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Natal Reportagem Girl Talk Dezembro 2020

Os brinquedos e os A luta do Líbano Estreia da rubrica Publicação Mensal

jogos tradicionais pela reconstrução em que só as 440


Portugal
exame.pt made in Portugal do país mulheres têm voz €4,90 (Continente)
440 dezembro 2020
O FUTU RO DO TR ABALHO  A S PE SSOA S QU E A S E M PR E SA S PROCU R AM

O FUTURO
DO TRABALHO
AS PESSOAS QUE
AS EMPRESAS PROCURAM
As competências e os perfis mais valorizados no momento da retoma
Para onde vai o emprego | O trabalho em tempo de pandemia | O papel da tecnologia
Os desafios para a cultura das empresas | Como vamos funcionar daqui para a frente
O talento e as mudanças sociais | Entrevista com a ministra do Trabalho
Exame
Nº440 . 12/20

66
GIRL TALK
Ana Paula Rafael e Jessica de
Seixas von Haff falam de negócios
ditos tradicionais, de inovação,
de liderança e de gestão na estreia
da nova rubrica da EXAME

14
QUE EMPREGOS?
A pandemia causou uma profunda
alteração das necessidades nos
mercados de trabalho atual
e futuro. A EXAME foi à procura
de respostas para o ajudar a nave-
gar nestas águas turbulentas

. Enter . Micro . Macro . Exit . Opinião


6 36 54 90 53
WE GO DIGITAL MUNDO ENCANTADO A FÉNIX DE BEIRUTE TEREMOS JOSÉ GOMES
O setor do retalho deverá DOS BRINQUEDOS A EXAME fez uma via- SEMPRE NATAL LONGE, MAS
Apesar de a Ásia ser um gem ao país dos cedros Com ou sem pandemia, MAIS PERTO
fechar o ano a registar
feroz concorrente, há brin- e surpreendeu-se com o que importa é não A necessidade
vendas globais no valor
quedos portugueses que deixarmos de estar de distanciamento
de 3,5 biliões de euros, um povo que, apesar
continuam a conquistar acelerou a adoção em
graças à pandemia de cansado, continua presentes junto
pequenos e crescidos. força de ferramentas
a reerguer-se de quem gostamos,
A EXAME foi conhecê-los remotas e digitais
10 de preferência com
500 M&M 46 72 produtos nacionais
SOFISTICAÇÃO FISCAL 86
Em dezembro daremos APOSTA NA
A Lobo Vasques e Asso- 92 FERNANDO
a conhecer as maiores REABILITAÇÃO CARDOSO DE SOUSA
empresas nacionais, A Kleya está de olho ciados assume-se como BMW MAIS VERDE A ORGANIZAÇÃO
pelo 31º ano consecutivo na dinamização uma boutique fiscal que Assente numa parceria PÓSPANDEMIA
do investimento no quer desenhar soluções com a portuguesa O novo modelo deve estar
Interior do País, seja via imaginativas para quem OutSystems, marca assente em equipas mul-
vistos gold ou outros cobra e para quem paga alemã vai apresentar tidisciplinares ágeis e com
instrumentos financeiros impostos 25 carros elétricos nos um caráter colaborativo
próximos três anos
50 78 88
ESCREVER DIREITO SOUMODIP SARKAR
HAJA VACINA 96
POR LINHAS
As esperanças numa CROSSOVER FAMILIAR DA CRISE DE SAÚDE
INTERNACIONAIS PÚBLICA À CRISE
A nossa capa vacina contra a Covid-19 O Cupra Formentor
Destaque para o trabalho
A celebrar 50 anos ECONÓMICA
trouxeram algum oxigénio chega ao mercado
dos jornalistas Paulo Zacarias de vida e de presença O impacto nas PME
em 30 mercados, a Ancor ao cansaço da pandemia com linhas dinâmicas, e as medidas de apoio
Gomes e Rui Barroso, numa
capa desenhada por Edgar segue firme nas mãos interiores confortáveis e implementadas, em
Antunes da segunda geração espaço para uma família Portugal e lá fora

DEZEM BRO 2020 . EXAM E . 3


E Editorial

Proprietária/Editora:
TRUST IN NEWS, UNIPESSOAL LDA.
Sede: Rua da Fonte da Caspolima – Quinta da Fonte
Edifício Fernão de Magalhães, 8
POR 2770-190 Paço de Arcos. NIPC: 514674520
Gerência da TRUST IN NEWS: Luís Delgado,
TIAGO FREIRE Filipe Passadouro e Cláudia Serra Campos
Diretor Composição do Capital da Entidade Proprietária: 10 000,00 euros
Principal acionista: Luís Delgado (100%)
Publisher: Mafalda Anjos

Renasceremos Exame
www.exame.pt

na primavera? Revista Mensal


Diretor Tiago Freire
Redação Cesaltina Pinto, Clara Teixeira, Margarida Vaqueiro Lopes,
Nuno Aguiar, Paulo M. Santos, Paulo Zacarias Gomes (editor) e Rui Barroso
Arte Edgar Antunes (editor), Patrícia Pereira e Rita Cabral

N
Infografia Álvaro Rosendo e Manuela Tomé
Revisão Maria João Carvalhas, Rui Carvalho, Margarida Robalo,
o meio do medo e (não deixando de aproveitar as lições Sónia Graça e Teresa Machado
da incerteza, é im- e as partes boas que fomos forçados a Secretariado Sofia Vicente (direção), Teresa Rodrigues (coordenadora), Ana
Paula Figueiredo e Luís Pinto
portante valorizar descobrir neste tempo tão especial). A REDAÇÃO, ADMINISTRAÇÃO E SERVIÇOS COMERCIAIS
Rua da Fonte da Caspolima – Quinta da Fonte
as boas notícias, e economia é feita, em grande parte, de Edifício Fernão de Magalhães, 8, 8A e 8B, 2770-190 Paço de Arcos
Tel.: 21 870 5000
elas existem. No úl- confiança, e é importante que valori- Delegação Norte: Rua Roberto Ivens, 288, 4450-247 Matosinhos
timo mês, a derrota de Donald Trump zemos este passo. Tel.: 22 099 5200 / 22 099 3810
Marketing
marcou um retrocesso no caminho do As primeiras indicações vão no Marta Silva Carvalho (diretora) mscarvalho@trustinnews.pt
Marta Pessanha (gestora de marca) mpessanha@trustinnews.pt
autoritarismo populista que parecia ter sentido de que na primavera possamos Publicidade
apenas um sentido. Mais do que es- estar em condições de voltar às ruas, Tel.: 21 870 5000
Vânia Delgado (diretora comercial) vdelgado@trustinnews.pt
querda ou direita, ou até de medidas aos almoços, aos convívios, às viagens, Manuel Geraldes (diretor coordenador de publicidade)
mgeraldes@trustinnews.pt
concretas, a saída do republicano deve às reuniões presenciais. No fundo, a Mónica Ferreira (gestora de marca) mferreira@trustinnews.pt
Mariana Jesus (gestora de marca) mjesus@trustinnews.pt
saudar-se pela simples razão de que poder viver como queremos, sem ter Rita Roseiro (gestora de marca) rroseiro@trustinnews.pt
não se discute economia ou qualquer de pensar duas vezes a cada momen- Florbela Figueiras (assistente comercial Lisboa) ffigueiras@trustinnews.pt
Elisabete Anacleto (assistente comercial Lisboa) eanacleto@trustinnews.pt
outra coisa sem que haja, na base, uma to. O desafio é ver o que conseguimos Delegação Norte – Tel.: 22 099 0052
Margarida Vasconcelos (gestora de marca) mvasconvelos@trustinnews.pt
prática de valores fundamentais: os Di- manter vivo até a sociedade poder res- Rita Gencsi (assistente comercial Porto) rgencsi@trustinnews.pt
reitos Humanos, a não discriminação pirar de novo. Estamos há muito tem- Parcerias e Novos Negócios
Pedro Oliveira (diretor) poliveira@trustinnews.pt
racial ou outra, a preservação do am- po a conter a respiração, e há danos Branded Content
Rita Ibérico Nogueira (diretora) rnogueira@trustinnews.pt
biente e a defesa da Ciência, a liberdade que, infelizmente, são irreversíveis. Tecnologias de Informação
João Mendes (diretor)
de informação, o respeito pelo outro, Produção, Circulação e Assinaturas
mesmo que seja um adversário político. Nota: Estreamos este mês a nova Vasco Fernandez (diretor)
Pedro Guilhermino (coordenador de produção)
Mas a melhor notícia não foi essa rubrica da EXAME, a que chamámos Nuno Carvalho, Nuno Gonçalves e Paulo Duarte (produtores)
Isabel Anton (coordenadora de circulação)
e sim o avanço aparentemente decisi- Girl Talk. Terá uma newsletter mensal Helena Matoso (coordenadora de assinaturas)
vo em vários dos muitos projetos de e presença garantida na revista em pa- Serviço de apoio ao assinante. Tel.: 21 870 5050 (Dias úteis das 9h às 19h)
Impressão Lisgráfica – Casal de Sta. Leopoldina, 2745, Queluz de Baixo
vacina contra a Covid-19. Os produto pel e pretende trazer para a discussão Distribuição VASP – MLP, Media Logistics Park, Quinta do Grajal,
Venda Seca, 2739-511, Agualva-Cacém, Tel.: 21 433 7000
desenvolvidos por várias farmacêuti- pública mulheres que se destacam no Pontos de Venda contactcenter@vasp.pt
Tel.: 808 206 545 – Fax: 808 206 133
cas estão perto de cruzar a meta nes- campo das empresas e não só. O nome Tiragem 7 200 exemplares. Registo na ERC
ta corrida, decisiva para a Humanida- é assumidamente provocador, porque com o nº 113 709, de 14/04/1989
Depósito Legal nº 24 202/89
de. Há muitos desafios ainda, desde queremos demonstrar que as “conver- Estatuto Editorial disponível em visao.sapo.pt/
informacaopermanente/2018-01-01-Estatuto-editorial-da-EXAME
os testes finais ao posterior processo sas de raparigas” não têm de ser sobre
“A TRUST IN NEWS, UNIPESSOAL, LDA. não é responsável pelo conteúdo
logístico de produção, distribuição e coisas fúteis ou apenas do âmbito fa- dos anúncios nem pela exatidão das características e propriedades dos
produtos e/ou bens anunciados. As respetivas veracidade e conformidade
vacinação de milhões de pessoas em miliar. As mulheres já são peças-chave com a realidade são da integral e exclusiva responsabilidade dos anunciantes
todo o mundo. Mas há uma esperan- na nossa sociedade. O que queremos e agências ou empresas publicitárias.” Interdita a reprodução, mesmo parcial,
de textos, fotografias ou ilustrações sob quaisquer meios e para quaisquer
ça, uma preciosa esperança, que não é que falem, se mostrem, partilhem fins, inclusive comerciais.

vem de uma qualquer superstição mas connosco o seu pensamento e a sua


de uma coisa bem mais valiosa: vem opinião. A Girl Talk não resolve nada
da Ciência. por si, naturalmente, e é apenas uma
Para já, o primeiro efeito da vacina peça do nosso esforço, nem sempre fá-
é o alento, a indicação de que haverá cil e nem sempre bem-sucedido, para
uma saída, de que existe pelo menos representar fielmente um mundo que
um calendário provisório que nos per- já é menos masculino e mais diverso.
mitirá voltar às nossas vidas normais Leia tudo a partir da página 66. E

4 . EXAM E . DEZEM BRO 2020


Enter
EXAME

NOTÍCIAS . FOCO

O TRIUNFO DO DIGITAL
O comércio eletrónico já representa mais de 16% do total das vendas a retalho
feitas em todo o mundo. Com o aproximar do Natal, a meio de uma pandemia,
este método poderá ganhar ainda mais relevância no próximo mês. No total,

32%
em todo o mundo, deverão ser feitas compras através de método digital no valor
de 3,5 biliões de euros, em 2020.
Texto Paulo M. Santos

FREQUÊNCIA

Dos
consumidores
online fazem
67%
GERAÇÃO
O APELO DAS COMPRAS ONLINE

É uma das indústrias mais rentáveis


da atualidade e continua a crescer
de forma exponencial. Ao longo
EM CURVA ASCENDENTE

O comércio eletrónico poderá atingir no final


deste ano um peso de 16,2% no total das vendas
a retalho feitas em todo o mundo. Dentro de três
compras, pelo Dos millennials da última década, as vendas online têm anos, a percentagem deverá a atingir os 22%
menos, uma vez preferem fazer aumentado a um ritmo de cerca 25
por semana compras online de 15% ao ano. Devido à pandemia, esta 22%

2,14 MIL
taxa duplicou em 2020, atingindo uma 20%
subida de 32%. Além da conveniência 20 18,10%
para o comprador, as lojas digitais 16,20%
conseguem, em muitos casos, praticar
15 14,10%
preços mais concorrenciais e apelativos 12,20%
para os consumidores. Por um lado, têm 10,40%
custos de operação mais reduzidos, pois 10 8,60%
não necessitam de tantos funcionários 7,40%
nem de pagar as rendas dos espaços

MILHÕES
5
físicos. Por outro, conseguem agregar
um maior número de clientes, pois estão
Consumo presentes a qualquer hora e à distância 0
Número de compradores digitais de um dedo sempre que alguém 2015 2016 2017 2018 2019 2020 2021 2022 2023
necessita de fazer uma compra.

9%
em todo o planeta em 2021 Fonte: Statista

EM ASCENSÃO
350 305
A par do cartão de crédito, o PayPal é um dos métodos preferidos para
300 fazer os pagamentos das compras online. Nos primeiros seis meses 267
deste ano, o número de subscritores ativos do PayPal cresceu
250 mais do que na totalidade de 2019, atingindo quase 229
os 350 milhões, o que representa uma subida
197
200 de 21% face a igual período do ano anterior.
179
Valores em milhões 161,5
150 142,6 FUNCIONALIDADE
122,7
106,3
100 97,7 Dos utilizadores
84,3 do comércio online
50 usam comandos
2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017 2018 2019 2020 de voz para fazer
Fonte: PayPal as suas compras

6 . EXAM E . DEZEM BRO 2020


40%
ALCANCE

Dos grandes
retalhistas em todo
o mundo usam
as redes sociais
para vender
PLATAFORMAS 55%
Dos utilizadores de redes sociais na
China admitem que fazem compras
produtos online através dessas redes

68,8%
DESISTÊNCIA

Percentagem de abandono
do “carro de compras”
online (local nos sites onde
se guarda os produtos

Fontes: Global Consumer Survey, Ecommerce Guide, FinancesOnline, DigitalCommerce 360


selecionados)

€3 500 000 000 000


VOLUME

Valor das vendas a retalho via comércio eletrónico em todo o mundo


no final de 2020. A China representa cerca de metade do mercado

55%
51%
CUSTO

DISPOSITIVOS Dos utilizadores


que desistem das
Das compras compras online
online são feitas fazem-no devido
através de a portes de envio,
smartphones taxas ou impostos

DEZEM BRO 2020 . EXAM E . 7


DIVER 300M

CERTIFICAÇÃO MASTER CHRONOMETER


Por detrás da elegância de cada
Master Chronometer está um extremo grau
de exigência: 8 testes ao longo de 10 dias,
para garantir uma precisão e resistência
anti-magnética superiores.

BOUTIQUE OMEGA
Av. da Liberdade, 192A • Lisboa
Enter Distinções
Além dos prémios referentes às 500 Maiores
& Melhores Empresas, será também entregue
o Prémio Excelência na Liderança deste ano

ALEMANHA COM
QUOTAS OBRIGATÓRIAS
NAS ADMINISTRAÇÕES

Os conselhos
de administração
de empresas cotadas
alemãs que contem
mais de três pessoas vão
passar a ter de integrar,
pelo menos, uma mulher
na sua composição.
A quota obrigatória nos
boards resulta de um
acordo entre a CDU/CSU

LUÍS BARRA
e o SPD, depois
de o sistema voluntário
de contratações

ESTÃO A CHEGAR AS 500 MAIORES de executivas, iniciado


em 2015, não ter surtido

& MELHORES EMPRESAS os efeitos necessários.


O setor empresarial
Evento digital decorrerá em dezembro e, antes do final do mês, será editada alemão considera
que a medida é uma
a revista especial com os dados financeiros de todas as empresas
interferência nos seus
assuntos internos.
Pelo 31º ano consecutivo, que teve melhor evolução. especial que deverá chegar às Segundo o Financial
tantos quantos a EXAME Este ano, o evento de entre- bancas no final de dezembro. Times, as mulheres
tem de vida em Portugal, ga dos prémios, que conta nova- Nesta, poderá encontrar a lis- representam hoje
vamos divulgar em dezembro a mente com o apoio do Bankinter, ta das 500 Maiores & Melhores 12,8% do total de
lista das 500 Maiores & Melhores será totalmente digital, devido à Empresas, com os respetivos administradores das
Empresas de Portugal, um traba- situação de saúde pública que o dados financeiros, trabalhos cotadas alemãs, contra
24,5% no Reino Unido
lho que é fruto da histórica par- País atravessa, com transmissão sobre os vencedores de todas
e 28,6% nos EUA.
ceria com a Informa D&B e com online através do Facebook e da as categorias, uma entrevista
Em Portugal, segundo
a Deloitte. página da EXAME. com o vencedor do Prémio Ex- a Leading Together,
Como habitualmente, serão Além dos prémios referentes celência na Liderança e a cober- as mulheres ocupavam
distinguidas as empresas que, às 500 Maiores & Melhores Em- tura do evento. Na revista, terá em junho oito lugares
dentro do universo das 500 mai- presas, nessa conferência, será um código que lhe permitirá executivos (10,5%
ores, tiveram uma melhor per- entregue o Prémio Excelência descarregar os dados financei- do total) e representavam
formance no ano completo an- na Liderança deste ano, que na ros das empresas em causa, em 26% do total de
terior, com base nos indicadores edição anterior foi entregue a formato excel. Fique atento à administradores nas
financeiros. Serão distinguidas Fernando Ulrich. página online da EXAME para 18 cotadas no PSI-20.

12,8%
as melhores empresas por setor Como sempre, esta inicia- conhecer todos os pormenores
e premiada a empresa do ano, a tiva será a base de uma revista desta iniciativa. E

-10,2% -5% €508M


À NOSSA?

Setor do vinho deverá


produzir menos este
ano, mas exportações Queda das vendas em Queda homóloga Exportações de vinho
estão no bom caminho, volume no primeiro prevista na produção de janeiro a agosto, um
sobretudo para fora de vinho, em 2020. No Peso atual das mulheres
semestre do ano. aumento de 2,3% em
da Europa. Pandemia ano passado, foi de 5,8 em cargos de gestão
Restauração perdeu relação a 2019. Vendas
castigou restauração e milhões de hectolitros. em empresas alemãs
quase metade do valor fora da Europa cresceram
fez evaporar 10% das A meteorologia cotadas no índice bolsista
e dos litros vendidos. 19%, segundo o IVV.
vendas até junho. condicionou. DAX, segundo a AllBright
Foundation

1 0 . EXAM E . DEZEM BRO 2020


Acima das expectativas.
Abaixo da tributação
autónoma.
SEAT FOR BUSINESS

Leon
Nova SEAT

Sportstourer 2.0 TDI FR 150 Cv


com caixa automática DSG.

Campanha válida para ENI e frotas para a nova Leon Sportstourer 2.0 TDI FR 150 Cv com caixa de velocidades
automática DSG com um valor final da viatura de 27.490,00€. Não é válida para cliente Rent-a-Car. Imagem não
contratual. Consumo (l/100km): 4,4 - 5,1; Emissões de CO2 (g/km): 117 - 133. Oferta limitada ao stock existente. seat.pt/NovoLeon
PROXIMIDADE E PREVENÇÃO: A APOSTA
DA SEGURADORA
Hoje, mais do que nunca, reconhecemos o risco como parte inerente das nossas vidas e novas necessidades pedem
soluções adaptadas aos contextos emergentes. A Ageas Seguros procura disponibilizar soluções adequadas a todos os
momentos. Uma marca de proximidade com a prevenção no ADN.

A Ageas Seguros já se Mais do que A marca pretende proporcionar A prevenção tornou-se a


tornou reconhecida estar presente uma experiência emocional e palavra chave para garantir
pela maior parte apenas no relevante na vida das pessoas. uma retoma sustentada e
dos portugueses momento do A proximidade é um princípio neste sentido, a Ageas Seguros
num curto espaço sinistro, visão que norteia a estratégia da trabalhou para ser a melhor
de tempo, e tem redutora Ageas Seguros, que procura parceira dos seus clientes,
vindo a consolidar que a marca estar cada vez mais perto do parceiros, colaboradores, e da
a sua notoriedade no tem vindo a seu mercado. sociedade nesta jornada.
mercado, através de desmistificar, a Desde o primeiro minuto, a
uma identidade inovadora Ageas Seguros quer UM ANO DE MÚLTIPLOS pensar em todos os profissionais
e colorida, que pretende construir uma relação a longo DESAFIOS de saúde, a Ageas Seguros
marcar a diferença no mundo prazo baseada na confiança O atual contexto teve impactos implementou a isenção de
dos seguros. Sob o mote “um e no acompanhamento incontornáveis do ponto de franquia de 30 dias na cobertura
mundo para proteger o seu”, constante, atuando numa ótica vista social e económico, e à de Incapacidade Temporária
a Ageas Seguros materializa de prevenção. O propósito escala global. O setor foi posto para o Trabalho, no caso de
o seu compromisso de zelar nobre é ser o equilíbrio nos à prova e teve que se adaptar contração de Covid-19 em
pela proteção e pelo futuro momentos de desequilíbrio rapidamente às transformações âmbito profissional, bem como
dos seus clientes. da vida dos clientes. causadas pela COVID-19. a inclusão no seguro de vida da
CONTEÚDO
PATROCINADO

Saúde. A seguradora sabe que, promovendo uma interação


para ser relevante, tem de estar que potencia relações de valor
cada vez mais presente na vida e proximidade a longo prazo.
das pessoas e, por isso, continua Os mediadores constituem,
a preparar o futuro, canalizando assim, uma das principais
o investimento para a mais-valias da Ageas Seguros.
digitalização, ecossistemas e Dada a sua importância
comércio eletrónico. na relação com clientes e
potenciais clientes, a Ageas
A RELEVÂNCIA Seguros tem vindo a investir
DOS MEDIADORES também ao nível da formação
DE SEGUROS e certificação de mediadores.
Os mediadores desempenham O contexto atual trouxe
um papel determinante consigo inúmeros desafios
na indústria seguradora. para a mediação de seguros,
proteção em caso de isolamento que garante a oferta de uma Através da análise das tendo obrigado os mediadores
profilático determinado a título bicicleta, na compra de um necessidades individuais, a procurarem novas formas
individual pela Autoridade de seguro Multirriscos Habitação propõem as soluções mais de se conectarem com os seus
Saúde competente. e Automóvel ou um seguro de adequadas para cada cliente, clientes.
No seguro de Acidentes de
Trabalho, passaram também
a estar abrangidos os
colaboradores dos restaurantes APOSTA NO SEGMENTO DAS PME
nas entregas ao domicílio, caso Para além dos Clientes particulares, as soluções para globalização da economia. Este ano as conferências
um imprevisto acontecesse empresas constituem grande parte da atividade foram realizadas em formato virtual, com emissão a
durante o exercício da sua da Ageas Seguros. Destaque para o Serviço PAR partir dos locais.
atividade, sem necessidade de (Prevenção e Análise de Risco), um serviço de O Prémio Inovação em Prevenção, criado em parceria
os clientes terem de comunicar consultoria e aconselhamento gratuito aos Clientes com a EXAME, é outra das iniciativas que marcam
previamente e sem aumento PME, que atua sobre as principais causas dos este ano. O objetivo é reconhecer e incentivar as
do valor a pagar pelo seguro. acidentes e sinistros participados pelas empresas. melhores práticas na área da Prevenção, premiando a
A Ageas Seguros promove Deste modo, possibilita a prevenção desses mesmos excelência, a inovação e a perseverança das empresas
atualmente uma campanha acidentes, permitindo melhorar a produtividade e os e dos empresários. A esta iniciativa juntaram-se
índices de motivação dos colaboradores, assim como o ISQ, que ajudará na validação e avaliação das
reduzir os impactos financeiros de um sinistro.
stro. candidaturas das em empresas, e também a Ordem dos
Apesar dos obstáculos impostos pela Economistas, para aalém de um conjunto de entidades
Sabia que…? pandemia, o planeamento das atividades des liga
ligadas ao mundo empresarial e que
...Uma consequência dos acidentes e apostas da Ageas Seguros continuou.. A con
constituem o júri: CIP, AICEP, IAPMEI,
com os seus colaboradores seguradora promoveu o lançamento do 2.º Com
Compete 2020 e AHP.
tem impactos também nas famílias? ciclo, do “Fórum Global PME”, um ciclo de AA Ageas Seguros pretende apoiar
Causa sofrimento moral, familiar,
preocupações, ansiedade,
conferências realizado em parceria com ma o ddesenvolvimento empresarial a
FKƒEWNFCFGUƒPCPEGKTCU Ordem dos Economistas e um conjunto de nível regional, pelo que este prémio
níve
...Por cada euro investido em parceiros a nível nacional. As conferênciasas valo
valoriza e divulga quem investe e
Prevenção, tem um retorno de 2,20€? têm como objetivo discutir e debater ter apoia a mesma causa – a criação de
apoi
(in estudo de Agência Europeia assuntos relacionados com a realidade de um ecossistema de boas práticas
para a Segurança e Saúde no Trabalho)
...O investimento em Prevenção
empresarial e os riscos associados à mesma,
ma, em p prevenção, que contribuem para
contribui para uma maior conquista bem como sensibilizar para a importância da a efic
eficiência da gestão das empresas.
e retenção de Clientes na sua empresa?
1 4 . EXAM E . DEZEM BRO 2020
ONDE VAI ESTAR
O EMPREGO NA
HORA DA RETOMA
O que fica quando, a uma vaga inédita de destruição de emprego,
se somam a incógnita do ritmo de recuperação da economia e a herança
de uma transformação acelerada das profissões – tudo durante uma
pandemia? Ainda um ponto de interrogação, mas com algumas certezas:
subsistem ofertas de emprego em setores dinâmicos, ao passo que
a digitalização e a “revolução verde” deverão criar novas oportunidades
no dia seguinte à Covid-19. Mas a formação e a reconversão serão
essenciais para não deixar ninguém para trás
Texto Paulo Zacarias Gomes e Rui Barroso

DEZEM BRO 2020 . EXAM E . 15


Quase 110 mil empregos destruídos
e cerca de 900 mil que necessitaram de
apoios extraordinários para se manterem.
Os números mostram o efeito brutal que esta
crise pandémica tem tido no mercado de trabalho e
indiciam dificuldades em sarar as feridas abertas nos
últimos meses. A retoma deverá chegar ao longo do pró-
ximo ano, com epidemiologistas e economistas relati-
vamente esperançados no efeito de uma vacina. No
entanto, o mais provável é que o perfil do emprego
não regresse ao que era antes da Covid-19. As trans-
formações dramáticas a que assistimos nos últimos
meses podem ser o prenúncio do que está para vir no
mundo do trabalho, o que poderá exigir programas ma-
ciços de requalificação para corresponder às
novas necessidades e exigências das empre- “Trabalhadores-
sas na fase de relançamento da economia. chave, de funções até doras perderam 42 mil empregos. Tanto o
“Desde o passado mês de março, co-
meçámos a assistir à maior transformação agora subvalorizadas, comércio como as atividades administra-
tivas empregam menos 30 mil pessoas do
no mundo do trabalho e nas necessidades tornaram-se heróis que no início do ano.
de talento desde a II Guerra Mundial”, afir- indispensáveis, Há postos de trabalho a serem cortados
ma Rui Teixeira, o Chief Operations Offi- a grande velocidade e as ofertas de emprego
cer (COO) do ManpowerGroup Portugal, à prestando serviço a caírem a pique. O IEFP revela à EXAME
EXAME. O Instituto do Emprego e Forma- em hospitais, que as ofertas de emprego que lhe foram
ção Profissional (IEFP) observa que “os blo- supermercados, comunicadas desceram 21,6% nos primei-
queios induzidos pela pandemia Covid-19 ros nove meses do ano em relação ao mes-
e a recessão global daí decorrente criaram fábricas, centros mo período homólogo. A entidade especi-
uma perspetiva altamente incerta para o logísticos e na fica que, “ao nível dos setores de atividade
mercado de trabalho e aceleraram, também, distribuição de bens” das ofertas de emprego, a maior quebra
a chegada do futuro do trabalho”. em 2020 (de janeiro a setembro) verificou-
Esta transformação tem ocorrido num Rui Teixeira -se no alojamento, na restauração e simila-
contexto altamente destrutivo para muitos COO ManpowerGroup Portugal res (menos 6 095 vagas recebidas, -43,3%
setores de atividade. Os dados mais recen- face a igual período de 2019), seguindo-se,
tes do Instituto Nacional de Estatística (INE) deixam em termos absolutos, o comércio por grosso e a retalho
perceber o que se tem passado no mercado de traba- (menos 3 518 vagas comunicadas ao IEFP, correspon-
lho, desde o início do ano até final de setembro. Setores dendo a -31,1%)”.
como a hotelaria e a restauração extinguiram mais de Apesar do travão a fundo nas ofertas nas áreas
45 mil postos de trabalho, e as indústrias transforma- mais atingidas pela crise, o alojamento, a restaura-

1 6 . EXAM E . DEZEM BRO 2020


ção e o comércio ainda representam 20% das vagas
comunicadas, o que ilustra bem o peso que têm na
AS ÁREAS COM economia portuguesa. Já as atividades imobiliárias,
MAIS PROCURA administrativas e dos serviços de apoio representam
quase 30% das ofertas de emprego disponíveis, apesar
Os especialistas em Recursos do ligeiro recuo de 1,5% face a 2019.
Humanos ouvidos pela EXAME Mas nem tudo foi destruição. Os dados do INE
apontam várias áreas que mostram que as atividades em que estão incluídas as
poderão vir a ter mais procura TI criaram mais de 24 mil postos de trabalho em plena
por parte das empresas no crise. “Há áreas que, mesmo no decorrer da pandemia,
relançamento da economia tiveram maior ênfase, como as tecnologias de informa-
ção que não pararam e tiveram, talvez, um comporta-
> TECNOLOGIAS DA INFORMAÇÃO mento mais ativo para darem resposta às necessida-
des de trabalho remoto”, refere Pedro Borges Caroço,
A tendência já se verificava antes da pan- Senior Executive Manager da Michael Page, à EXAME.
demia, mas a necessidade de profissionais Também Rui Teixeira observa que, “à medida que a
de tecnologias de informação acelerou
atividade de muitas empresas se desmaterializa e a di-
durante esta crise, e essa tendência deverá
ser reforçada numa economia cada vez gitalização aumenta, assistimos também a uma maior
mais digital. “Os perfis e as funções ligados procura de perfis de serviço a cliente, nomeadamente
à transformação digital das empresas nas áreas de customer support, que suportam ativida-
serão os mais beneficiados, com particular des de e-commerce, ou de serviços como telecomu-
ênfase para os postos de tecnologia”, indi- nicações, utilities e saúde”. Na tecnologia, a procura
ca Rui Teixeira, COO do ManpowerGroup por software developers, information security analys-
Portugal.
ts, network administrators, arquitetos e engenheiros
> SAÚDE E BEMESTAR de sistemas e por competências em Java, outsystem,
QA, SAP, Cyber ou Python tem estado em alta, revela
O IEFP observa que “as áreas da saúde e o responsável do ManpowerGroup.
do bem-estar têm vindo a ser valorizadas No entanto, durante esta crise, a procura das em-
desde o início da pandemia e tendem a presas não se ficou exclusivamente pela tecnologia.
continuar a sê-lo”. O instituto refere ainda Rui Teixeira realça que as áreas da saúde, logística
que “também as áreas ligadas ao apoio
e transporte e retalho alimentar, por exemplo, au-
domiciliário ou ao trabalho em lares, num
País em que o peso da população idosa mentaram as suas contratações, uma vez que este
e dependente é significativo, têm vindo a conjunto de trabalhadores essenciais “foi e continua
Forças transformadoras ser reconhecidas e valorizadas”. a ser fundamental na resposta à crise”. O COO da
Requalificar a força laboral ManpowerGroup sublinha que, “em todo o mundo,
de áreas que estão em > “COLARINHOS VERDES” estes trabalhadores-chave, de funções até agora sub-
regressão ou de setores
que não recuperem para níveis valorizadas, tornaram-se heróis indispensáveis, pres-
O investimento maciço que os governos
pré-pandemia, bem como tando serviço em hospitais, supermercados, fábricas,
a resolução do défice crónico
europeus contam fazer na transição
energética deverá criar oportunidades nas centros logísticos e na distribuição de bens”.
de competências digitais
dos trabalhadores estão áreas ligadas ao ambiente e à sustentabi- Já junto do IEFP, “a indústria do couro e dos pro-
no horizonte como os grandes lidade. Profissões que, em alguns casos, dutos de couro foi a única a registar um ligeiro au-
desafios para o ciclo têm elevada tecnicidade e poderão ajudar mento das ofertas de emprego”. O aumento nos pri-
de recuperação a absorver trabalhadores de indústrias com meiros nove meses do ano foi de 2,8%. Ao nível das
grande pegada carbónica. profissões, “as ofertas para trabalhadores qualificados
> FUNÇÕES ESPECIALIZADAS
da metalurgia, metalomecânica e similares foram as
únicas a apresentar uma variação positiva no período.
Rui Teixeira recomenda também a aposta Consequentemente, é também nesta profissão que se
em algumas áreas técnicas em que os regista o maior acréscimo de colocações, em termos
estudos indicavam já uma falta de profis- quer absolutos (+532) quer relativos (+43,1%)”, indi-
sionais qualificados antes da pandemia, ca o instituto liderado por António Valadas da Silva.
tendência que deverá continuar depois da Nos últimos meses, também “o trabalho através
crise. O responsável aponta para a escas-
de plataformas informáticas, que já vinha a ser uma
sez de talento em funções especializadas,
como é o caso dos eletricistas, condutores, tendência crescente nos últimos anos, ganhou peso
mecânicos e outros domínios técnicos, neste período de pandemia”, algo que deverá estar
nomeadamente o controlo de qualidade. para ficar e que o Governo promete regular.

