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Daniel Pedro

História da Didáctica Geral

Curso de Licenciatura em Ensino Básico

Universidade Rovuma

Extensão de Cabo Delgado

2020
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Daniel Pedro

História da didáctica Geral

Curso de Licenciatura em Ensino Básico

Trabalho individual de carácter avaliativo a


ser entregue ao docente da cadeira de
Didática Geral, leccionado no curso de
licenciatura em Ensino Básico, 1oAno, 2o
semestre sob orientação por: dr Marcelino
Santos Chinan A. John

Universidade Rovuma

Extensão de Cabo Delgado

2020
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Índice
1. Introdução..............................................................................................................3

2. A didática e um pouco de história.........................................................................4

2.1. Conceito de didática.............................................................................................5

2.2. Comênio e a didática magna.................................................................................5

2.3. Rousseau e o Emílio ou da educação...................................................................7

2.4. Pestalozzi e seus princípios educacionais.............................................................9

2.5. Herbart e o seminário pedagógico.......................................................................10

3. Deontologia para a educação...............................................................................11

3.1. Natureza ética da profissão docente...................................................................11

3.2. Deontologia da profissão docente......................................................................16

3.3. Modelos de códigos deontológicos....................................................................17

4. Método para lidar com adolescentes no processo educativo geral......................20

4.1. A adolescência....................................................................................................20

4.2. Desenvolvimento cognitivo................................................................................21

5. Fases do desenvolvimento cognitivo: particularidades e desafios para a educação


.............................................................................................................................23

5.1. A teoria de Piaget: os estágios............................................................................23

5.2. Aproximações da teoria de Piaget à educação...................................................27

6. Considerações finais............................................................................................30

7. Referencias Bibliograficas...................................................................................32
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1. Introdução
O presente trabalho aborta vários conteúdos relacionados com a didactica geral que é
uma disciplina muito importante para quem já é professor, porque lhe dá oportunidade
de refletir sobre a sua prática pedagógica e para o que ainda não o é, de entrar em
contato com um campo da ciência discriminado (que é o campo das ciências humanas)
pelos que adentram nas áreas experimentais laboratoriais, mas que nos permite um
conhecimento das teorias que regem o ensino e a aprendizagem. Um professor que
desconhece os saberes fundamentais que cercam os princípios da aprendizagem, como
poderá oferecer um ensino que dê oportunidades de construção e produção do
conhecimento de uma maneira metódica, crítica, científica e ética?
Apresentam-se neste artigo alguns aspectos de uma investigação sobre pensamento ético
e deontológico dos professores. Partindo do conceito de natureza ética da educação,
procura-se saber que princípios e valores presidem às práticas docentes, como é que os
professores concebem os seus deveres profissionais, que tipo de relação estabelecem
entre deveres e princípios e como encaram a possível criação de um código
deontológico da profissão. Discute-se ainda a possível influência da situação do
professor na carreira no modo de conceber estas questões.

Outrossim este trabalho, de cunho bibliográfico, centra-se na teoria Piagetiana e sua


contribuição para educação na atualidade Por outro lado, as teorias concordam que a
pessoa assume um papel ativo no seu desenvolvimento.
Essa é uma característica filogenética, isto é, o homem é o único animal que modifica
seu ambiente. Ele influencia e é influenciado pelo meio ambiente em que vive. Todavia,
cada ser humano nasce com potencialidades diferentes para responder aos estímulos. A
relação do homem com o meio ambiente acontece desde o nascimento, e as
aprendizagens acontecem num contínuo, das mais simples para as mais complexas.
Considera-se importante ressaltar que hoje com o ensino de nove anos e o ingresso ao
ensino fundamental antecipado, bem como a lei de não reprovação, emerge a
necessidade de se retomar os estudos de Piaget, mais especificamente os estágios por ele
propostos, na tentativa de reforçar que é preciso repensar as propostas pedagógicas para
este novo momento da educação
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2. A didática e um pouco de história


O estudo sobre a Didática, registrando que ela sempre existiu na história da humanidade
porque o homem sempre ensinou e aprendeu. No entanto, a escola como uma instituição
para todos só foi instituída socialmente, como forma de transmitir o legado cultural
construído pela humanidade, somente há pouco mais de duzentos anos.
Encontramos como expoentes do pensamento vigente na antiguidade Sócrates, Platão e
Aristóteles e na idade média Santo Agostinho, Tomás de Aquino que viam o homem a
ser desenvolvido aquele que pertencia à classe de homens livres, aptos a receber uma
educação voltada para o ideal de moral, de formação de caráter, de hábitos, do domínio
das paixões, da justiça e outros mais.
Sabemos que a educação formal tem um caráter reprodutivista que é uma qualidade da
espécie humana: conservar o que já existe. Mas sabemos também, pela capacidade de
pensar, analisar e compreender a realidade, o homem é capaz de interferir e transformar
esta mesma realidade, verificando as contradições geradas pelo seu trabalho.
A história da humanidade nos confirma isso quando encontramos a relação de produção
feudal com seu trabalho conservador, baixa produtividade e uso de técnicas
rudimentares serem substituídas por um novo sistema econômico, motivado pela
necessidade da nobreza em ampliar seus negócios, pelo desenvolvimento do comércio e
das cidades, pelo fortalecimento de novos modos de produção com o trabalho livre e
assalariado e o surgimento de uma nova classe social: a burguesia. Esse novo sistema
econômico, o capitalismo, marcou um novo momento na história da humanidade, haja
vista que a individualidade, a igualdade e a liberdade do homem foram geradas por
novas necessidades, novas concepções se mundo e novos valores.
Como é de se supor, a educação formal mudou o seu foco para atender a essas novas
necessidades do capitalismo, ampliando-a como um direito de todos e de
responsabilidade do Estado. Ocorreram, portanto, mudanças substanciais na concepção
de homem, de educação, de ensino e de sociedade voltadas para um novo modelo de
sociedade que passou a exigir um homem que pudesse atender às novas demandas.
A partir de então, nasce a compreensão de que tanto escola quanto o professor deveriam
oferecer um outro tipo de prática, agora voltada não mais para ligar o homem a sua
verdadeira pátria que era a celeste, mas ultrapassar a simples transmissão de conteúdo
com um ensino atraente, voltado para a transformação da realidade.
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2.1. Conceito de didática


Podemos conceituar Didática sob duas perspectivas: como um saber, um ramo do
conhecimento e, portanto, uma ciência com seu próprio objeto, e como uma disciplina
dos cursos de formação de professores. Ela é uma disciplina integradora que faz a
ligação entre a teoria e a prática. Ordena e estrutura teorias e práticas em função do
ensino. Um professor que pretende realizar com sucesso o seu trabalho, vendo acontecer
justamente o objetivo do ensino, que é proporcionar a aprendizagem ao seu aluno,
certamente não dispensará o conhecimento de toda a teoria que dá suporte ao fazer
pedagógico consciente.
A Didática tem seu corpo teórico fundamentado nas contribuições da Psicologia, da
Filosofia e da Sociologia que são áreas do conhecimento que lançam luz sobre a
complexidade da prática pedagógica.
Os objetivos da Didática são: refletir sobre o papel sociopolítico da educação, da escola
e do ensino; compreender o processo de ensino e suas múltiplas determinações;
instrumentalizar teórica e praticamente, o futuro professor para captar e resolver os
problemas postos pela prática pedagógica; redimensionar a prática pedagógica através
da elaboração da proposta de ensino numa perspectiva crítica de educação (OLIVEIRA,
1995).

