo geral, rejeitados pela mais
recente doutrina fiscalista e pelos modernos sistemas de Direito positivo.
Segundo o entendimento dominante, as normas tributárias não têm carácter “odioso”, nem
sequer “excepcional”. E, realmente, parece difícil defender a excepcionalidade, ou o carácter odioso, de
normas de execução permanente, cuja normalidade é afirmada pela própria circunstância de serem
indispensáveis ao funcionamento regular dos serviços públicos.
Tem-se observado pertinentemente que o princípio “in dubio contra fiscum” não constituirá
propriamente uma regra de interpretação das normas, mas sim “uma regra de decisão sobre facto incerto
na aplicação da lei", com alcance análogo ao do princípio “in dubio pro reo”, que respeita à apreciação
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Direito Fiscal I
das provas. Mas, por uma forma ou outra, continua tal regra a exercer influência na jurisprudência dos
Tribunais superiores de bastantes países, entre os quais os Estados Unidos.
b) Interpretação literal:
Poderão aceitar-se, com maiores ou menores resistências, as críticas que invalidaram o princípio
“in dubio contra fiscum”, assim como a aplicabilidade ao Direito Fiscal da regra “odiosa restringenda”.
Mas já parece duvidoso que essas mesmas críticas permitam afastar liminarmente o princípio da
interpretação literal, que tem sido defendido na base da legalidade do imposto e que, consequentemente,
se aplicaria apenas às normas sobre matérias reservadas à lei.
Com efeito, tem-se entendido que tais normas só admitem uma interpretação literal, não
devendo aceitar-se quanto a elas a interpretação extensiva, por motivos de segurança jurídica, e pela
dificuldade de fixar onde termina a interpretação extensiva, e onde começa a aplicação analógica, que o
princípio da legalidade veda quanto às matérias pelo mesmo princípio abrangidas.
É certo que os motivos de segurança jurídica poderiam opor-se à interpretação extensiva de
toda e qualquer norma de Direito, pelo que aqueles motivos não serão invocáveis especialmente em
relação às normas fiscais, a não ser no pressuposto de que estas sejam promulgadas sem equilibrada
ponderação dos interesses em causa. Aliás, foi esse pressuposto que inspirou, por vezes, as
particularidades admitidas relativamente à interpretação das leis fiscais.
Quanto à dificuldade de distinguir a interpretação extensiva da aplicação analógica, entende-se,
geralmente, que se trata de uma dificuldade real, mas situada no plano de facto. No plano conceptual, a
destrinça não seria difícil de estabelecer. E, assim, se tem julgado inconsistente a defesa do princípio da
interpretação literal da norma tributária tão-somente na base da legalidade fiscal. No plano do Direito a
constituir, porém, haveria vantagens na adopção daquele princípio de interpretação literal, que, aliás, a
orientação jurisprudencial tem muito frequentemente perfilhado, em França, na Itália, em Espanha e em
Portugal
A teoria da interpretação funcional, defendida na Itália por Griziotti e por alguns dos seus
discípulos da escola de Paiva, impondo ao intérprete que tenha em conta os aspectos político, económico,
jurídico e técnico das normas fiscais, a fim de revelar a respectiva função, poderá ser julgada não
inovadora, porquanto todos esses aspectos se haviam já de compreender na interpretação dita “lógica". A
não ser na medida em que, por força desses mesmos aspectos, .o intérprete da lei fiscal se substitua ao
legislador, criando uma norma nova.
A teoria da interpretação funcional situar-se-ia, por essa forma, no campo das doutrinas
histórico-evolutivas. Estas doutrinas oferecem, por certo, muitas vantagens para a implantação de regimes
políticos nascentes. E, partindo do princípio de que tais regimes possam assegurar melhores critérios de
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Direito Fiscal I
O sistema actual tende a dar prevalência, quer na legislação, quer na Doutrina, aos princípios
gerais de interpretação das leis (sistema literário, histórico, etc.). Esta solução actual de equilíbrio entre os
interesses do fisco e os interesses dos particulares baseia-se na ideia de que o Direito Fiscal não é um
direito restritivo das liberdades e não tem carácter excepcional. Ou seja, não é correcto apresentar como
diferença da ordem jurídica tributária o facto das suas normas representarem restrições à liberdade
individual, uma vez que tal característica é comum a todo o direito em geral. Na medida em que
disciplina condutas humanas, o Direito em geral impõe limites ao agir das pessoas (e não só o Direito
Fiscal).
O Direito Fiscal também não é excepcional, porque é um Direito institucional, um sector
especial da ordem jurídica dotado de princípios próprios e ordenando em função de um fim específico,
formado por um conjunto unitário de normas, que, se por um lado institui regimes diferentes dos regimes
de Direito Civil, por outro lado, não contém comandos opostos ao Direito Civil, como seria próprio de um
direito excepcional, o qual diligentemente poderia constituir um corpo autónomo de preceitos.
São de afastar, assim, as especificas correntes interpretativas que tem hoje interesse apenas
histórico, e impõe-se ver que o Direito Fiscal é um ramo de direito constituído por normas jurídicas que
devem ser interpretadas tal como as normas de outros ramos do direito.
As questões de interpretação das normas fiscais têm sido prejudicadas, muitas vezes, pela
deficiente metodologia do respectivo tratamento. E também pelas preocupações de ordem pragmática,
que frequentemente dominam a discussão desta matéria. Alguns vêm nas especialidades de interpretação
das normas fiscais um meio de facilitar as fugas ao imposto; e, por isso, as contrariam. Outros julgam tais
especialidades fundamentais para defesa dos contribuintes; e essa é, frequentemente, a razão porque as
entendem justificadas.
O problema nem sequer pode ser apreciado em termos globais, colocando no mesmo plano as
normas de incidência, de lançamento, de organização de serviços, de sanção, de contencioso, etc.. Nem
faz sentido também apreciar a questão simultaneamente do ponto de vista do Direito constituído e do
ponto de vista do Direito a constituir.
Temos, pois, de considerar o problema no plano do Direito Tributário vigente em Portugal e em
relação às diversas categorias de normas fiscais.
Soares Martinez, sobre a questão da interpretação do Direito Fiscal, faz a distinção entre dois
grupos de normas.
Num 1º grupo, destaca as normas de soberania fiscal, de lançamento, de organização de serviços,
de fiscalização e de contencioso. Quanto a este conjunto, a interpretação faz-se com base nos princípios
gerais de Direito e pela analogia.
Um segundo grupo, composto pelas normas de sanção, de incidência, de liquidação, de cobrança
e normas de contencioso que respeitam às garantias dos particulares, está sujeito ao princípio da
interpretação literal, ficando excluída a interpretação extensiva e a analógica.
S. Martinez justifica a sua posição com base no art. 1º do CPenal e nos arts. 103 e 104 CRP.
O Dr. Brás Teixeira entende que vale em Direito Fiscal, para toda e qualquer categoria de
normas, os princípios gerais de interpretação das leis, sem quaisquer específicidades senão aquelas que
resultam da própria lei.
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Direito Fiscal I
Se em termos de interpretação o Dr. Brás Teixeira não faz distinção de normas, já quanto à
integração de lacunas distingue três categorias.
1º, para as normas de incidência, de benefícios fiscais, sobre taxas e sobre garantias dos
contribuintes, a analogia está excluída, por força do art. 103 CRP.
2º, nas normas sobre infracções fiscais, a analogia está também excluída, em virtude d art. 1º/3
CPenal.
3º, quanto às restantes categorias de normas fiscais, nada obsta à sua aplicação analógica, a qual
é admitida pela generalidade da Doutrina (podemos apontar os nomes de Teixeira Ribeiro, Cardoso da
Costa, Alberto Xavier, Nuno Sá Gomes e Vitor Faveiro).
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Direito Fiscal I
Poderá entender-se que as normas fiscais, ou, pelo menos, as de incidência, têm a força
vinculativa condicionada pela autorização parlamentar anual de cobrança de receitas, que se integrará,
ou não, no Orçamento de Estado. Quanto a outros aspectos, nenhuma particularidade oferecem as normas
fiscais quanto à sua vigência e quanto à respectiva “vacatio legis”.
Também quanto à cessão de vigência das normas fiscais essa cessação verifica-se nos termos
comuns da cessação de normas, pela revogação ou caducidade, nos casos em que a vigência daquelas
normas tenha sido pelo legislador limitada no tempo, ou colocada na dependência de condições que
deixaram de verificar-se.
É relativamente frequente no campo do Direito Fiscal a suspensão da vigência de normas,
embora essa suspensão deva atribuir-se a precipitações do legislador, orientado para pôr em prática
normas de difícil aceitação pelo meio social respectivo.
Quanto à questão da retroactividade ou não das normas fiscais, quanto a saber se uma norma
fiscal nova, quando o legislador não tenha previsto disposições transitórias, se aplica (ou não) a relações
jurídicas tributárias constituídas à luz da lei anterior, depois de várias controvérsias, ficou resolvida pela
IV Revisão Constitucional (1997).
O art. 103 CRP passou a prever no nº 3 que ninguém pode ser obrigado a pagar impostos que
tenham natureza retroactiva, ou seja, ficou constitucionalmente consagrado o princípio da não
retroactividade da lei fiscal.
Alguns autores defendiam a retroactividade da lei fiscal, outros defendiam a não retroactividade.
Com a actual CRP a questão ficou resolvida. Antes disso, já a própria Jurisprudência se tinha ocupado da
questão – cfr. Acórdãos do Tribunal Constitucional de 2/3/88 e de 3/7/84: “Uma norma fiscal não pode
ser retroactiva”, tal como prevê a actual Constituição Portuguesa.
31
Direito Fiscal I
Capítulo I – Generalidades:
Tendo já identificado uma das noções de imposto com a ideia de relação jurídica, procurámos
então determinar os caracteres essenciais da relação tributária, ou relação de imposto: vínculo jurídico
obrigacional ou creditício, constituído com o fim de obtenção de uma receita pública e autónomo, no
sentido de não depender de situações jurídicas anteriores, nem criar novos vínculos legais. Mas as
características assim enunciadas levantam problemas cuja solução está longe de ser pacífica.
As dificuldades em tal matéria são bem compreensíveis. A figura jurídica da relação
obrigacional foi cuidadosamente trabalhada pelo Direito Romano e acha-se limitada por contornos
relativamente precisos nas modernas instituições de Direito Privado.
Talvez por isso, e, possivelmente também pelo desejo de se apartarem dos quadros comuns
traçados pelo Direito Civil, os cultores do Direito Público chegaram a julgar aquela figura
necessariamente ligada a uma autonomia da vontade sem papel a desempenhar nas disciplinas jurídicas
em que o interesse colectivo é dominante.
As transformações operadas no próprio campo do Direito Privado, porém, levaram mais
facilmente ainda à convicção de que o conceito jurídico de obrigação não era inadaptável a situações que
se constituam independentemente da formulação de qualquer vontade juridicamente relevante (ex.:
situações de responsabilidade objectiva). E o conceito de vínculo obrigacional, já posto à prova pelas
transformações operadas no seio do Direito Civil, acabou por penetrar, timidamente embora, na esfera
jurídica em que o interesse público é predominante.
No entanto, e porque muito frequentemente se liga o conceito de obrigação jurídica aos quadros
do Direito Civil, também muito frequentemente se nos deparam afirmações segundo as quais a obrigação
tributária “não é bem uma obrigação”.
