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Stein
VASSOURAS
um município brasileiro do café,
1850-1900
Tradução de
A
EDITORA
NOVA
FRONTEIRA
I’
CAPÍTULO IV
COMERCIALIZAÇÃO,
ABASTECIMENTO E TRANSPORTE
' s,
1| A ntes da construção da Estrada de Ferro D o m Pedro II, os
£ fazendeiros d e grandes lavouras de Vassouras enviavam diversas
vezes por ano seu trem d e carga de mula (tropa) sob responsabili
dade de um arreador e tropeiros escravos, no difícil e frequente
m ente perigoso trajeto para Iguaçu, perto da baía do R io o u para a
capital propriam ente d ita L á as sacas de café envoltas por sacos de
couro cru eram depositadas nos armazéns.do factótum urbano dos
fazendeiros, o s com issários ou correspondentes, para serem vendi
das a exportadores estrangeiros de café estabelecidos no R io de
Janeiro.
Com o interm ediários espremidos entre os fazendeiros do inte
rior e os exportadores de café, os comissários desem penham um
grande núm ero de serviços para seus clientes isolados. Em primeiro
lugar era vantajoso para os fazendeiros que o trem d e tropa ao
retom ar chegasse carregado de artigos não produzidos na fazenda:
gêneros alim entícios — bacalhau, cam e-seca, sal, toucinho d e fu-
meiro — , assim com o apetrechos de ferro e alguns artigos d e luxo.
O comissário era o abastecedor natural desses artigos, pois o di
nheiro creditado aos fazendeiros pela venda de seu café era empre
gado na aquisição d e artigos solicitados pelos fazendeiros. Em
segundo lugar, o com issário morava na capital do porto onde uma
ampla variedade de produtos importados estava disponível a preços
mais baratos d o que aqueles cotados por casas com erciais das cidades.,
de Vassouras e Pati, ou por vendas ao longo das estradas m unidpais.;,
Ao descrever a falta d e contato entre os fazendeiros e as casasl
comerciais na cidade de Vassouras, um membro da Câmara M uni-
cipal d e Vassouras explicou: “ .. .porque Iguassu e R io são vizinhos
e porque cada uma tem seus trens de carga, os grandes fazendeiros
111
acham mais prático m anter relações com erciais diretas com aquelas
cidades”.1
D e boca em boca, conform e um fazendeiro aconselhava outro,
e via faturas descritivas, os comissários formaram um a clientela no
interior. D e Iguaçu em 1845, K m enta & R ibeiro anunciavam que
tinham “instalações para receber rem essas para futura entiega e
para estocar outras mercadorias”.2Em sua fatura, Am aral & Bastm
informavam que eram ..grandes com erciantes no R io d e Janeiro
onde possuem um armazém de secos e m olhados com vendas no
atacado ou no varejo e pagam ento à vista o u a crédito, fornecendo
artigos comprados em outras lojas, assim com o quantias em di
nheiro”.3 U m fazendeiro podia despachar sua colheita para um
determ inado com issário, que, sem conhecê-lo, aceitava o café c d
vendia. E le en tão abria uma conta corrente, lançava o dinheiro na
conta e, numa nota entregue ao arreador, informava o fazendeiro
d eseu saldo. Através d e anos de contato, o fazendeiro e o comissário
desenvolveram uma confiança mútua; de sua parte, o fazendeiro
aceitava os preços obtidos pela venda de seu café assim com o as
provisões por ele encom endadas e depois “sacava dinheiro mais ou
m enos à vontade d e acordo com seu saído, e não poucos gastavam
todo o seu crédito antes que a nova colheita fosse feita.4A confiança
era mútua e quase sem pre por boas razões. U m com issário tinha que
ser cuidadoso para vender café consignado ao m aior preço possível
j a despeito d e flutuações diárias e não cobrar um preço m uito alto
| pelas provisões; se fosse detectada alguma fraude, a notícia logo se
espalhava entre os outros fazendeiros, que não mais fariam negócio
' com ele. A ntes de estender dem ais um crédito em provisões solici
tadas, os comissários avaliavam através de seus clientes fazendeiros
a situação financeira de um nova conta. A pesar da confiança mútua,
ambos empregavam certos expedientes na negociação do café. O
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café m uito seco absorvia umidade na descida d a s m ontanhas paia as
planícies úmidas do R io, e o ganho em peso ia para o fazendeiro.
Para agir contra isso, os comissários compravam café ensacado na
base d e uma arroba de 15kg e o pesavam para exportadores na base
da arroba ligeiram ente m enor, a “inglesa".5
B em poucos eram os fazendeiros ou adm inistradores de fazen
das que mantinham contas d e remessas e aquisições d e café solici
tadas d e seus comissários. V isivelm ente d eficiente era a contabili
dade d e Luís Peixoto de Lacerda W em eck, q u e registrou que “a
partir do início ele resolveu conduzir todos o s negócios da fazenda
com seus comissários, Furquim & Irm ão, para tom ar todas as nego
ciações tão legais quanto possível Enviava pedidos afirmando espe
cificam ente o porquê e a razão de cada solicitação. A s cartas eram
im pressas... e os com issários respondiam quando cumpriam as
solicitações”.6 Porém a maioria dos fazendeiros relutava em usar
“processos complicados d e contabilidade com ercial”7 e preferia
aguardar relatórios despachados ocasionalm ente pelos mais zelosos
com issários, prontos a “atender os pedidos d e Sua Excelência” e
esperançosos d e que “Sua Excelência honrar-m e-á com seu co
m ércio, ao qual sem pre servirei diligentem ente”.8 N os extratos de
sua conta corrente, os fazendeiros verificavam o que haviam enco
m endado, que faturas haviam sido saldadas o u hipotecas pagas
conform e haviam orientado, tudo classificado cuidadosam ente por
débitoou crédito. Durante um período de dois anos, 1835-1837, uma
fazenda de Vassouras recebeu de Iguaçu, entre outras coisas, dois
pares d e meias d e linho, duas arrobas decam e, duasdúzáas d e pratos,
um baú, pregos, duas arrobas d e toucinho d e fum eiro, um a resma
113
m
114
m & Sobrinhos, Teixeira L eite & Bastos, João Batista L eite & Cia.,
Furquim, Joppert & Q a., Tfeixeira d e Castro & M alafía, Faro &
•Irmão, Bernardo R ibeiro d e Carvalho, Ortigão & G a., R oxo, M on
teiro & Lem os, A lves & Avellar, e Gracie, Ferreira & Cia- N estes
locais e em ruas próximas, centralizava-se o com ércio d e café dos
Wé'municípios do Vale do Paraíba; e dessas e de outras grandes casas
com erciais saíam as provisões para as fazendas d e café e para o
/m estoque de outros estabelecim entos locais —- ranchos, vendas, ta
bernas, botequins — assim com o para os m ascates itinerantes.