DEZEM BRO 2020 . EXAM E . 17


> CRIAÇÃO E DESTRUIÇÃO DE EMPREGO
30 FAMÍLIAS
ONDE VAI ESTAR O EMPREGO?
Milhares de postos de trabalho, desde EMPREGADORAS
Ainda antes de a epidemia assolar o mundo, não era o início do ano (melhores e piores setores) DE PESSOAL
segredo que muito do futuro do trabalho iria estar nas DOMÉSTICO
20
oportunidades que viessem a surgir com a digitalização -0,1
da economia. Mas esta crise veio acelerar dramatica-
mente essa tendência e esse futuro aparenta ter já che-
10
gado, forçando-nos a alterar a forma como trabalhamos
e como compramos. Isso mesmo mostram os últimos
inquéritos do INE, revelados em novembro. “A percen- 0
tagem de utilizadores de comércio eletrónico registou
em 2020 o maior aumento da série iniciada em 2002”,
e cerca de 45% das pessoas dos 16 aos 74 anos fizeram INFORMAÇÃO CONSTRUÇÃO ELETRICIDADE INDÚSTRIAS OUTRAS
-10 E COMUNICAÇÃO 11,9 E GÁS EXTRATIVAS ATIVIDADES
encomendas pela internet. Além disso, “entre os uti-
24,2 8,6 5,3  DE SERVIÇOS
lizadores de internet empregados, 31,1% exerceram a 0,9
sua profissão em teletrabalho”, lê-se no documento. ATIVIDADES ADMINISTRAÇÃO
-20 AGRICULTURA CONSULTORIA EDUCAÇÃO  FINANCEIRAS PÚBLICA E DEFESA;
O rumo já estava a ser trilhado lentamente, mas a cri-
se forçou a sociedade e economia a atalharem caminho
E PESCA 10,6 6,8 E DE SEGUROS SEGURANÇA SOCIAL
14,7 4,8 OBRIGATÓRIA
rumo à digitalização. Assim, realça Rui Teixeira, “haverá, -30 0,4
claramente, uma crescente procura de perfis nas áreas
tecnológicas, de forma a responder às necessidades que
as empresas têm no desenvolvimento de projetos digitais, -40
fundamentais para a sua sustentabilidade”. O responsá- > EVOLUÇÃO DA POPULAÇÃO
EMPREGADA
vel pelo ManpowerGroup em Portugal indica que “con- 5 000
tinuaremos também a necessitar de talento para fazer -50
Milhares de pessoas
face aos desafios da crescente procura no e-commerce
e à necessidade de otimização das soluções
de logística”. Também Pedro Borges Caroço “Os desafios
nota que, na área das novas tecnologias, “há
mais procura do que oferta de candidatos
obrigaram a ajustar as
para dar resposta às necessidades de hoje”. soft skills associadas
Esta tendência tem tudo para acelerar aos líderes que têm
ainda mais, já que a digitalização da econo-
mia e da sociedade é uma das traves-mestras
de ter capacidade
4 354,6
do plano de 1,8 biliões de euros da Comis- para saírem da zona
são Europeia para recuperar a economia do de conforto e se 4 000 2011 2012 2013 2014
Velho Continente. Essa estratégia terá de ser
seguida pelos países que queiram aceder aos
adaptarem ao meio
fundos europeus e será uma das prioridades envolvente Além da digitalização e dos “colarinhos
de Portugal na próxima década. Assim, “os e à velocidade verdes”, a pandemia veio mostrar que os
perfis e funções ligados à transformação di-
gital das empresas serão os mais beneficia-
de transformação” trabalhadores das áreas de saúde, ensino e
segurança pública são essenciais. Bruxelas
dos, com particular ênfase para os postos de Luís Melo aponta também para um reforço no investi-
tecnologia, como cibersegurança, cloud, In- Executive Search e Country mento nestas áreas. O IEFP observa que “as
teligência Artificial/machine learning ou big Managing Partner da Boyden áreas da saúde e do bem-estar têm vindo a
data & analytics”, prevê Rui Teixeira. ser valorizadas desde o início da pandemia,
Além da digitalização, a outra grande aposta da Eu- e tendem a continuar a sê-lo”, e sublinha que “também
ropa é no investimento na transição energética que de- as áreas ligadas ao apoio domiciliário ou ao trabalho
verá criar oportunidades nas áreas ligadas ao ambiente em lares, num País em que o peso da população idosa
e à sustentabilidade, dirigidas aos chamados “colarinhos e dependente é significativo, têm vindo, nomeadamen-
verdes” (profissões relacionadas com as mudanças na te por força do efeito da Covid-19 nestas populações,
energia e com a descarbonização). Ocupações, em a ser reconhecidas e valorizadas”. O relançamento da
alguns casos de elevada tecnicidade, que podem economia terá também de incidir em grandes in-
absorver trabalhadores de indústrias com gran- vestimentos em infraestruturas, o que poderá dar
de pegada carbónica e que estejam em descon- algum suporte à construção, um setor que tem
tinuação, indica o COO do ManpowerGroup. resistido aos impactos desta crise.

1 8 . EXAM E . DEZEM BRO 2020


SANEAMENTO COMÉRCIO
E GESTÃO
DE RESÍDUOS
ATIVIDADES
IMOBILIÁRIAS
E REPARAÇÃO
DE VEÍCULOS
INDÚSTRIAS
TRANSFORMADORAS O QUE SE PEDE
-3,9 ATIVIDADES -11 -30,8 -42
SAÚDE
E APOIO
ARTÍSTICAS,
DE ESPETÁCULOS, TRANSPORTES ATIVIDADES
ALOJAMENTO,
RESTAURAÇÃO
ÀS LIDERANÇAS
SOCIAL DESPORTIVAS E ARMAZENAGEM ADMINISTRATIVAS E SIMILARES O pós-pandemia requer skills que aliem rapidez
-1,3 -6,2 -24,1 -31,1 -45,7 de reação, experiência global e mobilização de equipas
remotas. Saber juntar dimensão humana e tecnológica
também é um trunfo

As caraterísticas hoje de aprendizagem admitir entrevistar (e


exigidas aos líderes rápida, de liderar contratar) à distância,
Ferida aberta empresariais não por influência e de por videochamada, os
Setores como deverão mudar muito, mobilizar equipas candidatos que eles
a hotelaria e a assim que seja ultra- sem necessidade sempre receberam
restauração viram passada a atual crise de presença física – pessoalmente.
desaparecer mais de saúde pública, e algo crucial perante Nestes meses marca-
de 45 mil postos de
trabalho desde o início pedem uma conjuga- a emergência do dos pela Covid-19, os
da pandemia, seguidos ção entre a disponibi- teletrabalho. setores que mais têm
de perto pela indústria lidade para a diferença Juntar a dimensão hu- procurado a Boyden
transformadora, em e para a mudança, a mana e tecnológica, para recrutamento de
FONTE: INE

que as perdas foram


capacidade de ante- conseguir antecipar quadros superiores
de 42 mil empregos.
Herança pesada cipar alterações e de mudanças e ter a ca- são a indústria – em
para o próximo ciclo assumir o risco, a par pacidade para assu- particular a automó-
económico de qualidades menos mir riscos calculados, vel, após aquisições
tangíveis, como o numa altura em que de private equity – e
otimismo, a calma e a se pede intuição para o retalho alimentar,
intuição. se decidir com poucos dos poucos negócios
“Somos nós que dados e pouco tempo, que aumentaram ati-
ajudamos a definir são outros fatores vidade neste período.
melhor o que as distintivos, bem como E, no pós-pandemia,
4 947,8 empresas precisam “a capacidade de que setores se desta-
e a incorporar as soft manter a calma, de carão? “A tecnologia
skills necessárias”, demonstrar otimismo que já é uma realida-
FONTE: INE

mais do que serem moderado e de de. A transição digital


as empresas a pedir manifestar empatia vai acelerar e trans-
perfis específicos genuinamente”, afir- formar os modelos
2015 2016 2017 2018 2019 2020
de líder, explica Luís ma o responsável. de negócio e a cultura
Melo. Entre os Depois de um primei- das empresas que
Algumas destas tendências já se notaram nos últi- atributos que podem ro trimestre “bastante vão precisar das áreas
mos meses, mas o reflexo no número de vagas de em- decidir a escolha, o forte” para a atividade de consultoria”, an-
prego ainda está por se verificar. Para já, os empregado- responsável pela área de executive search, tevê Luís Melo. Com
res parecem estar, em grande parte, colocados ombro a de Executive Search o deflagrar da pande- várias multinacionais
ombro atrás da linha de partida, à espera de notícias que na Boyden Portugal (e mia a partir de março a transferir a produção
gerem confiança suficiente para uma retoma. Uns, na também seu Country trouxe o período para a Europa, para
Manager) elenca a mais difícil de que não dependerem
expectativa de ainda recuperarem das perdas causadas
aptidão de se sair da há memória, com as exclusivamente de
pelo impacto de quase um ano de pandemia; outros, os
zona de conforto e de empresas mais cen- mercados como a
que conseguiram manter-se a flutuar ou que navegaram ser adaptar à veloci- tradas na manuten- China, a indústria será
mesmo pelas oportunidades detetadas nestes meses, dade da transforma- ção de operacionais outra área quente, tal
esperam pela possibilidade de reforçar a produção, ou ção; a disponibilidade do que em recrutar. como o private equity
a prestação de serviços, e de continuarem a conquistar para ser influenciado, E só em maio/junho que continuará ativo,
mercado, assim se recupere alguma estabilidade. aprender e trabalhar a generalidade dos “porque há vontade
A chave em que todos apostam é o surgimento de com pessoas de clientes quebrou “um de investir e capacida-
um avanço médico que ponha um ponto final à crise diferentes culturas e dogma de décadas”, de de financiamento
de saúde pública global, traga a normalidade aos flu- em várias geografias, nas palavras de Luís para aquisições”,
xos comerciais, leve de novo as empresas a investir e as além da capacidade Melo, passando a argumenta.
pessoas a gastar – impulsionando a criação de mais em-

DEZEM BRO 2020 . EXAM E . 19


prego. “A partir de um determinado momento, a pro-
babilidade de uma vacina, só por si, já ajuda a que os
mercados tomem decisões a médio prazo”, considera CAMINHOS ÚTEIS
Pedro Borges Caroço, recordando a reação das bolsas Melhorar as competências
internacionais às notícias de eficácia chegadas do lado e manter-se no radar de possíveis
dos medicamentos que estão a ser desenvolvidos pela
empregadores podem ajudar
Pfizer ou pela Moderna. Mas o senior executive mana-
a acelerar transições ou a
ger da Michael Page põe água na fervura. Apesar de es-
tas nesgas de luz ao fundo do túnel serem animadoras,
regressar ao mercado de trabalho
falta que elas se convertam em recrutamentos. “Ainda
> MANTER E REFORÇAR A REDE
estamos no pico da cautela”, avisa.
Num inquérito realizado recentemente por aquela O distanciamento imposto pela pan-
consultora, um quarto das empresas mostrou-se su- demia vinca ainda mais a necessidade
ficientemente otimista para admitir contratar no pri- de manter vivo o leque de contactos,
meiro trimestre de 2021, contra os 30% que diziam não sobretudo nas redes sociais. Ter o
saber se o fariam. O questionário foi feito antes das no- currículo atualizado, consultar frequen-
tícias de eficácia das vacinas em desenvolvimento, o que temente o LinkedIn e interagir com as
pode fazer pecar os números por defeito. “Os mercados ligações existentes pode ajudar a abrir
precisam de confiança. Havendo-a, vão voltar a recru- portas para um regresso ao mercado
de trabalho ou para um novo emprego.
tar”, afirma o responsável da Michael Page.
Nos casos em que tal é possível, de-
monstrar experiência em tecnologias
A GRANDE RECONVERSÃO
de trabalho remoto pode ser um ponto
Esta crise teve um impacto forte em muitas das áreas de diferenciador.
atividade que representam mais emprego na economia
portuguesa, como a indústria transformadora, o comér- > APOSTAR NA FORMAÇÃO
cio e as atividades de alojamento e de restauração. Mes-
mo após terem perdido, no seu conjunto, quase 120 mil Não será cenário possível em todos os
postos de trabalho, nos primeiros nove meses do ano, casos – dado sobretudo o custo envol-
vido –, mas o ideal para quem se en-
ainda representam quase 37% do emprego em Portugal,
contra entre empregos, ou procura uma
segundo os dados do INE relativos ao final de setembro.
primeira colocação, será aproveitar para
São responsáveis por 1,76 milhões de postos de trabalho, investir em formação e na melhoria de
alguns deles mantidos à custa de medidas de apoio ex- competências, através, por exemplo,
traordinárias como o layoff simplificado e o novo meca- de pós-graduações. No caso das tec-
nismo de apoio à retoma progressiva da atividade. nologias, uma das áreas mais quentes,
Muitos destes empregos correm o risco de estar no muitas ofertas requerem competências
fio da navalha devido ao sufoco económico que dura já em plataformas, sistemas e linguagens
de programação como Java, outsystem, Ascensão da máquina
há nove meses e que não se sabe muito bem por quan-
QA, SAP, Cyber ou Python, segundo o Segundo o Fórum Económico
to tempo mais irá permanecer. Ainda antes da entrada Mundial, dentro de cinco anos
em vigor dos novos estados de emergência, a Associa- COO do ManpowerGroup, Rui Teixeira. o tempo que os humanos
ção da Hotelaria, Restauração e Similares de Portugal e as máquinas despendem
> EM CIMA DAS OFERTAS em tarefas relacionadas com
(AHRESP) revelava que 41% das empresas do setor pon- o trabalho deverá equilibrar-se,
deravam avançar para a insolvência. Já o comércio e “É fundamental estar atento ao merca- levando ao abrandamento
a indústria transformadora ressentiram-se fortemente da criação de emprego.
do. Não parámos, as oportunidades que
Já o ritmo de destruição
com o colapso súbito da procura externa e do consumo existem hoje são muito reais. Quem de postos de trabalho poderá
doméstico provocados pela crise. Além disso, eram já está a recrutar é porque tem muita ne- manter-se elevado, o que
apontados antes da crise como os mais vulneráveis à cessidade de que aquela posição seja obrigará a maiores esforços
preenchida”, defende Pedro Borges de reconversão e requalificação
crescente robotização e automação.
Um estudo apresentado pela Confederação Empre- Caroço. O Senior Executive Manager da
Michael Page aconselha quem procura
sarial de Portugal (CIP), em parceria com a McKinsey,
emprego a continuar empenhado na
indicava no início de 2019 que “50% do tempo despen-
pesquisa, a procurar o mais possível
dido em tarefas laborais atuais é suscetível de ser auto- nos sites, a perceber para onde está a
matizado, recorrendo-se à tecnologia atual, podendo ir o mercado, potenciando essas opor-
aumentar para 67% em 2030”. Num cenário intermédio, tunidades. “Todas as posições estão a
isso pode implicar que 1,1 milhões de trabalhadores se ser fechadas com sucesso, porque são
venham a tornar redundantes até 2030, com os setores poucas e fundamentais”, conclui.

20 . EXAM E . DEZEM BRO 2020


PREPARAR AS NOVAS GERAÇÕES PARA O FUTURO
Uma empresa portuguesa está a desenvolver experiências e conteúdos educativos, que
ajudam os jovens a criar competências para enfrentar os desafios do mercado de trabalho

As alterações dos modelos empresa- que pretende despertar a curiosidade para os alunos, quer para os forma-
riais, a automação e a cada vez maior e incentivar as crianças a encontrar dores. Quisemos perceber como as
utilização da Inteligência Artificial no o seu caminho e a pensar de uma experiências funcionavam no digital.
mundo dos negócios terão um forte maneira diferente. E o pensamento Tivemos cinco mil famílias a aderir”,
impacto na organização laboral como criativo será uma das ferramentas conta Manuel Câmara. O êxito desta
hoje a conhecemos. Um estudo do mais importantes para que pos- ferramenta digital levou-os a serem
Fórum Económico Mundial admite sam enfrentar o futuro mercado de selecionados pelo Impact EdTech,
que 65% das crianças que estão agora trabalho”. programa da União Europeia lançado
a entrar na escola básica vão trabalhar Em apenas quatro anos de existência, no contexto da Covid-19 para resolver
em profissões que ainda não existem. a The Inventors já deu formação a problemas de aprendizagem e ensino
Para tentar dar resposta a este proble- 28 mil crianças, desenvolveu 400 à distância.
ma, dois portugueses decidiram criar mil experiências e tem atividade em Agora, pensam levar este conceito
a The Inventors, uma empresa que 170 escolas nacionais. O sucesso em para as universidades. Manuel Câmara
desenvolve conteúdo educativo des- Portugal levou-os a experimentar o diz que “muitas faculdades não estão
tinado a preparar as novas gerações conceito no estrangeiro. Há cerca de a acompanhar a disrupção que está a
para esta realidade. “Nós criámos, um ano, entraram em duas escolas do acontecer no mercado de trabalho”.
de raiz, experiências educativas que Reino Unido – bastaram-lhes poucas “Hoje em dia, para estar a um nível
despertem a curiosidade das crianças semanas para começar a desenvolver competitivo no mercado de trabalho,
e lhes permitam desenvolver capaci- trabalhos em mais 23. “Estávamos a um aluno terá de fazer uma boa parte
dades que não são estimuladas nas crescer no mercado britânico quando da aprendizagem fora da universida-
escolas”, diz José Malaquias, um dos surgiu a pandemia, o que nos obrigou de. Sobretudo no lado prático.”
sócios da The Inventors. a refrear os projetos”, diz Manuel Com a rápida transformação e evo-
Estas experiências vão desde a cons- Câmara, outro dos fundadores. lução tecnológica, Manuel Câmara
trução de um piano até ao desenvol- Mas, por outro lado, foi a mesma sublinha que uma das ferramentas
vimento de um filme de animação. O pandemia que os colocou sob os ho- mais importantes para o futuro será
fundamental, explica José Malaquias, lofotes da Europa. “Em março, assim a de “aprender a aprender”. E é essa
“é que tenham sempre associadas a que se começou a falar de confina- capacidade de aprendizagem perma-
criatividade, a engenharia e as artes. mento, começámos a desenvolver nente que a The Inventors pretende
Nós temos uma postura disruptiva, ferramentas de ensino remoto, quer transmitir às novas gerações. P. M. S.

do comércio a serem os mais atingidos. Em contrapar- racterísticas do emprego em Portugal e a reconversão


tida, previa-se entre 600 mil e 1,1 milhões de postos não será necessária apenas nos setores mais atingidos
de trabalho criados na sequência da combinação entre pela crise. Mesmo sem pandemia, o País enfrentava já
automação e crescimento económico. um desafio enorme de preparar a mão de obra para
O retrato do Fórum Económico Mundial aponta no uma economia digitalizada. “Existem défices estrutu-
mesmo sentido. Até 2025, prevê-se que, ao nível global, rais de qualificações já conhecidos, designadamente os
humanos e máquinas gastem o mesmo tempo em tarefas associados aos setores emergentes, como é o caso das
relacionadas com o trabalho. A criação de emprego deverá tecnologias de informação, da programação e das en-
abrandar e o ritmo de destruição poderá continuar alto, genharias”, indica o IEFP. A ministra do Trabalho, Ana
obrigando a um grande esforço para se dotar os trabalha- Mendes Godinho, defende, numa entrevista nesta edi-
dores das profissões descontinuadas de competências que ção da EXAME, que este é o momento para se apostar
lhes permitam assumir outro tipo de funções. A recon- “em áreas económicas de futuro, seja no digital, na ener-
versão de mão de obra de setores em declínio e de outros gia e na sustentabilidade ambiental, seja na área social”.
que não recuperem para os níveis anteriores a março de A crise da Covid-19 veio acelerar essa necessidade
2020, além da resolução do défice crónico de competên- de requalificação, com reflexo nos instrumentos nacio-
cias digitais dos trabalhadores, são alguns dos maiores nais. O Plano de Recuperação e Resiliência, apresenta-
desafios para o ciclo de recuperação do pós-pandemia. do por Portugal a Bruxelas, contempla um total de 360
As novas forças que vão puxar pelo mercado de tra- milhões de euros para qualificação de competências
balho parecem estar bastante desencontradas das ca- para a inovação e renovação industrial e 650 milhões

DEZEM BRO 2020 . EXAM E . 21


de euros para apoiar a transição digital nas empresas, transversal”, refere Pedro Borges Caroço. O responsável
nomeadamente para reforçar as competências digitais da Michael Page defende que “os indiferenciados con-
dos trabalhadores, transformar os modelos de negócio tinuarão a ter lugar”, mas ressalva que, “se a atividade
e potenciar a integração de tecnologia. Antes disso, o comercial testar que pode ser feita de forma diferente,
Programa de Estabilização Económica e Social, lançado com menos contacto, podemos ter necessidade de me-
pelo Governo, já previa a formação profissional de novos nos pessoas afetas a essas funções”, em particular nas
desempregados e medidas para a capacitação digital de relações entre empresas. “O digital vem ocupar parte
desempregados e de jovens até aos 35 anos. O setor do das atividades que estavam a ser feitas agora.”
turismo, um dos mais afetados, vai exigir esforços de
reconversão, requalificação e apoios à criação de novos ALERTA PARA A DESIGUALDADE
postos de trabalho, segundo o IEFP. O instituto público Todos estes fatores também acentuam o risco de estar
aponta ainda a necessidade de os trabalhadores desen- a desenhar-se uma economia mais desigual. E isso já
volverem power skills (combinação de soft skills, com ficou demonstrado nos últimos meses. O Banco de Por-
thinking e digital skills) para poderem ser incluídos na tugal tem observado que, durante o confinamento, “a
transformação digital. incidência do teletrabalho foi muito mais elevada nos
As exigências atuais também já podem dar algumas indivíduos com maior escolaridade e maior remune-
pistas sobre o futuro. Em quatro das maiores economias ração do trabalho”. No boletim económico de outubro,
da Europa Ocidental, as cinco skills que as empresas os economistas da instituição observavam que “a possi-
identificaram como emergentes (segundo o mesmo re- bilidade de se trabalhar remotamente contribuiu para
latório do Fórum Económico Mundial conhecido em minimizar perdas de emprego” e alertavam que “esta
outubro) prendem-se com o pensamento analítico e evidência, em conjunto com o facto de as profissões
a inovação, a aprendizagem ativa, a resolução de pro- com menores qualificações e consequentemente me-
blemas complexos, o pensamento crítico e a análise, e nores rendimentos serem menos propensas ao trabalho
a criatividade, originalidade e iniciativa. Nos mesmos remoto, sugere que a crise pandémica poderá acentuar
países (Espanha, França, Itália e Alemanha), os perfis a desigualdade”.
dados como os mais procurados dentro das empresas Pessoas com fortes competências digitais terão
apontavam para funções como analistas de da- maior probabilidade de encontrarem ofertas
dos, especialistas em Internet das Coisas e em “A tendência de trabalho mais atrativas e com condições
big data. Em sentido contrário, consideram-se de maior liberdade mais vantajosas, e sem estarem circunscritas
redundantes, dentro das organizações, funções ao mercado português. No limite, e para as
relacionadas com a introdução de dados ou a e flexibilidade profissões cujo trabalho o permita, será pos-
atualização de bases, trabalhos administrativos pode permitir que sível “emigrar” sem sair de casa. “A tendên-
e de secretariado e contabilidade. a função seja feita cia de maior liberdade e flexibilidade pode
A crise pandémica aumentou a necessidade trazer oportunidades até ao nível interna-
que já existia de requalificação e de formação. remotamente a cional, em que a mobilidade provavelmen-
Mas, “hoje, além de ser uma arma fundamen- partir de Portugal te não obriga a mudar-se geograficamente.
tal para resolver este desencontro de compe- para outras Pode permitir que a função seja feita remo-
tências, a formação é também uma das solu- tamente, a partir de Portugal para outras
ções para gerar novas oportunidades para os geografias” geografias”, sintetiza Pedro Borges Caroço
profissionais que sofreram o impacto da crise Pedro Borges Caroço
que já hoje tem clientes a procurar, pontual-
de emprego decorrente da pandemia”, afirma Senior Executive Manager da Michael Page mente, soluções deste género em Portugal.
Rui Teixeira. O responsável do ManpowerGroup Tudo somado, parece garantido que as
sublinha a importância do investimento nas compe- oportunidades de trabalho vão continuar a existir. Mas
tências digitais, mas realça que “esta aposta deverá não será tarefa fácil fechar o desencontro entre o que
ser feita também nas áreas técnicas” e exemplifica as empresas querem e o perfil da mão de obra dis-
com a escassez de talento em funções especializadas ponível. Esse será o grande desafio para, quando a
como eletricistas, condutores, mecânicos e funções economia retomar, se conseguir absorver no mer-
técnicas, nomeadamente o controlo de qualidade. cado uma parte significativa dos 400 mil desempre-
Também as profissões menos especializadas gados, que o País registava no final de setembro, e
continuarão a ter lugar no mercado de trabalho, encontrar uma solução para os empregos que ainda
mas permanecerá a grande dúvida quanto ao volu- poderão ser extintos nos setores mais vulneráveis à
me de mão de obra que será absorvida. “Se, depois da crise pandémica e à revolução digital. Oferecer a cana
pandemia, conseguirmos resolver a perspetiva econó- já há muito que não é solução para criar e manter em-
mica posterior que poderá ser muito grave, então pregos. Mas, nunca como agora, foi tão essencial
voltará a haver espaço numa perspetiva (re) ensinar a pescar. E

2 2 . EXAM E . DEZEM BRO 2020


N OVO TRA BA L H O

TELETRABALHO
É A “PONTA
DO ICEBERGUE”
Painel de especialistas tentou ante-
cipar as competências que vão ser
necessárias num contexto laboral
que nunca mais voltará ao que era
Texto Margarida Vaqueiro Lopes

A
daptabilidade, flexibilidade, dele-
gação de tarefas, responsabilização.
Tudo palavras que soavam bem, mas
diziam pouco, e que agora as empre-
sas foram mesmo obrigadas a levar a
sério, sobretudo as que sabem que não podem perder
o comboio que passou, ainda mais veloz, durante esta
pandemia. O aviso foi feito pelo painel de especialis-
tas que se reuniu virtualmente no último dia de O Fu-
turo do Trabalho, para falar sobre como serão
as novas formas de o fazer, lembrando ainda
que o teletrabalho pode ser a face mais visível Formação ao longo chamam] Covid 1.0, as pessoas perceberam
de uma série de mudanças que serão sempre que o chefe não só não achava mal como até
muito mais profundas e muito mais alargadas da vida e um regime conseguiam trabalhar bem ou até melhor,
do que parecem à primeira vista. “Chamámos laboral adaptado ao em casa. Penso que, portanto, isto pode ter
a esta segunda fase a Covid 2.0. Ninguém ti- que é a diversidade vindo para ficar”, considera. Na Talkdesk,
nha verdadeiramente experiência de gestão de o trabalho remoto já era algo relativamente
pandemias em Portugal e, portanto, no início, geracional que normal – nos EUA, 40% das equipas foram
fizemos tudo o que podíamos com o que sa- compõe o tecido contratadas nesse pressuposto, e, com 80%
bíamos, mas, desta vez, já nos pudemos pre- laboral do País dos postos em solo nacional a estarem li-
para um bocadinho mais”, começou por dizer gados a funções tecnológicas, foi algo facil-
Catarina Horta, diretora de Capital Humano são inevitáveis mente acomodado pelos trabalhadores. “A
do Novo Banco. A responsável explicou que a nossa vontade era deixar as pessoas o mais
possibilidade de trabalhar remotamente já existia na à vontade possível para escolherem onde querem estar
instituição, dentro de um pacote chamado “Dividen- a trabalhar – muitas voltaram para a Madeira, para Co-
do Social”, mas que apesar de haver iniciativas que são imbra, para os Açores, lugares de onde tinham vindo só
muito bem acolhidas – como entrar mais tarde à segun- para trabalhar”, realça Francisca Matos, Talent Direc-
da-feira e sair mais cedo à sexta-feira ou ter oportuni- tor na Talkdesk. “Neste momento, os nossos escritórios
dade de levar para casa, a um preço reduzido, refeições encontram-se encerrados. Algumas pessoas estão com
do refeitório –, o teletrabalho tinha muito pouca adesão, opção de coworking; outras criaram um escritório em
“porque basicamente as pessoas acreditavam que o che- casa – a Talkdesk montou um pack de equipamento que
fe ia achar mal. Nos primeiros 15 dias [da época a que as pessoas podiam recolher e levar”, e a empresa tentou

2 4 . EXAM E . DEZEM BRO 2020


COM O APOIO

criar um sistema de acompanhamento para perceber


“VAMOS como cada um estava a lidar com o trabalho remoto.
PERDER UMA Mas para Vítor Antunes, Managing Director da
Manpower Portugal, a grande alteração vai passar pelo
OPORTUNIDADE facto de as organizações deixarem de estar assentes no
PARA PLANEAR conceito de estabilidade e passarem a estar centradas
O FUTURO” na agilidade e numa cultura de aprendizagem. E isto
vai recair sobretudo nos líderes, que terão como mis-
Maria João Valente Rosa teme são conduzir as empresas sob estas novas traves-mes-
que não aproveitemos esta crise tras. “É óbvio que ambição, resiliência, visão e adap-
tabilidade são competências que procuramos sempre
em alguém que ocupe cargos de liderança. Mas depois
> NOVO MUNDO existem as competências que se podem desenvolver,
e estas devem estar centradas naquilo que agora se
“Todo o nosso modelo de funcionamento do torna ainda mais importante: as pessoas, o desem-
trabalho vem da primeira Revolução Industri- penho e o propósito”, considera. “É preciso ouvir as
al. Estamos agora na quarta... Não podemos pessoas e desenvolver as suas competências para irem
continuar a esticar o que se fazia no passado. ao encontro não só daquilo que a organização precisa
Se continuarmos a achar que, quando tudo mas também daquilo que elas próprias pretendem. É
isto passar, voltaremos ao passado, vamos
preciso, em relação ao propósito, ter uma visão para a
perder uma oportunidade para planear o pre-
organização que oriente os membros, mesmo quando
sente e o futuro”, afirmou a demógrafa Maria
João Valente Rosa, durante o segundo painel não estejam com o líder – o que se torna mais regular
da iniciativa O Futuro do Trabalho. Isso pode em tempos de teletrabalho. Portanto, ganha importân-
significar mais flexibilidade mas também cia saber delegar, saber confiar, pedir feedback e agir
maior responsabilidade individual. “Já não com base nesse feedback”, indica ainda Vítor Antunes.
somos avaliados pelo número de horas que Um dos temas mais falados durante esta mesa-re-
estamos no trabalho, mas pelo resultado.” donda foi, precisamente, o possível desaparecimento
de várias funções – não apenas por conta da aceleração
> DESIGUALDADE
provocada pela pandemia mas também do surgimento
e afirmação das novas tecnologias, nomeadamente da
No entanto, a pandemia também põe a nu
as desigualdades existentes na sociedade Inteligência Artificial, que vai ajudar à realização de
portuguesa. “Mesmo nos casos de tele- muitas tarefas mais mecânicas e à prossecução efetiva
trabalho, nem todos estão em situações do desenvolvimento de outras valências por parte dos
idênticas. Há pessoas com locais de maior trabalhadores, como a hospitalidade, a capacidade de
conforto, mais espaço, melhores condições gestão e a criatividade, defende Vítor Antunes. No mes-
À distância
de trabalho, e outras nem tanto”, sublinhou mo sentido, a empatia e a capacidade de se colocar no
“A nossa vontade era
a antiga diretora da Pordata. Isso é ainda lugar do outro podem ser trunfos nestes novos tempos
deixar as pessoas
mais preocupante num País onde “a mo- o mais à vontade que se avizinham. Numa altura em que parece claro
bilidade social já é bastante baixa. Temos possível para que já é impossível travar este comboio em andamen-
uma cola social forte. Estamos colados ao escolherem onde
querem estar to – ou, nas palavras de Francisca Matos, as empresas
sítio onde nascemos. Esses pisos de baixo
a trabalhar,” frisa estão “a construir um avião que está em pleno voo” –,
tornam-se agora ainda mais pegajosos”. Francisca Matos, a verdade é que parece que ainda falta planeamento a
Talent Director
> CARREIRA PARA A VIDA? na Talkdesk médio e a longo prazos, admitiram por unanimidade.
Em resumo: todos apontam para um acelerar de
A ideia de uma única carreira para processos que há anos se vinham a revelar necessá-
a vida pode ter morrido? “Cada vez rios nas organizações e que agora foram fortemente
mais percebemos que um emprego impulsionados pela rapidez com que foi preciso agir.
para a vida é mais difícil de ser algo Isto obrigará, a partir de agora, a contar com equipas
garantido. Provavelmente, vamos ter
mais flexíveis, adaptáveis e com lideranças seguras,
múltiplas carreiras”, antecipa Valente
capazes de delegar responsabilidades e de olhar para
Rosa. Continuaremos a formar-nos nas
áreas que nos dizem mais, mas talvez o futuro enquanto se lida com o presente. A formação
não possamos ficar para sempre aí ao longo da vida parece ser uma inevitabilidade – tal
integrados. “Quando andei na escola, como um regime laboral mais flexível e adaptado ao
ninguém falou da internet. Hoje, vivo que é a diversidade, inclusivamente geracional, que
num mundo totalmente diferente.” compõe o tecido laboral do País. E

