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Yvonne Maggie
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O caso aconteceu em São Paulo. Uma senhora procurou a médium Priscila Estephanovichil
para “fazer trabalhos espirituais de cura”. Segundo diz a denúncia feita pela cliente nos autos,
Priscila Estephanovichil, com o passar do tempo, começou a ameaçá-la e constrangê-la a
entregar-lhe altas quantias a fim de solucionar os seus problemas. A médium dizia que “tinha
alguma coisa enterrada no cemitério” contra os filhos de sua cliente e por fim bradou: “vou
acabar com a sua vida, a vida de seus filhos, te pego aqui na esquina” falando que agiria “em
nome dos espíritos ".
“A ameaça de mal espiritual, em razão da garantia de liberdade religiosa, não pode ser
considerada inidônea ou inacreditável. Para a vítima e boa parte do povo brasileiro, existe a
crença na existência de forças sobrenaturais, manifestada em doutrinas e rituais próprios,
não havendo falar que são fantasiosas e que nenhuma força possuem para constranger o
homem médio. Os meios empregados foram idôneos, tanto que ensejaram a intimidação da
vítima, a consumação e o exaurimento da extorsão”.
O Portal do Holanla ao divulgar a notícia com o título “Ameaçar com Macumba é crime,
decide o STJ” abriu para comentários. O debate entre os internautas sobre as religiões e a
crença na magia foi intenso. Um dos duzentos comentaristas, Alexandro Oliveira da Silva,
levantou uma questão de suma importância: “Se for verdade então o STJ deve ter medo de
macumba, não é? ”
Alexandre Oliveira da Silva tem toda a razão. Os ministros da 6a turma do STJ, de fato,
condenaram a acusada por crime de extorsão porque acreditam na capacidade das pessoas
usarem forças espirituais para praticar o mal, ou seja, acreditam na magia tanto quanto os
personagens envolvidos na trama da acusação levada a julgamento.
A médium Priscila foi acusada por sua cliente de usar de sortilégios para extorqui-la e fazer o
mal. Os ministros do STJ parecem que também acreditam na existência de forças
sobrenaturais para praticar o bem e o mal e por isso culparam a ré pelo crime de extorsão.
No meu livro Medo do feitiço, a partir de muitos casos de acusação como este ocorridos no
Rio de Janeiro da Belle Époque, demonstro que o medo do feitiço afeta pessoas de todas as
classes. O nosso sistema jurídico está impregnado desta crença porque criminaliza a prática
da feitiçaria e o curandeirismo desde o primeiro código penal republicano de 1891 no seu
artigo 157:
Para criminalizar, como disse o internauta Alexandre, citado acima, é preciso participar da
crença. A legislação brasileira diferentemente da inglesa na África consolidada na Lei de
Supressão à Feitiçaria de 1892, por exemplo, reprime a prática da magia e aceita a acusação
dos que usam poderes sobrenaturais para o mal. Se o caso tivesse se passado na antiga
Rodésia, hoje Zimbábue, até 2006 quando a lei inglesa foi extinta, a cliente que acusou a
médium seria condenada à prisão além de ter de pagar uma multa por ter denunciado
alguém por atos de feitiçaria.
Podemos dizer que desde o código penal republicano de 1891 e até hoje sob o código penal
mais recente, como se vê pelo processo do STJ cuja decisão foi de março de 2017, nosso
sistema jurídico está imiscuído nos assuntos da magia e juízes e magistrados acreditam que
há pessoas que podem usar meios sobrenaturais para iludir a boa fé de outrem.
Enquanto a lei inglesa deixa o Estado fora da disputa e das acusações que produzem o
feiticeiro, a lei brasileira, desde a República, se imiscui nesse assunto para separar o joio do
trigo, o falso médium do autêntico, a extorsão da verdadeira busca pela cura, como no caso
descrito aqui.
Y
Antropóloga.
v
Autora
o
dos
livros
n
"Guerra
n
de
e
orixá"
e
M
"Medo
a
do
g
feitiço".
Coautora
g
dos
ilivros
e
"Raça
como
retórica"
e
"Divisões
perigosas".
Agraciada
em
2008
com
a
Comenda
da
Ordem
Nacional
do
Mérito
Científico
do
Governo
do
Brasil.
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