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REVISTA CIENTÍFICA

ISSN Impresso: 1982-422X | ISSN Eletrônico: 2236-1774


Volume 12, Número 1, 2017
INFORMAÇÕES GERAIS
A revista Acta Tecnológica é uma publicação oficial de divulgação
científica e tecnológica do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia
do Maranhão e se destina a divulgar os conhecimentos técnicos, científicos
e culturais produzidos nesta e demais instituições da rede de ensino básico,
técnico, tecnológico e superior.
A missão da Acta Tecnológica é publicar artigos científicos, revisões
bibliográficas, relatos de casos, resumos de teses e dissertações, notas técnicas e
outros referentes às áreas de Ciências Agrárias, Ciência e Tecnologia de Alimentos,
Ciências Biológicas, Meio Ambiente, Educação, Letras e Artes, Ciências Sociais e
Ensino das Ciências e Matemática, contribuindo para a divulgação e promoção
de debates sobre temas de interesse estratégico para o desenvolvimento científico
e tecnológico regional e nacional.
A Acta Tecnológica tem periodicidade semestral, podendo, no entanto,
ser publicadas edições especiais.
A Equipe Editorial é composta por editores, um corpo de assessores
científicos e uma equipe de apoio nas áreas de revisão textual, normalização,
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completos são de exclusiva responsabilidade dos autores.

I59 ACTA Tecnológica / Instituto Federal de Educação,


Ciência e Tecnologia do Maranhão, v.12, n.1, jan-jun. 2017.
São Luís: IFMA - Pró-reitoria de Pesquisa, Pós-graduação e
Inovação.

Semestral
ISSN Impresso: 1982-422X | ISSN Eletrônico: 2236-1774
1. Ciências Agrárias 2. Tecnologia de Alimentos 3. Educação
4. Meio Ambiente.
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II. Título.
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Ciência e Tecnologia do Maranhão Flávia Arruda de Sousa

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Tecnologia da Informação
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Documentação e Normalização
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EDITORIAL
A Acta Tecnológica é uma revista do Instituto Federal do Maranhão que publica e divulga
pesquisas realizadas em educação, em ciência e em tecnologia. O lançamento de exemplar
de uma revista científica é sempre salutar dentro do meio acadêmico, pois divulga resulta-
dos de pesquisas e desenvolvimento tecnológico nas mais variadas áreas do conhecimen-
to e assim, cumprimos nossa finalidade de promover resultados de pesquisas realizadas e
desenvolvidas dentro da academia.
Neste volume 1 referente ao ano de 2017 em especial, publicamos trabalhos nas áreas das
ciências exatas e da terra: “Análise numérica do escoamento e dos coeficientes aerodinâ-
micos em aerofólios sem e com a utilização de flaps plain”; ”Comportamento hidrodi-
nâmico de um reator uasb e análise do tempo de pico”; “Estudo numérico da convecção
natural em uma placa plana vertical via fluidodinâmica computacional”; “Otimização da
segurança em canteiros de obras utilizando veículos aéreos não tripulados (vants) com
controle de voo via arduino yun”; nas áreas das ciências agrárias e biológicas: “Protótipo
de um sistema de irrigação baseado em iot para pequenos e médios produtores rurais”;
“Percepção ambiental e proposta didática sobre a desmistificação de animais peçonhen-
tos e venenosos para os alunos do ensino médio”; “Avaliação microbiológica de frutos
de cagaita (eugenia dysenterica)”; e na área do ensino: “formação de professores da ept e
narrativas de formação: uma revisão literatura”; “O uso das tecnologias da informação e
comunicação pelos discentes e docentes do proeja do IFMA - Campus Maracanã”; e “Prá-
ticas de letramento e igualdade de gênero: a literatura (trans)formando leitores”. Todos
esses trabalhos são frutos de pesquisas nos mais diversos níveis, desde a iniciação científi-
ca até resultados de doutoramento.
Esperamos que a leitura desses artigos da Acta Tecnológica do IFMA tragam ganhos em
conhecimentos, e suscitem ideias para o desenvolvimento de novas pesquisas dentro das
nossas instituições, em especial as da nossa região. Esperamos também que possamos,
através da divulgação desses artigos, aproximar os pesquisadores das áreas afins e até dis-
tintas para que formem grupos de pesquisas para que fiquemos cada vez melhores.
Por fim a equipe editorial da Revista Acta Tecnológica espera que este número atenda às
expectativas dos leitores, trazendo artigos de qualidade técnico científica, cumprindo sua
missão de divulgação e promoção de debates sobre temas de interesse estratégico para o
desenvolvimento científico e tecnológico regional e nacional.
Agradecemos todos os autores que submeteram seus trabalhos para esta edição e os pare-
ceristas pela disponibilidade em colaborar com o crescimento do periódico.

Boa leitura!

Gedeon Silva Reis


Diretor da Editora IFMA e editor da Revista Acta Tecnológica
SUMÁRIO
Análise do comportamento hidrodinâmico de um reator UASB.................... 11
Ana Carolina Monteiro Landgraf, Lucas Eduardo Ferreira da Silva, Aruani Leticia da Silva
Tomoto, Eudes José Arantes e Thiago Morais de Castro

Protótipo de um sistema de irrigação baseado em iot para pequenos e médios


produtores rurais............................................................................................... 23
Francisco Alan de Oliveira Santos, Mardoqueu Sousa Telvina, Plácido Soares das Chagas
Segundo e Mysael Römulo Batista de Carvalho

Estudo numérico da convecção natural em uma placa plana vertical via flui-
dodinâmica computacional............................................................................. 35
William Denner Pires Fonseca, Lourival Matos de Sousa Filho e Genilson Vieira Martins

Análise numérica do escoamento e dos coeficientes aerodinâmicos em aerofó-


lios sem e com a utilização de flaps plain........................................................ 47
William Denner Pires Fonseca, Lourival Matos de Sousa Filho e Genilson Vieira Martins

Otimização da segurança em canteiros de obras utilizando veículos aéreos


não tripulados (vants) com controle de voo via arduino yun........................ 65
Jackson Silva Nascimento, Bruna Bugarin Tavares Gonçalves e Cynthia Leonis Dias Cintra

Avaliação microbiológica de frutos de cagaita (eugenia dysenterica).............. 75


Ana Letícia Silva Coelho e Solange Cristina Carreiro

O uso das tecnologias da informação e comunicação pelos discentes e docen-


tes do proeja do IFMA - Campus Maracanã..................................................... 87
Luziane Melo da Silva e Christiane Ferreira Lemos Lima

Percepção ambiental e proposta didática sobre a desmistificação de animais


peçonhentos e venenosos para os alunos do ensino médio ........................... 99
Azevedo, B.R.M. e Almeida, Z.S.

Formação de professores da educação profissional e tecnológica - ept e narra-


tivas de formação: uma revisão literatura..................................................... 111
Juliani Natalia dos Santos e Vantoir Roberto Brancher

Práticas de letramento e igualdade de gênero: a literatura (trans)formando


leitores............................................................................................................. 129
Lívia Maria Rosa Soares
Recebido em 30/09/2017; Aceito em 18/12/2017; Publicado na web em 14/03/2018

Análise do comportamento
hidrodinâmico de um reator UASB
Ana Carolina Monteiro Landgraf1;
Lucas Eduardo Ferreira da Silva2;
Aruani Leticia da Silva Tomoto3;
Eudes José Arantes4; 11
Thiago Morais de Castro 5;

1 Estudante do Curso de Engenharia Ambiental da Universidade Tecnológica Federal do Paraná; E-mail: analandgraf@alunos.utfpr.edu.br;

2 Estudante do Curso de Engenharia Ambiental da Universidade Tecnológica Federal do Paraná; E-mail: lucas.2013@alunos.utfpr.edu.br;

3 Estudante do Curso de Engenharia Ambiental da Universidade Tecnológica Federal do Paraná; E-mail: arutomoto@hotmail.com;

4 Professor do Curso de Engenharia Ambiental da Universidade Tecnológica Federal do Paraná; E-mail: eudesarantes@utfpr.edu.br;

5 Professor do Curso de Engenharia Ambiental da Universidade Tecnológica Federal do Paraná; E-mail: engenheirothiagocastro@gmail.com;

RESUMO
Este trabalho teve como objetivo analisar os tempos de pico da modelagem hidrodinâmi-
ca e avaliar o comportamento hidrodinâmico de reator UASB, com volume útil de 21 L. O
reator foi operado com tempo de detenção hidráulica (TDH) de 20 h. O comportamento
hidrodinâmico foi avaliado utilizando ensaios de estímulo-resposta tipo pulso, com o uso
de eosina Y como traçador. A partir do ensaio hidrodinâmico, foi verificada a presença de
vários picos na concentração do traçador ao longo do tempo, o que pode ser explicado
devido à possível presença de caminhos preferenciais ou devido aos problemas na manu-
tenção da vazão. O modelo teórico que melhor se ajustou ao ensaio foi o de tanques de
mistura completa em série (N-CSTR), resultando em 4 reatores. Os tempos de pico encon-
trados por meio dos cálculos realizados foram de 8,26, 32,85 e 28,51, para os cálculos 1, 2
e 3, respectivamente. Esses resultados foram importantes para a confirmação e explicação
de possíveis anomalias.

Palavras-chave: reator UASB. Ensaio hidrodinâmico. Tempo de pico. Eosina.

ACTA TECNOLÓGICA v.12, nº 1, 2017


Analysis of hydrodynamic behavior of a
UASB reactor
ABSTRACT
This study aimed to analyze the peak times of the hydrodynamic modeling and evalua-
12 te the hydrodynamic behavior of UASB reactor, with a volume of 21 L. The reactor was
operated with hydraulic retention time (HRT) of 20 h. The hydrodynamic behavior was
evaluated using pulse stimulus-response tests, using Eosin Y as the tracer. From the hy-
drodynamic test, it was found the presence of several peaks in the concentration of tracer
over time, which can be explained by the possible presence of preferential paths or due to
problems in maintaining the flow. The theoretic model that best fit the test was to com-
plete mixing tanks in series (N-CSTR), resulting in four reactors. The peak times found by
the calculations were 8,26, 32,85 and 28,51 for calculations 1, 2 and 3, respectively. These
results were important for the explanation of possible anomalies.

Keywords: UASB. Hydrodynamic test. Peak time. Eosin.

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1 INTRODUÇÃO UASB no tratamento de efluentes, surge a
necessidade do entendimento de seu com-
A questão ambiental se destaca cada vez mais
portamento hidrodinâmico. O estudo hi-
devido ao alto impacto provocado pelas di-
drodinâmico de reatores permite avaliar o
versas atividades humanas sobre o ambiente.
desempenho e o regime de escoamento no
Dentre essas atividades, a suinocultura vem
interior do reator, possibilitando a identi-
se tornando uma problemática ambiental,
ficação de anomalias, tais como, presença
pois a exploração de suínos em regime de 13
de zonas mortas, caminhos preferenciais e
confinamento gera excessivas quantidades
curtos-circuitos hidráulicos, deficiências que
de dejetos líquidos, sendo estes altamente
podem afetar diretamente o volume útil do
poluidores (FERNANDES; OLIVEIRA, 2006).
reator e causar falhas operacionais do ponto
Uma alternativa para o tratamento das de vista dos mecanismos hidráulicos e opera-
águas residuárias de suinocultura é a aplica- cionais (KREUTZ, 2012). Tal estudo permite
ção em reator anaeróbio de manta de lodo ainda a determinação da eficiência hidráu-
e fluxo ascendente (UASB), que mostra ser lica e a obtenção das curvas de distribuição
uma opção viável e promissora. Estes rea- do tempo de residência (DTR) por meio de
tores são compostos por uma coluna de di- testes de estímulo e resposta, isto é, permite
gestão anaeróbia dividida em leito de lodo, conhecer a fração do líquido que permanece
zona de sedimentação e separador de fases no reator, por unidade de tempo.
(GODINHO, 2015). Sua operação é fácil e
No teste de estímulo e resposta são utili-
apresenta eficiência quando comparado
zados traçadores inertes. Traçador é uma
com outros tratamentos. O reator UASB
substância que permite identificar o deslo-
utiliza o processo biológico de tratamento
camento de um fluido, podendo ser natural
com biomassa dispersa, onde os compostos
e artificial. Dentre os traçadores mais utili-
orgânicos são biodegradados e digeridos
zados e recomendados pela literatura pode-
por meio de uma transformação anaeróbia.
-se citar o azul de bromofenol, a dextrana
O interesse pelo tratamento anaeróbio de azul, mordante de violeta, rodamina WT,
resíduos líquidos e sólidos provenientes verde de bromocresol e eosina Y. A eosina
da agropecuária e da agroindústria tem au- Y é um corante aniônico altamente solúvel
mentado nos últimos anos, por apresentar em água, pertencente à classe de corantes
vantagens significativas quando compara- fluoresceína (ANTERINO et al., 2014). Pode
do aos processos comumente utilizados de ser utilizada em estudos de águas subterrâ-
tratamento aeróbio de águas residuárias, ou neas para a determinação de caminhos de
aos processos convencionais de composta- migração da água e identificar a distribui-
gem aeróbia de resíduos orgânicos sólidos ção de poluentes no ambiente.
(MORAES; JÚNIOR, 2004).
Dentro das informações apresentadas, este es-
Em virtude do uso crescente de reatores tudo tem como objetivo analisar o tempo de

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pico da modelagem hidrodinâmica e identifi- O lodo e o efluente utilizados para o trata-
car o comportamento hidrodinâmico do rea- mento no reator foram coletados de uma
tor UASB por meio de modelos uniparamé- granja localizada no município de Mam-
tricos e ensaio de estímulo e resposta usando borê-PR. O efluente é armazenado em um
como traçador a eosina Y.2 Metodologia reservatório de 60 L que atua como tanque
de equalização. Posteriormente, o efluente
2.1 Aparato experimental é conduzido para o reator por meio de uma
14 O estudo foi realizado na Universidade Tec- bomba, marca Provitec® modelo AWG
nológica Federal do Paraná (UTFPR), Cam- 5000 ABS, para tratamento.
pus Campo Mourão, no Laboratório de Sa-
neamento (C-104), localizado no bloco C e 2.2 Ensaio hidrodinâmico
em seu anexo externo. Para avaliar o comportamento hidrodinâmi-
co do reator UASB foi realizado, para o TDH
O reator UASB é constituído de uma coluna
de 20 h, um ensaio de estímulo-resposta do
cilíndrica de plexiglass, com volume útil de
tipo pulso com o traçador eosina Y, que foi
21 L e volume total de 22 L; diâmetro interno preparado por meio da mistura de 0,20 g do
de 0,15 m e altura de 1,22 m. O separador tri- traçador em 10 mL de água destilada.
fásico (gás-sólido-líquido) está acoplado à co-
Primeiramente, foi realizada a coleta de
luna cilíndrica e está a uma distância de 0,95
uma amostra do efluente do reator antes
m da base do reator, que possui altura total
de ser adicionado o traçador para servir
de 0,25 m e 0,14 m de diâmetro (Figura 1). de referência na realização das análises de
Figura 1: Reator UASB utilizado no experimento: absorbância das demais amostras no espec-
trofotômetro. Posteriormente, foi injetado
o traçador na entrada do reator com o auxí-
lio de uma seringa de 15 mL. As coletas das
amostras (total de 80) foram feitas em in-
tervalos de 45 minutos e teve duração total
de 60 h (3 vezes o TDH). Elas foram realiza-
das de duas formas: no período diurno, as
coletas foram realizadas manualmente com
a utilização de recipientes de plástico e no
período noturno, foi utilizado um coletor
automático da marca Isco, modelo 6712,
que coletava 100 mL do efluente.
Na sequência, as amostras coletadas eram
levadas até o laboratório e centrifugadas em
uma centrífuga Sislab, modelo Twister 12,
por cerca de 5 minutos a 3500 rpm. Dessa
Fonte: Cruz (2013). forma, a interferência de sólidos durante a

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leitura das absorbâncias pelo método colorimétrico é evitada. Essa etapa foi realizada em
todas as amostras. Em seguida, foram realizadas as leituras dessas amostras para deter-
minar a concentração do traçador em cada uma delas. Para isso, foi utilizado o método
colorimétrico de leitura de absorbância, realizado em um espectrofotômetro HACH, mo-
delo DR5000, com comprimento de onda de 516 nm. Os valores encontrados na leitura
foram transferidos para uma planilha do programa Microsoft Excel®, para a obtenção de
gráficos da variação da concentração do traçador pelo tempo.
15
Foi realizada a normalização das curvas experimentais da variação de concentração do tra-
çador ao longo do tempo, que resultou em curvas de distribuição do tempo de residência
hidráulica em função do tempo adimensional. Os resultados obtidos foram ajustados com
base nos modelos teóricos uniparamétricos de dispersão de pequena intensidade (PD) e
de grande intensidade (GD) e de tanques de mistura completa em série (N-CSTR) (Tabela
1) (LEVENSPIEL, 2000).

Tabela 1: Modelos teóricos uniparamétricos:

Modelo Parâmetro Equação


Dispersão
de pequena σ²θ = 2 (D/μL) Eθ = 1/(2 √(π(D/uL) ))exp[(1-θ)²/4(D⁄(uL))]
intensidade (PD)
Dispersão de grande
σ²θ,ta = 2 (D/μL) + 8 (D/μL)² Eθ,ta = 1/(2 √(π(D/uL))exp((1-θ)²/4(D⁄(uL))
intensidade (GD)
Tanques de
mistura completa N = 1/ σ²θ = θ-²h/ σ² Eθ = (N(N.θ)N-1/(N-1)!)e-Nθ eN-1
em série (N-CSTR)
Fonte: Adaptado de Levenspiel, 2000.

Em que: θ - tempo de residência médio (adimensional);

Eθ - Função de distribuição do tempo de residência hidráulica;

σ2 - variância;

σ2θ - variância (adimensional);

N - número de reatores em série;

D/u.L- número de dispersão do reator.

2.3 Cálculo do tempo de pico


Para este cálculo, foram realizados cálculos de derivação das equações de concentração de
eosina Y (C) geradas pela linha de tendência do tipo polinomial obtidas com o auxílio do
programa Microsoft Excel®. Para isso, os seguintes cálculos foram realizados:
1) Cálculo do tempo de pico na queda da concentração de eosina Y: Deriva-se a equação obti-
da pela linha de tendência em função do tempo e encontra-se t (tempo de pico). Em seguida,

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substitui-se o valor de t encontrado em C e do tipo pulso foi possível traçar a curva de
acha-se a concentração de eosina Y. variação da concentração de eosina Y ao
Observação: A queda iniciou a partir do longo do tempo das amostras coletadas na
tempo de 31,5 horas. saída do reator, no TDH de 20 horas, con-
forme Figura 2.
2) Cálculo do tempo de pico ao longo da cur-
va de variação de eosina Y em função do tem- Figura 2: Variação da concentração de Eosina
16 po, utilizando uma equação do 2º grau: Faz-se Y em função do tempo no TDH de 20 horas:
o mesmo procedimento do primeiro cálculo.

3) Cálculo do tempo de pico ao longo da


curva de variação de eosina Y em função
do tempo, utilizando uma equação de 3º
grau: Primeiramente, deriva-se a equação
obtida pela linha de tendência em função
do tempo. Em seguida, aplica-se a fórmu-
la de Bháskara para encontrar as raízes (t1
e t2). Deriva-se novamente a equação C e Fonte: Autor.

substitui as raízes encontradas. Dois valo- Ao analisar os dados apresentados na Figu-


res serão obtidos e para isso deve-se encon- ra 2 é possível observar a presença de vários
trar o ponto máximo da equação, que deve picos no decorrer da curva, sendo o maior
obedecer às seguintes regras: pico no tempo de 18,75 horas, em que a
a) f’’(t)>0, ponto mínimo e f”(t)<0, ponto máximo concentração de eosina Y é de aproximada-
mente 0,42 mg/L. Em decorrência da pre-
b) Parábola com concavidade voltada para
sença de muitos picos, os resultados apre-
cima, ponto mínimo. Parábola com conca-
sentados foram insatisfatórios. Isso pode
vidade voltada para baixo, ponto máximo.
ter ocorrido devido aos problemas encon-
Após encontrado o valor máximo, sabe-se trados na manutenção da vazão. Outro mo-
qual o tempo de pico obtido pela equação. tivo, pode ser a provável existência de ca-
Para o cálculo da concentração de eosina minhos preferenciais, o que é confirmado
Y neste tempo, basta substituir o tempo de pelo fato do maior pico ter ocorrido antes
pico na equação inicial. do TDH real (31,74 horas).

Os resultados dos parâmetros obtidos após o


3 RESULTADOS E
ajuste dos dados experimentais aos modelos
DISCUSSÃO
teóricos uniparamétricos estão disponíveis
3.1 Comportamento hidrodinâmico do na Tabela 2, na qual são apresentados, o nú-
reator UASB mero de dispersão para os modelos de gran-
Com base nos resultados experimentais en- de dispersão (GP) e pequena dispersão (PD)
contrados no ensaio de estímulo-resposta e o número de reatores em série (N-CSTR).

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Tabela 2: Parâmetros obtidos experimentalmente:
TDHt (h) TDHr (h) N-CSTR (N) Pequena dispersão (D/μL) Grande dispersão (D/μL)
20 31,74 4 0,114 0,331
Fonte: Autor.

Analisando os dados da Tabela 2 verifica-se que houve um atraso de aproximadamente


58% no TDH real (TDHr) em relação ao TDH teórico (TDHt) de 20 h. Isso pode ser explica-
do pela presença de zonas mortas, indicando regiões com baixa troca de massa e pequena 17
quantidade de movimento, provocando um retardo na liberação do traçador. Um atraso
no TDH foi observado por (ESCUDIÉ et al., 2005), que mencionaram que o atraso pode
desempenhar um papel significativo no cálculo do tempo de residência médio, tornando o
tempo de residência experimental maior do que o teórico.
Ainda com base nesses resultados, pode-se observar que o ensaio hidrodinâmico mostrou
que o modelo teórico de N-CSTR em série resultou em 4 reatores em série, e apresentou
números de dispersão de pequena e grande intensidade iguais a 0,114 e 0,331, respecti-
vamente. Esses valores de D/uL estão bem acima do limite (D/uL<0,01) e isso indica uma
grande dispersão ao longo do reator (LEVENSPIEL, 2000).
As curvas de distribuição do tempo de residência (DTR), obtidas a partir dos modelos de
tanques de mistura completa em série (N-CSTR), pequena dispersão (PD) e grande disper-
são (GD), estão representadas na Figura 3.

Figura 3: Curva de distribuição do tempo de residência (DTR) obtida no ensaio:

Fonte: Autor.

Os resultados do coeficiente de correlação (R2) são apresentados na Tabela 3.

Tabela 3: Coeficientes de correlação obtidos com o ajuste dos dados experimentais aos
modelos teóricos:
Coeficiente de Correlação (r2)
TDHt (h) N-CSTR (N) Pequena dispersão (D/μL) Grande dispersão (D/μL)
20 0,755 0,663 0,721
Fonte: Autor.

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Os modelos de tanques de mistura completa em série (N-CSTR) e grande dispersão (GD)
apresentaram melhores resultados em relação ao coeficiente de correlação, com valores
acima de 70%. O modelo de pequena dispersão (PD) apresentou um valor menor compa-
rado aos demais modelos, cerca de 66%.
De acordo com os coeficientes de correlação da Tabela 3, juntamente com a curva de
distribuição do tempo de residência (DTR) da Figura 3, observa-se que o modelo teórico
uniparamétrico que melhor se ajustou ao ensaio foi de N-CSTR, com correlação de 0,755.
18 O mesmo foi relatado por Martins (2012) e Godinho (2015).

3.2 Tempos de pico


Neste item serão apresentados os tempos de pico encontrados por meio dos cálculos de de-
rivação das equações da concentração do traçador que estão representadas nas Figuras 4 e 5.
Figura 4: Tempo de pico, considerando a queda da concentração de eosina Y em função
do tempo no TDH de 20 horas:

Fonte: Autor.

Figura 5: Linha de tendência polinomial de ordem 2 e ordem 3, respectivamente, da


curva de variação da concentração de eosina Y em função do tempo no TDH de 20 horas:

Fonte: Autor.

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Tabela 4: Tempos de pico encontrados nos cálculos e suas respectivas concentrações:

Cálculo Tempo de pico (h) Concentração de eosina Y


1 8,26 0,31
2 32,85 0,27
3 28,51 (máximo) 0,27
Fonte: Autor.

Os tempos de pico encontrados nos cálculos 1, 2 e 3, foram de 8,26, 32,85 e 28,51 horas, 19
respectivamente e as concentrações de eosina Y foram de 0,31 mg/L para o cálculo 1 e de
0,27 mg/L para os cálculos 2 e 3 (Tabela 4).