DEZEM BRO 2020 . EXAM E . 25


I DE NTI DADE

O GRANDE TESTE
À CULTURA
DAS EMPRESAS
Organizações que tenham construído
culturas fortes têm maior probabilidade
de superar esta crise que colocou
desafios que poucos esperavam
Texto Rui Barroso

P
ode não ser consensual que as crises
sejam os momentos certos para criar as
culturas das empresas. Mas o que apa-
renta ser certo é que as empresas com
culturas fracas saem fragilizadas em
tempos de crise. Já as que conseguiram construir cul-
turas fortes, ao longo dos últimos anos, tenderão a sair
reforçadas. Os novos padrões de trabalho gerados pela
pandemia serviram como uma espécie de teste do algo-
dão à solidez das culturas e das lideranças empresariais.
“No momento em que vivemos, que é de enorme
transformação, a cultura é o facilitador para o cresci-
mento”, defendeu Pedro Amorim. O managing director
da Experis Portugal indicou que “os líderes transparen-
tes e que conseguem gerar confiança nas suas equipas”
terão muito maior probabilidade de superar os desafios
colocados em fases como a que vivemos. O especialis-
ta considera que os gestores de “empresas que não se
adaptaram, e que tiveram a dissonância entre o que é ser
líder e ser chefe, terão muitos problemas”, até porque o
padrão de trabalho que se observava antes da pandemia
poderá nunca mais regressar.
Também Pedro Afonso defende que “estes momen-
tos da verdade põem à prova o que andámos a fazer nos
últimos anos”. O CEO da Vinci Energies Portugal realça
que “o trabalho de desenvolvimento da cultura é feito a
longo prazo, em permanência e muito antes da chegada
dos problemas”. E conclui: “Não é nesta altura que se
desenvolve a cultura.” No entanto, essa perspetiva não
é consensual. Maria de Fátima Carioca, dean da AESE
Business School, refere que “tudo aquilo por que esta-
mos a passar são momentos fortes e podem ser muito

26 . EXAM E . DEZEM BRO 2020


COM O APOIO

VÍDEO
DISPONÍVEL EM
EXAME.PT

À PROCURA DO TALENTO ESCONDIDO


Juan Carlos Cubeiro, especialista em liderança e coaching, diz que todos
temos talento. O problema é que são poucos os que descobrem que o têm

Todos temos talento. O problema é descobri-lo. Esta foi uma das principais querer e não apenas dizê-lo, sublinha. Enquanto muitas pessoas ainda não
mensagens deixadas por Juan Carlos Cubeiro, um dos maiores especi- descobriram o seu talento, os empregadores desesperam por encontrá-
alistas ibéricos em liderança, na iniciativa o Futuro de Trabalho. “Todas as -lo: em cerca de 40% das posições para as quais procuram candidatos, as
pessoas têm talento, mas só poucas descobrem o talento que têm”, afirma empresas acabam por não conseguir localizar aqueles que têm o talento
o também advisor do Human Age Institute, do Manpower Group. pretendido para as funções, observa o especialista. Na hora de contratar, as
Mas, afinal, como descobrir o talento? “Quando tens algo de que gostas, empresas olham principalmente para as competências técnicas, a aptidão
que fazes bem, que o mercado considera e paga por isso, aí é talento”, e o conhecimento, mas isso não quer dizer que as soft skills não sejam
responde Juan Carlos Cubeiro, autor de cerca de cinco dezenas de livros essenciais. No entanto, a regra, diz Juan Carlos Cubeiro, é que as empresas
sobre liderança e coaching. O especialista, que aconselha algumas das “selecionam por aptidão e despedem pela atitude”.
maiores empresas espanholas, especifica que “talento é pormos em valor Nas lideranças, competências como a autoconfiança, o autocontrolo, a ori-
aquilo que sabemos, podemos e queremos fazer”, e realça que, “quando entação para resultados, a empatia e a influência são ainda mais essenciais,
nas empresas dizemos que as pessoas são o mais importante, isso não é de forma a cultivar o talento coletivo.
propriamente verdade. O talento é o mais importante”. A pandemia forçou muitas empresas a fazer em cinco meses uma transfor-
Segundo as estimativas de Juan Carlos Cubeiro, 40% das pessoas nunca mação digital de cinco anos. Muitos trabalhadores tiveram de ficar em casa
chegam a descobrir o seu talento. Isso pode ser explicado por fatores como em teletrabalho, e a forma como este desafio está a ser encarado pode
o tipo de sociedade em que vivemos, que valoriza principalmente o espetá- fazer a diferença entre o sucesso e o insucesso das organizações. “Com o
culo e o show business. Outro entrave à descoberta de talento pode residir teletrabalho, muita gente tenta reproduzir a burocracia e o taylorismo. Mui-
na educação. Juan Carlos Cubeiro realça que, em Espanha, por exemplo, tos ficaram 14 horas por dia à frente de um ecrã, o que não é produtivo”,
a educação não aparece como uma das principais prioridades e preo- refere Juan Carlos Cubeiro. O autor ilustra com o caso de Espanha que,
cupações da opinião pública, e isso é um problema, já que “não pode tal como Portugal, é um dos países onde impera mais o “presencia-
haver desenvolvimento do talento se não houver desenvolvimento lismo”. “Ficava-se até que o chefe fosse embora, porque o capataz
da educação”. O especialista defende que “o talento é capaci- queria sentir-se capataz e ter todas as pessoas. Em algumas
dade, compromisso e contexto” e que a escola tem de ajudar a empresas ainda se espera que, quando isto terminar, se
desenvolver esse tipo de competências. regresse a este modelo. Mas o capataz não tem de regressar.
Para encontrarem o talento, as pessoas têm mesmo de que- Não aporta valor. Essa desconfiança, descontrolo e justifica-
rer fazê-lo, defende Juan Carlos Cubeiro. E querer é mesmo ção da burocracia não fazem sentido”, considera o consultor.

unitivos dentro de uma organização” e defende director da Experis Portugal esclarece que “os
que “momentos fortes são momentos para se Empresas que que construíram equipas fortes e operam, com
criar uma cultura forte”. desenvolveram integridade, as suas pessoas com culturas mui-
A pandemia colocou desafios difíceis às to orientadas para a transparência” têm mais
culturas e às lideranças empresariais. Maria culturas fortes ferramentas para lidarem com estes desafios.
de Fátima Carioca mencionou um estudo feito têm maior E é neste tipo de situações que vem ainda
pela IESE em vários países sobre as emoções probabilidade mais ao de cima a diferença entre o chefe e o
das pessoas que foram forçadas a ficar em casa. líder, entre quem pensa ter todas as certezas e
“Uns aceitaram, outros continuaram com uma de superar quem se preocupa em saber formular as per-
zanga interior devido à situação e houve quem os desafios guntas corretas. “Mostrar confiança não signi-
entrasse em depressão.” Num cenário deste causados pela fica mostrar certeza”, explica Pedro Afonso. O
tipo, indica a dean da AESE, “a primeira coi- gestor especifica que “confiança e certeza são
sa que o líder tem de fazer é gerir todas essas pandemia coisas diferentes, e se eu tenho muitas certezas
emoções que acabam por vir à tona e perceber é porque alguma coisa não está bem”. Apesar de
como é que, com uma equipa deslocalizada e virtual, se todas as exigências colocadas pela pandemia, Maria de
consegue desenvolver coletivamente a cultura única e Fátima Carioca avisa que “o verdadeiro desafio começa
a unidade entre pessoas relativamente dispersas”. Mas agora”. O mais provável é que se assista à implementa-
isso apenas pode ser assegurado se já se tiver construído ção de modelos híbridos, com algumas pessoas a tra-
uma base forte e uma liderança humilde nas organiza- balhar de forma presencial e outras de forma remota,
ções. “Não há milagres. Não é possível dizer ‘venham e será necessário assegurar uma única equipa entre os
agora para aqui uns consultores’, porque as pessoas es- que estão perto e os que estão longe. A dean da AESE
tão muito distantes”, realça Pedro Amorim. O managing conclui que “este modo híbrido é que é o desafio”. E

DEZEM BRO 2020 . EXAM E . 27


COM O APOIO

PA N D E M I A

UM DESAFIO
CHAMADO
DISTÂNCIA
O modelo de trabalho remoto, que
obrigou a uma rápida adaptação,
não é para todos. E traz desafios
às organizações, que vão da cultura
ao recrutamento, passando pela VÍDEO
DISPONÍVEL EM
EXAME.PT
formação e integração
Texto Paulo Zacarias Gomes

A
pandemia obrigou empresas Modelos segue fazer ‘training’ da mesma maneira. Temos
e trabalhadores a maior fle- de caminhar para um modelo mais intermédio”,
xibilidade e agilidade e criou híbridos de secundou Rogério Campos Henriques
desafios culturais, de forma- trabalho desafiam Para o CEO da Fidelidade, ter de trabalhar a
ção e integração que as orga- componentes partir de casa desfez alguns tabus junto de cola-
nizações ainda não digeriram. No longo prazo, boradores que pensavam que o teletrabalho não
as transformações trazidas por esta crise podem como o recruta- poderia ser aplicado à sua função. Mesmo com
acelerar a inovação e contribuir para aumen- mento, a seleção dificuldades iniciais: “Na altura [do confinamen-
tar a inclusão, por exemplo, através de fenó- e a integração to], dizia em jeito de brincadeira que aquilo não
menos como o trabalho remoto. “O teletrabalho era teletrabalho, era ‘teleconfusão’, cheguei a ver
abre oportunidades que não estavam na agen- na empresa crianças a pularem por cima dos pais, era difícil
da, também em termos geográficos. Podemos gerir aquela dinâmica”, descreveu. O modelo, re-
trabalhar com pessoas que não estão nos lugares ha- conheceu, não funciona de forma igual para todos, e, em
bituais e contribuir para a revitalização do Interior de alguns casos, requer muita ajuda e acompanhamento.
Portugal”, defendeu Rogério Campos Henriques, CEO Os oradores destacaram, ainda assim, a rápida res-
da Fidelidade, durante a mesa-redonda O Trabalho em posta das pessoas e dos processos nas suas organizações.
Tempos de Pandemia. “Toda a equipa acha que as coisas correram muito bem
Mas se esta deslocalização cria oportunidades para e isso resulta em mais motivação. As pessoas estão ainda
o desenvolvimento regional e para integrar colaborado- mais ligadas, dizem-me que estão ainda mais próximas”,
res com limitações, o caminho para um modelo que garantiu Cláudia Lourenço, diretora-geral da P&G Por-
alterna trabalho em casa e no escritório não está isento tugal. A adaptação obrigou a garantir a segurança e a
de sobressaltos. “Os propósitos das organizações são confiança dos colaboradores e a mobilizar as capacida-
o grande desafio para estes modelos mais híbridos de des digitais necessárias nas organizações, vertente que
trabalho. Os processos de recrutamento, de seleção e expôs ainda mais uma das necessidades do merca-
de onboarding são os mais desafiantes”, considerou Rui do: “A escassez de talento ficou vincada para o pós-
Teixeira, COO da ManpowerGroup Por- -pandemia nas áreas da digitalização, tecnologia e
tugal, que opera na seleção e gestão de modelos remotos. Num país como Portugal, com
recursos humanos. “Não se constrói cul- 90% de PME, isso traz desafios acrescidos à eco-
tura de empresa à distância e não se con- nomia”, concluiu Rui Teixeira. E

2 8 . EXAM E . DEZEM BRO 2020


E N T R E V I S TA

“AS PESSOAS NÃO TINHAM


IDENTIFICADO VANTAGENS EM
FAZER PARTE DO SISTEMA”
Em entrevista à EXAME, no âmbito do fórum O Futuro do Trabalho,
a ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social explica
as transformações que estamos a observar no mercado de trabalho
e qual deve ser o papel do Governo
Texto Tiago Freire

A
na Mendes Godinho diz à EXAME que, picidade. Foi dado um passo importante com os tra-
com a chegada da pandemia, “passa- balhadores a recibos verdes. Muitos tinham entrado no
ram a fazer-se coisas que pareciam sistema, mas ainda não tinham o prazo necessário para
impossíveis e de forma rápida”. Uma serem abrangidos. Há dois desafios grandes: ter relações
dessas transformações à velocidade da de trabalho e emprego sustentáveis; regular as novas for-
luz foi o teletrabalho, que nos traz muitas oportunidades, mas de prestação de trabalho. Estas duas bandeiras têm
mas também, como a ministra reconhece, a necessidade de mobilizar a sociedade, até para dar respos-
de regulação. ta aos jovens que, como sabemos, foram
dos primeiros afetados pela pandemia,
É correto concluir que os números do desemprego até porque muitos tinham contratos a
são difíceis de ler porque há muita gente cuja situa- termo. Uma terceira área são as qualifi-
ção laboral não é clara? cações e a reconversão. É o momento
Num primeiro período, sim. Tínhamos situações muito para aproveitar isso. Aposta em áreas
atípicas. Agora já conseguimos ter um retrato mais fiel económicas de futuro, seja no digi-
da realidade. A pandemia também mostrou a quantida- tal, na energia e na sustentabilida-
de de situações atípicas que tínhamos e que estas novas de ambiental, seja na área social.
formas de trabalho têm de ter uma resposta diferente. Foi
evidente o número de situações e medidas extraordiná- Sabemos o que vai marcar
rias que tivemos de criar para responder a pessoas que as prioridades estratégicas
ficavam fora do sistema. do País. Como será feito o
casamento da formação
Durante muito tempo referiu-se que Portugal tinha com essas áreas? Como
um problema de precariedade. Nesta crise, vimos se pode dirigir as pes-
os custos dessa precariedade e dessa informalidade. soas para aí?
Pode fazer mudar alguma coisa? Faz parte da liberdade
Isso leva-nos a repensar o sistema e a trazer para dentro de cada um, mas pos-
da economia formal uma quantidade de situações que so dizer que, no Progra-
estavam fora. Muitas vezes porque as próprias pessoas ma UPSkill, sentimos
não tinham identificado vantagens em fazer parte do sis- uma espetacular mo-
tema, que ficaram agora evidentes. Quantas mais pessoas bilização das pessoas.
fizerem parte dele, mais a resposta coletiva pode ser forte. O programa pretende
Mas o próprio sistema tem de se adaptar a novas formas juntar as necessidades
e relações de trabalho para conseguir enquadrar essa ati- do mercado à forma-

30 . EXAM E . DEZEM BRO 2020


COM O APOIO

ção desenhada pelas instituições públicas. Um trabalho namizar o diálogo social. Dou um exemplo concreto: estes
em conjunto. Tivemos oito mil pessoas interessadas, não instrumentos de apoio à contratação podem estar associ-
só jovens. Temos de ter a capacidade de desenhar pro- ados à existência de contratação coletiva dinâmica, que
gramas à medida em conjunto com as necessidades de reflita a valorização que damos a um diálogo social eficaz.
mercado. O UPSkill tem este desenho à medida, com o
compromisso das empresas tecnológicas para integra- Esta confirmação de que em muitos setores é possível
rem parte destas pessoas, com contrato sem termo e por trabalhar sem estar no escritório pode ser uma opor-
um valor mínimo tabelado. Isto também implica uma tunidade para atrair trabalhadores de outros países?
revolução na formação que está a ser dada e no próprio Tínhamos desencadeado um estudo − um Livro Verde −
catálogo de qualificações. sobre o futuro do trabalho, exatamente para discutir as
mudanças que antecipamos e que implicam alguma re-
Tem a sensação de que isto nos levou a fazer coisas gulação. Muitas pessoas que trabalham em serviços públi-
incríveis com grande rapidez? cos de Lisboa podem viver no Interior e trabalhar remo-
Tenho a certeza. Passaram a fazer-se coisas que pareciam tamente. Isso abre oportunidades, mas é preciso regular
impossíveis e de forma rápida. Também no setor privado. para gerir equilíbrios. Isso foi evidente nas situações de
A quantidade de empresas que passou a ter sistemas mis- incerteza que surgiram. Em segundo lugar, isto abre no-
tos de trabalho, presencial e à distância. Diria que isto nos vas oportunidades extraordinárias de captação de talento
mostrou que é possível fazer as coisas com foco e resulta- para Portugal. Os famosos nómadas digitais. Isso já está
dos rápidos, recentrando-nos no essencial. a acontecer. Pessoas que olham para Portugal como um
país que, mesmo num contexto de pandemia, é um óti-
O Estado quer influenciar as melhores práticas, mas mo sítio para trabalhar remotamente. Não só estrangeiros,
não pode correr o risco de ignorar modelos de que não mas portugueses que tinham emigrado. É um mundo de
gosta. As empresas falam de flexibilida- oportunidades.
de. O segredo será uma conjugação entre Isto abre novas
menor precariedade e mais flexibilidade?
O que procuramos todos é um modelo de
oportunidades Embora o que estamos a viver seja a an-
títese do modelo “picar o ponto”, não se
emprego sustentável, em que haja maior de captação pode cair na confusão total entre mundo
corresponsabilização na relação laboral e a de talento para profissional e pessoal. Como se pode re-
preocupação de garantir a conciliação com a
vida pessoal, até porque, cada vez mais,
Portugal, não gular, por exemplo, o horário de trabalho?
No momento de maior recurso ao teletra-
as empresas só vão conseguir fidelizar só estrangeiros, balho, tivemos várias situações que geraram
os trabalhadores se eles se revirem mas também dúvidas e dificuldades: [quem paga] o com-
nelas. Têm de deixar o trabalhador
envolvido e comprometido. Por ou-
portugueses que putador, o telemóvel, a cadeira, até o espaço.
Questões de conciliação da vida profissional
tro lado, é crítico ter um diálogo so- tinham emigrado com a familiar, numa altura que coincidiu
cial eficaz, seja através do alarga- com a suspensão das atividades letivas, e as
mento dos modelos típicos de diálogo a outras questões do horário de trabalho e do direito à desconexão.
formas de relação laboral que estão hoje exclu- VÍDEO São estas as áreas críticas a regular. Diferente é o traba-
DISPONÍVEL EM
ídas, seja na participação ativa nas empresas. EXAME.PT lho nas plataformas digitais: é preciso regulação. Iden-
tificámos essas áreas no Livro Verde para procurar uma
No final desta crise, a atividade sindical resposta estável.
pode sair enfraquecida porque, nestes mo-
delos remotos, há mais dificuldade para No final desta crise, podemos ter trabalhadores bas-
as pessoas se organizarem. Essa é outra tante bem e outros em situação de grande dificuldade?
das adaptações? A evolução que tivemos foi de aumento dos salários, basta
É evidente que a própria forma como a pensar no salário mínimo. O nosso objetivo é manter a va-
representação coletiva é assegurada tem lorização do SMN. Por outro lado, aumentámos o valor de
necessidade de evoluir e de estar presente entrada nos estágios do IEFP e fizemos uma majoração da
nestas novas formas de trabalho. Temos de contratação sem termo. Por outro lado, a preocupação é a
conseguir que as novas relações laborais se- qualificação. É a palavra-chave. Apostar nas qualificações
jam representadas no diálogo social. O que é fazer a diferença na oportunidade de as pessoas serem
fizemos foi garantir que nos próximos dois valorizadas e mais bem pagas. Esse é o verdadeiro instru-
anos não há denúncia de contratação co- mento de combate à pobreza. É aí que temos de colocar
letiva por caducidade, para garantir mais toda a nossa energia para garantir que damos igualdade
estabilidade. Podemos pensar em incen- de oportunidade às pessoas para serem valorizadas no
tivos positivos. Pode ser uma forma de di- mercado de trabalho. E

DEZEM BRO 2020 . EXAM E . 31


COM O APOIO

COMO
AS MELHORES
ENFRENTARAM
O DESCONHECIDO
Três das distinguidas nas
Melhores Empresas para
Trabalhar em 2019 partilharam
experiências sobre
a digitalização e o trabalho
à distância e os seus efeitos
VÍDEO na cultura interna
DISPONÍVEL EM
EXAME.PT
> BLIP

Antes da pandemia, todos os colabora-


dores da Blip estavam capacitados para
T EC N O LO G I A
trabalhar à distância. “Hoje estão mais

ÀS VOLTAS COM O DIGITAL


preocupados em ter de voltar ao escritório
do que em ficar em casa”, resumiu Sara
Sousa, head of RH da tecnológica. Com o
confinamento, a empresa disponibilizou
apoio (psicológico, financeiro e jurídico) e
comparticipou os gastos de eletricidade ou
água em casa. No futuro, a aposta passa
As ferramentas tecnológicas estão aí, mas é preciso pela formação remota e por repensar o
escritório como local para trabalho conjunto
saber utilizá-las para melhorar as organizações e as práticas e de construção de relações.
de trabalho, além de passar do “consumo” à “produção”
> ESTORIL SOL DIGITAL
Texto Paulo Zacarias Gomes

A
“Só um ou outro colaborador pediu –
s novas gerações de tra- falta colocar a tecnologia no centro da suplicou – para regressar” ao local de
balhadores podem pa- sua ação, algo que será mais fácil quando trabalho após o desconfinamento, notou
recer mais preparadas os elementos mais familiarizados com as Rui Magalhães. O administrador da Estoril
para lidar com a tecno- novas tecnologias “alcançarem posições Sol Digital diz que a produtividade dos
logia, mas tirar partido de comando”, acredita António Miguel colaboradores não desceu a trabalhar em
dela para melhorar a produtividade e a Ferreira, managing director da Claranet casa e quer manter o que de positivo trou-
xe a flexibilidade durante a pandemia. E
competitividade das organizações é outra Portugal. Por outro lado, para Paula Pa-
garante que a separação entre tempos de
história. “Temos a ideia de que a geração narra, diretora-geral da Microsoft Portu- trabalho e descanso é uma prioridade na
mais jovem é nativa digital, mas é muito gal, “é fundamental assegurar a formação generalidade das funções: “Não pedimos
numa perspetiva de consumo. Precisamos de todos para criar impacto” por via da às pessoas: ‘Já que estás em casa, faz lá o
de passar para a produção. Se não, o tecnologia, além de alterar culturas e jeitinho.’ Isso não existe.”
País tornar-se-á ótimo em ace- “reimaginar processos”.
> PHC SOFTWARE
der a facebooks e semelhantes, Admitindo que a digitaliza-
mas não terá capacidade de ção está para ficar num “novo
A maioria das funções pôde conciliar o
intervir além disso” alertou normal” ainda em constru- tempo de trabalho com rotinas familia-
António Leite, vice-presi- ção, o vice-presidente do res específicas durante o confinamento,
dente do IEFP, na mesa- IEFP disse que é preciso garantiu Luís Antunes. O diretor de recursos
-redonda A Tecnologia perceber, neste contex- humanos da PHC confia num futuro que
e o Trabalho. to, “o que temos de fa- traga um “better normal”, com um sistema
Já às organizações, zer para que o sistema de trabalho híbrido e mais flexibilidade. Em
Lisboa e no Porto, as equipas estão a mu-
que rapidamente en- produza mais riqueza
dar-se para edifícios maiores, onde a em-
contraram resposta e para que ela seja dis- presa quer construir a melhor experiência
digital para as limita- tribuída de forma mais de trabalho presencial e em convívio. “Vão
ções da pandemia, justa”. E ter vontade de ir para o escritório”, afiança.

3 2 . EXAM E . DEZEM BRO


32 BR
R O 2020
20
02
020
20
20
um por todos
e todos por si
Chegou o momento de sermos Empower Brands
Community. De fazermos parte da comunidade
que empodera pessoas, marcas e empresas.
Juntos podemos fazer mais por Portugal. E por si
também. Valorize um país com marcas mais
competitivas, pessoas mais preparadas, empresas
mais sustentáveis. Dê força a esta causa.
Sem a sua participação seremos sempre de menos.
Com a participação de todos nunca seremos de mais.

torne-se membro em ebc-community.pt

uma iniciativa official channel


COM O APOIO

EMPREGO

REGULAR
E FORMAR
O advento do teletrabalho e o impul-
so dado à “gig economy” pela crise
de saúde pública convocam o papel
regulador do Estado, que vê a forma-
ção ao longo da vida como essencial
Texto Paulo Zacarias Gomes

É
necessário acompanhar e regular
dois dos fenómenos laborais mais
evidenciados pela pandemia – o te- VÍDEO
DISPONÍVEL EM
letrabalho e as plataformas digitais EXAME.PT

–, sob pena de agravar as diferenças


no mercado de trabalho, enfraquecer as eco-
nomias urbanas e descaracterizar a vida em
sociedade, defenderam os oradores do painel Secretário Outra frente que o Governo também já
Para Onde Vai o Emprego. de Estado alertou se mostrou disponível para regular é o das
“Temos de conseguir criar condições para relações laborais no âmbito das plataformas
evitar que estes dualismos, que nalguns casos para “risco digitais de entregas, reforçando os direitos e
vinham sendo esbatidos, se venham a exacer- de polarização a proteção dos trabalhadores que usam es-
bar”, instou o secretário de Estado-adjunto do e erosão tas ferramentas digitais da “gig economy”. “É
Trabalho e da Formação Profissional. Miguel Ca- inescapável regular melhor as plataformas”,
brita salientou que o trabalho remoto opõe uma das profissões admite Miguel Cabrita. “E é melhor, como
melhor conciliação entre emprego e vida famili- e direitos país, que o façamos de forma regulada, pla-
ar à diluição dos tempos de trabalho e descanso associados neada e discutida como fizemos com os TVDE
e sublinhou que será necessário agir em bre- [plataformas eletrónicas de transporte, como
ve. “Não vamos poder esperar dois, três, quatro a trabalhos menos a Uber]”, insiste o secretário de Estado.
anos para discutir e tentar avançar numa regu- qualificados” Outra tecla premida com insistência foi a
lação equilibrada”, acrescentou o responsável. da formação, num setor como o turismo, um
Já Rafael Campos Pereira, vice-presidente da CIP, dos mais inovadores e com mais peso na economia na
alerta para o risco de o teletrabalho fazer regressar última década, mas também dos que mais sofreram
discriminações como as que no passado separavam com a contenção da Covid-19 e que acumula qualifi-
empregados e trabalhadores. “Há os que podem [tra- cações relativamente baixas. “Se queremos aumentar
balhar remotamente] e aqueles para quem isso é im- a importância do setor, temos de nos focar na forma-
possível. Cria uma sensação de diferenciação, de dois ção”, afirma Luís Araújo, presidente do Turismo de
tipos de classes”, argumenta. Se nas empresas pode di- Portugal. Fora de questão parece estar o fim de perspe-
ficultar a integração de talentos, o espírito de equipa, tivas de carreiras longas, considera Miguel Cabrita.
o trabalho em grupo e o cumprimento dos tem- “Os modelos de negócio de pessoas que circulam
pos de descanso, nas economias locais ameaça de um emprego para outros criam um risco de
tirar gente das ruas e asfixiar o pequeno comér- polarização e de erosão das profissões e direi-
cio local “que depende da deslocação para os tos associados a trabalhos menos qualifica-
locais de trabalho”, exemplifica o responsável. dos”, concretizou o secretário de Estado. E

3 4 . EXAM E . DEZEM BRO 2020


CONTEÚDO
PATROCINADO

UM REGRESSO EM GRANDE,
MESMO A TEMPO DO NATAL
James Martin’s, o whisky preferido dos portugueses, ganhou uma nova edição,
em exclusivo só para nós. Um whisky com uma bonita idade: 32 anos.

Reza a história que James Martin’s era o whisky Elizabeth. O “passageiro mais frequente” desses
de referência na corte de Eduardo VII, o whisky grandes transatlânticos, onde as elites europeia
eleito de sua majestade, e quem sabe se não terá e americana cruzavam os oceanos.
sido o próprio rei a pegar-nos o gosto, tal como Em 1912, a marca foi integrada na Macdo-
emprestou o nome a um famoso parque em Lis- nald e Muir, percursora da The Glenmorangie
boa? A verdade é que, com o passar dos anos, Company, hoje parte do grupo Louis Vuitton
Portugal adotou como seu este famoso blend do Möet Hennessy, o maior do mundo no seg-
melhor da Escócia, e foi assim que ganhámos, mento do luxo e onde o rigor e a qualidade são,
em exclusivo, o direito de recebermos uma edi- também, lendários. Foi, aliás, já sob a liderança
ção very rare, onde o lote mais novo conta já do atual diretor de Distilling, Whisky Creation
com 32 longos anos de maturação. Um & Whisky Stocks, o Dr. Bill Lumsden,
whisky pleno de suavidade e cremo- que a James Martin’s voltou a ser ga-
sidade, escolhido pelo master blender lardoada com mais uma medalha de
da marca. ouro no prestigiado International Wine
Este James Martin’s 32 Year Old and Spirits Competition, em 2004, tor-
Very Rare deixaria o próprio James nando-se oficialmente, no ano seguin-
“Sparry” Martin orgulhoso – “Spar- te, no whisky premium preferido dos
ry” era a sua alcunha dos seus tem- portugueses (e no mais vendido).
pos de boxeur. Comerciante de vinhos Em 2013 a Glenmorangie Com-
e bebidas espirituosas em Edimburgo, pany lançou as últimas garrafas de
Martin dedicou-se desde muito cedo à James Martin’s, para se concentrar
criação de whiskies da mais alta qua- totalmente nos Single Malt Glen-
lidade, insistindo que um bom blend morangie e Ardebeg, mas o Dr. Bill
demora tempo, 10 anos no mínimo. O Lumsden manteve e supervisionou
seu trabalho, e exigência, foram am- pacientemente alguns cascos precio-
plamente reconhecidos na altura, sos, aguardando o momento de ma-
incluindo com os Prémios de Ouro turação perfeita para honrar o nome.
e Diplomas de Honra em Bruxelas Uma seleção dos melhores whiskies,
(1888), Paris (1890) ou Antuérpia, sabiamente misturados num com-
em 1899. James Martin viria a fale- plexo balanço de suavidade, genero-
cer nesse ano, mas o legado perdurou sidade e complexidade. Um néctar
nas mãos do sócio e amigo, Edward com evidentes notas de caramelo e
MacDonald, que sempre respeitou açúcar mascavado, ainda que pon-
a alta qualidade e boa reputação do tuadas por outras mais cítricas de
nome. Mais tarde, MacDonald tor- laranja. Doce e encantador no pa-
nou-se proprietário da The Glenmo- ladar, chega-nos numa altura em
rangie Company, a que a marca ain- que tão necessitados andamos por
da hoje permanece ligada. pequenos prazeres que nos alegrem
Ao longo dos anos a fama de Ja- o espírito. Por isso, este Natal, va-
mes Martin’s consolidou-se dos dois mos brindar com um sonoro Slàinte
lados do Atlântico, e seguia sempre Mhath(!) ou “saúde!” em gaélico, e
a bordo do Queen Mary e do Queen um James Martin’s no copo.

