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PUC-MG
Belo Horizonte
2005
Rubem Gomes Pereira
Belo Horizonte
2005
A
meus pais Persides e Odete,
minha mulher Silvana
e meus filhos Mariano e Clarice.
Agradecimentos:
Prof. João Francisco de Abreu, Prof. Oswaldo Bueno Amorim Filho, Prof. Charles
Heinz Kohler, Prof. José Flávio Morais Castro, Prof. Cláudio Lhister Marques Bahia,
Profa. Marília Dalva Carneiro, Mariano Santoro Gomes, Maria Fernanda Antunes de
Pádua, Érica Pastor Miranda Soares, Bruno Azevedo e Glória Tupinambás.
RESUMO
1- INTRODUÇÃO.
1.1 Apresentação.................................................................................................. 13
1.2 Regiões metropolitanas: crescimento urbano x meio ambiente............... 20
1.3 O sítio urbano de Belo Horizonte: formação geológica,
geomorfologia, hidrografia e vegetação.............................................................26
1.4 Belo Horizonte: evolução de uma cidade planejada................................... 31
2- FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA.
2.1 O estudo da paisagem como sistema.......................................................... 42
2.2 Cidades sustentáveis: urbanização e natureza......................................... .49
2.3 O uso do geo-referenciamento e do sensoriamento remoto no
estudo da paisagem urbana.................................................................................55
2.4 Legislação urbana e ambiental......................................................................58
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS......................................................................158
ÍNDICE DE MAPAS
1- INTRODUÇÃO
1.1- APRESENTAÇÃO
essencialmente comparáveis."
"A cada instante, há mais do que o olho pode ver, mais do que o ouvido pode perce-
ber, um cenário ou uma paisagem esperando para serem explorados. Nada é vivenciado em
si mesmo, mas sempre em relação aos seus arredores, às seqüências de elementos que a
ele conduzem, à lembrança de experiências passadas. (...) Cada cidadão tem vastas asso-
ciações com alguma parte de sua cidade, e a imagem de cada um está impregnada de lem-
branças e significados."
"A apreensão dos lugares dá-se, necessariamente, a partir de sua forma física, con-
forme diversas abordagens arquitetônicas e geográficas da cidade, e também nos estudos
centrados nos mecanismos cognitivos. Esse fato requer análise do espaço como forma físi-
ca e resultado da ordenação de elementos morfológicos segundo certas leis. Em outras
palavras, é preciso que se observe os lugares como composições plásticas, isto é, elemen-
tos relacionados em conjuntos, ou, ainda, totalidades." (KOHLSDORF, 1996)
FIGURA 01 - Vista de Belo Horizonte a partir da crista da Serra do Curral. No primeiro plano: praça
do Papa, bairro Mangabeiras e parque Mangabeiras.
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Outra visão importante para a definição dos limites de uma área de estudo
dentro de uma área urbana nos é dada pelo arquiteto-urbanista italiano ROSSI
(1982:112-113):
"Supondo que haja uma inter-relação entre qualquer elemento urbano e um fato
urbano de natureza mais complexa na cidade na qual se manifestam, deveremos aclarar a
qual contorno urbano nos referimos.
Este contorno urbano mínimo está constituído pela área-estudo; com este termo
entendo designar uma parte da área urbana que pode ser definida ou descrita recorrendo a
outros elementos da área urbana tomada em seu conjunto; por exemplo o sistema viário.
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"A cidade é condição geral da produção, o que impõe determinada configuração espacial
que aparece como justaposição de unidades produtivas, formando uma cadeia (em função
da articulação e das necessidades do processo produtivo, por meio da correlação entre os
capitais individuais e a circulação geral) que integra os diversos processos produtivos, os
centros de intercâmbio, os serviços e o mercado, além da mão-de-obra. Esse desenvolvi-
mento tem potencializado a aglomeração como exigência técnica decorrente ora do gigan-
tismo das unidades produtivas, ora da constituição de unidades complexas, pela formação
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lizada e das economias locais se faz sobre a paisagem natural que envolve as
cidades e sobre a própria paisagem urbana existente através de um adensamento
proporcionado pela ocupação dos lotes vagos e pela substituição de edificações ho-
rizontais por construções verticalizadas. Os promotores imobiliários fazem uso do
espaço como mercadoria, promovendo a destruição dos antigos lugares em função
de um aumento do seu valor de troca, sem avaliar os danos causados ao ambiente.
Na cidade legal esta ocupação dos espaços é mediada por códigos e legislações que
nem sempre são totalmente compreendidos pela população, o que pode levar a
impactos inesperados sobre o meio ambiente e sobre a qualidade de vida. Na cidade
ilegal, as vilas e favelas vão se adensando cada vez mais, com construções de alve-
naria sem reboco de até três pavimentos grudadas umas nas outras, em situações,
às vezes, de alto risco.
Em ambos os casos, o que se vê é a diminuição da cobertura vegetal urbana,
o aumento das áreas impermeáveis, a destruição das nascentes dos córregos e rios,
a destruição das matas ciliares e a degradação do meio ambiente em suas variadas
formas. A ação antrópica sobre o ambiente urbano e a natureza, no tempo, é vista
por Spósito (2003: 295-296) como se segue:
"A cidade está submetida aos fatores climáticos que determinam seu ambiente de vida
e que são, também, redefinidos a partir dessas aglomerações, cuja densidade construtiva,
demográfica e de liberação e consumo de energia alteram a própria dinâmica climática,
definida em escala bem mais abrangente que a da cidade.
A diminuição da cobertura vegetal, como condição para a densidade construtiva que
caracteriza a cidade, e a reinvenção da vegetação, sob a forma de paisagismo, como adorno
de uma cidade em busca de um passado natural, são outras formas de se ver como a pro-
dução da cidade se relaciona com as dinâmicas e processos constitutivos da natureza.
Assim, problemas urbanos como o da erosão, desmoronamento de encostas, assore-
amento de cursos d'água, constituição de ilhas de calor, falta de áreas verdes, poluição do
ar, sonora e da água, uso de áreas para deposição de lixo são, na essência, problemas
decorrentes do descompasso entre o tempo da natureza - o das eras geológicas - e o tempo
da sociedade - o dos anos, dias, horas..."
A gestão dos recursos naturais das cidades de maneira sustentável deve levar
em conta a manutenção das condições de vida encontradas nos lugares antes das
intervenções urbanas sobre os meios biótico e abiótico. Uma prática
muito comum nas cidades brasileiras é desconsiderar os cursos d'água e conjuntos
arbóreos como elementos estruturadores da paisagem urbana. Os córregos são reti-
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ficados e canalizados passando a misturar suas águas com as águas sujas de rua
captadas pelas redes de água pluvial, eliminando praticamente todas as espécies do
meio biótico, existentes nestes corredores ecológicos que são os cursos d'água e
suas matas ciliares. Na prática os cursos d'água das grandes cidades foram transfor-
mados em avenidas sanitárias pela posição estratégica ocupada pelos vales na
estruturação das cidades, privando a população de um espaço natural com um alto
potencial de uso recreativo.
O crescimento vegetativo da população urbana nas grandes metrópoles, alia-
do à atração que estas exercem sobre as populações urbanas e rurais situadas em
sua área de influência que migram em busca da melhoria de suas condições de vida
no que se refere a emprego, educação, saúde e habitação, trouxeram um crescimen-
to sem precedentes das regiões metropolitanas brasileiras. O inchaço das grandes
cidades feito de forma desordenada e caótica levou, entre outras mazelas, ao cresci-
mento assustador do número de favelas na maioria das cidades brasileiras com mais
de 20.000 habitantes, com todos os problemas que elas trazem junto, tais como a difi-
culdade de saneamento, a violência urbana, as construções em área de risco, o
desemprego, etc.
Além da atração que as grandes cidades exercem sobre a população rural,
devemos considerar também os fatores de expulsão a que ela está sujeita, tais como
taxas de crescimento vegetativo da população em níveis superiores aos que o mer-
cado de trabalho no campo pode absorver e modernização das culturas agrícolas,
com uso de novas máquinas, defensivos agrícolas e produtos transgênicos. Esta situ-
ação explosiva levou os trabalhadores rurais sem-terra a se organizarem em movi-
mentos sociais, tais como o MST (Movimento dos Sem-Terra) que promovem
invasão de terras improdutivas, faixas de domínio das rodovias, terras com proble-
mas de propriedade, etc. pressionando os poderes públicos para a implantação de
uma reforma agrária que inclua o pequeno produtor rural.
A parte deste contingente populacional do campo sem renda que vem para a
cidade vai se somar à população dos excluídos que vivem em áreas consideradas
impróprias para habitação, tais como vertentes com inclinação excessiva (>47%)
sujeitas a desmoronamentos e áreas ribeirinhas sujeitas a inundações constantes.
Esta ocupação espontânea é feita de forma ilegal, uma vez que a lei federal nº 10.257
de 10/07/2001 (Estatuto da Cidade) estabelece a proibição de se construir em ter-
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renos com declividade acima de 47% e nas faixas de domínio dos cursos d'água.
Com o tempo, estas ocupações passam a adquirir um sistema de propriedade seme-
lhante aos assentamentos legais, com parte da população vivendo em moradia
própria e parte vivendo em imóveis alugados. O direito de propriedade dos imóveis
é transferido através de recibos, que ali tem o valor de uma escritura.
Com o aumento da quantidade das habitações faveladas, foram se desenvolvendo e
prosperando atividades urbanas tais como comércio e serviço locais, cultos reli-
giosos, etc. Esta sofisticação da vida urbana nas vilas e favelas tem levado os
moradores a reivindicar do poder público as melhorias urbanas necessárias para bem
viver na cidade, tais como: prestação de serviços públicos (postos de saúde, esco-
las, creches), tratamento das áreas de risco com obras de prevenção contra desliza-
mentos e inundações, pavimentação de ruas e becos para acesso de pessoas e
pequenos caminhões de lixo, micro-ônibus e ambulâncias, construção de
escadarias, energia elétrica, iluminação pública, água, esgoto, telefone e segurança.
