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Partitura

Em "A Canoa Virou" o objetivo mais importante foi reviver o DEZEMBRO/ 2008 NÚMERO 3
folclore. Também foram trabalhados a pulsação, o compasso e
o contra tempo. O acompanhamento com instrumentos de
percussão também pode ser feito com batidas de mãos e pés.

“Que o trabalho Orff-Schulwerk


gere um efeito vivo no Brasil”
Vasculhando relatos publicados
A Canoa Virou nos anos 60 e 70 pela Orff-
Schulwerk Informationen, a
melodia folclórica revista bienal do Instituto Orff,
arranjo: Walkyria Passos Claro a professora emérita de
Didática da Dança, Barbara
Haselbach, conseguiu resgatar
as primeiras articulações da
Pro Arte para criar um curso de
educação artística nos campos
da música, da pintura e do
movimento no Brasil. É esta
viagem no tempo que
estendemos aos colegas da Hermann Regner (1928-2008) foi um dos grandes nomes do
ABRAORFF e que ela deseja Instituto Orff e ajudou a divulgá-lo ao redor do mundo.
lançar como perspectiva para
um futuro de muitas
realizações no país.
Veja a entrevista na página 4.
Obrigado, Professor Regner
A presente edição do Jornal da de seu falecimento o relato de sua
ABRAORFF é inteiramente vinda ao Brasil, há mais de 45
dedicada a Hermann Regner, anos – um dos últimos textos que
que faleceu no último dia 29 de escreveu antes de morrer e que
dezembro de 2008 por respeitosamente aqui publicamos,
problemas de saúde. na página 3, na forma original em

Compositor, pedagogo musical, que foi redigido.


“Mostramos o que há por
trás da linguagem musical” professor e durante muitos anos Confira também nas próximas
Pautada por esta premissa, diretor do Instituto Orff da páginas o depoimento da
Walkyria Passos Claro fundou a
escola Escala Atividades Musicais Universidade Mozarteum de musicista Adriana de Oliveira
em parceria com a filha, Cynthia Salzburgo, na Áustria, Regner
Lachèze. A pianista criou e Ribeiro, que representou o
desenvolveu a “orquestra de nasceu em 1928, em
bebês”, para ensinar noções de Brasil em 1968 no IV Curso
música a crianças de oito meses Marktoberdorf, Alemanha, e Orff Schulwerk, em Lisboa, e o
a dois anos de idade. O método
é atualmente adotado por várias ministrou seminários e cursos de Helder Parente Pessoa,
escolas brasileiras e também em
outros países. Mãe e filha sobre Orff-Schulwerk ao redor sócio benemérito da
tiveram contato com Herman
Regner, cuja influência foi do mundo. ABRAORFF, recomendado por
determinante na atuação
profissional delas. O Jornal da ABRAORFF teve o Regner e Barbara para estudar
Acompanhe o bate-papo na página 5. privilégio de receber pouco antes no Instituto Orff, em 1967.
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Uma surpresa. E Helder estreita
Editorial relações com o professor Regner
Sócio benemérito da ABRAORFF, Helder Parente Pessoa conta como
ficou mais próximo do ex-diretor do Instituto Orff em Salzburgo.
O desafio de manter a chama sempre acesa
Em 1967, resolvi me inscrever no Salzburgo e duas candidatas eram
Este número do Jornal da ABRAORFF vai ficar Agora, com o falecimento do professor Regner, Curso de Férias da Pro Arte, em as mais cotadas: uma do Rio
na nossa memória para sempre. seu exemplo se torna ainda mais significativo e a Teresópolis, para ter aulas de flauta Grande do Sul e a outra de Niterói.
divulgação de seu trabalho, imprescindível. com Odette Ernst Dias. Esta, uma conhecida minha,
O ano de 2008 terminou com a notícia do Autodidata em flauta-doce, sem possuía anos de estudo de piano e
falecimento do professor Hermann Regner, Assim, esta publicação traz, além de um dos nenhum treinamento acadêmico em era por quem eu obviamente torcia.
