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19 EM MOÇAMBIQUE
RESUMO
O COVID-19 é hoje prerrogativa comum da humanidade, ou estamos afectados e infectados ou
estamos à espera de sê-lo. O seu impacto, via mídia globalizada, produz efeitos desesperadores para o
mundo inteiro e sobretudo para as comunidades mais pobres como é o caso de Moçambique. O
estoicismo, foi uma escola helênica e clássica, cuja noção de felicidade consiste num estado de
tranquilidade da alma, isto é, ausência de perturbação, parece apresentar-nos alguns elementos
necessarios para fazer face aos problemas que nos são expostos pelo COVID-19. A emergência do
COVID-19 no mundo representa uma afronta às liberdades sociais devido às medidas de controlo
social tomadas pelo Estado com vista a mitigar os efeitos catastróficos desta pandemia. Dum lado ,
isso tem uma razão muito simples de o ser, a salvaguarda do bem maior do homem, a vida, pois, não
existem liberdades sem vida, o que significa que fale a pena sacrificar um conjunto de liberdades do
homem para salvaguardar este bem maior mas, este controle social e a constante intervenção do
Estado Moçambicano na economia, pode numa situação mais extrema beneficiar um regime
autoritário. Oxalá que essa intuição não venha a se concretizar. Em suma, os desafios político-
filosóficos da Educação que o presente artigo apresenta estão atrelados ao densevolvimento de valores
modernos pois, a liquidiz das sociedades contemporâneas exige capacidade do homem em agir em
conformidade com as realidades e os fenómenos, pois nesse mundo saturado de informações, é
preciso que se criem consciências críticas, cientes de que a educação está também nas mídias, nos
movimentos sociais, nos espaços públicos de encontro da diversidade. Portanto, é preciso que se
aproveitem esses espaços para dilatar a perspectiva da educação, sendo para isso necessário que a
escola Moçambicana repense o seu modelo de aprendizagem de modo a formar individuos capazes de
dar resposta às realidades e aos fenómenos com que são confrontadas de forma sábia. Enfim, o
presente artigo carrega consigo uma visão do futuro. Este artigo teve como objectivo, identificar os
desafios do âmbito político e filosófico da educação em Moçambique em tempos de COVID 19 e teve
uma literatura de base ligada às ideias filosóficas de Sigmund Bauman no respeitante a Modernidade
Liquida. Este artigo seguiu uma linha metodológica baseada na pesquisa bibliográfica e analises sobre
o fenómeno COVID 19 e suas implicações para a Educação em Moçambique por parte do
pesquisador. Um dos principais resultados a que chegou-se depois de elaborado este artigo, é que as
TIC’s precisam deixar de ser visto simplesmente como um instrumento de lazer e passar a ser visto
como um instrumento pedagógico potenciador de aprendizagens em todos os níveis de ensino.
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Tem Licenciatura em Ciências da Educação com habilitações em Políticas da Educação (2018). Alma mater:
Universidade Pedagógica de Moçambique, actual Universidade Pedagógica de Maputo (UPM)
Introdução
A educação, continua sendo em qualquer canto do mundo o cerne da existência das
sociedades e da reprodução dos modelos de sociedade. O primado da racionalidade do
homem é talvez disto um grande exemplo, o que diferencia o homem das demais espécies.
Mas, a reprodução da racionalidade humana é feita através da Educação e duma instituição
que se chama “escola” pois estes transmitem ciência, reproduzem e universalizam a
racionalidade do homem e constroem modelos de sociedade. Mas será a racionalidade
totalmente benéfica ao homem? Ora, a história mostra-nos que a ciência como resultado da
racionalidade do homem tem tido efeitos catastróficos à integridade humana. E o
Coronavírus? Como surgiu? O certo é que o risco COVID-19 é hoje prerrogativa comum da
humanidade, ou estamos afectados e infectados ou estamos à espera de sê-lo. O seu impacto,
via mídia globalizada, produz efeitos desesperadores para o mundo inteiro e sobretudo para
as comunidades mais pobres. (Ngoenha, 2020).