Uma outra parte da população de baixa renda das cidades habita nos chama-
dos loteamentos clandestinos e vilas, existentes em áreas afastadas dos centros ge-
radores de emprego, sem infra-estrutura básica tais como saneamento básico, pavi-
mentação de vias, eletricidade, etc. Estes locais também podem ser considerados
como focos de tensão urbana, já que ali convivem jovens e adultos que não são
absorvidos pelo mercado de trabalho e, portanto sem acesso aos benefícios da
sociedade de consumo.
Paralela a ocupação ilegal do solo urbano, temos também o crescimento da
cidade feito dentro dos limites das normas legais, em loteamentos e bairros que pro-
liferam seguindo estatutos legais tais como a Lei federal 10.257 (Estatuto das
Cidades) os planos diretores das cidades, as Leis de uso e ocupação do solo, os
códigos de obra, etc. Esta legislação é debatida pela sociedade organizada em
fóruns específicos onde os representantes dos diversos segmentos presentes, tais
como: moradores das cidades, proprietários do solo urbano, construtores, incorpo-
radores dos empreendimentos imobiliários, comerciantes, empresários, represen-
tantes do sistema financeiro, poder público, etc. sinalizam para os legisladores a
existência de convergências ou divergências de interesses das diversas partes
envolvidas. O texto final de cada lei urbana é portanto, o reflexo das negociações
entre as várias forças políticas envolvidas naquele momento, movidas cada uma
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pelo seu próprio interesse. Este embate nem sempre resulta em melhorias efetivas
para a cidade. Ele pode trazer uma ocupação muito intensa das áreas mais va-
lorizadas, com uma verticalização excessiva das edificações sobrecarregando a
infra-estrutura urbana instalada, com conseqüente queda na qualidade de vida oca-
sionada por excesso de ruído, poluição do ar, engarrafamentos no trânsito, danos à
paisagem natural e urbana, alteração do sistema ecológico urbano, perda da privaci-
dade dos moradores, deterioração das relações interpessoais, etc.
Tendo em vista o aumento da violência urbana, tornou-se comum uma tentati-
va de fuga deste problema através da construção de condomínios com acesso con-
trolado para população de renda mais alta. A conseqüência deste tipo de ocupação
pode ser a substituição da fluidez de circulação entre as diversas áreas da cidade
por um sistema com sua malha urbana descontínua e segregada.
Um outro fator na evolução das cidades que não podemos esquecer é o movi-
mento de globalização das economias mundiais, caracterizado pela substituição das
relações fordistas de produção por um sistema que altera as relações espaço-tempo
até então vigentes. As empresas passam a produzir suas mercadorias com unidades
de produção espalhadas por diversas cidades e países do mundo, o capital é fluido
e pode mudar de país instantaneamente; as relações entre o capital e o trabalho são
flexibilizadas e a organização sindical dos trabalhadores é fragilizada dificultando a
manutenção da qualidade de vida dos mesmos.
Para fazer frente a estes fatores que contribuem para a queda de qualidade
de vida nas cidades e danificam o meio ambiente urbano e natural, vem se debaten-
do no mundo o conceito de "desenvolvimento sustentável", que preconiza um cresci-
mento que não pressione os recursos ambientais e que assegure às comunidades o
controle de suas condições de reprodução desvinculados dos fluxos do mercado
mundial.
FIGURA 02 - Belo Horizonte - Imagem do satélite Landsat 5, 2002. Esta imagem foi captada na faixa
espectral infra-vermelha, mostrando a vegetação na cor vermelha, a água (lagoas da Pampulha e da
Petrobrás) ns cor preta e a mancha urbana nas cores rosa e cinza.
"No Cretáceo, a região do Quadrilátero Ferrífero era uma superfície mais ou menos
nivelada pouco abaixo do atual topo da Serra do Curral, que estava em um nível muito mais
baixo que o atual em relação ao nível do mar.
Um movimento epirogênico (soerguimento continental) alçou toda a região, dando iní-
cio a um processo erosivo intenso, que deixou nova superfície aplainada em nível mais
baixo, onde pontificam serras de Itabirito como a Serra do Curral .
Sobrevém um novo pulso epirogênico, no Terciário, e a erosão começa de novo a
retalhar o então planalto. Mais uma vez as serras de Itabirito e Quartzito resistem mais que
as outras. No extremo oposto o gnaisse é mais profundamente arrasado. Rochas de
resistência intermediária formam saliências relativas, como é ocaso do alinhamento de
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FIGURA 03 - Mapeamento geológico de Belo Horizonte com detalhe da área de estudo (bacia do
Córrego da Serra
FONTE: Instituto de Geociências Aplicadas - Secretaria de Ciência e Tecnologia - MG, 1982
sos d'água.
Belo Horizonte foi criada com a finalidade de substituir a cidade de Ouro Preto
como capital de Minas Gerais, pois a mesma não apresentava as condições
necessárias para o atendimento das atividades administrativas do estado. De acordo
com Andrade e Magalhães (1998) em 1890 o Presidente do Estado Afonso Pena con-
trata o engenheiro Aarão Reis para elaborar um estudo comparativo das localidades
propostas para a futura capital: Belo Horizonte (Curral Del Rei), Paraúna (Município
de Diamantina), Barbacena, Várzea do Marçal (Município de São João Del-Rei) e
Juiz de Fora. A localidade escolhida, de acordo com Kohler (2003) tem sua origem
na Sesmaria de Curral Del Rei, registrada em 1711 pelo paulista João Leite da Silva
Ortiz, sobrinho neto de Fernão Dias, utilizada como entreposto de comércio de gado
proveniente do sertão mineiro e baiano.
Em 17 de dezembro de 1893 o Congresso mineiro determina a mudança da
sede do governo mineiro de Ouro Preto para Belo Horizonte. Para projetar a nova
cidade foi contratado o engenheiro Aarão Reis, que em 1895 conclui o plano da nova
capital de Minas Gerais que é inaugurada em 1897.
A região escolhida para a nova capital é adequada por apresentar uma situ-
ação geográfica favorável ao desempenho de sua função administrativa e por sua
localização estratégica que a habilita a ser um pólo radiador de desenvolvimento do
estado.
Por outro lado a escolha da localização da nova capital pode ser vista como
uma etapa importante na integração de regiões do país ainda isoladas. NAVA(2003)
cita o artigo de Martins de Almeida publicado no vespertino A Noite, do Rio de janeiro
em dezembro de 1925:
"Estamos a mil metros, mais ou menos, acima do nível do mar. Dois panoramas diver-
sos se desenrolam. De um lado é a natureza selvagem da serra, grandes massas brutas de
arvoredo que lhe galgam a lombada e se acumulam embaixo, numa floresta emaranhada e
pujante. De outro lado, é a vista de todo o chapadão longuíssimo; a povoação de Belo
Horizonte, primeiro, alvejando no fundo verde do vale; todo o vale depois, que se estende a
perder de vista; e as serras que o fecham, esbatidas na luz intensa do dia, sucedidas por
outras e outras serras azuladas, que ondulam no horizonte infinito, dando aos olhos a per-
feita e nítida impressão de vagalhões de um oceano sem termo.
Quando se chega ao alto da serra, - por cuja vertente oposta à de Belo Horizonte se
vai à Vila Nova de Lima e às minas de Morro Velho, - é que se compreende a razão do nome
Curral Del Rei, dado até hoje a esta localidade.
Todo o anfiteatro em que se assenta a atual população, cheio de um pasto suculento
e farto, fechado por todos os lados, abrindo por uma garganta estreita para a serra, servia
de fato antigamente, na era colonial, para a engorda do gado que vinha do sertão. Os con-
dutores e boiadeiros armavam os abarracamentos de viagem na garganta da serra, ficando
assim o gado encurralado no anfiteatro por semanas e semanas, até que, suficientemente
refeito de forças e banhas, seguia para o próximo arraial de Contagem, onde era contado,
conforme indica o nome que esse arraial ainda conserva."
" A zona suburbana, apesar de ter uma área três vezes maior que a urbana, tinha uma
extensão de ruas menor que o dobro, além de apresentar muito menos praças e avenidas.
O plano revela, portanto, a semente de um modelo de círculos concêntricos. A zona urbana
era claramente a zona nobre da cidade e a suburbana, a popular. A quase totalidade da zona
urbana, de planejamento mais aprimorado, e a maior parte da zona suburbana e de sítios
estavam localizadas ao sul da barreira constituída pelo ribeirão e pela ferrovia ao longo dele."
"Num pacto estratégico e deliberado, a natureza foi tratada apenas no plano das
grandes configurações da paisagem. É o que demonstram os limites da zona urbana, onde
os elementos naturais condicionaram os sentidos de estruturação e de perspectiva monu-
mental do eixo norte-sul: o vale do ribeirão Arrudas, em plano mais baixo que a Serra do
Curral, em gradativa elevação.
Nesse contexto, a "cidade oficial" se impôs de modo intermediário, entre o vale e a
montanha, incorporando-se nos extremos de seu traçado urbano principal. Mas nessa
relação com a paisagem natural, a ênfase do projeto de urbanização privilegiou a montanha,
conduzindo o sentido principal de crescimento e expansão, numa escalada rumo às
escarpas da Serra do Curral. As águas do ribeirão Arrudas, por sua vez, foram consideradas
como os fundos da área urbana, negando ao seu vale o status de marco espontâneo e li-
near da ocupação espacial mais favorável, no sentido leste-oeste.
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Os trajetos dos tributários do Arrudas também não foram utilizados como referências
naturais na composição do traçado da zona urbana, embora estivessem fisicamente pre-
sentes, atravessando quarteirões, cortando ruas, e à vista em trechos da cidade em seus
primeiros anos. Verdadeiros apêndices na concepção urbanística adotada, todos eles se-
riam progressivamente canalizados em seus percursos dentro do limite do perímetro da
avenida do Contorno. Tal constatação evidencia que, sob o ponto de vista da engenharia
sanitária, a topografia dos terrenos teria sido melhor aproveitada se as avenidas tivessem
sido projetadas ao longo desses cursos d'água."