Os valores encontrados nos cálculos 1 e 3 mostraram um adiantamento do tempo de pico


em relação ao TDH real, já constatado anteriormente pela curva de variação da concen-
tração do traçador ao longo do tempo, com pico no tempo de 18,75 horas, confirmando
a possível presença de caminhos preferenciais no interior do reator. Hattori et al. (2011) e
Martins (2012) também observaram esse efeito em seus estudos.

Em relação ao resultado obtido no cálculo 2, observa-se um atraso no tempo de pico em


relação ao TDH real, porém, este resultado encontrado tem baixa precisão (R2 = 0,53), in-
dicando que os valores estimados para a linha de tendência não correspondem fielmente
aos dados reais, portanto, não são satisfatórios para comparação.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Com base nos resultados obtidos neste trabalho é possível concluir que:

O ensaio hidrodinâmico do reator UASB apresentou valores pouco satisfatórios para o


entendimento do comportamento hidrodinâmico, sendo necessária a execução de mais
ensaios para uma possível comparação e assim obter resultados que possibilitem entender
tal comportamento.

Verificou-se o adiantamento do pico da concentração do traçador em 3 resultados diferen-


tes (curva de variação e cálculos 1 e 2) e também notou-se a presença de vários picos no
decorrer da curva, indicando a possível existência de caminhos preferenciais no interior
do reator ou falhas na operação da bomba. O modelo teórico uniparamétrico que melhor
se ajustou ao ensaio foi de N-CSTR

Os cálculos realizados para determinar os tempos de pico apresentaram valores condi-


zentes aos que haviam sido encontrados a partir da curva de variação da concentração de
eosina Y ao longo do tempo, o que contribui para a confirmação de possíveis anomalias.

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REFERÊNCIAS
ANTERINO, S.; PAIVA, T. M. N.; SILVA, P.; ZOBY, L. C.; FERREIRA, J. M.; MOTA SOBRI-
NHO, M.A. Adsorção do corante eosina a partir de solução aquosa utilizando cascas de
marisco Anomalocardia brasiliana. Blucher Chemical Engineering Proceedings, v. 1, n.
2, p. 8277-8284, 2014.

CRUZ, D. B. Estudo hidrodinâmico computacional de reator UASB em escala de ban-


20 cada com validação experimental. 2013. 70 f. Trabalho de Conclusão de Curso (Gradu-
ação) - Universidade Tecnológica Federal do Paraná, Campo Mourão, 2013.

ESCUDIÉ, R.; CONTE, T.; STEYER, J. P.; DELDENÈS, J. P. Hydrodynamic and biokinetic
models of an anaerobic fixed-bed reactor. Process Biochemistry, 40, p. 2311-2323. 2005.

FERNANDES, G. F. R.; OLIVEIRA, R. A. de. Desempenho de processo anaeróbio em dois


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ACTA TECNOLÓGICA v.12, nº 1, 2017


Recebido em 30/09/2017; Aceito em 09/11/2017; Publicado na web em 14/03/2018

Protótipo de um sistema de irrigação


baseado em iot para pequenos e
médios produtores rurais
Francisco Alan de Oliveira Santos1;
Mardoqueu Sousa Telvina2; 21
Plácido Soares das Chagas Segundo ; 3

Mysael Römulo Batista de Carvalho4;


1 Professor de Ensino Básico, Técnico e Tecnológico do Instituto Federal do Maranhão - IFMA. E-mail: franciscoalan.santos@ifma.edu.br;

2 Bacharel em Ciência da Computação pela Faculdade de Educação São Francisco. E-mail: mdq767@gmail.com;

3 Professor de Ensino Básico, Técnico e Tecnológico do Instituto Federal do Maranhão - IFMA. E-mail: placido.segundo@ifma.edu.br;

4 Professor de Ensino Básico, Técnico e Tecnológico do Instituto Federal do Maranhão - IFMA. E-mail: mysael.carvalho@ifma.edu.br;

RESUMO
Dentre as principais dificuldades no cultivo de hortaliças, podem-se citar a escassez de
água e o pH do solo. Visando proporcionar um melhor aproveitamento da terra e contri-
buir com o racionamento de água, este artigo relata o desenvolvimento de um protótipo
automatizado, baseado em IoT, capaz de simular o funcionamento de um sistema de irriga-
ção para pequenos e médios produtores rurais. O objetivo principal foi ponderar o nível de
pH do solo para averiguar, antecipadamente, se a terra é aceitável para a agricultura e, em
conjunto com sensores de umidade do solo e temperatura, descobrir a média de água ne-
cessária para irrigação, possibilitando o manejo eficiente dos recursos hídricos disponíveis.

Palavras-chave: Android, Arduino, Internet das Coisas. Irrigação.

ACTA TECNOLÓGICA v.12, nº 1, 2017


Prototype of an irrigation system based
on iot for small and medium rural
producers

22 ABSTRACT
Among the main difficulties in the cultivation of vegetables, we can mention the scarcity
of water and the pH of the soil. Aiming to provide a better use of the land and contribute
to water rationing, this paper reports the development of an automated prototype, based
on IoT, capable of simulating the operation of an irrigation system for small and medium
farmers. The main objective was to assess the pH level of the soil to ascertain if the soil
is acceptable for agriculture and, together with soil moisture and temperature sensors, to
discover the average water required for irrigation, allowing the efficient management of
the resources available.

Keywords: Android, Arduino, Internet of Things. Irrigation.

ACTA TECNOLÓGICA v.12, nº 1, 2017


1 INTRODUÇÃO o qual possui como finalidades: verificar a
humidade do solo para fazer uma distribui-
O conceito de automação foi introduzi-
ção de água eficaz; utilizar medidores de
do nos anos 20, por Henry Ford (ROSÁ-
pH, para que o produtor tenha certeza de
RIO, 2009) e surgiu com a finalidade de
que o solo é propicio para plantação. No
aumentar a produção e reduzir custos nos
mais, este projeto tem o propósito de aju-
processos industriais. Mais tarde, a auto-
dar o agricultor em sua produção e colabo-
mação trouxe uma enorme evolução para 23
rar com o meio ambiente.
o mercado agropecuário, tanto na criação
de máquinas, como no surgimento de no- O restante deste artigo está estruturado
vas tecnologias para auxiliar na produção como segue: A seção 2 descreve o ferramen-
(BARRIVIERA e CANTERI, 2009). tal de hardware e software que compõe o
arcabouço tecnológico para o desenvolvi-
Porém, atualmente, a automação está se
mento do projeto, discute os componentes
difundindo cada vez mais no cotidiano
da solução proposta e relata os testes do
das pessoas, como, por exemplo, na utili-
desenvolvimento. Por fim, na seção 3 são
zação de smart TVs, sistemas de vigilância,
feitas as considerações finais.
alarmes, entre outros. Nesse novo cenário,
muitos desses equipamentos têm conexão
2 METODOLOGIA
com a rede mundial de computadores (in-
ternet), gerando uma ressiginificação do 2.1 Ferramentas de hardware e software
termo automação e ensejando o surgimen- A solução aqui proposta compõe-se, basica-
to do acrônimo IoT (do inglês Internet of mente, da combinação de duas tecnologias
Things, ou Internet das Coisas). De acordo principais, a saber, um módulo Arduino de
com WOOTTON (2016), IoT é a possibili- monitoramento e um aplicativo Android
dade de qualquer equipamento se conectar para gerenciamento dos dados enviados
à internet transmitindo informações para pelos sensores.
seu usuário. Sabendo disso, pode-se afir-
Android é um sistema operacional móvel
mar que a IoT tem o potencial de auxiliar
baseado no núcleo do Linux (LECHETA,
a automação agrícola, fazendo com que os
2015). Sua plataforma é open-source, o que
produtores saibam o que está acontecendo
significa que o código pode ser utilizado por
em tempo real com suas plantações para o
qualquer indivíduo e para qualquer propó-
melhor aproveitamento de seus cultivos e
sito. Ele tem uma arquitetura em compo-
cuidados com o solo.
nentes, onde um conjunto de recursos está
Este trabalho tem como objetivo criar e disponível através de API (do inglês Appli-
avaliar um sistema automatizado de irriga- cation Programming Interface, ou Interface
ção, baseado nos métodos de irrigação uti- de Programação de Aplicação). Quando uma
lizados por pequenos e médios agricultores, API faz uma chamada para acessar hardware

ACTA TECNOLÓGICA v.12, nº 1, 2017


do dispositivo, o sistema Android carrega o 2.2 Desenvolvimento do protótipo
módulo de biblioteca para esse componen- Para o desenvolvimento deste projeto, fo-
te de hardware (LECHETA, 2015). WebView ram utilizados os seguintes componentes:
é uma extensão do Android que permite
Arduino Mega 2560. Esta placa se destaca
exibir páginas da web como uma parte do
pela sua grande capacidade de memória
layout (LECHETA, 2015). O cenário comum
(MCROBERTS, 2011). O Arduino Mega tem
para usar a WebView é quando se faz neces-
24 capacidade de suportar uma grande quan-
sário atualizar informações em um aplicati-
tidade de pinos em suas conexões conside-
vo (LECHETA, 2015).
ravelmente grande em comparações com
Android Studio é o ambiente de desenvol- outras versões.
vimento integrado (em inglês, Integrated
Sensor de temperatura DS18B20 water-
Development Environment ou IDE) ofi-
proof. Pode trabalhar em diversos ambien-
cial para desenvolvimento de aplicativos
tes, tanto submersos na água quanto inse-
Android (LECHETA, 2015). Neste projeto,
ridos no solo. Pode enviar a temperatura
o Android Studio é destinado à criação do
como um fluxo de dados seriais, transmi-
código do aplicativo. A linguagem de pro-
tidos por uma única linha de transmissão
gramação utilizada para a construção do
(MCROBERTS, 2011). Utilizado para avaliar
aplicativo foi Java, a qual o Android Studio
a temperatura do solo.
pode suportar.
Sensor de umidade do solo higrômetro.
Arduino é uma plataforma open-source
Tem por objetivo realizar verificações da
composta de duas partes: a placa Arduino,
humidade do solo em uma faixa entre 0%
que é o componente físico (hardware), que
e 100%. Possui dois eletrodos que, destina-
consiste em uma placa de circuito na qual
dos a corrente pelo solo, realizam a leitura
podem-se integrar dados analógicos e di-
do nível de humidade através de compara-
gitais, por meio de um processo chamado
ção com a resistência.
transdução (MCROBERTS, 2011), que é a
Placa Ethernet. Componente capaz de co-
conversão da energia detectada em outra
nectar o Arduino à internet, sendo respon-
forma de energia; e o IDE, que é a parte ló-
sável por realizar uma conexão através de
gica, ou seja, o software, que servirá para
um cabo de rede RJ-45, além de ser respon-
o desenvolvimento dos programas a se-
sável pelo fornecimento do protocolo TCP/
rem executados na placa Arduino (BANZI,
IP para o Arduino na rede, tornando favo-
2008). O fator que levou o Arduino a ser
rável a comunicação com outro dispositivo
adotado na prototipagem deste projeto foi
via internet.
a sua maleabilidade, que proporciona ao
usuário controle total do hardware e do Bomba. Para a simulação da irrigação foi
software, podendo ainda ser utilizado sem usado o modelo Moto Bomba SB 1000 pro-
qualquer custo. duzido pela Sarlo. Essa bomba é utilizada

ACTA TECNOLÓGICA v.12, nº 1, 2017


para a circulação de água em aquários, sen- Figura 1: Esquema do projeto
do uma bomba de grande capacidade.

Módulo Relé. Utilizado para o acionamen-


to de cargas, ou seja, pode controlar equi-
pamentos eletrônicos desde que a corrente
destes dispositivos a serem controladas não
ultrapassem de 10 A (ampéres). Nessa placa 25
existem 2 leds para cada canal.

Eletrodo Leitor de PH. Constituído de dois


eletrodos (de referência e de medição) na
mesma estrutura, sendo um dentro do ou-
tro (RODRIGUES, 2010). Envia sinais para
a placa responsável pela coleta de dados e Fonte: Autores. Fritzing.

só assim a placa envia as informações de


2.4 Funcionamento
forma analógica para a placa Arduino.
A ativação do mecanismo ocorre conforme
Leitor BNC. Trabalha em conjunto com o mudanças nas condições pré-configuradas.
eletrodo de medição de pH, obtendo dados Assim, qualquer alteração detectada pelos
do eletrodo e enviando de forma analógica sensores irá ocasionar uma reação no siste-
para a placa receptora. ma, sendo que a bomba de água será acio-
nada de acordo com os dados recebidos pe-
2.3 Elaboração do circuito
los sensores de temperatura e umidade do
A esquematização do circuito foi feita no
solo. O funcionamento do sistema é ilus-
programa de prototipagem denominado de
trado na Figura 2.
fritzing. Na Figura 1, pode-se observar que
os componentes estão interligados à placa O processo de irrigação ocorre da seguin-
em dois módulos de pinagem, que são os pi- te forma: durante o dia, se a temperatura
nos digitais e os pinos analógicos. Nos pinos ultrapassar os 39º C e a humidade do solo
digitais estão ligados o Modulo relé Pino 3, estiver abaixo de 65%, a bomba é aciona-
Sensor de temperatura - Pino 5, o sensor está da até que a umidade atinja 95%. Caso a
ligado ao pino digital mas está recebendo umidade do solo esteja abaixo de 60% e a
um valor analógico. Nos pinos analógicos, temperatura abaixo de 38° C, a bomba é
estão conectados o Sensor de umidade - Pino acionada até a umidade chegar aos 90%.
A0 e o modulo BNC - Pino A1, responsável Em dias de chuva, a bomba não é acionada.
pelo recebimento dos dados coletados pelo Sempre que houver alterações, o agricultor
eletrodo. Todos estão conectados a uma sa- receberá uma mensagem de aviso em seu
ída de energia de 5v distribuída pela placa e app, informando que há algo de errado
um neutro chamado de GND. com o pH ambiente de sua plantação.

ACTA TECNOLÓGICA v.12, nº 1, 2017


Figura 2: Fluxograma de funcionamento agricultor possa tomar providências para
do sistema sua plantação não ser prejudicada. A Fi-
gura 4 ilustra uma notificação gerada pelo
aplicativo. Na Figura 5, pode-se observar a
montagem do protótipo e, na Figura 6, po-
de-se ver o protótipo o momento da recep-
ção dos dados dos sensores.
26
Figura 4: Programa de monitoramento do
sistema de irrigação demonstrando em tem-
po real os dados coletados pelos sensores

Fonte: Autores. Microsoft Word 2013.

Os dados coletados pelos sensores de tem-


peratura, umidade e pH são transformados
em informações e demonstrados em tempo
real, para que o agricultor possa acompa-
nhar suas plantações, podendo acionar a
irrigação de sua cultura, se assim decidir.
A Figura 3 mostra o sistema em funciona-
mento.

Figura 3: Demonstração do funcionamen-


to do protótipo com irrigação por aspersão
Fonte: Autores

Figura 5: Montagem do protótipo de irrigação

Fonte: Autores

A partir do momento em que é alterado o


nível de pH, o sistema notifica para que o Fonte: Autores

ACTA TECNOLÓGICA v.12, nº 1, 2017


Figura 6: Protótipo em funcionamento recebendo dados dos sensores

27

Fonte: Autores

2.5 Calibragem dos sensores


Para atestar a acurácia das medições, foram executados procedimentos para realizar uma
análise comparativa dos valores obtidos pelos sensores, descritos a seguir.

Para a calibragem do sensor de umidade, o mesmo foi submerso em um copo de água, onde
foi obtida uma leitura de 98%. Logo após, foi medida a umidade com o sensor fora do copo,
onde obteve-se a leitura de 2%. Foram feitos testes em outras condições: primeiro em terra
seca, onde o sensor obteve um resultado de 2%, depois foi aferido em terra parcialmente
úmida, onde o mesmo marcou 14% e, por fim, fora inserido em terra totalmente úmida,
onde foi obtido um resultado de 92%. O resultado está na Figura 7.

Para a calibragem do sensor de temperatura, foi utilizado um termômetro como parâme-


tro de comparação. Primeiramente, foi feita a medição da temperatura ambiente, onde
obteve-se no sensor 31º C e no termômetro 30° C. Quando inserido em um ambiente frio,
obteve-se 9° C no sensor e, no termômetro 9,4ºC. Em temperaturas elevadas, obteve-se
39,2° C no sensor e no termômetro 39,7º C. Conforme pode-se ver na Figura 8.

As informações quantitativas fornecidas pelo valor do pH expressam quão ácido ou quão


básico é o solo em termos de atividade dos íons de hidrogênio. Para a calibragem do me-
didor de pH, foi utilizado um líquido cujo pH foi previamente medido em 6,21 a uma
temperatura de 25° C. Ao inserir o medidor de pH no líquido em temperatura ambiente de
33º C, o medidor apresentou resultados satisfatórios, sendo que o presente líquido nesta
temperatura apresentaria um pH em torno de 8° C. Portanto, fez-se necessária uma taxa
de reajuste -3, para o seu funcionamento preciso. Na Figura 9, é possível ver o resultado.

ACTA TECNOLÓGICA v.12, nº 1, 2017


Figura 7: Demonstração do funcionamento do sensor de umidade e seus resultados

28

Fonte: Autores

Figura 8: Demonstração do funcionamento do sensor de temperatura e seus resultados

Fonte: Autores

ACTA TECNOLÓGICA v.12, nº 1, 2017


Figura 9: Demonstração do funcionamento do medidor de PH e seus resultados

29

Fonte: Autores

A seguir, são apresentados os resultados da tabulação dos dados coletados. A Tabela 1 ilus-
tra as leituras obtidas em um dado conjunto de condições variadas para a calibragem do
sensor de humidade. Na Tabela 2, é mostrada uma análise comparativa dos dados coleta-
dos pelo sensor de temperatura e pelo termômetro utilizado, cujas medições foram usadas
como valores de referência para a calibragem do sensor em questão. A Tabela 3, por sua
vez, computa os dados resultantes do medidor de pH.

Tabela 1: Calibragem do sensor de humidade


Ambiente Humidade (%)
Submerso em água 98
Fora da água 2
Em terra seca 2
Em terra parcialmente úmida 14
Em terra totalmente úmida 92
Fonte: Autores

Tabela 2: Calibragem do sensor de temperatura


Temperatura (ºC)
Cenário Sensor Termômetro
Temperatura ambiente 31 30
Ambiente frio 9 9,4
Temperaturas elevadas 39,2 39,7
Fonte: Autores

ACTA TECNOLÓGICA v.12, nº 1, 2017


Tabela 3: Calibragem do medidor de pH visualmente no protótipo, que demonstrou
Temperatura (ºC) Valor do pH um funcionamento adequado da ativação
25 6,21 do regador e dentro de um tempo de res-
33 ~8 posta aceitável.
Fonte: Autores
Gráfico 1: Monitoramento da variação de
2.6 Testes temperatura
30 Para avaliar o protótipo foram realizados
três testes. O primeiro teste realizado foi
de monitoramento da umidade. O segun-
do teste realizado foi para manter a tem-
peratura em um nível mínimo estabelecido
pelo agricultor. E, por fim, o terceiro teste
realizado foi a análise sobre a variação do Fonte: Autores. Microsoft Excel 2013.

nível de pH do solo. Foi possível observar, Gráfico 2: Monitoramento da variação da


também, além do acompanhamento sobre umidade
a variação dos valores lidos pelos sensores,
a notificação do aplicativo e a resposta da
ativação do sistema de irrigação. Todos os
testes foram realizados ao longo de um dia.

Com base nesses testes, foi possível aferir a


efetividade do protótipo. Conforme é pos-
sível analisar nos gráficos 1, 2 e 3, é cabível Fonte: Autores. Microsoft Excel 2013.

afirmar que o mecanismo mostrou-se satis- Gráfico 3: Monitoramento do nível de pH


fatório, pois a realização desses três testes do solo
evidenciou o fato de que o protótipo se
comportou conforme esperado e que o sis-
tema foi capaz de oferecer ao usuário o va-
lor da umidade, temperatura e nível de pH
do solo em condições pré-determinadas, e
dentro de uma precisão suficiente para a
aplicação. Contudo, um quarto teste fez-se
Fonte: Autores. Microsoft Excel 2013.
necessário para validar o acionamento do
sistema de irrigação, ou seja, se o controle
da válvula de água seria acionado quando
3 CONSIDERAÇÕES FINAIS
o usuário ativasse o sistema de irrigação ao Neste projeto foi desenvolvido um protó-
clicar no botão “Ligar” do aplicativo mó- tipo automatizado, a fim de simular o fun-
vel. A confirmação de tal operação foi feita cionamento de um sistema de irrigação

ACTA TECNOLÓGICA v.12, nº 1, 2017


para pequenos e médios produtores rurais. O objetivo principal foi mensurar o nível de
pH do solo para averiguar antecipadamente se a terra é aceitável para a agricultura e, em
conjunto com sensores de umidade do solo e temperatura, descobrir a média de água ne-
cessária para irrigação.

Pode-se afirmar que o mecanismo implementado funcionou como esperado, uma vez que
o sistema opera quando há alguma alteração nas regras de monitoramento, fazendo com
que a bomba de água seja acionada ou uma mensagem de alerta seja enviada para o agri-
31
cultor informando sobre qualquer anomalia nas condições monitoradas.

Foi possível constatar que o sistema obteve sucesso ao detectar o nível de humidade no
solo, podendo, assim, facilitar a decisão da quantidade de água necessária para que haja a
irrigação com a utilização de recursos hídricos ideais, evitando o desperdício. Outro ponto
que o sistema foi capaz de realizar vem a ser a detecção do nível de pH do solo, que tem
como consequência o fato de o agricultor ter o conhecimento prévio a respeito do inves-
timento que irá realizar ao decidir empreender alguma plantação.

ACTA TECNOLÓGICA v.12, nº 1, 2017


REFERÊNCIAS
LECHETA, R. R. Google Android: Aprenda a criar aplicações para dispositivos móveis
com o Android SDK. 5. ed. São Paulo: Novatec, 2015.

MCROBERTS, M. Arduino Básico. 1. ed. São Paulo: Novatec, 2011.

ROSARIO, J. M. Automação Industrial. 1. ed. São Paulo: Baruana, 2009.

32 WOOTTON, G. Internet Das Coisas. 1. ed. São Paulo: Aureside, 2016.

ACTA TECNOLÓGICA v.12, nº 1, 2017


Recebido em 28/09/2017; Aceito em 16/11/2017; Publicado na web em 14/03/2018

Estudo numérico da convecção natural


em uma placa plana vertical via
fluidodinâmica computacional
William Denner Pires Fonseca1;
Lourival Matos de Sousa Filho2; 33
Genilson Vieira Martins ; 3

1 Mestrando em Engenharia Mecânica; Faculdade de Engenharia Mecânica; Universidade Estadual de Campinas; Departamento de
Energia; E-mail: fonsecawdp@gmail.com;

2 Professor do Curso de Engenharia Mecânica; Laboratório de Modelagem e Simulação Numérica; Universidade Estadual do Maranhão;
E-mail: filholouri@gmail.com;

3 Professor do Curso de Física; Departamento de Ensino; Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Maranhão - Campus
Grajaú; E-mail: gvmartins@gmail.com;

RESUMO
Este artigo apresenta uma investigação numérica da transferência de calor por convecção
natural no interior à camada limite laminar térmica e hidrodinâmica de uma placa plana
vertical isotérmica e engastada. As equações de governo foram discretizadas pelo Método
dos Volumes Finitos através do software ANSYS/FluentTM. Inicialmente, o trabalho visa
comparar o resultado obtido na simulação numérica para diferentes refinos de malha
com o modelo analítico disponível na literatura. Posteriormente, busca-se verificar como
as condições de contorno e a espessura da placa influenciam no escoamento, na troca de
calor e nos parametros adimensionais característicos para este tipo de escoamento. Os
dados numéricos foram comparados com o modelo analítico disponível na literatura e
apresentaram uma boa anuência no que diz respeito às variações nas condições de con-
torno. Observou-se que estas influenciam no campo de velocidade e, por conseguinte, na
transferência de calor.

Palavras-chave: Placa isotérmica vertical. Convecção natural. Método dos volumes finitos.

ACTA TECNOLÓGICA v.12, nº 1, 2017


Numerical study of natural convection
in a vertical flat plate vertical via
computational fluidodynamics

34 ABSTRACT
This paper presents a numerical investigation of heat transfer through natural convec-
tion inside the thermal and hydrodynamic laminar boundary layer of an isothermal and
crimped vertical flat plate. The equations that governs the process are discretized by the
Finite Volume Method through the ANSYS/FluentTM software. Initially the paper aims
to compare the results obtained in the numerical simulation for different mesh refining
with the analytical model available in the literature. Afterwards, it is sought to verify how
the boundary conditions and plate thickness influence at the flow, at the heat exchange
and in the characteristic dimensionless parameters for this type of flow. The numerical
data were compared with the analytical model available in the literature and showed
good consent, regarding the variations in the boundary conditions, it was noticed that
these conditions influence in the field of velocity and therefore in the transfer of heat.

