Fiódor Dostoiévski, filho de Mikhail Dostoiévski e Maria Dostoevskaia, [15] nasceu
em Moscou no dia 11 de novembro de 1821.[1][2][3] Ao contrário de outros grandes escritores russos da época - como Gogol, Turgueniev e Tolstoi -, seus pais não eram abastados financeiramente:[16] seu pai era médico militar e sua mãe dona de casa - a profissão de médico era pouco valorizada financeiramente na época. [17] Mesmo com dificuldades financeiras, a família possuía seis serviçais, os quais, segundo o irmão de Dostoiévski, Andrei, serviam para manter o status social perdido da família, tendo em vista que o pai de Dostoiévski possuía um passado relativamente nobre, passado que abandonou por vontade própria.[17] Além da educação religiosa no cristianismo ortodoxo,[18] Dostoiévski e seus irmãos estudavam literatura e outros estudos de humanidades desde muito cedo, sempre por influência dos pais.[19] Os pais de Dostoiévski morreram quando o escritor ainda era muito jovem: a mãe morreu no ano de 1836[20] e há suspeitas de que o pai foi assassinado no início de junho de 1839 pelos próprios servos de sua propriedade rural em Daravói. A tese de assassinato é hoje muito questionada.[21]
Início da carreira literária
Fiódor Dostoiévski Por Kostyantyn Trutovsky, 1847
Na Academia Militar de Engenharia de São Petersburgo, além das matérias militares
essenciais e de engenharia, Dostoiévski também estudou a obra de Victor Hugo, Honoré de Balzac, George Sand e Eugène Sue, uma vez que a academia tinha um bom programa de literatura, focado principalmente na produção francesa. [22] Nessa época, foi também muito influenciado pelo poeta romântico alemão Friedrich Schiller.[23] A partir de agosto de 1841, Dostoiévski passou a morar fora da escola de engenharia, dividindo apartamentos com conhecidos [24] e com o irmão Andrei.[25] Nesta época escreveu - segundo relatos de um seu conhecido com o qual dividia o apartamento - partes de duas peças românticas, as quais não sobreviveram ao tempo e cujos títulos eram Mary Stuart e Boris Godunov.[26] Terminou o curso de engenharia em 1843.[25] Em 1845 começou a escrever sua primeira obra, o romance epistolar Gente Pobre, [27] trabalho que iria fornecer-lhe êxitos da crítica literária, uma vez que Belinski, o mais influente crítico da literatura russa,[28] acreditou e fez acreditar ser Dostoiévski a mais nova revelação do cenário literário do país: Belinski estava extasiado com o movimento realista na Europa e considerou o romance de Dostoiévski como a primeira tentativa do gênero na Rússia.[29] O livro foi publicado no Almanaque de Petesburgo no ano de 1846.[30] A Gente Pobre seguiu o romance O Duplo, publicado em 1846,[31] e os seguintes contos: Senhor Prokhartchin, publicado no volume de outubro de 1846 da revista Notas da Pátria,[32] e dois contos escritos em 1846, Romance em Nove Cartas e Polzunkov,[33] A Senhoria, escrito entre 1846-47,[34] Coração Fraco, escrito em 1848,[35] três contos escritos entre 1847-48: O Ladrão Honesto, Uma Árvore de Natal e uma Boda, A mulher alheia e o marido debaixo da cama[36] e Noites Brancas[37] e, ainda, o conto Netochka Nezvanova, cuja última parte foi publicada no volume de maio da Notas da pátria no ano de 1849, sem, entretanto, conter o nome de Dostoiévski, uma vez que ele tinha sido preso em 23 de abril. [38] Estas obras não tiveram o êxito esperado e sofreram críticas muito negativas, inclusive de Belinski.[39] Nesta época,[40] desde que terminou o curso na academia militar até sua prisão, Dostoiévski entrou em contato com alguns grupos da Intelligentsia russa, sendo os principais o Círculo Petrashevski[41] e o Círculo Palm-Durov.[42] O primeiro era dedicado à discussão sobre literatura e humanidades em geral, centrado nas obras da biblioteca de obras proibidas de Petrashevski,[43] obras que, segundo os registros da sociedade, Dostoiévski consultou em várias ocasiões.[44] O segundo, o Círculo Palm-Durov, foi formado a partir do Círculo Petrashevski e servia de fachada para radicais revolucionários, incluindo Dostoiévski,[45] o qual foi preso muito por conta de suas atividades neste círculo, [45] em que pese as acusações terem sido direcionadas apenas ao círculo principal de Petrashevski, uma vez que o Círculo Palm-Durov não chegou a ser descoberto pelas autoridades. [46]