"Ao longo desse processo, os córregos, primeiro canalizados a céu aberto, foram
sendo gradativamente cobertos por avenidas sanitárias, transformando definitivamente a
paisagem e ocultando a natureza debaixo da terra. A visualização da passagem dos córre-
gos pela cidade foi sacrificada, assim, aos imperativos da necessidade funcional da fluidez
e do aumento da caixa das ruas para o tráfego de veículos."
A maior crítica ao plano de Aarão Reis se deve ao fato do sistema viário esco-
lhido não ter levado em conta a topografia, principalmente nas áreas mais íngremes
e os cursos d'água existentes. Os córregos cristalinos que brotam da serra do Curral
ou foram canalizados quando seu curso coincidia com o traçado das vias, ou corriam
no meio das quadras dificultando a utilização das mesmas. Perdeu-se assim
a oportunidade de se conservar os mananciais de água, o que afetou seriamente o
abastecimento de água potável da capital. Outra conseqüência foi a destruição das
matas ciliares e de áreas de absorção das águas de chuva, o que trouxe sérios danos
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"Ao longo da década de 20, a maior parte das obras de urbanização empreendidas
pelo poder público em Belo Horizonte foram no sentido de consolidar a estrutura lançada a
partir da Planta Geral de 1895, não totalmente implantada. Além dessas, realizaram-se tam-
bém algumas obras que possibilitavam a expansão da cidade: a ampliação do sistema de
bondes em direção a bairros suburbanos como Serra, Calafate, Gameleira, Matadouro,
Bonfim, Prado e Santo Antônio".
"Ponto - porque era o local da Estação dos Bondes. Vejo-a ainda, construção meio de
tijolo, meio de madeira, com três entradas sem portas, pintada a óleo e dotada de um tor-
reão para o relógio. Seu verde era semelhante ao dos pistaches e contrastava, qual outra
cor, com os verdes dos seis renques de árvores da Avenida Afonso Pena e com os mais
numerosos do Parque.(...) Servia de referência. No Bar do Ponto. Em frente ao Bar do Ponto.
Na esquina do Bar do Ponto. Encontros de amigos, encontros de obrigação. O nome acabou
extrapolando, se estendendo, ultrapassando o estabelecimento, passando a designar o polí-
gono formado pelo cruzamento de Afonso Pena com Bahia - local onde termina também a
ladeira da rua dos Tupis.(...) a designação Bar do Ponto excedeu-se psicologicamente e pas-
sou a compreender todo um pequeno bairro não oficial mas oficioso: o que se pode colocar
dentro de um círculo cujo centro seria o da praça e cujo raio cortasse a esquina de Goiás,
um pouco de Goitacases, o cruzamento de Tupis com Espírito Santo, que tornasse a Afonso
Pena, descesse tamoios, entrasse no Parque defronte ao início do Viaduto Santa Tereza e
voltasse à origem depois de reincursionar na espinha dorsal da Afonso Pena. Dentro deste
círculo, tido é Bar do Ponto".
"Serra e Floresta das grandes chácaras; Lagoinha, Calafate e Carlos Prates, pro-
letários; Pernambuco, Paraíba e Santa Rita Durão, aristocráticas e o resto de Funcionários
ainda cheio da Saudade de Ouro Preto; João Pinheiro e Praça da Liberdade dos altos servi-
dores; Quartel das prostitutas errantes, dos hospitais e até dos militares; Bonfim da gente
pobre, dos randevus em roda do cemitério e dos mortos dentro das suas catacumbas".
prefeito José Oswaldo de Araújo (1938/ 1940) para elaborar um "Plano de urbanismo
da cidade", no qual o mesmo propõe, entre outras diretrizes, o prolongamento da
Avenida Afonso Pena, atravessando a Serra do Curral, barreira natural à expansão
da cidade de Belo Horizonte em direção a Sudeste, com um túnel em direção a Nova
Lima.
Consolidam-se a Cidade Industrial, o centro da Floresta, o centro do Barreiro
e o de Venda Nova. As atividades terciárias começam a sair do centro, e o
Governador Juscelino Kubistchek levanta a bandeira "energia e transporte", com
instrumentos para acelerar o crescimento econômico.
Na segunda metade da década de 50, é contratado o grupo SAGMACS para
introduzir na administração da cidade o conceito de Planejamento Urbano. Conforme
Andrade e Magalhães(1998 :61-63), nessa época de grande crescimento, a estrutu-
ra da cidade é classificada de acordo com os denominados "níveis coletivos de vida".
Como exemplo, os bairros da Serra e São Lucas são caracterizados como de "nível
Superior Residencial com deficiência de equipamento, de ocupação mais recente e
densidades variáveis" e o bairro Santa Efigênia (centro de transição) como de "nível
Médio Comercial com ocupação por camadas populares médias e alta densidade".
Nas décadas de 50 e 60 com a concentração de atividades de comércio e
serviços no centro da cidade (figura 05) , a demanda por residências migra para bair-
ros próximos à Av. do Contorno, como Funcionários, Santo Antônio, Carmo, Cruzeiro
e Serra, em edificações unifamiliares e edifícios de apartamentos de 3 ou 4 pavimen-
tos, que atendiam aos parâmetros legais vigentes (Decretos nº 165 de 01/10/1933 e
nº 30 de 01/08/1938).
Na década de 70, o desenvolvimento acelerado da cidade é caracterizado pela
intensificação do uso dos terrenos urbanos, proporcionado pelo desenvolvimento de
novas tecnologias de construção e pela adequação da legislação urbana (Lei de Uso
e Ocupação do Solo de 08/ 12/1976) que permitia o adensamento populacional da
região central e dos bairros da cidade através da substituição das edificações exis-
tentes e da construção de novas edificações com mais pavimentos e ocupando uma
área maior dos terrenos.
É desta época a formação de concentrações comerciais importantes, como a
Savassi, o Santo Agostinho e a Floresta e a intensificação do uso comercial nas vias
mais importantes dos bairros São Lucas, Santa Efigênia, Serra, etc.
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FIGURA 05 - Belo Horizonte na década de 50: Rua da Bahia com Afonso Pena.
Fonte: Acervo do Museu Abílio Barreto.
"O processo de consolidação e adensamento das favelas é típico dos anos 80 e 90:
trata-se da crescente concentração espacial das favelas em algumas áreas, sob a forma de
aglomerados, verdadeiras cidadelas dentro da cidade, como o Aglomerado do Morro das
Pedras e o Aglomerado da Serra com uma ocupação de aproximadamente 50.000 habi-
tantes, que é hoje parte integrante do patrimônio ambiental urbano, representado pela impo-
nente presença da Serra do Curral."
bairros, como São Lucas e Santa Efigênia que concentram os consultórios médicos,
hospitais e laboratórios.
A partir da década de 80 cai a força política dos órgãos de planejamento me-
tropolitano, trazendo conseqüências inevitáveis para o funcionamento da metrópole,
com as prefeituras de cada município da região atuando sem uma coordenação cen-
tralizada e potencializando conflitos de ordens variadas.
A evolução da mancha urbana de Belo Horizonte de 1900 até 1980 pode ser
acompanhada através dos mapas esquemáticos da cidade feitos por Villaça (2001)
no mapa 02, ao qual foram acrescentados os limites da bacia do córrego da Serra,
que é o foco do presente trabalho.
No decorrer de sua existência, a cidade planejada pelos nossos antepassados
foi sucessivamente demolida e reconstruída, tendo em vista a necessidade de novos
espaços urbanos para atender à reprodução do capital. A evolução das técnicas
construtivas e as modificações da legislação urbana permitiram o adensamento pro-
gressivo das áreas urbanas centrais da capital. Este processo levou à destruição sis-
temática das matas existentes nas vertentes da Serra do Curral, das matas ciliares e
de resquícios da vegetação de cerrado, à degradação das águas das nascentes, cór-
regos e ribeirões, ocasionada pelas minerações e pelo lançamento de esgotos e resí-
duos industriais nas suas águas. Aliado a estes fatores, a retificação e canalização
dos cursos d'água e a diminuição da permeabilidade do solo agravaram o problema
das enchentes o que deteriorou bastante a qualidade de vida da população.
Salgueiro (2003: 107), analisa as mudanças na paisagem urbana Belo-
Horizontina ao longo do século vinte:
são responsáveis pelo quadro atual da cidade e reverter esta situação é o maior
desafio para os urbanistas e geógrafos.
42
2- FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
sendo adotado por geógrafos de várias correntes, entre os quais Vital de La Blache,
representante de primeira grandeza da escola francesa, que nos seus escritos
regionalistas incluídos no prefácio à primeira edição do Atlas Geral, conforme citado
por Amorim (1985:25) ,nos diz:
"Eu procurei, neste trabalho, reunir sobre cada lugar o conjunto das indicações
necessárias para obter dele uma visão razoável. A carta política da região a estudar é acom-
panhada de uma carta física; elas se aclaram, uma a outra, e encontram um complemento
em cartas ou figuras esquemáticas para os quais a geologia, a climatologia, a estatística
oferecem o objeto. Esta espécie de "dossier"...constituído, segundo o caso, de uma maneira
mais ou menos completa, tem traços que caracterizam um lugar, a fim de permitir ao espíri-
to o estabelecimento de uma ligação entre eles.(...)
É com efeito, nessa ligação que consiste a explicação geográfica de um lugar.
Considerados isoladamente, os traços que compõe a fisionomia de uma região, têm um valor
apenas factual: eles só adquirem o valor de uma noção científica na medida em que são
colocados dentro de um encadeamento do qual eles fazem parte, única forma de conferir-
lhes sua plena significação. Para tornar esse encadeamento sensível, é preciso esforçar-se
por reconstituir, dentro do que permitem nossos conhecimentos, todos os anéis da
cadeia.(...)
Ao tentar mostrar, assim, um lugar sob diferentes aspectos... eu não tive outro objeti-
vo que o de chamar a atenção sobre o princípio de conexão que une os fenômenos geográ-
ficos."
lugar para lugar, mas também em termos da combinação total dos fenômenos em cada lugar,
diferente daquelas que se verificam em cada um dos outros lugares (...) a Geografia se pre-
ocupa em fornecer uma descrição e uma interpretação cuidadosas, ordenadas e racionais
do caráter variável da superfície terrestre.(...) procura adquirir um conhecimento completo da
diferenciação por áreas do mundo e, portanto , discriminar os fenômenos que variam em
diferentes partes do mundo somente em termos de sua significação geográfica - isto é, em
sua relação com a diferenciação total de áreas. Fenômenos significativos para a diferenci-
ação de áreas têm expressão espacial - não necessariamente em termos de extensão física
sobre a terra, mas como uma característica de uma área de extensão mais ou menos defini-
da".