DEZEM BRO 2020 . EXAM E . 35


Micro
EXAME

E M PRESAS . N EGÓCIOS . G ESTÃO

A BRINCAR,
A BRINCAR...
... é um negócio de milhares de milhões de euros,
longe de estar apenas destinado a crianças.
Teve de se adaptar à pandemia e preparar-se
para um Natal diferente. Na era das redes sociais
e do digital, a bola está do lado das grandes
multinacionais, que fazem da Ásia a sua fábrica.
Mas, a outra escala, ainda há quem produza
(e idealize) jogos e brinquedos em Portugal
Texto Paulo Zacarias Gomes Fotos Lucília Monteiro e José Carlos Carvalho

36 . EXAM E . DEZEM BRO 2020


DEZEM BRO 2020 . EXAM E . 37
Micro

A
A fábrica em Alfena, a poucos minutos do
Porto, chegou a ter 100 trabalhadores e a
ocupar todo um pavilhão. Hoje, tem um
terço do espaço – o resto alugou-se a uma
oficina e a um negócio de diversões – e os
cinco funcionários trabalham ao som do
lento matraquear das máquinas. Júlio Pe-
nela, bisneto do fundador, percorre com
as mãos as prateleiras da sala de visitas,
onde repousam centenas de brinquedos
de lata (reaproveitada de embalagens de
conserva), chapa, plástico ou madeira, com
maior ou menor sofisticação. Miniaturas
de carros, telefones e outros objetos como
balanças, máquinas de costura e tábuas de
engomar das marcas PePe e Jato, que inun-
davam aos milhares as bancas das feiras,
nos anos 70 e 80 – e que contam uma parte
da história da indústria do brinquedo em
Portugal, antes de as normas comunitárias
e o fabrico barato e massivo na Ásia terem
levado alguns a pôr trancas à porta.
Com origem quase centenária, a fábri-
ca faz tudo como antigamente e encon-
trou o seu lugar no nicho da saudade, em- é a produção de plásticos técnicos, como
bora os artigos que hoje vende, dados os frascos para cola e álcool-gel ou asas para
materiais e as técnicas usadas, sejam clas- caixas de vinho.
sificados como artesanato e não aconse- A dez minutos de carro dali, num dis-
lhados a crianças com menos de 10 anos. creto armazém em Moreira (Maia), traba- Chegava a fazer
Vive de encomendas restritas de miniatu- lham atualmente tantas pessoas quanto as 200 a 300 táxis
ras de táxis, aviões, carros de bombeiros que a PePe (Penela e Penela) e Jato empre-
ou carrinhas “pão de forma”, para efemé- garam nos seus tempos áureos. Das mãos para a Catarina
rides, museus ou lojas da especialidade – de dezenas de funcionárias, encarregadas Portas [lojas A Vida
como A Vida Portuguesa, de Catarina Por- de pintar cada figura a pistola e pincel, Portuguesa]; agora
tas, que recentemente fechou uma loja em sairão este ano três milhões de miniaturas
Lisboa, em plena crise no turismo. “Che- de animais e personagens do fantástico faço 36. Se fizermos
gava a fazer 200 a 300 táxis para a Catari- para o mercado internacional. “As senho- mil brinquedos por
na Portas; agora faço 36. Se fizermos mil ras aliam a perfeição à rapidez”, descreve mês, é muito!”
brinquedos por mês, é muito!”, descreve Patrícia Maia, enquanto mostra a área de
Júlio Penela. Só 10% das receitas vêm des- decoração onde as figuras circulam entre Júlio Penela
te negócio, já que o que sustenta a fábrica as mãos das funcionárias. Responsável da PePe e Jato

38 . EXAM E . DEZEM BRO 2020


Algumas trabalham na empresa des-

O QUE DÁ CORDA AO SETOR


de 1976, ano em que o pai de Patrícia, Vic-
tor Maia, criou a Maia & Borges. Até 2008,
quando chegaram as primeiras máquinas
Redes sociais, online, envelhecimento, preocupação ambiental de injeção de plástico, as tarefas limitavam-
e poder ao consumidor são tendências sérias num mundo de fantasia -se à decoração das figuras; agora, a unidade
da Maia faz tudo, do fabrico dos moldes à
> MAIS TEMPO EM CASA mais resistiu aos efeitos mistério da experimen- embalagem das miniaturas. No ano passa-
da Covid-19 devido à base tação”, disse Stephen
do, faturou 2,8 milhões de euros (uma subi-
O confinamento por causa acumulada de fãs adultos. Pasierb, presidente da Toy
da de 40%, segundo dados da Informa D&B)
da pandemia encerrou Há 40 anos que o grupo Industry Association, ao
famílias em casa e obrigou comercializa modelos The New York Times.
e, já em 2020, investiu 300 mil euros numa
a encontrar formas alter- à escala, videojogos e nova unidade na Guarda, com 28 empre-
nativas (e mais educati- máquinas de jogo anco- > REDES E ANIMAÇÃO gados. Para já, só vão decorar as miniatu-
vas) de passar o tempo, rados numa série anime ras produzidas nas instalações a norte. Mais
levando a compra de jogos de televisão, Mobile Suit Cada vez mais marcas se tarde, o novo polo terá também capacidade
e de puzzles, de brinque- Gundam. apoiam no lançamento para fabricar estes produtos.
dos para atividades ao ar de filmes de animação “Estamos em pleno crescimento. Um
livre e de gaming a crescer > DIDÁTICO, ECOLÓGICO, para vender produtos
HÍBRIDO
dos nossos clientes teve em agosto, durante
dois dígitos entre março e associados, como Frozen
a pandemia, o seu melhor mês de sempre”,
maio, segundo a GfK. Resta 2, Toy Story 4 ou o Filme
Há brinquedos que já LEGO 2 no ano passado,
diz Patrícia Maia à EXAME, ao lado da vitri-
saber se ficam marcas
permitem uma experi- estratégia que sofreu em ne que encerra milhares de figuras produzi-
estruturais.
ência híbrida, aliando o 2020 com o cancelamen- das nos últimos 45 anos na casa, inspiradas
> DIGITAL físico ao digital. “São cada to de estreias no cinema. em séries de animação como Dartacão e os
vez mais sofisticados: Por outro lado, muitos Três Moscãoteiros, Os Estrunfes, Era Uma
Outra marca da pande- bonecas que reconhecem brinquedos nascem, de- Vez... o Espaço, Yakari ou Abelha Maia. Des-
mia foi o aumento da a voz, robôs inteligentes, senvolvem-se e vendem- de a morte do pai, há sete anos, é ela quem
importância do online brinquedos cada vez -se hoje nas redes sociais, lidera a empresa, com o marido, António
– as visitas à loja virtual mais realistas. A grande com recomendações de Pinto, o “faz-tudo” da casa: “Se for preciso ir
da Lego duplicaram no maioria dos players tem influenciadores e vídeos
uma componente eletró-
buscar material, vou; se for preciso ir para a
primeiro semestre e as de unboxing que revelam
nica bastante acentuada máquina de injeção, vou; se for preciso em-
vendas digitais da Hasbro jogos e brinquedos.
cresceram 50% de julho e quase todos têm uma balar, vou”, garante. Duplicada a produção
a setembro. Juli Lennett, app,” exemplifica Ricardo > PODER AO em dois anos, a próxima meta da Maia &
Feist, administrador da CONSUMIDOR Borges é fechar 2021 com quatro milhões de
vice-presidente do NPD
Group, alerta que neste Concentra. Em parale- figuras e alcançar os seis milhões em 2025,
canal é mais difícil gerar lo, aumenta a procura O impacto da crise no que serão escoadas para multinacionais na
por formas instrutivas poder de compra pode
compras adicionais, tal Alemanha, França e China.
como acontece numa e amigas do ambiente ser uma incógnita, mas a
para ocupar o tempo das centralidade do consumi-
grande superfície, o que DOS MOLDES AOS BRINQUEDOS
desafia a melhorar a crianças. dor é um dado adquirido.
A Bandai Namco, por Descemos um pouco no mapa até Oliveira
experiência de compra
> EFEITO UAU! exemplo, está a adap- de Azeméis. Em 1977, a Irmãos Melo, que fa-
digital para que o cliente
tar-se a “uma nova era zia moldes de aço para a produção de brin-
continue a gastar.
É o que está por detrás de totalmente diferente, quedos, decidiu entrar também neste ramo.
um dos brinquedos mais em que o cliente quer Começou com carrinhos de fricção e aviões
> INVERNO vendidos: as L.O.L. Sur- ter o que pretende, no “vai-e-vem” para vender em feiras e lojas, e
DEMOGRÁFICO prise!, figuras em caixas momento que escolhe e não parou. Estes artigos, atualmente vendi-
opacas que só se revelam na quantidade preten- dos sob a marca IRMEL, representam 20%
O envelhecimento na Eu- abrindo a embalagem, dida”. Mitsuaki Taguchi,
das receitas da empresa. “Nos dias de hoje,
ropa e no Japão abre es- fazendo do desembrulhar presidente da empresa
faz todo o sentido não perder o mercado do
paço para a fidelização ao uma experiência. “As que vende marcas como
longo da vida dos clientes crianças hoje querem Dragon Ball ou Tamagot-
brinquedo português, visto que somos os
e para a diversificação. Na surpresas. Vivem num chi, sublinha que “a crise únicos com esta gama de produtos”, explica
gigante Bandai Namco, mundo em que tudo é resultou em incerteza, João Paulo Melo, administrador da empresa.
o negócio de brinquedos online, sabem o que es- e nessas circunstâncias Tal como na PePe e na Maia & Borges,
e hobbies, que inclui os perar onde quer que vão as pessoas precisam de também aqui tudo é feito dentro de casa e
colecionáveis, foi o que e, por isso, anseiam pelo sonhos e de diversão”. com grande incorporação de materiais re-
ciclados. Dos 37 funcionários, 16 estão nos

DEZEM BRO 2020 . EXAM E . 39


Dar vida às figuras
Micro Quase 45 anos depois, o projeto do fundador Victor Maia (na
imagem, a preto e branco) é perpetuado pela filha, Patrícia, e pelo
seu marido, António Pinto. Hoje, estão à frente da Maia & Borges,
que produz três milhões de figuras por ano. Tudo para exportação

212
brinquedos, área que ganhou recentemen- ou a francesa Papo a escolher produzir cá
te duas máquinas de injeção robotizadas e parte dos seus produtos e a colocar-lhes a
mais eficientes, de onde saem artigos de etiqueta made in Portugal – basta entrar
praia, como baldes e pás, camiões e trato- numa papelaria e comprovar.
res de brincar ou tambores e martelos de “É um mercado muito pequeno, não te-
plástico, usados na noite de São João, no mos escala. O investimento em moldes pesa
Porto. Tal como aconteceu com a empresa muito e os preços da mão de obra são muitís-
de Júlio Penela, o cancelamento de festas e
romarias este ano, por causa da pandemia MILHÕES simo mais elevados. Não é competitivo com
a China”, explica Ricardo Feist, administra-
(a juntar à lotação limitada das praias), atin- de euros dor da Concentra, empresa que distribui
giu em cheio a época alta da IRMEL, que vai Valor do mercado de brinquedos em cerca de 50 marcas internacionais de jogos
de março a setembro. Resultado: uma que- Portugal, em 2019, segundo a GfK e brinquedos – e que também manda fazer
da esperada de 60% na faturação. a oriente os poucos artigos que desenvolve

60%
Exemplos de longevidade na produção de raiz para o mercado nacional. Outra dis-
de brinquedos em Portugal, como os da tribuidora, há quatro anos no mercado, sen-
PePe e Jato, da Maia & Borges ou da Irmãos tiu igualmente na pele o que custa produzir
Melo, não abundam. As crescentes exigên- no País, quando lançou o jogo de tabuleiro
cias de segurança, as necessidades de mo- Go Master, hoje adaptado a 14 países. “Pro-
dernização tecnológica, as mudanças na duzimos cá a primeira edição, mas depois
procura, a dimensão do País e a concorrên- optámos pela China, porque a qualidade do
cia de colossos na Ásia foram arrumando produto e o preço não têm comparação. As
para o lado e colocando no baú do esque- Vendas
fábricas cá não estão preparadas”, justifica
cimento dezenas de pequenos fabricantes Contributo mínimo dos meses que Carlos Ávila, diretor comercial da Creative
durante as últimas décadas (ver caixa “Fá- antecedem o Natal – outubro Toys, que, entre outros, distribui o Monopoly.
bricas de memórias”). Mesmo que ainda a dezembro – para o negócio anual É naquele país que serão feitos também os
haja multinacionais como a alemã Schleich dos brinquedos, em Portugal outros jogos que a sua área de desenvolvi-

4 0 . EXAM E . DEZEM BRO 2020


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Micro

mento, a Creative Live Games, está idealizar


a partir de Portugal, na esperança de que se
mantenha a procura de jogos sociais e de ta-
FÁBRICAS DE MEMÓRIAS
buleiro, que disparou no confinamento (ver Com mais ou menos “made in Portugal” inscrito nas etiquetas,
caixa “O que dá corda ao setor”). há algumas dezenas de marcas de brinquedos cuja produção ou
idealização ficou associada ao País. No imaginário de gerações
DAVIDES NUM MUNDO DE GOLIAS
de crianças das últimas décadas há brinquedos de lata,
Segundo a GfK, no último ano, o setor dos miniaturas em plástico, carrinhos de zamac produzidos à escala
jogos e brinquedos, dominado pela dis-
e até ursos de peluche para exportação
tribuição e pelo retalho de produtos de
multinacionais, representava 212 milhões
de euros em Portugal. Uma gota num oce- Ficavam sobretudo no Nor- alidade e pelos sites de venda de
ano global de 76,3 mil milhões de euros te e Centro do País, instala- produtos em segunda mão, como
(ou 90,7 mil milhões de dólares), que é das junto das grandes zonas o OLX, onde vão parar mui-
em quanto a Statista avalia o mercado industriais e, muitas vezes, asso- tas memórias de infância. “Se
mundial. A maior fatia deste bolo sabo- ciadas à indústria dos moldes e hoje encontrar brinquedos da
roso calha invariavelmente nas mãos de do fabrico de produtos de plás- JAJ [José Augusto Júnior] valem
gigantes mundiais como Bandai Namco, tico. A partir dos anos 1960, os uma pipa de massa”, alerta Júlio
Lego, MGA Entertainment, Hasbro, Mat- artigos que produziam passaram Penela, bisneto de José Augusto
tel ou Takara Tomy. Com marcas como a encher as prateleiras das lojas Júnior, o artesão que a partir de
L.O.L. Surprise!, Barbie, Marvel Univer- de brinquedos e de colecionismo Alfena foi precursor do que viri-
se, Hot Wheels ou Nerf (as mais vendidas e, em muitos casos, as mesas das am a ser duas das poucas mar-
de 2019), cruzam ofertas clássicas de jogos barracas das feiras que percorri- cas portuguesas tradicionais de
e brinquedos com conteúdos audiovisu- am o País. Com a automatização, brinquedos que ainda resistem, a
ais, videojogos e eventos, desenvolvidos a concorrência da China, as nor- PePe e a Jato (ver texto principal)
através de marcas próprias ou sob licença. mas comunitárias mais aperta- e que vivem sobretudo do merca-
Junte-se a isto toda a atividade de repre- das e a alteração de tendências do da saudade e da lusitanidade.
sentação, distribuição e venda ao consu- do lado da procura, muitas destas Brintói, Luso-Toys, Jamba,
midor final, área que também passou por fábricas interromperam a sua ati- Minibri ou Radar são hoje mar-
transformações, numa guerra de preços vidade e fecharam portas. cas que também só se recordam
A história das empresas que nesses círculos ou na memória
nas últimas décadas produzi- de quem, nas décadas de 1970 ou
ram ou montaram brinquedos a 1980, por exemplo, recebeu pelo
partir de Portugal faz-se de car- Natal uma boneca Tucha ou um
rinhos, de barcos, de aviões, de boneco Gavi, brincou aos cow-
bonecas, de peluches, de má- boys com uma pistola de plástico
quinas de lavar, frigoríficos ou da Osul, levou para a praia (ou
fornos de brincar, mas também para a banheira...) um barquinho
Tínhamos previsto dos primórdios, da folha de flan- da Fanabri ou teve a sorte de ter
bastantes novidades dres e do arame, até à baquelite uma miniatura à escala, da Luso-
e à borracha, passando pela liga -Toys ou da Vitesse.
este ano, mas metálica de zamac até chegar ao Na página seguinte, abrimos
adiámos para 2021 omnipresente plástico. De em- o baú (ou fazemos, como agora
as dez marcas presas familiares (a grande parte) se diz nas gerações mais recen-
até às multinacionais, que entra- tes, uma espécie de unboxing)
novas que íamos vam diretamente no mercado ou do que foi uma indústria dos
lançar. através de sócios portugueses. E brinquedos com mais ou menos
Há aversão de centenas ou milhares de tra- made in Portugal – já que não é
balhadores que trabalhavam para certo, em todos estes casos, que
ao risco e pouca brincar. os seus componentes cá tenham
disponibilidade Hoje, perceber esse percurso sido produzidos na íntegra. Ain-
para apostar” passa também, e sobretudo, pe- da assim, é o retrato de uma épo-
los círculos de colecionadores, ca em que no País ainda se traba-
Ricardo Feist pelas feiras e museus da especi- lhava para brincar.
Administrador da Concentra
> MINIBRI > STEIFF > FANABRI/GULLIVER > BRINTÓI

Criada na Maia em 1986, a Minibri A Steiff - Brinquedos, sediada Criada em 1987 na Marinha Conhecida sobretudo por marcas
– Indústria de Brinquedos, Lda. em Oleiros e detida pela alemã Grande e com atividade suspensa como Tucha (“A boneca que faz
fabricou miniaturas de carros de Margarete Steiff, GMBH, fabrica- desde 1993, a Fanabri - Fábri- o que tu fazes”, que foi produzida
metal. A empresa terá sido extinta va em Portugal mais de 100 mil ca Nacional de Brinquedos era nas versões mergulhadora ou al-
no início da década de 2000, ursinhos de peluche por ano. Criada detida em praticamente 50% pela pinista e por isso apelidada muitas
fornecendo até aí a francesa Norev em 1993, a empresa durou duas brasileira Gulliver – Manufacturas vezes de “barbie portuguesa”),
e vendendo com marcas próprias décadas no País até que fechou de Brinquedos, S.A., (fundada em Sandra (a boneca que andava e
como Vitesse – hoje propriedade portas em 2013, em plena altura de 1969 por um espanhol), a que se movia a cabeça “sem pilhas”), ou
da Macau Sky Star Toys Company intervenção da Troika. Deslocalizou juntavam sócios portugueses. Gavi (o boneco que “toma biberão
Limited –, SM Super Models, Retro então a produção para a Tunísia, A empresa produzia para venda e faz xixi”), a Brintói – Sociedade
Vitesse, Onix, Quartzo, Victoria ou deixando 103 pessoas no desem- no País, entre outros, miniaturas Produtora de Brinquedos, S.A. foi
City. Era detida através da Cinerius, prego, na sua maioria mulheres. A de barcos e carros fabricados fundada em 1976 na Figueira da
criada por sócios portugueses câmara local ainda apelou a Angela em plástico (vendidas avulso), Foz. Os brinquedos chegavam ao
e franceses em 1982, que tinha Merkel para que impedisse o fecho, bem como figuras, veículos de mercado através da participada
ainda participação numa empresa mas sem sucesso. Cada urso de combate, armas e acessórios da Jugal – Sociedade Nacional de
de moldes (Compasso) e numa peluche chega a custar 300 euros, gama S.O.S. Commandos, além Brinquedos. Suspendeu a ativida-
de serigrafia (Seridecal). Parte da no caso das edições limitadas e em do jogo de futebol de mesa Onze, de em 1993. Comercializava ainda
produção chegou a ser feita na leilões atinge valores na ordem dos adaptado neste caso aos principais bonecos de chiar como Topo Gigio
China. milhares de euros. clubes portugueses. ou Abelha Maia.

> RADAR > OSUL/METOSUL > LUSOTOYS > JAMBA

A Fábrica de Plásticos Radar, Lda. A fábrica de plásticos Henriques A Nelson & Dias da Rocha, que A marca, cujo logótipo está asso-
produzia miniaturas de carros, & Irmão (ou Luso-Celulóide), detinha a Luso-Toys, fábrica portu- ciado à imagem de um elefante,
barcos e utensílios domésticos em criada nos anos 1940, em Espinho, guesa de miniaturas, foi constituída foi criada pela UPLA - Fábrica Uni-
plástico, além de bolas de futebol. iniciou-se mais tarde no fabrico três meses depois do 25 de Abril de versal de Plásticos Lda., fundada
Foi criada em 1965 na Maia pela de brinquedos. Aqueles que eram 1974 em Gueifães, Maia, no mesmo na Marinha Grande em 1956. Entre
família Vilas Boas e está atual- produzidos em plástico levavam local que é hoje indicado como os artigos Jamba fabricados estão
mente dada como extinta. Outras a marca Osul (pistolas, miniaturas sendo a sede da Minibri. Nos anos desde carros e bonecos a pistolas
fábricas de plásticos também se de carros e também de eletro- 1970 e 1980, a empresa da Maia e esporas de cowboy, comboios,
adaptaram à produção de brin- domésticos como máquinas de vendeu, sob a marca Luso-Toys, gaitas e até baloiços de corda.
quedos, casos das algarvias IPAF lavar, fornos ou frigoríficos), a que modelos em plástico e, mais tarde, Além da marca Jamba, a empresa
ou Faplastal (surgidas em 1958 se viria a juntar a marca Meto- em zamac (liga metálica de zinco, também vendia brinquedos com a
e 1972, em Faro) ou a fábrica de sul, aplicada aos brinquedos em alumínio, magnésio e cobre), para insígnia própria, UPLA. Em 1997, a
pentes Ribeirinho, de Guimarães, metal, essencialmente miniaturas carros clássicos, de rali e Fórmula UPLA fundiu-se com a Grandarte,
que em determinada altura pro- de carros como camiões e táxis. A 1. A insígnia foi aplicada também a dando origem à Grandupla - Fá-
duzia “bonecas, berços, carrinhos, atividade da empresa está atual- jogos de tabuleiro como O Tesouro brica de Plásticos, SA, que viria a
cornetas, guizos”. mente dada como extinta. ou o Jogo do Rallye. enfrentar a insolvência em 2012.

DEZEM BRO 2020 . EXAM E . 43


Micro

100
com as grandes superfícies. “Há 20 anos,
tínhamos uns mil clientes no comércio
tradicional; hoje, não chega a 25”, cons-
80
tata Ricardo Feist. Hipermercados, gran-
des armazéns como o El Corte Inglés ou
a relançada Toys “R” Us (de que não foi
possível obter respostas até ao fecho desta 60
edição) dominam agora 70% do mercado 2007 2020
em Portugal.
Contudo, mesmo com a dimensão e as VENDAS NA
limitações do País, há quem continue a in- MONTANHARUSSA
sistir em idealizar e vender em português. Receita total mundial
Como a OkapiBox, constituída em plena do mercado de brinquedos
O mercado ressentiu-se à escala global
pandemia e que procura navegar nas vári-
com a crise económica e financeira,
as tendências deste mercado: a promoção
mas recuperou a partir de 2014
nas redes sociais, a venda online, a apos-
ta no pré-escolar, a vertente educativa e a Fonte: Statista; valores em milhares
de milhões de dólares

90.700
componente ecológica dos brinquedos. An-
dreia Davide começou a partilhar, em 2018,
numa página no Instagram, as atividades
didáticas que fazia com a filha em casa. A
curiosidade dos seguidores sobre as técnicas
e os materiais foi tanta que criou uma caixa
com materiais e instruções para que os pais
pudessem replicar as atividades.

MILHÕES
A montagem das caixas, com materiais
ecológicos e reutilizáveis, desenhados e pro-
duzidos na sua maioria na região de Aveiro, quatro anos, a empresa dá trabalho a 12
já ocupa uma pessoa a tempo inteiro e ou- de dólares pessoas em Torres Vedras e fatura 450 mil
tras em part-time sempre que necessário. Dimensão do mercado de brinquedos euros a produzir pequenos arbustos sin-
ao nível mundial, em 2019. Um recorde
Entre kits e caixas-surpresa por subscrição, téticos (chamados tufts), para decorar es-
seguem por mês cerca de mil artigos para fa- ses tabuleiros ou aplicar em maquetes ou
8 000
mílias, escolas e terapeutas, com pedidos até 6 923 dioramas. É das poucas no mundo a fazer
de Inglaterra, Suíça e Itália. A necessidade 7 000
6 000
6 042 estes materiais. “Temos uma filosofia de
de manter entretidas as crianças “aumen-
5 000
5 000 4 720 4 505 autossuficiência, devemos ser muito tei-
tou ainda mais o interesse durante o con- mosos. Gostamos de fazer as coisas cá, de
4 000
finamento”, diz à EXAME. Muitas vezes, os criar e resolver aqui os problemas”, diz o
3 000
produtos colocados no site, no qual se fazem
90% das vendas, esgotam em horas, o que
2 000 1 574 administrador à EXAME. Este ano, tam-
bém a colher os benefícios de mais gente
1 000
leva Andreia Davide a eleger novas contrata- fechada em casa, espera duplicar as ven-
0
ções como prioridade, tal como a diversifica- das e entrar em domínios mais científicos,
ção, com a criação de produtos para crianças LEGO HASBRO TAKARA com a produção para maquetes de espaços
BANDAI MGA MATTEL TOMY
em idade escolar. “Se não tivesse página no NAMCO ENTERTAINMENT naturais como rios ou estuários, aprovei-
Instagram, não teria este negócio. Foi uma tando o embalo das preocupações com o
rampa de lançamento”, conclui.
PRINCIPAIS ambiente.
GRUPOS MUNDIAIS Tema, aliás, que também parece ter
A MÃO POR DETRÁS DO ARBUSTO DE BRINQUEDOS entrado em força nesta indústria. Em
Também a GamersGrass tem orgulho em EM RECEITAS abril, os gigantes Mattel, Hasbro e Lego
produzir em Portugal, mas aponta para EUA e Japão destacam-se apresentaram compromissos com a sus-
um público mais especializado e a viver entre os gigantes tentabilidade, que passam por usar em-
MGA Entertainment, dona do fenómeno
no estrangeiro, para onde vai mais de 99% balagens produzidas com plástico recicla-
L.O.L. Surprise!, foi uma das que mais
da produção. A paixão de Jacinto Mateus do, eliminar, em alguns casos, o plástico
faturaram no ano passado
pelos jogos de estratégia com miniaturas, de todas as embalagens, produzir artigos
do género Dungeons & Dragons, virou um Fonte: Statista e relatórios e contas, dados com resinas de origem biológica ou cortar
de 2019 ou ano fiscal terminado em março
negócio que não é brinquedo. Ao fim de de 2020, em milhões de dólares no consumo de energia.

4 4 . EXAM E . DEZEM BRO 2020


Depois do primeiro choque da Co-
vid-19, é essa a grande incógnita para o se-
tor, já que as vendas de outubro a dezembro
costumam responder por mais de 60% do
negócio de todo o ano, segundo a Concen-
tra. Há que ter em conta não só o orçamen-
to disponível das famílias, depois de a cri-
se de saúde pública ter cilindrado alguns
empregos, como os receios dos consumi-
dores de se deslocarem a grandes espaços
e as restrições de abertura de lojas, que já
fizeram danos nos fins de semana de no-
vembro, durante o estado de emergência.
“Em março e abril, nas apresentações
de Natal por videoconferência, percebi que
o retalho estava bastante apreensivo, que
havia maior apetência por apostas mais se-
guras em marcas e produtos mais consoli-
dados”, conta Ricardo Feist. À conta disso,
a Concentra, que tinha previsto lançar dez
marcas novas este ano, acabou por adiá-lo
para 2021. Agora, aposta as fichas na épo-
ca natalícia, que poderá ajudar a mitigar
as perdas do ano. “É recuperável se o Natal
correr bem. Ter lojas fechadas aos fins de
semana é uma notícia muito preocupan-
te. Vamos ver se se consegue colmatar com
“A sustentabilidade era um grande tema, compras durante a semana.” Carlos Ávila
que foi ultrapassado pela direita pela pan- partilha a mesma opinião: “Vai depender
demia. Ainda assim, nota-se nas vendas a tudo destes meses antes de Natal. As gran-
tendência de as pessoas quererem comprar des superfícies começam a adaptar-se e a
Produzimos embalagens sustentáveis”, considera Miguel fazer campanhas de desconto durante os
cá a primeira Pina Martins, CEO da Science4you. A em- dias da semana. Está a ser muito difícil,
presa, que tem dentro de fronteiras mais de mas não está perdido.”
edição [do jogo], 90% da produção dos seus brinquedos ci- Mais tranquilas parecem estar as re-
mas depois entíficos, apostou nos últimos meses numa sistentes Maia & Borges, IRMEL e PePe. A
optámos pela nova linha de artigos ligados à ecologia, que primeira já entregou, em agosto, as enco-
privilegia materiais biodegradáveis e plásti- mendas que tinha para esta época e está
China, porque cos de múltipla utilização – um lançamen- a produzir a todo o vapor para 2021; para
a qualidade to na reta final de um ano muito complexo as outras duas, as verdadeiras épocas for-
e o preço para a empresa, que enfrentou diretamente tes são a primavera ou o verão: “Este ar-
os efeitos do confinamento, com o fecho de tigo é mais vendido nas feiras. No Natal,
não têm pontos de venda e a queda da atividade pela é quando menos se vende”, justifica Júlio
comparação. alteração forçada das rotinas. Penela. “Nesta altura, os miúdos querem é
As fábricas “Fomos habituados a comprar brin- bonecos que choram, querem é bonecos
quedos para oferecer nos aniversários, com pilhas.” E isso, definitivamente, não
cá não estão mas sem festas de aniversário criam-se se encontra na fábrica de Alfena, onde não
preparadas” muitas dificuldades”, argumenta. Só o há apps, drones que fazem piruetas ou bo-
“instinto de sobrevivência”, que levou a necas com o último look. Para fazer andar
Carlos Ávila empresa a reorientar parte da ativida- um comboio ou um carro, é preciso rodar
Diretor comercial
de para produzir álcool-gel e ócu- uma chave de metal ou friccionar os pneus
da Creative Toys
los de proteção, deverá ter evita- no chão. A diversão acaba ao fim de uns se-
do que a pandemia passe este ano gundos, quando se esgotar a corda. “Aqui,
uma fatura pesada à Science4y- produz-se como há 100 anos. As máquinas
ou. Mas ainda falta o Natal. só estão cá para auxiliar”, remata. E

DEZEM BRO 2020 . EXAM E . 45


Micro

C O N S U LT O R I A

Abrir
as portas
ao capital
A consultora integrada,
comprada em agosto pela
Ageas, quer apostar em
instrumentos como fundos de
capital de risco para dinamizar
o investimento associado
aos vistos gold no Interior do
País ou na reabilitação.
O mercado norte-americano
está no radar, sobretudo
a diáspora portuguesa, mas
é preciso garantir condições
de atratividade do investimento
em Portugal para bater
a concorrência, avisa o CEO
da Kleya
Texto Paulo Zacarias Gomes
Fotos Diana Tinoco

D
epois de cinco anos a aju-
dar quase centena e meia
de estrangeiros a virem
viver e comprar casa em rias ou apartamentos para arrendamento a Entre os investimentos que podem
Portugal, a Kleya quer baixo custo nas grandes cidades ou, ainda, ser potenciados, segundo o responsável
agora pôr pequenos investidores internacio- entrar no capital de pequenos negócios lo- da consultora, está a reconversão urba-
nais a apostar em empresas e outros projetos calizados, em particular, em zonas de baixa nística, em particular a dos espaços de
no País. Entre as ideias que poderão surgir densidade populacional. retalho e de escritórios no pós-Covid-19,
em 2021, está um fundo de capital de risco, “Tem que ver com não existir a estrutu- mas também a aplicação de Inteligência
a desenvolver em parceria com a sua casa- ração de uma oferta segura para que pes- Artificial a áreas como a produção e o con-
-mãe (o grupo segurador Ageas), outras ges- soas possam investir noutro tipo de produ- trolo de qualidade, agropecuária, eficiên-
toras de fundos ou que dão acesso a vistos tos que não o imobiliário”, justifica Vasco cia energética e saúde. Nesta área, há um
gold, bem como com autarquias e clientes Rosa da Silva à EXAME. “Desenvolviam-se parceiro estrangeiro interessado em de-
que queiram investir em Portugal. condições para que fosse usado o leque [de senvolver uma incubadora que conta com
Através deste mecanismo, já previsto na condições de acesso aos vistos gold] que uma shortlist de seis empresas nacionais.
lei, seria possível a pequenos investidores existe”, salienta o CEO da Kleya. Algo que, Numa altura em que o Governo se pre-
estrangeiros subscreverem tickets a par- acredita, teria impacto no total de investi- para para vedar o investimento em imobi-
tir dos 350 mil euros, o valor mínimo de mento captado através das transferências liário em Lisboa e no Porto como forma de
transferência de capitais que permite obter de capital. Em 2020, este valor represen- obtenção de vistos gold, Vasco Rosa da Silva
a autorização de residência para investi- tou apenas um sexto do total investido em avisa que manter a atratividade do destino
mento (ARI) ou visto gold. E, dessa forma, imobiliário para obtenção da ARI, mas o para os investidores depende de “estabili-
investir em áreas como a reabilitação ur- responsável acredita que há condições para dade” e não de criar dúvidas. “Houve em
bana, a criação de residências universitá- mais do que duplicar no próximo ano. Lisboa e no Porto uma valorização de ativos

4 6 . EXAM E . DEZEM BRO 2020


imobiliários, que não é desejável ou é exa-
gerada, mas a forma de solucionar isto não
VENDER SERVIÇOS é simplesmente proibir esse investimento.
COM SEGUROS Tem que ver com criar alternativas seguras
e que deem confiança aos investidores para
“Casamento” da Kleya com a que possamos alterar os números”, defen-
Ageas, em plena pandemia, prova de. Proibir estes vistos “traria danos repu-
“visão de longo prazo”, diz o CEO tacionais maiores ao País, que podiam até
afetar o investimento noutras áreas”, diz o
Em 2018, três anos após a sua criação, a CEO da Kleya, empresa em que os clientes
Kleya ganhou novo parceiro com a com- atraídos pelos vistos gold se contam ainda
pra pela belga Ageas de 24% desta con- “pelos dedos de uma mão”.
sultora integrada, que faz negócio a trazer
estrangeiros para viverem em Portugal. SUSPENSOS, MAS NÃO CANCELADOS
“Para nós foi surpreendente”, admite o Não fosse a pandemia e os projetos que por
CEO, Vasco Rosa da Silva, recordando a
causa dela ficaram em standby (cerca de
aproximação através do braço europeu
50% a 70% do volume de negócios adicio-
da multinacional. A compra pela AGEAS
Portugal Holding (dona da portuguesa nal que poderia ser concretizado) e este ano
Ageas Seguros) permitiu investir na seria o primeiro em que a Kleya atingiria re-
transformação tecnológica da Kleya “para sultados positivos. Quando fechar o exercí-
chegar a um mercado maior e com so- cio de 2020, a faturação em vez de duplicar,
luções acessíveis a uma gama maior de como se previa, deverá ficar muito perto do
pessoas,” nomeadamente digitalizando de 2019 (590 mil euros), um ano em que o
processos para a relação com o cliente, resultado líquido estava no vermelho (190
descreve o responsável à EXAME. mil euros). Ainda que o CEO não se diga
Em agosto deste ano, atingidos os obje- preocupado com obter lucro num determi-
tivos definidos na entrada no capital, os
nado ano: “Temos muito clara a nossa estra-
belgas compraram a totalidade da Kleya,
tégia e onde queremos chegar.”
mesmo em ambiente de pandemia
que impediu a empresa de ter este ano, A aposta feita nos últimos anos na digi-
como esperado, os primeiros resultados talização da empresa, na sequência da com-
positivos. “A Covid-19 foi entendida como pra pela Ageas (ver caixa Vender serviços
algo conjuntural e não trouxe dificuldades com seguros), e a concentração em terri-
de maior. Ter uma visão de longo prazo tórios de menor densidade no País deverá
facilita o ‘casamento’. Por isso, a nossa ajudar a alavancar a atividade da consultora
união correu tão bem”, assegura Vasco no pós-Covid-19, que acredita que tendên-
Rosa da Silva, que abdicou do valor da cias como o teletrabalho e o respeito pelo
venda da sua participação para que fosse ambiente podem favorecer a deslocaliza-
investido na consultora. Em contrapartida,
ção para áreas menos povoadas: “Os poucos
fica na gestão e com uma participação
projetos que não ficaram em suspenso são
nos lucros.
[Com os vistos gold] O objetivo é integrar a empresa no para zonas do Interior, como um glamping
muito perto de ser concretizado no Alentejo
houve em Lisboa conceito de beyond insurance da Ageas,
segundo a qual os seguros, cada vez por um investidor espanhol.”
e no Porto uma mais uma commodity, devem ser
valorização ancorados a uma oferta de serviços,
vocacionados neste caso para cidadãos
ENTRADA PASSO POR PASSO
Os clientes, de um segmento muito alto
de imobiliário que estrangeiros. “Todo um ecossistema para e à procura de viver ou investir em Por-
não é desejável, mas proteger e dar segurança às pessoas tugal, chegam quase sempre por passa-
e onde se podem criar projetos muito
a forma de solucionar interessantes”, reflete o CEO. Entre as
-palavra ou através de redes de contactos
e “antenas” em países como Brasil, EUA,
não é simplesmente sinergias a explorar, o responsável vê o
Canadá, Austrália, Reino Unido, França e
proibir esse desenvolvimento de seguros em pacote
que incluam serviços prestados pela Espanha. O percurso é muito semelhante:
investimento” empresa portuguesa: “Como alguém que uma primeira paragem em Lisboa ou no
tenha seguro da casa e precise de apoio Porto, onde alugam casa. Depois, a compra
Vasco Rosa da Silva para gerir a habitação na sua ausência”, de uma primeira e até segunda habitação,
CEO da Kleya exemplifica. quando começam a ter segurança e per-