O Coronavírus veio-nos recordar, que vivemos numa sociedade de incertezas e que a
globalização é essencialmente de riscos e não de bens (Ulrich Beck apud Ngoenha, 2020) e,
relactivamente a isso, os países pobres ou periféricos sendo na sua maioria do hemisfério sul,
estão em grande desvantagem pois os seus sistemas de Saúde não se encontram devidamente
preparados para fazer face ao COVID-19. Poderemos por isso também culpar os sistemas da
Educação? Por não desenvolverem consciência crítica nas pessoas para que possam agir em
conformidade com as realidades? Hoje, vivemos uma situação de acusações mútuas, porque
as pessoas negligenciam e demonstram uma certa ignorância em relação às medidas de
mitigação do COVID-19 indicadas pelas autoridades. Se calhar o maior problema é como
fazer da prevenção um substrato principal da existência do homem na terra, e que a
prevenção deve sempre ser tomada em consideração nas nossas vidas, e não apenas sobre o
COVID-19. E a escola? Poderá ela ter alguma culpa sobre isso? Parece uma situação mais
paradoxal que outra coisa pois acredita-se que a escola é uma instituição que está na
vanguarda da transmissão de conhecimentos e da ciência e do outro lado, as pessoas que
passam por ela parece não ter aprendido as lições. Enfim, muitas questões podem ser
levantadas e permanecerem sem respostas imediatas.
O presente artigo pretende identificar os desafios do âmbito político filosófico da Educação
em Moçambique à luz da modernidade.
A modernidade e pós-modernidade no contexto dos países periféricos
O mundo moderno, contrariamente ao medieval, é marcado por constantes transformações
em todas as esferas da vida do homem. Hoje nada é estático, precisamos sempre estar a par
dessas transformações. É o que (Zygmunt Bauman, 2001) chama de modernidade líquida. É
comum a educação ser encarada como um valor único, invariável e redentor, o que parece ser
o caso de Moçambique. Mas, para (Foucault, 1977), a via enredada em seu contexto cultural.
Por isso, o ensino que em uma época é considerado a salvação do ser humano, em outra pode
ser visto como nocivo. Para o autor, uma das grandes questões da filosofia da educação é a
dicotomia entre a educação como transmissão do conhecimento versus a educação crítica,
como um incentivo à habilidade questionadora por parte do aluno. Como se conhece, e o que
significa conhecer.
Para Foucault (1977,), o “mundo da escola” deve se vincular cada vez mais ao “mundo da
vida”, derrubando muros e se inserindo num contexto humano ampliado de formação pessoal
e de grupo. Bauman (2001) adianta dizendo que com esse mundo saturado de informações, é
preciso que se criem consciências críticas, cientes de que a educação está também nas mídias,
nos movimentos sociais, nos espaços públicos de encontro da diversidade, dilatando a
perspectiva da educação. Em tempos de COVID-19 em Moçambique, percebe-se que o nosso
SNE2 foi surpreendido. Ele não consegue estar em condições de antever situações que
possam colocar em causa o seu percurso tradicional. As Tecnologias de Informação e
Comunicação são muitas das vezes proibidas em nossos estabelecimentos de ensino e hoje,
graças ao COVID-19 e com a pseudo adoção do estudo electrónico, o cenário mudou. Oxalá
que a suspensão do ensino presencial imposto pelo vírus ajude as nossas instituições de
ensino de todos os níveis a deixarem de considerar os artefactos da tecnologia de
comunicação como simples instrumentos de lazer, para transformá-los em sérios
instrumentos pedagógicos, de trabalho de investigação e extensão em todos os niveis de
ensino, se não há-de vir Antônio Gramsci dizer que a História tem muito a ensinar mas não
tem discípulos. Tudo leva a crer que a pedagogia pós-coronavírus e o mundo do trabalho
nunca mais serão os mesmos, e se isso é uma lição que temos de tirar para antever o futuro,
constituirá um dos únicos pontos positivos da crise que estamos a atravessar (Ngoenha,
2020). Mas, é inadmissível que um país que diz formar intelectuais apenas tire proveitos
casuais das crises que atravessa ou colocar-se-á em causa a credibilidade das instituições de
ensino. É de facto inadmissível, “não podemos ficar sentados ao pé da lareira como se do
inverno se trata-se” e se o inverno não terminar? Albert Einstein uma vez disse que a crise é
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Sistema Nacional da Educação
a melhor coisa que pode acontecer a um país, a crise traz progressos uma vez que a
criatividade nasce da angústia assim como o dia nasce da noite escura. Os tempos de COVID-
19 apresentam-se como um teste às pessoas e às instituições de ensino sobre a sua capacidade
flexível de agir em conformidade com as novas realidades. O inconveniente para os países e
para as pessoas é como encontrar as saídas e as soluções para os problemas.
