Resumo: Este artigo é parte da minha proposta de pesquisa do Mestrado em andamento no Programa
de Pós Graduação em Educação, Conhecimento e Inclusão Social na Faculdade de Educação da
UFMG. Do qual busco analisar as relações entre as formas de socialização dos jovens negros no
ambiente escolar e sua importância intersubjetiva na construção das masculinades negras. Para isso,
utilizo como referencial teórico autores que vão abordar a relação entre o gênero masculino e trajetória
escolar de forma articulada com seus determinantes, ou seja, raça, classe, sexualidade e territorialidade
evidenciando as causas de maior exclusão entre meninos negros. O estudo será realizado a partir do
primeiro semestre de 2019, com estudantes da rede pública de ensino de Belo Horizonte, capital mineira.
Enquanto metodologia de pesquisa, farei uso dentro da abordagem qualitativa da pesquisa etnográfica.
Dos resultados obtidos a partir da produção dos dados, será feita sua análise, o que auxiliará na
confrontação junto as hipóteses, concluindo assim a dissertação.
1.Introdução
2 Referencia a obra de Alex Ratts “Eu sou atlântica sobre a trajetória de vida de Beatriz Nascimento”.
performatividade expressiva e revolucionária, a qual tem em si a potencialidade de
transformação de subjetividades subalternas em subjetividades mais autônomas.
Historicamente no Brasil é possível apontar a Segunda Onda do feminismo
como momento definidor no enfrentamento das desigualdades de gênero na escola.
Nesse momento o sexismo passa então a ser evidenciado na educação de meninos e
meninas na década de 70. É também a partir da Segunda Onda do feminismo que as
reflexões à cerca de masculinidades e feminilidades ganham respaldo nos trabalhos e
pesquisas acadêmicas. Posteriormente, um dos principais marcos regulatórios na
política nacional de educação foi o documento elaborado pela UNICEF na década de
90 intitulado: The Girl Child: AnInvestment in the Future,3 o qual apontava uma dupla
desvantagem a meninas e mulheres no sistema de ensino.
Para pensar na universalização do ensino e na redução das desigualdades
raciais e de gênero na educação devemos pensar não somente no acesso, mas na
permanência desses sujeitos, eliminando práticas normativas e que, portanto, são
discriminatórias a um contingente significativo de jovens negros que acabam
impedidos de concluir a Educação Básica. Se estes jovens estão fora da escola é
muito provável que encontrem caminhos deseducativos, diminuindo suas chances de
ter uma melhor qualidade de vida, tendo ciência de que por ano mais de xx mil jovens
são vitimas de violência no país. Quais os sentidos e significados da educação, senão
de transformar essa realidade?
No âmbito desse artigo, pretendemos analisar as relações entre as formas de
socialização dos jovens negros no ambiente escolar e sua importância intersubjetiva
na construção de masculinidades negras, pretendendo assim suprir uma lacuna nos
estudos de gênero e educação. Para isso, faço uso de autores que irão auxiliar nas
abordagens de gênero, raça e sexualidade, levando em consideração a trajetória
escolar desses sujeitos e os mecanismos de exclusão presentes nas práticas
pedagógicas normativas. Para alcançar esses objetivos, optamos por uma pesquisa
de cunho qualitativo, numa perspectiva etnográfica visando potencializar a
investigação de campo, podendo extrair o máximo de elementos presentes no
cotidiano e nas práticas interativas entre os jovens no contexto escolar.
CAMINHOS E TRAJETÓRIAS
O percurso que me fez chegar até aqui enquanto negra, pois antes de ser
“mulher” sou atravessada por olhares de racialização sobre o meu corpo, esses
mesmos olhares que me relegam também a condição de ser “fêmea”, pois em um
processo de dupla subalternização a condição humana me é relegada. Tais caminhos
tangenciaram minhas experiências a de outros sujeitos individuais ou coletivos cuja
corporeidade e memórias são atravessadas não apenas pela invisibilidade e
silenciamento, mas também de subversão, rupturas e agenciamentos.
4
5 Cantor de rap da música “o que separa meninos de homens”.
Associação Brasileira de Pesquisadores/as Negros/as – ABPN
Consócio Nacional de Núcleos de Estudos Afro-brasileiros – CONEABs
Universidade Federal de Uberlândia – (UFU)
períodos históricos, variam entre homens em meio a uma só cultura e variam no curso
de uma vida” (KIMELL, 1998, p. 106). Não podemos então falar de uma única forma
de masculinidade e sim masculinidades. Não há receita pronta do modo de como
“ser” homem ou “ser” mulher, embora ocorra todo um movimento que tenta moldar e
controlar corpos desconsiderando a agência individual dos sujeitos.
Neste sentido, devemos falar de masculinidades, reconhecendo as diferentes
definições de hombridade que construímos. Ao usar o termo no plural, nós
reconhecemos que masculinidade significa diferentes coisas para diferentes
grupos de homens em diferentes momentos (KIMELL, 1998, p.106).
Para Butlher, “se o gênero são significados culturais assumidos pelo corpo
sexuado, não se pode dizer que ele decorra de um sexo desta ou daquela maneira”
(2003, p.24), portanto, é preciso ter em mente que quando tais elementos são
desestabilizados dentro de uma lógica “inteligível” provocam crise nos indivíduos
modernos, como nos informa (HALL, 1997) assim, mediante a uma relação de
conflito, podemos por em cheque condutas e valores de uma masculinidade
normativa.
Essa perda de um sentido de si estável é chamada, algumas vezes, de
deslocamento ou descentração do sujeito. Esse duplo deslocamento –
descentração dos indivíduos tanto de seu lugar no mundo social e cultural
quanto de si mesmos – constitui uma “crise de identidade” para o indivíduo
(HALL, 1997, p.10)
Por fim, volto ao questionamento inicial: será que são os jovens o real
“problema” do sistema de ensino? Ou devemos nos perguntar de fato quem tem
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Trecho da música do cantor Thiago Elninõ “Pedagogingas”, albúm: “A Rotina do Pombo”, 2017.
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É na escola onde muitas crianças negras defrontam-se pela primeira vez com o
racismo, Seja através de opressões vivenciadas com outras crianças ou na sala de
aula por meio de sutis mecanismos de discriminação que tentamos abordar ao longo
do texto, expressos nas avaliações negativas dos docentes, na normalização das
praticas pedagógicas ou através de estigmas e estereótipos. A negação de sua
identidade, tal como as avaliações realizadas de modo a diferenciar o “bom” e o “mal”
aluno, o “disciplinado” e o “indisciplinado” são alguns dos exemplos do que a escola
considera atualmente enquanto “problema”.
Buscamos saber se a produção desses estereótipos interfere ou não na
construção da identidade masculina e, se interferem, qual são os valores e condutas
incorporados pelos adolescentes e quais são os valores e as condutas rejeitadas, pois
entende-se que embora haja todo um mecanismo de controle e repressão sobre seus
corpos também existem formas de subversão e negociação dessas identidades
incorporadas no cotidiano escolar ou fora da escola. Os estudos sobre as
masculinidades trazem um conjunto de informações que permitem ultrapassar uma
leitura universal sobre o gênero, incorporando a esse conceito outros marcadores
importantes para a leitura da realidade de sujeitos diversos, assumindo que não há
uma única forma de masculinidades e que é preciso romper com uma concepção de
masculinidade hegemônica para que os jovens negros possam vivenciar outras
relações que não os reduzam a condição desumana.
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