Há que encarar frontalmente a questão e esclarecê-la no sentido de que, admitida nos quadros do
Direito dos Impostos a figura da obrigação tributária, da obrigação fiscal, ela se há-de incluir no
conceito jurídico genérico de obrigação, que, embora elaborado pelo Direito Civil, constitui um elemento
comum do património cultural da doutrina jurídica. A obrigação é um conceito comum de Direito, que
apresenta especialidades nos diversos ramos, mas sem que isso obste à conservação, através dessas
especialidades, dos seus caracteres essenciais.
A relação jurídico-fiscal é, pois, uma relação obrigacional, embora de Direito Público.
A tendência para omitir toda a problemática respeitante à relação obrigacional tributária talvez
encontre a sua origem no tratadista austríaco Myrbach-Rheinfeld, cuja obra, do começo do século, teve
grande projecção tanto em países de língua alemã, como, talvez sobretudo, em França e em Portugal.
Aquele autor considera inadmissível apresentar como verdadeiras obrigações “as relações criadas pelas
leis de imposto”; mas porque o conceito de “obrigação” saiu exclusivamente - segundo ele - da esfera do
Direito Civil e, aceitando-o no campo do Direito Público, aí se teriam de aplicar princípios do Direito
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Direito Fiscal I
Privado das obrigações”. Tal argumentação de Myrbach-Rheinfeld, que, como veremos adiante, parece ter
inspirado a sua teoria sobre o nascimento e a cisão dos vínculos jurídico-tributários, perdeu actualidade,
tanto pela evolução do Direito Fiscal como pela aceitação da categoria obrigacional noutros ramos de
Direito Público, em cujo âmbito aquele autor julgava inadmissível tal aceitação.
Na sua monografia sobre “a relação de imposto”, Giannini, ao apreciar a natureza daquela
relação, reconheceu que a doutrina moderna (em 1937) quase unanimemente lhe atribuía natureza
obrigacional; mas observou também que muitas vezes essa mesma doutrina considerava o vínculo
obrigacional tributário apenas análogo, mas não idêntico ao vínculo obrigacional do Direito Privado.
Giannini, porém, negou a existência da pretendida “nota distintiva”, ou “diferença estrutural”, entre a
obrigação tributária e a obrigação civil.
A doutrina germânica sempre reagiu contra o estudo das matérias tributárias segundo o esquema
da relação jurídica obrigacional, tido por privatístico e avesso à ideia de subordinação do contribuinte ao
Estado, por vínculo de cidadania ou por uma supremacia de facto. Algumas vezes, admitindo embora, em
princípio, a natureza obrigacional do vínculo tributário, os autores alemães tendem a hipertrofiar as
especialidades, as particularidades, daquele vínculo, por forma a afastá-lo de qualquer domínio dos
princípios gerais do Direito das Obrigações. É o caso de Hensel, que, no entanto, não parece convincente
na sua indicação de tais especialidades, pois, para este autor, enquanto as relações privadas são
determinadas por um “acordo bilateral de vontade” entre devedores e credores, as relações tributárias são
fixadas pela lei, não podendo nelas o devedor influir no conteúdo dessas obrigações.
Mesmo a posição relativamente moderada de Hensel, que sempre admite um vínculo
obrigacional tributário, é francamente objectável, pela falta de fundamento quanto às especialidades
atribuídas à obrigação tributária.
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Direito Fiscal I
Vejamos agora a natureza jurídica das obrigações tributárias acessórias. Quanto a esta questão
não há unanimidade na Doutrina, existindo três correntes.
Uma primeira corrente, liderada por Brás Teixeira, as obrigações tributárias acessórias têm a
natureza de verdadeiras e próprias obrigações fiscais, embora com carácter acessório. No vasto conceito
da relação jurídico-fiscal destaca dois conceitos: a obrigação fiscal em si própria e a relação jurídica
fiscal.
A obrigação fiscal designa o vínculo que, da verificação dos pressupostos de facto que integram
o tipo legal tributário, nasce entre o Estado e o contribuinte. A relação jurídica fiscal refere-se a uma
realidade jurídica complexa, na qual se incluem, para além da obrigação fiscal em si própria, todas
aquelas relações de diferente objecto e conteúdo que aquela obrigação central dá origem.
São sujeitos passivos não só os próprios contribuintes, mas também outras pessoas (entidades
patronais, p.ex.).
Em conclusão, quer a obrigação de imposto, quer as obrigações tributárias acessórias integram-
se no conceito amplo de relação jurídica fiscal, como relação complexa, concorrendo em maior ou menor
grau para tornar possível a realização da prestação de imposto.
Uma segunda corrente, pouco relevante, com pouca expressão, defendem que as obrigações
tributárias acessórias são meros deveres de cooperação com a Administração Fiscal, logo não têm
natureza jurídica de verdadeiras obrigações.
Por fim, Soares Martinez (terceira corrente) defende que estas obrigações não têm natureza
fiscal, por não se destinarem directamente a obter uma receita pública, só se podendo considerar
obrigações acessórias quando elas recaem sobre o sujeito passivo da relação fiscal propriamente dita (art.
94 CIRC).
Assim, S. Martinez distingue vários conceitos:
¨ Obrigação fiscal propriamente dita;
¨ Obrigações tributárias acessórias, cujo sujeito passivo é o mesmo da obrigação fiscal
propriamente dita;
¨ Obrigações tributárias acessórias cujo sujeito passivo é uma pessoa diferente.
Integram-se no conceito de relação jurídica fiscal os dois primeiros tipos de obrigações, em que
o sujeito passivo coincide – obrigação fiscal propriamente dita e obrigações tributárias acessórias cujo
sujeito passivo é o mesmo da 1ª relação.
Quanto aos outros deveres tributários acessórios que recaem sobre terceiros, é mais difícil
integrá-los no conceito de obrigação fiscal de imposto, “criando-se” aqui uma relação jurídica paralela,
cuja natureza jurídica é discutível. P.ex., é difícil que um notário seja considerado sujeito passivo de uma
relação jurídica fiscal resultante do imposto sobre o rendimento, só pelo facto dele lavrar a escritura de
um contracto de mútuo.
Constituindo a relação jurídica de imposto uma espécie dentro do género “obrigação”, hão-de
corresponder-lhe especialidades; embora nem tantas, nem tão significativas, como aquelas que pretendem
atribuir-lhe quantos visam afastar radicalmente a obrigação tributária da teoria geral das obrigações.
Segundo uma das especialidades mais frequentemente apontada pelos autores, a obrigação
tributária é uma obrigação legal, “ex lege”. E tal afirmação não parece objectável, desde que se entenda
por obrigação “ex lege” aquela cujo conteúdo, cujo regime, é o definido pela lei, pela norma, não tendo
papel a desempenhar em tal definição a vontade das partes.
As relações jurídicas de imposto não são acordadas entre as partes. Exceptuar-se-á o caso da
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Direito Fiscal I
“concordata tributária”, que foi admitida nalgumas legislações, assim como os das avenças fiscais e dos
benefícios fiscais que as legislações têm, por vezes, admitido se baseiem em “contratos”. Mas, quanto a
generalidade das situações, pelo menos, parece indiscutível que as relações jurídicas de imposto não são
definidas por acordo. Logo, nesse sentido, a obrigação tributária há-de ser legal, “ex lege”.
Contudo, por vezes, tem-se dado sentido diverso a esse qualificativo, querendo-se por ele
significar que as obrigações tributárias têm a sua origem na lei, são constituídas pela lei, ao contrário das
obrigações civis, que teriam a sua origem na vontade das partes.
Também poderá duvidar-se que corresponda a uma especialidade da obrigação de imposto a sua
“irrenunciabilidade”, a que alguns autores se referem. Em primeiro lugar, importará observar que a
“renunciabilidade”, ou “irrenunciabilidade”, respeita aos direitos e não propriamente às relações. Mas
poderá admitir-se a qualificação de irrenunciáveis atribuída a relações que integram direitos como tal
qualificáveis. Algumas dúvidas oferecerá a afirmação de que os direitos tributários sejam sempre e
necessariamente, por essência, irrenunciáveis, como o são, por exemplo, os direitos de personalidade.
Mas, mesmo aceitando que tais direitos se apresentem normalmente como irrenunciáveis,
restaria saber se o seriam pela natureza, pela estrutura, da relação do imposto. Parece que não. Também
outro direitos do Estado, e de diversas entidades públicas, embora não tributários, serão, possivelmente,
considerados como irrenunciáveis. Essa irrenunciabilidade, a admitir-se, dependerá, não da natureza da
obrigação tributária, mas sim da qualidade do credor.
O Estado garante os seus créditos de imposto através de meio processual característico, a
execução fiscal. E daqui se extrai, por vezes, mais uma especialidade da obrigação tributária. E até a
conclusão de que nela o sujeito activo ocupa unia posição de especial preeminência.
Conclusão: O Dr. Soares Martinez, apesar de admitir que a obrigação fiscal é ex lege, não
defende as duas características como ligadas à estrutura e natureza da obrigação fiscal. Diz que, por um
lado, os direitos tributários não são sempre e necessariamente irrenunciáveis, pois o Estado concede
amnistias e moratórias (ex.: Plano Mateus). O próprio processo das execuções fiscais aplica-se à cobrança
coerciva de todas as dívidas ao Estado e não só aos impostos. Logo, não é característica específica do
conceito de obrigação fiscal.
Concluindo, a obrigação fiscal é uma obrigação em sentido verdadeiro e próprio, a qual tem o
seu nascimento com a verificação dos pressupostos que integram a previsão legal, não cabendo ao
processo administrativo de liquidação outro papel que não seja o de determinar os elementos da obrigação
e de a tornar líquida.
Normalmente, as características são as três já referidas, embora as duas últimas não sejam
essenciais (devido às amnistias e moratórias do Estado).
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Direito Fiscal I
O facto constitutivo, ou facto gerador, da relação de imposto será aquele facto que conjuga os
pressupostos previstos na lei tributária. É a realidade com vigor jurídico bastante, que lhe advém da lei,
para pôr em movimento, para combinar, os pressupostos tributários, considerados estes como aquelas
situações, pessoais e reais, previstas, expressa ou tacitamente, pelas normas de incidência tributária.
É preferível considerar em termos plurais os pressupostos tributários a aglutiná-los num só, que
seria então, também, o facto constitutivo do vínculo jurídico de imposto.
Um pressuposto, em si mesmo, como tal, não é causa, não é facto constitutivo. É qualquer coisa
sem a qual a causa, o facto constitutivo, se não verifica; não actua.
Exemplificando, será pressuposto da relação jurídica de contribuição predial a existência de um
prédio. Mas se existir um prédio que foi há muito abandonado, cujo proprietário actual se desconhece,
não havendo possibilidade de determinar quem seja a pessoa quanto à qual se possa presumir que aufere
os rendimentos desse prédio, a relação jurídica de contribuição predial não se constituirá. Enquanto se
mantiver tal situação. Mas se o prédio passar a ser possuído, e presumivelmente explorado, por alguém,
então já se poderá constituir uma relação jurídica de contribuição predial. Porque houve um facto - neste
caso a posse – que conjugou, que aproximou, o pressuposto tributário material, o prédio, do outro
pressuposto tributário, pessoal - um ente dotado de personalidade tributária - reunindo, ao mesmo
tempo, naturalmente, outros pressupostos ainda, de cuja conjugação a lei faça depender o nascimento da
relação jurídica fiscal considerada.