DEZEM BRO 2020 . EXAM E . 47


Marcas da pandemia
Micro Os poucos projetos de clientes da Kleya que
não ficaram em suspenso são para zonas
do Interior, como um glamping a concretizar
no Alentejo por um investidor espanhol

70%
cebem que o Algarve, Évora ou o Douro PORTUGAL MAIS IMPORTANTE
ficam a poucas horas de distância de car- DO QUE BIDEN
ro. Alguns acabam por investir em ativos Havendo condições para, como pretende,
da hotelaria. desenvolver o projeto do fundo de capital de
“Cada cliente que vem para cá viver risco no âmbito dos vistos gold, o mercado
gera em média 20 a 50 mil euros por ano norte-americano deverá ser a maior aposta
em consumo no País. E, até 2019, os seus da Kleya durante os próximos anos. E mais
projetos de investimento representaram Suspensos importante do que saber o que pode signifi-
entradas de capitais próximas dos 50 mi- 50% a 70% da faturação potencial car a eleição presidencial de Joe Biden para
lhões”, refere o CEO, que descreve o mo- ficou em pausa com a pandemia, pela a relação entre os dois países, deverá ser o
suspensão de projetos adjudicados
delo de negócio da Kleya como um misto posicionamento de Portugal para concorrer
à Kleya. “A boa notícia é que não houve
de consultor, agente de relocation e con- com Irlanda, Reino Unido, Itália ou Espanha.
nenhuma desistência”, salienta Vasco
cierge. Ou seja, alguém que ajuda a en- Rosa da Silva “Qualquer que seja a administração
contrar espaço para viver e desenvolver norte-americana, os investidores norte-a-

50
negócio, presta aconselhamento legal e mericanos procuram globalmente as me-
fiscal (através de parceiros), trata da logís- lhores oportunidades para a sua expansão
tica da mudança e disponibiliza o ecossis- e cabe-nos a nós mostrar que temos todas
tema de serviços de que o cliente precisa. as condições – posição geográficas, infraes-
Todo o processo de angariação, garante, truturas, quadro legal e fiscal, recursos hu-
cumpre até em excesso com as regras para manos ou segurança – para proporcionar
prevenção e combate ao branqueamento essas oportunidades”, resume Vasco Rosa
de capitais, que prevê análises a provas de da Silva, que elege os portugueses ou luso-
fundos e a bases de dados internacionais,
como a que identificou um potencial clien-
te ligado aos Panamá Papers. Um pente
MILHÕES -descendentes a viverem nos EUA como um
dos segmentos potenciais. “Há uma diáspo-
ra enorme de empreendedores, empresá-
de euros
fino que deu azo a recusas, ainda assim re- Valor das entradas de capitais rios e académicos que seria muito bem-vin-
siduais: “Quando a pessoa em causa perce- envolvidas nos projetos de investimento da em Portugal, não só para investir cá mas
be o nosso posicionamento e como traba- fechados até 2019 por clientes da Kleya também para trazerem mais ideias e capital
lhamos, normalmente afasta-se.” que vieram para Portugal dos EUA para o nosso país.” E

4 8 . EXAM E . DEZEM BRO 2020


CONTEÚDO
PATROCINADO

CRESCIMENTO DE 14% DO WEBSITE EM RELAÇÃO A IGUAL PERÍODO EM 2019

REMAX.PT ATINGE 24 MILHÕES DE VISITAS


ATÉ SETEMBRO
Com o lançamento das visitas multimédia e do novo Site, desde julho que o registo foi superior a 3 milhões de visitas
por mês. Setembro foi o mês recorde

Até ao final de setembro, o Ao longo dos três trimestres 70% de visitantes chegaram pioneiros no setor na utili-
Website da RE/MAX Portugal, do ano, a RE/MAX continuou via dispositivos móveis. zação de ferramentas digitais
rede imobiliária líder no mer- a destacar-se face à concor- inovadoras, tendo investido
cado nacional, ultrapassou as rência nas pesquisas do Goo- Setembro assinala o mês de bastante ao longo dos anos no
24 milhões de visitas, uma gle, de acordo com dados do lançamento do novo Site seu desenvolvimento. Desde
média superior a 2,6 milhões Google Trends. Este é um in- RE/MAX, que, além de mais muito cedo que apostámos
por mês, traduzidos em mais dicador relevante que tra- célere, alia um sistema de num Website para a promo-
de 200 mil contactos através duz a dinâmica da marca e o geolocalização e vem possibi- ção dos imóveis, tendo como
da plataforma. O número re- seu reconhecimento no setor litar visitar virtualmente mais foco proporcionar uma boa
presenta um incremento de imobiliário, onde é líder de de 20 mil imóveis disponíveis experiência de navegação a
14% face a igual período de mercado, quando compara- para as modalidades de com- quem nos visita, garantindo
2019, sendo o terceiro trimes- da com outras redes e portais pra, venda, arrendamento ou o acesso a uma oferta de qua-
tre o período mais represen- imobiliários. investimento. Este lançamen- lidade da forma mais rápida,
tativo, somando mais de 3 mi- to trouxe um aumento de 44% simples e eficaz.”
lhões de visitas em cada mês. Lançamento do novo Site em no número de páginas vistas e
Dos contactos recebidos, 64% setembro: Aumento de 44% do tempo passado na página, A responsável sublinha ain-
dos negócios foram relativos a no número de visualizações o que traduz a maior facilida- da que “Neste contexto de
compra e venda de imóveis e de de utilização, velocidade e pandemia, a tecnologia tem
36% a arrendamento. Segundo dados da RE/MAX, simplificação da navegação, sido o aliado perfeito. É mui-
julho, agosto e setembro fo- especialmente nos dispositi- to interessante o exemplo das
Do total de visitas a remax.pt ram os meses que contabili- vos móveis. Realçar também visitas virtuais e vídeo visi-
registadas de janeiro a setem- zaram mais visitas à página o facto de, até final de setem- tas, que na RE/MAX já eram
bro, mais de 3 milhões foram da consultora imobiliária, bro, terem sido transaciona- uma ferramenta diária, mas
de visitantes internacionais com um incremento de 28% dos 35% dos imóveis que fo- hoje são fundamentais, pois
que tiveram como origem ou- relativamente a igual período ram promovidos com visitas permitem uma triagem das
tros países como Estados Uni- de 2019. Cada mês do tercei- virtuais e vídeos, uma grande visitas que um cliente com-
dos, França, Alemanha, Es- ro trimestre ultrapassou as 3 inovação na qual a RE/MAX se prador quer realmente fa-
panha, Brasil, Itália, Angola, milhões de visitas, sendo se- destacou, possuindo a maior zer e assim reduzir as visitas
Reino Unido, Suíça, Canadá e tembro aquele que gerou o carteira de imóveis com este presenciais desnecessárias.
Holanda, que se destacaram número recorde (3.095.503). tipo de conteúdos, que os É reforçada, assim, a própria
na procura por imóveis por- A análise mostra ainda que compradores valorizam cada transparência de todo o pro-
tugueses. Em relação a igual julho, agosto e setembro ge- vez mais. cesso, trazendo uma maior
período do ano passado, estas raram 103.000 visitantes por eficiência e produtividade
visitas internacionais traduzi- dia à plataforma, 25.000 con- Para Beatriz Rubio, CEO da para todos, sejam consulto-
ram um crescimento de 15%. tactos por mês, sendo que RE/MAX Portugal, “Somos res, sejam clientes.”
Micro

PA P E L A R I A

Um caderno
é sempre
um caderno
O negócio começou com pastas
de arquivo numa loja artesanal, pela mão
dos pais. Os filhos trouxeram a gestão
e a internacionalização. No ano em que
comemora 50 anos, a Ancor diz ter
negócio para mais 20.
Texto Cesaltina Pinto Fotos Lucília Monteiro

A
pequena história costu- gócio! Porquê? Deixámos de ser credíveis.” dução, assente em todo o tipo de pastas de
ma ser lembrada como A maior parte dos pequenos industriais arquivo e cadernos. Somando aos 45% que
símbolo de persistência que quis dar o salto da internacionalização, representa o mercado nacional (em que
e tenacidade. “Em 98/99, no final dos anos 90, terá certamente uma conta com grandes distribuidores, como
por aí, eu e o meu irmão história idêntica para contar. Fernando a Staples ou o Continente), a Ancor vê-se
fizemos a primeira visita a Espanha com Correia, 47 anos, administrador da Ancor, legitimada a dizer que é líder na Penínsu-
potencial de venda. Levávamos as coisas gosta de a repetir sempre que pretende de- la Ibérica no que diz respeito à produção
orientadas daqui e praticamente fecha- monstrar como foi difícil entrar no merca- dos dois tipos de artigo em simultâneo.
das. Tínhamos uma reunião em Barcelo- do espanhol. “A primeira abertura de conta Seja como for, foi um grande passo para
na. Como sou mais ou menos fluente em que fizemos em Espanha num cliente a sé- a consolidação de uma empresa familiar,
espanhol, o encontro decorreu sempre em rio foi em 2001. Mas, a partir daí, foi sem- que este ano comemora 50 anos de exis-
espanhol. No final, o cliente apresenta-nos pre a crescer. Nunca mais parámos”, diz à tência nas mãos da segunda geração.
o contrato. Quando verificámos, dizia lá EXAME, satisfeito por ter vencido esta eta- “Foi muito difícil iniciar a internacio-
que éramos italianos. Chamámos a atenção pa, que lhe abriu portas noutras fronteiras. nalização. O mercado espanhol é tremen-
para o erro e reafirmámos que éramos por- Hoje, os grandes armazenistas de pape- damente fechado. Os espanhóis pensam
tugueses. A partir daí, não houve mais ne- laria espanhóis absorvem 35% da sua pro- dos portugueses o que os franceses pen-

5 0 . EXAM E . DEZEM BRO 2020


sam dos espanhóis e o que os alemães pen- E, assim, a Ancor, que tem sede na Maia
sam dos franceses. Mas à medida que fo- e fábrica de 15 mil metros quadrados em
mos concretizando contratos com grandes Vila do Conde, de onde saem anualmente
players e que pudemos dizer que éramos 30 milhões de unidades, passou de uma fa-
fornecedores deste e daquele, as portas turação de seis milhões de euros, em 2010,
também se abriram rapidamente”, pros- para 15,7 milhões, em 2019. E o valor da
segue Francisco Correia. “Depois disso, o venda de marcas próprias, com o respeti-
nosso crescimento em Espanha foi muito vo valor acrescentado, já quase ultrapas-
rápido, a crescer consecutivamente todos sou o valor da produção em private label.
os anos e um alicerce importante do nos- E o crescimento foi na ordem do milhão de
so negócio.” euros por ano.
Passar de Espanha para o centro da A Ancor conta, hoje, com mais de 30 dis-
Europa, com destaque para os países do tribuidores em mais de 30 mercados dife-
Benelux e a França, e desta para os paí- rentes. “Essa é a nossa estratégia: ter muitos
ses francófonos, como Marrocos, Tunísia, mercados, não pôr tudo no mesmo cesto.
Costa do Marfim, Senegal ou Guadalupe, Não quero ser uma fábrica da Alemanha,
foi mais uma vitória. Tanto mais que, por quero vender lá 200 ou 300 mil euros. Não
aqui, já não se apresentam como uma fá- estou interessado em ir a um gigante que,
brica a trabalhar em private label, mas sim depois, me come vivo. Quero vender aí uma
com uma série de marcas próprias que se gama de valor acrescentado, alargada, com
vão rejuvenescendo em coleções coloridas alguma exclusividade”, aponta o gestor.
e condizentes entre si de cadernos, mochi- Com o armazém recheado de bobines de
las e estojos – e que farão as delícias dos papel da Navigator, que serão transforma-
A nossa estratégia mais novos por serem exclusivas. das em cadernos de diversos estilos e cartões
Licenciado em Gestão pela Universida- à espera de serem forrados e moldados em
é ter muitos de Lusíada, Francisco Correia tem as ideias pastas de arquivo, a Ancor pensa já nas cole-
mercados. Não bem assentes. “Na Península Ibérica, temos ções a apresentar para a abertura do ano es-
estou interessado de ser competitivos em preço; somos a fá- colar de 2021/2022. Até porque a pandemia
brica. Fora daí, temos de trabalhar numa veio interromper a cadência do crescimento
em ir a um gigante ótica de longo prazo. E, nos mercados do verificado na última década.
que, depois, me Norte de África, há mais de 300 milhões de “Este ano, estamos a lutar para não
come vivo” pessoas, poucos velhos e muitos novos, ao perder mais de 10% das vendas e estamos
contrário dos países europeus. E onde há alinhados para conseguir isso. Devemos
menos crianças, há menos [compradores fechar o ano com menos 1,5 milhões de
de] cadernos.” faturação, sobretudo nos produtos de uso

DEZEM BRO 2020 . EXAM E . 51


Micro
Da produção ao design
A venda de modelos com marca própria (à esquerda) para
cerca de 30 países já vale tanto quanto o private label

empresarial, à conta de empresas que es- de apresentação do produto, intermedia-

75%
tiveram fechadas devido à pandemia. Mas das por um ecrã gigante – não sem antes
estávamos a crescer 5% em relação ao ano o potencial cliente receber, em mão, uma
anterior no final do 1º trimestre, mesmo caixa com exemplares do produto, para po-
com a última quinzena de março já seve- der ver e tocar, até porque há texturas que
ramente afetada pela quebra de consumo”, diferenciam o produto.
explica o gestor. Mas a Ancor nunca parou O que a pandemia não travou foi a festa
de laborar este ano e até se orgulha de não dos 50 anos realizada em fevereiro, na Alfân-
ter recorrido ao layoff ou de nem sequer dega do Porto. Tempo de relembrar o negó-
ter necessitado de despedir. “Claro que não Produção cio iniciado pelo pai, António Augusto Cor-
renovámos alguns contratos a termo, mas A maior fatia da produção está con- reia (vem daqui o nome Ancor), com uma
foi algo sem expressão”, garante. centrada na Península Ibérica: 45% em simples oficina de manualidades nas trasei-
Em espera ficou a montagem de uma Portugal e 35% em Espanha ras da Rua de Cedofeita, em plena Baixa por-
nova máquina que lhe permitirá aumen- tuense. Natural de São João da Pesqueira, no
tar a capacidade e a eficiência produtiva, Douro, António Correia (hoje com 74 anos)

15,7
automatizando o ciclo até à embalagem e foi viver, com 13 anos, para o Porto, “na casa
a colocação nas paletes – um investimento de quem o empregava”. Depois, entregou-se
de 500 mil euros. “Começámos por per- a fazer pastas de arquivo. “Ele costumava di-
der em França, Itália, Holanda, Espanha, zer: de manhã vendia, à tarde fabricava e à
até chegar a Portugal. O problema, agora, noite entregava.” Serviço militar cumprido,
é o ambiente que se vive no mercado. Está casou e foi então que juntou a sua empresa
tudo à espera para ver o que vai acontecer, à da mulher e optou pelo nome Ancor. Na
a gerir expectativas. Existe medo”, confessa segunda metade dos anos 90, o negócio foi
Francisco Correia. Neste contexto, também
os planos da Ancor “estão em banho-ma- MILHÕES passando para os filhos: primeiro, para Pe-
dro Correia, 50 anos, engenheiro mecânico,
ria”. Num negócio em que é “preciso olhar Faturação e depois para Francisco. Os dois assumiram
a longo prazo e fazer as coisas sem pressa”, Em 2019, a Ancor completava uma a direção-geral da empresa e iniciaram um
as decisões tomadas “são de meses”. década a crescer cerca de 1 milhão por plano de expansão e internacionalização.
As grandes feiras internacionais onde ano. O EBITDA oscila entre 1 e 2 milhões “Acredito que este mercado não se extingue
costumavam estar presentes foram subs- nos próximos 20 anos. A nossa obrigação é
tituídas por uma plataforma online (30 entregar à próxima geração uma empresa
mil euros de investimento), e as reuniões melhor do que a que recebemos.” E

5 2 . EXAM E . DEZEM BRO 2020


Opinião
POR
JOSÉ GOMES

Longe, mas
mais perto
A necessidade de distanciamento acelerou
a adoção em força de ferramentas
remotas e digitais, que não deverá nem
poderá eliminar o elemento humano
e diferenciador nos seguros
> CEO da Ageas Seguros

O
período de excelência, em que a venda ser tão forte, porque existia
confina- consultiva é fundamental e uma relação muito próxima.
mento obri- em que os mediadores rapi- Mas o distanciamento so-
gou a uma damente se adaptaram a esta cial obrigou a que se encon-
ad aptaç ão realidade e à conjugação dos trassem novas formas de con-
de comportamentos nunca dois canais para segurança dos ceção com os clientes, que
vista e que, de outra forma clientes e dos próprios. passaram pela digitalização
qualquer, demoraria anos a De forma geral, e na Ageas de ferramentas e processos.
acontecer. Foi, por isto, tam- Seguros não foi exceção, foi No período pré-Covid-19, já
bém um acelerador para o au- fundamental o ajustamen- existia uma clara aposta nos
mento da aquisição online de to para uma venda cada vez canais digitais e na formação
produtos e serviços do nosso mais remota – especialmente dos mediadores da Ageas Se-
setor. Os dados são do Obser- em dois momentos: o da pré- guros nesta evolução tecnoló-
vatório de Tendências, um in- -venda, em que, mais do que gica. E, por isso, assumimos
quérito do Grupo Ageas Portu- nunca, a proatividade passou o compromisso de colocar à
gal e a Eurogroup Consulting, a ser regra; e, obviamente, na disposição dos nossos parcei-
que refere que, à exceção das venda, em que a proximidade ros de negócio ferramentas
viagens, a preferência dos in- e a leitura da linguagem cor- adequadas para uma presen-
quiridos recai sobre a compra poral foram substituídas pela ça coerente e diferenciadora,
em loja para todas as catego- assertividade e pela relevância que lhes permite hoje, mais
rias. Mas, para as categorias do conteúdo. do que nunca, fazer parte da
como Cultura, Seguros e Pro- Não sobram dúvidas de Não sobram transformação digital.
dutos Financeiros, Educação/ que, pelo menos nestes nove dúvidas Porque acreditamos que
Formação e Produtos Tecnoló- meses, o mundo mudou e as os mediadores Ageas Segu-
gicos, mais do que 1/3 dos in- formas de trabalhar foram de que, pelo ros têm um papel fundamen-
quiridos admite preferir com- reinventadas. Todas as em- menos nestes tal na relação com o cliente, e
prar online. presas sentiram necessidade nove meses, no contexto atual ainda mais.
Para muitos serviços, esta de capacitar as equipas com Foi por isso também que qui-
tendência colocou um desa- novas competências digitais o mundo mudou semos agradecer a sua partici-
fio acrescido de um dia para e analíticas. O que acontecia e as formas pação na resposta à crise pan-
o outro; para outros, ape- num período de pré-pande- de trabalhar démica, porque continuam a
nas aumentou o volume. Mas mia, em muitas regiões do ser o ponto de união, de per-
no setor segurador, o canal País, é que não havia necessi- foram sonalização, de proximidade,
de mediação é um canal por dade de a componente digital reinventadas junto dos nossos clientes. E

DEZEM BRO 2020 . EXAM E . 53


Macro
EXAME

ECONOMIA . TENDÊNCIAS . SOCIEDADE

5 4 . EXAM E . DEZEM BRO 2020


BEIRUTE:
“A ALMA
DAS GENTES”
RENASCE
Eternizada na voz da inconfundível Fairouz,
a capital do Líbano é como uma fénix obrigada
a reerguer-se sem parar. E, apesar da desesperança, não há
economia destruída, Governo sem rumo ou tumultos sociais
que façam os libaneses baixar os braços
Texto Margarida Vaqueiro Lopes, em Beirute

DEZEM BRO 2020 . EXAM E . 55


Macro

C
Começamos por lhe ouvir a voz, a cha-
mar, pouco antes de sentirmos as mãos
pequeninas nas nossas pernas. Fala em
árabe, com os olhos cheios de lágrimas, e
nós insistimos em seguir caminho como
se fosse apenas um som que se mistura
com todos os outros da cidade. Ao fim de
uns metros de insistência paramos para
a ouvir – a tradução vem depois, mas o
desespero percebe-se, não importa a lín-
gua em que se fale. Damos-lhe as libras
que temos na carteira, que chegarão para
pouco mais do que para comprar um pa-
cote de seis pães árabes devido à subida
astronómica do preço dos alimentos nos
últimos tempos: 350% em apenas um
ano. Dela não guardámos o nome, mas a
história: tem 12 anos e dois irmãos mais
novos. A família fugiu da Síria, há dois
anos, à procura de paz e de uma vida em
que sobreviver não fosse a única solução.
Os pais morreram na explosão do porto
de Beirute, a 4 de agosto de 2020. Agora,
aquela pequena de olhos tristes e corpo
franzino é a imagem de um desespero que
está escondido numa cidade que continua
a fazer o possível por se reerguer. Beirute é assim, cheia de idiossincra- fugiados, uma vez que a incerteza política
Continuamos o caminho em silêncio, sias. Os refugiados sírios encontram aqui está a dificultar até a ajuda humanitária às
e sentimos o nosso próprio suspiro [de alí- paz – “o que já não é pouco!”, dir-nos-á o vítimas da explosão e da fome, generica-
vio?] quando olhamos o Mediterrâneo, a padre Rui Fernandes, jesuíta que há quase mente, no Líbano. Muitos sírios dirigiram-
menos de um quarteirão de distância. dois anos vive no Líbano –, mas “é só. Há -se à cidade para doar parte dos alimentos
Estamos na marina de Beirute, lugar pri- muito pouco para além disso”. As feridas que tinham recebido daquele organismo às
vilegiado e onde se passeiam libaneses, da guerra civil na Síria, que durante anos famílias afetadas pela detonação no porto
saudis e os poucos europeus que arriscam se alastraram pelo território libanês, ainda de Beirute, que foi só o elemento final de
uma visita turística na “Paris do Mediter- estão abertas, e é difícil para os libaneses uma tempestade perfeita. Senão, vejamos:
râneo”. Sucedem-se os restaurantes caros, afastar a memória dos acontecimentos re- depois de décadas em guerra, os conflitos
alinham-se os barcos que ostentam ban- centes. Por outro lado, vamos sabendo das armados no país só abrandaram em 2017;
deiras da Ferrari, desfilam casais com as histórias que nos últimos meses poderiam no ano passado, no meio de uma crise fi-
amas atrás. A menina de olhos tristes e ter ajudado na cicatrização: a ajuda do Pro- nanceira que já se fazia sentir, o povo saiu
corpo faminto está ali tão perto e parece grama Alimentar Mundial (WFP, na sigla à rua a gritar thawra (revolução) e conse-
que vive num outro mundo. em inglês), só chegou aos campos de re- guiu que o Governo se demitisse; no iní-

5 6 . EXAM E . DEZEM BRO 2020


Paredes-meias com nada
A explosão deixou várias casas como esta,
sem paredes e com o interior totalmente à vista.
Dois meses depois, a maior parte da recuperação
está a ser feita graças à sociedade civil

cio do ano, a pandemia fechou a porta aos ar a trabalhar para conseguir ter um país
turistas, responsáveis por cerca de 7% do melhor”, garante. A postura e o olhar de-
PIB nacional e reduziu significativamente terminados, bem como a elegância, são
as remessas dos emigrantes (que, por seu características comuns das mulheres li-
lado, representam 14% do PIB do país) que banesas – e quase nos fazem entender
alimentam muitas das famílias libanesas; porque o país não cai, apesar de todas as
em agosto, a explosão destruiu o porto de vicissitudes.
Beirute e, no início de outubro, um incên-
dio no centro da cidade danificou o edifício E AGORA, LÍBANO?
desenhado pela iraquiana Zaha Hadid, um Adivinhar o futuro é complexo, há vários
dos mais icónicos da capital. “Se querem anos. Uma cidade cosmopolita, com algu-
saber como sobreviver a tragédias, podem mas das melhores universidades do Médio
falar connosco”, diz meio a rir, meio a sé- Oriente e de olhos postos na “Paris” que
rio a irmã Lucy, da congregação das Irmãs quer continuar a ser, luta agora por mais
do Sagrado Coração. Responsável pelas um renascimento. É precisamente sobre
finanças da instituição, desdobra-se em isso que nos fala o dono do Route 961, um
reuniões com representantes do Governo, conhecido bar em plena escadaria Van-
para tentar alinhavar um futuro no qual dome, na zona equivalente ao Bairro Alto
o dinheiro escasseia na mesma proporção lisboeta. “Tinha 480 milhões de libras no
em que as necessidades aumentam. Mas banco. Dinheiro mais do que suficiente
os sorrisos ganham, mesmo que deses- para fazer a casa que queríamos (mais de
Como é que perançados. A Imprensa nacional afirma 300 mil dólares ao câmbio do ano passa-
posso ir? Este que cerca de 500 mil pessoas terão saído do do). De um dia para o outro fiquei sem
é o meu país. país em busca de uma vida melhor, nos úl- nada”, conta. Recorde-se que para fazer
timos meses, mas nem todas estão dispos- face ao enorme défice comercial acumu-
Tenho de ficar, tas a abandonar a terra que as viu crescer, lado, os bancos libaneses decidiram con-
tenho de ajudar a Pamela ainda não tem 30 anos, é fisi- fiscar as contas correntes dos depositantes,
reerguê-lo. Mas oterapeuta e tem uma clínica em Beiru- no ano passado e, incapazes de manter o
te. Faz parte da classe alta libanesa e, para câmbio fixo que tinham com o dólar des-
também, será ela, sair do país “é deixá-los ganhar [a cor- de 1997, converteram todo o dinheiro em
que podemos rupção, a injustiça, o Hezbolah, no limite]. libras libanesas. Sem dólares nas institu-
ficar?” Temos uma classe política corrupta, e já ições financeiras, a moeda nacional pode
muita gente antes de mim lutou pelo Lí- ter agora sete diferentes taxas de câmbio
Proprietário do Route 691 bano. Não me vou embora. Vou continu- no mesmo dia, no mercado negro. Durante

DEZEM BRO 2020 . EXAM E . 57


Macro

UM FORNO QUE
É UM ESPAÇO SEGURO
O projeto The Great Oven quer reconstruir
comunidades (e pessoas) à volta da mesa

Quando, há dois anos, é preciso juntar mais azeite porque, por exemplo, quan-
chegou a Tripoli, no norte aos tabuleiros de couve- do um hotel abre falência, o
do Líbano, James Gomez -flor que estão quase a Banco Alimentar pergunta
Thompson não sabia o que entrar no forno. À equipa de se queremos a despensa.
ia encontrar, mas tinha um base, que inclui refugiados Claro que sim!! E depois
objetivo: juntar à mesma do Sudão e antigos prisio- há a questão de como usar
mesa as pessoas que neiros do Daesh, juntam- os alimentos para retirar
ainda há poucos meses -se todos os dias novos deles o maior proveito. Este
“continuavam a tentar elementos que querem bocadinho de tecnologia
matar-se umas às outras”. ajudar, de alguma forma. E antiga do forno comunitário
O cozinheiro de ascendên- muitos precisam de ajuda, permite mesmo… ‘acres-
cia espanhola e irlandesa, também. Nour, a namora- centar mais um copo de
que durante vários anos da libanesa de James, diz água para alimentar mais
partilhou com o gastró- que é agora que o desafio pessoas’, como se diz em
nomo Nigel Slater um maior começa: “O objetivo Espanha”, explica James. “O
programa na BBC, acredita é reabilitar comunidades que fazemos é colocar os
no poder regenerador de e criar um espaço seguro ingredientes todos na mesa
uma refeição partilhada para estas pessoas”, e tentar responder à ques-
e o seu instinto tem-se sejam famílias carenciadas, tão: como é que podemos
revelado certo. Decidiu refugiados ou sem-abri- fazer disto a maior e mais
recuperar a ideia dos fornos go. Por essa razão, o The saborosa refeição? E toda a
comunitários que em Great Oven está “a tentar gente contribui com ideias.
Espanha eram lugar de não cair na rigidez de uma O chefe somos todos. a semana que passámos em Beirute, o va-
conversa e de convívio, e instituição de caridade” no Às vezes, conseguimos lor do dólar oscilou entre as sete mil e as
em Tripoli conseguiu que que toca a definir quem são triplicar ou quadruplicar dez mil libras, e os preços dos alimentos,
antigos inimigos partilhas- as pessoas que ajuda. “Não as quantidades. Eu tenho
refeições fora ou roupa tocam facilmente
sem refeições. Quando a vamos ter uma espécie aprendido mais com estas
os que encontramos em qualquer capi-
explosão do porto destruiu de formulário em que se pessoas do que na minha
parte de Beirute, James as pessoas não cumprem carreira toda como chefe”, tal europeia, o que torna qualquer com-
decidiu trazer o forno para todos aqueles pontos, não admite. Atualmente, o The pra praticamente incomportável, num
o sul do país para dar apoio podem ser ajudadas. Como Great Oven já se trans- país onde o salário mínimo é de cerca de
imediato às famílias com é que se mede a tragédia formou em quatro fornos 150 dólares. A título de exemplo, por uma
fome – numa altura em que alguém está a viver?”, e o objetivo é que sejam sanduíche dupla de kafta e dois copos de
que o preço dos alimentos pergunta Nour, alternando dez até ao final do ano. vinho no Route 961 pagámos cerca de 45
disparou 350% em apenas o inglês que fala connos- O primeiro foi financiado dólares. “Essa garrafa de vinho ontem cus-
12 meses, são demasiadas co com o árabe com que totalmente por James, mas tou-me 10 dólares. Mas amanhã pode cus-
a precisar de ajuda. “Sou responde às duas avós de os que estão previstos – o tar 20”, continua o proprietário em jei-
amigo do Joe Mourani, dono Achrafieh − o bairro onde valor da construção e da
to de justificação pelos preços cobrados.
do Ballroom Blitz [uma das o forno estava no dia em pintura ronda os $10 mil
“Tenho três filhos e tomo conta dos meus
mais famosas discotecas que a EXAME falou com os – são já fruto da generosi-
de Beirute], que entretanto mentores do projeto − que dade de todos os que, em pais, que também precisam de ajuda. E as
teve de fechar, por causa descascam rabanetes para redor do mundo, decidiram perguntas são, todos os dias, as mesmas:
da pandemia. Usamos o o jantar. Com a ajuda do contribuir para o projeto. E vamos comer amanhã? Vamos abrir [as
espaço para guardar o forno Banco Alimentar do Líbano, a ONU, de olho no sucesso portas] amanhã?”, conta enquanto olha
e fazer toda a preparação têm conseguido servir en- da ideia, já convidou James para os filhos, que correm alegres escada
dos alimentos. No fundo, tre 400 e 500 refeições por para uma reunião, de forma acima e abaixo, no meio dos clientes que
tem funcionado como o dia, mas o forno tem capa- a perceber como pode levar agora escasseiam. “Obrigada por virem e
nosso quartel-general”, ex- cidade para cozinhar mil. “Já o projeto para alguns países por pagarem em dólares”, diz-nos. A mu-
plica antes de perguntar se recebemos coisas incríveis, da América Central. lher, russa, pediu-lhe para voltarem para
a Europa após a explosão. “Como é que

5 8 . EXAM E . DEZEM BRO 2020


Comida com alma
A equipa do The Great Oven (ver caixa)
dedica-se à confeção de centenas
de refeições que alimentam as famílias
necessitadas de Beirute

15%
posso ir? Este é o meu país. Tenho de ficar, da de bens essenciais, o porto, continuar
tenho de ajudar a reerguê-lo. Mas será que destruído. Os hospitais e as farmácias não
podemos ficar?”, atira-nos mais em jeito têm acesso a medicamentos – o Governo
de reflexão do que de pergunta. voltou a decretar um confinamento total,
Os conflitos internos e internacionais a meio de novembro, para conseguir fazer
custam ao Líbano mais de sete mil milhões face à pandemia da Covid-19 que só veio
Remessas estrangeiras de euros e têm um impacto de 8% no PIB agravar um problema já sério, em termos
As remessas de emigrantes nacional, segundo os dados do mais recen- de prestação de cuidados de saúde – e en-
representam praticamente 15% do PIB te Índice Global da Paz. Uma fatura que já trar num supermercado de classe média é
libanês. A pandemia acabou por ninguém quer ou consegue pagar, a não uma surpresa. Os preços (e as marcas) de
penalizar este importante indicador ser que o país receba ajuda internacional – alguns produtos essenciais como massa,

7 mil
e essa está a ser ferozmente negociada por arroz, feijão ou grão não são em nada dife-
um recém-eleito Governo que tem pouca rentes do que se encontra nos supermer-
vontade de mudar um sistema que favo- cados europeus. Nas mercearias, os preços
rece as elites instaladas. descem um pouco, sobretudo nos frescos,
mas continuam a ser demasiado elevados
“WE WILL RISE AGAIN” para a grande maioria dos libaneses. Co-
Nas ruas de Beirute não se vê, generica- mer uma knafeh, um popular doce do
mente, tristeza ou sequer revolta. O que Médio Oriente que nos dá as calorias su-

MILHÕES se sente, ao longo dos dias, seja a passear


nas ruas ou a conversar com quem par-
tilha connosco as histórias, é cansaço. E
ficientes para um dia inteiro, custa cerca
de um dólar: está completamente fora do
orçamento das famílias. Muitas delas, ali-
Violência
Os conflitos internos e internacionais preocupação. Importador de praticamen- ás, têm tido como única refeição diária o
custam aos cofres do Estado mais te tudo o que consome, o Líbano sofre man’ousheh, o habitual pequeno-almoço
de sete mil milhões de dólares, com a flutuação cambial mas também que consiste em pão árabe recheado com
segundo o Índice Global da Paz com o facto de a principal porta de entra- queijo ou especiarias.