últimos textos escritos por ele, os depoimentos de música, eu já fazia parte do Foi nessa ocasião que tive as
diretor do Instituto Orff da Universidade Conjunto de Música Antiga da
Barbara Haselbach, Walkyria Passos Claro e primeiras aulas de flauta-doce com
Mozarteum de Salzburgo, na Áustria, membro- Rádio Ministério da Educação e Carolyn Rabson e dela soube da
diretor da Fundação Carl Orff e consultor nas Cynthia Lachèze, que trabalharam diretamente Cultura e dava aulas de flauta-doce existência da American Recorder
adaptações internacionais de Orff-Schulwerk – a com o ex-diretor do Instituto Orff. Também em algumas instituições no Rio de
Society e da CAMMAC. Fui
publicamos as palavras de Helder Parente Pessoa Janeiro.
quem queremos homenagear neste momento. recomendado por Carolyn a
e Adriana de Oliveira Ribeiro, que o conheceram Logo no início do curso, Maria participar das oficinas de verão em
Por este motivo, a terceira edição de nosso jornal de mais perto. Amélia Martins – pessoa iluminada ambas instituições, que deram um
– me perguntou se eu estava jeito no meu som, até então
é dedicada a esta personalidade especial, que fazendo o curso de Orff com dois
tanto fez pela propagação da pedagogia Orff. Esta foi a forma que encontramos para professores da Áustria. Quando
dominado por um vibrato capríneo.
homenagear um dos mais importantes disse que não, ela respondeu que eu Nas aulas de Orff fui escolhido para
Curiosamente, pouco antes da sua morte, a representantes do Orff-Schulwerk em todo o tinha de fazer, já que estava tocar um cânone de G. Keetmann,
diretoria da ABRAORFF já estava pensando em mundo e manter viva a sua memória. Estamos trabalhando com crianças. E com Barbara Haselbach na outra
seguindo de muito perto o seu exemplo: acabou me dando uma bolsa. 'Onde flauta, e fazer o solo de ‘Tava
se congratular com o professor Regner, já se viu, você, nosso professor, chovendo, tava chuviscando’
retratando sua atuação no Brasil, bem como a de multiplicando informações e conhecimento na perder essa oportunidade por falta (Canções das Crianças Brasileiras), convidou para jantar e anunciou
alguns musicistas – dos quais quatro brasileiros área de educação musical. de dinheiro!', indignou-se. com muitos problemas por conta do que eu – eu! – havia sido o indicado
– que tiveram contato mais próximo com ele, aqui Não preciso dizer que me diverti meu agudo. Lembro-me que por Regner e Barbara para estudar
Gostaria de deixar também um agradecimento muito. Afinal, pertencia a um grupo Hermann Regner me dizia para
e no exterior. Afinal, suas contribuições fazem no Instituto Orff!
especial ao Colégio Santo Américo, cujo apoio de professores e alunos de música fazer suave, sem forçar, que eu
parte de nossa história e precisavam ser Foi assim que conheci estas duas
tem sido fundamental para a realização das de altíssimo nível. conseguiria. pessoas maravilhosas, que mudaram
registradas. atividades da ABRAORFF. Corria um boato que um aluno seria E, pasmem: na véspera do fim do completamente a minha vida e a
indicado para uma bolsa em curso, o diretor Gilberto Tinetti me quem serei eternamente grato.