2.2. Comênio e a didática magna


O maior expoente desse pensamento é João Amós Comênio que, em pleno século XVII,
elabora uma proposta pedagógica que atinge tanto uma reforma da escola, quanto a
forma de ensinar baseada na apreensão das contradições e das novas necessidades
humanas surgidas das transformações profundas a se adequar à nova sociedade
capitalista. Até esse tempo, a natureza e o saber eram considerados como dons de Deus.
Assim, a Igreja e o Estado lutavam pelo controle do ensino, até que a Reforma
estabeleceu o predomínio do segundo sobre o direito de ensinar, o que durou pouco
tempo, haja vista o movimento da Contra-Reforma capitaneado pelos intelectuais
católicos, em especial os jesuítas, que retomou a teoria do mando indireto sobre o
Estado e assumiu radicalmente o monopólio do ensino (CUNHA, 1986).
Comênio valorizava a melhoria da vida social do homem a partir da educação quando
ele tivesse um melhor conhecimento dele próprio e o desenvolvimento de sua
capacidade de autocrítica, que teria como consequência uma maior solidez moral. A
Didática seria tanto o ato de ensinar como a arte de ensinar. E ensinar aquilo que a
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natureza social indicava com relação à instrução, à moral e à religião. Estes três
aspectos seriam trabalhados de forma integrada, uma vez que, através da instrução, o
homem conseguiria enxergar sua vida além das limitações do tempo.
É, pois, em Comênio que encontramos uma proposta metodológica de como ensinar
tudo a todos, distanciada da prática da época na qual o ensino era para poucos
privilegiados. As descobertas, assim como o comércio em grande escala, as novas
invenções, os avanços da ciência, a produção visando compra e venda, tudo fazia parte
de uma revolução em todos os aspectos da vida do homem.
O seu livro Didática Magna contém uma concepção educativa baseada numa
perspectiva religiosa, a tal ponto que ao se eliminar o aspecto didático, prejudica de
forma total o primeiro. Ele começou a ser escrito em 1627 e foi concluído cinco anos
depois, quando se encontrava exilado em outro país por causa de perseguições
religiosas, no entanto o original manuscrito só foi encontrado duzentos anos depois de
sua morte e publicado após quase dez anos.
Ele contém quatro partes: a primeira, apresenta o homem como a criatura mais perfeita
que existe na face da terra e inclui, também, os fundamentos teológicos e filosóficos da
educação; a segunda, apresenta os princípios da didática geral baseados nas leis da
natureza; a terceira, voltada à didática especial, apresenta os métodos para ensinar
letras, ciências, artes mecânicas, moral e piedade; e a quarta, apresenta um plano
orgânico de estudo para os quatro graus da escola de acordo com as características
gerais do desenvolvimento da criança e do jovem.
O método Comeniano baseia-se nos seguintes princípios: aquilo que o aluno deve saber,
deve ser ensinado; o que é ensinado dever ter aplicação prática; a explicação do que se
está ensinando deve ocorrer da forma mais clara possível; e ensinar de acordo com as
necessidades e no seu devido tempo.
Comênio propôs os fundamentos da arte de ensinar no âmbito escolar preocupando-se
com uma arte que não só se igualasse às demais áreas do artesanato, mas que lhes fosse
superior e que servisse de balisamento, uma vez que equiparou o processo de produção
intelectual escolar ao processo de produção material dos artesãos e manufatureiros.
A arte de ensinar abrangia tanto a transmissão de conhecimentos quanto o método
empregado para tal fim. Por isso, para ele, ensinar consistia em marcar, fazer sinais,
gravar etc., indicando a ação de uma pessoa sobre outra, de maneira que o papel do
professor é fazer marcas no aluno: em sua inteligência, vontade, memória e emoções ao
ponto de fazê-lo diferente das outras pessoas que não frequentaram a escola. É aqui que
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surgem os meios que correspondem à arte de ensinar: alguns pertinentes e determinados


pela matéria a ser ensinada e alguns de caráter coercitivo, como os castigos físicos,
através do uso da palmatória, cujos resultados, positivos para aquela época, a fizeram
permanecer nas escolas até meados do século XX.
O método de ensino comeniano tinha as seguintes características diferentes dos métodos
da época: consistia em ministrar um ensino que apresentasse bons resultados, que fosse
dinâmico, prazeroso para alunos e professores. Tudo isso como uma resposta ao novo
modo de produção, de comercialização, porque assim como havia um novo método para
produzir de tudo para trocar com todos, a escola necessitava de uma nova didática para
ensinar tudo a todos.
Nos seus escritos Comênio estende a “arte de ensinar” até o outro extremo do processo
de formação do ser humano, qual seja a aprendizagem, indicando, pois, que tanto o
professor quanto o aluno são partes constitutivas de um mesmo processo.

2.3. Rousseau e o Emílio ou da educação


Além de Comênio, outros pensadores e teóricos propuseram metodologias de ensino
capazes de servir de oposição à pedagogia escolástica vigente (a escolástica é a filosofia
cristã da Idade Média).
É o caso de Jean-Jacques Rousseau (1712-1778) que expressou suas ideias na área da
educação no seu livro Emílio ou Da Educação contrapondo-se ao pensamento vigente
sobre a natureza humana: enquanto se dizia que o homem é de natureza má necessitando
que a educação a transforme, ele defendeu a tese de que o homem é bom e a sociedade é
que o corrompe (ROUSSEAU, 1995).
O curioso é que ele não recebeu uma educação formal completa em escola, nem ao
menos cursou uma universidade, mas tinha profundo conhecimento por causa de leituras
que fazia em livros de sua mãe e de seu avô. Teve vários relacionamentos amorosos,
mas apenas de uma companheira teve cinco filhos que foram criados em orfanatos. O
curioso em toda esta história é que esta obra, Emílio, tem um caráter de redenção por ter
abandonado seus filhos e, por isso, suas ideias ajudariam outros pais a criarem os filhos.
No livro, ele dividiu o período de escolaridade em faixas etárias a começar pelas
crianças de um a cinco anos, depois de cinco a doze anos, em seguida de doze aos
quinze anos e, por fim, de quinze a vinte e um anos. Foi quem primeiro considerou a
criança como um ser em formação de acordo com as fases do seu desenvolvimento e
não como um adulto em miniatura. Um absurdo, para a época!
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Portanto, para a primeira fase, condenou a forma como as crianças eram tratadas e
apregoou que era de forma natural que ela se desenvolvia e aprendia. Para a segunda
fase, ainda não era momento de uma educação impositiva, com a transmissão de um
ensino fechado estipulado por antecipação, mas o acompanhamento do desenvolvimento
natural. Para a terceira fase, o conhecimento formal aconteceria, mas de acordo com a
curiosidade e o interesse natural, priorizando aqueles com possibilidade de aplicação
prática. Por fim, para a quarta fase, priorizou os aspectos relacionais, isto é, a vida em
comum com as outras pessoas, além da ministração da educação religiosa.
Para ele, os pressupostos da educação baseavam-se na crença da bondade natural do ser
humano e na percepção de que todo o mal tinha origem na sociedade. Portanto, educar
uma criança implicaria em acolher a bondade natural dela em protegê-la corrupção que
assolava a presente sociedade. A metodologia apregoada por ele tinha como foco uma
ação do professor no sentido de preparar o aluno para ser um homem aproveitando o seu
desenvolvimento natural, mas exigindo, para tal, um ambiente favorável, isto é,
altamente organizado.
Outro aspecto interessante no seu modelo de educação formal, era que ele não via
necessidade em apressar o desenvolvimento intelectual, deixando que cada criança
externasse interesse sobre um assunto e só a partir daí o professor iria respondendo suas
curiosidades. Só a partir da adolescência é que deveria ser ministrado o ensino formal.
Ele foi um filósofo que pregou que cada fase da vida tem a sua existência própria e
contribuiu para a compreensão de que o método da natureza vale para todas as coisas e
disse que não deveria se estabelecer um modelo quando se lida com educação de
crianças.
Ele foi um severo crítico da escola do seu tempo, com sua forma exagerada de cobrar a
memorização do que era ensinado. Pelo contrário, ele propôs uma educação que
envolvia a experiência pessoal da criança, começando por ela aprender a usar
instrumentos do ofício do seu pai e através deles aprenderia a medir, contar, pesar e
comparar. Então, por meio dessas atividades familiares elas aprenderiam a aplicar
aquilo que lhe foi ensinado em sala de aula.
A maior contribuição de Rousseau para a educação foi olhar para a criança como um ser
completo em termos de sentimentos, interesses e desejos próprios, o que concorreu para
o avanço da psicologia do desenvolvimento por ter dado atenção às diversas fases do
desenvolvimento da criança e por sugerir uma educação diferenciada para cada uma
dessas fases.
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2.4. Pestalozzi e seus princípios educacionais