1 O com ércio local de Vassouras que abastecia o pequeno fazen
deiro prosperou com trens d e tropa viajando pela Estrada da Polícia
— na década d e 1840 a “mais extensa e im portante no B rasil... se
estendendo 400léguas de Cuiabá ao R io de Janeiro”.13D as parelhas
de mulas que se dirigiam para o R io e Iguaçu, as casas com erciais
adquiriam a produção de Minas de tecido grosso d e algodão, touci
nho d e fumeiro e couro que suplementavam com mercadorias
importadas apanhadas na costa pelas parelhas qu e retom avam .14O
estoq u ed e vendas consistia de tecidos ordinários, mercadorias secas
(fubá, cam e-seca, toucinho de fumeiro, arroz, feijão, bacalhau,
m queijo, biscoitos), bebidas alcoólicas (aguardente, vinhos portu
gueses baratos), bugigangas (fitas, pentes, carteiras de dinheiro,
escovas d e unha e de dentes, sabonete perfum ado) e mercadorias
d e ferro (m achados, enxadas, podadeiras, panda d e ferro e pratos
d e lata).15A esta lista eram às vezes acrescentadas roupas prontas e
couros.16U m estabelecim ento típico da década de 1840, um rancho
ou taberna na Estrada da Polícia, perto de Vassouras, era uma
em presa familiar próspera onde o “tabem eiro vendia bebidas alcoó
licas, rapadura, m ilho, mercadoria de ferro... e nas horas d e lazer
jogava cartas. Sua m ulher preparava refeições, café para os viajantes,
broa de milho e biscoitos”.17Outros estabelecim entos beiravam um
116
vos,23 vendiam mercadorias de qualidade inferior a preços
excessivam ente elevados, ofereciam bebidas alcóolicas mal prepara
das ou “falsificadas” a confiantes fregueses escravos e enganavam
os doentes com vendas de “pequenas ou amplas doses d e medica-
m entas venenosos, estragados e desconhecidos”.24D urante os anos íj;
de prosperidade agrícola de Vassouras, as tabernas e vendas se j|
agrupavam próximo às fazendas de café, e um a autoridade municipal 1
profundam ente irritada comparou-os à igualm ente danosa praga do 1
café: “E les estão sugando a seiva do fazendeiro e são um a praga
talvez pior que a doença que ataca o café.”25O s fazendeiros também
não estavam im unes à pratica de diminuição do peso com um entre
as lojas locais. “D o ze arrobas de carne”, escreveu um fazendeiro
local, “chegaram empacotarias em três pacotes d e 4 arrobas cada.
Assim que chegaram, d ei ordem para que fossem pesados; dois
pacotes deram três arrobas, um terceiro deu três arrobas e um pouco
mais d e 7kg”. O pior d e tudo é que os p acotes chegaram em
“perfeitas condições”. ‘Agora você v ê”, concluiu o fazendeiro, “por
que tenho que encom endar certas coisas d e Iguaçu, pois quando
117
vêm do com ércio lo c a l... O com erciante não cobra pela remessa,
m as com pensa à sua m aneira”.26
A outro negociante em preendedor, o m ascate ou pim heiro
itinerante, o am plo m ercado potencial abastecido pela população
$•' escrava da fazenda era irresistível. D iferen te dos proprietários de
tabernas ou vendas, q u e comerciavam por trás d o balcão, os mas
cates percorriam as estradas do m unicípio d c Vassouras com peque
n o s baús d e m adeira o u de lata, amarrados às costas, para vender
diretam ente aos fazendeiros e seus escravos; outros usavam burros
ou m esm o carregadores para transportar a m ercadoria. Os mascates
vendiam aviam entos d e costura em bandejas de madeira ou canas
com tam po d e vidro e geralm ente incluíam em seu sortimento dc
mercadorias tecidos listrados ou quadriculados.27 Alguns incluíam
bilhetes d e loteria;28outros, que eram obrigados a fazer um depósito
de dois contos, “para indenizar aqueles que podiam ser enganados
p elo vendedor”,* ofereciam artigos d e ouro e prata, até diamantes
e condecorações que os novos barões ostentavam nas-la]idas.*
A lguns se especializaram em mascatear sapatos, folha-de-flandres e
utensílios d e folha-de-flandres e aguardente.31
Sabiam ente, o m ascate se concentrava primeiro nas prele-
rêndas das pessoas d o sexo fem inino da fam ília d o fazendeiio,
apresentando tecidos atraentes, fitas, jóias reluzentes e aviamentos.
Tais táticas e o Fato d e ser portador de boas notícias d o mundo fazi; un
com que o dono da casa desse perm issão para e le vender aos
\;
26. Barão d o Paty (F. P. de Lacerda Werneck) ao seu comissário, Bernardo
Ribeiro de Carvalho. Fazenda Monte A legre, 9 de dezembro de 1853
D ocum entos referentes à família Werneck. Arquivo Nacional.
27. D isposições da organização da Tabella, Artigo 7 ,1 0 de janeiro dc 1861.
A P V , 1861.
28. Pedido d e licença para mascatear bilhetes, 14 de fevereiro de 1853. APV, i»
1853.
29. Posturas da Câmara Municipal de Vassouras, 1857, Artigo 36.
30. D e uma lista de artigos encontrados no baú de lata de um mascate
multado em 1875 por náo ter pago sua licença. APV, 1875.
31. Auto de Multa contra Daniel Esposito, 17 d e janeiro de 1877. APV, 1877;
Pedido de lic e n ç a de Affonso Bandeira para mascatear folha-de-flandres,
13 de fevereiro de 1878. A P V , 1878; Carta da Secretaria do Governo da.
Província d o R io, 5 de juiho de 1873. A P V , 1873.
118
escravos, o verdadeiro objetivo de um grande núm ero d e m ascates.32
E le mostrava aos escravos seu sortim ento de reluzentes aviamentos
e tecidos ordinários e baratos e depois d e receber enfiava seu metro
dentro da bengala, colocava o baú nas costas, pegava um a valise de
mão epunha-seem m archaparaoutrafazenda. Q uando seu estoque
de venda se esgotava, retomava para um quarto alugado no centro
de Vassouras e se reabastecia nas grandes casas com erciais da cidade.
M ais para o final do século, apareceram outros tipos de vende-
" dores. A s lojas d e Vassouras empregavam ocasionalm ente seus
próprios m ascates. Joaquim José da Silva pagou por duas licenças
em 1853 quando tinha um “pequeno com ércio na cidade” e desejava
“enviar alguém para uma pequena mascatagem”.33Cardoso Pereira
de U m a & G a. explicou à Câmara M unicipal q u e “e le s não carre
ga m mercadorias para vender para nenhum freguês. A penas no fim
de cada sem estre, um funcionário visita os clientes para liquidar
contas e aproveita a oportunidade para exibir amostras de nova
mercadoria que nossa casa oferece aos seus clientes”.34 N a mesma
ocasião apareceu o “com eta”, com artigos que comprava no R io,
despachava para a ddade d e Vassouras een tã o enviava para clientes
espalhados pelo m unicípio. Qs clientes pagavam em dinheiro o u em
café e entregavam novos pedidos para a viagem d e volta.
U m a vez que os mascates entravam n o com ércio sem capital, o
ônus de uma licença municipal incomodava consideravelm ente, e
eles procuravam evitar os inspetores da Câmara. Alguns chegavam
a interromper a m ascatagem por algum tem po a fim d e enganar o
fiscal, antes d e retom ar sorrateiramente ao trabalho.35 Venância
P ortoree Francisco Caputo encontraram um expediente mais enge
nhoso: formavam uma sociedade de mascatagem, agiam “com o se
fossem sócios, em seguida se separavam assim que pagavam pela
licença e se juntavam a novos sócios”. A perda d e receita aborrecia
um fiscal atormentado com o problema d e agarrar o s mascates
119
trapaceiros, e e le se queixava: “Conheço alguns m ascates que ano
passado mudaram de sócios três vezes ou mais.”36
D e grande utilidade na distribuição d e mercadorias, especial-
m ente para os pobres livres e escravos que moravam distante dos
centros com erciais, os m ascates eram alvo de vigilância e controle
constante das autoridades m unicipais desde os primeiros anos do
sécu lo X IX . M uitos escravos africanos emancipados ou libertos
aparentem ente passaram a masca tear para ganhar a vida na década
d e 1830 e, conform e o nervoso G overno Imperial afirmou em sua
circular d e 1830, havia a “suposição e suspeita de que tais nqnos.
hom ens ou m ulheres, são os incitadoteseprovoçadoresdetum ultoí»
e agitações que têm influenciado aqueles que vivem na escravidão”.