Elisabeth Peissner Sertorio
Presidente da ABRAORFF

ABRAORFF: participação crescente a cada ano

Em fevereiro de 2008 foi realizada Em Recife também foram Ainda em novembro foi realizada a
a eleição da nova diretoria da promovidos encontros durante este oficina “Body Music”, que contou
ABRAORFF em Assembléia Geral ano. Cada vez mais, as idéias com a participação de Keith Terry,
Jornal da ABRAORFF Ordinária, de acordo com o pedagógicas do Orff- Schulwerk dos Estados Unidos, em parceria
estatuto da entidade. Na estão sendo difundidas pelo país. com o Núcleo Barbatuques de
Ano 3 Edição nº 3 Dezembro 2008 presidência e como primeira Percussão Corporal. Percussionista
tesoureira permanecem, No segundo semestre de 2008, foi
e dançarino rítmico, Terry é
Jornal da ABRAORFF é uma publicação Atual diretoria da ABRAORFF respectivamente, Elizabeth promovida a oficina “Cantando,
Dançando, Tocando e Criando!”, conhecido por sua música corporal
anual da Associação Orff Brasil. Peissner Sertório e Mayumi Takai.
em setembro, a cargo de Gabriela inovadora, que literalmente
Presidente: Presidente: Na vice-presidência, Gabriela Vasconcelos Abdalla. As oficinas incorpora ritmos sólidos e danças
Elisabeth Peissner Sertorio
Elisabeth Peissner Sertorio Vasconcelos Abdalla assume o são uma iniciativa da ABRAORFF altamente energéticas. Keith Terry
Coordenação Geral: lugar de Helder Parente, que passa para promover as idéias ministrou a oficina no Colégio Santo
Kelly Soraya Marques Vice-presidente: à condição de sócio benemérito, pedagógicas do Orff-Schulwerk. Américo, com apoio da ABRAORFF.
Coordenação Editorial: juntamente com D. Gabriel Iroffy e
Fabie Spivack - Fasmidia Gabriela Vasconcelos Abdalla Verena Maschat. Kelly Soraya
Marques e Silvia Salles Leite
Produção Gráfica / Design: 1ª Tesoureira: Lombardi foram designadas como
Jayro Mazzi Junior - Escritório Gráfico primeira e segunda secretárias,
Fotografias: Mayumi Takai respectivamente, e Thiago Abdalla
Beatriz Weingrill e Arquivo ABRAORFF passa a fazer parte da diretoria
2ª Tesoureiro: como segundo tesoureiro.
Impressão: Tiragem:
SR Gráfica 2000 exemplares Thiago Abdalla Nesta Assembléia também foi
Website: E-mail: realizada a prestação e a aprovação
www.abraorff.org.br inf@abraorff.org.br 1ª Secretária: das contas referentes ao período
Kelly Soraya Marques anterior (2006/2007).
Apoio:
Colégio Santo Américo Em São Paulo, os encontros do
Proibida a reprodução total e/ou parcial desta publicação.
2ª Secretária: grupo de estudos se deram sempre
Silvia Salles Leite Lombardi aos domingos. A média de
As matérias publicadas nesta edição são de responsabilidade participação vem crescendo a cada
total da Associação Orff Brasil mês e o objetivo de trocar
experiências vem se confirmando. Participantes da oficina “Body Music” acompanham aula de Keith Terry

Este jornal foi impresso em papel reciclado


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“É muito gratificante apresentar a
Minhas primeiras impressões sobre o Brasil
música às crianças”
Adriana de Oliveira Ribeiro leciona música desde os anos 50 no Conservatório Lavignac, em
Santos. Seu método de ensino, unindo som e movimento, despertou interesse num encontro Estive no Brasil pela primeira vez
promovido pela Fundação Calouste em Portugal e lhe valeu o convite para representar o há 45 anos. Já faz muito tempo!
Brasil no IV Curso Orff Schulwerk em Lisboa, em 1968, quando teve aulas com Regner. Lembro-me pouco dos detalhes,
mas este primeiro encontro com
Como conheceu Hermann Regner? Fale-nos do seu método de trabalho escola trabalha a criança pessoas de um outro país, de uma
e da sinergia com Carl Orff. livremente nesse processo até outra cultura, foram significativos
AOR: Foi através de Gilberto chegar aos 15 anos. Se ela quiser para a minha vida. Heitor
Mendes, que iniciou seus estudos AOR: Orff exaltava o ensino da fazer conservatório, ótimo, mas
de música aos 18 anos no música e o movimento: encaixar usando sempre o mesmo sistema. Alimonda, pianista e pedagogo
Conservatório Musical de Santos e depois o movimento no som obtido. Quando escrevi o livro A Música de musical do Rio de Janeiro, visitou a
acompanhou em Portugal o Minha sócia e eu começamos pelo Todos os Tempos, em 2005, foi Escola Superior de Música em
movimento Orff. Juntamente com movimento e com ele chegamos à curioso, porque quem se Trossingen, onde eu dava aulas
Maria de Lourdes Martins, música. Na realidade, já estávamos interessou mesmo pela obra foram para estudantes e crianças.