"o objetivo da Geografia Regional (...) é juntar os diversos resultados dos estudos sis-
temáticos, os aspectos geográficos de outras disciplinas em uma unidade de enfoque coe-
rente, ver a natureza e o que é criado, a parte física e a personalidade, como elementos inti-
mamente relacionados e interdependentes em regiões específicas."
"...é sobre esses arranjos de fenômenos espaciais, e não sobre os fenômenos propri-
amente, que os geógrafos deveriam procurar estabelecer esquemas explicativos asseme-
45
George faz ainda uma crítica ao uso indiscriminado dos métodos e técnicas
quantitativas para o tratamento de dados em geografia e conforme citado em AMO-
RIM (1985: 30) escreve :
"É supérfluo repetir que certos fatos e elementos não se deixam captar pelo cálculo,
ou que sua dimensão escapa à formulação matemática, fatores religiosos, nacionais, das
mentalidades, das estruturas sociais, dos níveis de instrução, dos estados sanitários e
endêmicos, por exemplo. A construção da imagem geográfica deve utilizar as informações
fornecidas por um tratamento quantitativo daquilo que é mensurável, mas ela não deveria
limitar-se a isso".
"O espaço geográfico é o espaço banal, epiderme da Terra. Ele se define, simultane-
amente, como estrutura e como sistema. Fenômeno espacial, ele se caracteriza primeiro
pelas estruturas que o inscrevem no espaço em sentido lato: localização e distância, super-
fícies e volumes, isomorfismos e descontinuidades. Fenômeno de contato, ele forma um sis-
tema integrado no qual se combinam, reagindo uns sobre os outros, elementos abióticos,
46
" O espaço vivido, em toda a sua espessura e sua complexidade, aparece, assim,
como o revelador das atividades regionais, ...com seus componentes administrativos, históri-
cos, ecológicos, econômicos mas, também e mais fundamentalmente, psicológicos...A
região, se ela existe, é um espaço vivido".
Dentro deste enfoque, Haggett faz em 1965, conforme Johnston (1985: 133)
uma descrição do padrão e da ordem nas estruturas espaciais expressas por meio
da decomposição de regiões nodais em elementos geométricos, a saber : padrões de
movimento, canais de movimento ou redes, nós, hierarquias, superfícies e difusão
espacial.
Outro texto que enfatiza os diferentes aspectos dos sistemas espaciais foi
escrito por Morrill (1970): The Spatial Organization of the Society. Morrill sugere uma
estrutura organizadora para o estudo geográfico, tendo como parâmetro apenas a
variável de distância. Conforme JOHNSTON (1985: 136) :
"A explicação da estrutura espacial parte do dedutivo - o que poderia ocorrer sob as
condições mais simples - para o indutivo - como os fatores locais distorcem esta estrutura
"pura". Para começar, o que toda variação local pode introduzir é um risco de se perder de
vista a estrutura subjacente. Muitas teorias locacionais, por conseqüência, enfatizam os
fatores espaciais - sobretudo a distância - que interagem para produzir padrões regulares e
repetitivos".
"A realidade é infinitamente complexa nas ligações entre suas variáveis, mas a análise
sistêmica fornece uma abstração cômoda daquela complexidade, em uma forma que man-
48
"Em Alberti (1401-72), essa imagem aparece no ponto de vista formal, manifestada no
tratamento das ruas, as quais deveriam ser traçadas "à maneira de rios" (Rosenau, 1988).
Nas cidades fluviais sugeridas nos desenhos e descrições dos manuscritos do escultor e
arquiteto Antonio Averlino, conhecido como Filarete (1400-69), e posteriormente, nos proje-
tos que se encontram no Manuscrito B do Instituto de França de Leonardo da Vinci (1452-
1519), detectam-se as preocupações sociais do livre acesso dos trabalhadores e artesãos à
água por intermédio da análise das ilustrações de canais fluviais penetrando nas cidades.
No Alto Renascimento, Thomas More concebeu modelos utópicos de cidade publica-
dos em sua obra A utopia, de 1516. Idealizando 54 tipos de cidades na "ilha da Utopia",
descreveu, na principal delas, a presença das águas delimitando a cidade, os florescentes e
abundantes jardins e o cinturão verde do campo. Nessa obra, segundo Choay, "é possível
ler tanto a nostalgia de uma ordem passada como a intuição futurista de transformações
sociais futuras(...), na medida em que propõe um modelo de organização do espaço
suscetível de ser realizado e com capacidade de transformar o mundo natural. (...) o tema
da natureza incorporado à estrutura urbana apresenta-se na forma de um "naturalismo con-
solador, oratório e formativo, que durante toda a época que vai de 1600 a 1700 tinha domi-
nado a episódica narratividade das sistematizações barrocas", Tafuri (1985, p. 14)."
50
lizada na Inglaterra é a das cidades jardins de Ebenezer Howard (1898). Neste mo-
delo, cada cidade jardim, com população limitada a 30 mil habitantes e rodeada por
um cinturão verde, fazia parte de uma constelação de cidades jardins, espalhadas no
campo.
No início do século XX impõe-se o modelo da cidade modernista. O teórico
mais importante deste momento histórico é o arquiteto francês Le Corbusier, que
51
"a forma assume a função de tornar autêntico e natural o universo não-natural da pre-
cisão tecnológica e, na medida em que esse universo tende a subjugar integralmente a
natureza, num processo contínuo e co-envolvente de transformação, é a própria estrutura
antropogeográfica o sujeito sobre o qual irá incidir o ciclo reorganizado da construção de
imóveis(...)
Seus autores aceitavam e valorizavam a verticalização e outras formas de centraliza-
ção, aliadas, porém, à reconciliação do solo urbano com a natureza. Eram cidades-jardins
verticais, onde as preocupações com a paisagem não se ligavam mais a razões de ordem
romântica - antiurbanas ou antiindustriais -, mas a razões de ordem higiênica, como a inso-
lação e a aeração dos edifícios” (1967, pp.44-6).
RUBEM PEREIRA
FIGURA 07 - Belo Horizonte: Parque das Mangabeiras com bairro da Serra ao fundo.
" uma primeira, em que os assuntos foram apropriados de forma fragmentada nos
estudos sobre políticas públicas, movimentos sociais etc. A segunda e mais importante ver-
tente, em que a questão ambiental passou a ser compreendida como redefinidora das pos-
sibilidades de desenvolvimento humano. E uma terceira vertente, na qual os paradigmas
existentes seguiram o caminho da chamada "ciência normal", procurando estender os mo-
delos, redefinir os conceitos e introduzir novos pontos de vista a fim de dar conta da pro-
blemática iminente."
"A conservação dos ecossistemas e dos recursos naturais é a condição básica para
o desenvolvimento, que diz respeito à manutenção dos processos ecológicos fundamentais,
como a fotossíntese, os ciclos hidrológicos e a reciclagem dos nutrientes."
"A ideologia do meio ambiente se caracteriza pela fusão de três aspectos, quais
sejam:
1. Uma ideologia global referente ao conjunto das relações sociais como
relações da espécie humana com seu meio de vida.
2. Um conjunto de questões, designadas sob o termo ecologia, que remetem em
definitivo à utilização social dos recursos naturais. Essas questões concernem, pois, ao sis-
tema geral das relações cultura/natureza, e não somente ao meio ambiente urbano.
54
RUBEM PEREIRA
grau de verticalização, taxas de permeabilidade do solo, etc. Cada setor urbano tam-
bém possui diferentes níveis de infra-estrutura urbana (água tratada, esgoto, energia
elétrica, telefone), comércio e serviços (saúde, educação, lazer).
A distribuição da população se dará portanto pela capacidade que cada habi-
tante tem de pagar pelos serviços e itens relacionados acima. Ao pobre, sem renda
e sem recursos caberá portanto as piores áreas principalmente as localizadas nas
periferias sem infra-estrutura urbana ou nas favelas localizadas em terrenos
impróprios para a habitação (áreas inundáveis ou sujeitas a desmoronamentos).
Acselrad (2001) assinala que a sustentabilidade urbana só seria possível com
a redistribuição espacial da pressão técnica de populações e atividades sobre a base
de recursos ambientais urbanos. Portanto a questão da sustentabilidade das
metrópoles com a preservação do meio ambiente está estreitamente vinculada à
solução dos problemas sociais, cujo maior vetor é a assimetria na distribuição de
recursos e renda da população.
3.1- INTRODUÇÃO
KOHLER (2003: 30) aborda os estudos do ambiente, lançando mão dos princí-
pios da Geoecologia:
"A bacia hidrográfica do rio São Francisco, em seu sentido amplo, de recepção, trans-
porte e deposição de toda drenagem superficial e subterrânea, abrange uma área de
645.067,2 km2 , contida aproximadamente entre as coordenadas de 13º - 21º Lat. S e 36º -
48º Long. W Gr. Trata-se da terceira bacia hidrográfica do Brasil, e a primeira contida inteira-
mente em território brasileiro, segundo o mesmo critério. O rio São Francisco nasce no
Chapadão dos Zagaias, nos altos orientais da Serra da Canastra, por volta da cota de 1.450
m (Cetec,1983). Percorre 3.160 km rumo norte, atravessando os Estados de Minas Gerais e
Bahia. A partir da altura de Sobradinho (BA) toma curso leste, perfazendo a divisa entre
Bahia e Pernambuco e entre Sergipe e Alagoas, até a foz."
parque, em uma galeria subterrânea que se inicia sob a rua Trifânia, de onde segue
fazendo um caminho em que, ora está debaixo de uma via, ora está atravessando
por debaixo da área ocupada de algum quarteirão. Ainda canalizado recebe as
águas do córrego Mangabeiras, que tem a maior parte do seu percurso canalizado
sob a rua Estévão Pinto. A medida que vai atingindo as partes mais baixas do vale
ele vai aumentando a velocidade, em virtude da retificação dos leitos do córrego e de
seus afluentes, indo desembocar no ribeirão Arrudas, na Avenida dos Andradas,
próximo ao Perrela (mapa 03).