Keywords: Vertical isothermal plate. Natural convection. Finite volume method.

ACTA TECNOLÓGICA v.12, nº 1, 2017


1 INTRODUÇÃO De acordo com Güths (1998), um problema
que pode ser modelado a partir da definição
Muitas aplicações comuns da transferência
de convecção natural é a transferência de
de calor envolvem, como seu principal me-
calor em uma placa livre isotérmica vertical.
canismo, a convecção. Dentre essas aplica- Esta possui inúmeras aplicações na engenha-
ções, destaca-se a transferência de calor em ria, entretanto, faz-se necessária uma boa co-
serpentinas de refrigeração, no resfriamen- leção de correlações matemáticas confiáveis
to de equipamentos eletrônicos, em cole- 35
e prontas para fornecer dados relevantes para
tores de energia solar e no isolamento de projetos, como o coeficiente de transferência
cabines de aeronaves. de calor (DIAS; MILANEZ, 2004).

Segundo Machado e Alves (2014), a con- Machado (2013) comenta, em seu trabalho,
vecção envolve dois mecanismos de trans- que problemas envolvendo convecção livre
ferência de energia, quais sejam a difusão são difíceis de serem resolvidos analitica-
ou condução, sendo esta definida, de acor- mente, pois são exigidas muitas simplifica-
do com Peterson e Ortega (1990), como a ções, por tratar-se de problemas com forte
transferência de energia devido ao movi- acoplamento entre os campos de velocida-
de e temperatura, onde estes são descritos,
mento molecular aleatório do fluido, e a
matematicamente, por equações diferen-
advecção, que é a transferência de energia
ciais não lineares, logo a obtenção de re-
devido ao movimento global do fluido.
sultados confiáveis se tornou cada vez mais
A convecção está relacionada à transferên- trabalhosa e demorada, para alguns casos,
cia de energia por calor entre uma superfí- ela é impossível.
cie e um fluido em movimento sobre ela na
Neste contexto, o presente trabalho ana-
presença de um gradiente de temperatura.
lisa numericamente a transferência de ca-
De acordo com a natureza do escoamento, lor por convecção natural à camada limite
a convecção pode ser classificada por con- laminar térmica e hidrodinâmica de uma
vecção forçada ou convecção natural. Na placa plana vertical isotérmica e engastada.
convecção forçada, o escoamento é prove- As equações governantes são discretizadas
niente de meios externos como, por exem- pelo Método dos Volumes Finitos e resolvi-
plo, um ventilador, um soprador ou uma das iterativamente, os resultados são com-
bomba (OOSTHUIZEN; NAYLOR, 1999). Já parados, quando possível, com a solução
a convecção natural ocorre quando uma analítica exposta por Ostrach (1952).
força de corpo atua sobre um fluido no O trabalho ainda busca proporcionar um
qual existem gradientes de densidade cau- embasamento teórico-numérico para a am-
sados por variações da temperatura no flui- pliação dos estudos voltados para a área de
do na presença de um campo gravitacional transferência de calor por convecção natu-
(BERGMAN et al. 2015). ral em placas planas isotérmicas.

ACTA TECNOLÓGICA v.12, nº 1, 2017


2 MODELAGEM O processo de transferência de calor por
MATEMÁTICA convecção, independentemente de sua na-
tureza, pode ser expresso matematicamen-
Para a solução de qualquer problema real de
te pela lei do resfriamento de Newton.
engenharia, é necessário modelar os fenô-
menos físicos presentes através da adoção QCONV = hAs (Ts -T∞) (1)
de hipóteses simplificadoras e de equações
Sendo que, QCONV [W] é a taxa de transferên-
matemáticas que expressem corretamente
36 cia de calor por convecção, h [W/(m².K)] é
a física envolvida. As hipóteses devem ser
o coeficiente de transferência de calor por
tais que possibilitem a formulação de um
convecção, A [m²] a aérea de transferência
problema matemático que seja bem posto e
que possua soluções coerentes. de calor, Ts [K] a temperatura da superfície
e T∞ [K] a temperatura do fluido suficiente-
Baseado nisso, a presente seção abordará o
mente longe da superfície.
modelamento matemático do problema de
escoamento externo e da transferência de Considerando o caso clássico do desen-
calor em uma placa plana isotérmica, sob volvimento da camada limite laminar so-
efeito de convecção natural. bre uma placa plana vertical isotérmica,
Considerando uma placa plana imersa em as equações da continuidade, de Navier-S-
um fluido extenso quiescente e, com a tem- tokes e da Energia, em regime permanente,
peratura na superfície maior que a tempe- podem ser expressas na forma vetorial, res-
ratura do meio, o fluido próximo a placa é pectivamente, por:
menos denso do que o fluido dela afastado.
Devido às forças de empuxo, uma camada
limite se desenvolve na direção vertical e o
fluido aquecido ascende na mesma direção.
A figura (1) ilustra o esquema da situação
descrita, onde pode ser verificado o desen-
volvimento das camadas limite de veloci-
Sendo que, ρ [kg/m²] é a massa específica
dade e de temperatura.
do fluido, [m/s] a velocidade, [N] a for-
Figura 1: Ilustração do desenvolvimento das
ça, P [N/m²] é o campo de pressão, μ [(N.s)/
camadas limite de velocidade e temperatura:
m²] é a viscosidade dinâmica do fluido, k
[W/(m.K)] é a condutividade térmica do
fluido, T [K] é o campo de temperatura e Θ
é a dissipação viscosa.

Por serem equações diferenciais parciais, aco-


pladas e com considerável complexidade, al-
gumas hipóteses e simplificações podem ser
Fonte: Bergman et al., (2015, p. 381).
consideradas na formulação deste problema.

ACTA TECNOLÓGICA v.12, nº 1, 2017


Para o desenvolvimento do modelo mate- ser adimensionalizadas pela divisão de to-
mático são admitidas as seguintes hipóteses: das as variáveis dependentes e independen-
tes por quantidades constantes adequadas.
Escoamento na camada-limite laminar;
Dentro dos grupos adimensionais, deve-se
Fluido Newtoniano;
destacar, para a convecção livre o número
Força da gravidade atuando na direção y e de Grashof, o número de Nusselt pontual e
no sentido negativo; médio e o número de Rayleigh. Estes para-
37
metros são expressos, respectivamente, pe-
Fluido considerado como incompressível;
las as equações (9), (10), (11) e (12), sendo
Ausência do termo-fonte na Equação da Energia;
de extrema relevância para analises de pro-
Aproximação de Boussinesq; blemas envolvendo convecção natural, pois
descrevem o regime de escoamento, como
Dissipação viscosa desprezível.
no caso do número de Grashof, e a relação
Desta forma, as equações que regem o fenô-
entre o termo de flutuação e a viscosidade,
meno físico da convecção natural na cama-
caso do número de Rayleigh.
da limite laminar de uma placa plana verti-
cal isotérmica, em coordenadas cartesianas,
são expressas por:

3 MODELAGEM NUMÉRICA
A tarefa de um método numérico é resolver
uma ou mais equações diferenciais, substi-
tuindo as derivadas existentes na equação
por expressões algébricas que envolvem a
Onde, u é a componente da velocidade na
função incógnita. Com o método numéri-
direção x, v a componente da velocidade na
co adotado, volumes finitos, serão feitas as
direção y, g [m/s²] a aceleração da gravidade,
simulações do problema já mencionado.
ν [m²/s] a viscosidade cinemática do fluido,
α [m²/s] a difusividade térmica do fluido e β Como apresentado em Patankar (1980), Ma-

o coeficiente de expansão volumétrica tér- liska (2004) e Vesteeg e Malalasekera (1995)

mica, sendo este expresso pela equação (8). o procedimento para se obter as equações
discretizadas no método dos volumes fini-
tos consiste primeiramente na divisão do
domínio do problema em volumes finitos,
formando assim, uma malha computacio-
Segundo Çengel e Ghajar (2012), as equa-
nal. Posteriormente, efetua-se a integração
ções que governam a convecção livre podem

ACTA TECNOLÓGICA v.12, nº 1, 2017


em um volume elementar da equação di- cada vértice da malha, ou seja, tendo como
ferencial de cada uma das variáveis depen- ponto de partida a equação (14) e integran-
dentes envolvidas. Assim, a conservação do-a em um volume de controle, temos:
das propriedades envolvidas fica satisfeita
em cada volume elementar da malha e,
consequentemente, em todo o domínio Como resultado desta integração, temos a
de solução. Deste procedimento deriva um
38 equação geral de discretização, onde esta é
sistema de equações algébricas para cada
expressa, segundo Patankar (1980), por:
variável do modelo. A partir da resolução
do sistema de equações algébricas lineares, APΦP = AN ΦN + ASΦS + AE ΦE + AW ΦW + SΦ (16)

obtém-se, finalmente, a distribuição da pro- Sendo que, P é o ponto central da malha


priedade do domínio do problema. computacional e os sub-índices N, S, E e W
Gonçalves (2007) comenta que o processo indicam a localização dos pontos discretos,
de discretização torna-se mais conveniente como ilustrado na figura (2).
se todas as equações governantes possuí- Figura 2: Ilustração da malha computacional:
rem uma forma comum, isto é, a forma da
equação geral de transporte.

Desta forma, as equações (5), (6) e (7) po-


dem ser escritas para um campo escalar Φ
como uma equação geral de transporte na
forma tensorial ou na forma divergente, es-
tas são expressas pelas equações (13) e (14).

Fonte: Gonçalves (2007).

A Equação (16), na sua forma linear, deve


ser solucionada para todo o domínio com-
putacional. Assim, deseja-se resolver um
Onde os termos do lado direito são deno-
sistema de equações discretizadas. Este sis-
minados, respectivamente, por difusivos e
tema, de acordo com Maliska (2004), pode
fonte, no qual Γ é o coeficiente de difusão
ser expresso na sua forma matricial pela
numérica e o termo do lado esquerdo é de-
equação (17).
nominado como convectivo.
[A].[Φ] = [S] (17)
As equações discretizadas da variável depen-
dente Φ são obtidas integrando a equação Onde [A] é a matriz dos coeficientes e [Φ] é a
governante sobre cada um dos volumes de matriz das incógnitas. Os métodos para so-
controle do domínio. Portanto, a equação lucionar tais problemas numéricos são base-
(14) dá origem a uma nova equação para ados em diretos e iterativos. Para este artigo,

ACTA TECNOLÓGICA v.12, nº 1, 2017


optou-se pelo método iterativo, devido a ra- 4 METODOLOGIA
pidez que ocorre o processo de convergência.
O escoamento externo sobre a placa plana
No que se refere ao acoplamento pressão-ve- isotérmica é resolvido por meio do software
locidade presente nas equações governan- comercial CFD (Computational Fluid Dy-
tes, os métodos de solução de tais problemas namics) ANSYS/FluentTM, o acoplamento
são divididos em acoplados e segregados. pressão-velocidade presentes na equação da
Para a solução deste problema, optou-se por quantidade de movimento foi resolvido ite- 39
um método de natureza segregada, mais rativamente pelo algoritmo SIMPLE e os ter-
precisamente o SIMPLE (Semi Implicit Linked
mos advectivos foram tratados pelo método
Equations), onde este consiste em criar uma
UPWIND de 2ª ordem. Foi adotado, ainda,
equação para a pressão, que permita que o
um fator de convergência de 10-3 para as va-
processo iterativo avance, até o momento
riáveis pressão, velocidade e continuidade e
em que todas as equações de conservação
fatores de relaxação de 0,3 e 0,7 para a pres-
envolvidas sejam satisfeitas. A figura (3)
são e momentum, respectivamente.
mostra o fluxograma com os procedimentos
realizados pelo método SIMPLE. Em um primeiro momento, foi realiza-
da uma análise do refinamento da malha
Figura 3: Fluxograma do método SIMPLE:
computacional, visando garantir resultados
numéricos confiáveis. Para esta análise, si-
mulou-se três graus de refino, mantendo-
-se constantes as dimensões do domínio
que são da ordem de 1m x 1m. A figura (4)
apresenta os resultados para os diferentes
refinos da malha. Verifica-se que, para uma
malha grosseira, ocorre um distanciamen-
to do resultado analítico exposto por Os-
trach (1952). A malha muito refinada é a
que mais se aproxima dos resultados analí-
ticos, no entanto, necessita de uma maior
capacidade computacional, por isso uma
malha estruturada, com refinamento inter-
mediário no qual os volumes de controle
variam de 300000 com tamanho de 230
µm para a região dentro da camada limite
até 1850000 com tamanho de 2 cm para
regiões distantes da placa, foi a escolhida
Fonte: Adaptado de Vesteeg e Malalasekera (1995). para a simulação.

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Figura 4: Nusselt para diferentes refinos de para verificar como estas situações influen-
malha: ciam no seu escoamento. As condições de
contorno, comparadas para estas situações
foram: Pressão prescrita e simetria.

Figura 5: Modelo do problema:

40

Fonte: Autor.

A figura (5) explana a forma básica utiliza-


da para a análise numérica do problema.
Foram consideradas as seguintes condições
de contorno: pressão prescrita de 1 atm e Fonte: Autor.

temperatura prescrita de 25ºC nas superfí-


cies superior, lateral direita e inferior; pare- 4 RESULTADOS E DISCUSSÃO
de adiabática e condição de não escorrega- Com base na metodologia apresentada ante-
mento nas partes acima e abaixo da placa riormente, nesta etapa do trabalho serão apre-
engastada; parede com temperatura pres- sentados e discutidos os resultados obtidos.
crita de 45°C e aderência na placa.
A partir das figuras (6) e (7), nota-se que o
Foi adotado, ainda, espessura de 1 mm no modelo numérico adotado obteve uma boa
domínio computacional para simular mo- anuência quando comparado ao modelo
delagem bidimensional. O fluido quiescen- analítico, mesmo com uma pequena discre-
te escolhido foi ar seco com temperatura de pância no número de Nusselt entre os dois
25°C à pressão atmosférica, sendo a força modelos. Pode-se afirmar que a solução nu-
gravitacional o potencial motriz. O número mérica para o problema da convecção livre
de Rayleigh e o número de Reynolds, sendo em placas planas engastadas é satisfatória.
expressos pela equação 15 foram, respecti-
A figura (6) expõe que número de Nusselt
vamente, da ordem 106 e 375, caracterizan-
médio, possui uma relação linear crescente
do o escoamento como sendo laminar.
com sua altura na placa plana. Quanto ao
coeficiente de transferência de calor por con-
vecção, nota-se, a partir da figura (7) uma
Posteriormente, foram variadas as condi- concordância entre os valores e o decaimen-
ções de contorno e a espessura da placa, to do coeficiente em relação à altura da placa.

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Analisando os dados obtidos, pode-se afir- condição de pressão prescrita para a condi-
mar que para uma placa plana isotérmica ção de simetria.
com as condições de contorno citadas an-
É notório, a partir da figura (8), que ocorre
teriormente, o número de Nusselt é dire-
uma pequena variação no coeficiente analí-
tamente proporcional à altura da placa, e
tico de troca de calor por convecção, quan-
esta, por sua vez, é inversamente propor-
do comparado a condição de simetria. As
cional ao coeficiente de transferência de
figuras (9) e (10) mostram que tal variação 41
calor por convecção, o que resulta em uma
é consequência da modificação nos campos
relação do tipo: Nu/h=y.
de velocidades.
Figura 6: Variação do número de Nusselt
Figura 8: Variação do número de Nusselt
médio em relação à altura da placa:
para diferentes condições de contorno:

Fonte: Autor.

Figura 7: Variação do coeficiente convecti-


Fonte: Autor.
vo em relação à altura da placa:
Figura 9: Campo de velocidade para condi-
ção de pressão prescrita:

Fonte: Autor.

Visando analisar como as condições de


contorno influenciam no escoamento e
nos parametros adimensionais, modificou-
-se, nas superfícies abertas, a atmosfera a Fonte: Autor.

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Figura 10: Campo de velocidade para con- 5 CONCLUSÃO
dição de simetria:
Neste trabalho, foi estudado, numericamen-
te, o escoamento e as características térmicas
da convecção natural no interior à camada
limite laminar térmica e hidrodinâmica de
uma placa plana vertical isotérmica e engas-
42 tada, onde buscou-se variar a espessura da
placa e as condições de contorno, com o in-
tuito de verificar como estes parametros in-
fluenciam no escoamento e na troca de calor.

A partir dos resultados apresentados na se-


Fonte: Autor.
ção anterior, chega-se a algumas conclusões:
No que diz respeito à espessura da placa, fo- os resultados numéricos mostraram uma
ram simulados três situações distintas, com concordância satisfatória, apresentando er-
espessuras de 1mm, 2.5mm e 5mm. Para ros mínimos quando comparados ao mode-
tais simulações, foi adotada a condição de lo analítico; tais resultados indicam que a
pressão prescrita para os ambientes expos- interpretação e a modelagem escolhida para
tos a atmosfera. As condições iniciais foram descrever o fenômeno físico apresentado por
mantidas das simulações anteriores. Ostrach (1952) foi elaborada corretamente.
A figura (11) mostra que a espessura da pla- Observa-se, também, que a variação das con-
ca quase não influencia no número de Nus- dições de contorno influencia diretamente
selt. Isto nos permite concluir que o mode- na mensuração dos coeficientes adimensio-
lo bidimensional apresentado por Ostrach nais característicos desse tipo de escoamen-
(1952) é satisfatório. to. Quanto à espessura da placa, conclui-se
Figura 11: Variação do número de Nusselt que esta não influencia no campo de veloci-
para diferentes espessuras: dade e, consequentemente, o coeficiente de
convecção não sofre grandes alterações.

AGRADECIMENTOS
Agradeço a coordenação do Laboratório de
Modelagem e Simulação Numérica da UEMA,
MSiLAB, por disponibilizarem sua estrutura
para a presente pesquisa e a Fundação de Am-
paro à Pesquisa e ao Desenvolvimento Cien-
tífico do Estado do Maranhão, FAPEMA, pela
Fonte: Autor. concessão de bolsa de iniciação científica.

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43
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44

ACTA TECNOLÓGICA v.12, nº 1, 2017


Recebido em 29/09/2017; Aceito em 18/11/2017; Publicado na web em 14/03/2018

Análise numérica do escoamento e


dos coeficientes aerodinâmicos em
aerofólios sem e com a utilização de
flaps plain
45
William Denner Pires Fonseca1;
Lourival Matos de Sousa Filho2;
Genilson Vieira Martins3;
1 Mestrando em Engenharia Mecânica; Faculdade de Engenharia Mecânica; Universidade Estadual de Campinas; Departamento de
Energia; E-mail: fonsecawdp@gmail.com;

2 Professor do Curso de Engenharia Mecânica; Laboratório de Modelagem e Simulação Numérica; Universidade Estadual do Maranhão;
E-mail: filholouri@gmail.com;

3 Professor do Curso de Física; Departamento de Ensino; Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Maranhão -Campus
Grajaú; E-mail: gvmartins@gmail.com;

RESUMO
Este trabalho apresenta o estudo numérico do escoamento e das características aerodinâ-
micas em aerofólios simétrico e assimétrico sem e com flap. Um modelo bidimensional,
permanente e viscoso é adotado no problema. As equações da conservação de massa (Con-
tinuidade) e da conservação de movimento (Navier-Stokes) são diferenciadas pelo méto-
do dos volumes finitos através do software CFD (Computational Fluid Dynamics) ANSYS/
Fluent™. Inicialmente o código numérico é validado com a comparação dos resultados
obtidos numa simulação para um aerofólio da série NACA 4 dígitos sem flap com os re-
sultados apresentados na literatura. Em seguida buscou-se averiguar como se comporta
os campos de pressão e velocidade, as linhas de corrente, os coeficientes de sustentação e
arrasto para os aerofólios simétrico (NACA 0012) e assimétrico (EPLLER 423) sem e com
flap. Por fim é verificado qual aerofólio é mais eficiente aerodinamicamente.

Palavras-chave: Aerofólio. Flap. Simulação numérica.

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Numerical analysis of the flow and
aerodynamic coefficients in aerofolios
without and with using flaps plain
ABSTRACT
46
This article presents the numerical study of the flow and the aerodynamic characteristics in symmetrical
and asymmetrical airfoils without and with flap. A two-dimensional, permanent, and viscous model is
adopted in the problem. The mass conservation (continuity) and conservation of momentum (Navier-S-
tokes) equations are differentiated through the finite volume method using the CFD software (Compu-
tational Fluid Dynamics) ANSYS/Fluent™. Initially, the numerical code is optimized, and validated by
comparing the results obtained in a simulation for a 4 digit NACA flapless series with the results presen-
ted in the literature. Next, we try to find out how the pressure field and velocity, the current streamlines,
the drag and lift coefficients for the symmetrical airfoils (NACA 0012) and asymmetric airfoils (EPL-
LER 423), without and with flap. Finally it is verified which airfoil is more aerodynamically efficient.

Keywords: Airfoils. Flap. Numerical simulation.

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1 INTRODUÇÃO decolagem e pouso podem fazer as condi-
ções do projeto se tornarem inadequadas
Com o aumento continuo nos preços dos
para descrever situações reais de voo.
combustíveis fósseis, a cada dia que passa,
estudos voltados para a aerodinâmica são Prontamente, para atender estas diferentes
convenientemente encontrados. Pesquisas condições, as aeronaves normalmente ado-
de modelos para o cálculo de escoamentos tam sistemas como os flaps, no qual estes
ao redor de superfícies aerodinâmicas vem são definidos de acordo com Brederode 47
crescendo exponencialmente nos últimos (2014) como dispositivos mecânicos que
anos, isto pode ser creditado à aplicação mudam temporariamente a geometria do
desses sistemas em muitos campos da en- aerofólio, afim de produzir mudanças no
genharia como, por exemplo, veículos ter- escoamento.
restres, veículos marítimos, turbomáquinas É notório que devido à crescente impor-
e aeronaves (FONSECA; WOLF, 2017). tância tecnológica dos aerofólios para en-
Bertin e cummings (2009) definem aerodinâ- genharia, foram desenvolvidas gradativa-
mica como sendo a ciência que estuda o mo- mente diversas ferramentas para a análise
vimento de fluidos gasosos, relativos às suas do comportamento aerodinâmico destes
propriedades e características, e às forças que sistemas, dentre os quais podemos citar
exercem sobre corpos sólidos neles imersos. como principais os ensaios em túneis de
vento e as simulações computacionais,
Ribeiro (2002) comenta que uma das prin-
mais conhecidas como CFD (Computational
cipais aplicações da aerodinâmica está rela-
Fluid Dynamics).
cionado ao ramo aeronáutico, mais precisa-
mente com o projeto global de aerofólios, Os testes em túneis de vento podem apre-
esses são definidos segundo Anderson sentar maior confiabilidade nos resultados
(2007) como sendo objetos de perfis aero- em relação aos métodos numéricos, entre-
dinâmicos com seção constante e bidimen- tanto, ainda são procedimentos demorados,
sional. No entanto, para Abbott (1932) um com custos bastante elevados e também
aerofólio é apenas uma simplificação do possuem uma série de erros e incertezas as-
comportamento de uma asa teórica com sociados aos experimentos que devem ser
razão de aspecto infinita, dessa forma, é estudados com cautela (VARGAS, 2006).
possível supor que o escoamento possa ser Já os métodos numéricos permitem aná-
descrito em um plano. lises mais rápidas e com custos inferiores
O projeto de um aerofólio basicamente sobretudo devido a capacidade de proces-
procura atender uma situação em que a samento dos computadores digitais, o que
aeronave está em voo predominante, geral- torna os métodos computacionais de CFD
mente nivelado, em velocidades e altitudes uma importante ferramenta na aerodinâ-
de cruzeiro. Contudo, circunstâncias como mica moderna.