portuguesa ligada à Fundação dentro da pedagogia Orff, embora os pediatras, os psicólogos e Alimonda gostou muito do meu
Calouste Goulbenkian, eles ainda não tivéssemos um pedagogos. Começaram a mandar
traduziram os primeiros livros de instrumentarium rico. Usávamos trabalho com as crianças: elas
as crianças para cá, porque o
Carl Orff. Em 1966, recebi um marimbinhas de brinquedo, flauta- nosso trabalho foi considerado tocavam instrumentos,
exemplar exatamente quando doce, o canto, a palavra – o que diz terapêutico, leve, e temos improvisavam, inventavam
estava procurando uma resposta, justamente a pedagogia Orff, que recuperado muitas crianças com melodias e textos para conhecerem
porque eu buscava um enfoque necessidades especiais. e aprenderem a amar a música.
diferente no ensino musical Assim, fui convidado por ele a ficar
infantil: tirar do centro os Pelo Lavignac passaram três meses no Brasil, com o auxílio Hermann Regner (ao centro) entre entusiastas da pedagogia Orff
princípios teóricos e colocar no celebridades?
lugar a pessoa e suas do Instituto Goethe e da Embaixada
e colaboradores, em especial Barbara Haselbach (em primeiro
potencialidades. Queria que a AOR: A escola foi criada há mais da Alemanha.
plano, à esquerda), em foto histórica de 1967.
criança usasse a cabeça e o de meio-século, por mim e minha
coração. Em 1968, fui convidada sócia, Dulce Fonseca Dias Pinto, já Recebi um convite para participar
pela Fundação Calouste falecida. Hoje temos cerca de cem de um curso de férias na Pró Arte
Goulbenkian para representar o alunos, a partir dos quatro anos de Brasil, em Teresópolis, uma cidade sempre utilizei todos os música alemã Carl Orff. Ele havia
Brasil no IV Curso Orff Schulwerk, idade. Por aqui já passaram alunos nas montanhas, próxima do Rio de instrumentos que as crianças já publicado, 15 anos antes, sua
patrocinado pelo ISME famosos, como Glaucia Leal, Janeiro. Visto que o meu português tocavam e também os de percussão 'Música para crianças'. Orff me
(International Society for Music pianista renomada que está em naquele tempo consistia só das tradicionais do país. Alguns convidou para visitá-lo e me
Education), em Lisboa. E lá tive Portugal e trabalha atualmente no
aulas com Regner. expressões 'por favor' e 'obrigado', especialistas já conheciam os apresentou ao novo Instituto Orff,
conservatório de lá; Maria Izabel
Araujo; Anete Valim Carvalho eu precisava de ajuda. Tive a sorte chamados 'instrumentos Orff', da Universidade Mozarteum. Um
Como foi sua participação neste Curso? Garten, que fez curso de de contar com Barbara Brieger como carrilhões, xilofones e ano depois, tornei-me um dos
musicoterapia na Alemanha e hoje como assistente compreensiva e metalofones. professores que lá ensinou a
AOR: Fui com Maria Luiza Moura,
que dava aulas no Lavignac e trabalha numa grande clínica competente. Estivemos então em estudantes do mundo inteiro.