É corrente, na jurisprudência, como na legislação, o emprego tanto da expressão “pressuposto”,
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Direito Fiscal I
ou “pressuposto de facto”, como da expressão “facto gerador” do tributo, no sentido de facto constitutivo
da relação jurídica de imposto.
Sob as mesmas designações de causa do imposto, ou causa tributária, tem sido estudados dois
problemas com aspectos comuns, mas que não deixam de ser diversos, pelo que cumpre separá-los.
Por um lado, o da causa do poder de tributar, por outro, o da causa da relação jurídica de
imposto.
Causa do poder de tributar será o próprio fundamento da soberania fiscal; causa da relação
jurídica de imposto será o motivo, ou o fim, de cada vínculo tributário, em concreto.
Quanto ao poder de tributar, importa determinar a sua causa, o seu fundamento, cuja apreciação
encontra ampla justificação nos quadros de uma construção jurídica. Poderá não caber ao jurista, como
tal, pronunciar-se sobre as razões políticas desse fundamento ou sobre as razões políticas da extensão do
poder de tributar. Mas não deve o jurista, mesmo nessa qualidade, renunciar a conhecer a génese e o
encadeamento causal que se acha na base dos institutos de Direito.
É mais difícil ajuizar sobre a causa da relação jurídica de imposto, podendo admitir-se que a
não tenha. Ao menos à luz dos sistemas de Direito vigentes. Mas não se julgue que as dificuldades
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Direito Fiscal I
revelam mais uma das “especialidades” do Direito Fiscal e da obrigação tributária. De modo algum. A
relação jurídica de imposto poderá achar-se desligada de uma causa jurídica apenas por não ter origem
negocial.
Frequentemente se tem usado a expressão “causa” referida à relação jurídica de imposto, no
sentido de facto constitutivo, ou de “pressuposto”; mas não se vêem as vantagens da inovação
terminológica, que pode oferecer inconvenientes.
Em face das dificuldades referidas, boa parte da doutrina fiscalista prefere ignorar o problema da
causa da relação de imposto. Outra parte nega que tal causa, como causa final, possa determinar-se.
Compreendem-se bem as razões de ordem pragmática que, em larga medida, têm ditado essas atitudes.
Nas circunstancias actuais, a dependência da obrigação tributária de um princípio causalista poderia
lançar uma permanente incerteza no campo das relações fiscais, através da constante discussão da
legitimidade dos comandos tributários.
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Direito Fiscal I
Capítulo II – Os Sujeitos:
Esta é uma das matérias em que mais se nota a diferença de opiniões na Doutrina, porque, se em
geral todos concordam em considerar como elementos da relação jurídico-fiscal o sujeito, o objecto e as
garantias, já existem múltiplos modos de conceber e ordenar estes elementos, não faltando autores que
autonomizam o facto jurídico, mas também outros que autonomizam outros elementos.
Sujeitos:
Todas as relações jurídicas em geral- e também a relação jurídica fiscal – desenvolvem-se entre
pessoas. Estes sujeitos – os titulares – aparecem numa posição de titulares de direitos e deveres previstos
na lei fiscal e o exercício desses direitos e deveres visa a percepção do imposto.
A característica 1ª destes sujeitos é a personalidade tributária, isto é, a susceptibilidade de ser
titular de direitos e deveres de tipo tributário (art. 4º CPT).
Segundo o Dr. Soares Martinez, o conceito de personalidade jurídico-tributária é especifica do
Direito Fiscal e diferencia-se do conceito de personalidade jurídica do Direito Civil. O Direito Fiscal,
defende o mesmo autor, personaliza certos centros de interesses que outros ramos de Direito não
personalizam (p.ex., actividades desenvolvidas por sociedades irregulares). O prof. Miguel Vasconcelos
concorda com esta posição.
O Dr. Brás Teixeira entende que a noção de personalidade jurídica exprime uma qualidade e
tem a ver com algo de absoluto e, portanto, não pode haver autonomização desse conceito no sub-ramo
Direito Fiscal. Diferente é já, segundo o mesmo autor, a noção de capacidade jurídica em geral, pois, esta
sim, pressupõe a existência de personalidade jurídica. A capacidade jurídica reporta-se a uma quantidade,
logo ela pode ser maior ou menor, pelo que este conceito pode, assim, ser alterado de um ramo de Direito
para outro.
Sendo assim, a capacidade jurídica fiscal é a medida dos direitos e deveres tributários de que um
determinado sujeito pode ser titular. Daí que o conceito possa ser, como é, mais vasto no Direito Fiscal do
que é no Direito Civil.
A diferenciação que Soares Martinez faz em relação à personalidade, o Dr. Brás Teixeira faz
em relação à capacidade.
O conceito de capacidade de exercício tributária coincide, de acordo com o Dr. Brás Teixeira,
com o conceito de capacidade de exercício em geral, no Direito Civil. De acordo com este autor, para
termos uma relação tributária é necessário que os respectivos sujeitos tenham personalidade jurídica e
capacidade jurídica tributária (titulares de direitos e deveres fiscais). O conceito de capacidade tributária
de exercício, numa relação tributária, é dispensável, pois os incapazes tendem a ser capazes
tributariamente.
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Direito Fiscal I
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Direito Fiscal I
a) Estado:
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Direito Fiscal I
b) Autarquias Territoriais:
Entende-se por autarquia territorial, ou local, a pessoa de Direito Público cujos fins e
atribuições se acham limitados a uma circunscrição do território do Estado e à população que nela reside
(art. 237/2 CRP).
Assim, face do regime constitucional vigente, poderão considerar-se autarquias territoriais as
regiões autónomas dos Açores e da Madeira, as regiões administrativas, a instituir, os municípios e as
freguesias. Embora aquelas regiões autónomas se achem formalmente separadas das outras autarquias,
pelo seu particular relevo político-administrativo.
Quanto às autarquias locais ou territoriais, a lei adopta três soluções fiscais diferentes:
1. A lei fiscal impõe ao Estado a entrega, total ou parcial, do produto de imposto (p.ex., SISA e
Contribuição Autárquica) a tais autarquias territoriais.
2. A lei fiscal cria impostos autárquicos, cujos sujeitos activos são as próprias autarquias,
embora a cobrança seja efectuada pelo Estado.
3. A lei fiscal autoriza as autarquias territoriais a fixarem determinados adicionais à colecta nos
impostos estaduais (p.ex., a derrama).
Na 1ª hipótese, para a totalidade das receitas pagas pelos residentes nas regiões autónomas, bem
como no caso dos Municípios (imposto local: SISA e contribuição autárquica), o verdadeiro sujeito activo
é o estado, sendo a autarquia credora do Estado. Esta é a posição do Dr. Soares Martinez e também do
Dr. Brás Teixeira. No entanto, aqui temos de ter em conta a revisão constitucional de 1997.
No entanto, já quanto aos impostos adicionais, o sujeito activo é a autarquia, embora os impostos
sejam cobrados pela Administração Central.
À luz da CRP anterior à revisão de 1997, os profs. Soares Martinez, Brás Teixeira e Manuel
Pires consideravam que só podiam ser sujeitos activos da relação fiscal os Municípios; as regiões
autónomas dos Açores e da Madeira não, pois apenas possuíam receitas consignadas, logo, neste caso,
sujeito activo seria apenas o Estado.
Após a 4ª revisão constitucional (1997), parece que as regiões autónomas foram fortalecidas , o
que leva a dizer, com Nuno Sá Gomes e também com o prof. M. Vasconcelos, que estas assumem, no
quadro jurídico-fiscal, a posição de verdadeiros sujeitos activos. Podemos retirar esta conclusão da análise
e confrontação dos arts. 229/1, al. i) e 277/1, al. i).
Quanto aos Municípios não há qualquer dúvida ou divergência, eles são, de facto, sujeitos
activos da relação jurídica.
c) Institutos Públicos:
Os serviços públicos funcionam, em regra, nos quadros das estruturas do Estado e das
autarquias territoriais, sem vontade própria com projecção no plano jurídico. Alguns, porém, ou pela
natureza técnica, que exige uma direcção independente, ou por concorrerem com os particulares no
comércio jurídico-privado, ou por outros motivos ainda, gozam de autonomia administrativa e financeira,
sendo-lhes reconhecida personalidade jurídica. São os institutos públicos como a Caixa Geral de
Depósitos, as Administrações-Gerais do Porto, de Lisboa e dos Portos do Douro e Leixões, as Juntas
Autónomas dos Portos, e outros.
Não repugna que a tais entidades, que prosseguem interesses públicos, às quais é reconhecida a
natureza de pessoas colectivas de Direito Público, seja atribuída pela lei personalidade tributária activa.
E, às vezes, assim acontece. Sendo frequentemente parte das receitas dos institutos públicos proveniente
de taxas, cobradas pela utilização dos respectivos serviços, podem suscitar-se dúvidas, muitas vezes,
sobre a situação tributária daqueles institutos, dada a dificuldade de destrinçar algumas taxas de certos
impostos.
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Direito Fiscal I
agora pôr em relevo que as especialidades mais marcadas em tal matéria não respeitam à personalidade
activa, mas sim à personalidade passiva.
Não oferece dúvidas a atribuição de personalidade tributária passiva às entidades que como
pessoas são tidas pela generalidade das outras disciplinas jurídicas, quer se trate de pessoas físicas quer de
pessoas meramente jurídicas. Mas põe-se a questão de saber se, para além das pessoas como tal
geralmente reconhecidas pelas diversas disciplinas jurídicas, poderá também ser atribuída personalidade
jurídica passiva a outras entidades ainda, não personalizadas à face dos outros ramos de Direito.
O problema da extensão do conceito de personalidade tributária passiva integra-se numa
questão mais vasta. A qual consiste em saber se a tributação incide sobre situações de conteúdo jurídico
ou de conteúdo meramente económico. A lei fiscal tributa situações de facto e não situações jurídicas. Do
momento, parece que deveremos conformar-nos com este princípio fiscalista da tributação de situações
económicas, quer sejam legais quer não o sejam. Essa tem sido a orientação da jurisprudência do
Supremo Tribunal Administrativo.
As legislações alemã e italiana admitiram que fossem sujeitos de relações jurídicas de imposto,
que gozassem de personalidade tributária passiva, entidades desprovidas de personalidade jurídica,
“entidades meramente de facto”.
E a doutrina, a italiana pelo menos, adoptou amplamente essa admissibilidade. Mas tal
entendimento parece liminarmente inaceitável. Porquanto a personalidade tributária integra-se no
conceito genérico de personalidade jurídica. Logo, se tais “entes de facto” se situam como sujeitos em
relações jurídicas de imposto, isso significa que são pessoas jurídicas, que gozam de personalidade
jurídica, ao menos no campo do Direito Fiscal.
A legislação italiana mais recente não emprega já a expressão “entes de facto”; mas prevê a
tributação de “sociedades sem personalidade jurídica”. Essa orientação foi também seguida pelas leis
fiscais portuguesas, que prevêem a integração em relações tributárias, como sujeitos passivos, de
entidades desprovidas de personalidade jurídica (CIRC, art. 2º/1, b) e c)).
A afirmação de que há entes de facto, desprovidos de personalidade jurídica, que, no entanto,
são sujeitos de relações tributárias, gozam de personalidade tributária passiva, envolve uma insanável
contradição. A personalidade tributária, susceptibilidade de ser titular de direitos e deveres fiscais,
constitui uma forma de personalidade jurídica. Os entes aos quais seja atribuída têm a natureza de
pessoas de Direito. Não são “entes de facto”, pelo menos a partir do momento em que o Direito Fiscal os
personaliza (art. 4º CPT).