A área de estudo é compartimentada em unidades paisagísticas definidas com
características próprias e com seus limites bem delineados. Estas unidades configu-
ram paisagens urbanas (bairros constituídos por conjuntos de edificações verticais e
horizontais, favelas, vias de circulação de veículos automotores, praças, cursos
d'água canalizados, etc) e paisagens naturais (parque das Mangabeiras e escarpas
da Serra do Curral).
A caracterização de cada um destes compartimentos será feita posteriormente
neste trabalho e o espaço construído e o ecossistema urbano, conseqüência da
ação do homem sobre a paisagem, serão analisados a partir do estudo das relações
entre os diversos elementos que constituem o ambiente urbano, levando sempre em
conta que as relações e conexões entre os eventos ocorrem sempre tendo como
referência as dimensões têmporo-espaciais.
Podemos considerar a bacia do córrego da Serra dividida nos seguintes com-
partimentos ambientais: escarpa íngreme da serra do Curral, parque das
Mangabeiras, bairro Mangabeiras, bairros Serra e São Lucas, vilas do Aglomerado
da Serra (Marçola, N.Sra.Conceição e N. Sra. Aparecida) e bairros da área central
(Funcionários e Santa Efigênia), conforme podemos comprovar nas imagens feitas
pelo satélite Ikonos em 2002 (mapa 04).
As imagens do Ikonos captadas a partir das radioções infra-vermelhas emi-
tidas pelos alvos, são úteis para se quantificar as áreas verdes, uma vez que nas ima-
gens obtidas, a vegetação é percebida na cor vermelha. Pela análise da imagem
(Mapa 04), podemos avaliar a alta concentração de vegetação no parque das
Mangabeiras e na escarpa da Serra do Curral. Nas áreas urbanizadas, o bairro
Mangabeiras é o que apresenta um maior percentual de verde, seguido pelos bairros
Serra, São Lucas Santa Efigênia e Funcionários, cuja área verde é representada prin-
67
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chão.
A topografia da bacia do córrego da Serra é bastante variada apresentando
deste áreas planas, como as situadas próximas ao ribeirão Arrudas, até áreas bas-
tante íngremes, como é o caso da escarpa da Serra do Curral. (Mapa 08). De um
modo geral à medida que nos afastamos das margens do ribeirão Arrudas em direção
à Serra do Curral, as declividades dos terrrenos vão se tornando cada vez maiores
(Mapa 09).
Na parte da bacia contida dentro do núcleo histórico de Belo Horizonte (Santa
Efigênia e Funcionários), situada paralelamente ao Vale do ribeirão Arrudas temos
uma topografia suave com terrenos localizados em sua maioria nas faixas de declivi-
dade abaixo de 5% e entre 5 e 10%.
Nos bairros Serra e São Lucas a predominância é de faixas de declividade
entre 5 e 30%, sendo tembém encontrados terrenos na faixa entre 30 e 47%.
Nas vilas do Aglomerado da Serra os terrenos estão em sua maioria classifi-
cados nas faixas de declividade entre 30 e 47% e acima de 47%. A legislação vigente
proíbe a ocupação dos terrenos com declividades acima de 47%. A alta densidade de
ocupação dos terrenos leva à diminuição da permeabilidade do solo, aumentando a
velocidade das águas de chuva e agravando o problema causados pelas enchentes
e pelos desmoronamentos.
O bairro Mangabeiras, apesar de ter sido implantado em terrenos com
topografia semelhante à do aglomerado da Serra, apresenta uma taxa de ocupação
menor (composto basicamente por residências unifamiliares), o que mantém o solo
com uma taxa de permeabilidade mais confortável, diminuindo as situações de risco.
A escarpa da serra do Curral é quase vertical, com declividades acima de
47%, e por ser voltada para noroeste as condições geológicas favorecem a estabi-
lidade da vertente.
O mapa de orientação de vertentes (mapa 10) foi elaborado associando-se às
orientações solares, as cores seqüenciadas do espectro de luz visível. A escala de
cores utilizada (figura 09) associa a orientação da vertente para Norte com a cor ver-
melha e a orientação da vertente para Sul com a cor azul. Portanto se as cores no
mapa de orientação de vertentes ficam em torno do vermelho (norte), temos uma
área bastante ensolarada e se as cores do mapa ficam em torno do azul (sul), temos
uma área com temperaturas mais baixas e com excesso de áreas sombreadas.
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FIGURA 09 - Escala de cores e orientação solar associada, indicada no mapa de orientação de ver-
tentes (mapa 10).
"A cidade não é apenas um objeto percebido (e talvez desfrutado) por milhões de
78
"1.Vias- As vias são os canais de circulação ao longo dos quais o observador se loco-
move de modo habitual, ocasional ou potencial. Podem ser ruas, alamedas, linhas de trân-
sito, canais, ferrovias. (...)
2.Limites- Os limites são os elementos lineares não usados ou entendidos como vias
pelo observador. São as fronteiras entre duas fases, quebras de continuidade lineares: pra-
ias, margens de rios e lagos, etc., cortes de ferrovias, espaços em construção, muros e pare-
des. (...) Esses limites podem ser barreiras mais ou menos penetráveis que separam uma
região da outra, mas também podem ser costuras, linhas ao longo das quais duas regiões
se relacionam e se encontram.
3.Bairros- Os bairros são as regiões médias ou grandes de uma cidade, concebidos
como dotados de extensão bidimensional. O observador neles "penetra" mentalmente, e eles
são reconhecíveis por possuírem características comuns que os identificam.
4.Pontos nodais- Os pontos nodais são os pontos, lugares estratégicos de uma cidade
através dos quais o observador pode entrar, são os focos intensivos pra os quais ou a partir
dos quais ele se locomove. Podem ser basicamente junções, locais de interrupção do trans-
porte, um cruzamento ou uma convergência de vias, momentos de passagem de uma estru-
tura a outra. Ou podem ser meras concentrações que adquirem importância por serem a
condensação de algum uso ou de alguma característica física, como um ponto de encontro
numa esquina ou uma praça fechada. Alguns desses pontos nodais de concentração são o
foco e a síntese de um bairro, sobre o qual sua influência se irradia e do qual são um sím-
bolo. Podem ser chamados de núcleos.
5.Marcos- (...) Em geral, são um objeto físico definido de uma maneira muito simples:
edifício, sinal, loja ou montanha. Seu uso implica a escolha de um elemento a partir de um
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Vias
RUBEM PEREIRA
FIGURA 10 - Limites da bacia do córrego da Serra: No primeiro plano à direita, avenida do Contorno
com praça Milton Campos e ao fundo a Serra do Curral,com seu perfil danificado pela mineradora
MBR. O bairro Serra apresenta, à esquerda, verticalização intensa ao longo da rua Estévâo Pinto e
no centro da foto, residências horizontalizadas e quintais (reserva para a especulação imobiliária?).
mente, de bicicletas.
Limites
Bairros
"O bairro é uma unidade morfológica e estrutural; é caracterizado por uma certa pai-
sagem urbana, por um certo conteúdo social e por uma função; portanto, uma mudança num
desses elementos é suficiente para fixar o limite do bairro. Também aqui é necessário ter pre-
sente que a análise do bairro como fato social baseado na segregação de classe ou de raça,
nas funções econômicas ou, em todo caso, na camada social corresponde indubitavelmente
ao mesmo processo de formação da metrópole moderna."
82
RUBEM PEREIRA
FIGURA 11 - Escarpa da Serra do Curral tendo ao fundo o pico Belo Horizonte. Percorre paralela-
mente à escarpa, a avenida José Patrocínio Pontes com o hospital Hilton Rocha à direita. À esquer-
da localiza-se o bairro Mangabeiras.
Pontos nodais.
Marcos.
predatória humana.(...) Nas partes íngremes da serra, o clima úmido e fresco expressa-se
numa vegetação mais abundante e rica, enquanto nos mares de morros, ao norte, as mes-
mas chuvas intensas, caindo sobre o solo poroso que abriga a vegetação do cerrado, pro-
duzem um clima seco e quente. A diversidade e a pluralidade de microclimas, característi-
cas da região de Belo Horizonte, são assim garantidas.
"Os impactos ambientais da mineração podem ser sentidos até, por exemplo, em
plena região metropolitana de Belo Horizonte, onde também há intensa atividade minerado-
ra e de grande significado para a economia. Nesse cenário metropolitano, em que se dá o
encontro de forte processo de urbanização com uma atividade mineradora igualmente forte,
destaca-se a Serra do Curral, macrounidade paisagística situada imediatamente ao Sul dos
espaços mais urbanizados da capital do estado.
A grande agressão à Serra acontece por conta da presença de grandes jazidas de
minério de ferro, que fizeram com que uma intensa atividade extrativa ali se desenvolvesse
nas últimas décadas. Em função da mineração, uma parte significativa da Serra vai deixan-
do de existir e até o seu perfil, para quem o observa desde Belo Horizonte , vai gradualmente
sendo modificado e rebaixado. O alinhamento e as encostas imponentes da Serrado Curral
constituem-se certamente, no aspecto mais marcante do conjunto paisagístico que compõe
RUBEM PEREIRA
esse belo horizonte. Do ponto de vista do espaço percebido da capital, a Serra é um de seus
marcos fundamentais, além de ser o único marco paisagístico da região metropolitana indi-
cado por unaminidade pela população em diversas pesquisas."
RUBEM PEREIRA
FIGURA 15 - Crista da Serra do Curral, vista do pico Belo Horizonte. A esquerda a foto mostra a
cava desativada da MBR sendo preenchida pelo lago e a direita o parque das Mangabeiras.
lençol freático, a sua desativação trouxe novamente a água que irá ocupar a cava
com um lago de aproximadamente 100 metros de profundidade (Figura 15).