européia; as irmãs Campos, Ana São Paulo, na 'Escolinha de Arte Foi um momento de experiência
apoiava meu trabalho. Pagamos a
passagem à prestação e Yara e Mara Campos, que se Moderna' no Rio de Janeiro, na decisiva para mim: as crianças e os Em 1964 foi publicado meu livro
conseguimos bolsa para cobrir as dedicaram à divulgação, e Cristina Universidade de Brasília e em adolescentes tinham tanto prazer e 'Canções das crianças brasileiras',
despesas com hospedagem e Vasques Paccillo, cuja escola talento em tocar esses pela Editora Schott, em Mainz,
infantil segue o modelo Lavignac. algumas outras escolas.
alimentação. Coloquei alguns slides instrumentos... Eu nunca tinha com o qual algumas crianças
na bagagem e parti rumo ao prega esta liberdade toda. Num dos
livros de Orff que recebi pelo Sempre procurei mostrar aos meus vivenciado algo assim na Europa européias puderam aprender a
desconhecido. Quando vi todo o O que é mais importante na sala de
correio, havia um trecho que dizia colegas o caminho pedagógico de até aquele momento. Creio que isso cantar e a acompanhar músicas
instrumentarium e a forma como aula para as crianças?
que a música muda de caráter brincar para aprender; como foi devido aos efeitos das brasileiras. Em 1967 e 1969, desta
eles trabalhavam, pensei: 'O que
estou fazendo aqui? Eu não tenho conforme o clima, a região e as AOR: As crianças precisam ter as conduzir exercícios de pergunta e influências das tradições africanas vez com Barbara Haselbach, estive
nenhum arsenal, não faço nada condições locais. Sempre fomos noções de som e silêncio. No resposta à improvisação livre ou nos brasileiros, durante séculos. novamente em Teresópolis.
disso... A criança tropical é adeptas disso. Afinal, usávamos os momento que é a vez dela tocar, é o por meio de modelos, e como é Conheci novos colegas e vivenciei,
indisciplinada. Muito criativa, é mais variados instrumentos, som para ela; quando é a vez do possível mostrar o meio para a Após a minha volta, escrevi uma
improvisávamos. Quando tomei uma outra vez, com que prazer e
verdade, mas avessa à organização. outro, é o silêncio. Assim, ela reflexão e a compreensão. Por isso, carta ao compositor e pedagogo de
contato com o trabalho de Orff, aprende - sem você precisar usar a desenvoltura o nosso modo de
Então, eu estava começando familiarizar crianças com música e
diferente, nem sabia se estava pensei: esta é a maneira de eu autoridade - a entender o que
cometendo uma heresia. Fiquei o entrar na música dele, só que ela é significam ambos. Em geral, os dança foi aceito. Em 1973 pude,
tempo todo calada, nem ousava me estruturada. No caso da criança meninos escolhem a percussão junto com Heidi Weidlich,
pronunciar. Os europeus partiam brasileira, a estruturação tem de para o acompanhamento, porque é trabalhar mais uma vez em São
de um ensino estruturado, vir depois. Então, eu comecei com mais agitada. Já as meninas optam
'o livre' visando o modelo Orff e, Paulo.
tradicional, e depois chegavam no por instrumentos melódicos,
movimento. Eu fazia exatamente o assim, o adaptei à pedagogia porque elas já têm outra idéia da Tudo isso só foi possível com o
contrário: primeiro o movimento, Lavignac, o que enriqueceu as música. Essa dualidade é
atividades criativas nas áreas de auxílio do Instituto Goethe e da
para depois chegar ao estruturado, importante para entrar na melodia embaixada e, também, devido ao
seguindo o ritmo de cada criança. Música e Teatro. Mantive o contato dentro da música, que é a
com a pedagogia Orff e participei seqüência do trabalho. Temos interesse fervoroso dos colegas do
Quando fui chamada como
representante do Brasil e – em 1976, desta vez sozinha, do XII alunos fazendo cânones e Brasil. Por iniciativa de minha ex-
timidamente – tive de dar o meu Congresso Orff - Schulwerk, em pequenas cenas, trabalhando com assistente, Verena Maschat, a
depoimento, foi uma surpresa Montreux, na Suíça, também como o instrumentário e pequenas cenas colaboração está viva de novo. Os
enorme. Ganhei a admiração de convidada do ISME. montadas dentro deste antigos e talentosos alunos do
todos, e desde então comecei a ser Por conta desta sua visão, o Lavignac instrumental e arranjo: a música Instituto Orff podem agora servir
procurada por psicólogos e tem recebido até crianças especiais... com a cena. É gratificante como multiplicadores e a
psiquiatras. Logo depois recebi da apresentar a música às crianças,
Embaixada do Brasil o dinheiro da AOR: É verdade, as crianças em fazendo-as ouvir e opinar, associação Orff-Schulwerk faz valer
passagem. Foi com ele que comprei geral melhoravam tanto com o acompanhando um ritmo, a sua influência sobre a educação
o instrumentarium que trouxe ao método que usávamos e ao longo cantando uma melodia e tocando de música e dança brasileira.