ACTA TECNOLÓGICA v.12, nº 1, 2017


Neste contexto, o presente trabalho visa
analisar numericamente o escoamento e as
características aerodinâmicas em dois aero-
fólios, sendo um simétrico e outro assimé-
trico, sem e com a utilização de flap, para
diferentes ângulos de ataque.
Fonte: Fox, Mcdonald e Pritchard (2013, p. 421).
48
Com base na ilustração, percebe-se que o
2 FUNDAMENTAÇÃO
escoamento de corrente livre, caracteriza-
TEÓRICA do pela velocidade V∞, divide-se no ponto
de estagnação e contorna o corpo. O flui-
2.1 Escoamento externo
do em contato com a superfície adquire
Segundo Munson, Young e Okiishi (2004)
à velocidade do corpo como resultado da
escoamentos externos são escoamentos so- condição de não escorregamento. Cama-
bre corpos imersos em um fluido sem fron- das limite são formadas nas superfícies su-
teiras, tais corpos são caracterizados por perior e inferior do corpo. O escoamento
uma camada limite de crescimento livre en- da camada limite é inicialmente laminar,
a transição para o escoamento turbulento
volvida pelo escoamento, que geram peque-
ocorre a alguma distância do ponto de es-
nos gradientes de velocidade e temperatura.
tagnação, distância esta que depende das
Çengel e Cimbala (2007) comentam que a condições de corrente livre, da rugosidade

principal diferença entre os escoamentos in- da superfície e do gradiente de pressão. A


camada limite turbulenta que se desenvol-
ternos e externos se dar em virtude de que
ve após a transição, cresce de forma mais
para os escoamentos confinados (interno),
acentuada que a camada laminar. Um leve
todo o campo de escoamento é denominado deslocamento das linhas de corrente é cau-
por efeitos viscosos, já no escoamento sobre sado pelo crescimento das camadas limites
corpos (externo), os efeitos viscosos estão li- sobre as superfícies. Em uma região em que

mitados a algumas partes do campo de esco- o gradiente de pressão é adverso (∂P/∂x>0),


assim chamado porque ele se opõe ao mo-
amento como as esteiras e camadas limite.
vimento do fluido, resultando numa dimi-
Para uma descrição mais clara, a figura (1) nuição da velocidade, uma separação do
ilustra os diversos fenômenos que ocorrem escoamento pode ocorrer. O fluido que es-
tava nas camadas limites sobre a superfície
nos escoamentos externos.
do corpo forma a esteira viscosa atrás dos
Figura 1: Ilustração do desenvolvimento das pontos de separação (FOX; MCDONALD;
camadas limite de velocidade e temperatura: PRITCHARD, 2013).

ACTA TECNOLÓGICA v.12, nº 1, 2017


Com isso, percebe-se que as características Munson, Young e Okiishi (2004) afirmam
dos escoamentos sobre corpos dependem que na ausência de todos os efeitos viscosos
fortemente de vários parâmetros, nos quais μ = 0), o número de Reynolds é infinito e
é de se destacar os adimensionais. Dentre que na ausência de todos os efeitos de inér-
estes, o número de Mach é um dos mais im- cia (r = 0), o número de Reynolds é nulo.
portantes, pois caracteriza o escoamento em Roskam e Edward (1997) comentam que,
relação a sua compressibilidade, tal parâme- se número de Reynolds for inferior a 107 49
tro é expresso segundo Brunetti (2008) por: o escoamento é caracterizado por regiões
de fluido bem organizadas, de forma que o
fluxo pode ser chamado laminar. Todavia,
se o número de Reynolds estiver acima de
Onde, V [m/s] representa a velocidade de
107, o movimento do fluido se torna caó-
corrente livre do fluido e C [m/s] a velo-
tico, isto é, este é caracterizado por flutua-
cidade do som. Se considerar-se um meio
ções aleatórias e rápidas de regiões de rede-
isentrópico (s = constante), a velocidade do
moinho de fluido, chamadas de turbilhões,
som é definida pela equação (2).
para essa condição o escoamento é dito tur-
bulento. A figura (2) ilustra a transição do
regime de escoamento.

Figura 2: Transição de regime de escoamento:


Sendo que, P [N/m] é a pressão, r [Kg/m³] a
densidade do fluido e s a entropia. Para Ma
< 0,3 temos escoamentos incompressíveis,
se 0,3 < Ma > 1 o escoamento é dito com-
pressível, com Ma = 1 o escoamento é sôni-
co e para Ma > 1 escoamento é hipersônico.

Outro importante parâmetro nas análises


Fonte: Munson, Young e Okiishi (2004, p. 491).
de escoamentos externos é o número de
Reynolds, onde este representa a razão en- Como dito, quanto maior for o número de Rey-
nolds, menor é a região onde os efeitos visco-
tre os efeitos de inércia e os efeitos viscosos.
sos são importantes e vice-versa. Esta diferença
Çengel e Cimbala (2007) afirmam que este
de comportamento do escoamento, aliada aos
parâmetro define o regime de escoamento
fenômenos de transição laminar-turbulenta,
de um fluido em laminar ou turbulento,
gera padrões de escoamento bastante diferen-
sendo expresso matematicamente por:
ciados para uma mesma geometria.

Silva (2005) comenta em seu trabalho que na


classe de escoamentos sobre corpos, as regi-
ões onde os efeitos viscosos são importantes

ACTA TECNOLÓGICA v.12, nº 1, 2017


são designadas por esteira e camada limite, gar geométrico dos pontos onde a velocidade
ilustradas esquematicamente na figura (3). u paralela ao corpo atinge 99% da velocidade
externa U, ou seja, a velocidade é nula, até
Figura 3: Transição de regime de escoamento:
uma distância perpendicular à superfície.

As equações que regem os fenômenos da


camada limite na forma integral são co-
50 nhecidas como equações de Von Kármán e
equação da energia, estas são expressas se-
gundo Moram (1984) por:

Fonte: Fox, Mcdonald e Pritchard (2013, p. 458).

Batchelor (1967) define a esteira como sen-


do uma região formada a jusante do cor-
po, resultado da própria perturbação que o
corpo apresenta ao escoamento. A camada
limite é acentuada como sendo uma região
Onde: ξ, η é o sistema de coordenadas local,
formada nas adjacências do corpo pelo efei-
sendo ξ tangente e η normal à superfície, Ve
to de aderência da camada de fluido que
a velocidade na fronteira da camada limite,
está em contato com a superfície, conheci-
δ a espessura de momentum, θ a espessura
da como condição de não escorregamento.
de energia, H o fator de forma da espessura
Para melhor compreender o fenômeno da de deslocamento definido como H=δ/θ, cf
camada limite, imaginemos uma partícula o coeficiente de atrito e cd o coeficiente de
fluida em contato direto com a parede de dissipação, sendo que estes coeficientes são
um sólido submetido a um escoamento ex- expressos respectivamente pelas equações
terno, devido às forças viscosas, esta partícu- (6) e (7).
la que se encontra infinitamente próxima da
superfície, terá velocidade nula nas regiões
próximas à superfície, mas não em contato,
terão velocidades menores que a velocidade
de escoamento, devido à ação das forças vis-
cosas. Essa região onde há variação de velo-
cidade devido a efeitos viscosos é conhecida
como camada limite e sua espessura é com-
preendida desde o contato com a superfície.

De maneira formal, Reis (2015) define a es- Onde τ é a tensão de cisalhamento e τw é a


pessura da camada limite δ como sendo o lu- tensão de cisalhamento na parede, ou seja,

ACTA TECNOLÓGICA v.12, nº 1, 2017


quando η = 0: Reis (2015) comenta que as equações aci-
ma apresentadas podem ser aplicadas em
qualquer corpo imerso num escoamento.
Contudo, é bastante difícil de utiliza-las,
Logo temos que, tais tensões existentes no devido a normalmente não conhecermos
campo de escoamento são devido à ação de as distribuições de pressão. Vários esfor-
efeitos viscosos para as tensões cisalhantes, ços tem sido feitos para determinar estas, 51
e devido à pressão local, para as tensões mas, devido as complexidades envolvidas,
normais. Estas tensões dão origem a uma elas estão disponíveis apenas para algumas
força resultante de modelo F, onde esta é
situações bem simples. Uma solução alter-
decomposta em duas componentes, sen-
nativa muito utilizada para contornar esta
do que, a componente normal desta força
dificuldade é definir coeficientes adimen-
é conhecida como sustentação (eq. 9) e a
sionais de sustentação e arrasto, no qual
componente na direção do escoamento é
chamada de arrasto (eq. 10). Tal configura- estes são expressos respectivamente pelas
ção é ilustrada na figura (4). equações (11) e (12).

Figura 4: Distribuição das tensões normal e


de cisalhamento:

Fonte: Çengel e Cimbala (2007, p. 493).


2.2 Métodos numéricos

Devido à complexidade das equações que


regem os escoamentos aerodinâmicos, nos
quais é necessário a obtenção destas de forma
integral para que se possa ter informações de-

Para as equações acima, θ representa o ân- talhadas sobre todo o campo do escoamento,
gulo que a componente normal exterior ao foram desenvolvidos gradativamente no de-
elemento diferencial de área faz com a dire- correr do anos diversos métodos numéricos
ção positiva do escoamento. capazes de resolves tais problemas.

ACTA TECNOLÓGICA v.12, nº 1, 2017


Dentre os principais métodos de solução Para tanto, o domínio de solução é dividido
utilizados em aerodinâmica computacio- num número finito de volumes de contro-
nal, destacam-se: le, e a equação da conservação é aplicada a

• Método dos Painéis e Vortex-Lattice cada um desses volumes. No centroide de


cada volume de controle, localiza-se um nó
• Método dos Volumes Finitos
computacional, no qual são calculados os
• Método dos Elementos Finitos valores das variáveis, sendo que, os valores
52
das variáveis nas superfícies dos volumes de
2.2.1 Método dos painéis e Método de
Vortex-Lattice controle são obtidos por interpolação em

Tanto o Método dos Painéis quanto o Mé- função dos valores nodais. Como resultado,

todo de Vortex-Lattice, que são apresenta- obtém-se uma equação algébrica para cada

dos com detalhes em Hess e Smith (1966) volume, na qual aparecem os valores das va-

e Miranda, Elliott e Baker (1979) respecti- riáveis no nó em causa e nos nós vizinhos.

vamente, solucionam o escoamento não Suas principais vantagens são a robustez e


viscoso através da solução da equação de o fornecimento de resultados detalhados de
Laplace, distribuindo singularidades (esco- todo o campo do escoamento, sendo possível
amentos elementares) ao longo do corpo sua utilização e qualquer tipo de escoamento.
que atendem a condição de impermeabi- 2.2.3 Método dos elementos finitos
lidade (o escoamento não pode atravessar
O Método dos Elementos Finitos (MEF) é
uma superfície sólida não porosa) e a Con-
similar ao Método dos Volumes Finitos, o
dição de Kutta.
que diferencia-os é o fato de que no MEF
A diferença básica entre ambos os métodos as equações de conservação não são discre-
é o tipo de singularidade utilizada em cada tizadas nos centroides dos volumes, e sim,
formulação. Às suas formulações clássicas nos pontos da malha computacional, além
podem ainda ser incluídos diversos mode- do mais estas são multiplicadas por uma
los como camada limite, correções devido à função peso antes de serem integradas so-
compressibilidade e cálculo da esteira. Tais bre todo o domínio.
características fazem com que esses méto-
Uma vantagem importante do MEF é a ca-
dos sejam bastante utilizados em aerodinâ-
pacidade para lidar com geometrias arbitrá-
mica computacional (VARGAS, 2006).
rias. Existe uma literatura extensiva dedi-
2.2.2 Método dos volumes finitos cada à construção de malhas de MEF, tais
Segundo Gonçalves (2007), o Método dos malhas são facilmente refinadas em regiões
Volumes Finitos (MVF) consiste em integrar de interesse, pois cada elemento pode ser
as equações diferenciais de conservação. simplesmente dividido em vários.

ACTA TECNOLÓGICA v.12, nº 1, 2017


3 METODOLOGIA Figura 5: Esquema do problema de escoa-
mento externo:
3.1 Metodologia matemática
Para a solução de qualquer problema real de
engenharia é necessário modelar os fenô-
menos físicos presentes através da adoção
de hipóteses simplificadoras e de equações
53
matemáticas que expressem corretamente
a física envolvida. As hipóteses devem ser
tais que possibilitem a formulação de um Fonte: Autor.
problema matemático que seja bem posto e Para o desenvolvimento do modelo mate-
que possua soluções coerentes. mático são admitidas as seguintes hipóteses:
Baseado nisso, o presente capitulo abordará • Escoamento bidimensional;
o modelamento matemático do problema
• Escoamento Incompressível;
de escoamento externo sobre aerofólios,
• Regime laminar e permanente;
onde será apresentado as equações de con-
servação de massa (equação da continuida- • Fluido viscoso;
de), quantidade de movimento linear (Na- • Fluido Newtoniano;
vier-Stokes) e hipóteses simplificadoras. As
• Não há efeitos de superfície livre.
equações acima mencionadas são apresen-
tadas na forma Lagrangeana, e sua obten- 3.1.2 Equações governantes
ção é feita aplicando as leis fundamentais Segundo White (2011) as equações que re-
da mecânica dos fluidos em um volume de gem o movimento de um escoamento in-
controle diferencial. compressível de um fluido Newtoniano e
com propriedades constantes, são as equa-
3.1.1 Formulação matemática ções da conservação de massa (continui-
Considere um aerofólio imerso em uma re- dade) e da quantidade de movimento (Na-
gião infinita totalmente preenchida por um vier-Stokes). Estas são apresentadas na sua
fluido que inicia seu escoamento uniforme forma integral como:
impulsivamente, isto é, o fluido assume ve-
locidade constante em todo o domínio ins-
tantaneamente. O escoamento incide sobre
o aerofólio fazendo um ângulo com relação
à corda do aerofólio, chamado ângulo de
ataque. A figura (5) mostra um desenho es-
quemático da situação descrita.

ACTA TECNOLÓGICA v.12, nº 1, 2017


Aplicando o teorema de Gauss do lado direito da equação da continuidade, temos:

Combinando as duas integrais de volume em uma:

54

Desta forma tem-se que, para que a integral seja nula, qualquer volume de controle ar-
bitrário deve ser nulo em todos os pontos dentro do volume de controle, caracterizando
assim a equação diferencial da continuidade, sendo esta expressa por:

Da mesma maneira se obtém as equações de Navier-Stokes na sua forma diferencial. En-


tretanto, deve-se ter um tratamento especial no que se refere as forças externas. Estas são
apresentadas da seguinte forma:

Considerando as hipóteses simplificadoras já mencionadas, as equações apresentadas an-


teriormente são reduzidas a:

ACTA TECNOLÓGICA v.12, nº 1, 2017


Onde, r [kg/m³], µ [Pa/s], u [m/s] e p [N/m] numérica e o termo do lado esquerdo é de-
representam a densidade, a viscosidade di- nominado como convectivo.
nâmica, a velocidade e a pressão estática, As equações discretizadas da variável de-
respectivamente. pendente são obtidas integrando a equação
governante sobre cada um dos volumes de
3.2 Metodologia numérica
controle do domínio. Portanto a equação
A tarefa de um método numérico é resolver
Eq. (25) dá origem a uma nova equação para 55
uma ou mais equações diferenciais, substi-
cada vértice da malha, ou seja, tendo como
tuindo as derivadas existentes na equação por
ponto de partida a equação (25) e integran-
expressões algébricas que envolvem a função
do-a no em um volume de controle, temos:
incógnita. Com o método numérico adota-
do, ou seja, o volume finitos, serão feitas as
simulações do problema já mencionado.

Como apresentado em Patankar (1980), Ma- Como resultado desta integração, temos a
equação geral de discretização, onde esta é
liska (2004) e Vesteeg e Malalasekera (2007)
expressa segundo Patankar (1980) por:
o procedimento para se obter as equações
discretizadas no método dos volumes finitos
consiste em integrar, no volume de controle
Sendo que, P é o ponto central da malha
finito, a equação diferencial na forma con-
computacional e os sub-índices N, S, E e W
servativa. Gonçalves (2007) comenta que o
indicam a localização dos pontos discretos,
processo de discretização torna-se mais con-
como ilustrado na figura (6).
veniente se todas as equações governantes
possuírem uma forma comum, isto é, a for- Figura 6: Ilustração da malha computacional:
ma da equação geral de transporte.

Desta forma, as equações (21), (22) e (23)


podem ser escritas para um campo escalar
Φ como uma equação geral de transporte na
forma tensorial ou na forma divergente, es-
tas são expressas pelas equações (24) e (25).

Fonte: Gonçalves (2007).

A Equação (27) na sua forma linear deve ser


solucionada para todo o domínio computa-
cional, assim deseja-se resolver um sistema
Onde, os termos do lado direito são deno- de equações discretizadas. Este sistema de
minados respectivamente por difusivos e acordo com Maliska (2004) pode ser expres-
fonte, no qual Γ é o coeficiente de difusão so na sua forma matricial pela equação (28).

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Figura 7: Comparação dos resultados nu-
mérico e experimental:
Onde, [A] é a matriz dos coeficientes e [Φ]
é a matriz das incógnitas. Os métodos para
solucionar tais problemas numéricos são ba-
seados em diretos e iterativos. Para este artigo

56
optou-se pelo método iterativo, devido a ra-
pidez que ocorre o processo de convergência.

No que se refere ao acoplamento pressão-ve-


locidade presente nas equações governantes,
os métodos de solução de tais problemas são
divididos em acoplados e segregados. Para
a solução deste problema optou-se por um
Fonte: Autor.
método de natureza segregada, mais preci-
samente o SIMPLE (Semi Implicit Linked As simulações foram realizadas para os per-
fis aerodinâmicos NACA 0012 e EPLLER
Equations), onde este consiste em criar uma
423 e o flap foi alojado a 20% do bordo de
equação para a pressão, que permita que o
fuga com uma deflexão de 40°. Adotou-se
processo iterativo avance, até o momento
ainda o método UPWIND de 2ª ordem para
em que todas as equações de conservação
o tratamento dos termos advectivos, um
envolvidas sejam satisfeitas.
fator de convergência de 10-3 para as va-
3.3 Modelagem e simulação riáveis pressão, velocidade e continuidade
As equações apresentadas no modelamen- e fatores de relaxação de 0,3 e 0,7 para a
to numérico foram resolvidas através do pressão e momentum respectivamente. As
software comercial CFD ANSYS/FluentTM. condições de contorno utilizadas foram:
Inicialmente foi realizada uma análise com- • • Velocidade prescrita de 10 m/s na
parativa da solução do problema, adotando- entrada do domínio computacional;
-se uma malha não estruturada com 89551
• • Pressão atmosférica na saída;
nós, com os dados experimentais apresenta-
dos por Abbott (1932). Tal comparação foi • • Condição de parede no aerofólio

realizada visando garantir resultados numé- para satisfazer a condição de não des-
lizamento.
ricos confiáveis e a figura (7) apresenta tais
resultados. Verifica-se que há uma boa con-
cordância no que diz respeito aos resultados 4 RESULTADOS E DISCURSÃO
numéricos apresentados com os dados ex- Com base na metodologia apresentada ante-
perimentais, logo pode-se afirmar que os da- riormente, nesta parte do trabalho serão apre-
dos expostos neste trabalho são confiáveis. sentados e discutidos os resultados obtidos.

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A figura (8) mostra os campos de pressão do aerofólio simétrico NACA 0012 sem flap para
diferentes ângulos de ataque.

Figura 8: Campos de pressão do aerofólio NACA 0012 sem flap:

57

Fonte: Autor.

Pode se observar na figura (9) que para o ângulo de 0° a sustentação produzida por esse
aerofólio é zero, como esperado devido a simetria do campo de pressão. À medida que se
aumenta o ângulo de ataque, constata-se que o gradiente de pressão se torna favorável
(∂P/∂x<0) na parte superior do perfil e adverso (∂P/∂x>0) na parte inferior, essa diferença
de pressão causa a sustentação e uma curva linear é gerada até aproximadamente 15°.

Figura 9: Coeficiente de sustentação dos perfis sem flap:

Fonte: Autor.

Pode também ser observado que quando o aerofólio se encontra a 15° (ver figura (10)),
os vórtices estão por toda parte superior do perfil. Esses vórtices fazem com que as linhas
de corrente divirjam, de modo que a velocidade diminui e como consequência a pressão
aumenta, logo a camada limite se desprende do escoamento e o aerofólio entra em estol.
Para o perfil assimétrico EPLLER 423 nota-se que mesmo com o ângulo de ataque zero é
gerado sustentação, isto é decorrência do seu camber (curvatura), o CLmáx para este aero-
fólio é de 2,1 e o estol ocorre a 12°.

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Figura 10: Linhas de corrente do aerofólio Figura 12: Campos de pressão do aerofólio
NACA 0012. α = 15°: EPLLER 423 com flap:

58

Fonte: Autor.

No que diz respeito ao arrasto desses perfis


(ver figura (11)), verifica-se que até 14° os
valores são aproximados, no entanto acima
desse ângulo o aerofólio NACA 0012 cresce
de forma mais acentuada que o EPLLER 423.

Figura 11: Coeficiente de arrasto dos perfis


sem flap:

Fonte: Autor.
Fonte: Autor.
Entretanto, o estol ocorre a ângulos inferio-
Para os aerofólios com flap, verificou-se
que mesmo a baixos ângulos de ataque a res aos aqueles próprios para perfis sem flap

diferença de pressão entre as superfícies su- como pode ser observado na figura (13). Tal
perior e inferior é muito grande (ver figura fenômeno é fundamentado pela presença
(12)), provocando altos valores nos coefi- excessiva de vórtices em aerofólios com
cientes de sustentação. Isto é decorrência flap a baixos ângulos, como observado no
da mudança na geometria do perfil. campo de velocidade da figura (14).

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Figura 13: Coeficientes de sustentação dos
perfis com flap:

59

Fonte: Autor.
Fonte: Autor.
Quanto ao arrasto, percebe-se que o aero-
Figura 14: Campo de velocidade do aerofó-
fólio simétrico possui valores menores para
lio EPPLER 423 com flap:
pequenos ângulos de ataque. Todavia, para
ângulos acima de 10° este possui coeficien-
tes maiores que aqueles apresentados pelo
perfil assimétrico.

Figura 15: Coeficientes de arrasto dos per-


fis com flap:

Fonte: Autor.

Após realizadas todas as simulações, obser-


vou-se a partir da figura (16) que o aerofó-
lio assimétrico EPLLER 423 sem flap é o que
possui maior eficiência aerodinâmica para
todos os ângulos de ataque. Isto acontece
porque este perfil tem melhores relações
CL/CD para todos os ângulos simulados.

ACTA TECNOLÓGICA v.12, nº 1, 2017


Figura 16: Eficiência aerodinâmica dos aerofólios:

60

Fonte: Autor.

5 CONCLUSÃO
Neste trabalho, foi estudado, numericamente, o escoamento e as características aerodi-
nâmicas em aerofólios sem e com a utilização de flaps, onde foi fixado um número de
Reynolds e variado o ângulo de ataque, com intuito de verificar qual aerofólio e sua dis-
ponibilidade (sem ou com flap) seria mais eficiente aerodinamicamente.

A partir dos resultados apresentados no capítulo anterior, chega-se a algumas conclusões:

As simulações mostraram que quando analisado somente os aerofólios sem flap, o assimé-
trico possui coeficientes de sustentação superiores e coeficientes de arrasto aproximados
aos aqueles apresentados pelo perfil simétrico.

Quando avaliado os perfis com flap, verificou-se que o assimétrico da mesma forma que
quando analisado os sem flap possui melhores relações CL/CD aos do aerofólio simétrico.
No entanto, foi constatado também que o estol para os perfis com flap ocorre a ângulos
inferiores aos dos sem flaps.

Por fim observou-se que o perfil EPPLER 423 sem flap é o que possui maior eficiência, pois
este aerofólio é o que possui melhores relações CL/CD. Entretanto, este perfil entra em
estol a ângulos menores que o aerofólio simétrico estudado.

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ACTA TECNOLÓGICA v.12, nº 1, 2017


Recebido em 29/09/2017; Aceito em 20/11/2017; Publicado na web em 14/03/2018

Otimização da segurança em canteiros


de obras utilizando veículos aéreos não
tripulados (vants) com controle de voo
via arduino yun
63
Jackson Silva Nascimento1;
Bruna Bugarin Tavares Gonçalves2;
Cynthia Leonis Dias Cintra3

1 Instituto Federal de Ciência e Tecnologia do Maranhão - IFMA, Departamento de Construção Civil. E-mail: jsnascimento1@hotmail.com;

2 Faculdade Pitágoras, Departamento Engenharia. E-mail: brunabugarin@hotmail.com;

3 Instituto Federal de Ciência e Tecnologia do Maranhão (IFMA), Departamento de Construção Civil. E-mail: cynthia@ifma.edu.br;

RESUMO
Ao longo dos anos, a indústria da construção civil tem passado por constantes evoluções
e transformações. Entretanto, nota-se um atraso na implantação de tecnologia de disposi-
tivos móveis para melhorias no setor. Na área de gestão de segurança, esse ponto de vista
é mais acentuado, uma vez que vários avanços tecnológicos podem ser utilizados em be-
nefício da otimização desse setor de operação da construção. Uma dessas tecnologias é a
implantação da tecnologia de veículos aéreos não tripulados (VANTs), em inglês Unman-
ned Aerial Veicheles (UAV), também conhecidos como drones. Na construção civil, seu
uso ainda é limitado, principalmente para o suporte de inspeção no setor de segurança
em canteiro de obras. O presente trabalho tem como objetivo investigar, de forma teórica,
como os drones podem ser benéficos para a otimização da segurança na construção civil,
mostrando um modelo a ser utilizado com o seu controle de voo realizado via Arduino
Yun, fornecendo gerenciadores de segurança com rapidez, tais como imagens e vídeos em
tempo real de inspeção no campo de limitação da obra, a fim de facilitar a inspeção de
segurança do local de trabalho.