Portanto, o problema tem de ser posto em termos diversos. Trata-se de saber se os critérios
adoptados para a atribuição de personalidade jurídica no campo do Direito Fiscal são diversos dos
adoptados noutros ramos de Direito. E são-no, efectivamente. Aliás, em obediência ao referido princípio
da base económica, e não jurídica, das situações tributárias, dos pressupostos tributários. É desse
princípio que resulta o critério tributário de atribuição de personalidade passiva. Onde quer que o Direito
Fiscal depare com um ente individualizável, do ponto de vista da sua actividade económica, aí reconhece
uma base personalizável, desde que a personalização seja exigida pelo sentido teleológico da ordem
tributária.
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Direito Fiscal I
termos de tornar possível o seu uso com significado idêntico ao de sujeito passivo da relação jurídica de
imposto, ou sujeito tributário passivo.
Será contribuinte quem é obrigado ao pagamento de uma contribuição, termo que os
legisladores do século XIX procuraram substituir ao de imposto, por julgarem que aquela expressão
melhor se amoldava aos sistemas fiscais modernos, à face dos quais a tributação se há-de realizar em
termos de contribuições para as despesas públicas, consentidas pelos eleitores-contribuintes, através dos
seus mandatários parlamentares.
O sujeito passivo da relação de imposto, pessoa a quem é juridicamente exigível a prestação
tributária, apresenta-se-nos como o contribuinte, ou contribuinte de Direito, para distingui-lo da figura
do contribuinte de facto, que se desenha em consequência de, por vezes, o sacrifício económico resultante
do pagamento do imposto ser suportado por pessoa diversa daquela a quem é juridicamente exigível.
Ao Direito Fiscal, geralmente, não interessa saber quem realiza o pagamento da prestação
tributária. Menos lhe interessará se o peso económico do imposto acaba por recair sobre um terceiro. E
isso acontece, com frequência, através do fenómeno da repercussão tributária, na base do qual já se tem
até tentado distinguir os impostos indirectos, que seriam repercutíveis, dos directos, que não o seriam. A
repercussão pode respeitar tanto a impostos indirectos como a directos; e, por ela, o contribuinte de
Direito transfere para outrem (contribuinte de facto) o sacrifício económico do imposto.
Assim, por exemplo, um comerciante, ou um industrial, procurando evitar os encargos
resultantes de um aumento da taxa de um imposto, transferirá para os consumidores, através do aumento
de preço dos produtos vendidos, ou para os fornecedores, através de uma redução de preço de matérias-
primas, de bens instrumentais, e outros, o sacrifício tributário efectivo. Os consumidores, ou os
fornecedores, serão, em tais casos, os contribuintes de facto, em consequência de uma repercussão
descendente, ou de uma repercussão ascendente.
Esta figura do contribuinte de facto não parece ter relevância jurídica, embora alguns autores,
entre eles Vanoni, entendam que sim; mas oferece grande interesse aos níveis da ciência das finanças, da
política financeira, e até da economia em geral.
Poderá, talvez, o intérprete da lei tributária desconhecer o contribuinte de facto; mas o legislador
fiscal deve ter bem presente a respectiva figura, procurando sempre prever em que plano vão sentir-se os
efeitos económicos dos impostos criados, ou remodelados. Acontece até, com frequência, que a situação
de contribuinte de facto não é meramente ocasional, tendo sido visada pelo legislador. Conhecendo as
possibilidades de repercussão do imposto, a lei fiscal tributa pessoas diversas daquelas que procura
atingir, sabendo previamente que elas não deixarão de libertar-se do encargo, transferindo-o no sentido
desejado. Mas, mesmo nesses casos, a figura do contribuinte de facto, de indiscutível relevo económico-
financeiro, não oferece relevo jurídico.
Já se pretendeu na doutrina portuguesa reservar a expressão “contribuinte”, pura e simplesmente,
para a figura que designámos por contribuinte de facto. Mas a inovação terminológica não parece
aceitável, por não se conformar nem com a linguagem legislativa, nem com a mais corrente e usual, que
designam por contribuinte o devedor tributário, o sujeito passivo da obrigação de imposto. Esta parece
ser a preferível. Especialmente depois de o CPT, de 1991, tendo definido a personalidade tributária como
“susceptibilidade de ser sujeito de relações jurídicas tributárias” (art. 4º), definir também os “sujeitos
passivos das relações tributárias” como “os contribuintes, incluindo os substitutos e responsáveis, bem
como outras pessoas sobre as quais recaiam obrigações daquela natureza” (art. 10). Em suma, é
contribuinte, é sujeito passivo, aquele que se acha juridicamente vinculado.
Tem-se procurado distinguir o sujeito passivo - titular de uma situação jurídico-tributária passiva
- do contribuinte - pessoa em relação à qual se verificaram os pressupostos tributários - e do devedor de
imposto - aquele sobre quem recai o dever de prestar. Mas não parece que tal destrinça se justifique. A
pessoa relativamente à qual se verificaram os pressupostos tributários, ou o facto tributário, é
necessariamente titular de uma situação jurídico-tributária. E aquele sobre quem recai o dever de prestar
não pode deixar de ser também uma pessoa relativamente à qual se verificaram os pressupostos
tributários, com cuja verificação essa mesma pessoa passou a ser titular de uma situação jurídico-
tributária.
Não deverá pretender-se que o substituto de imposto, ou que o responsável tributário sejam
devedores, mas não sejam contribuintes, nem sujeitos passivos, da relação de imposto. O substituto, como
o responsável, como o devedor solidário, como o sucessor devem o imposto, são devedores, porque são
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Direito Fiscal I
contribuintes, porque são sujeitos passivos da relação jurídica de imposto (art. 10 CPT). Apenas não são
sujeitos passivos, nem contribuintes, nem devedores originários.
O sujeito tributário passivo pode sê-lo por um débito originário ou por um débito não
originário. O débito do sujeito tributário passivo é normalmente originário. Alguém auferiu um
rendimento, recebeu um património, ou praticou um acto de que se presume certo benefício. Por essa
razão constituiu-se um débito tributário, que é seu próprio, originário, pois a presunção legal de
benefício, de utilidade económica definitiva, respeita a essa pessoa.
Contudo, as leis de impostos mostram particulares cuidados em acautelar, e facilitar, a realização
dos créditos tributários. E um dos meios de que se servem para o fazer consiste na extensão do dever de
prestar a entidades que não são originários devedores. Porque em relação a elas se não estabelece uma
presunção de benefício, ou de beneficio definitivo, ou de beneficio total.
Alguns autores referem-se a obrigados por débitos tributários próprios e obrigados por débitos
tributários alheios. O CPT também se refere a “responsabilidade fiscal por dividas de outrem” (art. 11).
Mas a destrinça não parece inteiramente correcta. Desde que um preceito legal impõe a alguém,
verificadas certas condições, o pagamento de uma prestação tributária, o débito é seu próprio. Embora
possa não ser originariamente seu.
Também quanto ao carácter originário do débito tributário importa ter presente que aquele
carácter não coincide sempre e necessariamente com o desenvolvimento normal da relação jurídica de
imposto. Não serão sujeitos passivos não originários apenas as pessoas obrigadas a prestar em
consequência do desenvolvimento patológico daquela relação.
Há casos em que a entidade obrigada a pagar na base de um desenvolvimento normal da relação
de imposto é um sujeito passivo não originário. Assim acontece com os substitutos de imposto, chamados
a pagar a prestação tributária normalmente, isto é, na base de um desenvolvimento normal da relação
jurídica de imposto. Mesmo assim, os substitutos de imposto são devedores, sujeitos passivos, não
originários; porquanto em relação a eles não se estabelece uma presunção de benefício que justifique a
incidência tributária.
A contribuição autárquica incide sobre o proprietário, ou sobre o usufrutuário, na base de uma
presunção de rendimento económico, de benefício auferido. O imposto do Selo incide sobre um
anunciante porque se presume que do anúncio resulta para ele um beneficio. Os débitos tributários
assentes na presunção de um benefício auferido são débitos originários. Como originários serão também
os sujeitos tributários passivos relativamente aos quais se estabeleceu a presunção de beneficio.
Mas o legislador fiscal, procurando acautelar os créditos tributários, e simplificar as respectivas
operações de lançamento, liquidação e cobrança, criou processos que permitem exigir o pagamento da
prestação tributária a pessoas relativamente as quais se não pode estabelecer qualquer presunção de
benefício auferido. Assim, se o antigo proprietário de um imóvel não tiver pago um imposto que devia,
em razão da sua propriedade, essa prestação tributária poderá ser exigida ao novo proprietário do mesmo
imóvel. Se o obrigado ao pagamento de taxa militar não realizasse a respectiva prestação, esta poderia ser
exigida aos seus familiares. Nestes dois casos, apontados como exemplos, o dever de prestar do obrigado
não originário situa-se numa fase de desenvolvimento patológico da relação de imposto. O obrigado não
originário é chamado a prestar porque o obrigado originário não prestou. Mas noutros casos não.
Muitas vezes o legislador fiscal estabelece para o obrigado não originário o dever de prestar
logo na fase de desenvolvimento normal da relação de imposto. Assim, a entidade patronal paga a
antecipação de IRS baseada nos salários dos seus trabalhadores, antecipação essa retida na fonte,
descontada, previamente, no montante global dos salários. A presunção de beneficio que justifica a
incidência estabelece-a a lei fiscal em relação aos trabalhadores. As entidades patronais que se lhes
substituem são utilizadas pelo Fisco para facilitar a cobrança do imposto. São sujeitos passivos não
originários, embora os respectivos deveres de prestar se situem num plano normal, não patológico, do
desenvolvimento das relações jurídicas.
Ex.: Soares Martinez - Um trabalhador tem um salário de 100 contos. A empresa retêm na
fonte (ou, em termos jurídicos, substituição fiscal) 15%. Deste modo, o trabalhador só recebe 85 contos
(100-15%). A empresa é um sujeito passivo não originário. O Dr. Brás Teixeira não faz qualquer
ligação entre estes aspectos e considera a empresa sujeito passivo originário.
As situações de débitos tributários não originários correspondem a quatro tipos diferenciados:
solidariedade, sucessão, responsabilidade e substituição.
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Direito Fiscal I
i) A Solidariedade Fiscal:
a) Conjunção: quando a cada um dos sujeitos corresponde apenas uma parte ou fracção do
débito tributário comum estamos perante uma situação de conjunção ou parciaridade passiva. Cada
devedor tributário responde apenas pela sua parte e só essa lhe pode ser exigida. Esta é a regra geral e está
prevista no art. 241 CPT.
b) Solidariedade passiva: o sujeito activo pode exigir a qualquer dos devedores tributários a
totalidade da prestação tributária comum, nenhum deles podendo socorrer-se do instituto do benefício da
divisão (arts. 521 e ss CC).
Cada um dos devedores está legalmente obrigado a realizar por si à totalidade do débito
tributário que impende sobre si e sobre os demais co-devedores, cabendo-lhe exigir aos demais devedores
a parte que a mais pagou como direito de regresso.
Pela forma como se estrutura, a solidariedade passiva é a garantia mais forte da obrigação fiscal,
uma vez que diferentes patrimónios respondem pelo cumprimento integral da prestação de imposto. No
âmbito do Direito Fiscal português, o regime da solidariedade passiva assume um carácter excepcional.