Outro expoente que representa um pensamento, uma necessidade, um momento
histórico, é Heinrich Pestalozzi (1746-1827) que seguiu os rumos pregados por
Rousseau vivenciando-os, pois era professor e teve oportunidade de divulgar suas ideias
e teorias baseadas no princípio de que toda criança deveria ter acesso à educação,
qualquer que fosse a sua classe social, inclusive se fosse portadora de limitações para
seu desenvolvimento.
Sua maior contribuição teórica foi a elaboração de um método que era a base da sua
prática pedagógica: primeiro apresentava o conhecimento da forma mais simples e
prática, em seguida utilizava a observação através dos sentidos e, por fim, exercitava o
conhecimento de forma gradual para fixá-lo. A concepção de ensino que Pestalozzi
tinha era de que a criança se desenvolve de dentro para fora e com isto, era necessário o
professor ter conhecimento do nível de desenvolvimento que seu aluno se encontrava
para oferecer uma educação direcionada de acordo com suas necessidades e
características próprias, tendo como método pedagógico a natureza. Portanto, sua teoria
deva ênfase ao desenvolvimento do ser humano através de leis definidas, provindas da
natureza. Tanto Rousseau como Pestalozzi consideravam o homem muito influenciado
pelo meio prejudicando, portanto, o seu crescimento natural.
A organização escolar era baseada nas seguintes características:
 As turmas eram formadas com os menores de oito anos, com os alunos entre oito
e onze anos e outra turma com idades de onze a dezoito anos;
 As atividades escolares duravam das 8:00 as 17:00 horas e eram desenvolvidas
de modo flexível; os alunos rezavam, tomavam banho, faziam o desjejum,
faziam as primeiras lições, havendo um curto intervalo entre elas;
 Duas tardes por semana eram livres, e os alunos realizavam excursões;
 Os problemas disciplinares eram discutidos à noite; ele condenava a coerção, as
recompensas e punições.
 Além disso, Pestalozzi formulou princípios educacionais e deu valiosa
contribuição para a prática pedagógica:
 O desenvolvimento é orgânico, sendo que a criança se desenvolve por leis
definidas; a gradação deve ser respeitada; o método deve seguir a natureza; a
impressão sensorial é fundamental e os sentidos devem estar em contato direto
com os objetos; a mente é ativa; o professor é comparado ao jardineiro que
providência as condições propícias para o crescimento das plantas;
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 Crença na educação como o meio supremo para o aperfeiçoamento individual e


social;
 Fundamentação da educação no desenvolvimento orgânico mais que na
transmissão de ideias memorizava;
 A educação começa com a percepção de objetos concretos e consequentemente
com a realização de ações concretas e a experimentação de respostas emocionais
reais;
 O desenvolvimento é uma aquisição gradativa, cada forma de instrução deve
progredir de modo lento e gradativo;
 Conceituação de disciplina baseada na boa vontade recíproca e na cooperação
entre aluno e professor;
 Introdução de novos recursos metodológicos;
 Deu impulso à formação de professores e ao estudo da educação como uma
ciência.
Pestalozzi apresentava uma unidade orgânica no seu conjunto de pensamentos sobre
educação, pela ação educativa e inspirado no seu espírito humanitário, ambicionando
melhorar a qualidade de vida do povo.

2.5. Herbart e o seminário pedagógico


Enquanto Pestalozzi pôs em prática a teoria de Rousseau primeiro com seu filho, depois
dirigindo uma escola profissionalizante para crianças pobres e como professor durante
vinte anos da sua vida, Johann Friederich Herbart (1776-1841) embora atuando no
ensino universitário expandiu o pensamento pestalozziano criando um seminário
pedagógico com uma escola de aplicação em anexo para a experimentação universitária.
Ele tinha uma percepção da educação como uma ciência e por isso trouxe para o
professor o rigor metodológico que tinha como procedimentos o controle do
comportamento do aluno, o ensino através da instrução que deveria atender ao
desenvolvimento de interesses, e da disciplina que favoreceria a formação do caráter
pretendido pela sociedade.
Por dar ênfase ao aspecto metodológico do ensino, indicou uma série de passos
determinados pelo interesse da criança: o primeiro, é a preparação que consiste em
trazer à mente ideias anteriores que tem relação com as novas para interligá-las; o
segundo, é a apresentação das ideias novas para serem assimiladas; o terceiro, é a
associação que consiste na combinação do novo com o velho; o quarto, é a
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sistematização que consiste na elaboração teórica do novo conceito; e, por fim, o quinto
passo, é a aplicação que é a utilização pelo aluno do aprendido em suas atividades.
Portanto, caro aluno, percebemos que o pensamento desses teóricos, com o passar do
tempo, concorreram para que a escola fosse colocada no centro das ideias de mudança
para atender de forma mais adequada aos novos tempos e às novas realidades marcadas
pelas inovações tecnológicas responsáveis por transformações em todos os aspectos da
vida humana.
Tanto é verdade, que esses pensadores e teóricos que se preocuparam com um novo
modelo de escola divulgaram seus estudos, teorias e experiências desde o séc. XVI e só
quatro séculos depois é que o foco da educação na escola saiu do campo do professor e
do ensino para o campo do aluno e da aprendizagem.
3. Deontologia para a educação:

3.1. Natureza ética da profissão docente


Várias ciências, nas últimas décadas, têm procurado identificar e caracterizar as
especificidades da profissão docente e daqueles que a exercem, nas suas múltiplas
facetas. No entanto, muitos aspectos permanecem obscuros. É o caso do pensamento e
do comportamento moral do professor, cuja importância é inegável se se tiver em conta
a função eminentemente ética que a profissão desempenha, por força da sua própria
natureza.

Na obra intitulada “Os Usos da Filosofia”, Mary Warnock afirma a sua convicção de
que a educação deve ser orientada para a incrementação da liberdade das pessoas,
entendendo isto como uma espécie de elevação a partir de uma dada situação sobre a
qual, geralmente, se não reflecte. Tratar-se-ia, então, de possibilitar o conhecimento da
história e do desenvolvimento das instituições e da sociedade em que se vive, bem como
dos instrumentos conceptuais utilizados, como meios de proporcionar essa elevação. E
como a liberdade é um valor, continua a autora, então a educação é intrinsecamente
valorativa.

Salvas as devidas distâncias, não será difícil encontrar aqui ecos da metáfora platónica
da educação como libertação da ignorância - da ilusão - por meio de uma dialéctica
ascensional que é também um processo de crescimento intelectual, moral, humano, em
suma, que conduz da “caverna” para a luz; e do pedagogo como aquele que,
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propriamente falando, nada ensina, a não ser o esforço da ascensão e a sua simbólica
libertadora (Platão, República, 514a- 517c).

No seu sentido mais amplo, Ética designa um conjunto de preocupações teóricas


concernentes à intencionalidade da vida humana e às razões pelas quais se age. Daí que
no seu contexto se fale de princípios e de valores com um alcance geral e que estes
princípios encontrem o seu fundamento no plano da racionalidade.

Embora seja corrente tomar os termos ética e moral como sinónimos e usá-los
indiferenciadamente, no campo filosófico a distinção faz-se e justifica-se pelas
diferentes áreas semânticas que os dois termos cobrem: ética significa a teoria do certo e
do errado na conduta e reporta-se aos valores que a ela presidem; moral tem que ver
com a prática, isto é, com os comportamentos efectivos das pessoas em articulação com
os valores (Billingdon, 1988). Assim, a ética refere-se aos princípios, ao que deve ser
em geral - que Kant, por exemplo, designou por imperativo categórico,
aprioristicamente concebido - enquanto a moral remete para as máximas da acção, isto
é, para o modo como cada indivíduo interpreta o dever geral em função da situação
particular (Kant, 1960).

Mantendo embora a distinção entre ética e moral, Ricoeur (1990, p. 5) recorre a um


outro critério e considera os seguintes princípios: o do que é “considerado bom” e o do
que “se impõe como obrigatório”; a ética reporta-se ao primeiro e a moral ao segundo. E
acrescenta que não será difícil reconhecer “na distinção entre o objectivo de uma vida
boa e a obediência às normas a oposição entre duas heranças, a herança aristotélica,
onde a ética se realiza pela sua perspectiva teleológica, e a herança kantiana, onde a
moral é definida pelo carácter de obrigação da norma, logo numa perspectiva
deontológica.”

Compreende-se, então, que a educação se encontra na encruzilhada destas duas


“heranças”: ao formar os jovens com vista à autonomia e à cidadania, são os fins que
determinam os processos educativos e há, consequentemente, um ideal orientador; ao
mesmo tempo, a boa consecução dos objectivos educacionais exige normas e o respeito
por elas da parte de todos os intervenientes, com especial ênfase para os professores.