“N enhum liberto pode deixar a grande ddade, a pequena cidade,
aldeia, fazenda ou a casa em que m ora para comercializar sem um
passaporte em itido peto Juiz Criminal ou Juiz de Paz”, para o qual
eram necessárias três testem unhas que assegurassem sua boa condu
ta, e sem declarar seu destino.3738N o ano seguinte, o regulam ento
m unidpal d e Vassouras criou um controle sem elhante sobre aqueles
que podiam atuar com o m ascates sendo brasileiros ou estrangeiios/'6
C inco anos m ais tardeopresidenteda provmcia deu ordem para que
todas as câmaras municipais mudassem ou acrescentassem tais con
troles sobre os mascates, fossem “escravos o u libertos, estrangeiros
ou brasileiros”.39 N a década d e 1840, os controles rigorosos foram
relaxados, já que o núm ero d e mascates portugueses imigrantes
reduziu qualquer possível am eaça d e “arruaceiros” libertos masca
rados d e m ascates.
A gora era vez dos m ascates estrangeiros. Quando a alta das
preços dos gêneros alim entícios na década d e 1850 perturbou os
fazendeiros brasileiros, parte da culpa caiu sobre os m uitos imi
grantes, inclusive mascates. “A s novas bocas... são d e estrangeiros,
120
que agora correm pelo pais como mascates sem nenhum a intenção
de se estabelecerem aqui, visando apenas ao lucro pela venda de
jóias baratas e objetos sem valor e depois se aposentarem quando
seus bolsos ficarem cheios. Atras deles vêm outros, pois há sem pre
um grande núm ero desses caçadores de riqueza.’ Em 1859 havia
15 m ascates licenciados em Vassouras, quase todos portugueses.4041423
Bar volta d e 1864, o núm ero de mascates italianos havia crescido o
suficiente para acarretar queixas exageradas do com ércio varejista:
(2)
121
A quela “pessoa m uito im portante das fazendas de cale’ "— o
arreador — estava incumbida do controle dos tropeiros ou toca
dores e da responsabilidade da chegada segura da valiosa <arga de
café ao armazém do com issário, distante léguas na costa. Para tais- 6
posições, os fazendeiros de Vassouras empregavam imigrantes por- %
tugueses dos A çores, quase sem pre solteiros. Exem plodisso foi o
arreador que se descreveu no tribunal com o “José de M enezes
V asconcellos, um hom em branco, nascido na Ilha Tèrceira, 24 anos,
solteiro”.445Pelos serviços prestados ao proprietário da Fazenda São
Fernando em 1850-1851, um arreador recebeu aproximadamente,
R s.30$000 por mês, um terço a mais que o salário pago a outro ■>?
“em pregado livre”, o supervisor da secagem 'do café no terreiro. Sem
dúvida o proprietário não calculava dessa maneira, mas o fato c que
20% da força de trabalho masculina produtiva e efetiva da fazenda !.
(“sem pre escolhida entre os m elhores”46) ou sete entre 35 esi nivos
eram tirados do cam po para trabalharem com o tropeiros. As des- ‘
pesas com o transporte não terminam aqui. As contas incluíam tais 1,
entradas no valor d e R s.45$000pagos por “uma mula de carga jvra
substituir outra que m orreu”, o custo de duas peças especiai de
arream entos de madeira gravada totalizando Rs.6$000, mais o pieçe
pago a “João Benguella pelo aluguel d e uma mula de caiga.
R s.l2 $ 5 0 0 ”, para não m encionar o “custo de hom ens e anim ai no
R ancho do A lto” durante um período de cinco m eses ou ?
R s.300$220.47A lém do mais, quando os fazendeiros envi avam caie
para Iguaçu, seus comissários cobravam o baldeam ento la to por
123
facas compridas presas às costas seguras pelo d n to.a N o fim da tarife
a tropa procurava um rancho o u estação secundária para pernoitar.,,
N ão encontrando nenhum a, os viajantes fatigados freqüentemeofe,'. -
acampavam no m eio da estrada ou trilha, descarregavam as sacas de,' ‘
café e arreios e acendiam uma fogueira para esquentar seu feijão,
arroz e café.525354D ias mais tarde, os hom ens cobertos d e poeira e suor.
chegavam às portas do com issário no R io ou Iguaçu, onde o caíé era,
descarregado e pesado im ediatam ente, e o total, comparado com a J
lista feita p elo fazendeiro. A lguns dias d e descansa, e a viagem d e
volta com provisões com eçava. \ /
A lém da dispendiosa m anutenção das tropas d e carga, os dançs
sofridos pelo café e pelos animais durante a viagem acarretavam
queixas interm ináveis por parte dos fazendeiros do interior. “Oç
habitantes desse m unicípio precisam lutar contra estradas horríveis,
poças d e lama e precipícios que consom em a m aior parte do lucro-
acum ulado d e seus produtos.... e causam a m orte de seus animais”,
escreveu um fazendeiro em 1835.M Outro se queixou em 1850; *
“Tdmos tido muitas tem pestades... os animais ficam assustados ao
passarem por um lamaçal tão alto quanto seu s peitos, ou quando
caem pela beira da estrada. O s tropeiros ficam cobertos de lama a o .
tentarem salvar as sacas d e café q u e na maioria das vezes ficam /-
úm idas, e o café se estraga. Num a tropa d e mulas, quatro ou cinco
geralm ente se afogam nesse mar d e lama.” N um trecho particular
m ente difícil o “tropeiro, árduo trabalhador, amaldiçoa u hora cm
q u e nasceu”!55 Lama e poças profundas eram temas recon entes
em outras queixas: “ Q uando as chuvas vêm, as estradas custam a
secar; chuvas diárias, faltad elu zsolare aconstantem archa d e tropas
e gado transformam os leitos d e estradas num mingau de lama tão
profundo que ffeqüentem ente m uitos animais são encontrados
afogados no m eio d e la ” Óbvias também eram as conscqüências
124
dessa situação: “Grandes prejuízos ao fazendeiro, que não apenas
perde o animal pelo qual pagou um bom preço, mas ainda perde no
preço d e seu café, estragado pelo contato com a lama”.54A situação
ficou tão ruim que, em 1854 e nos primeiros m eses de 1855, a
assembléia provincial fo i informada que os custos de transporte
absorviam mais de um terço do valor do café trazido do interior.565758
Gomo produtores e expedidores de café para os portos costei
ros, os fazendeiros insistiam que os “mais desejáveis m elhoram en
tos” fossem “facilidade de com unicação acima d e tudo” e que as
estradas fossem preparadas para as fortes torrentes de novembro,
“não apenas para o período seco’’.xPela m etade d o século tom ou-se
mais do que evidente que a participação dos fazendeiros na manu
tenção das estradas, apesar das posturas m unicipais em contrário,
era inteiram ente inadequada. Na verdade, a penúria do antigo
tesouro municipal e a imprecisão dos regulam entos municipais
tomavam difícil calcular onde deveria cair a responsabilidade para a
construção e m anutenção das estradas locais — se sobre o
fazendeiro ou a municipalidade.59Em 1830, uma estrada não-públi-
ca, portanto não-m unicipal, foi definida com o “privativa, usada por
alguns residentes” e deveria ser mantida pelos usuários contanto que
sua junção com qualquer estrada geral fosse mantida pelo fundo
provincial ou imperial.60 A falta d e uma definição precisa para
“alguns residentes” resultou num regulam ento apresentado em
1831 afirmando que todos os proprietários de terras deveríam
m anter... drenar e limpar estradas que defrontassem com suas
propriedades.61 Quatro anos mais tarde, as autoridades municipais
62. A P V , 1837.
63. Joaquim José Teixeira L eite e Camillo de Carmo para CM V, 20 de abril
de 1853.