Palavras chave: Construção civil. Drones. Segurança.

ACTA TECNOLÓGICA v.12, nº 1, 2017


Optimization of safety in workstrades
using non-tripulated air vehicles (vants)
with voice control via arduino yun

64 ABSTRACT
Over the years, the construction industry has undergone constant changes and changes.
However, there is a delay in deploying mobile device technology for industry improve-
ments. In the area of ​safety management, this point of view is more pronounced, since
several technological advances can be used to benefit the optimization of this sector of
construction operation. One such technology is the deployment of Unmanned Aerial
Veicheles (UAV) technology, also known as drones. In civil construction, its use is still
limited, mainly for the support of inspection in the sector of security in construction site.
The present work aims to investigate in a theoretical way, how the drones can be benefi-
cial for the optimization of safety in the civil construction, showing a model to be used
with its control of flight realized through Arduino Yun, providing security managers with
speed, such as images and real-time video inspection in the field limitation of the work,
in order to facilitate safety inspection of the workplace.

Keywords: Construction. Drones. Security.

ACTA TECNOLÓGICA v.12, nº 1, 2017


1 INTRODUÇÃO Desta forma, o presente trabalho propõe
de um viés teórico a respeito da utilização
O setor da construção civil vive em constan-
dessas aeronaves, acopladas a plataformas
te transformação e adaptação. A fim de se
externas de hardware utilizadas para o con-
manter competitivo no mercado, tem bus-
trole de voo, para inspeção de segurança,
cado soluções eficientes e de baixo custo que
uma vez que tal atividade necessita de uma
elevem a produção e a qualidade de serviços.
visão mais ampla em um canteiro e locais
Dentre os problemas enfrentados pela área, 65
de obra de difícil acesso às pessoas.
a falta de organização em canteiro de obras
tem ocasionado prejuízos, devido à inefici-
ência dos processos de logística e seguran- 2 DRONES
ça do ambiente em construção, acarretando Drone é um termo utilizado para definir um
em falhas no cumprimento de prazos, negli- veículo voador não tripulado, ou aeronave
gência das obras, aumento de custo, etc. que não necessita de um piloto para o seu
Diante disso, Hissam e Terrence (2001) ob- funcionamento. Existem vários modelos
servam a necessidade de ferramentas que diferentes no mercado. Porém, podemos
auxiliem no melhor gerenciamento do can- classificá-los em duas categorias: asa rotati-
teiro, proporcionando, assim, a otimização va (Figura 1) e asa fixa (Figura 2). Os de asa
do espaço e de segurança. Nesse contexto,
rotativa assemelham-se a um helicóptero e
Veículos Aéreos Não Tripulados (VANTs),
costumam ser compactos, de fácil operação
em inglês Unmanned Aerial Vehicles/Sys-
e baixo custo. Sua estrutura permite me-
tems, ou popularmente conhecidos como
lhor estabilidade de voo. Possuem grande
drones são aeronaves projetadas para pilo-
versatilidade, com decolagem e pouso ver-
tar sem a presença de um piloto a bordo,
capazes de auxiliar em diversas atividades tical (não necessitam de pista para tal), e
de construção de maneira rápida, eficien- boa estabilidade. São muito utilizados para
te e com baixo custo. De acordo com Mi- filmagens aéreas devido a sua facilidade de
tishita et. al (2014), alguns estudos já são uso, mas esbarram na maioria das vezes na
realizados na construção civil utilizando autonomia de voo limitada, restringindo
VANTs, como aerofotogrametria, mapea- sua utilização em algumas aplicações. Hoje
mento de áreas de risco, montagem de es- existem várias fabricantes de asas rotativas
truturas metálicas, monitoramento e con- de alto desempenho com até 90 minutos
trole de trafego, manutenção de rodovias,
de autonomia, e há preço, em contraparti-
entre outros. Porém, o estudo voltado para
da, a partir de 90 mil.
a implantação dessas aeronaves para apoiar
o monitoramento de tarefas gerenciais, tais Já os de asa fixa apresentam vários tama-
como logística, inspeção e segurança de nhos, funcionalidades e são mais susceptí-
canteiros, ainda é muito limitado. veis aos ventos fortes. Assemelham-se a um

ACTA TECNOLÓGICA v.12, nº 1, 2017


avião, possuindo sustentação aerodinâmi- Figura 2: Drone com asa fixa
ca a partir do fluxo de ar nas asas. Possui
uma autonomia maior e custo reduzido na
grande maioria das vezes, o que contribui
para sua utilização em aplicações como
mapeamento aéreo, para o qual é necessá-

66
ria a cobertura de grandes áreas. Relativa-
mente mais difícil de operar, os sistemas
de piloto automático fazem praticamente
Fonte: Adaptado por Nascimento (2017).
todo o trabalho, desde a decolagem até o
De um modo geral, todo drone possui um
pouso automático. A variedade deste tipo
sistema de comunicação, um controlador
de equipamento aumenta a cada ano, as-
de voo, hélices acopladas, dispositivos con-
sim como os sensores e câmeras que podem
troladores de velocidade dos motores, ba-
ser embarcados. No Brasil, atividades de
terias e sensores para informar o nível de
voo comercial com drones são regularmen-
inclinação do drone, pois é através des-
te monitoradas pela Agência Nacional de
sa inclinação que ele acelera ou desacele-
Aviação Civil (ANAC). De acordo com a Lei
ra cada motor, de forma individual, para
11.182/2005 (BRASIL, 2005), a operação
mantê-lo nivelado. Segundo Paula (2012),
comercial de uso de veículos aéreos não tri-
um quadricoptero tem a capacidade de rea-
pulados está pendente, permitindo apenas lizar quatro movimentos básicos (arfagem,
o uso experimental para fins de pesquisa, guinada, rolagem e altitude). Essas informa-
desenvolvimento, levantamento de merca- ções de movimentos são transmitidas para
do, treinamento de pilotos e outras deman- o controlador de voo através do sistema de
das específicas e autorizadas pela ANAC. comunicação que interpreta a informação e
Figura 1: Drone com asa rotativa comunica aos controladores de velocidade
dos motores a potência necessária que cada
um deve receber, fazendo, assim, o contro-
le de rotação correta e de forma individual
de cada motor acoplado. O conjunto destes
elementos formam a base de qualquer veí-
culo aéreo não tripulado.

Na construção civil, os avanços de pesquisa


com drones ainda é recente. No entanto,
estudos demonstram crescimento da apli-
cação quanto a atividades de monitora-
Fonte: Adaptado por Nascimento (2017). mento e inspeção. Mitishita et al. (2014)

ACTA TECNOLÓGICA v.12, nº 1, 2017


desenvolveu um estudo utilizando as ima- devido as muitas variáveis que tornam cada
gens aéreas capturada por VANTs para mo- projeto da construção civil ímpar. Apesar
nitorar áreas rurais através da geração de disso, existem vários princípios básicos,
ortoimagens. Outras aplicações também considerações e critérios que, aplicados
são encontradas, como detecção de danos de maneira correta e com bom senso, po-
em estruturas, monitoramento de estradas dem auxiliar os planejadores a uma solu-
não pavimentadas através da captura de ção satisfatória. Os procedimentos formais
67
imagens feitas por drones, monitoramento devem ser necessários para a atividade de
e avaliação de danos e manutenção em pa- planejamento de canteiros, pois facilitam a
vimentos rodoviários, etc. focalização de detalhes e, por conseguinte,
diminuem a possibilidade de esquecimento
3 CANTEIRO DE OBRAS: de pontos importantes em uma obra, tais
PLANEJAMENTO como inspeção devida, logística e seguran-
ça no ambiente.
Canteiros de obras podem ser definidos
como áreas de trabalho fixa e temporária,
3.1 Logística e segurança em canteiros de obras
nas quais são desenvolvidas operações de
Na construção civil, a segurança do traba-
apoio e execução de uma construção. O
lho em um canteiro de obras está ligada
processo de planejamento do canteiro tem
diretamente à sua logística. Hissam e Ter-
por objetivo otimizar a utilização do espaço
rence (2001) destacam que acidentes, como
físico disponível, de maneira que possibili-
queda de objetos envolvendo equipamen-
te o trabalho com segurança e eficiência de
tos ou veículos em canteiros, estão relacio-
homens e máquinas. Saurin (1997) classifi-
nadas ao mau uso do espaço, desorganiza-
ca os objetivos que um canteiro deve atin-
ção do ambiente ou acontecem por causa
gir em duas categorias:
de falhas e desvios de comportamento in-
a) Objetivo de baixo nível: promover ope-
dividual de funcionários. O procedimento
rações eficientes e seguras de forma a man-
mais comum de segurança utilizado é a rea-
ter alta motivação dos empregados;
lização de inspeções no canteiro, com o ob-
b) Objetivo de alto nível: minimizar distân- jetivo de verificar frequentemente as con-
cias de viagem e tempo de movimentação dições do ambiente no qual os trabalhos
pessoal e materiais, a fim de diminuir ao estão sendo realizados. Melo e Costa (2015)
máximo o tempo de manuseio de materiais descrevem que o processo de inspeção se-
enquanto aumenta-se o tempo produtivo gura no ambiente de trabalho da constru-
evitando, dessa forma, obstruções ao movi- ção civil segue três características básicas: a
mento de materiais e equipamentos. frequência, a observação direta e a intera-
Embora os objetivos de um canteiro sejam ção com os funcionários. Isto é, o gestor de
bem definidos, não existe solução rápida, segurança necessita fazer inspeções diárias
fácil e imediata para o seu planejamento, e frequentes caminhando por todo o can-

ACTA TECNOLÓGICA v.12, nº 1, 2017


teiro, a fim de verificar se as atividades em exercício estão sendo executadas conforme os
critérios de segurança. Porém, na maioria das construções e obras civis, canteiros possuem
tamanho significativo e uma quantidade de atividades considerável. Dessa forma, o tem-
po gasto para observar e inspecionar o ambiente da construção se eleva.

De modo a suprir essa carência de forma eficiente e ágil, os recursos visuais de alta tecno-
logia, como Veículos Aéreos não Tripulados (VANTs), ou popularmente conhecidos por
68 drones, apresentariam grande potencial ainda inexplorado para a execução de tarefas de
inspeção e segurança dentro dos canteiros. A aeronave seria capaz de sobrevoar de forma
automatizada a área delimitada pelo canteiro e, assim, fornecer informações em tempo
real, de forma precisa e com um gasto de tempo reduzido quando comparado ao mesmo
processo feito de forma tradicional.

Saurin (1997) selecionou os elementos mais comuns localizados em um canteiro de obras


e que são passiveis de inspeção visual por meio do sobrevoo de um drone ao logo de toda
a área delimitada, apresentados no Quadro 1.

Quadro 1: Elementos a serem inspecionados durante o sobrevoo de um drone em um


canteiro de obras

Área de verificação Itens inspecionados


Localização das instalações do canteiro;
Instalações provisórias Condições físicas das instalações;
Monitoramento das rotas de pessoas e materiais.
Proteção contra queda no perímetro dos pavimentos (guar-
da-copo e rodapé);
Plataforma de proteção (bandeja salva-vidas);
Segurança da obra
Sinalização de segurança;
Andaimes suspensos e simplesmente apoiados;
Elevadores Cremalheira, Guincho e Grua.
Condições das vias de circulação do canteiro;
Sistema de movimenta-
Monitoramento do tráfego de materiais;
ção e Armazenamento de
materiais Condição de armazenagem dos materiais na área externa
(agregados, argamassa, blocos, tijolos, aço, tubos de PVC,etc)
Rotas e trânsito na área externa do canteiro devido a entrada
Análise dos impactos na e saída de caminhões;
vizinhança da área deli-
mitada Potencial de poluição de ruas/avenida devido ao descarrega-
mento de materiais (concreto entre outros).
Fonte: Melo e Costa (2015).

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4 MÉTODO DE PESQUISA
A estratégia inicial para o desenvolvimento deste trabalho consiste em etapas de estudos
exploratórios e empíricos que auxiliam na pesquisa, criando conhecimento teórico durante
os processos de concepção ou aplicação de um artefato projetado. Segundo Hevner et al
(2004), essa meta-teoria definida como Design Science Research não anseia alcançar verda-
des absolutas, grandes teorias ou leis gerais, mas sim identificar e compreender problemas
do mundo real e propor soluções adequadas, fazendo avanços no conhecimento teórico de 69

determinada área.

A etapa de estudos exploratórios tem por objetivo realizar a identificação do problema


real a ser estudado para que, dessa forma, obtenha-se melhor entendimento sobre como
deve ser desenvolvido o uso do drone para o monitoramento e inspeção do canteiro de
obras, conforme os processos gerenciais em obras, logísticas e segurança.

A etapa de estudos empíricos, por outro lado, visa à construção do artefato, que, no pre-
sente trabalho, envolve a escolha de um drone AR.Drone 2.0 parrot, que terá o seu plano
de voo automatizado via Arduino para transmissão e recepção de dados durante a inspe-
ção do canteiro. Deverão ser levantadas, inicialmente, as práticas de segurança e logística
do ambiente em construção com base nos requisitos dos gestores de segurança de obras.
Tais práticas serão colhidas por meio de documentos de checklist de segurança, entrevis-
tas e reuniões com gestores dos canteiros participantes.

5 DRONE PROPOSTO NA METODOLOGIA


Para o desenvolvimento do presente trabalho, é proposto a utilização de um AR.Drone
2.0 parrot, conforme mostra a Figura 3, pois esse tipo de aeronave possui quatro hélices,
baixo custo para fins acadêmicos e científicos, altura de voo elevada para necessidade de
fotografias aéreas e gravação de vídeos em tempo real em canteiros de obras.

Figura 3: AR.Drone 2.0 parrot:

Fonte: Afonso (2014).

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Quadro 2: Especificações técnicas do drone proposto na metodologia

Características Descrição AR.Drone 2.0


Útil para controlá-lo à distância, bem como
Câmera horizontal para utilização em técnicas de mapeamento 1280 x 720 (720p HD)
e localização.
Útil para visualizar o solo e ainda, através
Câmera Vertical de um algoritmo de comparação de ima- 320 x 240 (QVGA)
70
gens, mede a velocidade do voo.
Para medir a força aplicada ao drone, in-
Acelerômetro formando a sua inclinação em um deter- 3 eixos
minado eixo.
Giroscópio Obtenção da direção do drone. 3 eixos
Sensor de pressão Maior estabilidade durante os voos verticais. Sim
Medir a altura do drone, isto é, a distância
Ultrassom Sim
do artefato em relação ao solo.
Magnetômetro Uma bússola 3D, útil no Absolute Control. 3 eixos
Recurso interessante no AR.Drone 2.0 pois,
através do magnetômetro,
Absolute Control Sim
o referencial para o controle do quadricóp-
tero será o ponto de visão do usuário.
Kernel Linux Sistema adepto ao uso de software livre 2.6.32

Circuito constituído por uma série de tran-


ARM Cortex A8 32b
Processador sístores que podem executar operações ló-
1GHZ
gicas e matemáticas.

RAM Memória de acesso aleatório 1 GB

WiFi Conexão com internet sem fio -


Fonte: Afonso (2014).

O quadro 2 mostra algumas especificações do drone proposto. Embora o manuseio do


AR.Drone 2.0 parrot seja possível via dispositivos móveis e com aplicativos em plataformas
IOS ou Android, seu controle de voo utilizando esses aparelhos não é simples. O controle
via aplicativos em aparelhos celulares ou tablets é muito instável, devido aos comandos
virtuais obtidos via Joystick no aplicativo possuírem uma resposta de sensibilidade muito
maior do que a obtida em comandos via botões físicos. A ideia do presente trabalho é inte-
grar um controle físico capaz de comandar o voo do Veículo aéreo não tripulado utilizando
a plataforma de prototipagem eletrônica de hardware livre e de placa única Arduino Yun.

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Figura 4: Arduino Yun e seus componentes: e o botão ao lado do conector USB-A serve
para resetar as configurações de rede WiFi
para as configurações de fábrica).

Esta placa se diferencia das outras devido ao


fato de conseguir facilmente fazer uma co-
municação entre os pinos e o Linux rodando
na placa. Dessa forma, um poderoso compu-
71
tador em rede é capaz de ser criado com as
facilidades da programação do Arduino.

Fonte: RoboCore (2017). 6 CONCLUSÃO


O Arduino Yun (Figura 4) é uma placa mi- Propondo a otimização da inspeção de can-
crocontroladora que possui chip ATme- teiros de obra em construção civil utilizan-
ga32u4 e processador Atheros AR9331. do drones para controle de voo realizado
O ATmega32u4 é um microcontrolador via Arduino Yun, espera-se, com o presen-
CMOS-8 bits de baixo consumo, com base te trabalho, integrar a plataforma de pro-
na arquitetura aprimorada AVIS RISC e ca- totipagem eletrônica de hardware e placa
paz de executar instruções poderosas e pre- única ao controle físico do voo do veículo
cisas em um único ciclo de clock com apro- aéreo não tripulado (VANT), garantido uma
ximações de 1 MIPS/MHz, permitindo que melhor estabilidade e manuseio via pressio-
namento de botões, quando comparadas à
o design do sistema otimize o consumo de
alta sensibilidade de aparelhos utilizados
energia e a velocidade de processamento.
como controles remotos, tais como tablets
A placa possui entrada para cabo ethernet
ou smartphones com plataforma IOS/An-
com conector RJ-45, módulo Wifi para co-
droid que possuem telas sensíveis e ocasio-
nexão à internet sem fio, uma porta USB-
nam a instabilidade de comando.
-A, onde é possível colocar periféricos, 20
Espera-se ainda, o desenvolvimento de di-
pinos digitais de entrada/saída, que podem
retrizes para a utilização de drones na cons-
ser controlados usando os mesmos méto-
trução civil que possibilitem o monitora-
dos comuns do Arduino (7 podem ser usa-
mento de obras, com ênfase na segurança
dos como saída PWM e 12 podem ser usa-
e logística do ambiente em construção, to-
dos como entradas analógicas) e 3 botões
mada de decisões gerenciais utilizando as
de reset com funções distintas (O botão imagens obtidas pelos VANTs após o pro-
próximo ao conector RJ45 serve para rese- cesso de inspeção e o aumento do conhe-
tar o chip do Arduino, como em qualquer cimento na utilização de drones para reali-
placa Arduino. O botão próximo aos pinos zação de atividades gerenciais, redução de
analógicos serve para resetar o processador custos, tempo e aumento na eficiência de
AR9331 com todas as informações de RAM atividades de vistoria em canteiros.

ACTA TECNOLÓGICA v.12, nº 1, 2017


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de Aviação Civil. Diário Oficial da República Federativa do Brasil. Poder Executivo,
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Brasília, DF. Disponível em: <http://www.camara.gov.br/sileg/integras/384679.pdf>. Aces-
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MITISHITA, E.; EDUARDO, J.; GRAÇA, N. de.; CENTELHO, J.; MACHADO, A. O Uso de Ve-
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SAURIN, A. THARCISIO (1997). Metódo para diagnóstico e diretrizes para planeja-


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www.robocore.net/loja/produtos/arduino-yun.html>. Acesso em: 04/08/2017.

ACTA TECNOLÓGICA v.12, nº 1, 2017


Recebido em 08/11/2017; Aceito em 22/12/2017; Publicado na web em 14/03/2018

Avaliação microbiológica de frutos de


cagaita (eugenia dysenterica)
Ana Letícia Silva Coelho1;
Solange Cristina Carreiro2

1 Mestre em Engenharia Química pela Universidade Estadual de Maringá - UEM. E-mail: ana_lsc@outlook.com;
73
2 Professora do Programa de Pós Graduação em Ciência e Tecnologia de Alimentos da Universidade Federal do Tocantins - UFT.
E-mail: solange@uft.edu.br;

RESUMO
Foram analisadas amostras de frutos frescos e congelados de cagaita (Eugenia dysenteri-
ca), bem como dos frutos submetidos à desidratação osmótico-solar com teor de umidade
de 22,7%. A qualidade microbiológica foi determinada por meio do Número Mais Prová-
vel de coliformes totais e termotolerantes (NMP.g–1), ausência/presença de Salmonella em
25g de amostra, segundo legislação vigente, além de Unidades Formadoras de Colônia de
bolores e leveduras (UFC.g–1). Nos frutos in natura frescos foram detectados bolores, leve-
duras e bactérias entéricas, no que concerne aos congelados, verificou-se apenas a presen-
ça de bolores e leveduras. Os frutos desidratados apresentaram resultados negativos para
Salmonella, coliform totais e termotolerantes. Conforme a Resolução RDC nº 12, de 02 de
janeiro de 2001, os frutos e o produto desidratado são adequados ao consumo.

Palavras-chave: Desidratação osmótica. Coliformes. Salmmonella. Bolores e leveduras.

ACTA TECNOLÓGICA v.12, nº 1, 2017


Microbiological evaluation of cagaita
(eugenia dysenterica) fruit

ABSTRACT
74 Samples of fresh and frozen cagaita (Eugenia dysenterica) fruit were analyzed, as well as
fruits submitted to solar osmotic dehydration with 22,7% dampness. The microbiological
analysis included counts for total and termotolerant coliforms (MPN.g–1), Salmonella and
the determination of moulds and yeasts (CFU.g–1). The study showed contamination of
fresh fruit by enteric bacteria, moulds and yeast, while for frozen fruit were observed
moulds and yeasts. Samples of dehydrated cagaita fruit showed negative results for total
and termotolerant coliforms (MPN.g–1), Salmonella and the determination of moulds
and yeasts (CFU.g–1). All samples were considered acceptable for consumption according
Resolução RDC nº 12, January 02, 2001.

Keywords: Osmotic dehydration. Coliforms. Salmonella. Moulds and yeasts.