Dentro da solidariedade fiscal, é ainda preciso distinguir entre sucessão tributária e substituição
tributária.
Em geral, a posição do sujeito passivo é ocupada, desde o início até ao fim, sempre e unicamente
por uma mesma pessoa ou pessoas, que se encontram na situação a que a lei tributária atribui eficácia
constitutiva.
Porém, casos há em que a lei fiscal permite que no decurso da relação fiscal tal posição de
sujeito passivo passe a ser ocupado por uma terceira pessoa, alheia à relação (sucessão tributária).
Diferentemente, há casos em que a lei fiscal de imposto atribui, desde o início, a posição de
sujeito passivo a pessoas ou entidades diferentes daquelas em relação às quais se verificam os
pressupostos da relação jurídico-tributária (substituição tributária).
Para se falar em sucessão fiscal é necessário que o sucessor venha a ocupar, na mesma relação
jurídica, o lugar do sucedido (do de cujus). É necessário que, no momento em que se verifica a sucessão,
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Direito Fiscal I
a relação fiscal já exista e ainda não se tenha extinguido, passando o lugar de sujeito passivo a ser
ocupado por entidade diversa do devedor originário.
Quanto à forma, a sucessão pode, em geral, realizar-se inter vivos, mortis causa, determinada por
lei ou determinada por um acto de autonomia privada.
No Direito Fiscal, a sucessão fiscal só é possível por morte, dado o carácter da indisponibilidade
da obrigação tributária, que decorre do facto das obrigações fiscais terem natureza de Direito Público.
➥ cfr. arts. 239 e 240 CPT
No que se refere ao âmbito da sucessão fiscal, há que distinguir entre dívidas fiscais e penas
fiscais.
O sucessor não pode ser responsabilizado por quaisquer penas, mesmo pecuniárias, que
correspondam a transgressões fiscais cometidas pelo “de cujus”. Têm aqui aplicação plena as normas
contidas no art. 30/3 CRP e nos arts. 125 e 127 CPenal de 1982, revisto em 1995.
A não ser que se trate de multas em que a respectiva sentença transitou em julgado em vida do de
cujus, não há qualquer transmissibilidade de penas no âmbito do Direito Fiscal.
Existem dois casos em que o legatário pode vir a assumir a posição de sucessor fiscal.
O 1º caso surge quando a herança tiver sido distribuída na totalidade por legados. Assim, por
aplicação do art. 2177 CC, deve entender-se que os encargos tributários da herança serão suportados por
todos os legatários, na proporção dos seus legados, excepto se o testador houver disposto de outro modo.
O 2º caso surge quando a parte da herança atribuída aos herdeiros é insuficiente para o integral
pagamento das dívidas fiscais do de cujus, caso em que se deverá exigir o restante aos legatários, na
proporção dos seus legados, mas só depois de executada a parte da herança atribuída aos herdeiros.
iii) A Substituição Fiscal:
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Direito Fiscal I
garantem-se melhor os créditos tributários pela atribuição do dever a determinadas pessoas ou entidades –
os substitutos – cuja solvência parece mais facilmente assegurada.
O substituto fica, pois, encarregado pela lei (única fonte possível) de realizar a cobrança do
imposto junto do substituído e de proceder à respectiva à Administração Fiscal (Fisco).
Quanto as elementos caracterizadores da substituição fiscal há polémicas doutrinais a analisar.
O 1º elemento é o conceito de devedor originário.
Soares Martinez defende que a substituição fiscal é uma situação característica da
responsabilidade tributária passiva, mediante a qual o substituto assume perante o sujeito activo da
relação tributária uma posição de devedor tributário, satisfazendo um débito que é seu próprio, mas que
não é originário, por não corresponder a uma posição de benefício económico, a qual respeita ao
substituído (substituto – devedor não originário).
Brás Teixeira , na sequência da definição que dá de devedor originário, como pessoa ou
entidade que ocupa a posição de sujeito passivo ou devedor do imposto, sendo a que a lei vinculou aos
rendimentos, entende que na figura da substituição fiscal, o único obrigado originário é o substituto, só
podendo o substituído ser chamado à execução como garante na falta de bens do substituto e no caso em
que as importâncias que ao substituído tiverem sido deduzidos pelo substituto sejam de montante inferior
ao legalmente devido. O substituto é, pois, devedor originário.
O 2º elemento tem a ver com o direito de regresso ou retenção, que a substituição normalmente
determina e que, em geral, pode ser obrigatória ou facultativa. No entanto, face ao actual Direito Fiscal
em vigor, o Direito de Retenção é obrigatório, pois a falta de entrega da prestação pelo substituto constitui
uma infracção fiscal, desde que estivesse expressamente prevista a obrigatoriedade do proceder a essa
mesma entrega (art. 29 RJIFNA). Há, porém, casos em que o direito de retenção é facultativo (art. 7º/3
CSISA).
Por fim, para generalidade da Doutrina Portuguesa, o direito de retenção tem uma verdadeira
natureza civil e não tributária.
Concluindo, a substituição fiscal é o meio através do qual a Administração Fiscal rápida e
seguramente aufere as receitas fiscais.
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Direito Fiscal I
Soares Martinez não o considera como tal, mas não lhe atribui nome específico, diz-nos apenas que é
uma figura característica do Direito Fiscal.
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Direito Fiscal I
posição de igualdade; porquanto tais actividades beneficiam também muitas vezes de subsídios e
privilégios vários que falseiam as condições de concorrência. Em qualquer caso, o problema é de política
financeira. E, do ponto de vista jurídico, o argumento mais impressionante parece adverso à tributação
das actividades económico-privadas do Estado nos casos em que o credor do imposto seja também o
próprio Estado. Com efeito, em tais casos, poderá entender-se que o vínculo jurídico-tributário se
extinguiria pela confusão do crédito e do débito respectivos.
No entanto, a circunstância de frequentemente as leis fiscais estabelecerem isenções em favor do
Estado leva a concluir que o princípio geral é o da sujeição aos impostos, mesmo estaduais. Se as leis de
impostos declaram o Estado isento; quando o não fizerem será admissível a tributação. A menos que se
conclua no sentido de que a generalidade da concessão de isenções, estabelecidas para prevenir a hipótese
de desnecessárias operações de lançamento, liquidação e cobrança, traduza um princípio geral de
isenção, ou mesmo de não incidência tributária, quanto ao Estado e em relação aos seus próprios
impostos.
Por vezes, porém, os termos em que são estabelecidas as isenções em favor do Estado não
tornam possível este entendimento, pela especificação das circunstâncias que condicionam essas isenções,
da qual se poderá concluir, “a contrario sensu”, que, não se verificando tais condições, o Estado não
estará isento. É este um dos problemas que conviria solucionar definitivamente através dos preceitos de
uma lei tributaria de caracter geral. É de notar que o Estado não se acha isento do imposto sobre o valor
acrescentado, cujos diplomas disciplinadores apenas estabeleceram isenções de carácter objectivo.
Afigura-se perfeitamente admissível que o Estado seja contribuinte em relação a outras
entidades públicas, autarquias territoriais ou institutos públicos. Essa é a solução generalizada na
doutrina, não obstante a oposição de alguns autores.
Também as outras entidades públicas não deverão ficar sujeitas a impostos de que sejam elas
próprias beneficiárias, nada obstando, no entanto, a que se lhes atribua personalidade tributária passiva
em relação ao Estado ou a outras entidades públicas, quando se tratar de actividades de carácter
económico-privado, semelhantes às das empresas privadas, em conformidade com o princípio da
similitude.
O princípio geral de possibilidade de tributação das entidades públicas não oferecerá dúvidas.
Mas as leis fiscais usam, geralmente, de cautelas no sentido de isentar o Estado, não apenas dos impostos
estaduais mas também, com frequência, de outros. E também muitas vezes isentam entidades públicas
menores. Assim, não apenas o Estado mas também as autarquias locais não se acham sujeitos à
contribuição autárquica (C. da Contribuição Autárquica, art. 9º), à sisa e ao imposto sucessório (CSISA e
do Imposto sobre as Sucessões e Doações, art. 13), etc.
A natureza colectiva de uma pessoa não tem obstado a que seja tributada. E, assim, não oferece
dúvidas que tanto as entidades públicas como as empresas públicas, sob forma pública ou sob forma
privada, como as associações e fundações, como as sociedades comerciais, possam ser tributadas. Desde
que se situem no respectivo plano de incidência. E dele não sejam removidas por qualquer isenção.
Mas põe-se o problema de saber se, nalguns casos, o fenómeno associativo determinará uma
individualidade diversa da dos sócios. A questão é suscitada, especialmente, em relação às sociedades
civis e às sociedades comerciais irregulares. A situação tributária destas últimas já foi aflorada como
projecção de maior relevo das particularidades da atribuição de personalidade tributária passiva.
50
Direito Fiscal I
Quanto às sociedades irregulares, segundo o art. 107 do Código Comercial, “ter-se-ão por não
existentes as sociedades com um fim comercial que não se constituíram nos termos e segundo os trâmites
indicados neste Código, ficando todos quantos em nome delas contratarem obrigados pelos respectivos
actos, pessoal, ilimitada e solidariamente”. E o Código das Sociedades Comerciais, de 1986, tendo
reconhecido personalidade às sociedades apenas a partir do seu registo definitivo, afirmou a
responsabilidade solidária e ilimitada pelas obrigações contraídas daqueles que tenham criado uma “falsa
aparência” de contrato de sociedade (arts. 5º e 36). Em face de disposições semelhantes do Direito
Privado, têm diversas leis tributárias afirmado que, não obstante tal inexistência, as sociedades
irregulares, assim como outras unidades económicas, são susceptíveis de tributação.
E é também a orientação adoptada, no Direito Tributário português, através da alínea b) do nº 1
do art. 2º do CIRC. Aliás, já antes, no silêncio da lei sobre tal matéria, a doutrina e a jurisprudência se
tinham geralmente pronunciado no sentido da sujeição tributária das sociedades irregulares.
Apenas parecerá objectável a forma usada, por via legislativa - tributação de “entidades
desprovidas de personalidade jurídica”. A lógica da construção jurídica aconselhará uma rectificação
formal. O legislador reconheceu personalidade jurídico-tributária a entidades que dela não gozam à face
dos critérios adoptados por ramos de Direito alheios ao Fiscal. É, aliás, esse entendimento o que melhor
se ajusta ao que se contém no art. 4º CPT, como ao que já se continha no art. 10 do Código de Processo
das Contribuições e Impostos, de 1963.
De harmonia com tal orientação, os impostos originados em actividades praticadas em nome das
sociedades irregulares são lançados e liquidados às próprias sociedades irregulares e não àqueles que
realizaram os actos respectivos.
As sociedades irregulares gozam de autonomia patrimonial e de personalidade judiciária, nos
termos do art. 8º do Código de Processo Civil, aplicável, subsidiariamente, ao processo tributário, não
podendo opor, quando demandadas, a irregularidade da sua construção. E, mesmo sem querer saber se a
personalidade judiciária tem eficácia substantiva, pela definição judicial de poderes e deveres
substantivos, o reconhecimento daquela personalidade às sociedades irregulares, com todas as
consequências que envolve, aliada ao movimento generalizado no sentido da sua personalização no plano
fiscal, e à preocupação de defesa dos interesses do Fisco, quanto à sua participação na riqueza produzida,
tornam difícil a defesa da tese avessa à tributação das sociedades irregulares.