64. Posturas da Câmara Municipal de Vassouras, 1857, Título 5, Artigos 68,
69.
126
petição, “que a estrada é a única fonte d e vida e prosperidade”.
Então, num tom profético, advertiu que “se vocês tirarem essa
estrada da cidade, a cidade terá que se mudar tam bém ”.65Os fazen
deiros mantinham mais laços sociais do que econôm icos com a
cidade, para onde enviavam suas famílias a fim d e passar parte do
ano em casas da cidade, para participar das festividades da igreja e
da vida social da pequena nobreza comercial e proprietária de terras.
Sua produção d e café, por outro lado, vinha diretam ente do m uni- '~ >
cípio para Iguaçu e para o R io. Assim a prosperidade da ddade 1 j V
estava mais vinculada ao tráfegp da Estrada da Polícia e às vendas a j'SÍ y
pequenasproprietáriosepessoaspobresdavianhançacloqueàvida U
econôm ica das fazendas de café. O fato de o s inspetores municipais
importunarem os fazendeiras pela não m anutenção das estradas,66
enquanto a Câmara M unicipal usava a receita pública para obras e
benfeitorias na cidade não era, na verdade, um contra-senso, já que
a receita derivava de im postos sobre atividades com erciais e não
agrícolas: casas com erciais da ddade, tabernas, vendas, m ascates,
hotéis, barbearias, alfaiatarias, marcenarias, sapatarias, açougues e
pontos de venda de bilhetes de loteria. Aproximadamente 66% do
total da receita municipal no próspero ano de 1859 foram prove
nientes de licenças e multas pagas pelos estabelecim entos com er
ciais; enquanto isso, a Câmara Municipal estendia 54% d e sua
receita a obras públicas da ddade (Quadro 9).
127
Quadro 9
R EC EITA E D E SPE SA D E O BR A S PÚBLICAS
D A C Â M A R A M UNICIPAL D E VASSO URAS,
1838-1879
SSÜL
ili!
O s fazendeiros tinham que usar seus próprios recursos para
construir e manter estradas vidnais que passassem por suas terras
128
ou de vizinhos até a junção com as estradas gerais do governo
provincial.67
E frequentem ente zelosos fazendeiros encontravam obstáculos
erguidos por seus vizinhos. Bernardo Caetano d e Freitas mandou
abrir uma trilha “sim ples” entre R io Bonito e m argens do rio Paraíba
ligando as picadas queseus vizinhos usavam paracom unicaçãoentre
suas fazendas. Um a vez concluída a trilha, ele achou que “todos os
m eus vizinhos negligenciam seu sagrado dever de m anter as estradas
que passam por sua propriedade”. O que o irritou ainda m aisfoi que
eles não limparam partes da trilha onde árvores cortadas na mata
virgem foram deixadas atravessadas no caminho. C ustódio C oelho,
a quem Freitas pagou uma pequena som a para abrir um atalho, usou
o dinheiro para limpar sua terra, deixando as árvores amontoadas
na trilha.6869Quatro m eses se passaram até que as autoridades muni
cipais verificassem as queixas de Freitas.
H ouve o caso de Salvador Lopes de Figueiredo, que alegou não
ter lim pado sua parte da estrada durante dois anos porque “estava
convencido de que por lei e senso comum os proprietários deviam
conservar apenas aquelas estradas úteis ao trânsito público de
viajantes e não para o conforto pessoal de dois ou três fazendeiros”.
Já que ele não tinha mão-de-obra escrava excedente para limpar a
estrada, tinha que “implorar aos seus amigos para efetuar o trabalho
à sua cu sta... a não ser que eles quisessem gentilm ente pagar eles
m esm os”. C om um estilo floreado encerrou seu discurso: “Como
quer que seja feito, aceitarei com o um grande favor e caridade.”®
N ão houve qualquer espírito d e cooperação quando H onório Fran
cisco Caldas enviou escravos para repararem uma parte da estrada
que sua represa danificara ao transbordar. N esse local encontraram
129
um fazendeiro enraivecido que insistiu que o nível da represa 1icas.se
perm anentem ente baixo e que Caldas o indenizasse por perdas e
danos. Caldas cham ou de volta seus escravos e deixou unir “imensa
poça d e lama” que im pedia todo o tráfego. Perguntou o diligente
inspetor da Câmara: “Essa Respeitável Corporação aterrai a .1 poça
o u reabrirá a antiga estrada?”* Quando os inspetores importuna
vam os fazendeiros com queixas quanto à falta d e manutenção da-,
estradas, esses retrucavam que “em tem pos passados a estrada era
conservada pelos cofres provinciais”7071ou “a Câmara deveria cuidar
d e tais necessidades”,7273ou se refugiavam em brechas legais deixadas
nas posturas, insinuando que uma estrada continuava sendo parti
cular, não m unicipal, porque tinha sido usada sem seu “conhe
cim ento e tolerância”. Enquanto a maioria dos fazendeiros negli
genciava as estradas, outros ansiosos por terra incorporavam-nas a
suas propriedades “destruindo pontes, cavando valas ou empilhan
d o madeira n o m eio do leito da estrada”,74 dando um péssimo
exem plo aos seus vizinhos caso não fossem punidos. E depois que
os escravos foram libertados, as boas intenções dos fazendeiros com
relação à m anutenção das estradas não tinham vez porque lhes
faltavam m ão-de-obra e dinheiro.75
C om o um corpo eleito, a assem bléia provincial reag iu às pode
rosas pressões exercidas por eleitores d e uma província ngiícola em
expansão e muita prosperidade. Logicam ente os fazendeiros solici
tavam aos representantes provinciais capital suficiente p<i< mantu
?aquelas estradas gerais próximas às fazendas d e café em expansão.
jÓ s fazendeiros tam bém não eram contra a possibilidade Jc obter
ium bom lucro através da venda da madeira desuas floresti is a “pi ecos
• excessivam ente elevados” para uso na construção de pontes n<ts
70. A P V , 1867.
71. Fiscal Joaquim Antonio de M acedo Tupinambá para CMV, 1856. APV,
1856.
72. Tupinambá para CMV, 12 de março de 1855. APV, 1855.
73. Suplicante: Francisco Gomes d’Assumpçao, Suplicado: Salusmano de
Souza Freitas, março de 1879. APV, 1879.
74. Antonio Florèncio Pereira do Lago para CMV, 11 de dezembro de 1862
APV, 1862.