Sejam quais forem as origens dos princípios éticos, problema que não cabe no âmbito
deste trabalho discutir, é pertinente, no entanto, questionar até que ponto devem eles ter
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expressão no processo educativo, já que é mediante este processo que o ser humano se
torna apto a agir de forma simultaneamente autónoma e integrada. Semelhante
perspectiva pode encontrar-se já no pensamento de Platão, quando considera que só a
educação permite formar o cidadão virtuoso, isto é, o cidadão moral, estabelecendo
uma estreita vinculação entre ética e pedagogia. Não se trata, por certo de uma
pedagogia qualquer nem, muito menos, da pedagogia relativista e pragmática do sofista
Protágoras, para quem cada indivíduo é medida e critério das suas próprias verdades,
que o mesmo é dizer das suas próprias acções. Platão exemplifica este ponto de vista
com as palavras que põe na boca do personagem Cálicles: “(...) aquele que quiser viver
bem deverá deixar crescer à vontade as suas paixões, sem as reprimir e por maiores que
elas sejam, deverá ser capaz de as satisfazer graças à sua coragem e inteligência, dando-
lhes tudo aquilo que elas desejarem.” (Górgias, 491e - 492a); a este, contrapõe a sua
própria concepção de vida, representada pela dramatis personae Sócrates: “Tal é,
parece-me, o objectivo que cada um deve visar durante a vida. Todos os seus esforços,
todos os seus actos, devem ser dirigidos no sentido de adquirir a justiça e a temperança
como condições de felicidade, sem consentir nunca que as paixões campeiem (...)”
(idem, 509d-e), acrescentando que só pelo cultivo da filosofia este objectivo de
autonomia e autodeterminação pode ser atingido e que cabe precisamente ao filósofo,
mestre pela palavra e pelo exemplo, orientar os alunos neste caminho que cada um tem
de fazer por si mesmo.

Também Aristóteles concebe a educação como formação para a cidadania (Política,


livro oitavo, I), mediante o desenvolvimento de certas actividades e poderes
característicos do ser humano, nomeadamente a capacidade de orientar racionalmente as
suas acções. Esta função prática da razão, diz Williams (1993, p. 55) “é suposto
produzir coerência e reduzir os conflitos entre os desejos do indivíduo que vive (como o
homem deve viver) em sociedade”. Portanto, a aprendizagem da cidadania é,
simultaneamente, a aprendizagem do autocontrolo e dos justos princípios em função dos
quais se deve viver para viver bem o que, na perspectiva de Aristóteles, é o mesmo que
ser feliz; indivíduo e sociedade interpenetram-se e implicam-se mutuamente.

Assim, é a própria concepção de humanidade do homem que está em jogo quando se


educa, que é o bastante para compreender a dimensão ética da tarefa educativa e a
responsabilidade dos que nela se comprometem, tanto mais que o alcance da educação
não é individual, mas social: cada novo indivíduo formado vai integrar-se no tecido
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social que ajuda a construir e a renovar; da sua (boa) formação ética dependerá, pois, a
de toda a sociedade (Cordero, 1986). O mesmo autor insiste, aliás, na necessidade de
tornar conscientes os professores da inevitável orientação teleológica do processo
educativo. É que não são indiferentes os fins que se pretende atingir e que determinam,
consequentemente, o tipo de educação que se vai realizar. Portanto, na raiz de qualquer
projecto educativo está uma intencionalidade ética que o orienta e legitima. Do mesmo
modo, o professor nunca é neutro quando escolhe os caminhos pedagógicos que vai
percorrer e é a sua própria pessoa que está em jogo quer quando escolhe quer quando
actua em função das escolhas feitas.

Vão neste mesmo sentido as reflexões de Billington (1988), quando analisa a etimologia
da palavra educação a partir das duas palavras latinas educare e educere. Diz ele que,
embora as palavras possam parecer semelhantes, há entre elas “um hiato de sentido tão
largo que é difícil imaginar que possam ambas coabitar no contexto curricular de uma
escola” (p. 259) e justifica o seu ponto de vista através da explicitação do respectivo
sentido.

Assim, educare significa treinar, equipar alguém com determinadas habilidades (skills)
físicas ou intelectuais, em articulação com o desempenho de uma ocupação ou
profissão. Desta interpretação decorrem duas importantes consequências educativas: a
primeira é que a valoração dos temas incluídos no currículo escolar é determinada pelas
necessidades económicas e sociais da comunidade ou do estado. A motivação para
aprender - e ensinar - um assunto será a da qualificação que esse assunto confere ao
aprendente para a obtenção de determinado emprego.

A segunda consequência faz depender a apreciação das prioridades curriculares de um


critério de utilidade, pelo que será dada primazia às competências para as quais há mais
oportunidades de trabalho, e não é de estranhar, neste caso, um certo desprezo
relativamente às chamadas humanidades, cuja aplicação prática imediata não é visível.
Aqui, pois, os alunos são preparados para se integrarem em sistemas já constituídos e
reproduzirem as suas rotinas e os professores são vistos como servidores do estado.

Por sua vez, o valor semântico de educere - encaminhar para fora, exteriorizar - conduz
a um outro olhar sobre a educação, vista agora como o meio de preparar os estudantes
para o conhecimento do mundo e de si mesmos; não por qualquer razão pragmática,
mas pelo valor intrínseco da própria educação e das competências que ela proporciona.
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Aqui, a motivação para aprender não é dada de fora, mas é interior, o que significa que
será o aluno a construir os sentidos das suas aprendizagens que, aliás, estarão sempre
em construção; a aprendizagem é um processo permanente. O grande objectivo da
educação entendida segundo esta perspectiva é o formar seres humanos capazes de
tomar decisões fundamentadas, apreciar os valores sustentados pelos outros e julgar de
forma autónoma.

Sem que tome explicitamente partido por qualquer destas orientações, antes as
reconhecendo, a ambas, como necessárias no sistema educativo, não deixa o autor,
porém, de chamar a atenção para as dificuldades que se levantam a todos os que
pretendem conciliá-las num mesmo projecto educativo; daí que questione se educere
não será apenas um ideal no espírito de algumas pessoas .

Efectivamente, a questão está longe de ser pacífica e de recolher a unanimidade de


todos os que se interessam por temas de educação. Como nota Starratt (1994), muitas
pessoas, embora reconhecendo a importância de uma educação ética dos jovens, pensam
que não é à escola que deve caber essa função, mas à família ou às igrejas; as escolas
devem ter em vista, apenas, a formação científica, para a qual todo o tempo disponível
deve ser aproveitado. Outros, de forma mais radicalmente pragmática, estão convictos
de que a formação ética é simplesmente dispensável, devendo a escola promover o
sucesso e a competitividade, antecipando o mundo do trabalho que os alunos irão
posteriormente encontrar. A perspectiva valorizada é, então, a do educare.

Cordero (1986), por seu turno, parece privilegiar a raiz educere de educação, ao
considerar que a profissão do educador consiste em trabalhar na formação do homem,
fazendo desabrochar a personalidade humana. Nesta perspectiva, a personalidade é
conquista de cada um e supõe um esforço pessoal de autoconstrução em função das
normas sociais e culturais vigentes. Mas cabe ao educador “(...) desenhar o tipo de
sujeito humano e de sociedade que se pretende conseguir através do trabalho educativo
para, em seguida, escolher os meios necessários à realização desse objectivo.” (p. 471).
Assim sendo, a responsabilidade que recai sobre o educador é incontestável, acentuando
mais uma vez a dimensão ética da sua acção; e para levar a cabo esta acção, o professor
precisa de estar imbuído de determinadas características que, permitindo-lhe respeitar a
personalidade dos outros, lhe garantam a possibilidade de efectivamente ensinar e que
são geralmente referidas como “autoridade moral”.
16

Billington (1988), igualmente, fala de autoridade do professor neste mesmo contexto.


Começa por analisar o campo semântico da palavra remetendo-a para o étimo latino
auctoritas e o seu correlato auctor que designa o que é pioneiro ou iniciador de ideias,
imagens ou caracterizações. Após referir que o professor é geralmente considerado
detentor de autoridade ou, pelo menos, como devendo possuí-la, interroga-se sobre as
bases em que tal autoridade assenta e o modo como se relaciona com a educação no seu
duplo sentido etimológico.

Quanto à autoridade moral, pensa que é pela atitude do professor face à tarefa educativa
que ela se revela e que apresenta duas características distintivas: a primeira consiste no
facto de o professor indicar, pelo modo como se relaciona com o seu trabalho, que a
tarefa educativa, comum a professores e alunos, possui valor intrínseco; aprender é um
valor em si, sem precisar de motivações extrínsecas. Este professor compromete-se com
o sentido educere da educação, seja qual for o objecto do seu ensino. A segunda
característica, intimamente ligada à anterior, é a da capacidade do professor para
motivar o estudo, sem recorrer ao “fantasma” dos exames finais, o que requer
entusiasmo e empatia com os alunos, sem perder de vista os direitos de ambos os
participantes no processo educativo.

Também na mesma linha se pode ler Gusdorf (1978), apesar das diferenças de discurso,
ao caracterizar a exemplaridade e a autoridade do mestre nos seguintes termos: “(...) é
um exemplo em que nos podemos inspirar, (...) a sua influência reveste a significação de
um apelo de ser, que exorta à edificação da personalidade. (...) a autoridade do mestre
exerce uma acção que a um tempo constrange e suscita a aspiração.” ( p. 255).