Brasil, o mesmo que usamos do tempo as mães entenderam que em conjunto. O despertar das Regner considerava que brincar é o melhor caminho pedagógico para aprender.
até hoje. aquilo era uma terapia. A nossa crianças é a nossa recompensa.
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“Sucesso para o trabalho Orff- “Regner me fez crescer musicalmente.
Schulwerk do Brasil” Eu lhe sou grata para sempre”
Professora emérita de Didática da Dança do Instituto Orff, Barbara Haselbach foi Antes de abrir sua escola, Walkyria Passos Claro deu aulas para crianças da favela
resgatar nos anos 60 as primeiras manifestações de interesse da Pro Arte em promover Paraisópolis. Em 1986, proferiu palestra aos professores de música do Curso de Férias do
a educação artística nos campos da música, da pintura e do movimento no Brasil. Instituto Orff. “Lá estavam alunos e professores de música do mundo inteiro. Isso é o ponto
“Desejo que o renascimento do nosso trabalho dos anos 60 e 70 tenha resultados máximo da vida de um musicista!”, lembra nesta entrevista, ao lado da filha Cynthia Lachèze.
positivos” – é a mensagem que dirigiu aos colegas da ABRAORFF.
O que a levou a criar a 'orquestra animais: semibreve (elefante),
de bebês'? mínima (girafa), semínima (macaco);
O convite gentil da redação da curso semanal e um curso Quem estava à frente de todos era depois, passamos do concreto para o
WPC: Foi na década de 50. Eu me abstrato, tirando os animais. Assim,
ABRAORFF para escrever sobre quinzenal. Como docente, Helder Parente Pessoa, o estudante dedicava à tarefa de criar meus filhos restam somente as figuras musicais.
lembranças dos primeiros cursos conseguiu-se a autora da edição mais talentoso em dança a quem e ao mesmo tempo lecionava. Por Também usamos xilofones e
brincadeira, comecei a usar metalofones, e as crianças brincam
Orff-Schulwerk no Brasil me levou a portuguêsa do Orff-Schulwerk, a pude ensinar. Após concluir seus pequenas canções para pontuar os
compositora Maria Lourdes Martins, de achar as notas. Damos as cartelas
'desenterrar' relatórios de 1967, estudos, ele trabalhou (infelizmente diferentes momentos do dia-a-dia das e elas têm que descobrir. Assim,
1969 e 1975. Na seqüência, os de Lisboa. Em seguida ela ensinou só por poucos anos) como docente crianças. Cada passo da rotina delas criamos uma harmonia em cima dos
era determinado por uma música. xilofones e metalofones: alguém toca
leitores poderão conferir algumas também na Bahia, em Belo no Instituto Orff. Outros nomes 'Marcha, soldado', por exemplo,
Horizonte, em Santos e no Rio de uma flauta, todo mundo faz igual e
citações da Orff-Schulwerk que merecem destaque são: Malitta apontava a hora do banho. Também depois cada um faz a sua
Informationen, a revista bienal e Janeiro. Vailatis – radicada na Áustria, ela havia músicas para comer e dormir. composição, sua improvisação.
