Brincar aos hoteleiros - Gestão hoteleira por gestores não-hoteleiros, o impacto nas
operações e na saúde mental dos trabalhadores
Atender ao 3º toque, acompanhar ao quarto, oferecer bebida de boas vindas, levar a bagagem, são alguns dos standards a que nos habituámos. A suavidade de processos desde o primeiro contacto até ao email pós check-out está presente em tudo o que toca o cliente. E com razão. O cliente gasta dinheiro e tempo a escolher um hotel que lhe ofereça comodidade e serviços que não tem no seu seio familiar. No entanto, por trás de toda esta suavidade existem problemas de bastidores, agravados pela gestão feita por quem quer ser hoteleiro sem o ser. O “brincar aos hoteleiros” tem repercussões graves tanto nos hotéis como nos trabalhadores, razão pela qual existem cursos de gestão hoteleiras diferentes da gestão empresarial. Estas repercussões são sentidas de maneira diferente. Um hotel de cadeia, com standards, estruturas e funções definidas terá menos problemas do que um hotel individual aberto por um gestor de uma empresa “normal” e gerido do ponto de vista do utilizador; também um hotel em Lisboa com 100 quartos é diferente de um hotel de 10 quartos no campo. No entanto se o gestor do hotel menor quer oferecer os mesmos serviços, tem de criar uma estrutura em escala, mais polivalente num hotel rural pequeno do que num citadino grande. E se o gestor não investir na formação e na estrutura não pode esperar que o serviço seja o mesmo. Para que o telefone seja atendido ao 3º toque, há uma equipa; para levar a bagagem e acompanhar o cliente outra; para servir à mesa outra. Num hotel bem estruturado existem os operacionais, supervisores, chefes e diretores com o mesmo objetivo: proporcionar ao hóspede uma estadia agradável e memorável, mas com funções distintas. No entanto, em muitos hotéis existem gestores não-hoteleiros que exigem que a mesma pessoa atenda o telefone ao 3º toque, recolha a bagagem, faça o check-in, sirva a bebida, recolha os copos, acompanhe ao quarto, e ajude a servir pequenos-almoços, almoços e jantares, sem cobertura de colegas; ou um empregado de mesa que “dê uma mãozinha” ao Housekeeping ou à receção sem ter tido formação, nem ter competências para tal. Isto resulta numa confusão de procedimentos, acabando com a suavidade que se deseja, e o gestor que “brinca aos hoteleiros”, fruto da sua ignorância, não vê o problema, pressionando injustamente o trabalhador. Num hotel gerido por um gestor não-hoteleiro apenas importa o produto final, lançando o trabalhador numa espiral de desmotivação e frustração. Como ir ver a casa dos nossos sonhos e em cada divisão existem pessoas a segurar as paredes porque não foram criadas estruturas que sustentem a casa. Assim que as pessoas ficarem sem força, a casa vem abaixo. Todos estes fatores afetam a operação, e a má saúde mental do trabalhador é muitas vezes fruto da má gestão hoteleira e pessoal que é feita por quem lidera, sendo importante que os trabalhadores se sintam empoderados para falar sobre estes assuntos sem medos de represálias num mundo e profissão cada vez mais acelerados e nervosos. Luís Cutileiro Santos