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Robert Reilly.
Por que não aconteceu algo parecido no mundo islâmico? Por que essa civilização,
que brotou com tanta abundância de energia no século VII da nossa era, e que se
espalhou pelo norte da África e pelo Oriente Médio produzindo cidades,
universidades, bibliotecas, e uma florescente cultura cortês que deixou uma
marca permanente no mundo, hoje é, em tantos lugares, muda, violenta,
ressentida? Por que o islã hoje parece não apenas tolerar a violência de seus
defensores mais enérgicos, mas também endossá-la e pregá-la? Por que as
minorias muçulmanas na Europa, que emigram para gozar dos benefícios de uma
jurisdição secular, pedem outro tipo de lei, ainda que tão poucas delas pareçam
concordar com o que essa lei diz ou com quem tem o direito de promulgá-la?
Vários fatores são responsáveis por essa súbita ossificação, mas o principal, na
visão de Reilly, foram a ascensão da seita asharita, no século X, e a derrota da
seita rival, a mutazalita. Os asharitas encontraram uma voz potente no imame al-
Ghazali (†1111), filósofo e teólogo brilhante, cujo espírito atormentado, enfim,
encontrou refúgio em uma unidade mística com Alá. A razão humana nos ensina
a questionar as coisas, a descobrir as coisas, e a fazer leis para nos governarmos
melhor. Por isso, a razão era – para al-Ghazali – inimiga do islã, que exige uma
submissão absoluta e sem questionamentos à vontade de Alá. Em seu celebrado
tratado A Incoerência dos Filósofos, al-Ghazali propôs-se a mostrar que a razão,
como reverenciada nos textos de Platão, de Aristóteles (384-322 a.C.), e de seus
seguidores, não leva a nada além de trevas e de contradições, e que a única luz
que brilha na mente do homem é a luz da revelação. Apesar de os argumentos de
al-Ghazali serem perfeitamente refutados por Averróis (1126-1198) – também
conhecido como Ibn Rushd – em seu A Incoerência da Incoerência, o islã
apressou-se em abraçar a doutrina asharita, que tornava a ideia de submissão
muito mais compreensível. Averróis foi mandado da Andaluzia para o exílio, e a
voz da razão deixou de ser ouvida nas cortes dos príncipes muçulmanos sunitas.
O resultado do embate dentro do islã hoje terá grandes consequências para todos
nós. Ao nos ajudar a entender esse embate, este livro serve a um propósito pelo
qual todos devemos ficar profundamente gratos.
Roger Scruton
Fonte:
https://ataqueaberto.blogspot.com/2020/12/o-prefacio-de-roger-scruton-ao-livro.html