ACTA TECNOLÓGICA v.12, nº 1, 2017


1 INTRODUÇÃO e coloração, degeneração dos tecidos, se-
guindo-se envelhecimento e murchamento
Eugenia dysenterica, popularmente conhe-
dos frutos.
cida como “cagaita” ou “cagaiteira”, é uma
árvore frutífera nativa dos cerrados de até Neste sentido, a aplicação da desidratação
10 m de altura, de tronco e ramos tortuo- osmótica tem demonstrado efetiva redução
sos, casca grossa, fissurada, folhas simples, no colapso estrutural de frutos delicados,
opostas e de margem lisa, ocorrendo nos mesmo quando posteriormente se aplicam
75
Estados da Bahia, Goiás, Maranhão, Mato processos agressivos, como tratamento tér-
Grosso, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, mico. Além disso, na atualidade, tem sido
Pará, Piauí, São Paulo, Tocantins e Distrito grande a demanda por produtos naturais e
Federal. As flores podem ser isoladas ou reu- saudáveis, e este processo permite o desen-
nidas em pequenos fascículos, partindo das volvimento de produtos com valor agregado
axilas foliares. Os frutos têm formato globo- e propriedades funcionais, além de favore-
so, bagáceo, cor amarelo-clara, levemente cer a retenção dos pigmentos da fruta, evitar
ácido, epicarpo membranoso, casca frágil, o escurecimento enzimático e fornecer pro-
alta umidade, baixo valor energético, além dutos mais atraentes em termos de aparên-
de serem considerados fonte de vitaminas A cia para o consumo (LIMA, et al, 2004).
e C, apresentam peso entre 14 a 20 g, com- Por conseguinte, a desidratação osmóti-
primento de 3 a 4 cm e diâmetro de 3 a 5 co-solar é uma técnica interessante e pro-
cm (CARNEIRO et al, 2015; ASSUMPÇÃO missora em países onde existem grande
2013). Após a floração, os frutos estão dispo- variedade de frutas, ampla disponibilidade
níveis para a colheita em aproximadamente de açúcar e alta incidência de raios solares
quinze dias, e devem ser coletados maduros, durante todo o ano. Esta tecnologia é co-
no chão, ou de vez, sacudindo-se levemente mumente utilizada na industrialização de
os ramos da árvore (OLIVEIRA, 2010). alimentos e baseia-se na redução de água

A cagaiteira é considerada uma espécie de disponível para microrganismos e reações

interesse econômico, principalmente por químicas, sendo uma alternativa econômi-

causa do aproveitamento de seus frutos na ca e segura para a conservação de produtos

culinária, destacando-se o preparo de do- alimentícios, resultando em um produto

ces, geleias, licores, refrescos, sorvetes e su- final com estabilidade na cor, maior reten-

cos (ASSUMPÇÃO et al, 2013). Carneiro et ção de vitaminas, melhor qualidade na tex-

al, (2015), apontam que a conservação pós- tura, quando comparadas com os produtos
diretamente desidratados (GONÇALVES e
-colheita de frutos de cagaita, sob atmos-
BLUME 2008; BRANDÃO et al, 2003).
fera refrigerada, é em média de cinco dias,
independente do tratamento utilizado. A Os frutos desidratados são considerados ali-
partir deste período observam-se sinais de mento de umidade intermediária (15-30%),
senescência, como perda de textura, aroma com atividade de água na faixa de 0,65-0,85,

ACTA TECNOLÓGICA v.12, nº 1, 2017


sendo bolores e leveduras são os principais ram utilizados 12 frutos frescos e 12 fru-
microrganismos responsáveis pela deterio- tos congelados, os quais foram agrupados
ração deste tipo de alimento (GONÇALVES em quatro amostras, contendo três frutos
e BLUME, 2008; LIMA et al, 2004). cada, enquanto para o produto desidratado
foram utilizadas quatro embalagens de ca-
A Resolução RDC nº 12, de 02 de janeiro
gaita tipo passa com quinze frutos por em-
de 2001, estabelece os padrões microbioló-
balagem com 22,7% de umidade.
76 gicos para alimentos, sendo estabelecido o
valor máximo de 5. 103 e 102 UFC.g-1 para Os testes microbiológicos foram conduzi-
coliformes termotolerantes referentes a fru- dos no Laboratório de Microbiologia Apli-
tas frescas in natura/congeladas e desidrata- cada (UFT), enquanto as provas bioquí-
das, respectivamente, além de ausência de micas e o teste de coloração Gram foram
Salmonella para ambos os casos. Não é esta- realizados no Laboratório de Microbiologia
belecido, contudo, padrões para bolores e de Alimentos (UFT). Foi utilizado 25g de
leveduras (BRASIL, 2001). cada amostra as quais foram transferidas
assepticamente para um frasco contendo
Neste contexto, o presente trabalho teve
225 mL de água peptonada 0,1% estéril (di-
como objetivo avaliar a qualidade micro-
luição 10-1), precedeu-se a diluição seriada
biológica de frutos in natura/congelados e
até 10-3 utilizando-se o mesmo diluente.
desidratados de cagaita através de análises
microbiológicas de bactérias do grupo coli- 2.2 Número Mais Provável (NMP) de

formes, Salmonella, bolores e leveduras. coliformes termotolerantes e totais

Para a determinação do Número Mais Pro-


2 METODOLOGIA vável (NMP) de coliformes termotolerantes
e totais, alíquotas de 1mL de cada dilui-
2.1 Amostras
ção foram inoculadas em séries de três tu-
Os frutos de cagaita foram coletados em bos contendo 9 mL de caldo Lauril Sulfato
duas propriedades rurais distintas localiza- Triptose (LST), com campânula de Duhram
das em Palmas (TO). O material coletado invertido. Os tubos foram incubados a
foi inserido em sacos plásticos individuais 35°C por 24-48 horas. Foram considerados
e estéreis, mantido em caixas de isopor até positivos aqueles tubos que apresentaram
a chegada ao Laboratório de Processos de turvação do meio e formação de gás den-
Separação de Biomoléculas e Desidratação tro da campânula de Duhram. Dos tubos
de Alimentos da Universidade Federal do positivos, foi retirada uma alçada que foi
Tocantins (UFT), onde os frutos foram se- transferida para tubos contendo caldo Ver-
lecionados quanto à ausência de injúrias de Brilhante Bile (teste para coliformes to-
e com coloração uniforme, seguindo-se o tais), os quais foram incubados a 35°C por
processo de desidratação. Para as análises 24-48 horas. Dos tubos positivos de LST
microbiológicas do produto in natura, fo- também foi retirada uma alçada para tubos

ACTA TECNOLÓGICA v.12, nº 1, 2017


contendo caldo Escherichia coli (teste para lose Lisina Desoxiciolato (XLD). As placas
coliformes termotolerantes), incubados a foram incubadas invertidas a 35°C por 24
45°C por 24 horas (COELHO et al, 2006). horas (COELHO et al, 2006).

2.3 Determinação de Escherichia coli 2.5 Contagem de Bolores e Leveduras

Para confirmação da presença de E. coli, Para contagem de bolores e leveduras foi


uma alçada dos tubos contendo caldo EC, utilizado o método de plaqueamento em
que apresentavam turbidez e produção de superfície das diluições 10-1, 10-2 e 10-3, em 77
gás no interior da campânula de Duhram, meio BDA (batata-dextrose-ágar) acrescido
foi semeada em placas de Petri contendo de 0,2 mg.mL-1 de cloranfenicol. Foi plaque-
Ágar Eosina Azul de Metileno (EMB). As ado 0,1 mL de cada diluição na superfície de
placas foram incubadas a 35°C por 24-48 placas, uma alça de Drigalsky foi utilizada
horas. Nas placas em que as colônias apre- para espalhar o inóculo por todo o meio. As
sentaram características macroscópicas tí- placas foram incubadas a 22°C por 48 horas
picas de E. coli foram realizadas as provas e os resultados foram obtidos segundo o nú-
bioquímicas de Indol, Vermelho de Meti- mero de Unidades Formadoras de Colônia
la (VM), Voges-Proskauer (VP) e Citrato de por grama de material (UFC.g-1), consideran-

Simmons, além do teste de coloração Gram do-se cada diluição (COELHO et al, 2006).

(COELHO et al, 2006). 2.6 Coloração Gram

2.4 Determinação de Salmonella Para cada placa que apresentou crescimen-


to com características macroscópicas típicas
Para detecção de Salmonella foram retiradas
de E.coli, foi selecionada uma colônia e, a
25g de cada amostra que foram transferi-
partir desta, foi realizado o teste de colora-
das para frascos de homogeneização previa-
ção Gram. Em uma lâmina limpa, foi feito
mente esterilizados e tarados. Foram adi-
um esfregaço que foi fixado com calor (em
cionados aos mesmos 225 mL de caldo de
chama do bico de Büsen), seguindo os pro-
pré-enriquecimento (caldo lactosado). As
cedimentos a seguir: (1) cobrir com cristal
amostras foram homogeneizadas, e os fras-
violeta por 1 minuto; (2) lavar em água cor-
cos foram incubados a 35°C por 24 horas,
rente; (3) cobrir com solução de lugol por
com as tampas ligeiramente afrouxadas. De
1 minuto; (4) lavar em água corrente; (5)
cada frasco contendo pré-enriquecimento
descorar com álcool absoluto por 15 segun-
foram retirados 1mL para 10 mL de caldo
dos; (6) corar com fucsina por 30 segundos;
Tetrationato (TT) e 1 mL para 10 mL de cal-
(7) lavar em água corrente; (8) secar com
do Rappaport. Os caldos foram incubados a
papel de filtro; (9) observação em objetiva
35°C por 24 horas. Para cada tubo de TT e
de imersão (COELHO et al, 2006).
Rappaport retirou-se uma alçada que foi es-
triada nos meios Ágar Entérico de Hectoen 2.7 Teste Bioquímico de Produção de Indol

(HE), Ágar Bismuto Sulfito (BS) e Ágar Xi- Para cada amostra suspeita, selecionou-se

ACTA TECNOLÓGICA v.12, nº 1, 2017


uma colônia que foi inoculada com o auxí- A prova Voges Proskauer testa a habilida-
lio de uma alça de níquel-cromo em tubos de de microrganismos de produzirem um
de ensaio contendo 5 ml de meio seletivo produto final neutro, acetilmetilcarbinol,
sim industrial (kasvi). os tubos foram incu- durante a fermentação da glicose. Os tubos
bados a 37°C por 48 horas. Após a incuba- positivos apresentam coloração rósea a ver-
ção, foram adicionadas quatro gotas de rea- melho rubro. Os tubos positivos apresen-
tivo de kovacs. esta prova testa a habilidade tam ausência de coloração rósea ou verme-
78
de alguns microrganismos de degradarem a lha (COELHO et al, 2006).
molécula de triptofano em indol. Os tubos
2.9 Teste Bioquímico Citrato de Simmons
positivos apresentam coloração vermelha
na superfície do caldo. os tubos negativos As colônias, selecionadas das amostras sus-
apresentam coloração amarela na superfí- peitas, foram estriadas com o auxílio da alça
cie do caldo (Coelho et al, 2006). de níquel-cromo em tubos de ensaio con-
tendo 5 mL de Ágar citrato de Simmons.
2.8 Testes Bioquímicos Vermelho de
Os tubos foram incubados a 37°C por 24
metila e Voges Proskauer
horas, logo depois se realizou a leitura. Esta
Para cada amostra suspeita, foi selecionada prova caracteriza microrganismos capazes
uma colônia que foi inoculada com o au- de utilizar o citrato como única fonte de
xílio da alça de níquel-cromo em tubos de carbono, provocando a elevação do pH do
ensaio contendo 5 mL de caldo Vermelho meio de cultivo devido a metabolização do
de metila e Voges Proskauer. Os tubos fo-
íon citrato. Nos tubos positivos, o meio tor-
ram incubados a 37°C por 48 horas. Após a
na-se azul intenso, principalmente no ápi-
incubação, foram retirados 2 mL do caldo
ce. Nos tubos negativos o meio permanece
que foram transferidos para tubos de en-
da cor natural (COELHO et al, 2006).
saio vazios e estéreis. Para este caso, foram
adicionadas 1 mL de solução de alfa-naftol
3 RESULTADOS E DISCUSSÃO
e 0,5mL de solução de hidróxido de po-
tássio 40% ao caldo. Para o primeiro caso As análises microbiológicas dos frutos in
foram adicionadas ao caldo 5 gotas de so- natura antes do congelamento foram nega-
lução de vermelho de metila. Para ambos tivas para Salmonella e Coliformes totais em
os casos, os tubos foram agitados e ficaram todas as amostras avaliadas. Já as contagens
em repouso por 2 horas. A prova Vermelho de bolores e leveduras apresentaram valo-
de Metila testa a habilidade de alguns mi- res consideráveis de unidades formadoras
crorganismos de produzirem e manterem de colônias variando de 20 a 80. No que
estáveis produtos ácidos finais da fermen- concerne aos microrganismos Coliformes
tação da glicose. Nos tubos positivos, o cal- termotolerantes, das quatro amostras anali-
do fica avermelhado. Nos tubos negativos a sadas, três apresentaram contaminação na
cor original (amarela) do meio é mantida. diluição 10-1, duas apresentaram contami-

ACTA TECNOLÓGICA v.12, nº 1, 2017


nação na diluição 10-2 e nenhuma demonstrou contaminação na diluição 10-3. Os resulta-
dos das provas bioquímicas podem ser observados na Tabela 1.

A microbiota detectada em tais análises pode estar relacionada à contaminação inicial das
frutas com bactérias e fungos originários do solo (GONÇALVES et al, 2014), uma vez que
a cagaita é normalmente recolhida diretamente do mesmo, sendo, então, utilizada para
consumo ou destinada à etapas de processamento. Ressalta-se ainda que a presença de
coliformes termotolerantes indica que as frutas tiveram contato com material de origem 79
fecal, pois a E.coli não faz parte da microflora normal de frutos in natura, tendo como ha-
bitat exclusivo o intestino de animais de sangue quente (PINHEIRO et al, 2005).

Tabela 1: Provas bioquímicas para coliformes termotolerantes de frutos in natura sem


congelamento.

N° Amostra Indol VM VP Citrato Resultado


Padrão E. coli (típica) + + - - Cultura Positiva
Padrão E. coli (atípica) - + - - Cultura Positiva
1 1 - Diluição 10-1 + + + + Cultura Negativa
2 1- Diluição 10-2 + + + + Cultura Negativa
3 2 - Diluição 10-1 + + + + Cultura Negativa
4 2 - Diluição 10-2 + + + + Cultura Negativa
5 3 - Diluição 10-1 - + + + Cultura Negativa

VM- Vermelho de Metila; VP - Voges-Proskauer


Fonte: Coelho et al, (2006).

Por conseguinte, Teixeira et al. (2013) ao avaliarem a qualidade microbiológica de tomates


comercializados em supermercados da cidade de Juazeiro do Norte, observaram a ausência
de Salmonella e presença de coliformes termotolerantes abaixo do limite máximo de 102
NMP.g-1 - estabelecido pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA). Por sua
vez, Palú et al. (2002) ao realizarem o mesmo estudo para frutas frescas servidas em um
restaurante universitário, verificaram que 64,3% das amostras analisadas apresentaram
contagem de coliformes termotolerantes acima do padrão preconizado pela ANVISA, sen-
do a presença de E.coli detectada em 40% do total de amostras.

No presente estudo, apesar de não terem sido detectadas bactérias do grupo coliformes
nas amostras dos frutos in natura, houve o crescimento de microrganismos nas placas de
Petri nos meios seletivos para E.coli, sendo um indicativo da presença de outros sorotipos
diarreiogênicos (PALÚ et al, 2002). Sabe-se que diversas toxinfecções alimentares estão
relacionadas com a presença de Salmonella bem como bactérias do grupo coliformes, con-

ACTA TECNOLÓGICA v.12, nº 1, 2017


figurando um perigo para a saúde humana ração, enquanto que, para as leveduras, tal
(ASSIS e UCHIDA, 2014). Assim, de acordo condição é evidenciada na faixa de tempe-
com a RDC n° 12 de 2 de janeiro de 2001, ratura entre 5 e 35ºC. Scriban (1985) res-
os frutos de cagaita enquadram-se em pa- salta que tal comportamento parece estar
drões higiênicos satisfatórios, sendo dessa relacionado com a estrutura química da
forma aconselháveis para consumo. membrana plasmática desses microrganis-
mos, que contém lipídeos com baixo ponto
80 Para os frutos in natura submetidos ao con-
de fusão, o que possibilita trocas celulares
gelamento, as análises foram negativas para
mesmo a baixas temperaturas.
Salmonella, Coliformes totais e termotole-
rantes. Todavia, bolores e leveduras mos- Na literatura, são escassos os trabalhos re-
traram contagens que variaram de 1 até 5 lacionados à avaliação microbiológica de
UFC.g . O resultado obtido para Salmonella
-1 frutos congelados, contudo, estudo de
e microrganismos do grupo coliformes Santos et al. (2008) para polpas de frutas
pode estar relacionado com a sua predile- congeladas, mostrou que das 98 amostras
ção por temperaturas intermediárias próxi- analisadas quanto ao padrão microbiológi-
mas de 30°C. Assim sendo, o crescimento co, apenas cinco apresentaram resultados
de sua maior parte não ocorrerá abaixo de positivos para coliformes totais e duas con-
15°C nem acima de 45°C (SCRIBAN, 1985). firmaram a presença de coliformes termo-
Por conseguinte, o fato da contagem de tolerantes e E. coli, com valores entre 0,3 e
Unidades Formadoras de Colônia de bolo- 0,9 NMP.g-1, resultando em uma qualidade
res e leveduras terem sido minimizadas jus- microbiológica satisfatória dos frutos con-
tifica-se devido à condição adversa de bai- gelados analisados no presente trabalho.
xa temperatura, pois, durante o processo No que concerne às análises microbiológi-
de congelamento, a formação dos cristais cas dos frutos desidratados, estas foram ne-
de gelo no interior do alimento modifica a gativas para bolores e leveduras, coliformes
disponibilidade de água para reações bio- totais, coliformes termotolerantes e Salmo-
químicas, o que, consequentemente, reduz nella. Tal resultado pode estar relacionado
a taxa de crescimento de microrganismos com o fato de a desidratação osmótica ser
(SINGH e HELDMAN, 2016). Desta for- um método que visa a remoção parcial de
ma, a temperatura de congelamento pode água dos alimentos, reduzindo a atividade
ter contribuído para eliminação de grande de água dos mesmos, o que, consequente-
parte da microbiota presente originalmente mente, inibe a atividade microbiana (SIN-
nos frutos frescos. GH e HELDMAN, 2016).

Ademais, Marques (2006) aborda que os Guimarães e Silva (2008), indicaram que o
bolores se desenvolverem em uma ampla processamento de murici-passas por meio
faixa de temperatura, demonstrando cres- desidratação osmótica seguida de secagem
cimento ótimo em temperaturas de refrige- em estufa com circulação forçada de ar, foi

ACTA TECNOLÓGICA v.12, nº 1, 2017


satisfatório no que se refere à avaliação microbiológica. Os resultados mostraram que as
contagens de coliformes termotolerantes foram inferiores ao valor máximo permitido
(<1,0.102 UFC.g–1) e a pesquisa de Salmonella indicou ausência em 25 g dos frutos desidra-
tados. Resultados semelhantes foram obtidos por Batista et al. (2014), ao analisarem a esta-
bilidade microbiológica de bananas passas das variedades Prata e Anã, não se observando o
crescimento de coliformes a 45 ºC, nem a presença de Salmonella, no período de 180 dias.

Assim sendo, a ausência de mofos e leveduras demonstra que o processamento foi eficien-
81
te na eliminação da microbiota deteriorante presente nos frutos in natura e congelados,
enquanto que os resultados negativos para Salmonella e microrganismos do grupo coli-
formes mostram que o procedimento de desidratação foi realizado em condições higiê-
nico-sanitárias adequadas, e os frutos desidratados estão aptos ao consumo, segundo a
legislação vigente.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A avaliação microbiológica para as amostras de frutos in natura de cagaita evidenciaram a
presença de entorobactérias, leveduras e bolores, contudo tais resultados são considerados
satisfatórios conforme a RDC n°12 de 2 de Janeiro de 2001.

Nos frutos in natura congelados não foi detectada a presença de Salmonella, nem de mi-
crorganismos do grupo coliformes. Para as mesmas amostras, observou-se a presença de
bolores e leveduras, embora em menor número do que nos frutos frescos, o que é atribuí-
do à redução da atividade de água resultante do processo de congelamento.

Por fim, os frutos desidratados por meio da técnica osmótico solar não evidenciaram o
crescimento de nenhum dos microrganismos estabelecidos na legislação. Os resultados
indicam condições higiênico-sanitárias adequadas no processamento dos frutos, além de
demonstrar a viabilidade do processo de desidratação como método de conservação de
frutos de cagaita.

ACTA TECNOLÓGICA v.12, nº 1, 2017


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ACTA TECNOLÓGICA v.12, nº 1, 2017


Recebido em 30/09/2017; Aceito em 06/11/2017; Publicado na web em 14/03/2018

O uso das tecnologias da informação e


comunicação pelos discentes e docentes
do proeja do IFMA - Campus Maracanã
Luziane Melo da Silva1;
Christiane Ferreira Lemos Lima2; 85

1 Estudante do Curso de Cozinha (PROEJA) do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Maranhão - Campus Maracanã;
E-mail: luzianemelos@gmail.com;

2 Professora Pesquisadora do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Maranhão - Campus Maracanã, Líder do Núcleo de
Pesquisa em Informática Aplicada; E-mail: cfllima@ifma.edu.br.

RESUMO
Este artigo apresenta o resultado de uma pesquisa realizada em outubro de 2016, que teve
como objetivo identificar como se dá o acesso e o uso das Tecnologias da Informação e
Comunicação pelos discentes e docentes do Programa Nacional de Integração da Educa-
ção Profissional com a Educação Básica na Modalidade de Educação de Jovens e Adultos
(PROEJA) do IFMA (Instituto Federal do Maranhão), campus Maracanã, na opinião dos
entrevistados. A pesquisa foi exploratória e descritiva, tendo como instrumento de in-
vestigação um questionário. Como resultado desta pesquisa, tem-se um diagnóstico que
aponta para um envolvimento tecnólogo que requer mais do que apenas o conhecimento
técnico teórico, mas também necessita do desenvolvimento de habilidades e sensibilidade
nas relações sociais com pessoas que nunca tiveram a oportunidade de ter contato com
a informática. O estudo também propõe melhorias sobre o acesso e o uso das TICs pelos
alunos e professores do PROEJA como instrumento educacional na referida instituição.

Palavras-chave: Tecnologia da Informação e Comunicação (TIC); PROEJA, IFMA, campus


Maracanã.

ACTA TECNOLÓGICA v.12, nº 1, 2017


The use of information and
communication technologies by
students and teachers of the proeja
from IFMA - Maracanã Campus
86

ABSTRACT
This article presents the results of a survey conducted in October 2016, which aimed to
identify how the access and the use of Information and Communication Technologies
by students and teachers of the National Program for the Integration of Vocational Edu-
cation and Basic Education in Youth and Adult Education Mode (PROEJA, portuguese
acronym) from IFMA (Federal Institute of Maranhão), Maracanã campus, according to
the interviewees’ opinion. The research was exploratory and descriptive, making use of a
questionnaire as a research tool. As result of this research, there is a diagnosis that points
to a technological involvement that requires more than just theoretical technical knowle-
dge, but also the development of skills and sensitivity in social relations with people who
have never had the opportunity to have contact with computer science. The study also
proposes improvements on the access and use of ICTs by PROEJA students and teachers
as an educational tool in IFMA.

Keywords: Information and Communication Technologies (ICT). National Program for


the Integration of Vocational Education and Basic Education in Youth and Adult Educa-
tion Mode. IFMA, Maracanã campus.

ACTA TECNOLÓGICA v.12, nº 1, 2017


1 INTRODUÇÃO não dá nenhuma garantia de ocorrerem
transformações significativas na educação.
Com o advento de um novo modelo de
Nesse contexto, Pretto (2008) enfatiza que:
sociedade, a chamada Sociedade da Infor-
mação, em que o uso das Tecnologias da A presença de tecnologias mais simples,
Informação e Comunicação (TICs) consti- como os livros impressos, ou de outras
tui-se como ferramenta que viabiliza inú- mais avançadas, como os computadores em
meros produtos e serviços facilitadores no rede, produzindo novas realidades, exige o 87
dia a dia, surge mais uma modalidade de estabelecimento de novas conexões que as
excluídos. De maneira direta ou indire- situem diante dos complexos problemas
ta, observa-se a exclusão nos acessos ban- enfrentados pela educação, sob o risco de
cários, serviços públicos, e manuseios de que os investimentos não se traduzam em
computadores, eletrodomésticos, celulares alterações significativas das questões estru-
e muitos outros. turais da educação (PRETTO, 2008, p. 81).