Não são convincentes as razões já aduzidas no sentido de que, à face do art. 980 do Código Civil,
as sociedades comercias irregulares teriam a natureza de sociedades civis, não sendo, consequentemente,
tributadas. A questão reclamará, por certo, tratamento legislativo adequado numa lei geral de impostos.
Mas não se descortina com facilidade uma solução legislativa Contrária à tributação das sociedades
irregulares. Porquanto uma solução diversa do problema abriria vias a práticas orientadas no sentido de
evitar a incidência, ou de protelar o pagamento de impostos, sobre actividades cuja tributação é
amplamente justificada.
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Direito Fiscal I
de Direito Privado se mostra geralmente menos adequado às exigências da tributação do que o critério da
individualidade económica.
O Direito Fiscal português orientou-se por forma a tributar tanto os agrupamentos como as
entidades agrupadas em contribuição industrial e em imposto de capitais, embora permitindo, como
privilégio de caixa a dedução de alguns rendimentos, a fim de evitar, ou reduzir, duplas tributações.
O CIRC, na sequência do regime do DL 414/87, de 31 de Dezembro, continua a reflectir, quanto
ao problema, a preocupação de fazer assentar a incidência em situações económicas reais. E, por isso,
além da dedução de lucros distribuídos (art. 45), admitiu que os lucros tributáveis dos grupos de
sociedades sejam calculados em conjunto, para todas as empresas agrupadas, mediante a consolidação de
balanços. Mas fez depender essa tributação global de diversos requisitos, que serão apreciados pelo
Ministro das Finanças, na base de solicitação da sociedade dominante (art. 59).
Semelhante solução oferece todos os inconvenientes do casuísmo, mas parece justificada pela
diversidade de situações reais que se deparam e pela previsão razoável dos abusos aos quais se prestaria,
em tal matéria, uma solução geral uniforme.
O Direito Fiscal conforma-se, geralmente, com as normas de Direito Civil quanto à capacidade
tributária passiva de exercício. Não cria incapacidades de exercício que valham só para as relações
tributárias. Limita-se a verificar se as manifestações de vontade produzidas através do desenvolvimento
de um vinculo jurídico de imposto dimanam de uma pessoa que não esteja ferida por qualquer das
incapacidades do Direito Civil.
Assim, o art. 5º CPT comete aos representantes dos incapazes, designados de acordo com a lei
civil, o cumprimento dos deveres fiscais dos representados e o exercício dos respectivos direitos. A essa
representação correspondem, necessariamente, responsabilidades, nos termos gerais de Direito. E ainda as
resultantes da eventual prática de infracções fiscais, sendo as multas e as coimas por elas aplicadas
devidas pelo representante, e não pelo representado.
Era esta já há muito a doutrina defendida no plano jurisprudencial, que acabou por receber
consagração legislativa no art. 5º CPT. Quanto à prestação tributária, só os bens do representado
respondem pelo respectivo pagamento; mas quanto a multas, e outros encargos resultantes de faltas
cometidas, que não podem ser imputáveis ao representado, em razão da sua incapacidade, é perfeitamente
admissível a responsabilidade pessoal do representante (cfr. RJIFNA, aprovado pelo DL 20-A/90, de 15
de Janeiro, arts. 6º e 22).
São de natureza muito diversa as pessoas colectivas que podem estar sujeitas ao cumprimento de
deveres tributários. A cada uma delas corresponderão, segundo essa natureza e a sua forma de
constituição, um ou mais órgãos próprios. Também aqui o Direito Fiscal se conforma com as normas de
Direito Civil, Direito Comercial e Direito Administrativo aplicáveis.
O órgão competente para manifestar a vontade de uma pessoa colectiva no desenvolvimento de
outras relações de Direito será também aquele que a legislação tributária como tal reconhece no plano das
relações jurídico-fiscais. Serão órgãos das entidades de Direito Público os que as leis administrativas
assim admitirem; serão órgãos das pessoas colectivas privadas os seus gerentes, directores,
administradores, gestores, consoante o que for determinado pelos respectivos pactos sociais ou outros
instrumentos constitutivos.
Suscita naturais dúvidas a manifestação de vontade daquelas entidades cuja personalidade
jurídica se acha limitada às relações tributárias. Não definindo o Direito Fiscal os órgãos das pessoas
colectivas, e não tendo aquelas entidades existência para os outros ramos de Direito, torna-se difícil
admitir que manifestem a sua vontade através de órgãos que, aliás, nem sequer podem estar legalmente
constituídos. Mas, admitida a personalidade tributária de entidades que não oferecem condições de
personalização para as outras disciplinas jurídicas, terá o Direito Fiscal de admitir também como válida a
52
Direito Fiscal I
manifestação de vontade de órgãos, mesmo irregularmente constituídos, que desenvolvam uma actividade
no sentido da defesa de interesses concentrados numa unidade económica que as leis tributárias tenham
personalizado.
Quem se achar na plenitude da sua capacidade jurídica pode realizar pessoalmente os actos que
as leis admitem em relação aos sujeitos tributários passivos, desde que ocupe a respectiva posição.
Designadamente, prestar declarações, impugnar, reclamar do lançamento de contribuições, apresentar
requerimentos vários. Mas pode também o sujeito tributário passivo, na plenitude da sua capacidade de
exercício, confiar a outrem a realização de tais actos, fazer-se representar. Não se trata agora de
representação legal, mas de representação voluntária, através do mandato tributário, isto é, do mandato
conferido para a prática de actos que se inserem no desenvolvimento de uma relação jurídico-tributária.
O CPT, através do seu art. 6º, seguindo o teor do anterior Código de Processo das Contribuições
e Impostos (art. 9º), admite que os interessados, ou os seus representantes legais, confiram mandato, “sob
a forma prevista na lei, para a prática de actos tributários que não sejam de natureza pessoal”. A “lei” que
há-de prescrever a forma do mandato é a lei civil, devendo o referido mandato, para efeitos tributários,
constar de procuração com poderes especiais para o efeito, nos termos do Código do Notariado.
Assim, podem os sujeitos tributários passivos, ou “terceiros”, desde que legitimamente
interessados num processo tributário de qualquer natureza, fazer-se representar através de mandato, salvo
para a prática de actos de natureza pessoal. É o caso dos “esclarecimentos” em processos tributários
graciosos, também designados por processos administrativos tributários.
Pelo pagamento das prestações tributárias responde exclusivamente o património do
representado, podendo este fazer-se indemnizar pelo representante, nos termos comuns, por danos
emergentes de mora no pagamento, se esta for imputável ao mandatário. Mas pelas multas e pelas coimas
aplicadas em razão de infracções fiscais é responsável o representante, sem prejuízo da responsabilidade
solidária do representado (vd. RJIFNA, art. 6º).
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Direito Fiscal I
Este conceito tem sido usado pelas convenções internacionais sobre dupla tributação. E também
o é pelo CIRC (arts. 4º, 49, 50 e 95), para o qual estabelecimento estável se considera qualquer instalação
fixa, ou representação permanente, através das quais se exerça uma actividade de natureza comercial,
industrial ou agrícola (art. 4º, nº 5).
Ainda que o contribuinte possa estar ligado, pela multiplicidade dos seus interesses, a mais de
uma circunscrição fiscal, as legislações tributárias modernas tendem a fixá-lo a um único centro, que é o
do seu domicílio fiscal; e, por vezes, a um registo central, a que poderá corresponder um número de
contribuinte, que acompanha este em todas as suas relações fiscais e deverá ser invocado em
diversíssimas situações, para efeitos de fiscalização tributária de actividades desenvolvidas. Assim
aconteceu em Portugal, onde o DL nº 463/79, de 30 de Novembro, estabeleceu um registo central e um
numero para cada contribuinte.
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Direito Fiscal I
b) As isenções objectivas:
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Direito Fiscal I
as isenções subjectivas, como pressuposto negativo da tributação. Tendo presente quanto sobre as
isenções subjectivas foi referido, cabe agora considerar as isenções objectivas, concedidas em atenção à
matéria colectável e não em atenção às pessoas.
Para além dos fins de protecção de actividades, de cumprimento de regras internacionais, de
protecção de grupos sociais, fins que umas vezes são visados através de isenções subjectivas e outras
através de isenções objectivas, o Estado soberano muitas vezes concede estas por reconhecer a
inexistência de matéria colectável, como no caso dos terrenos estéreis, ou a sua exiguidade. Outras vezes,
concede-as para incentivar actividades. É o caso das isenções de prédios destinados a habitação, das mais-
valias de acções, dos juros de depósitos a prazo em moeda estrangeira, etc. (vd. Estatuto dos Benefícios
Fiscais, aprovado pelo DL nº 215/89, de 1 de Julho, arts. 34, 40-A, 52).
Acontece, por vezes, tornar-se difícil qualificar uma isenção como subjectiva ou objectiva,
quando ela é concedida a determinadas pessoas que exploram certas actividades. O critério de destrinça
deverá assentar nas razões pelas quais a isenção foi estabelecida.
Também as isenções objectivas podem ser temporárias ou absolutas, automáticas ou não
automáticas. Será mais difícil deparar com isenções objectivas de carácter individual; mas é possível
admitir que o legislador fiscal estabeleça isenções em relação a uma coisa certa e determinada, como,
p.ex., um imóvel de interesse artístico, ou histórico, uma actividade produtiva, com independência de qual
seja a pessoa que o possuir, ou que a explore.
É de notar que muitas das considerações expostas quanto às isenções, quer subjectivas quer
objectivas, são aplicáveis aos chamados benefícios fiscais que não consistam em isenções, como acontece
com as reduções de taxas de imposto e de matéria colectável. Nos outros casos, os benefícios fiscais têm
a natureza de isenções, embora parciais ou temporárias.
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Direito Fiscal I
Tal como na teoria geral da relação jurídica, também aqui cumprira distinguir o objecto
imediato da relação de imposto do seu objecto mediato. Aquele constituído pelo próprio conteúdo do
vínculo, pelos direitos e deveres que nele se integram; este correspondendo à prestação.
O objecto imediato da relação de imposto, também designado por conteúdo, é, pois, constituído
pelos direitos e deveres nessa relação incluídos. E como cada direito de um dos sujeitos encontra
contrapartida num dever do outro, bastara indicar os direitos e os deveres correspondentes ao sujeito
activo, ou ao sujeito passivo, para se fixar o conteúdo da relação de imposto. Indicar-se-ão, assim, os
deveres e os direitos do sujeito passivo, do contribuinte.
O dever fundamental do sujeito tributário passivo é o de realizar a prestação de imposto, que
corresponde ao objecto mediato da relação. Mas, além deste, deparamos com deveres acessórios que,
quando impendem sobre a pessoa à qual é também exigível a prestação de imposto, parece preferível
incluir na relação jurídico-tributária, à semelhança com o que acontece quanto a outros deveres acessórios
incluídos em obrigações diversas das tributarias. Alguns desses deveres acessórios são estabelecidos a
fim de permitir ou facilitar o lançamento e a liquidação dos impostos (ex.: o dever de prestar
declarações); outros têm em vista prevenir e reprimir fraudes fiscais (ex. o dever de suportar exames à
escrita comercial e outras fiscalizações).
Quanto aos direitos do contribuinte, afirmando-se correntemente que a relação jurídica de
imposto é unilateral, respeitando essa unilateralidade para uns autores apenas à origem mas para outros
também ao conteúdo, poderá parecer duvidoso que naquela relação se incluam direitos do sujeito passivo.
