GEOGRAFIA
Esse seminário teve como eixo orientador das discussões o tema “Resistência
Camponesa no município de Paulista” que suscitou o debate sobre os conflitos decorrentes do
desenvolvimento urbano em curso no município, bem como a destruição da agrobiodiversidade
local e as implicações desse processo para a população camponesa. Esse evento criou um espaço
de diálogo entre os sujeitos envolvidos e possibilitou conhecer parte da diversidade do território
da população camponesa, bem como viabilizou o reconhecimento de parte das demandas e
potencialidades da região.
Como fruto dessa articulação entre o CEFOMP e a Associação Camponesa mencionada,
destacamos a luta pela criação do Conselho Municipal de Segurança Alimentar e Nutricional
(CONSEA Municipal), o intercâmbio e troca entre agricultores e agentes do CEFOMP, bem
como o envolvimento entre sujeitos da população rural e urbana do município. A criação do
CONSEA Municipal é uma luta gestada pelo CEFOMP e impulsinada e fortalecida pela
associação, como resultado dessa luta salienta-se a criação da Comissão de Segurança
Alimentar e Nutricional do Município, composta por diversos sujeitos da sociedade civil
organizada, dentre os quais notabilizam-se integrantes do CEFOMP, da Associação
Camponesa, de sindicatos e movimentos sociais.
Essa articulação foi responsável pela realização de conferências municipais para debater
os desafios e os limites para a criação do CONSEA Municipal e nesse sentido, ressaltamos a
organização e realização da II Conferência de Segurança Alimentar e Nutricional do Município
de Paulista que teve como mote orientador do debate o tema “Comida de verdade no campo e
na cidade na luta por direitos”, ocorrida no ano de 2019.
Na discussão realizada com base na fala de cada participante foi deliberado que todos
os presentes pudessem formular propostas para o município que foram homologadas através do
registro de todas as delegadas e delegados da conferência. Nesse contexto, destacam-se alguns
questionamentos formulados pelos sujeitos presentes na conferência, tais como: de que maneira
o poder executivo dialoga sobre os assuntos com os demais setores relacionados com a política
de SAN? Quais as intervenções de apoio às iniciativas que seguem na discussão da criação do
Conselho de Segurança Alimentar e Nutricional no município de Paulista? Como os demais
setores do governo municipal interagem entre si, no sentido da criação de uma política de
Segurança Alimentar e Nutricional? Qual a situação real da mulher e do homem do campo e
demais seguimentos que discutem essa temática hoje no município de Paulista? Esses
quesitonamentos suscitaram as reflexões e discussões e foram responsáveis pela elaboração das
propostas da conferência.
Ressaltamos também a parceria entre a Associação Camponesa e o Instituto
Agronômico de Pernambuco (IPA) no sentido de fortalecer as práticas e valorizar os saberes
dos agricultores camponeses. Essa parceria entre o IPA e associação tem possibilitado a
criação de agroecossistemas resilientes e viabilizado processos de transição agroecológica dos
agricultores que rompem com o modelo convencial da agricultura moderna baseada no pacote
tecnológico da Revolução Verde. Nesse sentido, tem ressignificado a compreensão dos
camponeses sobre o manejo dos seus agroecossistemas, fomentando práticas agroecológicas
responsáveis pela conversação da agrobiodiversidade local. Nesse contexto, as estratégias
camponesas são exemplos de potencialidade e sabedoria, sobretudo no cuidado com a saúde
humana e ambiental, entretanto o reconhecimento e a valorização dos seus saberes é um fator
imprescindível, e ainda que esses saberes sejam considerados primitivos pelo pensamento
monocultural ocidental, é a partir dessa sabedoria popular que se viabiliza a percepção da vida
desde uma perspectiva integrada como bem aprofunda Pereira (2005):
São inúmeros casos ilustrativos que estão presentes em nossas terras, e que são um
potencial social e ecológico, e que apesar de na concepção ocidental dominante serem
lidas como atrasadas primitivas, são avançadas. Conseguem lidar com a vida em seu
conjunto, integrando dimensões que foram separadas na sociedade moderna, e que
muito está custando para serem resgatadas (PEREIRA, 2005, p. 271).
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