É precisamente nesta referência ao ser - ao mesmo tempo princípio orientador e fim a


atingir - que se encontra a especificidade da tarefa educativa, aquela que lhe confere a
dimensão ética e, nessa medida, formativa.

3.2. Deontologia da profissão docente


Dada, então, a natureza ética da profissão docente, atestada por vários pensadores desde
a antiguidade até à contemporaneidade, é legítimo que se pergunte de que modo - ou
modos - será possível passar do nível da normatividade ideal para o da conduta prática;
isto é: como passar dos princípios éticos, válidos para a acção em geral, para uma
deontologia específica da profissão que encontre neles o seu fundamento.
17

No momento presente, parece justificar-se plenamente o crescente interesse da


investigação educacional pelos assuntos de natureza deontológica. Estrela (1993)
justifica este interesse não só pelas perspectivas teóricas que tal reflexão abre, mas
também pelas aplicações práticas que pode vir a ter. E dada a multiplicação e
complexificação dos problemas que afectam as sociedades contemporâneas, cuja
repercussão a escola não pode deixar de sentir, a reflexão deontológica não só se
justifica como se mostra realmente necessária. Ao mesmo tempo, determinados
conflitos gerados na escola, relacionados com práticas menos correctas por parte de
alguns professores, parecem exigir que algo seja feito para minorar, se não prevenir, os
seus efeitos.

Lembra ainda a autora que entre os vários aspectos que permitem caracterizar o
profissionalismo se conta o “ (...) exercício correcto e autónomo de uma função
socialmente reconhecida como altruísta, de que o código ético constitui uma expressão”,
como se fosse uma espécie de “imagem de marca da profissão.” (p. 188)

As principais vantagens de um código adviriam da incrementação de uma identidade


profissional, que se reflectiria na imagem interna e externa da profissão e na afirmação
de autonomia relativamente à heteronomia dos regulamentos provenientes das
instâncias governamentais.

3.3. Modelos de códigos deontológicos


Em vários países, associações profissionais de professores tomaram a iniciativa de
elaborar códigos de deveres; em Portugal, contudo, nunca as associações de professores
deram corpo a qualquer código deontológico que fosse expressão de luta pela autonomia
ou de um ideal de profissionalismo.

Reflectindo sobre este tema, D’Orey da Cunha (1996) começa por comparar o estado da
reflexão deontológica em vários grupos profissionais, colocando de um lado médicos,
juristas e jornalistas e, do outro, professores. Enquanto os primeiros terão desenvolvido
reflexões sistemáticas em torno da deontologia e, na sequência desse processo,
elaborado códigos deontológicos, os segundos, reconhecendo embora a natureza ética
da profissão docente, não consubstanciaram os princípios éticos numa deontologia
codificada.
18

O autor justifica esta diferença recorrendo aos paradigmas que, no seu entender,
suportam os respectivos procedimentos: o paradigma deontológico de médicos e
juristas, dada a natureza liberal de ambas as profissões que estabelecem com o cliente
uma relação directa, é um “paradigma de responsabilidade”; aqui, são as necessidades
do cliente que determinam os deveres tornando-se estes, por sua vez, critérios de
controlo da qualidade profissional. Os professores, em contrapartida, dada a sua
situação de empregados por conta de outrem, seja o empregador o estado ou uma
entidade privada, tomam como referência um “paradigma deontológico de direitos” e os
deveres, de origem administrativa, são-lhes impostos ou, em certos casos, negociados,
sistematizados sob a forma de estatutos ou de contratos; é o caso do Estatuto da Carreira
Docente que consigna os direitos e os deveres dos professores, na sequência de um
processo negocial.

D’Orey da Cunha considera, todavia, que os referidos paradigmas não têm


necessariamente de ser vistos como contraditórios e que, no caso dos professores, por
serem simultaneamente profissionais e empregados, seria pertinente “conciliar dois
paradigmas numa integração criativa” (p. 114). Para esse fim apresenta três sugestões:
que, em todos os actos educativos, o professor coloque sempre o bem dos alunos à
frente do seu próprio “interesse pessoal ou corporativo” (p.114); que, com vista ao bem
educativo do aluno, reivindique empenhadamente as condições óptimas para a
realização do seu trabalho e que, sempre dando a primazia ao bem educativo do aluno,
este possa ter precedência sobre normas emanadas dos empregadores.

Alargando o âmbito do seu estudo, Cunha (1996) dá conta de um projecto de código


deontológico, integrado num seminário da Universidade Católica sobre Deontologia da
Profissão Docente, cujas natureza e estrutura se propõe analisar nos seus aspectos “mais
sensíveis ou mais controversos” (p. 116). Quanto à natureza, depois de referir que um
código não é “uma escritura que narre uma história de salvação e inspire a acção moral
dos fiéis”, nem “um regulamento até ao pormenor daquilo que as pessoas devem fazer”,
apresenta o seu ponto de vista sobre o que ele deve ser: “ cristalização da experiência
ética dos educadores e professores”, tradução de um consenso sobre as soluções
consideradas mais equilibradas e justas face a algumas situações dilemáticas, “para
consideração de todos os profissionais” (p.118). E admitindo que mesmo esta
cristalização possa ser contestada por quem defenda a liberdade de decidir em função
dos seus próprios valores, conclui que o código não deve ser mais do que “um
19

instrumento de consulta à tradição antes de uma deliberação que tenha em conta todas
as exigências da situação” (p. 119).

Quanto à estrutura, propõe cinco pontos organizadores: (1) Preâmbulo; (2) Deveres para
com os alunos: na ordem do seu desenvolvimento integral, do saber, da relação
pedagógica e da isenção; (3) Deveres recíprocos dos docentes; (4) Deveres dos docentes
para com a comunidade educativa e (5) Deveres para com a sociedade.

Também Estrela (1993), depois de ter analisado alguns códigos provenientes de vários
países, pensa ser possível inferir aspectos caracterizadores e distintivos que poderiam
ser resumidos no seguinte quadro:

Quadro 1 - Tipos de Códigos Deontológicos

Origem  Associações sindicais


 Escolas de formação de professores

Estrutura  Com ou sem Preâmbulo


 Com ou sem fórmula de juramento
 Enunciação das normas reguladoras, em blocos ou em capítulos,
seguida ou não da explicitação das condutas incorrectas

Extensão  10 ou 12 normas
 Várias dezenas de normas

Orientação  Relativas aos alunos, pais e colegas


das normas  Relativas à escola, ao público em geral, à profissão, às práticas de
emprego, à associação profissional
 Salvaguarda dos direitos fundamentais do Homem e do cidadão
 Salvaguarda dos valores cuja universalidade se pretende assegurar
A autora não deixa, contudo, de chamar a atenção para as fraquezas dos códigos
elaborados pelas associações de docentes, e que são sobretudo de três tipos: (1)
vinculam apenas os seus membros; (2) possibilitam a coexistência de códigos diferentes
20

numa mesma escola, o que pode ter efeitos contraproducentes na união da classe
justificando, assim, as intenções de muitos professores de se constituírem como ordem;
(3) não possuem força legal, mas apenas força moral, com todas as limitações daí
decorrentes. Em todo o caso, parece ser convicção de M. T. Estrela que as sanções
aplicáveis pelas associações aos seus membros, embora “de carácter moral e psicológico
(...) atingem o infractor no seu bom nome profissional (...) concorrendo para que o
exercício profissional se processe dentro dos limites circunscritos pelas normas
veiculadoras de um determinado conceito de profissionalismo.” (1993, p. 190).