Os países periféricos como Moçambique têm a particularidade de dispor ainda duma
percentagem significativa de pessoas não escolarizadas que para além de irem à machamba
para obter uma fonte de renda, do outro lado elas se vêm na obrigação do cumprimento das
medidas de prevenção contra o COVID-19. Será isso possível? Não seria necessário primeiro
associá-las à sabedoria e a ciência com consciência? Estará esse grupo de pessoas preparado
para isso? Não é nossa intenção afirmar que analfabetismo é sinónimo de ignorância E se os
alfabetizados ou escolarizados que por sinal na sua maioria são jovens, forem os que primeiro
ignoram as tais medidas? Culparíamos a educação que a escola providência? A resposta para
isso parece óbvia, o facto de termos metodologias de ensino do século ou XX e professores
do século XXI O que nos leva a aferir que as mesmas são estáticas e não acompanham as
grandes transformações globais como as TIC`s, o que nos leva a concordar com Albert
Einstein quando diz que a verdadeira crise é a crise da incompetência ou a concordar com
(Lyotard, 2004) quando se refere à crise da Universidade que em vez de formar indivíduos
capazes de formular ideias, forma competidores. As escolas e as Universidades precisam
comecar a preocupar-se em formar formuladores de ideias e de consciência crítica em tempos
de COVID-19 para que possam agir em conformidade com a realidade actual.
As autoridades de tutela da Educação em Moçambique, para fazer face à interrupção de aulas
presenciais, tomaram medidas de adopção da educação on-line, ou seja, o recuso às TIC´s
para continuar garantindo a Educação conforme reza a Constituição da República mas, o
direito verdadeiro só existe quando ela está ao serviço dos mais necessitados (Rousseau).
Como garantir a educação on-line em tempo de COVID-19 aos mais desfavorecidos que por
sinal constituem uma parte significativa da população moçambicana que nem smartphone ou
TV têm em casa? Não seria a educação on-line excludente e ao serviço das classes mais
favorecidas? Obviamente que concordaríamos com Castiano e Ngoenha (2005) quando
referem-se à educação para todos e qualidade para poucos. Seria injusto e inadmissível, o
justo seria garantir o direito à Educação para todos. A condição sócio-econômica e de
extrema desigualdade social de Moçambique pode estar por de trás desta triste realidade. A
teoria de dependência (Baran 1957; Frank 1967 apud Lemmer 2005, 55-56) defende os
princípios básicos da modernidade baseada nas ideias de Karl Max e Frederich Engels em
manifesto comunista da exploração dos pobres pelos ricos o que nos leva a crer que o modelo
de estudo on-line e/ou multimídia pode perpetuar ainda mais uma futura exploração dos
pobres pelos ricos. O sistema da Educação de Moçambique precisa desenvolver em todos os
níveis os valores de liberdade, solidariedade, de justiça social e todos outros valores que
possam permitir construir uma sociedade Moçambicana mais justa possível nos alunos.
Assim, numa possível e eventual pandemia ou crise futura, a capacidade de resposta do SNE
estaria mais preparado, pelo menos sob ponto de vista moral ou ético das sociedades.