DEZEM BRO 2020 . EXAM E . 59


Macro

Da presença da ajuda humanitária, cé- ESPERANÇA E ALEGRIA


lere a chegar nos dias após a explosão do Uns metros mais à frente, encontramos Ro-
porto, restam agora algumas tendas vazias. drigue Herb, um ilustrador transformado
Muitas delas servem até de estacionamento em empreiteiro voluntário, que se desdobra
para motas, outras de espaço de descanso entre carpintarias provisórias, fios de eletri-
para os trabalhadores da construção civil cidade e idosos com olhar perdido. Está a
que fazem renascer os edifícios destruídos trabalhar para a Offre Joie, uma ONG liba-
há cerca de dois meses. “Continuamos a nesa que tem sido fundamental para a recu-
tentar trabalhar em rede com algumas peração dos edifícios destruídos em Beiru-
ONG, mas são muito poucas as que estão te. “Começámos a fazer o levantamento das
ainda cá”, lamenta Mira Rasbieh, respon- necessidades ainda no dia da explosão. Dois
sável por um consórcio de organizações dias depois, estávamos no terreno a traba-
que, além de prestar apoio aos mais ido- lhar”, atira-nos antes de interromper para
sos, se concentra bastante na saúde femi- receber um grupo de voluntários que hoje
nina. “Distribuímos dignity kits (cabazes vai trabalhar aqui, num dos bairros mais
com produtos de higiene feminina) às mu- afetados pela detonação, e onde a institui- A Offre Joie
lheres mais necessitadas; prestamos apoio
domiciliário a grávidas e a recém-mães...
ção já recuperou 45 apartamentos. As doa-
ções foram feitas pela sociedade civil, desde
deu-me tudo
Mas a verdade é que não chega. As famí- particulares a empresas que cederam mate- de volta.
lias estão a passar muitas necessidades riais de todo o tipo. Os trabalhadores espe- Reconstruiu
e nós só atuamos na área da saúde”, ex-
plica Mira. Tem conseguido, ainda assim,
cializados – canalizadores, eletricistas, car-
pinteiros – estão a oferecer mão de obra em
tudo.”
trabalhar com a Nusanet e com a Caritas, troca de transporte e refeições, e muitos ou- Charbel
por exemplo, para tentar criar uma rede de tros voluntários estão a aprender a construir Morador do bairro recuperado
apoios transversal aos mais necessitados. E paredes ou pintar portas. Por este bairro, em pela Offre Joie, em Beirute
pede à comunidade internacional que não particular, passaram dois mil voluntários
se esqueça do povo libanês. “Continuamos em dois meses. As autoridades apareceram
a precisar de ajudar financeira para nos apenas para aprovarem o que estava a ser
mantermos no terreno”, pede. feito, e os moradores recusaram-se a sair. “A

60 . EXAM E . DEZEM BRO 2020


apenas o trabalho, mas condiciona tam-
bém o ensino dos mais novos, que não
podem comprar material. “Perdi muitos
alunos” e isso vai refletir-se até na saúde
mental da sociedade. “A melhor terapia
para sair deste apocalipse é a arte-terapia”,
garante à EXAME Goguikian, pintora reco-
nhecida e premiada internacionalmente.
“Acredito que os meus alunos estão a so-
frer, e que a arte os pode ajudar.” A neces-
sidade de psicólogos é, aliás, uma das mais
apontadas por famílias e ONG que ainda
encontrámos no terreno. Sobretudo para
os mais novos, que ainda não entendem
que, na mesma medida em que é um te-
souro geo-estratégico, o Líbano é também
um barril de pólvora à mão de demasiados
interesses económicos e políticos que lhe
dificultam o caminho da paz.
As vendas das obras de arte caíram a
pique, numa altura em que há menos tu-
ristas e menos gastos. Enquanto os murais
da cidade se enchem de novas produções
por parte de artistas mais ou menos urba-
nos, o retorno desse esforço é quase nulo.
Mireille pede à comunidade internacional
que não se esqueça dos artistas libaneses, e
que se lembre que a arte é mesmo o cami-
nho para a redenção. Fala-nos, a ritmo ace-
lerado, enquanto nos mostra as telas rasga-
das pelos vidros que saltaram das janelas
no dia da explosão. Ela e a família não esta-
vam em casa, e os estragos são, felizmente,
solucionáveis. A revolta pela situação, por
seu lado, tem sido o principal gatilho: de
repente, a mesa da sala enche-se de ilus-
trações, colagens e afins que Mireille fez
nos últimos dois meses, como um grito de
Offre Joie devolveu-me tudo. Reconstruiu perança, que dá alento. Recebeu-nos em socorro. “As pessoas acham que os artistas
tudo”, conta-nos Charbel, que abre religio- sua casa, com a generosidade típica dos têm muito dinheiro, mas a verdade é que
samente a sua oficina para não ter trabalho, nacionais, e quando demos conta já es- às vezes não sei mesmo como vou comprar
durante 12 horas. O filho universitário per- távamos rodeados de obras da pintora: a comida até ao final do mês. Só que não há
deu um olho na explosão e isso é o que mais Notre Dame em chamas, a Arménia a lu- como fazer outra coisa. Tudo isto vai ter
lhe dói. Mas, apesar da desesperança, con- tar para se reerguer, Beirute em tempos impacto na minha arte”, atira em jeito de
tinua a levantar-se, todos os dias, porque é de revolução, Nova Iorque a recuperar do conclusão.
isso que o povo libanês faz: nunca baixa os 11 de Setembro. Em todas as telas encon- Quando saímos à rua, depois de um
braços. E tem um sentido de comunidade tramos um sol amarelo, o seu símbolo de jantar improvisado em casa da artista,
que dificilmente sentimos na Europa. renascimento. No entanto, na sua voz, olhamos as ruas desertas e silenciosas de
encontramos o desalento de uma classe Mar Mikhael, um dos bairros mais tradi-
A ARTE SALVA que tem tido muita visibilidade mas ne- cionais da cidade. A noite traz a Beirute
Mireille Goguikian é uma pintora de ori- nhum apoio. “Uma caixa de lápis pastel, uma paz e uma esperança em que os liba-
gem arménia que retrata Beirute como por exemplo, custa atualmente 200 dóla- neses gostam de acreditar, mesmo depois
ninguém. Aliás, entre a comunidade ar- res”, exclama. “É uma loucura”, lamenta de tantas décadas de conflito. Se isto não é
tística é mesmo apelidada de Mireille de enquanto explica que o preço altamente uma lição de resiliência, não sabemos bem
Ville, por se inspirar nas cidades e na es- inflacionado do material não lhe dificulta o que lhe chamar. E

DEZEM BRO 2020 . EXAM E . 61


EM CASA, ONDE TUDO ACONTECE
O centro nevrálgico nas nossas vidas invadiu a esfera privada, à conta de uma pandemia ainda sem fim
a vista. Em casa trabalhamos, reunimos virtualmente família e amigos, educamos os filhos, gerimos
emoções. Dentro de paredes celebramos vitórias, ultrapassamos as dificuldades, vivemos a vida.
Confinados, mas sempre em bom – por dentro e por fora. Como bem dizia Coco Chanel: “Se estiveres
triste, acrescenta mais batom. E segue em frente”.

62
6 2 . EXAM E . DEZEM BRO 2020
CONTEÚDO
PATROCINADO

ZOOM MEETING A POSTOS


MakeUp: Base Les Beiges Teint Belle Mine BD41; Batom Rouge Allure Cuivré; Sombra Ombre Première Or Antique;
Lápis Stylo Sourcils 808; Máscara Le Volume de Chanel 10; Blush Les Chaînes de Chanel; verniz Le Vernis 773.
Roupa e acessórios: Chanel na Stivali

DEZEM BRO 2020 . EXAM E . 63


HOME OFFICE LOOK
MakeUp: Base Les Beiges Teint Belle Mine B41; Batom Rouge Allure Purpre D’Or; Sombra Ombre Première Cuir Brun; Lápis Stylo
Ombre et Contour 08 e Stylo Sourcils 808; Máscara Le Volume de Chanel 10; Blush Les Chaînes de Chanel; verniz Le Vernis 773.
Roupa e acessórios: Chanel na Stivali

64 . EXAM E . DEZEM BRO 2020


Realização: Filipe Carriço assistido por André Pequito; Fotografia: João Paulo; Make Up e Cabelos: Joana Moreira
com produtos Chanel; Modelo convidada: Débora Rosa; Agradecimento: Pousada de Lisboa – Grupo Pestana

DEZEM BRO 2020 . EXAM E . 65


PATROCINADO
CONTEÚDO
Macro

NEGÓCIOS

NOTÍCIAS . FOCO

Ana Paula Rafael,


da Dielmar, e Jessica
de Seixas von Haff,
da Fidelidade, acreditam
que o segredo das equipas
está na comunicação.
E garantem que são
a imaginação e a humildade
que transformam empresas
em negócios de sucesso
Texto Margarida Vaqueiro Lopes
Fotos Luís Barra

C
omo não podia
deixar de ser, a
primeira Girl Talk
também sofreu
os desaires de ser
lançada em plena pandemia. De-
pois de várias semanas a tentar
encontrar uma data possível para
juntar à mesa a CEO da Dielmar Paula Rafael foi o rosto de um otimismo isso mesmo, o seu grande desafio passa
e a Corporate Marketing Team Leader da moderado, numa altura em que a maior por “continuar a acordar as pessoas que
Fidelidade, a alteração do mapa epidemi- parte das empresas nacionais luta com os tenho à minha volta para continuarem
ológico acabaria por nos trocar os planos: efeitos da pandemia, numa economia que a observar o mundo, para continuarem
Ana Paula Rafael não conseguiu juntar-se estava em franca recuperação. E aprovei- a observar o estilo de vida das pessoas,
ao nosso pequeno-almoço, no Martinhal ta para afastar a ideia de que o setor em que vai mudando – olhemos para a pan-
Chiado, como estava previsto, para poder- que se move é tradicional. “Se o fosse, já demia! – e despertá-las para serem mais
mos, à boa maneira portuguesa, trocarmos tinha desaparecido do mercado!”, atira a observadoras do que antes. No passado,
ideias em redor de uma mesa. responsável da mais antiga marca de al- tínhamos de inovar todas as estações e fa-
Mas as novas tecnologias resolveram faiataria nacional. “Na verdade, é um setor zer coleções-cápsula na própria estação.
o problema e foram a peça fundamental altamente inovador, até. Neste tempo de Hoje, temos de redescobrir o estilo de vida
para permitir à EXAME ouvir as opini- pandemia, em que todos somos treinado- do novo normal, e das pessoas que estão
ões das duas profissionais sobre inovação res de bancada, eu tenho dito isto: o setor a fazer vários estilos de vida ao mesmo
em negócios considerados tradicionais, as da moda é o mais inovador que eu conhe- tempo, como disse há pouco a Jessica”,
eleições norte-americanas e a liderança de ço, desde que estou cá. Eu sou advogada e lembrava. Logo no início da conversa, a
equipas e os negócios internacionais. trabalhei em muitas empresas, como sa- responsável de marketing da Fidelidade
A partir do escritório em Alcains, com bem. E quando cheguei aqui é que validei referia como o teletrabalho tinha alterado
vários blazers como pano de fundo, Ana isso: o que este setor tem é tradição.” Por a forma de nos vestimos, sendo possível

66 . EXAM E . DEZEM BRO 2020


COM O APOIO

tro, é mais informal”, garante Jessica. “Há


de tudo a acontecer. Há pessoas que nun-
ca foram formais!”, atira com um sorriso.
“Mas é claro que é um setor tradicional,
clássico, chato, até... no sentido em que
trabalhamos com base no azar, na venda
da probabilidade de haver um azar. Mas
a verdade é que trabalhamos na proteção
das pessoas. O nosso trabalho é proteger as
pessoas, mas as seguradoras também po-
dem tomar uma atitude nessa proteção. Foi
isso que vimos, aliás, nos últimos meses.
As seguradoras a irem para lá do que está
na lei, para proteger, para apoiar, para estar
presente.” As mudanças, no entanto, já se
começaram a sentir há mais tempo, sobre-
tudo após a crise financeira de 2011. “Há
uns anos, a pessoa comprava o seguro e co-
municava com a seguradora talvez uma vez
por ano, na renovação, para voltar a pagar.
Hoje, já não é assim, já temos muito mais
contacto com as pessoas, graças a aplica-
ções, com outras features e valências”, o
que obriga a um esforço constante de ino-
vação, de estratégia de comunicação para
estar mais perto do cliente, que também
ele é um consumidor diferente.

DE PORTUGAL PARA O MUNDO


No mesmo sentido, o facto de ambas as
executivas trabalharem em empresas com
presença internacional obriga a um maior
esforço de comunicação e de estratégia de
venda. Para Jessica, há duas regras funda-
mentais para trabalhar em outros merca-
dos: respeito e humildade. “Eu estou na área
de marketing internacional e estamos atual-
estar a ter uma reunião formal com uma mente em 11 países, em quatro continentes.
camisa e um blazer e, ainda, calças de E se em Portugal somos uma empresa líder,
pijama. “Hoje em dia, as pessoas podem em outros países estamos no top 3 e noutros
ter o pijama e a pantufa associado a uma mercados estamos ainda a conquistar uma
camisa, a uma camiseira, a um blazer... posição. Temos de ser criativos, inovadores
Porque têm de ter um aspeto sério, de es- e abertos”, porque não é possível ter a mes-
tar a trabalhar no andar de cima, e podem ma atitude em mercados onde não se tem
estar a relaxar no andar de baixo”, atirou a mesma posição. “Podemos levar os nos-
com uma gargalhada Ana Paula. sos 200 anos de experiência, mas temos de
O setor da Um quê de informalidade que pode pensar como fazê-lo. A nossa criatividade
moda é o mais trazer algum divertimento ao setor segu- tem de nascer da abertura. Por exemplo, o
rador, comummente conhecido por ser meu principal foco das manhãs é trabalhar
inovador que eu dos mais clássicos, a par da banca. “É um com Macau, e logo de seguida África e Eu-
conheço, desde setor tradicional, mas quando falamos de ropa e, no final do dia, a América Latina.
que estou cá formalidade, há muitos mundos no setor As necessidades são diferentes em qualquer
dos seguros: o mais formal, junto do cliente uma das regiões, ainda que possamos, às
Ana Paula Rafael virado para fora. Agora, nas áreas de cál- vezes, enfrentar alguns problemas seme-
CEO da Dielmar culo, de marketing, mais virado para den- lhantes. E essas partilhas são importantes,

DEZEM BRO 2020 . EXAM E . 67


Macro

lembrando-nos sempre de que somos dife-


rentes”, reafirma. “Não há espaço para ter
nenhum tipo de arrogância ou de imposi-
ção. Não dá para ter aquele espírito coloni-
zador e dizer que “estamos na sede, então
tens de fazer desta ou daquela forma”.
Ana Paula, por seu lado, salienta que
“trabalhar com a Austrália, a Irlanda, o
Reino Unido, França ou Espanha é muito
diferente, porque são outros mundos. Tra-
balhamos com Marrocos, por exemplo, que
ainda é outro totalmente diferente. Há um
processo de comunicação que tem de ser
muito eficaz, porque é fundamental” para
o negócio, esclarece a gestora, recordando
que, no seu caso, esta interação é feita so-
bretudo com os fornecedores que, depois,
falam com o cliente final. “Por isso é que
fazemos uma construção e um diálogo co- Falar
muns com os nossos parceiros. Não fazemos de dificuldade
um produto e entregamo-lo, simplesmente.
Temos um sistema de vasos comunicantes
e de inclusão
em que somos coproprietários do que faze- não é inovador,
mos. E pomos no mercado aquilo que são as pode ser visto
competências que criamos juntos.” Para a
advogada transformada em gestora, as pe-
como uma
ças que fabrica e vende são um produto com tendência, mas
“um peso brutal na forma como as pesso- isto é a nossa
as comunicam entre si e com o mundo. E
temos uma responsabilidade muito gran-
vida”
de com este precisamente por isso”, realça. Jessica de Seixas von Haff
A importância da comunicação é algo Corporate Marketing Team
que sente não apenas no final do processo Leader na Fidelidade
de produção mas que também, defende, é
importante estar garantido durante todo o
tempo. Essa é também uma das razões pe-
las quais a horizontalidade da hierarquia se lidade é tão grande que há ainda algumas
torna tão importante na empresa sediada colaboradoras que, às vezes, me chamam
no concelho de Castelo Branco. “Nós temos, Paulinha”, revela com um sorriso.
internamente, uma comunicação e intera- “Eu tive um choque muito grande quan-
ção diretas. Somos 400 pessoas no mes- do me apercebi da formalidade das hierar-
mo espaço e comunicamos diretamente, quias em Portugal”, revela Jessica, adiantan-
porque, quando se constrói em conjunto, do que, depois de vários anos a trabalhar em
quando toda a gente conhece o objetivo e França, foi dos maiores choques culturais
trabalha para ele, é assim que tem de ser. que sentiu. “As pessoas em França tratam-
A verticalização das hierarquias está muito -se por vous, mas a partir do momento em As pessoas têm
enraizada em processos mais administra- que têm uma relação passar a tratar-se por de ter a noção
tivos, mas, quando as pessoas estão com a tu. E não há título quando falam umas com do coletivo.
mão na massa, ela acaba por se esbater. Se as outras – não há dr., engenheiro, arquiteto.
estamos todos a construir uma calça ou um E eu, depois de pensar bastante, tomei a de- Pensar
blazer, as pessoas estão no mesmo espaço cisão de não adotar essa posição de tratar as e trabalhar
com os mesmos objetivos, a tentar encon- pessoas pelo título, aqui, em Portugal. Hou- em coletivo”
trar a melhor via para chegar ao sucesso, e ve quem dissesse que eu era mal-educada,
onde todos podem ‘jogar ao criativo’. Todos mas a minha decisão foi baseada no facto Ana Paula Rafael
têm uma palavra a dizer, aqui. A informa- de eu sempre as tratar com muito respeito. CEO da Dielmar

6 8 . EXAM E . DEZEM BRO 2020


COM O APOIO

Outro projeto que passou a ter lugar na


Fidelidade, no sentido de melhorar a co-
THE WORD municação e o envolvimento, é o do grupo
TO THE WOMEN de Diversidade e Inclusão que Jessica lidera
desde a sua criação, uma vez que nasce por
Um espaço em que todos sua sugestão. “Tomámos a decisão de que
os assuntos vão ter lugar esse grupo seria transversal a todas as áreas
do grupo, e até mesmo às várias empre-
sas do grupo. Estamos a tirar a fotografia
da empresa, a ver o que já existe, e quere-
mos que tudo fique agregado. O objetivo
> PORQUÊ ESTE PROJETO?
é estimular dinâmicas que promovam a
A Girl Talk nasce após muita reflexão
diversidade e a inclusão, porque a Fideli-
e para dar destaque a mulheres dade é uma empresa líder, e há um cami-
que têm um papel fundamental na nho de posicionamento e de cidadania que
sociedade e na economia, bem como a empresa tem de ter perante os outros”,
as iniciativas que elas protagonizam começa por explicar. “Esse grupo é pro-
ou em que estão envolvidas. Aqui, a fundamente impactante para nós – somos
voz é feminina mas os assuntos são uma dezena de pessoas –, e deram-nos a
globais. Falaremos de negócios, de liberdade para podermos trabalhar vários
política, de educação, de economia, temas. Falar de dificuldade e de inclusão
de gestão e de Ciência, e de tudo o
não é inovador, pode ser visto como uma
mais que surgir. Todos os
tendência, mas isto é a nossa vida. Pode-
meses, a Girl Talk tomará
o pequeno-almoço
mos ser uma mulher entre dez mulheres,
com (pelo menos) duas mas há enquadramentos em que vamos ser
mulheres responsáveis uma ou das poucas entre muitos homens;
por projetos ou ideias de podemos ser a única que fez Gestão entre
destaque, para conhecer todas as que estudaram Direito; podemos
a sua visão sobre o País e ser a pessoa mais velha da sala... a diver-
o mundo, e para apren- sidade não é só nacionalidade, raça, géne-
der com elas. ro. Há imensa coisa que é diversidade e é
isso que nós estamos a enaltecer”, conclui.
> E ALÉM DAS ENTREVISTAS?
Declarações que foram ao encontro de
Vamos selecionar personalidades um dos ensinamentos que Ana Paula Ra-
que estejam a destacar-se nas fael considera fundamental que sobreviva
diversas áreas do saber (Great ao período de pandemia que atravessamos:
Há ocasiões mais formais em que temos de Minds) e apresentamos-lhe algumas “As pessoas têm de ter a noção do coletivo.
tratar as pessoas pelo título, mas, se estamos sugestões de livros, podcasts, filmes, Pensar e trabalhar em coletivo. É preciso
no mesmo open space, isso não faz senti- programas de televisão que tenham mesmo perder a ideia individualista do seu
do”, defende. A especialista em marketing mão feminina na sua existência (na ser, da sua cidade, do seu país.” No mesmo
aproveitou ainda a ocasião para explicar secção Como Disse?). Pode receber sentido, a gestora espera que “a noção de
tudo no seu email, subscrevendo a
que a Fidelidade tem levado a cabo várias que todos temos de construir um mundo
nossa newsletter.
iniciativas que implicam dar, em projetos melhor e de que a agenda do ambiente tem
específicos, funções diferentes às pessoas, > COM QUEM? de estar em toda a nossa vida” tenham vin-
precisamente para perceber que perfil es- do para ficar, “porque senão vamos ter de
tas podem ter e para que posições. Também Este formato não seria possível sem a construir outra arca de Noé”, brinca com
ajuda a horizontalizar hierarquias, uma vez ajuda do grupo Martinhal Resorts que muita seriedade. E, por fim, defende, “nin-
que, ao se atribuir a chefia de um projeto a se associou à EXAME neste projeto e guém tem dúvidas de que neste momento
um colaborador, ele pode passar a chefiar que, com muita generosidade, todos é urgente que as pessoas pensem no futuro
o seu superior formal. “É bom para quem os meses, disponibiliza um espaço e de que forma vão conseguir contribuir
privado e uma deliciosa mesa de
pensa em assumir cargos de liderança, mas para a sua cidade, para o mundo. Temos
pequeno-almoço em redor da qual
também para aqueles que descobrem que, de criar formas claras de reproduzir o valor
acontecem as conversas que são aqui
afinal, liderar não é o que querem fazer.” E publicadas.
do trabalho – não o dos sindicatos, mas o
obriga, claro, a uma dose extra de humilda- valor intrínseco da contribuição que cada
de por parte das chefias. um vai fazer”. E

DEZEM BRO 2020 . EXAM E . 69


CONTEÚDO
CONTEÚ
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POR UMA BELEZA


RESPONSÁVEL
Inspirada pela natureza desde 1954, a Clarins mantém nos seus
produtos o respeito pelo planeta e pelas pessoas, num compromisso
com a inovação responsável e o progresso contínuo.
Quando, em 1954, Jacques
Courtin-Clarins fundou a
marca com o seu apelido fê-lo
com base numa visão única:
criar os melhores produtos de
beleza, utilizando os melhores
ingredientes à base de plantas.
Visão essa que, passados 66
anos, ainda norteia as ambi-
ções da Clarins. Os produtos
continuam a ser tão eficazes
quanto naturais, feitos com
respeito pelo planeta e pelas
pessoas, com transparência na
comunicação e um compro-
COMPROMISSOS
misso de confiança para com CLARINS PARA 2025
os clientes, distribuidores, for- JÁ OUVIU FALAR
necedores e parceiros. NO DOMAINE CLARINS? > 100% de abastecimento
Tudo é pensado nesse senti- sustentável na produção;
do: os ingredientes são da mais Fica no coração dos > 80% dos extratos de plan-
alta qualidade, de origem sus- Alpes Franceses, a 1400 tas serão provenientes de
metros de altitude, o agricultura biológica;
tentável (com colheitas con-
verdadeiro testemunho da > Objetivo de melhoria do
troladas, agricultura biológi-
filosofia Clarins: produzir Green Score*: +10% para as
ca certificada, comércio justo, fórmulas livres de ingredientes fórmulas;
ingredientes excecionais
com respeito pelas leis laborais derivados de animais. > Todas as fórmulas solares
mantendo o respeito pela
e condições de trabalho), aju- natureza. O Domaine e de limpeza serão biode-
dando na proteção da biodi- Clarins são 10 hectares INOVAÇÃO CONTÍNUA gradáveis;
versidade. As fórmulas obede- de terreno integralmente A Clarins aposta no conceito da > Reforço de programas de
cem a três pilares de excelência dedicados à observação e “fórmula aberta” na criação de comércio justo;
– segurança, eficácia e sensori- ao cultivo de plantas atra- todos os seus produtos. O que > Reduzir em 4% por ano a
alidade – e regem-se pelo prin- vés de práticas ancestrais significa isto? Que os laborató- pegada de carbono das
– como a permacultura, operações;
cípio da inovação permanente. rios estão continuamente a me-
com fertilizantes naturais > 100% de embalagens
Toda a produção, bem como as lhorar e a otimizar as fórmulas, recicláveis.
embalagens, obedece a critérios e arados puxados por para que estas beneficiem das
cavalos. Tudo feito em *Green Score é a ferramente
sustentáveis e de baixo impacto mais recentes descobertas ci- que a Clarins utiliza para
perfeita harmonia com a
ambiental. A redução da utili- entíficas, tornando-se assim avaliar o impacto dos seus
natureza.
zação do plástico nas embala- Desde 2016 que aqui
mais naturais, mais eficazes – e produtos no ambiente.
gens é um compromisso firme se faz a investigação e mais sustentáveis. Tudo isto sem
da marca, que pretende tornar- produção de plantas para comprometer a segurança, a efi-
-se neutra até 2025 (ver caixa). utilização em produtos cácia ou a sensorialidade (esta mulas de cuidados solares, que
Na Clarins não há testes Clarins. Só em 2019, foram última, uma parte essencial do em 2019 se tornaram coral-fri-
feitos em animais – desde bem desenvolvidas 14 espécies universo Clarins, onde se com- endly, ou seja, apesar de já se-
antes de estes terem sido pro- de plantas e estudadas binam todos os elementos: a rem eficazes na proteção solar
ibidos por lei – e a marca lan- 865 amostras. Um núme- textura, as fragrâncias, as co- da pele, passaram a respeitar a
çou no ano passado a linha ve- ro que promete crescer. res, o conforto na aplicação). vida marinha e os recifes de co-
gan-friendly myClarins, com Um exemplo concreto? As fór- ral, em particular.

70 . EXAM E . DEZEM BRO 2020


Macro

IMPOSTOS

Uma
butique
fiscal
para
tempos
de crise
O mais recente escritório
de advocacia de Lisboa nasce
com o conceito de butique
fiscal, em contraciclo com
a crise. Os sócios, Carlos Lobo
e Sérgio Vasques, acreditam
que a recuperação económica
requer soluções fiscais
imaginativas – para quem cobra
e para quem paga impostos
Texto Clara Teixeira
Fotos José Carlos Carvalho

A
ideia amadureceu du- CARLOS LOBO um a seguir ao outro, quando o Ministério
rante o confinamento e das Finanças era dirigido por Fernando Tei-
a instalação, num am- > I DA D E xeira dos Santos (ver perfis).
plo espaço de 350 me- 49 anos Durante anos, esperaram pacientemen-
tros quadrados no Largo te que o mercado amadurecesse para rece-
de Santos, em Lisboa, fez-se a conta-gotas > CARREIRA ber o projeto que tinham em mente. Assim
durante o verão e o início do outono. Depois Professor na Faculdade de Direito da que viram chegar o momento, nem a ines-
Universidade de Lisboa e consultor
de receber obras, o alto pé-direito do edifí- perada crise pandémica os demoveu de lan-
estratégico da EY, onde teve funções
cio de estilo pombalino ficou com as condi- çar a Lobo Vasques e Associados, uma buti-
de liderança nos últimos nove anos.
ções ideais para acolher uma sociedade de Foi secretário de Estado dos Assun-
que de advogados especializada na área da
advogados a estrear, que quer ser mais do tos Fiscais entre 2008 e 2009 fiscalidade. “Sempre que há uma crise, tam-
que um vulgar escritório lançado por dois bém há uma oportunidade”, avança Carlos
sócios que também são amigos de infância. > ÁREAS DE ESPECIALIZA Lobo, convencido de que o novo escritório
Carlos Lobo e Sérgio Vasques conhecem-se Ç ÃO vai preencher “uma lacuna no mercado”.
desde que, em crianças, habitaram o mes- Fiscalidade do Setor Público e Em Portugal, segundo explica Sérgio Vas-
mo prédio nos Olivais. Mais tarde, licen- Tributação do Património. Desen- ques, as grandes sociedades de advogados
ciaram-se ambos em Direito, especializa- volveu projetos de finanças locais, de “banda larga” prestam serviços de con-
ram-se na área fiscal e ocuparam, nos dois infraestruturas e energia sultoria fiscal, mas não o fazem de forma
governos de José Sócrates, a mesma pasta: tão “profissional e sofisticada” como este
a Secretaria de Estado dos Assuntos Fiscais, tipo de butiques. Embora desconhecidas

7 2 . EXAM E . DEZEM BRO 2020


Macro

rado na introdução do IVA na Guiné-Bissau to fiscal agressivo. Há muitos a fazerem isso. de procurar a melhor solução para as duas
e na revisão dos benefícios fiscais em Cabo E claro que vamos evitar os clientes expos- partes?”, prossegue Carlos Lobo. Para o fis-
Verde, enquanto Carlos Lobo tem acompa- tos”, diz ainda. calista, “as empresas têm o dever de pro-
nhado projetos na área fiscal em Angola e Mas, escândalos à parte, se o objetivo por a melhor solução para as duas partes,
também em Cabo Verde. dos Estados é estabelecer sistemas tribu- porque o Estado nem sempre o faz bem”. E,
Para melhor acompanhar os clientes, tários eficientes e justos, acompanhados em tempos de crise, há que saber encontrar
a Lobo Vasques vai ter parcerias locais em das melhores soluções para os cidadãos, as equilíbrios virtuosos: “O Estado precisa de
África, ao passo que, na Europa, terá liga- empresas e os Estados, “qual é então o mal receitas, mas as empresas precisam de recu-
ção a sociedades de outros países, desde perar da crise.” Uma equação de resolução
que isso não implique uma perda de inde- impossível? “Nem por isso”, sublinha Carlos
pendência. “Não queremos estar integrados Lobo. “Temos milhares de ideias sobre o as-
numa rede internacional”, diz Carlos Lobo.
Afirmando-se “preparados para criar solu-
PRINCIPAIS sunto”, acrescenta Sérgio Vasques.
O País, na atual crise, aguenta um au-
ções para os problemas mais complexos”,
à escala nacional, internacional ou local, os
APOSTAS mento de impostos em determinadas áreas
para socorrer outras? Nenhum dos sócios
sócios prometem respostas inovadoras, cri- acredita que esse seja o caminho. “O desa-
ativas e sofisticadas – mas sem nunca “per- fio é melhorar o sistema de impostos, tor-
der os princípios”. O foco será “o profissio- > A LOBO VASQUES E ASSOCIADOS nando-o ainda mais eficaz, e racionalizar a
nalismo e a excelência”. PROPÕESE FORNECER SERVIÇOS despesa pública. Tem de ser encontrado um
DE POLÍTICA FISCAL “INOVADORES
equilíbrio entre receita e despesa”, defende
E SOFISTICADOS” EM ÁREAS COMO:
OS “LEAKS” DO NEGÓCIO Carlos Lobo. E se a solução passar por redu-
Nos últimos anos, a área fiscal tem gerado Biocombustíveis zir impostos nos setores mais afetados, como
escândalos que se agigantam sempre que Bebidas alcoólicas por exemplo o IVA da restauração? “Não há
há novos leaks e papers expostos na in- Energia (hidrogénio, solar) uma análise que demonstre a eficácia dessa
ternet. Panama Papers, Swiss Leaks, Lux Banca medida”, prossegue. Mas onde há algo a fa-
Leaks ou Luanda Leaks são apenas alguns Telecomunicações zer é na despesa, tornando-a mais transpa-
exemplos que fizeram mossa em socieda- Indústria farmacêutica rente. “Temos de garantir que as despesas do
des de advogados e firmas de auditoria em Indústria extrativa Estado são eficientes e justas. Mas há falta de
Portugal e lá fora. Os sócios da Lobo Vas- (petrolífera e mineira) análise. Há quanto tempo não é produzido e
ques admitem que essa imagem, “embora > NOS PAÍSES AFRICANOS
apresentado um relatório fiscal?”, pergun-
errada”, tem “custos reputacionais para os DE EXPRESSÃO PORTUGUESA, ta ainda. Mas – insistimos – há setores fis-
dois lados”. E, neste como noutros setores, QUEREM PRESTAR CONSULTORIA calmente mais penalizados do que outros?
EM MATÉRIA DE REFORMAS
a reputação é o maior ativo. “Essa é uma das FISCAIS EM ÁREAS COMO:
“Claro que há. O turismo, a energia, a ban-
razões por detrás da configuração do nosso ca…”, respondem, à vez. “Mexer nos impos-
projeto. Sendo pequenos e ágeis, podemos Impostos indiretos tos é sempre uma opção política”, sentencia,
controlar os processos”, considera Sérgio Impostos especiais de consumo (IVA) por seu turno, Sérgio Vasques. São palavras
Vasques. “Não vamos oferecer planeamen- Tributação aduaneira de antigos governantes… E