Outra grande vantagem dos códigos deontológicos, explicitamente reconhecida por


muitos investigadores da deontologia docente (Strike e Soltis, 1985; Soltis, 1986;
Blázquez, 1986; Watras, 1986; Nash, 1991; Estrela, 1991, 1993; Cunha, 1996) reside no
facto de proporcionarem um ponto de partida e um pretexto para a reflexão e o debate
em torno dos valores e dos deveres inerentes ao exercício da profissão docente. Cunha
(1996), por exemplo, pensa que o código “pode constituir um instrumento de formação,
tanto de formação contínua de professores já formados, como de formação inicial
daqueles que se prepararam para serem professores”. Blázquez (1986) acentua outro
aspecto, o da “ chamada constante a um sentido mais profundo de responsabilidade por
parte de todas as pessoas implicadas no trabalho educacional.” (p. 495)

4. Método para lidar com adolescentes no processo educativo geral

4.1. A adolescência
São muitas as culturas em que ritos de passagem existem para demarcar o fim da
infância.
Em diversas delas, significa o início da vida adulta. Nas sociedades mais complexas, por
exigir maior formação para o ingresso no mercado de trabalho, a passagem para a vida
adulta pode ser mais longa e menos claramente demarcada.
Para a classe média brasileira, o final da adolescência significa ter competência para
ganhar seu próprio sustento e independência, o que pode acontecer por volta de 22 anos
de idade ou com o ensino superior completo. Todavia, para uma grande parcela da
população, esta fase termina por volta de 16 anos, com a possibilidade legal de ingresso
no mercado de trabalho e, muitas vezes, com uma gravidez não planejada. Nestes casos,
a ocupação não é especializada, resultando em ganhos baixos e pouca probabilidade de
superar o ciclo da pobreza. A adolescência, como um fenômeno cultural, não tem um
21

final demarcado. Dizemos que o fim da adolescência ocorre quando a pessoa assume
papéis sociais adultos, como independência emocional, afetiva e econômica,
possibilidade de responder à legislação, de poder votar, casar se, dirigir etc. São esses
pequenos “rituais” que vão colocando as pessoas no lugar de adultas, deixando a
adolescência para trás.
A adolescência, portanto, é um fenômeno social e cultural que é visto de diferentes
modos, dependendo do contexto social. É diferente da puberdade, que é um fenômeno
universal, uma vez que as modificações do corpo, como crescimento e amadurecimento
orgânico, vão ocorrer de modo semelhante para todas as pessoas, em quaisquer
contextos.
Neste sentido, a adolescência começa com a puberdade, processo que conduz à
maturação sexual ou fertilidade e que significa a possibilidade de reprodução. A
puberdade tem início mais cedo para as meninas, por volta de 11 a 12 anos, e dos 13 aos
14 anos nos meninos.
É acompanhada por mudanças físicas que implicam em um crescimento de forma geral,
independentemente do sexo. Tais mudanças têm desdobramentos psicológicos e é
relativamente comum, nesse período, que tanto meninos quanto meninas fiquem
descontentes com sua nova aparência e seu novo tamanho.

4.2. Desenvolvimento cognitivo


Enquanto desenvolvimento cognitivo, segundo Piaget, os adolescentes chegam ao
estágio mais elevado das operações mentais, que é o das operações formais, quando são
capazes de formular pensamentos abstratos. Podem aprender álgebra e cálculo,
apreciam metáforas e alegorias, pensam em termos do que poderiam ser, imaginam
possibilidades, geram e testam hipóteses (PAPALIA; OLDS; FELDMAN, 2006).
Nesta fase, o adolescente se liberta do concreto e é capaz de, considerando determinadas
situações, imaginar um conjunto de transformações possíveis. Seu desenvolvimento
cognitivo é resultante de um desenvolvimento adequado nos estágios antecedentes, uma
elaboração mais complexa das estruturas sensório-motoras e dos agrupamentos das
operações concretas (DAVIS,1982). Este autor defende que, para o alcance desse
estágio, é preciso um misto de maturação cerebral e a expansão das oportunidades
ambientais.
O pensamento do adolescente se organiza a partir da linguagem ou de outro sistema
simbólico, como a matemática. Por estes caminhos, ele é competente para formular
22

hipóteses, chegando a conclusões que independem da verdade de fato ou da observação.


É capaz de pensar em alternativas de ação, substituindo eventos concretos por
suposições. Isto é, diante de um problema, é capaz de levantar todas as hipóteses
possíveis e, a partir delas, tirar conclusões.
Isso caracteriza o tipo de pensamento desse estágio, o hipotético-dedutivo. Seu
pensamento está além das possibilidades do seu cotidiano (DAVIS, 1982).
Ao final da adolescência, as estruturas cognitivas permitem que o pensamento do
adolescente seja flexível, versátil e reversível, possibilitando o uso de várias operações
cognitivas na resolução de problemas. Tal capacidade de refletir livremente torna
possível o estabelecimento de projetos de vida que orientam a sua ação. Todavia, até
que esse tipo de pensamento lógico se estabeleça, o adolescente experimenta um
período de desequilíbrio, que se apresenta como uma crença ilimitada na sua capacidade
de alterar a realidade. Inicialmente, diante de problemas do cotidiano, as soluções são,
ainda, desprovidas de senso de realidade. É quando almejam profissões sem atentar ao
esforço necessário para chegar lá, pensam em ser astronautas, ídolos de futebol, da
música, ou ainda que vão salvar o mundo.
O fato de valorizarem a convivência com os seus pares pode estar relacionado com a
questão de que o mundo dos adultos sempre tenta demovê-los de ideias fantasiosas, o
que os incomoda. Nessa fase é importante que a escola apresente, nas diferentes
disciplinas, possibilidades de pesquisa e de reflexão, atentando para a viabilidade das
hipóteses explicativas levantadas. Promover fóruns de discussão em qualquer área do
conhecimento, inclusive política, auxilia o adolescente a organizar logicamente suas
ideias, experimentando a oportunidade de vivenciar as soluções propostas, se lógicas ou
não.
Durante a adolescência, é importante que a escola priorize o desenvolvimento de
hábitos de responsabilidade quanto ao estabelecimento e cumprimento de metas reais,
envolvendo a realização de tarefas escolares, de cuidados com seus materiais e com os
ambientes coletivos que frequentam. Considera-se uma boa escola de ensino médio
aquela que:
tem uma atmosfera de organização sem ser opressiva, um diretor ativo
e enérgico e professores que participam da tomada de decisões. O
diretor e os professores devem ter altas expectativas para com os
estudantes, dar mais ênfase aos conteúdos acadêmicos e monitorar de
perto o desempenho dos alunos (PAPALIA;OLDS; FELDMAN,
2006, p. 468).
23

É preciso trabalhar para que os adolescentes entendam as regras e façam parte da


construção delas. Entendendo as regras e os limites, eles acabam por ajudar tanto a
responder a elas quanto a cuidar para que seus pares também o façam. Por isso, não é
eficiente impor com autoritarismo uma regra, muitas vezes sem sentido ou arbitrária,
porque com isso os adolescentes questionam, rompem, sentem-se agredidos e reagem
com agressão.
Adolescentes precisam de limites e orientações que devem, em geral, ser apresentados e
discutidos. Raramente regras e normas devem ser impostas. Alguns exemplos deste tipo
são as que visam protegê-los, como não dirigir sem ter Carteira Nacional de
Habilitação, utilizar uniforme para identificá-los quando vão a um passeio didático, a
necessidade de avaliação das disciplinas, o respeito às pessoas, entre outras.

5. Fases do desenvolvimento cognitivo: particularidades e desafios para a


educação

5.1. A teoria de Piaget: os estágios


Piaget desenvolveu sua pesquisa a partir da observação com seus próprios filhos,
criando um campo de investigação que denominou epistemologia genética, isto é, teoria
do conhecimento centrada no desenvolvimento natural da criança. Segundo ele, o
pensamento infantil passa por quatro estágios, desde o nascimento até o início da
adolescência, quando a capacidade plena de raciocínio é atingida. Para Piaget (1981,
p.32), o primeiro estágio é o sensório motor representado desde o nascimento até os dois
anos de idade aproximadamente, no qual os bebês aprendem sobre si mesmo e seu
mundo, por meio da atividade sensória e motora.

Essa fase é conhecida como a dos reflexos, pois ao nascer à criança herda os reflexos
que permitirão os primeiros contatos com o mundo exterior. Segundo Piaget (2011),
esse período é marcado por um extraordinário desenvolvimento mental, embora não se
dê muita importância por não ser acompanhado de palavras que permitam seguir, passo
a passo, o progresso da inteligência e dos sentimentos, como ocorre em outros períodos.
No sensório motor, o contexto aparentemente desordenado se transforma por intermédio
do movimento e da repetição da ação da criança, surgem os esquemas, que são modelos
de ação interna dos objetos e das pessoas que a criança passa a conhecer em
consequência da vivência que estabelece com os mesmos (BLAJ, p. 16, 2008).
24