75. Registro fiscal, 7 de janeiro de 1889. APV, 1889. ,
130
estradas provinciais.™ N ervosos com a constante pressão pela cons
trução de estradas por toda a província, os presidentes provinciais
da m etade do século cuidavam das estradas que haviam proliferado
por toda parte, e o ônus de sua manutenção ficava por conta dos
orçamentos provinciais. Dentro do m unicípio d e Vassouras, havia
numerosos exem plos d e estradas gerais paralelas, um a substituindo
a outra em importância e — quando sua utilidade desaparecia —
em abandono. Joaquim José Teixeira L eite estava sem dúvida m o
tivado pelos sucessivos abandonos num período d e 15 anos do
Caminho N ovo, Estrada do Vem ek e estrada do C om m ercio, quan
do censura as autoridades provinciais. “Existem tantas estradas não
apenas úteis, mas de extrem a necessidade, e não há fundos para sua
conservação”, enquanto “despesas desconcertantes são feitas sem
nenhuma certeza d e que serão benéficas, ou m elhor, com evidentes
sinais de sua im propriedade.” “Certamente”, alegou, “a experiência
deveria ter ensinado q u e é um grande erro construir inumeráveis
estradas e im ediatam ente abandoná-las.” Filosoficam ente, con
cluiu: “EssaCâm ara... sabe porexperiência que existem duas classes
dc indivíduos sempre prontos a prometer milagres raram ente cum
pridos: descobridores d e minas e de pequenos atalhos.”7677
Por toda a província do Rio, os problem as das estradas de
Vassouras foram duplicados anos após anos e resum idos com fra
seologia sem elhante. O relatório de 1841 do presidente provincial
atacava o desvio dos fundos de manutenção d e estradas, sobrando
pouco para com pletar artérias importantes e com plicando qualquer
supervisão ofíciaL78‘As antigas estradas seguiam planosdefíçientes”,
escreveu um presidente em 1854, “e a prova reside no fato de que
seria difícil encontrar em todo nosso país um território atravessado
por tantas estradas quanto nossa província.”79 Q uatro anos mais
tarde, outro presidente lamentava as “dispendiosas estradas que
satisfazem apenas pressões locais e interesses m uito lim itados quan
do a vida de nossa nação exige a construção de grandes artérias que
131
tracem as linhas principais de nosso sistem a d e transporte”.80No ano
seguinte foram realçados os defeitos e distorções dentro da hierar
quia administrativa provincial onde o presidente investigou a “falta
d e continuidade administrativa, sucessão rápida d e presidentes,
aborrecim entos e inim izade encontrada pot quem decide se opor a
m ilhares d e interesses individuais e desse m odo perde seu zelo e
dedicação.”8182M eses mais tarde, outro registro criticava a situação
em que “muitas estradas paralelas com petem umas com as outras,
ligando pontos terminais sem levarem a um ponto im portante...”
nas seçõ es intermediárias.® Examinando mais d e m eio século de
construção de estradas, o relatório provincial d e 1861 observou que
“quase todas as estradas foram construídas em solo impróprio e se
deterioraram por causa da constante passagem d e tropas e outros
veícu los.. eosestragos d e “copiosas chuvas de verãoquesó podem
ser reparados no fím da estação... Fazer reparos n o verão seria jogar
dinheiro fora”.83 O relatório presidencial retom ou no ano seguinte
ao tem a “plano incom pleto”, “interesses locais ao acaso” e o “caráter
tem porário da construção de estradas” — um ciclo d e 25 anos de
queixas — , em bora m itigasse sua crítica com a observação d e que
tais práticas eram com uns entre “países jovens, que, na falta de
experiência, tentam apressar o caminho do progresso m aterial.”84
Na sua ânsia d e construir estradas rapidamente, sem contar com
suficiente força d e trabalhe» para obras públicas, as autoridades
provinciais passaram para os em preiteiros a constm ção e manu
tenção d e estradas. E sse sistem a mobilizou dois interesses conflituo-
I sos, o desejo do em preiteiro de obter lucros m aiores versus a boa
j m anutenção das estradas. A luta era desigual, conform e registros
' provinciais informaram à Assem bléia. Contratos pobrem ente redi
gidos superestim avam os custos, permitiam especulação e favore
ciam os astutos, que se aproveitavam também do núm ero insufi
ciente de engenheiros supervisores designados para cobrir amplas
áreas.85Existia um pequeno policiam ento nas estradas para impedir
80. Relatório, 1858, p. 83.
81. Relatório, I o de agosto de 1859, p. 48.
82. Relatório, 16 de abril de 1861, pp. 14-15.
83. Relatório, 4 de maio de 1862, p. 68.
84. Relatório, 4 de maio de 1862 , p. 68.
85. Relatório, 3 de maio de 1864, p. 7
132
e corrigir o mau procedim ento de tropeiros e carroceiros. N a verda
de, a confiança da província na fé contratual sem garantias de
supervisão durante a construção e m anutenção forjou um círculo de
irresponsabilidade. Chamado .para prestar con tas sobre o péssimo
estado da estrada, o em preiteiro da construção se defendia citando
cláusulas contratuais ou acusando viajantes p or estragos que ele
havia reparado “na véspera”; os viajantes alegavam que o estrago
era inevitável porque tinham que se livrar das enorm es poças de
lama, e o indolente em preiteiro dizia que o m au tem po era aforce
majeure de “tantos danos”. Tàl irresponsabilidade beneficiava ape
nas o em preiteiro d e manutenção, que seguia o “ortodoxo preceito
d e salvar sua própria pele” e esperava pacientem ente que o “sol
reparasse todos os estragos que a chuva havia causado”.86 Desse»
lam açal administrativo e financeiro, uma ferrovia parecia ser a saída
im ediata.
(3)
133
rápido e conseqiientem ente distribuição mais barata das importa
ções de sal, tecidos e vinhos do R io (um vagão fo i retratado transpor
tando pianos e vidros), o prospecto prom etia resolver as dificuldades '
d e transporte dos fazendeiros. “N ão haverá mais lugar para as
dispendiosas tropas de mulas, não haverá mais riscos o u estragos
causados por arreadores incom petentes e animais moribundos e
fam intos. i
A despeito das prom essas de transporte mais barato que o
prospecto da ferrovia garantiu aos fazendeiros de Vassouras e aos
m oradores do V ale do Paraíba, passaram-se 15 anos a té que a
construção fosse inidada. Thom as Cochrane, que preparou o pros
pecto d e 1839, não conseguiu cumprir sua concessão.878889Acima de
tudo, aos financiadores de uma ferrovia através dos distritos de
plantação d e café careciam influênda política e um clima financeiro
favorável para investim entos.
N ão tiveram que esperar m uito. Em 1825, a marcha dos acon
tecim entos nacionais e estrangeiros m udou radicalmente a situação.
A crescente facilidade de com unicação com a Europa e notícias em
jornais sobre debates parlam entares franceses acerca d e uma ferro
via renovaram o interesse brasileiro. O fim do trafico d e escravos
africanos originou uma reserva d e capital; e um balanço n o pêndulo
político colocou no poder o Partido Conservador, sobre o qual os
cidadãos mais im portantes d e Vassouras tinham influência. Não
obstante, m uitos fazendeiros do Vale do Paraíba permaneciam
indecisos, tem endo a drenagem financeira com a construção da
ferrovia. Outros insistiam que só havería tráfego suficiente para um
dia por m ês.8* M uitos fazendeiros d e Vassouras duvidaram que
algum dia o difícil projeto fo sse realizado. “Em 10 anos a ferrovia já
deverá ter ultrapassado a serra do M ar em busca de pontos onde
possa receber nossos produtos”, redigiu o Barão do Paty ao seu
87. Plano de uma estrada de ferro desde o município da Corte até a Vila de
Rezende. R io de Janeiro, 1839, na Typographia da Associação do Desper
tador dirigida por F. de S. Torres H om em , A PV , 1840; Artigo de ofício
caminho de ferro entre o município da Corte e a p m ín c ía de São Paulo.