Comecei a perceber que meus filhos
bilíngüe – ainda muito ativa – do trabalha na área de pedagogia com estavam mais disciplinados com esse Como foi seu contato com Regner?
Outros cursos foram realizados sob
Instituto Orff, do Orff-Schulwerk muita dedicação; Fatima Pereira, 'método' e, assim, resolvi transportar WPC: Regner foi o divisor de águas
a direção de Adelheid Weidlich e essa experiência para a minha
Forum e das associações Orff- de quem me lembro com muito na minha vida musical. Me fez refletir
Ida Meirelles, de 7 a 11 de julho de atividade profissional. Nas aulas, as sobre o que se fazia na Europa, pois
Schulwerk da Alemanha e da Suíça. afeto; Ida Meirelles, Gilda Giusti- crianças trocam objetos entre si e
1975, em São Paulo, e de Adelheid neste ponto o Brasil era tão pobre!
Latino, José Adolfo Mora, Isabel aprendem a dividir os instrumentos, Em 1969, sabendo que ele viria da
Weidlich e Helder Parente Pessoa, o que desenvolve a sociabilidade. No
Villares, Susan Reilly, Erica Áustria para dar um curso na Pró
A Pro Arte Brasil organizou também de 14 a 18 julho 1975, no Rio. (in final, são orientadas a guardar tudo. Arte, eu me inscrevi. O meu grupo
Schwarz, Elmarina Samways, A intenção é estimular a coordenação tinha aulas o dia todo, porque, além
neste ano (1969), como há 19 anos, Orff-Schulwerk Informationen nº
Rosanna Aráujo e, como motora e a linguagem dos bebês, que de Orff, havia aulas de coral, teoria e
seu curso internacional de férias em 15, Salzburg, 1975) também assimilam conceitos básicos
participante do Special Course de canto. Uma professora de expressão No final do curso apresentamos 'O
Teresópolis. Músicos, estudantes de de ritmo, musicalidade e organização. corporal veio junto com ele e, assim,
2006/07, Kelly Marques. Com o tempo, passei o know how Baião', de Luiz Gonzaga, e vimos
música e professores de todas as tivemos aulas de movimento e de todos os participantes do mundo
para a minha filha, que incorporou instrumental Orff. No final do curso
Sim, meus queridos colegas, até nas aulas diversas coisas novas. inteiro cantarem em português. Foi
partes do Brasil se encontram, por Desejo que o renascimento do houve uma apresentação e Hermann
onde sabemos, desde 1965 há no de arrepiar!
um mês, para estudos intensivos nosso trabalho dos anos 60 e 70 e Como é o trabalho desenvolvido Regner me escolheu para relatar em
Brasil estudantes e professores que pela escola? nome do grupo a minha experiência. Como a pedagogia Orff se aplica
com docentes nacionais e as fortes iniciativas atuais tenham
se entusiasmam pelos estudos do Eu me recordo que a maioria eram na escola?
internacionais. Há muitos anos é um resultados positivos. Espero, CL: As aulas para bebês são em solistas, não sabíamos trabalhar em
Orff-Schulwerk, bem como grupo de até 12 criancinhas, elas CL: Não seguimos uma linha única,
objetivo particular da Pro Arte e do também, que o contato com grupo. Então, chamei a atenção para mas adotamos vários preceitos de
participam junto com suas mães e o fato de que era difícil entrosar
seu diretor incansável Theodor promotores e instituições que Salzburgo continue mantido, que 'acompanham' as melodias Orff: o jeito de trabalhar, o modo de
solistas em grupo. Alguns anos ensinar. Educação musical é muito
Heuberger promover a educação sempre organizam cursos e sempre novos colegas brasileiros executadas pela professora ao piano depois, ele foi convidado pela
em instrumentos de percussão, como mais que tocar um instrumento.
artística nos campos da música, da seminários. possam estudar em nossa cidade, prefeitura de São Paulo a dar aulas Todo mundo é capaz de fazer
castanhola, tambor, pandeiro e reco- no MASP para educadores infantis.