O referido autor ressalta ainda, que nesse estágio, o ponto de partida das ações está no
movimento reflexo: sugar e agarrar. Os lábios e a boca podem sentir a forma, textura e
temperatura dos objetos que passam ser concebidos por estas, sensações, bem como
pelo domínio motor que por meio dos exercícios se torna mais refinado. Outro aspecto
relevante está em relação à visão, que passa a ser mais um recurso nesta etapa, onde a
criança começa a focalizar os objetos a segui-los e a conhecê-los. E mais, nesta fase, a
repetição de suas ações e constância do vínculo com as pessoas, dá a criança segurança
para as novas descobertas, ou seja, os bebês respondem basicamente por reflexos
espontâneos e quais vão evoluindo no confronto com o mundo envolvente, e, por isso
mesmo, os primeiros esquemas de ação são esquemas reflexos inatos, como a sucção e a
preensão (Piaget, 1981, apud BLAJ, p.17, 2008).
O segundo estágio Piaget chamou de pré-operatório, referente aos dois anos e
aproximadamente até sete anos, segundo Papali (1998). Nesse período, está à função
simbólica, as crianças raciocinam por imaginação. É possível notar que a criança nessa
fase está presa a uma forma subjetiva de pensar e necessita do concreto para dar
explicações e entender as situações do dia-a-dia. Esta forma rica em detalhes aparece
com clareza no desenho, pois as formas são justapostas, sincréticas e as explicações são
egocêntricas e tudo é possível entrando no pensamento intuitivo e imaginário (BLAJ,
p.19, 2008).
Felizmente, algumas escolas, principalmente as de Educação Infantil, já planejam as
suas atividades de acordo com os estágios do desenvolvimento cognitivo. Nas classes
com crianças entre dois e três anos, por exemplo, não é difícil perceber que elas estão
em plena descoberta da representação, do “faz de conta”. Começam a brincar de ser
outra pessoa, com imitação das atividades vistas em casa e dos personagens das
histórias.
De acordo com a Coletânea de Planos de Estudo da Escola Solange Ana Copetti - Ijuí-
RS (2006, p.10):
Observa-se no cotidiano de nosso trabalho, crianças brincando de faz
de conta, de jogos simbólicos, como costumamos dizer, é a capacidade
que desenvolvemos de representar, de simbolizar, o uso do símbolo-
de considerar uma coisa como sendo outra. Por isso o faz de conta é
um pouco isso: desejar algo e apostar que é possível ter uma solução
criativa para se ter/ser/ viver o que se quer. A brincadeira é o fazer da
criança. É através dela que ocorre as aprendizagens básicas para o ser
humano. Portanto, devemos estimular situações que ela brinque, uma
vez que mesmo sem nenhum brinquedo ela pode realizar atividades
básicas porque o corpo ainda é seu.
25

O apresentado representa uma aprendizagem simbólica. Piaget baseou seus estudos em


atividades lúdicas, sendo o jogo uma atividade espontânea da criança, dessa forma jogar
é simular, imaginar, criar, inventar, sair de si mesmo em relação aquilo que se busca
alcançar, motivado apenas pelo prazer de sua função (Piaget, 1964 apud MACEDO,
2013, p.?)
O egocentrismo é mais uma característica do estágio pré-operatório, pois nessa faixa
etária a criança não consegue ver as coisas do ponto de vista do outro. Conforme
Papalia (2000, p.198), não se trata de egoísmo8, porém compreensão centrada em si
mesmo e. segundo Piaget. está no cerne de grande parte do pensamento limitado das
crianças. O egocentrismo é uma forma de centração: Piaget afirmou que as crianças,
nesse estágio, estão tão centradas em seu próprio ponto de vista que não podem
apreender a visão do outro. Nesta faixa etária dos quatro anos o pensamento caracteriza-
se por centrar-se em determinados aspectos da realidade, sem conseguir abstrair algo
que nele está contido.
Neste ponto é importante destacar o que Zilá Mesquita (1999, p.7) afirma:
O termo ”egocentrismo" é algumas vezes confundido com “egoísmo”,
que significa fazer alguma coisa para benefício próprio, mesmo
sabendo que esse ato não convém ou magoa outra pessoa.
Egocentrismo é diferente de egoísmo na medida em que se refere à
total inabilidade de ver outro ponto de vista. As crianças de três a
quatro anos estão interessadas apenas no que “elas” fazem, e não lhes
ocorrem comparar sua performance com nenhuma outra.

A criança pensa, agindo concretamente sobre os objetos. Ela opera, pensa a realidade,
transformando-a e aos poucos este pensar vai deixando de se apoiar no concreto. Ao
demais, para além dos seus pensamentos expressos, as crianças têm muitos pensamentos
não expressos e, como afirma Piaget, ficam por exprimir precisamente porque são
egocêntricos, isto é, incomunicáveis. Para transmiti-los aos outros, a criança teria que
ser capaz de adotar os seus pontos de vista. “Poder-se-ia dizer que o adulto pensa
socialmente, mesmo quando se encontra só, ao passo que as crianças com menos de sete
anos pensam e falam egocentricamente, mesmo em sociedade com os outros” (Piaget,
1964 apud VIGOTSKY, caderno 29, p. 56).
Na idade de sete a 12 anos aproximadamente, as crianças passam para o estágio de
desenvolvimento denominadas operações concretas. Elas são menos egocêntricas e
podem usar o pensamento, são capazes de distinguir a fantasia, o jogo simbólico da
realidade, possuem melhor compreensão da conservação, da diferença entre aparência e
realidade e dos relacionamentos entre os objetos. A partir dos sete anos, pouco a pouco,
26

a criança vai podendo captar o que se acha aparentemente “escondido” no concreto,


começa a perceber mais em relação aos objetos em si, as relações entre eles. É capaz de
pensar abstratamente, operando a realidade mentalmente (PAPALIA, 2000, p. 257).
A partir dos 12 anos, os adolescentes ingressam no nível mais alto de desenvolvimento
cognitivo, o estágio das operações formais, quando desenvolvem a capacidade de
pensamento abstrato. Nesse estágio adquirem um maior conhecimento de manipular ou
operar com a informação, não estão mais limitados ao aqui e agora, podendo pensar em
termos do que é verdade, podem imaginar possibilidades, testar hipóteses e formar
teorias (PAPALIA, 2000, p.258).
A grande contribuição de Piaget foi estudar o raciocínio lógico-
matemático, que é fundamental na escola, mas não pode ser ensinado,
dependendo de uma estrutura de conhecimento da criança", diz Lino
de Macedo, professor do Instituto de Psicologia da Universidade de
São Paulo. As descobertas de Piaget tiveram grande impacto na
pedagogia, mas, de certa forma, demonstraram que a transmissão de
conhecimentos é uma possibilidade limitada. Por um lado, não se pode
fazer uma criança aprender o que ela ainda não tem condições de
absorver. Por outro, mesmo tendo essas condições, não vai se
interessar a não ser por conteúdos que lhe façam falta em termos
cognitivos. Isso porque, para o cientista suíço, o conhecimento se dá
por descobertas que a própria criança faz - um mecanismo que outros
pensadores antes dele já haviam intuído, mas que ele submeteu à
comprovação na prática (FERRARI, 2013, p.2)

A importância da elaboração de conceitos. partindo dos estágios de Piaget. é


fundamental para que a criança aprenda e construa seu próprio conhecimento, essencial
para seu desenvolvimento motor, cognitivo e emocional. Grandes autores da psicologia
do desenvolvimento. como Piaget, apontam para a importância do ato motor no
desenvolvimento das crianças nas dimensões afetivas e cognitivas.
Segundo Piaget, (1964 apud CHATEAU, 1987, p.33), o corpo é o ponto de referência
no processo e aprendizagem infantil. Agir, movimentar-se ludicamente permite à
criança descobrir suas capacidades de coordenação, percepção, exploração,
concentração e atenção, sendo fundamental ela explorar o corpo, os objetos e interaja
com os outros, para que construa o conhecimento do mundo e conquiste gradativamente
a sua autonomia.
Assim compreende-se que os estágios definidos por Piaget são fundamentais para o
desenvolvimento da criança e para melhor compreender e melhorar a prática
pedagógica.
27