A preservação e proteção da vertente da serra voltada para o norte e perten-
cente a bacia do córrego da Serra é responsabilidade da administração do parque
das Mangabeiras. A proximidade com as áreas urbanas tornaram esta parte da serra
do Curral vulnerável a incêndios na época das secas, o que destruía regularmente a
sua flora e parte da fauna. Para fazer frente a este problema foi executado um sis-
tema anti-incêndio, com a utilização de tubulações e água proveniente do lago que
cobre a mina desativada na vertente de Nova Lima.
Existem vários projetos para utilização turística da serra do Curral ainda não
implantados. Os mais importantes são a construção de um teleférico ligando o par-
que ao topo da Serra e o de uma trilha para caminhada acompanhando a crista da
Serra no trecho que se encontra sob a jurisdição da administração do parque das
Mangabeiras.
RUBEM PEREIRA
FIGURA 16 - Parque das Mangabeira: estacionamentos, Praça das Águas,
administração e área para esportes.
"Estamos a mil metros, mais ou menos, acima do nível do mar. Dois panoramas diver-
sos se desenrolam. De um lado é a natureza selvagem da serra, grandes massas brutas de
arvoredo que lhe galgam a lombada e se acumulam embaixo, numa floresta emaranhada e
pujante."
"Nesse fim de férias eu trouxera os amigos das anteriores para tomarem conta comi-
go dos domínios da Serra. Ocupamos o Cruzeiro, seu campo de futebol, sua Caixa-d'água
cercada d'araucárias, escalamos Curral de todos os modos possíveis, subimos ao Pico,
95
"A escalada para os cumes se faz, em toda a parte, através de uma sucessão de cin-
turões vegetais que diferem uns dos outros pela fisionomia e pela composição. Nos sopés,
a paisagem das terras baixas galga as primeiras encostas: as raízes da montanha mergu-
lham na ambiência regional.
Mais acima, surge o plano montanhês, revestido de florestas mistas. Em toda a face
da terra observa-se a vocação florestal deste plano: corresponde ao aumento de umidade
devido a altitude.
Mais acima,(...) a vida reflui ao nível do solo neste meio áspero, sujeito aos ventos e
à insolação responsáveis pela exacerbação das evapotranspirações e ao frio e novamente
à insolação que reduzem o crescimento".
As partes mais baixas do Parque, por onde correm os vários cursos de água,
concentram grande quantidade de solo fértil. Isto propicia a consolidação da vege-
tação de grande porte, classificada como mata de galeria e composta de várias espé-
cies nobres como o jacarandá, vinhático, jequitibá, e a quaresmeira, eleita árvore
símbolo de Belo Horizonte.
Em 1996, sob a coordenação do prof. José Luiz Pedersoli, foi desenvolvido um
projeto, parceria da Prefeitura de Belo Horizonte com a UFMG/FUNDEP (publicado
no site da PBH), cujo objetivo era o conhecimento do potencial botânico do Parque
das Mangabeiras, através de coletas e determinação sistemática das plantas com flo-
res, mês a mês, a fim de reconhecer e caracterizar as formações vegetais existentes
determinando famílias, gêneros e espécies. Constatou-se que a família Compositae
representada principalmente pela Erementhus erythopappus é a mais abundante,
seguida pela família Melastomaceae, representada pelos gêneros Miconia e
Tibouchina e também por plantas da família Myrtaceae do gênero Myrcia. Na
pesquisa citada, verificou-se também formações vegetais de cerrado, mata ciliar,
representantes da mata semidecidual estacional de altitude, nos pontos mais altos
algumas espécies de campo rupestre. Foram identificadas cerca de 320 espécies
vegetais, entre as quais podemos citar, através do seu nome popular, as seguintes:
aroeira-branca, araticum-do-mato, mangabeira, ipê-amarelo-do-cerrado, pau-d'arco,
pequi, embaúba, marmeleiro, sucupira-do-cerrado, caviúna-do-cerrado, jacarandá-
do-cerrado quaresmeira, tingui, mamica-de-porca, mutamba, pau-terra, capitão-do-
campo, pau-santo, jatobá-do-cerrado, ingazeiro, angico-rajado e barbatimão.
A fauna do parque é muito variada, tendo sido registrada a ocorrência de treze
espécies de mamíferos não voadores na área: o mico estrela (Callithrix penicillata), o
tatu- galinha, o gambá-de-orelha-branca, a cuíca-de-quatro-olhos, a catita, o esquilo,
o quati, o furão, a raposa, o ouriço-cacheiro, o rato-do-mato, o rato-de-árvore e o
tapeti.
O quati - Nasua nasua - é um dos poucos mamíferos de médio porte que o
Parque das Mangabeiras abriga. Seus bandos chegam a ter mais de 25 indivíduos e,
ocasionalmente, ultrapassam os limites da reserva.
Encontramos no parque a maior concentração de aves do município, cerca de
158 espécies, que corresponde a quase 25% da avifauna do estado de Minas Gerais.
Os répteis são representados por 12 espécies de serpentes e lagartos, e os
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anfíbios por 16 espécies, uma delas descrita cientificamente pela primeira vez no par-
que (espécie de anuro Eleutherodactylus izecksohni).
O parque das Mangabeiras constitui-se em um nicho ecológico peculiar, e sua
sustentabilidade depende da preservação dos diversos fatores que garantem o seu
equilíbrio. Alterações provocadas principalmente pelo homem podem levar a extinção
de espécies e outras alterações ambientais não desejáveis. Pereira e Almeida (2000:
227) alertam:
RUBEM PEREIRA
FIGURA 17 - Palácio das Mangabeiras.
RUBEM PEREIRA
FIGURA 19 - Bairro Mangabeiras: vertente voltada predominantemente para oeste.
RUBEM PEREIRA
BRUNO AZEVEDO
FIGURA 26 - Grelha atirantada de concreto construída no terreno do Palácio das Mangabeiras em
1992 para conter os deslizamentos
FIGURA 27 - Desvio construído para substituir trecho da rua Badi Salum destruido pelos desliza-
mentos.
110
Rafaello Berti e João Camilo Torres, conforme podemos verificar em fotos feitas no
local em 2001, 2003 e 2004 (Figuras 28,29 e 30).
RUBEM PEREIRA
FIGURA 28- Contenção provisória para conter deslizamentos sobre a
rua arq. Rafaello Bertti. Foto de 2001.
RUBEM PEREIRA
Estas vilas estão localizadas nas partes mais altas e mais íngremes dos mor-
rotes típicos da topografia do sul de Belo Horizonte nos contrafortes da Serra do
Curral e juntamente com a favela do Cafezal, vila Novo São Lucas e vila Nossa
Senhora de Fátima compõe o chamado Aglomerado da Serra (Mapa 22).
As vilas altamente adensadas, estenderam sua ocupação sobre áreas de risco
em terrenos com declividades impróprias para a implantação de edificações, localiza-
dos em linhas de drenagem e agravados pela supressão da cobertura vegetal e pelo
lançamento de esgoto a céu aberto (Mapas 23 e 24).
A estrutura geológica da serra do Curral, de um modo geral, apresenta um
mergulho voltado para sudeste, o que torna as vertentes voltadas para noroeste mais
estáveis e as voltadas para sudeste mais instáveis e sujeitas a escorregamentos
(Mapa 25). Os acidentes decorrentes de deslizamentos são freqüentes. As
construções são precárias e inacabadas, com problemas estruturais de diversas
órdens. A paisagem é caótica e fragmentada.
O que se vê é uma comunidade marginalizada dos direitos básicos de cidada-
nia e marcada pela segregação social, econômica, racial, etc.
De acordo com dados levantados no " Plano Global do Aglomerado da Serra",
elaborado pela prefeitura de Belo Horizonte em 2000, através da URBEL, a Vila
Nossa Senhora Aparecida (Figura 31) existe há, aproximadamente, 50 anos. Em
RUBEM PEREIRA
1970, contava pouquíssimos moradores, não existindo nem água nem luz. Os
primeiros moradores buscavam água em dois chafarizes localizados na Rua Mica e
na Rua Oriental ou em uma mina localizada na Rua Monte Alegre onde hoje é o
reservatório da COPASA.
A água chegou na Vila há 15 anos, aproximadamente, primeiramente na Rua
Monte Alegre e de lá era "puxada" para as outras casas.
Foi também nessa época, que a rede elétrica foi implantada. Antes, já existia
em algumas casas em forma de "bicos", sistema usado para fazer ligações clandes-
tinas.
Ainda segundo o Plano Global do Aglomerado da Serra (2000), os primeiros
moradores da Vila Nossa Senhora da Conceição (Figura 32) vieram do interior do
estado principalmente das cidades de Raul Soares, São Pedro dos Ferros, Rio
Casca, Montes Claros, Teófilo Otoni, há mais de 80 anos. Nava (2003: 299) ao des-
crever as chuvas torrenciais que caiam sobre Belo Horizonte na década de 20, assim
se refere aos moradores que já ocupavam os morros da região:
Em 1954 tudo ainda se conservava em estado natural, com muita área verde.
Segundo depoimentos de moradores mais antigos, a região era muito pacífica e os
moradores tinham uma boa relação de vizinhança. Os primeiros barracões eram de
zinco, tábua e papelão. Mais tarde começaram a surgir os primeiros barracos de
adobe e somente por volta dos anos 70 surgiram os de alvenaria.
Em 1970 a luz elétrica chegou à Vila por meio de ligações clandestinas, assim
como as primeiras urbanizações e a rede de água.
RUBEM PEREIRA
FIGURA 32 - Vila Nossa Senhora da Conceição, vista da rua Herval. À direita, bairro da Serra com
Serra do Curral acima.
117
RUBEM PEREIRA
Caraça. A água só veio por volta de 83/84 e ainda hoje existem becos onde a água
é obtida através de ligações clandestinas, pois não há abastecimento oficial (o seg-
mento da Rua Caraça é um exemplo).
