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O crítico de pessoas

Julio Villanueva Chang*

Há dois mil anos, Plutarco dizia que os atos mais destacados de uma

pessoa não revelam nem sua bondade, nem sua maldade. Podemos saber quem

é uma pessoa por seus feitos mais públicos e notáveis? O que define uma pessoa:

o que ela diz, o que esconde ou o que faz? Um perfil é um gênero jornalístico que

tenta explicar alguém a partir destas três perguntas. Em sua forma mais

elementar, um perfil é o retrato de uma pessoa, ou seja, uma explicação de quem

é e de como chegou a sê-lo. Em suas versões mais ambiciosas, um perfil é uma

reportagem, em forma de narrativa e ensaio, sobre uma pessoa singular. É o

relato de sua vida e a biografia do caráter que a governa.

Um perfil tenta dar lógica a uma vida extraordinária: tenta ser um relato

mais ou menos completo da vida e do caráter de uma pessoa, mas também pode

limitar-se ao drama de alguém numa determinada situação de sua vida. Por

exemplo: o perfil de uma pacata mãe de família que em poucos dias se transforma

numa guerreira devido ao sequestro de sua filha. Ou o perfil de um craque do

futebol em decadência que pensa em se aposentar. Às vezes, quem escreve um

perfil só decide contar um episódio da vida de uma pessoa para explicar a

subcultura à qual ela pertence (e todos os preconceitos e mitologias por trás dela).

Assim, por exemplo, podemos fazer o perfil de um ator de sucesso, focando no

fato de ele ser um mulherengo incorrigível e ensaiando a ideia da incapacidade

de amar. Nesse caso, esta história não trataria tanto de narrar o estilo de vida dos

galãs solteirões, e sim de retratar, a partir de um deles, aqueles seres humanos

incapazes de amar alguém. Nesse sentido, se pretende ser memorável, um perfil

deve não só definir uma pessoa no singular, como também universalizá-la dentro
de sua comunidade. Em consequência, este gênero alcança mais leitores ao

converter a história íntima de alguém na história íntima de toda uma legião.

Um perfil é, assim, a escavação de uma personalidade. Seu autor se vale

de uma montanha de entrevistas, documentos e, por fim, de seu olhar seletivo:

comunica o que sabe e o que ignora. E há casos como o de Janet Malcolm, que

evita dar ao leitor a ilusão de que está lendo algo objetivo e prefere evidenciar

sua posição. Nesse sentido, não há gênero no jornalismo mais subjetivo que o

perfil. Os leitores, é claro, sempre esperam que o autor seja responsável pela

autoridade de suas conclusões sobre uma pessoa. Tampouco se trata de

parafrasear uma seleção de declarações que um sujeito dá sobre si mesmo em

entrevistas. O perfil mais desafiador é o que atravessa um oceano (ou um deserto)

de informação e de tempo para tentar retratar uma pessoa.

Um escritor de perfis sabe que enfrenta um gênero tão ambicioso quanto

decepcionante: trata-se de conhecer uma pessoa. Por isso, é o gênero mais

completo e, ao mesmo tempo, o mais falível. "Os grandes artistas nunca são iguais

dois dias seguidos. Melhor assim, pois a irregularidade costuma ser um dos

sinais do gênio", recordava Proust. É preciso ser um pesquisador do

comportamento, um biógrafo ensaísta, um repórter com mentalidade histórica,

um retratista sob juramento. Em suma, alguém que narra e explica com

autoridade um modo de ser humano numa época.

O perfil é um gênero de gêneros. Perfilar uma pessoa pode exigir um

trabalho superior a qualquer outro gênero de jornalismo: a obsessiva busca por

pistas de um detetive, a visão em escala de um historiador, a dúvida metódica de

um ensaísta, a clareza de um professor, o instinto narrativo de um escritor. Trata-

se, em resumo, de: 1. Reportar e contextualizar a vida pública e privada de uma

pessoa. 2. Ensaiar ideias sobre ela e sua comunidade. 3. Narrar e condensar sua

história em cenas e resumos.

O ponto de vista de quem escreve um perfil não é neutro: pode ir da

simpatia à irreverência. Buscar o equilíbrio entre ambas é um trabalho de


dissimulação. Os extremos oscilam entre a adulação e a maledicência. O autor de

um perfil caminha sobre uma corda-bamba cujos extremos são a piedade e a

crueldade. O tempo todo enfrenta decisões éticas: o que contar e o que calar sobre

a vida e a personalidade de alguém, o que iluminar e o que obscurecer. Um

escritor de perfis não assume a postura de um fiscal ou de um advogado. Seu

trabalho não é apresentar provas, e sim ensaiar explicações com a maior

autoridade possível. Sem ela, um perfil pode acabar sendo uma cortesia, um

linchamento ou apenas um mal-entendido. É fácil ser bom e é fácil ser mau: o

difícil é ser justo.

Nem todos merecem um perfil. Excentricidade, fama e tragédia não são

condições suficientes para um perfil. O ideal é que o personagem alcance a

estatura de um símbolo. Tampouco é imprescindível entrevistar o protagonista

da história para conseguir um grande perfil (como nos casos de "Frank Sinatra

está resfriado", de Gay Talese, ou "O imperador" de Ryszard Kapuscinski). Nesse

sentido, o perfil por excelência é o obituário, este retrato entre o epitáfio e a lápide

que se escreve sobre a vida de um morto fresco. Um escritor de perfis é um crítico

de pessoas.

Depois de ler um perfil, se ele é bom, um leitor sabe se gosta ou não da

pessoa que acaba de "conhecer". Há, no fundo de qualquer perfil, um conteúdo

exemplar que encanta mesmo quem não tem o hábito de ler, pelo simples fato de

que precisamos de modelos para viver. Sem se propor a isso, um perfil acaba

sendo um texto de autoajuda.

Escritor peruano, fundador da revista de jornalismo literário Etiqueta negra.

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