5.2. Aproximações da teoria de Piaget à educação


Conforme já dito, a educação básica necessita de educadores comprometidos e
conhecedores do processo de desenvolvimento da criança, por isso a necessidade de o
professor ter um conhecimento amplo, inicialmente, sobre o desenvolvimento infantil,
compreendendo como e por que a criança de tal faixa etária se comporta de uma
determinada forma, para, então poder influenciar de maneira positiva no seu
desenvolvimento. Sabendo identificar em qual estágio a criança se encontra, propondo
estímulos e/ou atividades adequados.
Considerando que a criança chega à escola com seis anos onde já se inicia o processo de
alfabetização, cabe ao educador propor atividades que atendam as especificidades dessa
faixa etária, adequando o planejamento. É importante ressaltar que é através da ação, do
testar, do usar suas capacidades, que o pensamento se desenvolve. Por isso, devem-se
oferecer materiais concretos para que a criança manipule, observe e toque, interaja com
o mesmo e a partir daí elabore e reestruture seu conhecimento.
Segundo Lefrançois (2008, apud GOMES; GHEDIN, p. 229, 2012), a teoria de Piaget
causou um grande impacto no currículo escolar ao enfatizar que a aprendizagem é muito
mais do apenas deslocar informações de fora para dentro da criança. Desse modo,
surgiu o construtivismo que consiste numa abordagem para ensinar e aprender, no qual
a criança tem papel central e ativo na construção do conhecimento. Esse método
construtivista parte do princípio de que a criança deve ser estimulado a pensar
criticamente e de forma independente, ou seja, que o aluno seja capaz de construir
coisas novas a partir de sua ação e mediação de seu professor.
Para Lefrançois (2008, apud GOMES; GHEDIN, p. 229, 2012), a teoria de Piaget tem
como essência sua ênfase na gênese do desenvolvimento do conhecimento o que
chamou de epistemologia genética. Entretanto, também é uma teoria da aprendizagem,
pois só há aprendizagem se houver desenvolvimento, ou seja, o sujeito desenvolve-se e
com isso aprende sobre o mundo e sobre si mesmo. Maturação, experiência ativa,
equilibração e interação social são as forças que moldam a aprendizagem.
Desse modo, em sala aula é preciso respeitar o momento que o sujeito está pronto para
aprender determinado conteúdo, possibilitando a ele experiências que possa agir
ativamente no processo, conseguindo um equilíbrio entre o que já conhece e aquilo que
é novo e que precisa conhecer através da interação com outros sujeitos. São esses
aspectos que o professor precisa considerar para a efetivação da aprendizagem e
construção de conhecimentos de seus alunos. E, à medida que o sujeito age para se
28

adaptar ao meio, está mobilizando vários processos cognitivos, como o raciocínio,


atenção e o pensamento, que permitem a resolução de problemas, o que consiste numa
atitude inteligente.
A todo o momento o sujeito é levado a resolver problemas, dos mais simples aos mais
complexos, e isso implica a construção de conhecimentos que permitem resolver tais
situações e resolver com sucesso. Piaget propôs para a educação, o desafio de
considerar o conhecimento não como algo acabado, mas sim como um processo de
formação dos diferentes estados alcançados pelo conhecimento, ou seja, o educando
sendo capaz de produzir conhecimentos a medida que aprende pela interação de seu
professor e pela sua ação no processo dessa construção e não apenas como receptor de
informações (GOMES; GHEDIN, p. 230, 2012),
Para Piaget, o principal objetivo da educação é criar indivíduos que sejam capazes de
fazer coisas novas e não simplesmente repetir aquilo que outras gerações já fizeram.
Isso significa dizer que a educação não pode mais trabalhar para que os educandos
apenas memorizem, mas para que estes, além de memorizar, sejam autônomos para
inventar, produzir e criar novos conhecimentos, que esses educandos não conheçam
somente o produto do ensino, mas participem do processo de construção.
Através da teoria piagetiana, o professor pode saber quando ensinar determinado
conteúdo e de que forma deve ser ensinado, pois através dos estágios estudados, é
possível visualizar o desenvolvimento dos sujeitos e o que lhe é possível aprender em
determinado estágio. Isso significa dizer que o professor sabe quando e como ensinar ao
seu aluno e que desenvolvimento pode-se esperar desse aluno, dependendo do estágio
pelo qual está passando. Em suma, é importante respeitar o desenvolvimento do aluno e
a forma como este aprende. É importante também conhecer como o sujeito organiza em
sua estrutura cognitiva as informações recebidas do meio. Somos seres diferentes e por
isso percebemos o ambiente de formas diferentes e damos a ele significados de acordo
como o percebemos.

Isso significa dizer que cada sujeito constrói o conhecimento de acordo como percebe e
organiza as informações em sua estrutura cognitiva, isto é, construímos conhecimento
que nos permitem adaptar ao meio em que estamos inseridos e para, então, resolver os
problemas desse meio. Cabe ao professor possibilitar ao sujeito as oportunidades
necessárias para essa construção. (GOMES; GHEDIN, p. 227, 2012),
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6. Considerações finais
Para este estudo, consideramos a aproximação do conceito de Didática a partir de
Comenius, em sua obra mais importante, Didática Magna, onde ele tenta sistematizar o
processo de ensino, e afirma, a Didática é a “arte de ensinar tudo a todos” (CO-
MENIUS; GOMES, 1966).
Delineia-se um ideal de comportamento profissional pautado por valores
essencialmente éticos (honestidade, solidariedade, tolerância...), exigindo profissionais
dotados de “competência” e “excelência” e capazes de “disponibilidade total”; no
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entanto, é notória a discrepância entre realidade e idealidade da profissão: os princípios


são elevados mas o mesmo não acontece, necessariamente, com os actos.
As referências aos valores e à consciência do dever são feitas pelos dois grupos de
professores, mas são mais numerosas entre os que estão em fase avançada da carreira;
os que estão em fase inicial parecem mais preocupados com os programas das
disciplinas e os conhecimentos teóricos de pedagogia e didáctica específica, o que
poderá justificar-se pela proximidade temporal da formação profissional e do que nela
habitualmente se valoriza
Os professores na fase inicial da carreira mostram-se menos sensíveis ao tema das
ofensas aos princípios: embora se lhe refiram, fazem-no de modo mais abreviado e
menos veemente, excepto no que respeita à realização displicente das tarefas escolares.
É certo que a posse ou o conhecimento de bons princípios não é garantia da bondade da
acção, isto é: deles não se deduz necessária e automaticamente uma acção correcta, nem
do ponto de vista moral, nem do profissional. Contudo, é ainda mais certo que nenhuma
acção educativa consistente se pode realizar sem fundamentos que a sustentem e que a
aprendizagem desses fundamentos deveria ser preocupação prioritária de todos os
professores.
Reconhece-se que as teorias de Piaget contribuíram muito para a educação e continuam
contribuindo, principalmente para pedagogos, a psicólogos, assistentes sociais,
educadores especiais, entre outros. Comentar sobre ele é dizer que o mesmo
revolucionou seu tempo com seus estudos destinados ao desenvolvimento da cognição
humana, desenvolvendo o método clínico de investigação das ideias, não é exagero, ele
ainda tem sido reconhecido mundialmente pelos seus estudos.
A partir dessa concepção, a tarefa de educar crianças no sentido do ensino formal não é
só transmitir conteúdos, mas de favorecer a atividade mental do aluno, instigando-o
apensar e elaborar o seu pensamento para que construa seu próprio conhecimento, suas
próprias hipóteses e sua compreensão sobre determinado assunto.
Conhecer a obra de Piaget, portanto, pode (e deve) ajudar ao professor a tornar seu
trabalho mais eficiente, pois na teoria piagetiana ele é um mediador, e não um mero
transmissor do conhecimento. Além disso, o sujeito professor deve pesquisar sobre
diferentes metodologias, a fim de entender o processo de desenvolvimento da criança.
Importante lembrar que os modelos teóricos são sempre parciais e que, no contexto das
ideias de Piaget em particular, não existem receitas para a sala de aula, mas sim a
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necessidade de se compreender o desenvolvimento biológico e maturacional das


crianças, na tentativa de entender como a sua cognição se apropria das informações.

O professor é o mediador, o instigador, para desenvolver desafios para que o educando


se lance a novas possibilidades, ampliando seu leque de habilidades e conhecimentos.
No entanto, Piaget foi mal compreendido por alguns pesquisadores que entenderam que
o educador deveria lançar a responsabilidade do aprendizado somente a criança, mas
sabe - se que essa concepção é equivocada, porque o professor é um agente da
aprendizagem como mediador e possui também função ativa na tarefa de ensinar.
Nessa perspectiva, é fundamental criar desafios para as crianças, propor situações de
aprendizagens que geram uma desacomodação das experiências já assimiladas, implica
o envolvimento dos educadores, em estarem atentos ao desenvolvimento de seus
educandos independente da área que atuem, e que esses ofereçam e busquem
alternativas para que a criança amplie seu horizonte de desenvolvimento, formando
sujeitos capazes, autônomos, participativos e atuantes na sociedade em que vivemos,
sem discriminação, nem preconceito, valorizando as pessoas pelo que elas são e não
pelo que elas têm.
Cabe lembrar que Piaget foi precursor nos estudos sobre assimilação e acomodação,
conceitos fundamentais para se compreender a aprendizagem, os quais não foram
tratados nesse estudo. O desenvolvimento é algo contínuo no ser humano e depende do
contexto para que possa ser favorável ou não. Diversos aspectos são comuns a muitas
pessoas, o que possibilita trabalhos focais, envolvendo-os. Outros são específicos, frutos
de condições da própria pessoa (a presença de algum tipo de deficiência) ou, ainda,
frutos de condições sociais e/ou culturais (ser índio ou vir de outro país). Em qualquer
dos casos, o professor precisa estar atento para poder compreender e contribuir com o
desenvolvimento dos seus estudantes.

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