Os acessos para as vilas se dão por vias estratégicas. Para acessar a vila
Aparecida são utilizadas as ruas Camões e Monte Alegre; para a vila Conceição são
utilizadas as ruas Pouso Alto e Herval e para acessar a vila Marçola são utilizadas as
ruas Sacramento, Capivari e Caraça (Mapa 26). O sistema viário das vilas é estrutu-
rado principalmente pela rua Doutor Camilo que percorre a crista do morro e pela rua
Bandonion que vai a meia encosta. O sistema viário é complementado por becos que
percorrem o terreno nas curvas de nível e por escadarias que cortam as curvas per-
pendicularmente.
As edificações são geralmente barracos de alvenaria de tijolos cerâmicos fura-
dos ou blocos de concreto sem reboco, podendo atingir até 3 pavimentos. São
implantadas ao longo dos becos e escadarias com soluções às vezes engenhosas,
às vezes um convite ao risco.
A topografia das vilas se apresenta, de um modo geral acima de 47%, declivi-
dade inadequada para ocupação por habitações. Além disso a alta taxa de ocupação
das vertentes diminuem as áreas de absorção das águas de chuva, aumentando os
riscos de deslizamento e desmoronamento.
O adensamento das vilas pode ser comprovado pelos dados do quadro 01,
onde se constata um aumento crescente no número total de domicílios, no curto
período de 6 anos.
QUADRO 01
Quadro Comparativo do Total de Domicílios do Aglomerado da
Serra, por Vilas.
QUADRO 02
Densidade Domiciliar por Vila
QUADRO 03
Tempo de ocupação das Vilas do Aglomerado da Serra (Valores em Percentual)
Vilas/Tempo Conceição Marçola Aparecida
Ocupação
0 a 2 anos 12,1% 18,6% 10,4%
2 a 5 anos 08,7% 16,6% 10,04%
5 a 10 anos 14,7% 18,6% 17,8%
10 a 20 anos 30,0% 21,8% 27,9%
20 a 30 anos 18,4% 15,5% 17,4%
Mais de 30 anos 16,1% 08,9% 16,4%
Média (anos) 17,6 12,8 16,9
Fonte: Contagem de Domicílios - PGE - 1999.
121
QUADRO 04
Domicílios Residenciais/Mistos, População Residente Estimada e Densidade
Demográfica, por Vila do Aglomerado da Serra
QUADRO 06
População de Belo Horizonte e das Administrações Regionais, Taxa de
Crescimento e Densidade Demográfica 1991-1996
QUADRO 07
Vilas do Aglomerado da Serra, Segundo o Número de Domicílio por Edificação
(valores em %)
QUADRO 08
Vilas do Aglomerado da Serra, Segundo a Verticalização (valores em %)
Vilas/Nº Pavimentos 1 2 3 4 + de 4 Nº
N. Sra. Aparecida 45.24 48.98 5.04 0.32 _ 1224
N.Sra.da Conceição 52.04 41.94 5.24 0.26 0.13 1558
Marçola 62.98 34.54 1.91 0.20 _ 1973
QUADRO 09
Domicílios Residenciais e Mistos, por Vilas do Aglomerado da Serra
QUADRO 10
Áreas de Risco Alto e Iminente por Vila
6 2,68 2,84
Hospital Evangélico
FIGURA 37- Praça Esperanto e ruínas da vila Rizzo, marco histórico do bairro da Serra.
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RUBEM PEREIRA
FIGURA 38 - Bairro da Serra, com Hospital Life-center à esquerda. Pode-se perceber a verticaliza-
ção em curso do bairro, com edificações de grande altura ao longo das vias principais. No alto o
Aglomerado da Serra.
"Para quem conhecia a Serra palmo a palmo como eu, reconstruir seu caminho era
fácil. Nossa cidade tinha como último quarteirão antes das escarpas do Curral, o quadrado
formado por Caraça, Ouro, a deserta Palmira e a Rua do Chumbo. Esta e Ouro, daí para
cima viraram trilhas que iam se perder no Arquimedes Gazzio e no atual sítio das
Mangueiras. Quem subia Ouro, tinha de virar à esquerda e pegar o caminho cheio de postes
de alta-tensão que iam na direção de Morro Velho. Do Pico e ali perto, na da Caixa de
Areia."
"Ora, direis, mas não seria melhor? cortar por Ouro, vencer Monte Alegre, Contorno,
Maranhão tudo tão mais direto. Eu vos responderei no entanto que esta zona era cheia de
erosões, buracos,desbarrancamentos, ruas pela metade, matagais, córregos, águas repre-
sadas. Só muito aos poucos a Prefeitura foi completando a cidade e Serra, Cruzeiro,
Funcionários - enfim se conurbaram."
Cruzeiro, a praça da Bandeira e o clube Minas Tênis II. A praça Milton Campos, que
anteriormente era conhecida como praça do Cruzeiro é assim descrita por Nava
(2003: 294) nas suas memórias do ano de 1925:
"Para atrás era a montanha, o Cercado, o Curral que sob um céu que desmaiava, ia
perdendo o verde do mato e o vermelho do chão para esticar-se em todo o horizonte duma
cor violeta dum roxo de quaresma que avançava seus dois braços em direção ao último
clarão do crepúsculo para apaga-lo enfim e desaparecerem por sua vez, na pulverização
azul-marinho e depois negra da noite que se constelava.
Às vezes passávamos a buraqueira de detrás do Cruzeiro, atravessávamos o
Pindura-Saia, subíamos à velha Caixa d 'Água cercada de araucárias. Fixávamos um sol
inverossímil que aumentava de tamanho à medida que se aproximava da fímbria do hori-
zonte."
A delimitação física entre os bairros da Serra São Lucas é a rua Pouso Alto
localizada em uma crista de um dos morrotes característicos da região. Este limite
não é muito bem percebido, pois são muito parecidas as tipologias do sistema viário
e as tipologias das edificações existentes em ambos os lados da Rua Pouso Alto.
O bairro São Lucas está localizado numa faixa estreita de terreno, compreen-
dida entre a Avenida do Contorno e a Vila Nossa Senhora Aparecida. Seu sistema
viário é estruturado principalmente pelas ruas Engenheiro Carlos Antonini, Rua Dante
e Rua Camões. Sua ocupação é predominantemente composta por edificações uni-
familiares e por edifícios residenciais multifamiliares com 3 ou 4 pavimentos.
No projeto da nova capital de Minas Gerais, as áreas localizadas fora do anel
da Avenida do Contorno eram classificadas como pertencentes à chamada zona sub-
134
urbana (bairros Santa Teresa, Carlos Prates, Bonfim, etc) e à zona de sítios (bairros
da Serra e Floresta). Nesta última zona, contíguos aos bairros dos Funcionários e de
Santa Efigênia estão localizados os bairros da Serra e São Lucas. Para as zonas
suburbanas estava prevista a localização de chácaras para produção de produtos
hortifrutigranjeiros. Estes bairros se diferenciam claramente da área urbana pelo
traçado de seu sistema viário, que apesar de ser ainda ortogonal em sua maior parte,
apresenta vias sinuosas, como é o caso da rua do Ouro e da rua Estevão Pinto (anti-
ga Chumbo) e se adequa mais á topografia, diferentemente do traçado viário regular
existente dentro da av. do Contorno, que ignora a topografia, os cursos d'água e a
vegetação existentes.
A existência dos mananciais de águas cristalinas da bacia do Córrego da
Serra, aliada à sua localização em cotas altimétricas elevadas levaram ao aproveita-
mento desta água para atendimento das necessidades de parte da cidade e para
tanto foi construída uma infra-estrutura de abastecimento da qual fazia parte o reser-
vatório denominado "caixa de areia", localizado onde hoje está implantado o parque
das Mangabeiras.
Com a expansão do centro histórico da cidade e com a construção de linhas
de bondes que ligavam o centro às áreas suburbanas e às áreas sítios a partir da
década de 20 (Castriota,1998), a Serra começa a se urbanizar, dando início ao
processo de modificação do uso do solo, com a substituição das chácaras por lotea-
mentos que foram paulatinamente aumentando o adensamento populacional da
região, diminuindo as áreas permeáveis, a fauna e a flora características das fraudas
da Serra do Curral.
O início deste processo foi registrado por Nava (2001: 144-145) em seu livro
de memórias "Chão de ferro", onde descreve o percurso que conduzia à sua mora-
dia no ano de 1918 :
"Ganhava-se a Serra - nesse tempo serra virgem - pela Rua Cláudio Manuel e depois
Chumbo. Aí o bairro começava a tomar seu caráter. À esquerda as casas do Dr. Cícero (azul,
dentro da mata) e a do Desembargador Siriri (verde dentro da mata). Ainda à esquerda, a
touceira de bambus e os atalhos que seriam a Rua Bernardo Figueiredo. Logo depois, à di-
reita, a fachada fechada dos Goulart. Outro pulo para defronte e começavam os muros e as
colunetas da chácara do Estevinho. No Ponto do Bonde, olhando o nascente, viam-se no
meio da copa das mangueiras, os telhados e as vidraças dos Gomes Pereira e olhando o
poente, mais mangueiras, toda uma aléia de mangueiras e no fundo, a casa de D. Carolina.
Ainda havia continuação de rua até em frente ao sobrado branco e misterioso do dr. Aleixo,
135
mas daí para diante, eram atalhos abertos entre matagais e barrancos, cheios de poeiras nas
secas, cheios de lama nas águas, passando defronte do Zé Rizzo, do Seu Abras, da bode-
ga do Albertino e chegando finalmente às veredas que configurariam, com o tempo, a Rua
Caraça. Nessa esquina, mirando à direita - o espigão que levava aos Chalés das Viúvas e à
esquerda - o ladeirabaixo que ia a nossa nova casa. Em frente, o aprumo gigantesco muro
Serra do Curral (...)".