No que tange à exclusão digital, as pesqui- Portanto, a atuação docente na construção


sas conduzidas pelo Cetic.br apontam que e efetivação das propostas pedagógicas que
uma parte substancial da população e das direcionam a utilização das TICs na educa-
organizações brasileiras não tem acesso à ção, é um fator determinante para o suces-
Internet. Ainda existem diferenças decor- so do educando.
rentes de características como, por exem- Dessa forma, o professor deve utilizar as
plo, o porte da organização ou o perfil TICs como diferenciais na aprendizagem
socioeconômico do indivíduo (renda fa- com sentido e significado, evidenciando
miliar, grau de instrução, faixa etária, etc.) ao discente o quanto é imprescindível a
(CGI, 2014, p. 160). apropriação desses recursos para o seu de-
No IFMA - campus Maracanã, essa reali- senvolvimento intelectual e seu exercício
dade é vivenciada com as alunas e alunos pleno da cidadania. Assim, o professor, ao
matriculados nos cursos de Agropecuária e proporcionar a inclusão digital do educan-
Cozinha do Programa de Educação de Jo- do, transforma os recursos tecnológicos em
vens e Adultos - PROEJA (Brasil, 2005), os instrumentos de inclusão social.
quais, geralmente, não dispõem de recursos Freitas (2004) argumenta que é inconcebí-
tecnológicos em casa ou que ainda não se vel que a escola nos dias atuais não utili-
apropriaram desses recursos. ze as TICs de maneira favorável e positiva
É certo afirmar que os recursos tecnológi- para seu corpo discente, principalmente
cos, em especial o microcomputador, apre- quando se trata dos alunos do PROEJA,
sentam-se para a educação como recursos que retornam à sala de aula visando uma
pedagógicos. Contudo, a disponibilidade maior qualificação profissional exigida pelo
física de tais recursos no ambiente escolar mercado, aumentando suas expectativas

ACTA TECNOLÓGICA v.12, nº 1, 2017


de conseguir um emprego melhor. Aliada sores de informática) com capacitação para
a isso, segundo Bovo (2002), têm aqueles mediar a inclusão digital?
que querem adquirir conhecimento para se
A referida Instituição está suprindo as neces-
tornarem independentes, então não devem
sidades desses alunos com relação ao uso das
ser excluídos desse mundo digital.
TICs, para seu desenvolvimento intelectual,
Diante desse cenário, especialmente para profissional e social, já que a inclusão digital
atender a modalidade de ensino PROEJA, as é direito de todos os cidadãos e cidadãs?
88
instituições de ensino precisam adequar as
Nesse contexto, o objetivo principal des-
suas práticas ao contexto de cada educan-
te estudo é apresentar um diagnóstico de
do, inclusive propiciando a utilização de
como se dá o acesso e o uso das Tecnolo-
seus recursos tecnológicos de forma proati-
gias da Informação e Comunicação pelos
va, centrados em projetos pedagógicos, de
discentes e docentes do PROEJA no IFMA,
modo a permitir ao educando sair prepara-
campus Maracanã.
do para competir no mercado de trabalho.
Para alcançar os objetivos traçados neste
Pelo exposto, tem-se que as TICs são im-
trabalho, foi realizado um estudo explora-
prescindíveis no contexto educacional. To-
tório-descritivo de abordagem quantitativa
davia, o que se questiona, continuamente,
e qualitativa, com o objetivo identificar
é se as instituições de ensino estão prepara-
como se dá o acesso e uso das TICs por alu-
das para a utilização desses recursos de for-
nos e alunas do 1º, 2º e 3º ano dos Cursos
ma eficaz, para usufruir de seus benefícios.
de Agropecuária e Cozinha do IFMA, cam-
Com o intuito de saber se o IFMA campus pus Maracanã, da modalidade de ensino
Maracanã está capacitado para atender essa PROEJA, na concepção dos próprios alunos
demanda, utilizou-se deste estudo para ava- e alunas dos cursos. O estudo também foi
liar os aspectos que ocorrem no entorno do ampliado aos professores que ministram
uso das TICs por alunos e alunas do PROEJA aula nos cursos do PROEJA. Os dados da
desta referida instituição. Para sua sustenta- pesquisa foram obtidos tendo como ins-
bilidade, o estudo foi realizado a partir dos trumentos de investigação questionários
seguintes questionamentos: distribuídos aos alunos e professores dos
O IFMA - campus Maracanã dispõe de uma referidos cursos.
infraestrutura que permite a utilização am-
pla e abrangente das TICs? 2 METODOLOGIA
Como estão sendo usadas as TICs em bene- A metodologia utilizada no desenvolvi-
fício do desenvolvimento de alunos e alu- mento desta pesquisa envolveu as seguin-
nas do PROEJA? tes etapas:

Há na Instituição professores ou tutores de Realizar um estudo exploratório-descritivo


diversas áreas de atuação (além dos profes- de abordagem quantitativa e qualitativa,

ACTA TECNOLÓGICA v.12, nº 1, 2017


com o objetivo identificar como se dá o Em relação à natureza dos dados, o estudo
acesso e uso das TICs por alunos, alunas, foi qualitativo, pois buscou saber detalhes
professores e professoras dos Cursos de do objeto estudado, bem como traçar um
Agropecuária e Cozinha do IFMA, campus perfil dos professores e estudantes entrevis-
Maracanã, da modalidade de ensino PROE- tados e qualitativo, pois permitiu análises
JA, buscando atingir os objetivos traçados estatísticas e tabulações a partir do questio-
no projeto. Os dados da pesquisa foram ob- nário aplicado.
89
tidos por meio de questionários aplicados
A coleta de dados "em primeira mão" se deu
aos alunos e professores do PROEJA;
por meio de um questionário contendo vinte
Analisar os dados obtidos na pesquisa com e três perguntas, incluindo questões abertas,
os alunos, classificando-os por turma, curso fechadas e de múltipla escolha. Da mesma
e de forma geral; forma, aplicou-se um questionado com de-
Analisar os dados obtidos na pesquisa com zenove perguntas aos docentes do PROEJA.
os professores do PROEJA;

Propor melhorias sobre o acesso e o uso das


3 RESULTADOS E DISCUSSÃO
TICs pelos alunos e professores do PROEJA Conforme já mencionado na Seção 2, fo-
como instrumento educacional do IFMA, ram aplicados dois diferentes questioná-
campus Maracanã. rios, sendo um destinado aos discentes e
outro aos docentes. Portanto, serão feitas
A amostragem do estudo foi não probabi­
duas análises distintas, que serão apresen-
lística3, selecionada por conveniência, for-
tadas nas próximas subseções.
mada por docentes e discentes do PROEJA
do IFMA - campus Maracanã. Este tipo de Os dados da pesquisa foram obtidos por
amostra foi o escolhido pela facilidade de meio de um questionário distribuído aos
acesso da pes­quisadora aos entrevistados. alunos e professores no ambiente institu-
cional - IFMA, campus Maracanã. O refe-
A pesquisa realizada teve uma abordagem
rido questionário foi subdividido em duas
qualitativa, por meio da observação, análi-
partes: a primeira consiste na identificação
se e pesquisa em referências bibliográficas e
teve uma abordagem quantitativa por meio dos participantes da pesquisa por sexo e

do uso de recursos e técnicas estatísticas. idade para todos os entrevistados e o tem-


po de atuação profissional dos docentes; a
O questionário aplicado foi um instrumento
segunda refere-se à percepção dos pesquisa-
de coleta e medida, sendo que a apresenta-
dos sobre o acesso e uso das TICs no IFMA
ção dos resultados foi realizada por meio de
- campus Maracanã.
gráficos, números e percentagem, como for-
ma de facilitar a visualização dos resultados. Para facilitar a forma das respostas do ques-
3 Neste tipo de amostragem, a seleção dos elementos da população tionário, optou-se por utilizar em diversas
para compor a amostra depende ao menos em parte do
julgamento ou conveniência do pesquisador (MATTAR, 2012). perguntas, respostas objetivas, às vezes de

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múltipla escolha, sendo também deixado um espaço em aberto para comentários livres.

O universo deste estudo foi constituído de 102 (cento e dois) discentes oriundos do curso
de Cozinha (quarenta e quatro discentes) e do curso de Agropecuária (cinquenta e oito
discentes), e de 25 (vinte e cinco) docentes que trabalham com as turmas do PROEJA. Há
uma distorção entre o número de alunos matriculados e os que responderam ao questio-
nário, que pode ser observada empiricamente, pois muitos alunos do PROEJA, apesar de

90
matriculados, não estão frequentando a sala de aula. Além disso, alguns professores en-
contravam-se afastados da instituição no período que ocorreu a pesquisa.

Ademais, destaca-se que motivar os participantes a responder ao questionário foi uma tarefa
exaustiva pois o ideal era que todos os alunos e professores do PROEJA do campus Maracanã
participassem da pesquisa. Contudo, foram usadas técnicas estatísticas que permitem que o
resultado da pesquisa seja confiável, apesar de não permitir generalizações.

Com questões abertas, foi possível perceber o nível de informação do respondente, des-
vendando aspectos desconhecidos. Em contrapartida, foram produzidas algumas respos-
tas vagas ou o entrevistado não respondeu corretamente ao questionamento. Já as ques-
tões fechadas permitem ser tratadas quantitativamente.

3.1 Identificação do público entrevistado


A Tabela 1 apresenta o número de alunas e alunos que participaram da pesquisa, por curso
e série. De acordo com os resultados obtidos, excluindo o caso em que o aluno optou em
não responder à pergunta do questionário aplicado, 47% dos participantes da pesquisa
são do sexo masculino, enquanto o sexo feminino representa um contingente de 53%
dos pesquisados, apresentando uma proximidade à paridade de gênero na instituição de
ensino IFMA - campus Maracanã, conforme tendência apontada no "Relatório educação
para todos no Brasil 2000-2015" (MEC, 2014).

Contudo, observa-se, por meio da Tabela 1 que, com base na referida pesquisa e também
pelo número de matrículas, no Curso de Cozinha há um quantitativo maior de alunas
(trinta e seis) do que no Curso de Agropecuária (dezoito), representando 67% do total de
alunas entrevistadas (cinquenta e quatro).

Tabela 1: Número de discentes que participaram da pesquisa, por sexo, curso e série:
Cozinha Agropecuária
Sexo Total
1º Ano 2º Ano 3º Ano 1º Ano 2º Ano 3º Ano
Feminino 15 14 7 7 5 6 54
Masculino 7 - - 11 11 18 47
Não respondeu - 1 - - - - 1
Total Geral 102
Fonte: Autora.

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Portanto, os resultados permitem concluir que responderam à pesquisa. Esse resultado
que apesar das barreiras que precisam supe- apresenta um perfil diferenciado de cada
rar para voltar a estudar, tais como filhos, curso do PROEJA oferecido pela instituição e
trabalho, casa, as mulheres estão cada vez reforça o que já fora abordado anteriormen-
mais retornando para a sala de aula em te sobre o retorno das mulheres à escola.
cursos que integram a elevação do grau
Em relação aos docentes, a pesquisa aponta que:
de escolaridade à educação profissional de
nível médio. De fato, conforme o "Rela- 60% dos participantes da pesquisa são do 91

tório educação para todos no Brasil 2000- sexo feminino e 40% do sexo masculino;
2015" (MEC, 2014) a participação do sexo A faixa etária dos que ministram aula no
feminino vem aumentando e em 2012 foi PROEJA, 8% responderam que estão na fai-
identificado um aumento de 10% a mais xa de 20 a 30 anos; 60% têm entre 31 e 40
de mulheres do que homens matriculados anos; 20% estão com idade entre 41 e 50
na Educação Profissional. Adicionalmente, anos; e 12% têm mais de 51 anos;
embora não seja objeto específico desta pes-
56% responderam que trabalham com o
quisa, convém mencionar que as mulheres
PROEJA há mais de 6 anos; 24% tem ex-
já são maioria no ensino superior4, possibi-
periência entre 3 e 5 anos com a referida
litando, assim, uma participação crescente
modalidade de ensino; 16% possui de 1 a
no mercado de trabalho (MEC, 2014).
2 anos de experiência; 4% ministra aula no
Já em relação à idade média dos alunos e PROEJA há menos de um ano.
alunas participantes desta pesquisa, confor-
No tocante à faixa etária dos professores,
me apresentado na Figura 1, em geral, 17%
percebe-se que, de um modo geral, 92% dos
dos entrevistados tem menos de 20 anos;
entrevistados têm mais de 30 anos, confir-
49% têm de 20 a 30 anos; 19% está na faixa
mando o que já foi comprovado em outras
de 31 a 40 anos; 9% estão com idade entre
pesquisas que o professor é um profissional
41 e 50 anos; e 6% têm mais de 51 anos.
de meia idade.
Constata-se, por meio destes resultados,
que os alunos do PROEJA do IFMA - cam- Figura 1: Faixa etária dos discentes entre-
pus Maracanã são jovens e adultos em ple- vistados:
na idade produtiva, que buscam uma nova
oportunidade de crescimento.

A pesquisa também revelou que, no Curso


de Cozinha, a faixa etária dos discentes é
acima de 30 anos, representando 77% dos
4 Segundo o MEC (2014), em 2011, no Brasil, entre a população
com níveis de escolaridade mais elevados (pessoas com 24
anos de idade e que frequentam o Ensino Superior, ou cursam
Mestrado ou Doutorado, ou que apresentam 15 anos ou mais
de estudo), há um predomínio do sexo feminino, atingindo o
patamar de 40% superior ao número de homens. Fonte: Autora.

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Ademais, os dados supracitados demons- 30% usa e-mail frequente; 38% raramente
tram que o IFMA - campus Maracanã possui usa; 10% nunca usa e 22% não tem e-mail.
docentes experientes no ensino de jovens e 64% consegue digitar um trabalho escolar,
adultos e isso pode ser visto como um fator usando seu conhecimento de informática
determinante em relação à transformação adquirido no IFMA; 29% com ajuda de ter-
dos recursos tecnológicos utilizados por es- ceiros; 7% não conseguem;
tes em instrumentos que possibilitem a in-
92 51% consegue fazer uma apresentação,
clusão social de seus alunos e alunas.
usando seu conhecimento de informática
Ressalta-se que os professores participantes adquirido no IFMA; 33% pedem ajuda a
da pesquisa apresentam características di- terceiros; 16% não conseguem.
versificadas no que tange à idade e o tempo
Os discentes apontaram causas para jus-
de sala de aula com a modalidade PROEJA,
tificar as suas deficiências, na ordem das
o que manifesta, assim, necessidades e in-
mais votadas, conforme a seguir: dificulda-
teresses diferenciados no decorrer dos tra- de para memorizar os comandos; não sabe
balhos realizados por eles em sala de aula. salvar um arquivo (no pen drive e/ou no
Assim, de acordo com essas informações, computador); não sabe abrir um arquivo
verifica-se que a amostra é heterogênea, ca- (no pen drive e/ou no computador); difi-
racterística que assegura as condições favo- culdades com o teclado e mouse.
ráveis para a análise dos dados.
Figura 2: Avaliação da disciplina de Infor-
3.2 Dificuldades em operar as tics mática:
Os alunos e alunas que fazem parte do uni-
verso desta pesquisa já fizeram pelo menos
uma disciplina de Informática oferecida
pelo IFMA. Levando em consideração este
fato, a seguir têm-se os seguintes resultados
da pesquisa:

Conforme ilustrado na Figura 2, os discen-


tes classificam a disciplina de Informática
como boa (42%); ótima (28%); 30% apon-
Fonte: Autora.
taram como regular (25%) e ruim (5%).
Esses resultados apontam falhas que preci-
39% do total responderam que não têm di-
sam ser sanadas nas disciplinas de Informá-
ficuldades de operar o ambiente Windows,
tica ofertadas pelo IFMA - campus Maracanã.
porém, o restante, 61%, disse que sim (29%)
Como sugestão de melhoria, podem ser de-
ou usa o ambiente com dificuldade (32%);
senvolvidas metodologias de ensino, tais
89% sabe navegar pela Internet; como o uso de material didático que facilite

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a memorização dos comandos, o uso e/ou ao dia; 9% usa por mais de meia hora. Em
desenvolvimento de aplicativos de treina- contrapartida, 96% dos docentes afirmam
mento que facilite o uso do teclado e mouse. usar o computador por mais de uma hora
Ainda no quesito dificuldades sobre usar por dia. Porém, um docente apontou usar
TICs, apesar de 80% dos docentes terem somente usar no máximo meia hora por dia.
afirmado que não fizeram nenhum trei-
56% dos alunos usam o computador so-
namento em informática oferecido pelo
mente no IFMA, os demais usam em casa, 93
IFMA, a pesquisa revelou que 46% conside-
na lan house e/ou no trabalho;
ram seu conhecimento em informática re-
gular; 37% consideram como bom; e 17% Os alunos responderam que usam os com-
como ótimo. putadores do IFMA, na maioria das vezes,

Adicionalmente, os professores responde- para pesquisar e fazer seus trabalhos esco-

ram sobre suas habilidades em usar os se- lares. Já os professores usam para pesquisar,
guintes aplicativos que estão disponíveis ler e-mails, trabalhar (preparar suas aulas, fa-
nos computadores da instituição: 92% sabe zer suas pesquisas científicas, em suas aulas,
usar o Windows; 96% usa o Word; 84% usa o quando possível, dentre outras atividades).
PowerPoint. Contudo, alguns professores de-
Conforme a Figura 3, a percepção dos alu-
clararam não ter nenhum conhecimento em
nos sobre o questionamento se os profes-
informática e que necessitam de capacitação.
sores do IFMA - Maracanã (além dos pro-
3.3 Finalidades do uso das tics fessores de informática) utilizam as TICs
Nos quesitos relacionados à finalidade do (computador e outros recursos tecnológi-
uso das TICs pode-se destacar que: cos) em sala de aula é de que: 58% utilizam;
Os alunos e alunas responderam sobre o 31% utilizam às vezes; e 11% não utilizam.
que acham de usar o microcomputador e Apesar de 52% dos professores achar bom e
outras tecnologias, tais como o celular e o 40% achar ótimo usar o microcomputador e
tablet. Como foi uma questão de múltipla
outras tecnologias, tais como o celular e o ta-
escolha seguem os resultados das opções
blet em sala de aula, um ter declarado achar
mais votadas: importante para a vida pro-
regular e outro nunca ter usado, somente
fissional - 87% do total; importante para a
24% dos docentes afirmam contribuir para a
vida pessoal - 50% selecionou esta opção;
inclusão digital dos alunos do PROEJA, 60%
17% dos respondentes acham que eleva a
sua autoestima; dos respondentes diz que somente às vezes;
e 16% manifestou não contribuir.
Em relação à duração média de acesso ao
computador no dia a dia, por parte dos dis- Figura 3: A percepção dos alunos sobre se
centes, é de que: 31% não usam; 39% rara- os professores (além dos professores de in-
mente usa; 21% usa no máximo 30 minutos formática) utilizam as TICs em sala de aula:

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falta de um monitor que tire dúvidas; labo-
ratório sem internet; laboratório fechado;
poucos computadores funcionando.

Em relação aos docentes, têm-se os seguin-


tes resultados: 36% consegue realizar suas
atividades de ensino e pesquisa no PROEJA,
94 usando a infraestrutura de TICs oferecida
pelo IFMA; 40% somente às vezes; 24% não
conseguem. Os docentes relataram alguns
problemas que dificultam o uso do micro-
Fonte: Autora.
computador, sendo os mais votados:
Pelos índices apresentados, pode-se con-
No ambiente de trabalho: muitos computa-
cluir que ainda existem discentes e docen-
dores sem funcionar; falta de um monitor
tes do PROEJA excluídos digitalmente. Essa
que tire dúvidas dos professores; poucos
é uma questão preocupante, pois se enten-
computadores para a quantidade de pro-
de que a democratização do uso das TICs é
fessores que precisa utilizá-lo; sem internet;
fundamental para o ensino/aprendizagem
falta de capacitação.
e para a formação da cidadania.
No ensino e pesquisa: salas de aula sem
3.4 Acessos às tics no IFMA - Campus Maracanã acesso à internet; sem recursos tecnológi-
Quanto ao acesso às TICs, os discentes pes- cos, tais como data show, microcomputa-
quisados responderam se, quando necessário, dor; falta de capacitação.
eles têm ou não acesso fácil a um computador
dentro do IFMA- Maracanã. Como resultado, 4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
tem-se que: 30% respondeu que sim; 49%
Os resultados obtidos nesta pesquisa geram
responderam que às vezes; 15% respondeu
uma série de desafios para todos os profis-
que não; e 6% respondeu que só tem acesso
sionais que trabalham com esse público,
no horário da disciplina de informática.
pois, pelo que se vê nesta pesquisa, há uma
Os dados apontam que 29% dos alunos exigência de novas metodologias aplicadas
acha que o IFMA atende às suas necessida- no processo de ensino e aprendizagem e na
des de uso das TICs; 51% relatam que so- construção do conhecimento desses alunos
mente às vezes; 14% afirmam que o IFMA e dessas alunas que chegam aos Institutos
não atente às suas necessidades; e 6% não Federais com muitas expectativas, prin-
souberam responder. Em relação ao acesso cipalmente porque, ao retornar à sala de
às TICs, os docentes relatam problemas, tais aula, veem a possibilidade de unir a educa-
como: que há poucos computadores para a ção e o trabalho em um único sentido: o de
quantidade de alunos que precisa utilizá-lo; ser incluído em sua sociedade.

ACTA TECNOLÓGICA v.12, nº 1, 2017


O IFMA - campus Maracanã precisa melhorar o acesso às TICs como ferramenta indis-
pensável de ensino e aprendizagem, e adotar medidas simples que foram sugeridas na
pesquisa pelos alunos e professores, tais como: aumentar o número de computadores com
acesso à internet nos laboratórios de informática; ter um monitor que tire dúvidas dos
alunos e professores; melhorar a infraestrutura tecnológica das salas de aula, com data
show e acesso à internet, e nos laboratórios, com jogos educativos das diversas áreas de
ensino; manutenção contínua dos equipamentos de informática, pois os equipamentos
95
ficam muito tempo sem funcionar; ter um laboratório para alunos e professores traba-
lhares com pesquisas científicas; uso de ambientes virtuais de aprendizagem; capacitar os
professores em aplicativos que os auxilie em suas aulas (Word, PowerPoint, Excel, Edição
de Vídeos - para tornar as filmagens das aulas práticas em recursos didáticos) e capacitar
os professores para mediar a inclusão digital dos discentes do PROEJA.

AGRADECIMENTOS
À FAPEMA, pelo apoio financeiro. Ao IFMA, professores e alunos que dispuseram de seu
tempo para responder os questionários e dar sugestões valorosas para promover melhorias
no ensino, pesquisa e inclusão digital de todos os envolvidos do processo.

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REFERÊNCIAS
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PEC, Curitiba, v. 2, n. 1, p. 105-112, jul. 2001-jul. 2002.

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96 da União, Brasília, DF. 25 jun. 2005.

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quisa sobre o uso das tecnologias de informação e comunicação. São Paulo, 2014. Dispo-
nível em: <http://www.abradi.com.br/wp-content/uploads/2015/05/TIC_eGOV_2013_LI-
VRO_ELETRONICO.pdf>. Acesso em: 22 jul. 2015.

FREITAS, D.S.L. Informática na Escola: recursos, possibilidades e desafios. Revista do Cen-


tro de Ensino Superior de Catalão, 2004, Ano VI, n11.

MATTAR, F. N. Pesquisa de marketing - edição compacta. 5 ed. Elsevier Editora Ltda.
2012. p. 336.

MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. Relatório educação para todos no Brasil 2000-2015. Brasí-


lia, 2014. Disponível em: <http://unesdoc.unesco.org/images/0023/002326/232699POR.
pdf>. Acesso em: 30 out. 2016.

PRETTO, Nelson de Luca. Cultura digital e educação: redes já! In PRETO, N e SILVEIRA,
S. A. (org). Além das redes de colaboração: internet, diversidade cultural e tecnologias do
poder. Salvador, Edufba, 2008. Disponível em: <http://books.scielo.org/id/22qtc/pdf/pret-
to-9788523208899-06.pdf>. Acesso em: 22 jul. 2015.

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Recebido em 27/09/2017; Aceito em 20/12/2017; Publicado na web em 14/03/2018

Percepção ambiental e proposta


didática sobre a desmistificação de
animais peçonhentos e venenosos para
os alunos do ensino médio
97
Azevedo, B.R.M.1;
Almeida, Z.S.2;

1 Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Maranhão. E-mail: brunarafaela_bio@hotmail.com;

2 Laboratório de Pesca e Ecologia Aquática, Departamento de Química e Biologia, Universidade Estadual do Maranhão, Cidade Universitária
Paulo VI, Caixa Postal 9, São Luís/MA, Brazil, zafiraalmeida@hotmail.com

RESUMO
Animais peçonhentos e venenosos frequentemente despertam o interesse geral dos es-
tudantes, já que geralmente estão cercados de histórias populares, lendas e crendices. As
concepções errôneas que cercam esses animais são acompanhadas de um desconhecimen-
to geral sobre a biologia e formas de identificação das espécies, medidas de prevenção de
acidentes e práticas corretas de primeiros socorros. A educação ambiental, neste contexto,
tenta desconstruir visões equivocadas da natureza e construir o conhecimento científico
a partir do conhecimento popular, além de contribuir na conservação de espécies e ecos-
sistemas. O presente trabalho teve como objetivo investigar o conhecimento prévio dos
estudantes do ensino médio acerca dos mitos e verdades existentes sobre animais peço-
nhentos e venenosos e, ainda, elaborar um material didático complementar que auxilie
as práticas pedagógicas dentro e fora de sala de aula. Foram entrevistadas 258 estudantes,
que responderam a um questionário semi-estruturado, que trazia perguntas referentes
às experiências prévias dos alunos com o tema, procedimentos de manejo de animais
peçonhentos e primeiros socorros, além da definição correta de conceitos e espécies. Foi
elaborada uma proposta de material didático complementar, do tipo cartilha, para auxi-
liar o professor na transmissão de conhecimentos específicos aos alunos. As respostas às
perguntas dos questionários indicam uma carência na abordagem em sala de aula e na
propagação de conceitos e ideias erradas sobre o tema o que contribui na disseminação de
mitos e dificultam as estratégias de conservação.

Palavras-chave: Educação ambiental. Cartilha. Serpentes. Artrópodes.

ACTA TECNOLÓGICA v.12, nº 1, 2017


Environmental perception and didactic
proposal about the dismissal of vermin
and poisonous animals for middle
school students
98

ABSTRACT
Vermin and poisonous animals frequently arouse the general interest of students, since
they are generally surrounded by popular stories, legends and superstitons. The wrong
conceptions that surround these animals are accompanied by a general not know about
the biology and the ways of identifying the species, accident prevention measures and
right practices of first aid. The environmental education, in this context, tries to decons-
truct wrong views of nature and build scientific knowledge from the popular one, beyond
to contribute with ecosystems and species conservations. The present work had as objec-
tive to investigate the previous knowledge of high school students about the myths and
truths existing about vermin and poisonous animals, and still to produce a complement
educational material which helps the pedagogical practices in and out of the classroom.
We interviewed 258 students who answered a half structured questionnaire that brought
questions reported to previous experience of the students with the theme, handling pro-
cedures of vermin and poisonous animals and first aid, beyond the correct definition of
concepts and species. It was produced a proposal of a complement didactic material like
a primer to try to provide the teachers’ needs in the transmission of specific knowledge
to the students. The answers pointo to lack of this approach in the classroom and in the
spread of wrong conceptions and ideias about the theme that contribute to dissemination
of myths and difficult conservation strategies.