Como exemplos desses direitos refere Tesoro a restituição de tributos indevidos. o direito às isenções e o
direito de recurso. A qualificação poderá suscitar objecções. Se determinada pessoa tem direito a uma
restituição de um tributo indevido será porque, afinal, não era sujeito passivo da relação de imposto em
causa. Se beneficia de uma isenção é porque também não é contribuinte.
Se recorre de qualquer acto da Administração fiscal, o direito respectivo é de carácter geral,
decorrendo do princípio comum de petição e recurso (arts. 52 e 268 CRP). No entanto, se se tratar não da
restituição de um tributo indevido, mas sim da restituição de uma colecta mal lançada, ou mal liquidada,
já poderá admitir-se que seja o contribuinte, o sujeito passivo, como tal, que tem direito a essa restituição.
Também poderá entender-se que a isenção, ao menos quando parcial, não exclui a qualidade de
contribuinte de quem dela beneficia. Aliás, aos direitos do sujeito passivo indicados por Tesoro poderá
acrescentar-se o de ser informado pela Administração fiscal sobre a sua própria situação tributária.
Se a todo o cidadão cabe o direito de ser esclarecido pelo governo e outras autoridades acerca da
gestão dos assuntos públicos (art. 48, nº 2 CRP) e o de tomar conhecimento e exigir a rectificação e a
actualização dos dados que a seu respeito constarem de registos informáticos (art. 35, nº 1), por maioria
de razão tem de reconhecer-se ao contribuinte o direito de ser informado sobre elementos de que depende
a defesa do seu património, nos termos do art. 268, nº 1 CRP. Aliás, tal direito achava-se expressamente
reconhecido, desde 1963, pelos preceitos do art. 14 do Código de Processo das Contribuições e Impostos.
E o actual CPT enumera, como direitos dos contribuintes, os direitos à informação, à fundamentação dos
actos tributários, à notificação dos mesmos actos, os direitos de reclamar, de impugnar, de opor, de ser
ouvido, de haver juros indemnizatórios e de lhes serem reduzidas as coimas, em certas circunstâncias
(arts. 19 ss). O Estatuto dos Benefícios Fiscais refere-se ao direito a esses benefícios (art. 11). O DL nº
492/88, de 30 de Dezembro, consigna um direito ao reembolso (art. 19). Mas, sem que ofereça dúvidas o
interesse pragmático de tais declarações de direitos dos contribuintes, sobretudo nos quadros de
ordenamentos jurídicos que pretendem assentar a realização da justiça no respeito de direitos subjectivos,
e com as reservas suscitadas por todas as declarações de direitos, pôr-se-á em dúvida - isso sim - que os
referidos direitos, ou todos, ou a maioria deles, caibam na esfera do objecto da relação de imposto.
O objecto mediato da relação de. imposto é uma conduta, uma prestação, positiva, .de dare, "de
facere", ou negativa, "de non: facere"..
Entende a generalidade da doutrina que a prestação tributaria principal é sempre "de dare", só se
apresentando como "de facere" ou "de 'non facere" as prestações acessórias.
Poderia pôr-se o problema de saber se não haverá prestações tributárias principais "de facere",
dando-se como exemplo a prestação de imposto do selo, quando consiste na inutilização de uma
estampilha fiscal.
Poderá assentar-se em que as prestações tributárias principais são "de dare".
Mas, em relação às prestações acessórias, já se admitirá, sem reservas, que possam ser "de
facere" as prestações de declarações, de apresentação de documentos, de estabelecimento de vedações
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Direito Fiscal I
A prestação tributária pode ser divisível ou não divisível, consoante o legislador permite ou não
que ela se pague por fracções, também designadas por prestações.
Algumas vezes a prestação tributária é fixa; e, por isso, conhecida antecipadamente, com
anterioridade a qualquer operação de lançamento.
Os impostos portugueses, na generalidade, porém, são de prestação variável, dependente do
montante da matéria colectável e da taxa tributária que lhes seja aplicável.
As prestações tributárias acessórias, quer "de facere" quer "de non facere", geralmente não são
fungíveis, pois pressupõem uma conduta pessoal do contribuinte. Põe-se o problema de saber, porém, se
as prestações tributarias "de dare" serão necessariamente fungíveis. Num plano prático poderá entender-se
que sim. Mesmo que se discuta se as prestações tributárias principais são ou não necessariamente
pecuniárias, em cujo caso a fungibilidade será indiscutível, é difícil de admitir o pagamento de impostos
em bens não fungíveis, até na hipótese de esse pagamento se fazer em géneros. Ainda quando se admite a
dação em cumprimento de bens em si mesmos não fungíveis (obras de arte, títulos de crédito), esses bens
são recebidos pelo Fisco em razão do valor de troca que lhes é atribuído. No plano teórico, no entanto, é
admissível considerar o pagamento de impostos através da prestação de serviços, não fungíveis; embora
essa admissibilidade possa suscitar dificuldades de ordem vária.
Distinguem-se, frequentemente, a prestação tributária principal, resultante da aplicação da taxa
básica do imposto, os adicionais e os adicionamentos. Mas importará observar que a prestação global,
resultante da aplicação da taxa básica, dos adicionais e dos adicionamentos, é, em regra, incindível.
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Direito Fiscal I
36. Cumprimento:
b) prazo do pagamento:
No caso dos impostos directos, a modalidade normal designa-se “cobrança à boca do cofre”
(designação histórica). Nesta fase, o pagamento é efectuado dentro do prazo normal (do cumprimento
voluntário), sem que lhe sejam acrescidos juros de mora ou compensatórios.
Não sendo pago dentro desse prazo normal, de cumprimento voluntário, surge a fase da
cobrança voluntária (na expressão do Dr. Soares Martinez), ou com juros de mora. Ou seja, o
pagamento já é efectuado com juros de mora.
Por fim, vem a fase da cobrança coerciva, que é feita depois de se ter iniciado a execução fiscal,
tendo já sido extraída a certidão de dívida de imposto (ou relaxe).
Podemos apontar duas situações especiais: 1º, temos o imposto municipal de SISA, que é pago
antes da compra de um imóvel (o contribuinte dirige-se à Repartição de Finanças e afirma que vai
adquirir um imóvel); depois, temos o imposto sobre sucessões e doações, cujo pagamento se realiza num
momento posterior ao facto originário da tributação.
Quanto aos impostos indirectos, p.ex. o IVA, são pagos no momento da compra do bem.
A dação em cumprimento, dação em pagamento, ou "datio in solutum", que, tal como o próprio
cumprimento extingue imediatamente a obrigação, distinguindo-se, assim, da "datio pro solvendo", ou
"dação em função de pagamento", é admitida, por vezes, no Direito Fiscal português.
Um dos casos acha-se contemplado no art. 129-A do CSISA e do Imposto sobre as Sucessões e
Doações. Nos termos desse artigo, pode o Ministro das Finanças autorizar a entrega ao Estado de bens de
uma herança, pelos valores que serviram de base à liquidação do imposto sucessório, em substituição do
cumprimento da respectiva dívida.
A partir de 1984, foi permitida, no Direito português, a extinção de qualquer obrigação tributária
por dação em cumprimento, a qual será oferecida, e requerida, ao Ministro das Finanças, na fase de
cobrança coerciva, de execução fiscal (DL nº 52/84, de 15 de Fevereiro; CPT de 1991, arts. 273 e 284).
Não deverão ser entendidas como casos de dação em cumprimento as formas de pagamento por
cheque, por vale de correio, ou por transferência de conta. Pela liquidez imediata que aquelas formas
envolvem, elas não correspondem à figura da dação em cumprimento, a qual, para mais, implica a
prestação ao credor de uma coisa diversa da inicialmente prevista e estipulada. Ora, tratando-se de
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Direito Fiscal I
cumprimento por cheque, por vale de correio, ou por transferência de conta, não há substituição de uma
prestação prevista, e estipulada, por outra, que o não estava quando a obrigação se constituiu. Desde que
a lei admitiu o cumprimento de obrigações fiscais por cheque, por vale de correio e por transferência de
conta que tais formas de cumprimento se acham previstas e estipuladas.
Acresce que a dação em cumprimento só é admissível na base do assentimento do credor (art.
837 CC); e o Estado-credor do imposto não tem que assentir no pagamento deste por cheque, por vale de
correio ou por transferência de conta.
38. Prescrição:
Como qualquer outra obrigação também a relação jurídica de imposto se extingue quando o
cumprimento respectivo não é realizado num certo período de tempo. Importa determinar qual seja o
momento em que esse período se inicia e qual a sua duração.
No Direito Privado tem-se entendido que o instituto da prescrição extintiva encontraria o seu
fundamento na negligência, no desinteresse, do credor, que seriam interpretados como renúncia tácita ao
seu direito. E como geralmente se afirma que os créditos tributários são irrenunciáveis, poderia também
julgar-se que as obrigações tributárias não fossem prescritíveis. Mas o instituto da prescrição encontra
também fundamento na certeza e na estabilidade das relações sociais, que não se compadecem com a
cobrança de impostos cujos pressupostos, ou cujo vencimento, se situem em épocas muito remotas.
Assim, sempre se tem admitido a prescrição em Direito Fiscal.
No regime do Código das Execuções Fiscais de 1913 o período de prescrição começava a
contar-se da autuação do processo executivo.
Preferível parece ter sido a solução do Código de Processo das Contribuições e Impostos, de
1963, para o qual aquele período se conta "do inicio do ano seguinte àquele em que tiver ocorrido o facto
tributário" (art. 27). E tal critério foi mantido pelo CPT de 1991 (art. 34, nº 2).
Mas alguns casos especiais quanto ao inicio da prescrição fiscal se nos deparam.
Nos termos do citado art. 27 do Código de Processo das Contribuições e Impostos, o prazo
normal da prescrição tributária era de vinte anos, tendo sido reduzido para dez anos, pelo CPT (art. 34, nº
1). Mesmo assim reduzido, este período parece ser ainda demasiado longo, quanto aos impostos directos
periódicos, que recaem sobre rendimentos, cujo prazo de prescrição comum é de cinco anos (art. 310
CC).
A prescrição tributária interrompe-se em virtude de reclamação, impugnação judicial, recurso
ou execução fiscal. Mas a interrupção cessa "se o processo estiver parado por facto não imputável ao
contribuinte, durante mais de um ano, somando-se, neste caso, o tempo que decorrer após este período
com o que tiver decorrido até à data da autuação". Assim, em tal hipótese, os factos que normalmente
interrompem a prescrição limitar-se-ão a suspende-la (Código de Processo das contribuições e Impostos,
art. 27, § 1º; CPT, art. 34, nº 3).
Nos termos do art. 259 do CPT, "a prescrição será conhecida oficiosamente pelo juiz se o chefe
da repartição de finanças não o tiver feito". Quer dizer, a Administração fiscal deve conhecer,
oficiosamente, da prescrição, sem dependência de ela ser invocada pelo contribuinte, antes de instaurar o
procedimento executivo respectivo. E, não o tendo feito, dela deverá conhecer o juiz, também "ex
officio". A actual solução legal é preferível à do Código de Processo das contribuições e Impostos, que
fazia depender o conhecimento oficioso, da parte do juiz, das circunstâncias de o executado não ter sido
citado pessoalmente e não intervir no processo (art. 27, §§ 2º e 3º).