Mais do que um sósia, era o seu duplo, o desdobramento dêle
“ mesmo. ” —Dostoiévski[47]
Exílio na Sibéria Detenção, julgamento e falsa execução
A falsa execução do Círculo Petrashevski
Dostoiévski foi detido na noite de 22-23 de abril de 1849 por participar do Círculo Petrashevski sob acusação de conspirar contra o czar Nicolau I.[48][6] O czar mostrou-se, depois das revoluções de 1848 na Europa, vigoroso contra qualquer organização clandestina que pudesse pôr em risco seu reinado. [49][6] Apesar de o Círculo Petrashevski não ser em si nem clandestino nem revolucionário, como chegou à conclusão o relatório oficial,[50] existiam vários grupos menores orbitando ao seu redor e alguns de seus membros eram de fato revolucionários, como era o caso de Dostoiévski. [51] A ordem de detenção foi emitida baseada nos relatórios da chancelaria imperial russa da época, mais conhecida como "polícia secreta", realizados em conjunto com o Ministério dos Assuntos Internos, após mais de um ano de investigação. [52] A principal acusação contra Dostoiévski foi de ter lido em público passagens de uma carta semiaberta de Vissarion Belínski ao escritor Nikolai Gogol, na qual o escritor foi criticado por suas visões políticas e sociais conservadoras. Dostoiévski leu esta carta tanto no Círculo Petrashevski quanto no Círculo Palm-Durov, além de ter ajudado a disseminá-la.[53] Por conta do processo, Dostoiévski passou oito meses na Fortaleza de São Pedro e São Paulo, onde trabalhou escrevendo várias notas para diferentes obras. [54] As notas não sobreviveram e a única obra concluída desta época foi O Pequeno Herói.[55] Nestes oito meses continuaram as investigações do Círculo Petrashevski, as quais foram finalizadas apenas em 17 de setembro de 1849, quando foram enviadas ao czar, o qual ordenou a abertura de um tribunal misto (civil e militar) para julgar, sob leis militares, 28 acusados. Destes, 15, incluindo Dostoiévski, foram condenados no dia 16 de novembro à pena de morte por fuzilamento. Após diversos recursos, Nicolau I perdoou muitos dos sentenciados à morte. Dostoiévski foi então condenado a oito anos de trabalhos forçados, pena reduzida para quatro anos seguida de serviço militar por tempo indeterminado. [56] Mesmo assim, em 22 de dezembro os prisioneiros foram transferidos e levados ao lugar da suposta execução, a Praça Semenovski, onde suas sentenças de morte foram lidas publicamente. [57] Três membros do grupo - Petrashevski, Mombelli e Grigoriev - foram amarrados aos postes em frente ao pelotão de fuzilamento. Dostoiévski era um dos três próximos [58] e neste momento de aguardo disse a Nikolai Spetchniev, o qual se encontrava atrás: -"Nós estaremos com Cristo", o revolucionário respondeu -"Um pouco de poeira". [59] Antes do comando para o fuzilamento, entretanto, chegou uma ordem do czar para que a pena fosse comutada para prisão com trabalhos forçados. Soube-se, depois, que a ordem havia sido assinada dias antes, mas que o czar exigira a falsa execução - através do Príncipe Michkin de O Idiota, Dostoiévski oferece uma descrição desta experiência de quase morte.[60] Dostoiévski, então, recebeu os grilhões e partiu para a Sibéria poucos dias depois.[61] É comumente aceito e afirmado pelo próprio Dostoiévski, que após a simulação da execução, ele passou a apreciar a vida de uma maneira muito diferente da anterior, iniciando um processo de transformação existencial, literária e política, que estaria terminada quando de seu retorno a São Petersburgo, 10 anos depois.[6] [62][63]