74 . EXAM E . DEZEM BRO 2020


CONTEÚDO
PUB
PATROCINADO

NUM ANO ATÍPICO A NOSSA RESILIÊNCIA


TEMNOS PERMITIDO CONTINUAR
A RECRUTAR
Num ano em que tudo o ilhas, em parceria com uma
que estava previsto acon- empresa sólida e com vários
tecer teve de ser reajustado anos de experiência.
em função do atual contexto
pandémico, a DS CRÉDITO, Diretamente ligado a uma
especializada na prestação agência, mas que trabalha-
de serviços de intermedia- rá de uma forma autónoma,
ção de crédito e serviços de como se do seu próprio ne-
consultoria relativamente a gócio se tratasse, tem a DS
contratos de crédito, encon- CRÉDITO a figura do Gestor
tra-se a crescer em contra- de Crédito Associado, que terá
ciclo. Para além do aumento a formação necessária para o
da faturação, a DS CRÉDITO desenvolvimento da sua ativi-
tem estado a reforçar a sua dade e contará sempre com o
rede de agências procuran- apoio da agência e do Master.
do novos profissionais que
se queiram juntar à marca, e Lançada em maio de 2017, a
integrar uma rede que conta DS CRÉDITO presta aos seus
já com cerca de 65 agências, clientes um serviço de aconse-
localizadas de norte a sul do lhamento personalizado e gra-
país e ilhas, estando prevista tuito em todo o tipo de opera-
a expansão, a nível nacional, ções de crédito bancário. A DS
com a inauguração de novas CRÉDITO tem como objetivo
agências em breve. aconselhar e apresentar aos
seus clientes, ajustado a cada
De acordo com as previsões uma das realidades apresenta-
da NOVA Information Mana- das, as melhores, as mais van-
gement School (NOVA IMS), tajosas, bem como as mais bai-
da Universidade Nova de Lis- xas prestações mensais para os
boa, 11 concelhos de Portugal seus créditos, que lhes permi-
Continental deverão encerrar tam pagar o mínimo possível,
2020 com uma taxa de de- Marta Almeida, Diretora Coordenadora Nacional DS CRÉDITO obtendo assim a máxima pou-
semprego superior a 20%. Já pança mensal, que se irá tra-
em termos globais, a taxa de duzir numa melhoria da sua
desemprego poderá atingir os A todos os profissionais que ram abraçar um novo proje- qualidade de vida.
10,2% no final do ano. se queiram juntar à DS CRÉ- to profissional, numa área
DITO é garantida a entrada de enorme potencial e tão Atualmente a DS CRÉDITO
No sentido de dar resposta a numa marca já consolidada, necessária junto da popula- conta com uma rede de 65
este flagelo, uma das priori- que proporciona formação e ção em geral. agências e mais de 350 cola-
dades da DS CRÉDITO, para acompanhamento necessário boradores a nível nacional.
além de auxiliar as famílias a aos seus colaboradores, para Podem assim, abrir uma
poupar, é contribuir de forma se lançarem numa carrei- agência DS CRÉDITO e cria- Se quiser fazer parte desta
ativa para a economia local e ra de enorme sucesso. A DS rem o seu próprio negócio na marca, aceda através do site:
para a tão necessária criação CRÉDITO está a dar oportu- área da intermediação de cré- https://www.dscredito.pt/
de postos de trabalho. nidade às pessoas que quei- dito, de norte a sul do país e oportunidades-de-carreira/
Macro PESSOAS

EM TRÂNSITO

MANUEL DIAS JOSÉ ANTÓNIO RAMOS


National Technology Officer CCO da ASOS
da Microsoft Portugal linkedin.com/in/jose-antonio-
linkedin.com/in/mdias/ ramos-031220/
Manuel Dias tem agora a respon- José António Ramos vai deixar a
sabilidade da implementação do presidência-executiva da Salsa,
plano tecnológico e de transfor- no final deste ano, que ocupava
D.R.
mação digital das empresas e desde fevereiro de 2019, e passa a
entidades governamentais. Com assumir o cargo de Chief Comer-
mais de 20 anos de experiência cial Officer da gigante britânica
TA L E N T O E M AÇ ÃO
em tecnologia, iniciou a sua car- ASOS. O gestor espanhol, que

McDonald’s com
reira na EFACEC como engenheiro conta com mais de 20 anos de
de software, passando pela experiência, tinha passado por
OutSystems, onde ocupou vários grupos como Esprit, Carrefour Es-
liderança nacional cargos nas áreas de engenharia,
gestão de produto e pré-venda.
panha e Inditex. A Salsa anunciou
a saída do executivo, agradecendo
Inês Lima substitui Thomas Ko e é a nova Em 2011, integrou a Microsoft o ambicioso plano estratégico
Portugal como Data & AI Specialist que estabeleceu para a marca,
responsável da empresa no País para o mercado empresarial. Em bem como a sua transformação
Texto Margarida Vaqueiro Lopes 2018, assumiu a função de Tech- numa referência mais virada para

I
nical Sales Diretor na Unidade de o digital e com foco na expansão
nês Lima assumiu, a 1 de novembro, o car- Soluções. para novos mercados.
go de diretora-geral da McDonald’s Portugal,
regressando assim ao País onde iniciou a sua
carreira na empresa. Desde 2014 que Inês in-
tegra os quadros da multinacional, na qual co-
meçou como diretora de Marketing e Comunicação. Desde
abril de 2019, desempenhava a função internacional de
Marketing Lead, tendo sido responsável pela estratégia de
marketing de 12 mercados: Rússia, Itália, Espanha, Poló-
ELISABETE FERREIRA PATRÍCIA PIMENTA
nia, Holanda, Áustria, Suíça, Portugal, República Checa, Fundadora e CEO da New Normal Vice-presidente de Home
Ucrânia, Bélgica e Eslováquia. linkedin.com/in/elisabeteferreira/ & Distribution da Schneider Electric
A executiva assume agora a direção-geral da McDo- Tinha assumido, em maio, o cargo linkedin.com/in/pimentapatricia
nald’s Portugal, num mercado que conta, atualmente, com de Chief Growth Officer da WPP, A nova vice-presidente da
179 restaurantes e 41 franquias. Vai assumir uma posição mas sai agora para fundar e liderar divisão de Home & Distribution
que era, desde 2018, ocupada por Thomas Ko – o gestor uma nova agência de soluções em Portugal e Espanha tem
passa a assumir a liderança de 12 mercados asiáticos. integradas de marketing e co- como objetivo desenvolver e
Licenciada em Administração e Gestão de Empresas municação, tecnologia e negócio. consolidar soluções que favore-
Foi assim que a New Normal se çam a sustentabilidade e a casa
pela Universidade Católica Portuguesa, e com um MBA
apresentou ao mercado, no início conectada, duas tendências
pelo INSEAD, Inês Lima conta com um percurso ligado
do mês de novembro, anunciando cada vez mais presentes no se-
ao Marketing, tendo estado mais de uma década na EDP, tor da habitação. Licenciada em
ainda Luís Fernandes e Luís Santos
em que desempenhou diversos cargos, nomeadamente Engenharia Eletrotécnica pelo
como fundadores da organização.
o de diretora de Marketing e Clientes. Passou ainda pela Nuno Lourenço será o diretor cria- Instituto Superior de Engenharia
Oniway – enquanto diretora de Market Insight –, bem tivo. Elisabete Ferreira passou, ao de Coimbra, iniciou a sua carreira
como pelas empresas de grande consumo Reckitt Ben- longo de décadas de carreira, pela na Schneider Electric Portugal
ckiser, Mondelez e Mars. Megamedia, PT, Brandia Central, em 2005, como Product Mana-
Atualmente, é mentora de líderes femininas na Eu- Havas Media e J. Water Thompson. ger de Automação Industrial.
ropean Professional Women’s Network. E

76 . EXAM E . DEZEM BRO 2020


Macro

ECONOM IA

Injeções
de esperança
com doses
de cautela
Resultados preliminares das vacinas da Pfizer/
BioNTech e da Moderna são promissores e foram
considerados uma luz ao fundo do túnel.
Mas ainda há um caminho duro e longo a percorrer
até se encontrar a saída para a crise pandémica
Texto Rui Barroso

78 . EXAM E . DEZEM BRO 2020


A
s injeções de confiança global enfrentar um inverno difícil”, avisa
dos resultados prelimi-
nares das vacinas para a
AS VACINAS a equipa de economistas do banco ING.
Numa nota a investidores, os especialistas
Covid-19 ativaram o oti- NA LISTA DA UE realçam que “a renovação de confinamen-
mismo nos mercados fi- Existem, a nível global, tos por toda a Zona Euro deverá cortar 2%
nanceiros. Os anúncios da Pfizer/BioNTech ao PIB no quarto trimestre e o risco de res-
48 candidatas a vacina em
e da Moderna de que os ensaios clínicos de trições adicionais nos EUA coloca um travão
ensaios clínicos e outras
larga escala das suas vacinas demonstraram considerável à atividade”.
taxas de eficácia acima de 90% levaram a 164 ainda em fase de testes pré- Apesar da reação inicial de euforia nos
subidas expressivas nas bolsas mundiais. -clínicos, segundo a Organização mercados, as contas que os economistas e
O maior efeito foi sentido nos setores que Mundial da Saúde. A Comissão investidores começam a fazer são agora so-
têm sido mais fustigados pelas medidas de Europeia tinha, a meio de bre quanto tempo irá demorar até a vaci-
contenção da pandemia, casos da aviação, novembro, contratos fechados na chegar ao terreno para ser administra-
do turismo, do lazer e das petrolíferas. A com cinco farmacêuticas da num número suficiente de pessoas que
reação dos investidores reflete a convicção e está em conversações permita derrotar a pandemia. E a solução
de que em 2021 o mundo poderá derrotar avançadas com a Moderna está longe de ser instantânea. Anthony Fauci
a pandemia, libertando a economia global alertou recentemente que “a cavalaria está a
do espartilho sufocante em que se encontra. > PFIZER/BIONTECH caminho, mas não se deve pousar as armas
Começa a ver-se a luz ao fundo do túnel, e deixar de lutar porque a ajuda ainda não
como afirmou o CEO da Pfizer e também Estas empresas foram das primeiras a chegou”. Citado pela imprensa americana, o
alguns políticos e analistas. divulgar a eficácia dos ensaios clínicos diretor do Instituto de Alergias e Doenças In-
Os avanços rápidos e com taxas de efi- de larga escala. Os dados preliminares fecciosas dos EUA pediu que se redobrassem
cácia superiores ao esperado ajudam-nos a divulgados a 9 de novembro mostravam os esforços nas medidas de saúde pública.
uma eficácia de mais de 90% da vacina
vislumbrar uma saída desta crise. A Ciên- Assim, para a economia, “a perspetiva
e os resultados finais mostraram uma
cia aparenta estar a conseguir baixar a pro- de vacinas dá alguma luz ao fundo do tú-
eficácia de 95%. A empresa prevê come-
babilidade de novas recaídas durante 2021 çar a distribuir as primeiras vacinas ainda
nel, mas fará muito pouco para ajudar no
provocadas por terceiras e quartas vagas da este ano ou no início de 2021. futuro imediato”, observa David Oxley. O
pandemia. Mas, apesar dos festejos nas bol- economista da consultora Capital Econo-
sas, a confiança injetada pelas vacinas tem > MODERNA mics afirma, num relatório, que “dada a
de ser intercalada com uma boa dose de prevalência atual do vírus e a pressão nos
cautela. Os líderes dos maiores bancos cen- A farmacêutica mostrou também sistemas de saúde, as restrições severas irão
trais do mundo, por exemplo, jogam à defe- dados promissores nos resultados pre- provavelmente continuar no terreno duran-
liminares dos ensaios clínicos de larga
sa. “É demasiado cedo para avaliar com con- te todo o inverno e poderão ficar ainda mais
escala, com uma taxa de eficácia de
fiança as implicações destas notícias para o apertadas”. Realça que, mesmo depois das
95%. A infraestrutura necessária para
rumo da economia, especialmente no curto esta vacina é menos complexa do que
notícias sobre a eficácia da vacina da Pfizer/
prazo”, disse Jerome Powell, o presidente da a da Pfizer/BioNTech. A Moderna prevê BioNTech, o ministro da Economia alemão,
Reserva Federal dos EUA, no Fórum do BCE, distribuir as primeiras doses nos EUA Peter Altmaier, alertou que as medidas de
que se realizou de forma digital. Também a até ao final do ano e estava, no dia de confinamento parcial deverão continuar no
presidente do BCE, Christine Lagarde, con- fecho desta edição, em conversações terreno por quatro a cinco meses. Um for-
siderou que os dados promissores apresen- avançadas com a Comissão Europeia. te indício de que não será fácil nem rápido
tados pelas farmacêuticas não são, para já, derrotar a pandemia e libertar a economia
> ASTRAZENECA
decisivos para as estimativas económicas da E UNIVERSIDADE DE OXFORD
do espartilho em que se encontra. Se a con-
Zona Euro. A vacina até pode estar a avançar tração no quarto trimestre é já um dado ad-
a um ritmo mais rápido do que o anteci- Os responsáveis desta entidade obser- quirido, a probabilidade de que o arranque
pado. Mas os cenários-base dos economis- varam dados promissores na resposta de 2021 seja marcado pela continuação, ou
tas também não incorporavam, regra geral, imunitária das pessoas mais idosas. Os mesmo pelo aumento, dos constrangimen-
uma segunda vaga tão violenta da pandemia resultados finais dos ensaios clínicos tos à atividade económica é cada vez maior.
na Europa e nos EUA que obrigasse a medi- deverão ser revelados antes do Natal.
das de contenção tão severas. SALVAR O VERÃO
> OUTRAS CANDIDATAS
As notícias da vacina são boas, mas pro- Os indícios para os próximos meses não são
vavelmente não serão suficientes para aliviar Entre as candidatas consideradas pela
animadores. O inverno avizinha-se difícil e
as provações que a economia ainda terá de Comissão Europeia estão ainda as longo. Nas últimas semanas, ouvimos mui-
GETTY IMAGES

enfrentar no que falta percorrer até ao final vacinas da CureVac, da Sanofi-GSK e da tas vezes a expressão de se fazer um esforço
do túnel. “Infelizmente, [as vacinas] não al- Janssen Pharmaceutica. Estas farmacêu- para salvar o Natal. Mas, na frente económi-
teram o facto de no curto prazo a economia ticas têm já contratos firmados com a UE. ca, as próximas semanas serão de conten-

DEZEM BRO 2020 . EXAM E . 79


Macro

O AINDA
LONGO CAMINHO
DAS VACINAS
A Pfizer/BioNTech e a Moderna
contam obter autorização para
as suas vacinas ainda este ano,
nos EUA. Na Europa, a luz verde
também poderá estar para breve

> AUTORIZAÇÃO DE USO Mas, como os últimos meses nos ensina-


ram à força, com este vírus não há margem
Após os resultados dos ensaios clínicos para grandes certezas. Além disso, a tarefa
de larga escala a indicarem a eficácia de produzir e distribuir vacinas que abran-
das vacinas, as farmacêuticas que jam uma parte significativa da população
ção de estragos. O foco dos economistas e estão mais avançadas neste processo mundial é hercúlea. Por outro lado, real-
dos investidores está agora sobre se a vacina esperam ter a autorização para utiliza- çam os economistas do ING, “existem ainda
ção de emergência nos EUA ainda este
ajudará a salvar o próximo verão, algo par- questões importantes a envolver as vacinas
ano. Na Europa, a Agência Europeia
ticularmente relevante para países bastante que serão essenciais para as perspetivas eco-
do Medicamento também poderá dar
dependentes do turismo, como é o caso de essa autorização ainda este ano ou no nómicas”. E exemplificam: “Qual será a efi-
Portugal. início de 2021, tendo implementado cácia provada da vacina quando for estendi-
Apesar da velocidade sem precedentes procedimentos para uma aprovação da a toda a população? Qual a proporção da
a que as vacinas passarão dos laboratórios mais rápida. população que será vacinada? Quanto tem-
à distribuição em massa, os especialistas de po demorará a completar a vacinação, dadas
saúde duvidam de que o vírus esteja con- > PRIMEIRAS ADMINISTRAÇÕES as complexidades de transporte e armaze-
trolado antes do final de 2021. O cofunda- namento de algumas vacinas que precisam
A Pfizer e a Moderna conseguirão
dor da BioNTech disse, numa entrevista à de temperaturas abaixo de zero e requerem,
distribuir algumas dezenas de milhões
BBC, que se tudo correr bem, a vacina po- provavelmente, duas doses?” Precisaremos
de doses das vacinas até final do ano,
derá começar a ser distribuída no final deste o que torna possível que existam ainda ainda de perceber durante quanto tempo
ano ou no início de 2021 e chegar à entrega este ano ou logo no início de 2021 dura a imunidade e se a vacina é totalmen-
de 300 milhões de doses até abril. No en- alguns programas-piloto de vacinação te eficaz junto da população mais idosa.
tanto, Ugur Sahin estima que o regresso à (envolvendo profissionais de saúde, por As respostas a estas questões serão essen-
vida normal aconteça apenas no inverno do exemplo). O presidente do Infarmed, ciais para as projeções económicas. A juntar
próximo ano. Isso desde que se atinja uma Rui Ivo, também sinalizou, numa das a isso há ainda a incerteza sobre se haverá a
elevada taxa de vacinação da população até reuniões com responsáveis políticos proporção necessária da população a querer
ao outono. sobre a evolução da pandemia no País, ser vacinada. Uma sondagem divulgada em
O mais provável é que a Covid-19 con- que as primeiras vacinas podem chegar setembro pela Ipsos e pelo Fórum Económico
a Portugal em janeiro.
tinue a condicionar as nossas vidas no ve- Mundial, que abrangeu 20 mil pessoas de 27
rão do próximo ano. Mas existe a esperança > DISTRIBUIÇÃO EM MASSA países, mostrava que 26% dos inquiridos di-
de que as temperaturas mais altas, aliadas ziam não ter intenção de levar a vacina, pro-
à primeira ronda de vacinação dirigida aos O grande desafio será a vacinação porção que os especialistas dizem que pode
mais vulneráveis, possam levar o vírus a dar em massa da população, sendo que comprometer a eficácia desta arma. Em paí-
uma trégua que ajude a diminuir as limi- algumas das vacinas envolvem a admi- ses como Rússia, Polónia, França e Hungria,
tações necessárias para retirar pressão aos nistração de duas doses. O cofundador mais de 40% dos questionados disseram que
serviços de saúde. “Pensamos que o mais da BioNTech salientou que é essencial não pretendiam ser vacinados.
provável é que os Governos possam começar que a vacinação da população esteja Os anúncios da Pfizer/BioNTech e da
concluída o mais tardar até ao próximo
a levantar a maioria das restrições que estão Moderna até podem ter ajudado a vislum-
outono, de forma a podermos regres-
atualmente em vigor durante o segundo tri- brar a luz ao fundo do túnel, algo que, dada
sar ao normal no inverno do próximo
mestre do próximo ano – bastante antes de ano. Em Portugal, caso as vacinas em a situação, é muito valioso. Mas, infelizmen-
a vacinação a toda a população estar com- fase mais avançada consigam aprova- te, não dissiparam os indícios de que ainda
pleta – e que todas as limitações significati- ção, o objetivo é “ter um número muito existe um caminho escuro e cheio de obstá-
vas sejam retiradas até ao quarto trimestre”, significativo de pessoas abrangidas” no culos a percorrer até encontrarmos a saída
indica David Oaxley. início do verão, indicou Rui Ivo. desta crise. E

80 . EXAM E . DEZEM BRO 2020


Macro

TENDÊNCIAS

“Sou muito
boa só a fazer
o que interessa”
Marian Salzman é uma das mais respeitadas especialistas
em comunicação do mundo. Vice-presidente da Philip
Morris International, anti-tabaco convicta, falou à EXAME
de tendências, de gestão de tempo e de como decidiu
trocar a publicidade pelo meio corporativo
Texto Margarida Vaqueiro Lopes Fotos Jagoda Wisniewska

Q
uando abrimos o rela- político admirável.” Na mesma ocasião,
tório Trends for 2020, Marian partilhou em primeira mão com
publicado por Marian a EXAME aquelas que acredita que vão ser
Salzman no final do ano as tendências para o próximo ano (ver pá-
passado, não queríamos gina seguinte), fazendo questão de realçar
acreditar no título: Caos: o novo normal. que tinham sido todas definidas antes de
Dito assim parece quase futurologia, mas se saber quem iria ocupar a Casa Branca
a executiva garante que não tem qualquer nos próximos quatro anos. Mas, assumin-
bola de cristal. “Achei que 2020 ia ser um do-se uma trendsetter, pedimos-lhe que
ano de realinhamento político e emocio- fizesse o seu prognóstico: a vitória seria
nal. Não previ, naturalmente, que ia haver de Joe Biden, garantiu.
um vírus que vinha da China para todo o
mundo. Lembro-me, aliás, de estar num MUDAR A PERSPETIVA
jantar aqui na Suíça, com um colega chi- Salzman trabalhou, durante mais de duas
nês, em fevereiro, e perguntar-lhe o que décadas, em algumas das maiores agências
estava a acontecer”, começa por contar de publicidade do mundo. Há cerca de dois
à EXAME, numa conversa descontraída anos trocou o universo criativo pelo grupo
desde o escritório em Lausanne. Falámos Philip Morris (PMI), depois de nove meses
com a vice-presidente da Philip Morris de conversações e de muitas dúvidas sobre
International com o pelouro da comuni- se devia comunicar uma tabaqueira, depois
cação, dois dias depois das eleições nos de o pai ter falecido de cancro do pulmão
EUA, quando ainda não havia resultados. e de ela própria já ter lutado mais do que
Norte-americana com residência no Ari- uma vez contra doenças do foro oncológico.
zona, garantiu-nos que o tradicional esta- Pensar nesta mudança “foi uma viagem
do republicano iria virar democrata nes- de ceticismo”, admite. “O meu marido é de
tas eleições, sobretudo por duas razões: Direito e é especialista em Direitos Huma-
“Primeiro porque, para nós, a questão nos. Achei que ele ia ser completamente
das fronteiras não faz sentido algum. O contra isto. Mas quando lhe contei que me
México está a 20 km de minha casa. São tinham contactado, e que ia indicar outra
nossos vizinhos, não são nossos inimigos. pessoa para o cargo, o que ele me respondeu
Nós crescemos com aquelas pessoas, fa- foi: ‘Por que razão vais fazer isso? Imagina
zem parte da nossa vida e da nossa eco- o que era poderes mudar o apartheid por
nomia. E, depois, [o republicano] John dentro.’ No fundo é uma questão de pers-
McCain foi um apoiante de Obama e de petiva, da forma como se olha para a ques-
Biden. E nós respeitamo-lo demasiado”, tão. ‘Imagina a diferença que podes fazer, se
atirou com um sorriso. “Era realmente um tiveres o poder desta empresa… farás muito

8 2 . EXAM E . DEZEM BRO 2020


mais lá dentro do que apenas a não deixar
as pessoas fumar na tua casa’”, conta diver-
tida. “Eu era efetivamente uma idiota. Uma
anti-smoking vigilante, que nem deixava
o jardineiro fumar se estivesse no meu jar-
dim!”, diz com um sorriso.
Os ecrãs, na Mas então, o que faz uma executiva de
verdade, criaram sucesso, completamente antifumo, juntar-
-se à principal empresa tabaqueira do mun-
uma barreira na do? Primeiro, explica, a ética que encontrou
comunicação. dentro da organização. Os valores, o com-
Escondemo-nos promisso e o ambiente, refere. “As agências
de publicidade são lugares muito diverti-
atrás deles” dos para se trabalhar. Mas a PMI é um lugar
maravilhoso. Não estava à espera. E estou
muito feliz por me ter juntado à PMI, e por
o ter feito quando tinha idade para o fazer.
As energias negativas já não me afetam, o
que as pessoas dizem não me afeta… Ga-
nhei calo, no fundo”, conta, antes de reve-
lar que vários amigos a questionaram bas-
tante por ter tomado esta decisão. Trabalhar
numa empresa que promove produtos que
são um risco para a saúde com o seu histo-
rial não lhes fazia sentido. Mas, defende, a
empresa está comprometida em “tornar o
mundo um lugar melhor”, garante. Esse foi,
aliás, um dos tópicos que a levaram a demo-
rar tanto tempo a tomar a decisão. Queria
ter a certeza de que o compromisso de que
lhe falavam era real e seria consequente no
marketing da PMI. “A nossa campanha atual
é mesmo para retirar o fumo do mundo.
Temos três frases-chave: se não fuma, não
comece; se fuma, desista e se não desistir,
mude. Os cigarros não são bons para nós,
certo? E temos de continuar a testar os valo-
res da companhia. A empresa vai estar fora
do negócio do tabaco de combustão num
futuro relativamente próximo. E vai subs-
tituir isso por produtos que são melhores
para a sociedade. E eu acredito nisso”, re-
sume. “Sinto uma enorme responsabilida-
de, como sentia na publicidade, aliás, por
ser uma mulher num cargo sénior de ges-
tão, em fazer a nossa mensagem chegar”,
afirma, como que a comprovar o seu grau
de exigência com a própria missão. “O que
faço aqui é muito diferente de vender ou de
promover outro tipo de produtos. Estamos
a falar de transformar técnicas de marke-
ting, de alterar comportamentos, de criar
novos quadros regulatórios para que possa-
mos apresentar novos produtos ao merca-
do, que sejam bons para o mundo”, conclui.

DEZEM BRO 2020 . EXAM E . 83


Macro

TENDÊNCIAS PARA 2021


Marian Salzman terminou o seu relatório para
o próximo ano em vésperas das eleições norte-americanas
e partilhou-o em primeira mão com a EXAME

> “ZOOM IN” nem nunca as pessoas se no próximo ano, com


NAS PESSOAS sentiram tão conscientes muita gente e defender
do seu cansaço digital. um repensar do atual sis-
Mais atenção ao próximo, Marian acredita que os tema económico e social.
foco nos negócios locais e ecrãs vão perder espaço
nas nossas necessidades durante o próximo ano, e > NOVAS PARCERIAS
pessoais. Marian acredita que as pessoas voltarão a
que a pandemia vai fazer sentir-se mais conecta- A corrida às vacinas con-
com que parte das pesso- das com a realidade. tra a Covid-19 mostrou
as se reconectem com os que público e privado fun-
valores essenciais e que > HELLO, ROBÔS cionam bem juntos e mais
vamos ter um olhar mais parcerias são precisas. As
atento a quem precisa Drones, robôs, motoristas empresas vão tornar-se,
de nós. virtuais: tudo tendências mais do que os Estados,
que terão vindo para ficar, verdadeiros agentes de
> O QUE SÃO O TEMPO numa altura em que se mudança
E O ESPAÇO? acelerou significativa-
mente o processo de > DIFERENTE
A especialista acredita entregar à robótica as URBANIZAÇÃO
que vamos ser mais flexí- funções mais mecânicas
veis na gestão de tempo da nossa realidade. Até Para quem tem traba-
e espaço. É possível que já existem robôs sub- lhado em casa, esta
a semana de quatro dias -chefs... começou a ser olhada de
tenha mesmo vindo para outra forma. É muito pos-
ficar e que os horários de > READY FOR THE FIGHT sível que as cidades se
trabalho passem a ser tornem mais pequenas,
PREVER O CAOS
geridos individualmente, Despensas mais cheias, que o campo volte a ser
quando é possível. prédios e condomíni- valorizado, e que as casas
No meio de dias agitados, em que se divide
os com zonas comuns confortáveis passem a ser – agora mais virtualmente – entre a Euro-
> ADEUS, NARCISISMO de depósito, espaços mais importantes do que pa e os EUA, Marian Salzman decidiu ain-
reservados para guardar a manutenção do statu da voltar a estudar, além de se dedicar aos
A pandemia trouxe-nos todos os mantimentos social. O imobiliário vai seus relatórios de tendências e livros sobre
menos selfies e mais que sejam necessários em mudar. liderança. Para 2020, além de apontar para
fotografias de videocha- caso de “guerra”. O estado um cenário caótico e de um novo normal, a
madas em grupo, o que de alerta vai permanecer > PAZ EM TEMPOS
DE INCERTEZA
executiva elencou ainda uma série de outras
pode refletir-se também connosco. E podem até tendências que se provaram certas: o regres-
na nossa consciência de surgir serviços de concier-
que somos uma comu- Nunca vivemos com tanta so a uma vida no campo, maior atenção ao
ge aplicados à saúde.
nidade e precisamos uns incerteza no horizonte: ambiente, a aceleração da robótica, os mais
dos outros para lutar por > REDEFINIR isso poderá levar-nos a jovens a terem mais voz, e uma das que nos
um futuro comum. O ESSENCIAL fazer investimentos mais surpreenderam mais pela sua precisão, um
seguros, alocar mais a “desespero por toque”.
> REAL OU DIGITAL? A ideia de um Rendimen- saúde e educação, sim- Mas, se não tem uma bola de cristal,
to Básico Incondicional plificar o estilo de vida. No como é que Marian chega a estes resulta-
Nunca se venderam nunca esteve tanto na fundo, procurar um clima
dos que, ao longo dos anos, se têm mostrado
tantos “detox packs” agenda. Poderá ser uma de paz e de serenidade
tão certeiros? “Vem tudo dos números”, re-
para férias em família, das ideias que vão crescer para sobreviver ao caos.
sume. “Eu estudo muito estatísticas, no que
toca a atitudes humanas. No fundo, procu-

8 4 . EXAM E . DEZEM BRO 2020


ficiente, ter um estilo de vida saudável e ter
hobbies são tudo coisas muito importantes”,
avisa. E sobre como consegue ter tempo para
gerir tudo, com um nível de sucesso tão ele-
vado, é bastante assertiva: “Só não se pode
fazer tudo de uma vez, nem sozinha. Nunca
poderia ter aceitado este trabalho se tivesse
crianças em casa, ainda. Não acredito, aliás,
que o tivesse aceitado se as crianças [os en-
teados] ainda estivessem em idade escolar.”
Mas o grande segredo, admite, está em
ser “muito boa só a fazer o que interessa. Por
exemplo, interessou-me sempre que a nossa
família jantasse junta todos os dias. Não me
interessa quem cozinha esse jantar. Duran-
te anos tivemos uma incrível empregada, e
eu nunca sabia o que ia comer quando me
sentava à mesa… Há 20 anos que eu não me
preocupo com nada em casa, porque há
uma outra pessoa, que é bem paga, a pro-
pósito [risos], que trata de tudo. Portanto,
fazíamos questão de pelo menos um de nós
estar à mesa com as crianças para jantar. E
acho importante que haja sempre comida no
frigorífico. Acho superimportante ter toma-
do atenção ao seu percurso escolar. Mas, por
outro lado, não vi filmes durante uns cinco
anos, porque para mim não era importan-
te ir ao cinema. Era importante, porém, ter
sempre alunos de intercâmbio em casa no
verão, porque cresci como uma pessoa glo-
bal. E gostava de me levantar as 5h da manhã
para lhes preparar sanduíches, porque era
uma memória que eu tinha”, conta. Uma
ro padrões, olho para o que está na agenda em formato digital, permite-me olhar de das coisas que foi aprendendo com os anos
do dia e muito para aquilo a que as pessoas uma forma muito aberta. É como se fosse – e que, admite, tem estado a tentar traba-
aspiram – e aquilo a que as pessoas aspi- um puzzle que eu estou a montar”, explica. lhar – é que o seu “ nível de intensidade é
ram odiar. A título de exemplo, acredito que É depois de juntar todas as peças e de lhes muito mais elevado do que o do resto da fa-
Trump foi eleito porque as pessoas aspiram dar sentido na sua cabeça, que olha para o mília”, conta com uma gargalhada. “Eu sou
a ser uma estrela de televisão. Não é por- futuro e tenta antecipar comportamentos e muito focada. O meu marido é muito mais
que ele era um pai de família ou um políti- preocupações. intelectual e, por exemplo, às vezes ligo-lhe
co ótimo. Os eleitores viam-no de uma for- daqui e ele diz-me que está a pescar. Eu não
ma diferente. Como sou uma pessoa global, “YOU CAN DO IT ALL... consigo dizer-lhe como isso me irrita! E eu
olho para o que aconteceu no ano anterior, ONE THING AT A TIME” devia ficar contente por ele estar a pescar,
considerei estas questões populistas todas Este ano, por exemplo, teve ainda mais tem- mas irrito-me por ele estar ali todo descon-
que estão a acontecer em redor no mundo... po para pensar, uma vez que ficou várias traído”, confessa divertida. Mas, acima de
Depois estudo os média, leio imensa litera- semanas confinada em casa. Foi também tudo, remata, “sei aquilo em que não sou
tura académica e popular, ou informativa. quando sentiu vontade de recomeçar a es- boa”. E é essa lição que gosta de levar tanto
E todos os dias tento ler jornais de diferen- tudar. “Já viu o que é poder estar aqui a fazer para casa como para o seu escritório, onde
tes espectros políticos. Garantidamente, vou um mestrado numa boa universidade norte- hoje estão menos pessoas, por conta da pan-
passar os olhos pelo New York Post, que é -americana? Através da internet? Não posso demia, mas de onde as acompanha para ter
de direita, pelo Daily Mail, que é middle perder a oportunidade”, diz entre uma pi- a certeza de que todas estão a atravessar este
England, e claro, leio o New York Times, o poca e um sorriso descontraído. E, no meio período com a maior paz possível. Uma das
Washington Post e tento ler alguns jornais de tudo isto, Marian garante que dorme pelo tendências para 2021, aliás. Paz em temos
australianos. E porque tudo está disponível menos seis horas por noite. “Dormir o su- incertos. E