Com a prescrição das obrigações de imposto não deverá confundir-se a preclusão, ou
caducidade, do poder de liquidar os impostos (CPT, art. 33). Dessa preclusão, ou caducidade, se tratará
adiante, a propósito do acto tributário de liquidação.
39. Compensação:
As obrigações fiscais seguem também a forma de extinção das obrigações civis, nos termos do
art. 847 CC.
No Direito Fiscal, autores como Cardoso da Costa, Brás Teixeira e Sousa Franco defendem
que há compensação e extinção da dívida fiscal quando o sujeito passivo possui contra o Estado
determinado crédito derivada de outra dívida de imposto e com a qual pode solver total ou parcialmente a
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Direito Fiscal I
40. Confusão:
Cardoso da Costa, Brás Teixeira e Sousa Franco defendem esta forma de extinção da
obrigação fiscal. O Dr. Soares Martinez não admite esta possibilidade.
O caso mais comum de confusão poderá ser o da situação da ordem de sucessão legítima (arts.
2132 e ss CC). O Estado também pode ser herdeiro. Assim, a situação de confusão surge quando o
Estado, tendo uma dívida contra o contribuinte, se torna único herdeiro do contribuinte, quando este
falece. A dívida extingue-se, porque, no momento em que existe a obrigação fiscal, coincide na mesma
pessoa a personalidade activa e a personalidade passiva.
A generalidade dos autores não admite no Direito Fiscal três formas de extinção de obrigações
admitidas no Direito Civil:
§ Insolvência;
§ Extinção;
§ Consignação em depósito.
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Capítulo V:
Além da garantia geral temos também garantias especiais, que se destinam a reforçar a 1ª. As
garantias especiais podem ser de duas espécies: pessoais ou reais. Se estamos perante a afectação de mais
de um património à dívida fiscal estamos perante garantias pessoais. Se temos a afectação de apenas um
ou determinados patrimónios estamos perante garantias reais.
Quanto às garantias pessoais temos duas: a fiança legal (ou responsabilidade) e a fiança
voluntária (ex.: art. 136 CSISA).
A fiança legal ou responsabilidade verifica-se sempre que as normas fiscais determinam que
certas pessoas, alheias à constituição do vínculo jurídico, mas com especial conexão ao mesmo, podem
ser chamadas à execução fiscal (ex.: gerentes ou administradores).
Tal como no regime da solidariedade, temos que mais do que um património vai responder pelo
integral cumprimento da obrigação tributária, mas enquanto o devedor solidário responde pela totalidade
da prestação, já o responsável só é chamado à execução depois de excutido o património do devedor
originário. Quando o responsável é chamado à execução, tem, depois, direito de regresso contra o devedor
originário.
A natureza jurídica desta responsabilidade, segundo Brás Teixeira, é a de fiança legal e é a
situação em que alguém, por força de lei, vai garantir o cumprimento de dívida alheia, ficando obrigado
perante o credor (art. 627/1 CC).
Como exemplo típico de fiança voluntária temos o art. 136 CSISA e sobre sucessões e doações.
1. A nossa lei fiscal admite três espécies de garantias reais: privilégios creditórios (art. 733 CC),
hipoteca (art. 705, al. a)) e prestação de caução (arts. 255, 282 e 294 CPT). Além destes, temos também
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Direito Fiscal I
a) privilégios creditórios:
O privilégio creditório é a faculdade que a lei concede a certos devedores de serem pagos
preferentemente a outros, independentemente do registo dos seus créditos (art. 733 CC).
Os privilégios creditórios podem ser mobiliários ou imobiliários, consoante recaiam sobre bens
móveis ou imóveis.
Os privilégios creditórios mobiliários podem ser gerais (se abrangem todos os bens móveis do
património do devedor) ou especiais (se recaem apenas sobre certos móveis).
Os privilégios creditórios imobiliários são sempre especiais, pelo que incidem sempre sobre
determinado imóvel.
O regime dos privilégios foi bastante alterado pelo CC de 1966. O actual CC seguiu de perto o
Código Civil italiano de 1942 e veio simplificar o regime jurídico dos privilégios creditórios, mas fê-lo de
tal forma que estabeleceu um regime que suscita dúvidas e dificuldades de interpretação.
O Código Civil de 1966 extinguiu todos os privilégios e hipotecas legais destinados à garantia de
débitos tributários conferidos por legislação especial, ou seja, todos os privilégios creditórios e hipotecas
que não sejam concedidos pelo actual CC foram abolidos, pelo que actualmente as garantias reais
reconhecidas pela lei fiscal se limitam às acabadas de enunciar.
b) hipoteca:
O CC mantém a hipoteca legal (como garantia real), relativamente aos créditos de contribuição
autárquica (art. 705, al. a) CC).
c) Prestação de caução:
Poderá discutir-se se o vencimento de juros de mora não constituirá uma forma de garantia
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Direito Fiscal I
tributária. Tanto pelo efeito disuasor sobre o contribuinte remisso (= pouco diligente) para que pague a
prestação tributária ainda na fase de cobrança voluntária, ou já na fase de cobrança coerciva, como,
sobretudo, pelo efeito que os juros de mora possam ter no espírito de outros contribuintes, os quais, por
receio de ficarem sujeitos ao pagamento daqueles juros, cuidarão de cumprir pontualmente as suas
obrigações tributárias. Tudo dependerá da natureza atribuída a esses juros de mora, que já foi
considerada como a de uma "taxa compulsiva", destinada precisamente a impelir o contribuinte ao
cumprimento das suas dívidas fiscais.
É de notar, com efeito, que, quando o nível das suas taxas é muito elevado, os juros de mora não
parece terem a função compensatória dos juros no Direito Privado, mas sim uma função compulsória, por
excederem largamente os rendimentos normais das importâncias em dívida.
Se o imposto não for pago dentro do prazo legalmente estabelecido, começam a vencer-se juros
de mora, a uma taxa mensal de 2% (decretos-lei nº 49 168, de 5 de Agosto de 1969, e 318/80, de 20 de
Agosto; Código de Processo Tributário, de 1991, arts. 109, nº 1, e 341, nº 7).
Os juros de mora só serão devidos quando o cumprimento não tenha sido pontual. Mas poderá
não haver mora do contribuinte e, no entanto, o pagamento ser retardado por se ter procedido tardiamente
às operações de lançamento e liquidação. Se esse atraso não for imputável ao contribuinte, este só terá
que realizar a prestação tributária, não acrescida de quaisquer juros. Mas se tal atraso lhe for atribuível, à
prestação acrescerão juros compensatórios, sem prejuízo das multas e outras penas porventura aplicáveis
(art. 83 CIRS; CPT, art. 83).
Também as multas fiscais e outros meios compulsórios poderão, em termos paralelos, constituir
garantias de cumprimento da obrigação tributária.
2. O Dr. Brás Teixeira apresenta uma crítica ao regime actual (acabado de analisar):
Da análise dos privilégios creditórios resulta que o nosso legislador adoptou uma dualidade de
regimes. Enquanto que os privilégios creditórios de que gozam os impostos indirectos (SISA e imposto
sobre sucessões e doações) não têm qualquer limitação temporal. Diferentemente, os respeitantes aos
créditos por contribuição autárquica e restantes impostos directos apenas aproveitam aos impostos
inscritos para cobrança no ano da penhora ou acto equivalente, ou nos dois anos anteriores.
O critério distintivo entre impostos directos e impostos indirectos utilizado pelo CC não coincide
com o critério vigente na lei actual, parecendo no fundo que o CC faz corresponder essa distinção àquela
que separa impostos periódicos e impostos de obrigação única, considerando elemento essencial dos
primeiros aquilo que se chama inscrição para cobrança.
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A relação jurídica de imposto a que a verificação da previsão legal dá origem é uma relação de
sujeito indeterminado e ilíquida, pelo que se impõe uma actividade destinada a determinar em concreto
quem é o sujeito passivo, qual o valor dos bens sobre que incide o imposto, qual o montante da prestação
e qual o débito tributário.
Esta actividade de concretização dos pressupostos do pagamento do imposto, que normalmente é
desenvolvida pela AP fiscal, por uma sequência de formalidades, visa a aplicação a um caso concreto de
uma norma tributária e vai culminar na prática de um a.a. final, o acto tributário.
A Doutrina distingue nesta actividade processual duas operações :a de lançamento e a de
liquidação. A 1ª corresponde à determinação em concreto do sujeito passivo da obrigação fiscal e da
matéria colectável. A 2ª consiste na aplicação à matéria colectável, apurada no lançamento, da taxa do
imposto em causa, com vista ao apuramento final da colecta.
Estas duas operações constituem o processo tributário gracioso de formação do acto tributário
(a.a. final que fixa o débito tributário que o contribuinte terá que pagar como resultado da aplicação da lei
fiscal).
O estudo do processo tributário gracioso corresponde à análise do conjunto das operações
realizadas pela AP fiscal para, pela aplicação da lei fiscal ao caso concreto, determinar a dívida de
imposto que certo contribuinte tem que pagar.
Por vezes, não é o contribuinte a pagar o imposto, mas a entidade patronal. Logo, o acto
tributário é efectuado pela empresa – substituição fiscal.
Também no caso dos impostos indirectos a liquidação cabe aos contribuintes (ex.: IVA).
À AP fiscal cabe controlar o lançamento e a liquidação do imposto, ou seja, exercer fiscalização
sobre essas operações. No âmbito do controlo da legalidade que a AP fiscal faz após o procedimento do
contribuinte vai homologar o acto, desde que o contribuinte tenha apurado bem a colecta.
Enquanto não há homologação do acto, pelo menos tácita, a liquidação é apenas provisória, só se
tornando definitiva após a homologação. A homologação pode surgir, pois, tacitamente. Tal sucede ao
fim de 5 anos, prazo em que caduca o direito de liquidação adicional da AP fiscal.
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a) Princípios:
b) Fases:
Dentro do processo tributário gracioso podemos distinguir três fases: a fase introdutória, a fase
instrutória e a fase decisória.
A fase introdutória é aquela que dá origem ao processo e pode ser de iniciativa do contribuinte
(prestando declarações) ou da própria AP fiscal.
Em regra, esta fase é de iniciativa do contribuinte, que se dirige à AP e, através de declarações
escritas, inicia o processo. As declarações são efectuadas em impressos, em formulários, previamente
aprovados pelo Governo e produzidos pela Imprensa Nacional.
Quanto à natureza jurídica destas declarações as opiniões dividem-se. Alguns afirmam que são
actos constitutivos. A doutrina maioritária (Soares Martinez e Brás Teixeira) considera-as uma
participação de ciência, pois o contribuinte cumpre uma prestação tributária acessória e leva à AP fiscal
todos os dados para que esta possa determinar o acto final.
A fase de instrução destina-se a comprovar os dados constantes das declarações prestadas pelos
contribuintes (preenchidas na fase anterior), acrescentando aqueles dados que não constem da mesma
declaração.
Quando os contribuintes preenchem e prestam as declarações iniciam o processo. As declarações
devem ser verdadeiras, reais e corresponder de facto à situação verificada. Todos os elementos devem ser
apresentados e sobretudo fundamentados. Ou seja, se, p.ex., há despesas deve-se apresentar os
documentos correspondentes (exemplo típico dos recibos ou facturas). Além da prova documental,
também pode haver prova testemunhal e prova por arbitramento, podendo esta última ser por exame
(coisas móveis), vistoria (coisas imóveis) ou avaliação (em todos os outros casos).
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