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Oi gente, tudo bem com vocês?

Então, decidi fazer um vídeo aqui um


pouco diferente hoje.

A Cielo recentemente reportou para o mercado quais foram os impactos em


várias áreas da economia em relação ao faturamento dos setores por causa
do coronavírus e especificamente sobre o varejo de vestuário. Desde o
começo de março até hoje houve uma queda de 52% do faturamento das
varejistas. Considerando as últimas três semanas (duas semanas de abril e a
última semana de março), houve uma queda de aproximadamente 87% da
receita. Pasmem!

E como que a Cielo sabe disso? A Cielo tem simplesmente o maior market
share das maquininhas no mercado e ela sabe quanto que está oscilando o
faturamento de cada um dos clientes de cada um dos setores.

FABIO FARIA CNPI N. 1711


VÍDEO 30/04/2020
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E então eu pensei, em fazer um estudo sobre a Renner, que é uma empresa
que eu tenho e que eu já invisto há muito tempo, para tentar entender qual
será o impacto disso na empresa e quanto tempo a empresa tem de caixa
para conseguir superar essa queda de receita de 87%, até sabe lá Deus
quando, porque a gente não sabe quando as quarentenas vão acabar.

Esse é um exercício de grandes números, portanto não se apeguem aos


detalhes. É só para termos uma ideia de quanto tempo a empresa
aguentaria honrar suas despesas com caixa dela e ver qual que é o prazo
disso, ok?

A Renner tem hoje 388 lojas que representam mais de 90% da receita da
empresa, mas ela também tem mais de 100 lojas da Camicado e também é
proprietária da Youcom, que é uma loja de moda um pouco mais jovem.

No ano de 2019 a empresa reportou uma receita líquida de R$ 8.7 bilhões de


reais e um lucro bruto de R$ 4.7 bilhões de reais. O que isso quer dizer? Quer
dizer que se a empresa pegar tudo o que ela vendeu e tirar só o custo que
ela teve para efetivamente fazer, fabricar cada uma das roupas que ela
vendeu (lembrando que a Renner não fábrica, ela compra as roupas de
fábricas terceirizadas) ou seja, quanto sobrou para a empresa, considerando
só o custo que ela teve de comprar essas roupas que ela vendeu, chega-se a
um resultado de 4.7 bilhões de reais. Isso é uma margem bruta, um lucro
bruto de 54% em relação à receita.

É importante lembrar aqui que quando a receita cai, o custo dos produtos
cai porque a empresa vendeu menos. Quando a receita sobe, o custo dos
produtos sobe porque a empresa vendeu mais. Então esse custo é referente
só às peças que foram vendidas. É importante saber disso para a entender o
modelo que será usado daqui para frente.

A empresa teve uma despesa operacional de R$ 3.1 bilhões de reais. Essa


despesa representa aproximadamente 36% de toda a receita que a empresa

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teve. Essas despesas operacionais são o que se chama de gastos fixos porque
são salários de funcionários, despesas com marketing, despesas
administrativas (com corpo de funcionários, aluguel, luz) então essas
despesas costumam não oscilar, costumar ser gastos fixos da empresa. Por
mais que se saiba que a empresa vai gastar menos com marketing,
provavelmente, ou vai gastar menos com energia, por exemplo, porque as
lojas vão estar fechados, decidi manter as despesas travadas pra gente
entender quanto tempo a empresa aguenta pagar essas despesas.

Considerando no ano de 2019 essas despesas e a receita que a empresa teve,


sobrou um lucro operacional de R$ 1.5 bilhões de reais, que representa 17%
da receita da empresa. Um indicador interessante de olhar é o grau de
alavancagem operacional que é um indicador muito simples que é só você
dividir o resultado operacional (R$ 1.5 bilhões) pelo lucro bruto (R$ 4.7
bilhões) chegando no valor de 32%.

O quê que isso quer dizer?

Isso quer dizer que a receita da empresa pode cair até 32% que a empresa
vai continuar tendo um lucro bruto passível de honrar com todas as suas
despesas.

Só que agora a receita está caindo 87%. Ela está caindo mais do que os 32%,
que seria o limite para ela conseguir pagar suas despesas. Então
considerando uma queda de 87% das receitas, há uma redução na receita
que sai de R$ 8.7 bilhões para R$ 1.13 bilhões. Considerando a mesma
margem bruta, a mesma margem que ela teria com custo dessas unidades,
que é de 54%, a gente chegaria a um lucro bruto de R$ 610 milhões e
despesas fixas de R$ 3.1 bilhões. Lembrando que estou sendo bem
conservador deixando todos as despesas fixas.