R io d e Janeiro, 1840. A P V , 1840.
88. C. B. Ottoni, Esboço histórico das estradas de ferro do Brasil (Rio de
Janeiro, 1866), p. 5.
89. Ottoni, Esboço histórico, p. 6.
- comissário. ‘Ainda tenho dúvidas arespeito disso. N ossas esperanças
muitas vezes não se realizaram, e os hom ens n ã o mudam.”* N o
entanto os irmãos Teixeira Leite, d e Vassouras — Joaquim José,
João Evangelista e Francisco José, e um parente afim, Caetano
Furquim de Alm eida — , com amplos investim entos financeiros
junto a fazendeiros locais e casas intermediárias do R io, empurraram
o projeto. Sem dúvida tinham esperanças de q u e sua iniciativa
trouxesse a concessão para a construção da ferrovia.9091 Certamente
Joaquim José Teixeira L eite percebeu as vantagens com erciais se a
ferrovia passasse pelo centro do município, pois um a estação central
serviría com o um ponto d e baldeação de carga e passageiros vindos
da cidade do R io e das províncias vizinhas d e S ã o Paulo e Minas.
Afinal de contas, com o líder dos interesses com erciais d e Vassouras
e funcionário da Câmara, ele havia afirmado um a década antes que
a Estrada da Polícia era a “única fonte de vida e prosperidade” e “se
vocês desviarem essa estrada da cidade, a cidade terá que se mudar
também”.
A Estrada de Ferro D om Pedro H, que atravessa o Vale do ;/
Paraíba, foi construída depois de 1855, mas os Teixeira L eite não
conseguiram sua concessão, e os engenheiros am ericanos decidiram '
transpor as m ontanhas costeiras para alcançar as terras planas ao
longo do rio Paraíba em Barra do Piraí, desviando do centro do
m unicípio de Vassouras.92 D e Barra do Piraí em direção ao leste
passando pelo m unicípio de Vassouras, os trilhos seguiam as mar-
gens do Paraíba com paradas em Ypiranga, Vassouras, Commereio
90. BarSo do Paty para Bernardo Ribeiro de Carvalho, 1854 (?). Em docu
m entos referentes à família Wemeck, Arquivo Nacional.
91. O s membros da família contrataram engenheiros ingleses para fazer o
levantamento topográfico de um possível trajeto. Ottoni, Esboço históri
co, p. 6 e José M atoso Maia Forte, “A Fazenda do Secretário”, pp. 11-12.
92. N a amarga luta acerca de onde localizar os trilhos sobre as montanhas
costeiras, as fontes variam do abertamente a d ep to ao ambíguo. Ver
Ignácio Raposo, História de Vassouras, p. 156; O ttoni, Esboço histórico,
pp. 6-7; Relatório apresentado pela diretoria aos acionistas da Estrada de
Ferro D. Pedro II em 31 de janeiro de 1857 (R io de Janeiro, 1857),
pp. 10-12.
135
■m
136
adequada a carroças, inclusive as de quatro rodas” * Para os fazen
deiros de Vàssouras nesse período, a Presidente Pedreira oferecia a
suprema vantagem, dp transporte de carroça, e em resposta a essa
crescente conscientização veio uma segunda observação da Câmara,
em 1853, d e que a Presidente Pedreira não “era apenas especial
m ente vantajosa, mas ainda absolutamente necessária para a cidade
d e Vassouras e a m aior parte do município, que até esta data não
tinha uma única estrada de carroça para se viajar para a C orte (R io
d e Janeiro) e para transportar certas cargas volum osas”.*’ A té o
registro provincial daquele ano ecoava o desejo dos fazendeiros de
transportar café em carroças na Presidente Pedreira.5”Aborrecidos
por verem o centro com ercial estagnado enquanto tropeiros, carro
ceiros e boiadeiros davam preferência à nova estrada, os membros
. da Câmara reclamaram a construção de um desvio a partir da cidade
até M endes na Presidente Pedreira.*
Quando os trilhos da ferrovia se aproximaram da cidade de
Belém , situada no sop é das montanhas costeiras, o critério do apoio
financeiro provincial à Estrada de Ferro D om Pedro II tom ou-se
evidente. N o projeto original do traçado através das planícies até
B elém haveria estações “em pontos de junção com estradas de
tráfego pesado”.* M as na segunda seção da ferrovia, entre Belém e
Barra do Piraí, a Presidente Pedreira podja canalizar sua carga em
pontossucessivos em vagões de carga, à medida que o s trilhos subiam
as m ontanhas costeiras seguindo o caminho tanto da ferrovia quanto
da estrada principal, ou seja, o caminho do afluente ribeirão dos
M acacos. O ríginalm ente uma estrada direta entre M inas e o porto
do R io de Janeiro, a Presidente Pedreira tom ou-se agora uma linha95678
137
d e abastecim ento para a ferrovia.100A lém do m ais, quanto mais os ■
trilhos subiam as m ontanhas costeiras, mais rapidam ente o tesou m
provincial reduzia os programas d e m anutenção das partes abando
nadas da Presidente Pedreira. Para evitar um trecho pantanoso da
estrada, a Pedro II abriu um tronco para M acacos em 1861; imedia
tam ente a província passou a econom izar 2:52ó$400 por ano em
, m anutenção.l01Em l8<S2,opiesidenteprovincialpropôsoabandono
com pleta d e todos o s trechos da Presidente Pedreira que atra-
i vessavam o m unicípio d e Vassouras “tão logo a construção da Ks-
| trada de Ferro D om Pedro II esteja concluída n o lo c a l”11" S ete anos
: m ais tarde, alguns trechos da abandonada Estrada Presidente Pe
dreira foram descritos: “O leito da estrada está em péssimas con-
I dições, e quase todas as pontes caíram .. .”10B
A ju n ção da Pedro Ô com outras estradas outrora m uito movi
m entadas tam bém fez piorar as condições da estrada dentro do ,
m unicípio d e Vassouras, pois não havia m ais fundos para a manu- ■
tenção da estrada provincial. Quando a estrada de ferro cruzou a
Estrada da Polícia nas margens d o Paraíba na estação de Vassoui as.