DEZEM BRO 2020 . EXAM E . 85


Opinião
POR
FERNANDO CARDOSO
DE SOUSA

A organização
“pós-pandemia”
O novo modelo, acelerado pelas circunstâncias
que vivemos, deve ser assente em equipas
multidisciplinares, ágeis e com um carácter cada
vez mais colaborativo, à volta de projetos com > Presidente da direção
resultados mensuráveis da Associação Portuguesa
de Criatividade e Inovação
– APGICO

U
m dos impe- tos de I&D. No entanto, em ge- necessário ao trabalho adi-
rativos deter- ral, trata-se de projetos limita- cional dos projetos, é preciso
minados pela dos a alguns colaboradores ou que o desempenho funcional
Covid-19 foi a restritos às áreas de engenha- e de projeto sejam integrados
necessidade ria. Quanto à sua origem, são, na avaliação do desempenho e
de adaptação rápida a novos normalmente, projetos orga- na retribuição salarial do cola-
problemas, cuja resolução, em nizados como resposta a so- borador. Se isso não acontecer,
muitos casos, não pôde ficar licitações de clientes que não a mensagem que é transmitida
circunscrita à equipa de ges- visam a inovação, sem prejuí- Pode ser é a de que o trabalho de pro-
tão nem a um departamento zo da ocorrência esporádica conveniente jeto não é importante, com as
específico da empresa. Assim, de projetos inovadores, dita- a utilização consequências inerentes.
a organização “pós-pandemia” dos pela gestão ou por algu- É este enquadramento de
vem reforçar a conveniência da ma ideia entretanto apurada de uma equipas multidisciplinares,
constituição de equipas multi- no sistema interno de suges- estrutura utilizando processos ágeis de
funcionais, cumprindo objeti- tões. O que se propõe, aqui, matricial, obtenção de resultados e ado-
vos mensuráveis e estabelecen- é a utilização de um processo tando uma cultura colabora-
do processos que permitam à que permita a produção con- simultanea- tiva, que permitirá ao sistema
organização movimentar-se tínua de projetos de inovação mente por mover-se mais rapidamente,
mais rapidamente. Para isso a partir de fóruns empresariais funções e por num ambiente cujo grau de
pode ser conveniente a utiliza- (organização de stakeholders incerteza aumentou consi-
ção de uma estrutura matricial, para um dado objetivo de ino- projetos, que deravelmente em virtude da
simultaneamente por funções vação, definido pela gestão), alie a tecnologia pandemia. Poderemos, des-
e por projetos, que alie a tecno- em que os colaboradores de- e o talento em ta forma, reinventar a forma
logia e o talento em novas for- cidem sobre os projetos em como nos organizamos e con-
mas colaborativas, geradoras que pretendem trabalhar, as novas formas seguimos que o trabalho seja
de projetos inovadores. equipas que querem integrar colaborativas, feito. A empresa veloz pode
Atualmente, é difícil en- e, eventualmente, os gestores geradoras aqui encontrar, também, um
contrar uma empresa que de projeto que querem ter. propósito mais elevado e uma
não tenha projetos a decorrer, E para que ocorra o au- de projetos saúde organizacional melho-
mesmo fora dos departamen- mento do comprometimento inovadores rada. E

86 . EXAM E . DEZEM BRO 2020


Opinião
POR
SOUMODIP SARKAR

Da crise
de saúde pública
à crise económica
O impacto nas PME e as medidas de apoio > Professor catedrático,
implementadas, em Portugal e lá fora Universidade de Évora

H
á cerca de não deveremos olhar mais (e A incerteza do futuro e a di- As medidas implementa-
nove me- melhor) para essas? mensão do impacto desta crise das em todo o mundo vão des-
ses, fomos Segundo alguns estudos, impõem uma atitude activa por de o suporte do Estado aos pa-
aterroriza- as PME são as empresas mais parte dos governos de todo o gamentos dos salários (layoff),
dos pela Co- afectadas pela crise económi- mundo. O Governo português ao diferimento de impostos
vid-19, pelo medo de contra- ca que vivemos, uma vez que tem, desde o primeiro minu- e contribuições, às moratóri-
ir o SARS-CoV-2. Hoje, com o não só têm um acesso mais to e muito regularmente, im- as no pagamento de dívidas, à
passar do tempo, o medo dei- limitado aos recursos como plementado medidas de apoio simplificação das garantias dos
xou de ser apenas esse. O medo também têm mais obstáculos às empresas. Mas serão essas empréstimos, à intensificação
multiplicou-se. Multiplicou-se no acesso ao capital. medidas um real apoio para as dos empréstimos directos por
do medo de ser despedido até O Facebook, em parceria empresas? Haverá outras me- meio de instituições públicas,
ao medo de despedir. Depois com a OCDE e o Banco Mundi- didas que podiam ou poderão aos subsídios e subvenções, até
da saúde, a economia foi a mai- al, lançou em Julho deste ano ser implementadas? O que an- às políticas estruturais de apoio
or vítima deste vírus. um relatório – Global State of dam a fazer os outros países? e incentivo à digitalização. A re-
O Produto Interno Bruto Small Business – sobre o im- Entre as primeiras (e prin- corrência dos governos a estas
(PIB) português teve uma que- pacto da Covid-19 nas PME, cipais) medidas tomadas pelo medidas foi intensiva e massiva
bra de 16,4% no 2º trimestre do em que Portugal se destaca, Governo português encontra- em todo o mundo.
ano, relativamente ao mesmo entre os 50 países inquiridos, mos a criação de uma linha O que andam os outros a
período do ano anterior. Foram com uma quebra de vendas na de crédito para as empresas, a fazer de diferente? Realço al-
registadas 3 145 insolvências ordem dos 70 por cento. 23% moratória de capital e de juros gumas das medidas mais im-
nos primeiros sete meses do das PME portuguesas referem à banca e o diferimento de im- pactantes tomadas por alguns
ano. No 3º trimestre, segundo que foram obrigadas a reduzir postos e contribuições. países. A exportação foi um
o Instituto Nacional de Estatís- o número de colaboradores e dos principais focos das medi-
tica (INE), registou-se uma re- 36% que o valor em caixa será Segundo alguns das de vários países, com, por
cuperação de 13,2% em relação um dos maiores problemas exemplo, a Coreia a alocar 24,6
ao trimestre anterior. Contudo, que enfrentarão brevemente. estudos, as PME mil milhões de dólares para ga-
esta “recuperação”, que ocorreu Os países onde a digitalização são as empresas rantir a exportação, 4,5 mil mi-
pela reabertura progressiva da das empresas já é algo conso- mais afectadas lhões de dólares para financiar
actividade económica, corres- lidado apresentaram melhores novo comércio e 820 milhões
ponde, na realidade, a uma re- resultados. Este relatório per- pela crise de dólares para liquidez de
dução homóloga de 5,8 por cen- mitiu ainda identificar os sec- económica que emergência.
to. O caminho ainda é longo… tores mais afectados. vivemos, uma Em Hong Kong, os impos-
Uma das principais preo- O Banco de Portugal, em tos sobre o lucro foram reduzi-
cupações do Governo foram as parceria com o INE, desenvol- vez que não só dos em 100 por cento. A Noru-
empresas. Em primeiro lugar veu um estudo longitudinal – têm um acesso ega reduziu temporariamente
(e principalmente), as gran- Inquérito Rápido e Excepci- mais limitado o IVA de 12% para 8 por cento.
des. Estas empresas têm um onal às Empresas – Covid-19 No Reino Unido, as pequenas
impacto colateral muito gran- – de acompanhamento do im- aos recursos empresas vêem os seus impos-
de – são too big to fail. No en- pacto da pandemia nas em- como também tos totalmente isentos durante
tanto, devemos ter em atenção presas portuguesas, no qual têm mais este ano.
que 99,9% das empresas por- foi também avaliado o impac- A Alemanha disponibili-
tuguesas são Pequenas e Mé- to da implementação das me- obstáculos no zou um fundo de dez mil mi-
dias Empresas (PME). Então, didas tomadas pelo Governo. acesso ao capital lhões de euros para comprar

88 . EXAM E . DEZEM BRO 2020


GETTY IMAGES
participações em PME em di- das implementadas por Por- deixar (e voltamos às gran- nas linhas de crédito, corres-
ficuldades. tugal suficientes? As linhas de des empresas!) os bancos fa- pondendo a 20% dessas e sen-
A França ofereceu 1 500 crédito cedidas, embora resol- lharem está relacionado com do apenas concretizado se, no
euros, no mês de Março, a to- vam a curto prazo alguns pro- o número de empregos que ano de 2021, houver manuten-
das as pequenas e microem- blemas, podem trazer outros estão em jogo. Voltamos aos ção dos postos de trabalho.
presas que tiveram de fechar maiores a longo prazo. Mas 99,9 por cento. Deveria pesar Começamos a dar os pri-
por ordem do Governo. não longo o suficiente para na consciência como pesa na meiros passos.
Na Dinamarca, as empre- acompanhar a renovação da economia. A relutância que o Esta-
sas que se viram obrigadas a economia. Que medidas po- Felizmente, parece que do tem tido em apoiar as em-
despedir 30% dos funcionários deriam ser mais benéficas? temos novas medidas. Já este presas nas quais tudo se está
(ou mais de 50 funcionários) Será que a introdução de li- mês, fiquei muito agradado a desmoronar é totalmente
receberam uma compensação quidez não seria uma opção com a notícia do lançamen- contraditória em relação aos
do Governo de 75% do total das mais benéfica? A relutância to de um Programa de Apoio esforços tidos (depois!!) para
despesas salariais desses fun- do Estado em apoiar, nestas à Produção Nacional no valor recuperar.
cionários, por forma a garan- alturas em que está tudo a de 100 milhões de euros para Por vezes, basta pensar
tir a sua permanência na em- cair, é totalmente contraditó- co-financiar projectos de mi- em estratégias… Estratégi-
presa. ria em relação aos esforços ti- cro e pequenas empresas. Ou- as simples, bem ponderadas,
Este apoio dos governos foi dos (depois!!) para recuperar tra medida também anuncia- mas que podem salvar. Pode-
e continua a ser essencial para com recursos os poucos des- da foi a criação de novas linhas mos dar o exemplo do maior
que as empresas consigam (de troços que restaram. É menor de crédito e subsídios a fundo devedor, o Estado. Se o Esta-
alguma forma) superar este o custo para não deixar cair do perdido para apoiar as empre- do pagasse as suas dívidas em
período que atravessamos e que o custo de levantar tudo sas mais castigadas pela pan- três dias, ao invés de três me-
que está para durar (pelo me- do chão. demia. No entanto, é impor- ses, injectaria assim liquidez
nos, seguramente, em termos Um argumento muito tante realçar que a parte do de que as empresas tanto pre-
económicos). Serão as medi- usado (em Portugal) para não “fundo perdido” está inserida cisam. Por exemplo. E

DEZEM BRO 2020 . EXAM E . 89


Exit
EXAME

LAZER . CONSUMO

THAT CHRISTMAS FEELING


Apesar de todas as incertezas, há algo que ninguém nos tira: o facto de o Natal estar mesmo a chegar
e continuar a ser motivo de celebração. E se este ano formos obrigados a passá-lo mais separados de
quem mais gostamos, porque não fazermo-nos presentes com algumas ofertas especiais? A EXAME fez
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9 0 . EXAM E . DEZEM BRO 2020


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DEZEM BRO 2020 . EXAM E . 91


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MASSIMO SENATORE /Diretor-geral da BMW Portugal

“Vamos lançar
25 carros elétricos
até 2023”
Os veículos eletrificados já representam 26% das vendas
da BMW em Portugal. À EXAME, o diretor-geral da marca bávara
revela que, em 2022, será lançado o primeiro veículo a hidrogénio
Texto Paulo M. Santos

A
marca alemã quer lançar sistemas de condução elétrica com células
nos próximos três anos de combustível de hidrogénio com o BMW
25 modelos eletrificados, i Hydrogen NEXT – em pequenas séries de
entre os quais o primeiro veículos, baseada no atual BMW X5.
veículo da BMW movido a
hidrogénio. Com a exceção do iX3, que che- Qual o investimento previsto para executar
ga ao mercado já no início do próximo ano, esse plano?
todos os outros terão um sistema operativo No que diz respeito a investigação e desen-
totalmente desenvolvido em Portugal pela volvimento, até 2025, vamos investir mais
Critical TechWorks, a joint venture criada de 30 mil milhões de euros nesta área, para
entre a BMW e a Critical Software. assegurar a nossa posição de liderança.
Em entrevista à EXAME, o diretor-geral Esta estratégia materializa-se no facto de
da marca bávara, Massimo Senatore, revela fazermos apostas concretas de investimen-
que o Grupo BMW está a investir 30 mil mi- to em tecnologia, como é o caso da nossa
lhões de euros em investigação e desenvolvi- joint venture nacional, a Critical TechWorks,
mento, só para criar soluções para esta nova que está a desenvolver – em exclusivo para
mobilidade. Na sua opinião, os portugueses a BMW – tecnologia e software com foco
estão muito recetivos a estas inovações, mas na mobilidade, condução autónoma, sof-
considera que as medidas de apoio à aqui- tware de bordo, tecnologia para veículos
sição destes veículos “estão dirigidas para conectados, análise de dados, eletrificação,
as empresas” e menos para os clientes par- produção e logística. Perto de mil talentos
ticulares. portugueses estão a trabalhar, em Lisboa e serviço que permite a ativação automática
no Porto, numa conciliação entre condu- para o modo totalmente elétrico quando o
A BMW está a fazer uma forte aposta na ção autónoma, mobilidade elétrica e conec- veículo entra em zonas de baixa emissão ou
eletrificação dos seus veículos. O que pode- tividade. Já concretizámos essa visão com o zero emissões, uma realidade já presente em
mos esperar, em termos de novos produtos protótipo que apresentámos recentemente, mais de seis países.
em Portugal, nos próximos anos? o BMW Concept i4, que ilustra como a tec- No final de 2021, lançaremos também
Há sete anos, lançámos o nosso primeiro nologia pode ser aproveitada para aumentar o novo BMW iX, que foi apresentado na se-
veículo 100% elétrico, o BMW i3, e temos o prazer da condução. mana passada no evento #NEXTGen 2020, e
feito, desde então, um grande investimento que reúne os mais recentes desenvolvimen-
em mobilidade elétrica. Este ano, apesar da A estratégia contempla também uma gran- tos da marca nas áreas de inovação estratégi-
pandemia, lançámos 12 modelos híbridos e de inovação em termos de impacto ambi- ca de design, condução autónoma, conecti-
ainda o novo Mini elétrico. Para os próximos ental? vidade e eletrificação. Além disso, o conceito
anos, mais especificamente até ao final de Com o objetivo de diminuir os níveis de do veículo e o design do novo modelo estão
2023, temos como objetivo lançar no mer- emissões poluentes dos automóveis dentro altamente conectados com uma abordagem
cado 25 modelos eletrificados e, já em 2022, das áreas urbanas, prevemos ainda alargar, abrangente de sustentabilidade. Em suma,
planeamos apresentar a próxima geração de já em 2021, o BMW eDriveZones, um novo estamos focados em criar medidas e solu-

9 2 . EXAM E . DEZEM BRO 2020


ções que possam contribuir para uma maior Porém, são inúmeras as variáveis a ter
rapidez na concretização dos nossos obje- em conta nesta fase, mas o tema da susten-
tivos, construindo um futuro mais verde e tabilidade irá manter-se sempre no topo das
ecológico. nossas prioridades. O mercado de veículos
eletrificados teve uma quebra inferior ao do
Qual o peso que os veículos eletrificados mercado global nos últimos meses, e isto é
têm nas vendas do Grupo BMW em Portu- um sinal de que os clientes procuram cada
gal? E, já agora, qual a percentagem de hí- vez mais este tipo de solução.
bridos e de 100% elétricos nessa equação?
Neste momento, estamos a atravessar um O mercado português está a ser recetivo a
período de vendas globalmente desafiante. esta mudança?
No entanto, as vendas dos veículos eletrifi- Sim, sem dúvida. Acreditamos que Portugal
cados continuam a aumentar progressiva- está no caminho certo, sendo um país rece-
mente, à semelhança do ano passado. No tivo à mudança, que começa já a ter altera-
final de 2019, as vendas dos veículos eletri- ções de comportamentos e mentalidades. É
ficados representavam 18% das vendas totais visível o compromisso cada vez maior dos
da BMW, num total de 2 507 unidades. Este portugueses com a sustentabilidade, com-
resultado permitiu que atingíssemos a lide- preendendo o problema que se está a criar
rança de vendas de veículos eletrificados, ao próprio planeta, se não mudarmos os
ao nível nacional, no segmento premium. nossos hábitos.
Nos primeiros dez meses deste ano, a Portugal ultrapassou recentemente os
BMW vendeu, em Portugal, 8 331 veículos, 10% de quota de veículos eletrificados no
dos quais 2 185 são eletrificados, o que re- total de veículos vendidos, o que significa
presenta uma quota de 26% do total das ven- que um em cada dez veículos vendidos em
das da marca. As vendas dos PHEV [híbridos Portugal é eletrificado (100% elétrico ou hí-
plug-in] têm tido um aumento constante brido plug-in). É um claro sinal de que as
nas vendas totais do grupo em Portugal: pessoas estão realmente a mudar os seus há-
ao longo deste ano, a BMW já vendeu 1 997 bitos e de que esta mentalidade está a afetar
veículos híbridos plug-in, o que represen- a forma como consomem e se movem.
ta 24% do total das vendas globais. Duran- A mobilidade elétrica é uma realidade.
te este período, a marca vendeu ainda 188 Veja o caso de Lisboa: a CML assinou inúme-
veículos 100% elétricos, o que representa, ros acordos, alguns dos quais a BMW é subs-
atualmente, 2% do total das vendas globais critora, como o Pacto de Mobilidade para a
da marca, em Portugal. Cidade de Lisboa, com o objetivo de apoiar a
Em relação à Mini, foram vendidos 1 494 câmara nos seus objetivos de tornar a capital
veículos nos primeiros dez meses do ano, numa cidade neutra em carbono até 2050.
dos quais 257 híbridos e 185 elétricos. Nesse sentido, a população portuguesa está
D.R.

cada vez mais voltada para temas que estão


Sendo este um plano a dez anos, qual o na ordem do dia, como a sustentabilidade e
crescimento esperado das vendas deste a preocupação com o meio ambiente.
tipo de veículos?
As incertezas face à evolução da crise que E em termos legislativos, na sua opinião, o
atravessamos e a situação atual do merca- que poderia ser feito para dinamizar ain-
Em 2022, planeamos do dificultam bastante a previsão do nosso da mais esta transição entre os motores de
desempenho comercial para os próximos combustão e os elétricos?
apresentar a próxima anos. No entanto, acreditamos que, até ao Apesar de, em Portugal, a quota de mer-
geração de sistemas final do ano, os veículos eletrificados repre- cado de veículos eletrificados ter vindo a
de condução sentarão cerca de 30% do total das vendas aumentar de modo exponencial, graças ao
BMW. Para 2021, prevemos que esta tendên- chamado “incentivo verde”, é importante
elétrica com células cia de crescimento se mantenha e este valor criar mais incentivos para que a população
de combustível aumente para 38 por cento. Já em relação à possa aderir, de forma massiva, à mobilida-
de hidrogénio Mini, em 2020, as vendas de veículos eletri-
ficados irão representar cerca de 30% e, em
de elétrica. Em Portugal, a maior parte das
medidas de incentivo à utilização de veícu-
2021, estimamos que este valor seja cerca de los elétricos é dirigido às empresas. Acre-
40 por cento. ditamos que essas medidas deveriam ser

DEZEM BRO 2020 . EXAM E . 93


Exit

alargadas aos clientes particulares, que es-


tão atentos e disponíveis para esta mudança
de paradigma, pelo que devem ser objeto de
um eventual reforço de incentivos à compra
de veículos eletrificados. Além disso, como
o custo de produção de automóveis eletri-
ficados é muito superior ao das motoriza-
ções “clássicas”, os apoios governamentais
podem ser decisivos para que os fabricantes
consigam suportar a sua massificação. E, fi-
nalmente, é importante conseguir atrair as

D.R.
pessoas, visto que são elas o nosso princi-
pal foco de interesse. É essencial informar,
comunicar, partilhar e esclarecer. A infor- Ao mesmo tempo que criou, em Portugal,
mação é chave, principalmente para as ca- uma empresa para desenvolver software
madas mais jovens, que são o consumidor para a nova mobilidade, a BMW encerrou,
de amanhã. É importante investir na dispo- em Lisboa, o serviço de car-sharing. A que
nibilização de conteúdos, para que as pes- se deveu esta decisão?
soas possam avaliar e tomar uma decisão O serviço de car-sharing na cidade de Lisboa
informada. era integralmente gerido pela Brisa, e o seu
encerramento fez parte de uma estratégia
O iX3 será a montra da quinta geração da global da Share Now em diversas cidades
tecnologia eDrive da BMW. Quais as gran- A próxima geração europeias. Estamos obviamente a olhar para
des alterações que este produto traz face às O BMW i4, que será lançado no final o futuro e para novas formas de mobilidade.
gerações anteriores? de 2021, será o primeiro modelo a receber No entanto, falamos sempre de projetos a
um sistema operativo totalmente desenvolvido
Com o lançamento do BMW iX3, o BMW X3 em Portugal pela Critical TechWorks, uma longo prazo. A pandemia veio também in-
estará disponível com quatro variantes dife- parceria entre a BMW e a Critical Software troduzir novas variáveis que nos obrigam a
rentes de transmissão: diesel e gasolina efi- repensar esta estratégia.
cientes, híbrido plug-in e elétrico. Este novo
modelo está perfeitamente alinhado com a condução elétrica com células de combus- O setor automóvel tem sido um dos mais
nossa estratégia Power of Choice: disponi- tível de hidrogénio, em pequenas séries de prejudicados pela pandemia. Qual foi o im-
bilização de uma ampla oferta de motoriza- veículos, baseada no atual BMW X5. O BMW pacto na BMW Portugal?
ções que permita aos nossos clientes optar i Hydrogen NEXT antecipa uma visão ini- No início de 2020, o mercado estava a evolu-
por aquela que melhor se ajuste às suas ne- cial do que este modelo poderá vir a ser. O ir ao nível do ano anterior. Contudo, nos dias
cessidades. O BMW iX3 destaca-se por ser o BMW Group tinha como objetivo disponi- de hoje, assistimos a uma quebra da ordem
primeiro SAV [Sport Activity Vehicle] total- bilizar veículos com células de combustível dos 37 por cento. Na BMW e na Mini, apre-
mente elétrico, que oferece uma autonomia para os clientes a partir de 2025, mas com sentamos quebras de 27% e 33%, respetiva-
de 460 quilómetros e um consumo energé- a situação atual, essa concretização depen- mente, valores, ainda assim, inferiores em
tico combinado inferior a 20 kwh/100 km. derá muito dos requisitos e condicionantes relação ao mercado nacional. Desde o iní-
Este modelo dispõe de um motor elétrico do mercado, e também das infraestruturas cio desta crise, temos criado diversas medi-
com uma potência de 286 cavalos e permite, relacionadas com o desenvolvimento des- das, por forma a assegurar a rentabilidade e
em dez minutos, receber uma carga corres- ta tecnologia (armazenagem, distribuição sustentabilidade do negócio. Lançámos um
pondente a 100 quilómetros de autonomia. e abastecimento de hidrogénio), não tendo conjunto de campanhas de financiamento e
O novo BMW iX3 dispõe ainda de um sis- ainda data prevista para chegada aos con- o BMW Digital Showroom e o Mini Digital
tema adaptativo de recuperação de energia, cessionários BMW. Showroom, para auxiliar os nossos clientes
que permite maximizar a eficiência do seu na compra de um veículo, através de uma
consumo. Além da eletrificação dos carros, quais as plataforma online. Todos os nossos con-
outras apostas que a BMW está a fazer em cessionários têm plataformas digitais para
Quando teremos o primeiro BMW fuel cell novos conceitos de mobilidade? acompanhar os clientes nesta nova era, em
disponível nos concessionários? Neste momento, temos o Free Now, em con- que a digitalização é um assunto importante
No que diz respeito ao hidrogénio, há mais junto com a Daimler. No entanto, devido ao e necessário. Sabemos que estamos a atra-
de 30 anos que o BMW Group se concentra avanço da pandemia Covid-19, estamos a vessar um período de vendas bastante desa-
no seu uso enquanto fonte de energia. Como repensar a nossa estratégia referente a estes fiante ao nível global, mas estamos otimistas
referi anteriormente, planeamos apresentar conceitos de mobilidade e não conseguimos e acreditamos que, juntos, vamos superar
em 2022 a próxima geração de sistemas de adiantar mais informação nesta fase. esta crise. E

94 . EXAM E . DEZEM BRO 2020


Exit

CUPRA FORMENTOR 2.0 TSI

Assim nasce uma marca


Ganhou o estatuto de marca em 2018, mas só agora, com o lançamento de um
modelo exclusivo – o Formentor –, a Cupra concretiza a emancipação da Seat
Texto Paulo M. Santos

O
Formentor é o primeiro mente desenhado de raiz para dar início
Cupra que não é, tam- a este novo clã. Apesar de ser
bém, um Seat. Até ago- Este não é o primeiro caso de mar- um veículo
ra, esta designação ser- cas que ganham vida própria no seio dos
via para diferenciar as grandes construtores. Ainda recentemen- de cariz desportivo,
versões mais desportivas da marca espa- te, o Grupo PSA decidiu separar a DS da o Formentor está
nhola, como acontecia com o Cupra Ateca Citroën. A Toyota tem a Lexus e a Nissan, a concebido para
ou o Cupra Leon. No entanto, após o su- Infinity, entre outros exemplos. O objetivo
cesso que estas versões foram conhecen- destes construtores é terem uma insígnia acolher uma
do ao longo dos anos, com crescimentos paralela, com modelos mais exclusivos e família
de vendas superiores a 50%, os respon- dinâmicos, para captar um novo tipo de
sáveis da Seat decidiram criar, em 2018, público, alargando, por um lado, a base de
uma nova insígnia que funcione de for- vendas e, por outro, conseguindo margens
ma independente. O Formentor foi total- mais elevadas.

9 6 . EXAM E . DEZEM BRO 2020


Funcionalidade digital
O ecrã de grandes dimensões pode ser
dividido em três níveis de informação

PERSONALIDADE
E ELEGÂNCIA
Com um design distinto
e arrojado, as linhas
do Cupra criam uma imagem
de exclusividade e dinamismo

A Seat espera, com esta nova marca, Com uma direção precisa, o Formentor
> DOS PÉS À CABEÇA vender meio milhão de unidades até ao é bastante eficaz em curva, o que se deve
final de 2028, uma estratégia que permi- também à tração integral permanente. A
As linhas bem vincadas, que se esten- tirá consolidar a recuperação económica caixa, bem escalonada, permite excelen-
dem ao longo do veículo, conferem-lhe da marca espanhola, que apresenta resul- tes recuperações, mesmo em regimes mais
um carácter único e dinâmico. Os faróis tados positivos desde 2017. baixos. Temos a sensação de que nunca fal-
LED, de baixo perfil, associados a duas
Se o nome Cupra já era sinónimo de di- ta motor para qualquer manobra que seja
entradas de ar de grandes dimensões,
namismo de condução e de linhas mais ar- necessária devido a um imprevisto.
reforçam ainda mais esta imagem
rojadas, com esta emancipação, os designers Este modelo possibilita vários modos
e engenheiros tiveram agora margem para de condução: estrada, mais confortável e
dar asas à sua criatividade. Em vez de tra- adaptada para viagens do dia a dia; mon-
balharem sobre um modelo já concebido, tanha, para quando é preciso que o motor
desta vez foi-lhes dada uma tela em branco nos ajude a controlar o veículo; desporti-
para conceberem um novo veículo de raiz. vo, para uma deslocação mais rápida; e,
E assim nasceu o Formentor, um cros- finalmente, o modo Cupra, no qual po-
sover, ou seja, um SUV com características demos sentir todas as emoções que este
de coupé – indo ao encontro daquelas que motor consegue transmitir aos amantes
são as duas grandes tendências atuais do da condução.
> JANTES BICOLORES mercado europeu –, com uma silhueta re- Apesar de ser um veículo de cariz des-
duzida e linhas bastante vincadas. portivo, o Formentor está bem adaptado
As jantes de liga leve de 19 polegadas O interior está bem concebido. Os para acolher confortavelmente uma famí-
reforçam o design desportivo. Desta- bancos são confortáveis e permitem um lia, pois apresenta uma boa habitabilida-
que para a cor cobre, que circunda a bom curso de regulação, adaptando-se às de, com espaço suficiente para três pes-
jante, que combina com a dos travões
mais variadas estaturas dos condutores. soas no banco traseiro, complementada
de disco e com a do símbolo da marca
Os revestimentos são agradáveis ao toque, por uma bagageira com uma capacidade
situado na grelha frontal
mas, para um veículo tão exclusivo, al- de 420 litros.
guns dos materiais utilizados poderiam O primogénito puro desta nova família
ser de melhor qualidade. Já ao volante, o será apresentado com sete motorizações:
Formentor reforça ainda mais o seu quatro a gasolina, dois híbridos e apenas
cariz desportivo. Um simples to- um diesel. Quanto a preços, o modelo mais
que no botão de arranque e co- barato, 1.5 TSI, a gasolina, de 150 cavalos,
meçamos logo a ouvir um ligei- está disponível a partir de 31,9 mil euros.
ro “roncar” do motor, 2.0 TSI, Já a versão mais musculada, de 310 cavalos,
310 cavalos, a versão mais po- com um motor 2.0 TSI – que será a primei-
tente deste veículo – que atin- ra a chegar a Portugal –, pode ser adquirida
ge os 250 km/hora e consegue por 47 mil euros. Não é um carro barato,
ir dos 0 aos 100 km/hora em mas é o custo acrescido para quem quer
menos de cinco segundos. exclusividade. E

DEZEM BRO 2020 . EXAM E . 97


Exit

E S TA N T E

Reflexões, versatilidade,
contabilidade e História
Texto Rui Barroso

REFLEXÕES CONTAS
EM TEMPOS DECIFRADAS
DE PANDEMIA
Um guia para perceber
Eduardo Catroga o funcionamento
analisa os desafios da contabilidade
e as oportunidades para
a economia portuguesa Os autores do livro pro-
UMA BREVE
no pós-pandemia põem um guia prático HISTÓRIA
para ajudar os empresários DA ECONOMIA
O antigo ministro das Fi- GENERALISTA OU a apreender os conceitos e o
nanças Eduardo Catroga ESPECIALISTA? funcionamento da contabi- Como a Humanidade
evoluiu da troca simples
detalha a sua visão estratégica lidade, de forma a poderem
para a próxima década neste A queda do mito tomar melhores decisões es- de bens essenciais para um
livro. Pede que, contrariamen- da especialização como tratégicas e a conseguirem sistema financeiro altamente
te ao que diz ter acontecido no o principal caminho para comunicar a situação finan- complexo e sofisticado
passado, desta vez a crise seja o sucesso ceira das organizações de
aproveitada para transformar forma mais eficaz. Apesar da Desde as trocas comer-
a economia portuguesa através O que têm em comum os complexidade e do jargão téc- ciais na Idade do Ferro
de reformas que permitam a atletas, artistas, invento- nico da contabilidade, os au- até ao comércio global em que
Portugal convergir com os pa- res e cientistas mais talento- tores, que lecionam também um tubo de pasta de dentes
íses europeus mais desenvolvi- sos? Enveredaram pelas suas seminários sobre o tema, pro- contém materiais vindos dos
dos. Uma reflexão e uma análise especializações desde cedo metem exemplos práticos em quatro cantos do mundo. Nes-
às políticas públicas e às priori- ou descobriram apenas o seu português corrente de forma a te livro, Philip Coggan, jorna-
dades que devem ser seguidas grande talento depois de ou- ajudar quem precise de se fa- lista da The Economist, conta a
para aumentar o potencial da tras experiências? David Eps- miliarizar com estes conceitos. história de como a sociedade e
economia portuguesa. tein, que integrou a equipa de TÍTULO: Contabilidade
a economia se desenvolveram
TÍTULO: Desenvolver Portugal
investigação da Sports Ilus- Descodificada: Como Ler para criar riqueza, progresso
− Reflexões em tempos trated e trabalha atualmente e Interpretar as Contas e bem-estar nos últimos dez
de pandemia na ProPublica, percorreu as mil anos. Nesta viagem, cons-
AUTOR: Rafael Franco
carreiras de pessoas que che- tata-se que algumas civiliza-
AUTOR: Eduardo Catroga e Rafael Dolores
garam ao topo e conclui que, ções antigas eram bem sofis-
EDITORA: Bertrand na maior parte dos casos, o EDITORA: Actual ticadas a nível económico e as
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sucesso e a realização pessoal PVP: €19,90
suas histórias podem ajudar a
surgiram após experiências fa- retirar lições para os desafios
lhadas, contestando o mito de com que nos defrontamos no
que a especialização é a condi- presente.
ção necessária para o sucesso. TÍTULO: A Grande História
TÍTULO: Versátil da Economia

AUTOR: David Epstein AUTOR: Philip Coggan

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98 . EXAM E . DEZEM BRO 2020


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