Ou seja, ela vai lucrar R$ 610 milhões de forma bruta, vai ter que pagar os
R$ 3.1 bilhões, que são as despesas fixas, chegando em um prejuízo

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operacional de R$ 2.5 bilhões de reais. Isso seria um prejuízo que ela tomaria
em 12 meses, porque estamos pegando uma base de doze meses.

Quando divide esse valor por 52 semanas, que é mais ou menos o número de
semanas que a tem no ano, chega-se em um prejuízo de R$ 48 milhões por
semana. Ou seja, a cada semana com as lojas fechadas, supondo essas
premissas, a Renner tem um prejuízo operacional de R$ 48 milhões de reais
para manter as suas operações.

Não é à toa que o mercado jogou as ações de R$ 60 reais para algo próximo
de R$ 30 reais, hoje está algo próximo de R$ 40 reais. A empresa passou a
ter prejuízo todas as semanas. Mas considerando esses R$ 48 milhões, quanto
tempo a empresa teria de caixa para honrar com esses prejuízos?

Hoje a Renner tem R$ 1.3 bilhões de reais em caixa e a empresa tem também
algo próximo de R$ 1 bilhão de reais em dívidas. Essas dívidas da empresa
geram uma despesa financeira de R$ 80 milhões, que são juros da dívida
que precisam ser pagos. Então considerando esses R$ 80 milhões dividido
pelas 52 semanas, dá R$ 2 milhões de reais por semana de juros da dívida
que ela tem que pagar, que somando com os R$ 48 milhões de prejuízo
semanal das suas operações daria um desembolso semanal de caixa de R$
50 milhões de reais.

Ou seja, os R$ 1.3 bilhões de caixa teriam que honrar semanalmente com 50


milhões de prejuízo operacional e de despesas financeiras. E esse R$ 1.3
bilhões aguentaria aproximadamente 26,5 semanas de um desembolso de
R$ 50 milhões por semana de prejuízo operacional e de despesas financeiras.

Em meses isso dá proximamente 6,5 meses, o que até me surpreendeu


bastante para uma empresa que teria uma queda de praticamente 87% da
sua receita.

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Ou seja, considerando uma queda de 87% da receita, a Renner teria a caixa
ainda para ficar pagando todas as operações por seis meses e meio.

Agora, lembrando que eu utilizei algumas premissas conservadoras:


- Mantive 100% das despesas sendo honradas, os R$ 3.1 bilhões.
Provavelmente haveria menos despesa para pagar;
- Outro fator também conservador foi deixar 87% de queda no varejo
durante todo esse período. Porque provavelmente terá uma leve
retomada ao longo do tempo;
- Além disso, não considerei os R$ 3.2 bilhões de valores a receber de
clientes que ela tem financiado das vendas que ela fez lá atrás e são
para receber daqui para frente;
- Também não considerei o R$ 1 bilhão de reais que ela tem para pagar
os fornecedores.
É como se essa parte que eu ignorei ficasse elas por elas porque a empresa
tem R$ 3.2 bilhões de valores a receber, tem R$ 1 bilhão de valores a pagar
de fornecedores, tem mais ou menos uns R$ 2 bilhões de obrigações com
terceiros. Então acabaria ficando elas por elas. Mas não se apeguem aqui
aos números fixos. É só para termos uma grande ideia de quanto tempo esse
caixa duraria. Lembrando que, também de forma conservadora, eu não
considerei o rendimento do valor que tem em caixa e fica investido.

É importante também lembrarmos que a empresa tem outras formas de se


financiar, caso o caixa dela acabe. Ela pode, por exemplo, tomar um
empréstimo no banco; ter acesso a alguma linha de crédito que o governo
pode disponibilizar para as empresas; e pode emitir novas ações, diluindo os
acionistas, mas captando recursos para manter suas operações.

Então, achei o valor de seis meses bastante conservador para uma empresa
com uma queda de 87% da sua receita.

Então, basicamente é isso. A ideia foi trazer esse pequeno estudo pra vocês.
Espero que tenham gostado.

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