a vários quilôm etros do centro da cidade, previu-se que a Icicena
seção, ainda em uso, seguiría o destino das outras'duas seções.1911034
Sobre a Estrada do Com m ercio escreveu um pequeno comerciante,
quando a ferrovia chegou à estação do Commercio, onde a estrada
entrava no m unicípio: ‘A penas suas ruínas perm anecem , pois seu
estad o d e abandono é lam entável. N ão há com ércio nem manuten
çã o da estrada. A penas aqueles proprietários que não podem aban
doná-la perm anecem .”1 Com certeza as autoridades provinciais
estavam plenam ente cientes d o que estava acontecendo. U m rela
tório registrava: “M uitas estradas que ficaram sem condições de
tráfego antes da construção d e ferrovias... perderam m uito sua
im portância.”105106D ezesseis anos após a colocação do prim eiro trilho
138
n§
roí
139
no últim o parágrafo. “N osso inform ante nos disse que havia muitos
m ortos e diversos feridos.”®9Quatro dias mais tarde outro atrope-
lam ento perto d e Barra do Pirar deixou um engenheiro com as>
“pernas despedaçadas e abdom e esm agado e ele morreu imedia
tam en te... Era casado e deixa m ulher e filhos”. N esse caso o jornal
fez um edital com entando que “Tais fatos, que se repetem com
freqüência, exigem toda atenção e preocupação da hierarquia ad
ministrativa da ferrovia” .10
9
110 » ;*
O s fazendeiros rapidam ente se reorientaram no sentido de
| mudar as condições de transporte local, o índice d e adaptação
í variando com a distância que separava suas fazendas da estaçãom ais
i próxima. Quatro anos d epois que a Pedro H chegou ao Vale do
1 Paraíba, asubstituição de animais d e carga por carroças deboi estava
íi bem adiantada. A tendendo a uma solicitação provincial de 1868,
'^ fu a n to aos tipos de animais de carga utilizados h o município, um
vereador de Vassouras replicou que “bois e animais d e carga são
em pregados nesse m unicípio para serviço d e transporte. Qs fazen
deiros que estão próximos a estações da Pedro II e têm estradas à
sua porta usam bois”.1110 que mais caracterizou a m udançadom eio'
de transporte fo i o aum ento do rebanho bovinõnas fazendas e a
dim inuição demnimais d e carga num período superior a 30 anos a
"partir de 1850. A pós a m etade da década d e 1860, os boísrapida-
rríentê sühstííuíram as mulas d e carga; pouco depois de 1873, o preço
dos bois superou o de animais de carga, atingindo em alguns anos
duas, às vezes três vezes seu valor.112
A s vantagens do novo sistem a de transporte eram claras para os
fazendeiros. O s carros d e bois gastavam um a pequena parte do
capital anterionnente despendido com mulas d e carga ecom pessoal
livre-e escravo. Enquanto o s tropeiros escravos eram transferida
para os reduzidos grupos d e trabalho riõ cãmjx^
A>>' perto d e uma centena de arrobas (aproximadamcrité "li5dÕkg) de
° :r"x "café ensacado a uma veíocidàde de 4kmyh aproximadamente; sob a
direção d e um único m estre-carreiro escravo, um carro puxado por
140
4 J|
fj duas ou três juntas d e bois começaria sua viagem an tes d o nascer do
so le retornaria após o o ca so , eliminando as contas d e rancho, com o
a alim entação do pessoal e o pasto dos animais. N a volta, os carros
® L Iraziain mercadorias encom endadas ao comissário n o R io e despa
chadas por ferrovia. E além d e tudo o isolam ento da fazenda, até 4
então reforçado pelos estreitos e tortuosos cam inhos d e mulas, 4
com eçou a diminuir à medida que se com eçou a investir em estradas ^
ISf/«on ais próprias para veículos de rodas, não apenas carros de b ois,/
■
mas carroças puxadas por cavalos, com duas e quatro rodas, m a is/
I
-! ' W f
ligeiras, carruagens leves e tflburis.
<Jlte M uitos fazendeiros ansiavam por troncos da ferrovia que pu
É.íM í
a S * dessem reduzir a distância percorrida por seus carros d e bois até as
i I- : estações da Pedro l í no perím etro do município. E ssas idéias eram
Ifp: bastante populares nas duas principais áreas produtoras de café do
município — o vale Massambará e a região d e Pati do A lferes — ,
onde os grandes fazendeiros podiam prever “m uita retração e
/desesperança por parte dos fazendeiros cujas plantações ficavam
longe da Pedro IL. porque careciam de “m eios fáceis d e transpor-
tar sua produção agrícola”. Conforme raciocinavam, onde “a força
propulsora da civilização” — a Pedro R — corria, a agricultura
prosperava, enquanto as áreas afastadas mergulhavam numa “apatia
i vergonhosa”.113A ntes d e os trilhos alcançarem R odeio, no afluente
ribeirão dos M acacos, os fazendeiros fizeram uma petição para uma
estrada de Pati para R odeio ou M endes;114e eles apoiaram a campa
inha durante nove anos até que o governo provincial aprovou em
1870 a construção de uma estrada de Pati até B elém sobre a serra j
do M ar.115 O s fazendeiros de Massambará se alegraram; no ano
seguinte quando os ricos comerciantes de Vassouras fizeram circular
planos para uma ferrovia d e bitola estreita para unir Massambará a
M endes na Pedro D .116 Em 1874, a febre de ferrovia atingiu Pati
/.também, e um rico fazendeiro e comissário do R io daquela área,
Ips/ 141
■J
!
(4 )
142
problemas que a nova ferrovia tem im posto a v o cês ”12012— não
mitigaram os sinais de decadência comercial por todo lado. A s casas
n o antigo Caminho N ovo em Pati foram vendidas porque a aldeia
estava “com pletam ente decadente ”13 em 1865. Pati continuou
abandonada durante os 22 anos seguintes e por sua estrada “quase
não passavam viajantes, devido ao enorm e núm ero de estações da
Pedro U que pontflham as extremidades desse m unicípio e e lim inam
uma estrada por onde passavam os mais variados produtos d e M inas
a cam inho da capital do Império”.122 Im pressionantes foram os
efeitos sobre o valor dos prédios construídos para o com ércio ao
longo das estradas principais agora abandonadas: en tre 1 8 6 2 e 1865
uma loja, uma residência, dois ranchos e um salão d e bilhar em
Q uilom bo, na Estrada W emeck, desvalorizaram 75% ; outra loja e
moradia desvalorizaram 87% , e um terceiro grupo d e prédios,
47 % ,123A s vendas ao longo da Estrada da Polícia, perto de Sacra
Família, informavam à Câmara em 1863 que a região estava “deca
dente”,já que os consum idores passaram a fazer com pras na estação
ferroviária de R odeio. A companhia de Braga & P ues exigiu uma
taxa d e licença mais baixa, uma vez que “a decadência d e Sacra
Família em Graminha é bem evidente devido à criação de um novo
centro com ercial... na estação de Rodeio, para onde foram todos os
fregueses”.124E no desastroso ano de 1863, outro com erciante, dessa
vez de Vassouras, apresentou uma solicitação sem elhante “em vista
da triste condição a que o com ércio dessa cidade ficou reduzido ” .125
Alguns pequenos com erciantes deixaram Vassouras atrás do “gran
de núm ero de trabalhadores que têm que procurar em prego em
outros m unicípios porque aqui não há nenhum ” .126 Quando os
trilhos da ferrovia alcançaram a estação de Vassouras no rio Paraíba,
120. B ern ard odeSouzaF ran cop araC M V .lld eou tub rod e 1865. APV, 1865.
121. Inventário, 1862, falecido: Baráo do Paiy, inventariante: Francisco de
Assis e Almeida, Fazenda das Palmeiras, CPOV.
122. Torquato de M acedo Silva à CMV, 16 de fevereiro de 1887. A PV , 1887.
123. Inventário, 1862, falecido: Bardo do Paty, inventariante: Francisco de
Assis e Almeida, Fazenda das Palmeiras, CPOV.