"Quando desci pela primeira vez a Rua Caraça, chutando seus calhaus de crisopaco,
vermelhão, aço e ferrugem - fui ouvindo aos poucos o ruído de águas despencando que ia
aumentando. De Chumbo, Caraça descia em rampa suave até aquele córrego, um dos
muitos que serpenteavam nos mundos indescobertos da Serra. O que eu ouvia, separava
nosso terreno do lote vizinho. Descia das encostas da Serra do Curral, das sesmarias do
Arquimedes Gazzio, passava nos fundos dos latifúndios do Zé Rizzo, do Dr. Aleixo, recebia
a afluência de outro que descia da Caixa de Areia e atravessava a Rua do Ouro,seguiam
mutualmente engrossados por dentro das terras do Gomes Pereira e viravam no corregão
maior que banhava as glebas do Estevinho. Seguia ora a descoberto, ora debaixo de túneis,
dando braços que se juntavam a outros riachos. Acabavam todos no Arrudas, depois no Rio
das Velhas velho, depois nomarroeiro São Francisco, depois no Mar Oceano. Ao atravessá-
lo, paramos no meio da pinguela que o major mandara construir com duas grossas tábuas.
Ele marulhava entresseixos dois metros abaixo, mas o ruído grande vinha de uma cascata
que olhamos deslumbrados. A límpida língua d'água saía de dentro de plantas agrestes, da
vegetação ribeirinha, onde predominavam tufos de samambaias e de avencas gigantescas -
como esguicho parabolando do fundo das barbas lodosas de um mascarrão de mármore
preto. Atirava-se dentro dum banheiro natural cavado por sua força - mas de que seu jato
não turbava a transparência das águas que já ferviam no fundo mineral de cascalho lavado
e relavado. O riacho descia dentro de leito inteiriço feito de ganga de ferro, estrondava
naquele ponto, borbulgava e descia. A visão só tinha três cores - o negro das pedras, o bran-
BRUNO AZEVEDO
FIGURA 39 -Praça Violeta Soter Vargas, local onde até a década de 60 existia a queda d’água
descrita por Pedro Nava.
136
co das águias de prata e o verde var vertarial das ramagens que se sacudiam fazendo sim
e não, sim e não, impulsionadas pelo ar deslocado pelo ímpeto da linda despencada".
RUBEM PEREIRA
FIGURA 40 - Rua Palmira: destruição das galerias subterrâneas durante temporal em abril de 2004.
RUBEM PEREIRA
FIGURA 41 - Garagem de edifício localizado à rua Monte Alegre, após temporal em 2004.
138
RUBEM PEREIRA
FIGURA 42 - Efeitos das chuvas de 2004 na rua Desembargador
Drumond.
renos geralmente obtidos pelo remembramento de dois ou mais lotes. A altura dos
edifícios nos bairros residenciais era limitada a 3 ou 4 pavimentos para atender às
leis de regulamentação urbana da época, notadamente o Decreto nº 165 de
01/10/1933, que estabelecia um gabarito abaixo do qual as construções deveriam
estar contidas. Estas normas foram substituídas em 1976 pela Lei de Uso e
Ocupação do Solo de Belo Horizonte, que permitia uma maior verticalização a par-
tir de novos critérios (taxa de ocupação, coeficiente de aproveitamento, afastamen-
tos obrigatórios, etc.).
A verticalização se disseminou por todo o bairro, mas de forma acentuada em
três focos principais. O primeiro foco está localizado entre a rua do Ouro e a Avenida
Afonso Pena com edificações residenciais multifamiliares e comerciais (Figura 43).
Este fenômeno se explica em parte, pela proximidade e atração exercida pela av.
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FIGURA 43 -Área localizada entre a avenida Afonso Pena e rua do Ouro pressionadas crescente-
mente pela especulação imobiliária.
Fonte: Prodabel- Levantamento Aerofotogramétrico de BH - 1989.
140
Afonso Pena que é um dos principais eixos da cidade e por outro lado, pela existên-
cia nesta área de lotes de grandes dimensões originados das chácaras ali existentes
desde a fundação da cidade.
Na proximidade da av. Afonso Pena, a construção de edifícios residenciais de
alto luxo em terrenos com área variando em torno de 1000 m2 chegando até 7000m2,
proporcionou a preservação de vegetação nativa e de vegetação originária das chá-
caras anteriormente existentes. Infelizmente tal fato não ocorre de maneira genera-
lizada, pois as legislações urbanas já citadas foram muito permissivas, trazendo
muitas vezes como conseqüência, a destruição total da cobertura vegetal e a imper-
meabilização dos terrenos com a construção de garagens subterrâneas, que podem
ocupar toda a área do lote. Este fenômeno pode ser observado pela análise de dois
cenários obtidos através de aerofotos de 1977 e 1989 (Figuras 44 e 45). Num perío-
do de apenas 12 anos podemos comprovar uma verticalização acentuada na região
FIGURA 44 - Foto aérea de área situada entre FIGURA 45 - Foto aérea de área situada entre
av. Afonso Pena e rua do Ouro em 1977. av. Afonso Pena e rua do Ouro em 1989.
Fonte: IGA - Instituto de Geociências Aplicadas Fonte: IGA - Instituto de Geociências Aplicadas
de MG. de MG.
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"O processo aparece sob a forma de uma operação urbana, que aparece como
estratégia de intervenção espacial, sinalizando as novas relações do processo de repro-
dução espacial, em que parcela significativa de solo urbano ocupado é liberado para outro
uso, com a destruição de imóveis e o deslocamento (e/ou expulsão) dos habitantes. O
processo de reprodução espacial envolve segmentos diferenciados da sociedade, com inte-
resses e desejos conflituosos. Todavia, o processo de reprodução espacial revela que os
interesses divergentes podem entrecruzar-se sob a unidade do Estado, que tem inques-
tionável poder de comando.(...) O Estado se utiliza de seu poder de planejador para, "em
nome do interesse público", desapropriar áreas imensas da metrópole (fazendo a terra
mudar de mãos), instalando, na seqüência, a infra-estrutura necessária ao desenvolvimento
da nova atividade, e, com isso, mudando o uso, a função e o sentido dos lugares. Esse
processo não só permite o estabelecimento de uma nova atividade no lugar, mas sobretudo
desencadeia um processo de valorização do solo urbano por meio dos investimentos em
infra-estrutura e do aumento do potencial construtivo da área (até então interditada pela lei
de zoneamento vigente na cidade). A essa situação ainda se deve acrescentar o fato de que
mudanças na área obrigam antigos proprietários a vender suas pequenas propriedades,
criando um aquecimento no mercado imobiliário."
RUBEM PEREIRA
FIGURA 51 - Parte alta do bairro São Lucas. No meio da imagem temos a parte dos bairros
Funcionários e Santa Efigênia que está contida dentro do anel da avenida do Contorno. A direita, a
vila Nossa Senhora Aparecida e acima a parte verticalizada da bacia correspondente à chamada
Região Hospitalar.
Esta é a área ocupada mais antiga de toda a bacia e está contida dentro dos
limites da Avenida do Contorno, portanto dentro do Setor Urbano da cidade projetada
por Aarão Reis (Figura 51). Esta área está localizada nas partes de cotas altimétricas
mais baixas da bacia (Mapa 32), à margem direita do Ribeirão Arrudas, onde
deságua o córrego da Serra. A topografia é quase plana com a maior parte dos
terrenos apresentando declividades entre 0 e 10%, excessão feita para os terrenos
situados no encontro das avenidas Carandaí, Francisco Sales e Contorno, onde
encontramos declividades situadas entre 10 e 30% (Mapas 33, 34 e 35).
A ocupação da área foi iniciada no princípio do século XX com a edificação de
construções no estilo hoje chamado de eclético. São desta época muitas edificações
ainda existentes na região, sendo que boa parte delas se apresenta em péssimo
estado de conservação ou com interferências visuais inaceitáveis (Figura 52)
RUBEM PEREIRA
“ Nas nossas andanças íamos e vínhamos do São Vicente (N.R.- Hospital São
Vicente) à frente da Faculdade. Contemplávamos sua fachada azulada e suja da poeira
vermelha. Olhávamos um instante a face de bronze do busto de Cícero Ferreira. Pegávamos
o passo outra vez e caminhávamos em direção à Santa Casa. Parávamos no meio da Praça
Quinze e olhávamos o frontispício marrom da construção central com os nove degraus da
sua escadaria de granito, a larga porta ogival com pseudovitrais nas bandeiras e as duas
janelas do andar de cima também dum gótico indigente. Mais recuadas e para dentro do
jardinzinho anterior, os renques de janelas à esquerda, da Clínica Médica de Mulheres que
acabava confrontando com as construções nunca concluídas e sempre no tijolo, de nova ala
150
151
da Maternidade Hilda Brandão; à direita da Clínica Médica dos Homens, emparedando com
o Pavilhão Carlos Chagas (onde ficava o anfiteatro de aulas do Balena) e dependências do
seu Ambulatório. Íamos até o portão do São Lucas e apreciávamos ao fundo e ao longe o
risco nítido e metálico da Serra do Curral incisando-o no céu de onde, em pouco, a noite
começaria a subir.”
RUBEM PEREIRA
FIGURA 58 - Encontro das poluídas águas do córrego da Serra com o igualmente poluído ribeirão
Arrudas, próximo ao cruzamento da avenida dos Andradas (limite Norte da bacia do Córrego da
Serra) com avenida do Contorno.2002.
154
inicialmente por favelas que foram vítimas constantes de inundações cada vez mais
freqüentes na época das chuvas (Figura 57). Na década de 80 o ribeirão Arrudas foi
retificado e teve sua seção ampliada, reduzindo a zero os problemas causados pelas
cheias na região. A avenida dos Andradas, que acompanha o leito do ribeirão foi
prolongada e as favelas foram substituídas por edificações em terrenos agora
valorizados pela intervenção urbana (Figura 58)
155
3.5- CONCLUSÕES
Referências Bibliográficas
CARLOS, Ana Fani Alessandri. Espaço- tempo na metrópole, Editora Contexto, São
Paulo, 2001.
CARVALHO, Edézio Teixeira. Geologia Urbana para Todos, uma Visão de Belo
Horizonte, Editora do autor, Belo Horizonte, 1999.
LACOSTE, Yves. A geografia – isso serve em primeiro lugar, para fazer a guerra,
Papirus editora, Campinas SP, 1988.
LYNCH, Kevin. A imagem da cidade, Editora Martins Fontes, São Paulo, 1999.
169
1995.
VILLAÇA, FLÁVIO. Espaço intra-urbano no Brasil, Livros Studio Nobel Ltda., São
Paulo, 2001.