pintura e do movimento. Por este que novos materiais nasçam e que reco. Também usamos materiais que música, é algo coletivo, social. A
Eu mesma tive a oportunidade de Como eu morava em São Paulo, ele
motivo têm lugar cursos de o trabalho Orff-Schulwerk do lhes são familiares: colheres, cones, musicalização é que abre a mente
me chamou para participar. Assim,
dar dois cursos de férias em potinhos, martelos. Intercalamos a fui a única musicista presente. Mais do aluno. Não se trata de ensinar a
introdução e de aperfeiçoamento Brasil venha a gerar um efeito vivo,
Teresópolis – cidade localizada na música com os apetrechos. A partir tarde, ao ter notícia da minha técnica, mas de mostrar o que está
profissional de Orff-Schulwerk no calcado nas necessidades de hoje. de dois anos ensinamos as figuras por trás da linguagem musical. E
região serrana do estado do Rio de atuação com bebês e sabendo que eu
curso de férias internacional. A musicais associando-as com iria a Insbruck no Congresso nesse ponto, há muita
colaboração com o Instituto Orff em Janeiro –, naquele tempo sob a Internacional do ISME (International concordância com Orff.
Salzburgo existe há muitos anos. […] direção de Theodor Heuberger. Foi Society for Music Education) para WPC: No meu tempo, a vida era de
mostrar o meu trabalho com crianças solistas. Mas fazer música em grupo
um prazer muito grande estar com carentes, ele me convidou para
Particularmente satisfatórios foram é o grande diferencial. Ainda está
esses participantes abertos, explicar minha proposta. Devo a ele a difícil, pois a nossa sociedade não
os relatórios de professores que já entusiastas e profundamente divulgação da minha metodologia em valoriza a música como
participaram em cursos anteriores. Taiwan, na China e na Austrália. instrumento de educação. Até
musicais, que tinham uma alta Uma das alunas de Taiwan
Os programas, coleções de introduziu essa metodologia na sua mesmo os músicos não valorizam a
motivação e um grande talento música, eles prezam o artista. Mas
materiais e resultados deles escola e no ano seguinte me enviou
para a dança e o movimento. um vídeo dos bebês chineses com um eu não estou interessada no artista,
convenceram do efeito deste nem Regner estava. A pedagogia
recado: 'tinha 308 em sua escola!'
trabalho [...] (in Orff-Schulwerk Alguns participantes quiseram Orff acaba trabalhando a formação
Informationen nº 7, Salzburg, Cynthia, você também conheceu Regner? de um educador e é para isso que
aprofundar suas experiências e sempre estive voltada. Se eu não
1969). CL: Eu já o conhecia de nome e ele
conseguimos, com o auxílio de era muito amigo do meu sogro. tivesse tido contato com Regner,
bolsas de estudos do DAAD Dado o entusiasmo da minha mãe, teria ficado naquela mesquinhez de
No ano passado às atividades fomos todas nós, da escola Escala professora, quadrada. Os músicos
regulares no Brasil continuaram. (Deutscher Akademischer Atividades Musicais, para a Áustria. ainda não têm consciência da
Foram, sobretudo, o Instituto Austauschdienst), o serviço Em 1997 participamos do Curso importância da música na formação
alemão de intercâmbio Internacional de Férias, o mesmo da criança, no seu desenvolvimento
Goethe em São Paulo, a Fundação que a minha mãe fez, junto com e capacidade intelectual. Foi com
São Caetano do Sul e a Escola de acadêmico, lhes oferecer a Verena Maschat, Sofia López-Ibor e Regner que eu comecei a entender
Música Magda Tagliaferro em São possibilidade de estudarem no Pablo Vallejo, e ficamos encantadas. isso. Ele me fez crescer
Instituto Orff, em Salzburgo. Já trabalhávamos com a Pedagogia musicalmente e sou grata ao
Paulo que organizaram juntos um
Orff, mas aprendemos muito mais. estímulo que me deu.

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