124. Braga & Pires â CM V, 1863. APV, 1863.
125. APV, 1863.
126. Exposição, dezembro de 1864. APV, 1864.
143
os m aquinistas iam direto para lá sem entrar na cidade. M esm o os
rebanhos que anteriorm ente atravessavam o m unicípio a caminho
dos m atadouros do R io deixaram de passar pela Estrada da Polícia
para serem embarcados em trens de carga em Rodeio; a província
se recusava portanto a fazer qualquer reparo na estrada inútil.13
N em a prosperidade das estações ferroviárias do perím etro perdu
rou. H á registro deque R odeio sofria de “apatia com ercial” em 1867,
pois os consum idores preferiam comprar diretam ente no R io. O
fator m ais im portante por detrás do declínio com ercial veio à tona
no relatório anual da Câmara M unicipal em 1869, quando João
R ibeiro d os Santos Zainith enfatizava “o avanço da Estrada d e Ferro
Pedro n , que permitiu aos consum idores obter provisões nos mer
cados do R io ” .12
7
182913
0
M uitos com erciantes tentaram m anter seus negócios a despeito
do reduzido volum e d e com ércio, recebendo ajuda de autoridades
m unicipais tolerantes que reduziram as taxas d e licença. R ir volta
de 1870, no entanto, a esperança d e um retom o à época próspera
diminuiu, e o êxodo teve início. F elipe Laport, m ascate, avisou à
Câmara em 1870 que estava partindo “depois de mascatear merca- i
dorias secas e aviam entos nesse m unicípio desde 1863 até o ano
passado ” .139 O êxodo se acelerou por volta de 1877, quando as
notícias da partida de todos os tipos de negociantes preenchei am as
colunas dos jornais locais. “D om ingos Carvalho Guimarães vende
seu n egócio de com idas e bebidas porque deseja partir.” “Tòrquato
Ü f4
V illarinho roga aos seus fregueses que gentilm ente saldem as dívidas
o m ais rápido possível.” 131 Uma sem ana mais tarde, Augusto Chris-
tiano de Freitas, “antigo proprietário do H otel Quatro Colunas, roga
a seus devedores através desse jornal que se dirijam ao hotel p;
pagar as contas para que ele possa saldar suas dívidas”.132No:
seguinte um artista local, A ntonio Joaquim Pereira Falcão, anunciou
144
sua intenção de deixar Vassouras e ir para Cam pos, onde estava
m ontando uma loja.133 Aqueles que tentaram resistir à rastejanter
depressão apresentaram às autoridades municipais um quadro som -1
brio da decadência com ercial por toda Vassouras em 1878 e 1879. í
M anoel Martins da Silva solicitou uma taxa d e licença mais barata
em 28 de fevereiro d e 1878, porque os negócios ao longo da ferrovia
entre Cbmmercio e Cazal estavam “decadentes”; A ntonio Lopes
Cancella avisou em março quenão garantia o pagam entodesua taxa
de licença, pois as condições de negócios em C om m erdo estavam
“decadentes”; do sopé da serra do Mar, José Teixeira da íòn seca
Bastos descreveu a “decadência dos M acacos” em dezem bro de
1878, e, de Sacra Família, José Furtado D om ingues d’01iveira reite
rou “a decadência desse lugar” em março d e 1879.133135O declínio
com ercial também afetou os casais, uma vezq u e o salário m édio que
as casas com erciais pagavam aos funcionários n ão dava para o
sustento da família de dois. U m jovem herói de uma pequena história
corajosam ente declarou: “Irei para o R io e lá conseguirei um traba
lho que propiciará o suficiente para viverm os juntos de maneira
m odesta ”335 O declínio entrou na conversa de duas comadres que
tagarelavam uma manhã acerca das notícias sobre uma ferrovia e
uma linha telefônica que, segundo os boatos, ligariam Vassouras à
estação ferroviária no rio Paraíba. “E o que a está surpreendendo?”,
perguntou uma. “N osso progresso e atividade”, respondeu a com a
dre Paula. “Pensando bem , é nossa atividade— agora uma fruta rara
nessas redondezas.”136137
A redução dos laços sociais entre as famílias de fazendeiros e o
povo da cidade seguiu-se ao declínio com ercial. O custo de uma
passagem d e trem era insignificante, a viagem era breve o suficiente
para tranquilizar osm ais m edrosos, e em questão de horas as famílias
dos fazendeiros podiam passar férias no R io. M ais cedo ou mais
tarde, conform e escreveu Barroso, todos tinham q u e passar férias
na capital para ir à ópera ou, quando as damas estivessem interessa
das, com prar uma nova toüette.w Alguns moradores da cidade, que
133. O Município, 2 de setembro de 1877.
134. A PV , 1878,1879.
135. “O Juramento”, O Município, 2 2 d e julho de 1877.
136. “Unia visita”, O Vassourense, 30 de abril de 1882.
137. Raposo, História, p. 208.
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se lembravam das lutas das autoridades para manter a indepen
dência m unicipal na década d e 1850 dos controles cada v ez mais
rígidos da Capital Im perial, viam n o declínio com ercial, e especial-,
m ente no declínio social da cidade, outro sinal do que criticavam
com o “centralização”. M enos d e una quarto de século após aépoca
de maior prosperidade, outros se referiam à cidade com o prestes a
entrar no seu “período de decadência”. Já não havia mais a “vida, a
anim ação, o alvoroço d e 20 anos atrás”, recordou nostalgicamente;
um habitante da cidade em 1822. “H avia então o ruído das carroças,
o trote d e animais, gritos d e crianças, o s cantos d e rua dos vendedores
ambulantes de to d a esp éçied efru ta sed o ces... ouivodoscachorros
nas estradas que conduziam a esse antigo em pório d e mercadoria.”
C om m ais tristeza ainda, concluiu: “Vassouras hoje não é o que
costum ava ser”.138139
N ão obstante, a m elancolia, as lágrimas e as reconstruções
jornalísticas românticas dos anos tranquilos d o final da década de 70
e início d e 80 refletiam apenas um aspecto da econom ia municipal
— o com ercial. A redução d o com ércio local trouxe o declínio
econôm ico ao centro da cidade e a pequenas aldeias antes que os
sinais d e decadência aparecessem na região agrícola, cujo lento
declínio fo i consequência do envelhecim ento e não renovação fia
m ão-de-obra escrava e do esgotam ento do solo. Quando o povo da
cidade escreveu q u eo m unicípio haviasido “apunhalado no peito”121
pela ferrovia, eles confundiram a cidade com o cam po. Pois a cidade
d e Vassouras lam entou seu destino antes que a decadência agrícola
se tom asse evidente. N a verdade, em seus aspectos externos, a vida
da fazenda mostrava uma aparente riqueza resultantede um contato
mais próxim o com o litoral e da facilidade d e transporte. U m padrão
d e vida mais elaborado, uma ênfase maior em am enidades sociais c
no consum o de mercadorias im portadas — mobília, vestuário, ali
m entação, utensílios dom ésticos e livros— durante algum tem po e
até uma certa m edida encobriram a lenta paralisia que afetou a
produção agrícola. O s prédios das fazendas tom avam -se m ais atra
entes pela construção de jardins ou parques na frente ou atrás da
casa, on d e outrora existiram terraços de secagem . Papel de parede,
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cortinas, mesas com tam po de mármore, pianos, cadeiras d e balanço,
máquinas de costura, pesadas camas francesas, cabines de banho,
telhas de ferro e fogões de tijolos gradativamente alteraram a austera
sim plicidade das residências ricas.Os fazendeiros m enos prósperos, (
cujos contatos e créditos no R io eram mais lim itados, continuaram . ^
a viver com o sempre haviam vivido. j
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