Keywords: Environmental education. Primer. Snakes. Arthropods.

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1. INTRODUÇÃO de exposição do conhecimento científico
contribuem para melhor assimilação dos
A clássica definição de educação ambiental
conteúdos. As atrativas e múltiplas possibi-
é dada por Dias (1994) como sendo uma
lidades de tecnologias, como o videogame
orientação ao conteúdo e à prática da educa-
e jogos eletrônicos, que não estão disponí-
ção, na busca da solução para os problemas
veis na escola, estão associadas a falta de
concretos do meio ambiente, através de en-
motivação dos alunos com os estudos, ca-
foques interdisciplinares e da participação 99
bendo à escola encontrar alternativas e no-
ativa e responsável de cada indivíduo e da
vas abordagens para estimular o processo
coletividade. No Brasil, a Educação Ambien-
de ensino-aprendizagem (KNÜPPE, 2006).
tal, definida nos Parâmetros Curriculares
A proposta de elaboração de cartilhas edu-
Nacionais, sugere a discussão de questões
cativas complementares aos materiais didá-
éticas, ecológicas, políticas, econômicas, so-
ticos tradicionais vem na tentativa de auxi-
ciais, legislativas e culturais de forma trans-
liar o professor na preparação de aulas mais
versal e abrangente (BRASIL, 1997).
atrativas aos alunos. Segundo Souza e cola-
De acordo com Baptista (2006), a prática de boradores (2009), a cartilha é utilizada des-
ensino em ciências no Brasil vem assumin- de o início da metade do século XIX como
do uma postura cientificista, que distancia material didático de grande aceitação entre
a cultura do estudante da ciência. Traba- professores, devido a sua formatação que
lhos como de Maldaner (2000) e Mortimer facilita a compreensão do tema abordado,
(2005) mostram que persiste, nas salas de por meio de uma linguagem simples, didá-
aulas, um distanciamento entre a aborda- tica e ilustrada. Assim, através das cartilhas,
gem dos conteúdos científicos escolares e é possível que temas cientificamente con-
as concepções prévias dos estudantes. Por- ceituados sejam trabalhados e apresentados
tanto, hoje, um dos desafios da Educação como conteúdos de fácil compreensão.
Ambiental é o de pôr o saber científico ao
Ao se tratar a temática de animais peço-
alcance do público escolar. Contudo, é mais
nhentos e venenosos, quase sempre os es-
do que claro que esse desafio não pode ser
tudantes apresentam visões preconcebidas
enfrentado com práticas docentes antigas,
errôneas sobre o risco e manejo correto des-
visto que o contexto escolar mudou, pois o
ses animais. Serpentes, anfíbios, aranhas,
contingente estudantil aumentou e a socia-
lacraias, abelhas e escorpiões são alguns
lização, as formas de expressão, as crenças,
dos muitos animais que vivem envoltos a
os valores, as expectativas e a contextuali-
histórias e lendas a respeito da sua pericu-
zação sócio-familiar dos alunos são outros
losidade e ameaça à vida de homens e ani-
(DELIZOICOV et al., 2002).
mais domésticos. A falta de conhecimento
Materiais didáticos que despertem o in- sobre a ecologia e os hábitos desses animais
teresse dos alunos e formas diferenciadas provoca sensação de repúdio e não permi-

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te ao indivíduo a correta identificação do Nesse contexto, o objetivo desse trabalho
animal, nem tampouco proceder conforme foi avaliar o conhecimento dos alunos de
medidas corretas de manejo e segurança. ensino médio do IFMA - Campus Codó so-
bre os animais venenosos e peçonhentos,
Conceitos como os de animal peçonhen-
tais como: identificação correta, importân-
to, venenoso e não venenoso nem sempre
cia ecológica e procedimentos de manejo e
são claros para a maioria da população.
segurança, além da elaboração de um ma-
100 Segundo Ferreira e Soares (2008), um dos
terial didático complementar a ser utiliza-
principais fatores responsáveis pelo alto ín-
do nas aulas de biologia e em palestras de
dice acidentes com animais peçonhentos
educação ambiental que contribua para a
é o desconhecimento da população sobre
desmistificação de conceitos sobre o tema.
aspectos biológicos e ecológicos básicos de
cada animal, assim como sobre a prevenção
de acidentes. Sendo assim, cabe à Educação 2 MATERIAIS E MÉTODOS
Ambiental a desconstrução dessas visões A pesquisa foi desenvolvida no campus do
distorcidas da realidade e a formação de Instituto Federal de Educação, Ciência e
uma consciência ambiental, pois, segundo Tecnologia do Maranhão (IFMA) localizado
Chassot (2010), somente um indivíduo al- em Codó, município situado na chamada
fabetizado cientificamente entende o meio e na Zona dos Cocais no estado do Mara-
onde vive e age de forma a melhorá-lo. nhão. O campus Codó está localizado na
zona rural do município e possui como
Entende-se por animal venenoso aquele
característica o ensino, pesquisa e exten-
que secreta alguma substância tóxica para
são fortemente voltadas para as questões
outros animais, inclusive para o ser huma-
agrícolas e ambientais, possuindo grande
no. Essas substâncias podem estar presentes
parte do corpo docente composto por pro-
na pele ou em outros órgãos e têm a função
fessores que integram o campo de ensino
de proteger o animal contra predadores. das Ciências Agrárias. A presença de cam-
Alguns peixes, diversos anfíbios e alguns pos agropecuários experimentais e de uma
invertebrados são exemplos de animais considerável vegetação no entorno da in-
venenosos (COTTA, 2014). Animais peço- fraestrutura do campus facilita o encontro
nhentos são aqueles capazes de produzir e ocasional dos alunos com vários animais
inocular substância tóxica, sendo responsá- peçonhentos e venenosos. Sendo assim, a
veis por causar acidentes que podem pro- instituição foi escolhida como um ótimo
vocar complicações locais, gerando seque- local para fomentar discussões sobre a te-
las e em casos mais graves, evoluir ao óbito mática animais peçonhentos e venenosos
(BRASIL, 2009). Essa definição é a mesma com a comunidade escolar, já que a educa-
utilizada por diversos autores, como Puorto ção ambiental nas comunidades inseridas
e França (2003) e Bernarde (2012), e será nesse contexto é de extrema importância
adotada nas discussões desse trabalho. para a conservação das espécies e manuten-

ACTA TECNOLÓGICA v.12, nº 1, 2017


ção do equilíbrio dos ecossistemas, além de Codó. Dentre os entrevistados, 71% afir-
contribuir na formação acadêmica de téc- mou já ter tido algum tipo de contato com
nicos agrícolas e ambientais. um animal peçonhento, enquanto 29%
nunca teve nenhuma experiência com esse
Foram elaborados questionários semiestru-
tipo de animal. Caso a aluno desse uma res-
turados para investigar os conhecimentos
posta afirmativa a esse questionamento, era
prévios dos alunos a respeito da impor-
solicitado então que o estudante especificas-
tância e dos cuidados que se devem ter ao
se qual animal já havia avistado ou tocado. 101
encontrar ocasionalmente um animal pe-
Vários animais foram citados neste campo,
çonhento/venenoso. Foram investigados
sendo que serpentes foram responsáveis por
também os conceitos prévios dos alunos so-
uma alta porcentagem (60%) das respostas
bre a temática e se estes conseguiam proce-
(ver Figura 1). Essa alta porcentagem pode
der à correta classificação de alguns animais
ser explicada pelo fato das serpentes serem
quanto ao grau de perigo ao homem. Para
notadamente os animais que mais frequen-
elaboração das questões, considerou-se as
temente são associados como perigosos e
concepções alternativas ou o senso comum
nocivos aos seres humanos. Esses animais
existente sobre o tema, buscando a compa-
fazem parte da mitologia de muitos povos,
ração entre o conhecimento científico e os
representando tanto o bem quanto o mal
mitos e crenças populares. Adotou-se uma
(PIZZATO, 2003). Por conta disso, são mais
visão antropocêntrica em algumas pergun-
popularmente relacionados a acidentes com
tas, pois é a visão mais difundida pelo saber
envenenamento e são associados no imagi-
popular e por alguns livros didáticos.
nário popular e nas crenças e mitos a senti-
Os questionários foram aplicados em maio mentos e atitudes ruins.
de 2014 para estudantes do ensino médio,
A grande incidência de alunos que tiveram
na faixa etária de 14 a 19 anos. Após a apli-
algum tipo de contato com animais peço-
cação, os dados foram tabelados e analisa-
nhentos se justifica pela a localização geo-
dos por meio de estatística descritiva e os
gráfica e aptidão econômica do município
resultados apresentados por meio de grá-
de Codó. O campus está localizado na sede
ficos. Os dados também foram utilizados
da antiga Escola Agrotécnica Federal de
para elaboração de material didático do
Codó, possui vocação totalmente voltada
tipo cartilha e subsidiaram os conceitos e as
para o ensino das Ciências Agrárias e muitos
práticas que foram abordadas em um mini-
dos alunos são oriundos de famílias que pos-
curso ministrado para os alunos, intitulado
suem ampla ligação com a terra e atividades
“Animais Peçonhentos: mitos e verdades”.
agrícolas. Muitos contatos com animais pe-
çonhentos são relatados em comunidades
3.RESULTADOS E DISCUSSÃO rurais ou com trabalhadores que exercem
Foram aplicados 258 questionários com alguma função relacionada à agropecuária
alunos do ensino médio do IFMA - Campus (BOCHNER e STRUCHINER, 2003).

ACTA TECNOLÓGICA v.12, nº 1, 2017


102

Figura 1: Porcentagens das respostas dadas pelos estudantes do câmpus Codó quando questionados se: a)
Você já viu ou tocou algum animal peçonhento/venenoso? Qual?; b)Qual a sua reação ao avistar um animal
peçonhento?

A segunda pergunta do questionário trata- estarem inseridos em um contexto rural já


va sobre qual tipo de reação o entrevista- tenham noções mínimas de meio ambiente
do teria ao encontrar ocasionalmente um e conservação das espécies.
animal peçonhento nas dependências da Os alunos também foram questionados se
instituição. As respostas mostram que os conheciam alguém que já havia sido pi-
alunos, em sua maioria, ou chamariam a cado por algum animal peçonhento. Para
ajuda de algum professor (32%), ou corre- essa pergunta, mais da metade dos entre-
riam (27%) ou esperariam o animal ir em- vistados (53%) afirmaram conhecerem al-
bora (25%) (ver figura 1). Esses resultados gum amigo ou parente que já tenha sofrido
permitem perceber ainda uma forte hie- um acidente com animal peçonhento. Ao
rarquia presente no ambiente escolar. O serem questionados sobre qual animal se-
professor é visto com detentor do conhe- ria o causador do acidente, a maioria res-
cimento e, portanto, tomador de decisões. pondeu que o responsável pelo ataque se
Outro aspecto importante nas respostas a tratava de uma serpente (57%) ou um es-
esse questionamento foi a baixa incidência corpião (27%) (ver Figura 2). Inclusive foi
de alunos (7%) que afirmaram que mata- registrado um relato de um aluno que foi
riam o animal ao avistá-lo. Apesar da for- picado por escorpião nas dependências da
ma como esta pergunta foi elaborada ter própria escola. Segundo dados do Sinan –
potencial para indução de uma resposta Sistema de Informação de Agravos de Noti-
esperada, em um estudo onde foi feito per- ficação, órgão vinculado aos Ministério da
gunta similar, 84% dos entrevistados afir- Saúde, foram registrados, apenas em 2014,
maram que costumavam matar as aranhas um total de 2290 notificações de acidentes
que encontravam (SOUZA e SOUZA, 2005), envolvendo serpentes e aranhas no estado
o que pode demonstrar que os alunos por do Maranhão.

ACTA TECNOLÓGICA v.12, nº 1, 2017


Sobre os conceitos referentes ao uso correto dos termos peçonhento e venenoso, 50% dos
alunos responderam corretamente afirmando que existem animais venenosos que não
são peçonhentos. A outra metade dos alunos deram respostas que variavam numa série de
conceitos equivocados (ver Figura 2). Esses altos números de conceitos errôneos difundi-
dos entre os estudantes podem estar associados a fato de muitos livros didáticos do ensino
médio e fundamental ainda apresentarem erros conceituais graves ao tratarem sobre a di-
ferenciação de animais peçonhentos e venenosos (SANDRIN et al., 2005). Em decorrência
103
da avaliação pedagógica realizada nos livros didáticos a partir de 1998, pelo Ministério
da Educação, e que resultou na publicação dos Guias de Livros Didáticos (BRASIL, 1999),
a maioria dos livros que apresentavam graves erros conceituais e metodológicos foram
excluídos do processo de aquisição e distribuição pelas escolas. Contudo, esses livros de
edições anteriores e obras recentes não analisadas estão disponíveis aos alunos e professo-
res, fazendo parte do acervo bibliográfico das escolas, o que contribui para disseminação
de um falso conhecimento científico (NUNEZ et al., 2001).

Figura 2: Porcentagens das respostas dadas pelos estudantes do câmpus Codó quando questionados se a) Você
conhece alguém que já tenha sido picado por animal peçonhento? Que animal era esse?; b) Qual o conceito
de animal peçonhento e venenoso?

A quinta pergunta do questionário tratava sobre as medidas a serem tomadas em caso de


picada de animal peçonhento. Nessa pergunta, os alunos poderiam escolher múltiplas res-
postas, visto que não existe um único procedimento correto a ser adotado. A maioria dos
alunos (44%) respondeu corretamente, que a pessoa acidentada deverá ser encaminhada ime-
diatamente a um posto de saúde, contudo apenas 13% dos entrevistados detectou que não
permitir que o acidentado realize grandes esforços físicos como andar ou correr seja uma me-
dida eficaz a ser adotada em caso de acidente. Os procedimentos incorretos e que são, muitas
vezes, adotados pelo senso comum representaram, no total, 43% das respostas (ver Figura 3).
Segundo Sandrin e colaboradores (2005), a execução de programas de educação ambiental e
em saúde que tratem sobre acidentes com animais peçonhentos tem o objetivo de reduzir o
número de casos, a letalidade e o não uso de práticas caseiras como primeiros socorros.

ACTA TECNOLÓGICA v.12, nº 1, 2017


104

Figura 3: Porcentagens das respostas dadas pelos estudantes do câmpus Codó quando questionados se: a)
Quais procedimentos devem ser adotados em caso de picada por animal peçonhento?; b) Qual a importância
da preservação dos animais peçonhentos?

Muitos dos procedimentos de primeiros socorros tidos como corretos por grande parte da
população advém de crenças populares, do erro de identificação das espécies de animais
e da divulgação errada de procedimentos em programas de televisão, internet e livros
didáticos antigos. O incentivo à adoção de medidas preventivas e a divulgação de proce-
dimentos adequados a serem tomados em caso de acidente, reduz o número de casos com
sequelas e representa uma economia para o serviço público (FERREIRA e SOARES, 2008).

Quando questionados se os animais peçonhentos deveriam ser preservados, a maioria


dos alunos (96%) respondeu que sim. A justificativa escolhida, predominantemente nes-
se caso, é que os animais peçonhentos também contribuem para o equilíbrio ecológico
(ver Figura 3). Esse resultado demonstra que os alunos do IFMA – Campus Codó, em sua
maioria, já percebem o papel das diferentes espécies nos ecossistemas e rejeitam a visão
antropocêntrica que toma como referência as vantagens ou desvantagens que as outras
espécies venham a conferir ao homem. Esse tipo de reposta positiva pode já ser reflexo
do conhecimento técnico adquirido pelos estudantes nas dependências próprio instituto.

O uso de classificações não científicas tais como “feios”, “nojentos”, “nocivos” também são
encontradas em alguns livros didáticos (SANDRIN et al., 2005) que podem, inclusive, contri-
buir para a matança indiscriminada dos animais que, aparentemente, não oferecem nenhum
tipo de utilidade ao homem.

A pergunta final do questionário pedia aos alunos que classificassem as fotos de 15 animais
nas categorias: animal não venenoso, animal venenoso e animal peçonhento. As imagens
utilizadas foram selecionadas entre espécies locais que frequentemente esses alunos pos-
suíam contato, tanto no ambiente escolar como nas suas residências. Muitas espécies não
venenosas como rato, barata e piolho de cobra foram classificadas, na maioria dos ques-
tionários, como animais peçonhentos ou venenosos (ver Figura 4). Isso se justifica, pois a

ACTA TECNOLÓGICA v.12, nº 1, 2017


maioria da população possui algum tipo de aversão a esses animais que são frequentemen-
te associados a doenças e falta de higiene. Tanto essas espécies como as serpentes, aranhas,
vespas e escorpiões são classificadas no grupo de animais indesejáveis ao homem. Com
as respostas dadas a essa pergunta também é possível perceber que a maioria dos alunos
não consegue fazer a correta distinção entre um animal venenoso e peçonhento, demons-
trando a carência na abordagem, em sala de aula, dessa caraterística tão importante para
compreensão do tema e a para identificação dos potenciais riscos à saúde.
105

Figura 4: Frequência absoluta da classificação dos animais feita pelos estudantes do campus Codó nas catego-
rias animal não venenoso, animal venenoso e animal peçonhento.

As respostas fornecidas pelos alunos nos questionários foram utilizadas na formulação do


material didático do tipo cartilha. A necessidade de produção da cartilha vem do fato da
carência da abordagem realizada nos livros didáticos de ensino médio sobre uma temática
tão relevante para estudantes inseridos em uma realidade rural. A cartilha continha infor-
mações acerca das principais espécies peçonhentas de répteis e artrópodes encontradas no
Brasil, conceitos básicos e mitos relacionados à identificação dos animais peçonhentos,
métodos para identificação de espécies de interesse médico, consequências e sintomas dos
principais acidentes ocasionados por animais peçonhentos, além de cuidados no campo e
procedimentos de segurança caso ocorra o encontro ocasional com esses animais.

Como detectado por vários autores (SANDRIN et al., 2005; FERREIRA e SOARES, 2008), os
livros didáticos apresentam inúmeros erros conceituais e muitos professores têm dificuldade
de acesso à literatura especializada. Portanto, a cartilha tem a proposta de auxiliar o profes-
sor na sua prática pedagógica, ajudando-o a enfrentar as dificuldades relacionadas ao tema.
O material produzido também pode ser utilizado como material para educação ambiental
em ambientes fora da escola em palestras, oficinas e discussões, já que a linguagem empre-
gada é bem acessível para os diferentes públicos.

ACTA TECNOLÓGICA v.12, nº 1, 2017


Além da cartilha educativa, um total de 4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
sessenta alunos participaram do minicurso
Este trabalho mostrou que há uma carência
“Animais peçonhentos: mitos e verdades”,
grande na compreensão dos principais aspec-
que foi ministrado durante dois dias e pos-
suiu carga horária total de 10h. O objetivo tos que cercam a temática animais peçonhen-
central dessa ação educativa foi repassar o tos, principalmente no que se refere à identi-
conhecimento científico e desmistificar uma ficação das espécies de interesse médico e ao
106 série de crenças que cercam o imaginário po- procedimento em caso de acidente.
pular. A aceitação do minicurso pelo público Serpentes, escorpiões e aranhas despertam
foi considerada muito boa e houve grande o interesse de crianças e adolescentes e en-
participação dos alunos. Pode-se considerar tende-se que esse tipo de tema deve ser abor-
essa estratégia um bom recurso pedagógico
dado de uma forma mais cuidadosa pela es-
como complemento aos conteúdos regulares
cola. Noções de saúde e ambiente buscam
ministrados em sala de aula, sendo uma im-
fazer um paralelo entre o conhecimento
portante ferramenta de educação ambiental.
científico e a vida prática dos estudantes,
Os resultados dos questionários, o processo contribuindo, portanto, para aproximar os
de elaboração da cartilha didática e o diálo- jovens do saber científico, despertar o in-
go desenvolvido com os estudantes durante teresse pelos estudos, além de desmistificar
o minicurso mostram que existem muitas visões de mundo errôneas e preconcebidas.
dúvidas e mitos sobre a temática animais
peçonhentos. O professor, ao abordar esse Acredita-se que ações de educação ambiental
tema em sala de aula, deve partir, primei- nas escolas e o estímulo à produção de mate-
ramente, dos conceitos prévios dos alunos, riais didáticos auxiliares, como os produzidos
procurar desmistificar visões incorretas, a partir desse trabalho, contribuam na forma-
mitos e crenças populares, numa aborda- ção de cidadãos mais conscientes e de profis-
gem que permita ao aluno reconhecer a si sionais com maior qualidade, com visão de
mesmo como parte integrante do meio am- mundo aprofundada e que saibam reconhe-
biente e como construtor e propagador do cer a importância das questões ambientais
conhecimento científico. para o pleno desenvolvimento da sociedade.
Esse estudo aponta que as grandes deficiên-
cias conceituais apresentadas pelos estudan- AGRADECIMENTOS
tes estão concentradas na diferenciação de
Agradecemos ao Programa de Especializa-
animais peçonhentos, medidas de preven-
ção em Educação Ambiental e Gestão Par-
ção e primeiros socorros. Portanto, cabe,
ticipativa de Recursos Hídricos do Instituto
ao docente, buscar informações atualizadas
sobre esses temas e utilizar métodos didáti- Federal de Educação, Ciência e Tecnologia
cos para transmissão do conteúdo, visto que do Maranhão - IFMA, ao IFMA - Campus
esse é um tema de importância não apenas Codó e aos inúmeros estudantes que gentil-
ambiental, mas também de saúde pública. mente aceitaram participar dessa pesquisa.

ACTA TECNOLÓGICA v.12, nº 1, 2017


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Recebido em 26/09/2017; Aceito em 26/10/2017; Publicado na web em 14/03/2018

Formação de professores da educação


profissional e tecnológica- ept e
narrativas de formação: uma revisão
literatura
109
Juliani Natalia dos Santos1;
Vantoir Roberto Brancher2;

1 Mestre em Educação Profissional e Tecnológica - UFSM

2 Doutor em Educação -UFSM

RESUMO
Este artigo em como objetivo de estudo o estado da arte junto ao banco de dados da Scielo
Brasil, referente às produções científicas que vem sendo realizadas com os temas forma-
ção de professores para Educação Profissional e Tecnológica-EPT e narrativas de formação
docente, tendo o objetivo de mapear e discutir como se da à constituição dos saberes do-
centes para atuação no espaço da EPT. Para tal, se estabeleceu relações e aproximações teó-
ricas a respeito da constituição profissional destes sujeitos, a partir da análise de conteúdo
das produções existentes, com ênfase nas seguintes categorias temáticas: saberes docentes,
imaginário e representações, trajetos formativos e identidade docente, tendo como base
o ano da criação dos Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia em 2008 até o
ano de 2016. Ao concluir a análise dos artigos publicados, identificou-se uma significati-
va preocupação com a formação dos professores da Educação Profissional e Tecnológica
diante das políticas públicas referentes a esta modalidade, dando ênfase as narrativas de
formação para o crescimento profissional de si e demais colegas. Percebeu-se, ainda, a
carência de publicações sobre narrativas de professores da EPT, fomentando o uso destas
narrativas para a formação e crescimento desse profissional.

Palavras-chave: Educação Profissional e Tecnológica; Formação de Professores; Narrativas


de Formação; Saberes Docentes.

ACTA TECNOLÓGICA v.12, nº 1, 2017


Training of ebpt teachers and narrative
training: a literature review

ABSTRACT
110 This paper aims to study the state of the art in the database of Scielo Brazil, referring to
the scientific productions that have been carried out with the themes of teacher training
for EFA and narratives of teacher education, aiming to map and discuss how is given to
the constitution of the teaching knowledge to work in the EFA space. To this end, the-
oretical relations and approximations were established regarding the professional cons-
titution of these subjects, based on the analysis of content of the existing productions,
with emphasis on the following thematic categories: teacher knowledge, imagery and re-
presentations, formative paths and teacher identity, based on, the year of the creation of
the Federal Institutes of Education, Science and Technology in 2008 until the year 2016.
In concluding the analysis of the published articles, a significant concern was identified
with the training of teachers of Professional and Technological Education in the face of
public policies referring to this modality, emphasizing the narratives of formation for the
professional growth of oneself and other colleagues, it was also noticed the lack of publi-
cations on narratives of teachers of the EPT, fomenting the use of these narratives for the
formation and growth of this professional.

Keywords: Professional and Technological Education; Teacher training; Training Narrati-


ves; You know teachers.

ACTA TECNOLÓGICA v.12, nº 1, 2017


1 FORMAÇÃO DE a Educação Básica Profissional Técnica e
PROFESSORES DA Tecnológica e suas narrativas de formação,
EBPTT E NARRATIVAS passamos a tentar entender o que se tem
DE FORMAÇÃO: UMA produzido em relação aos seus saberes e fa-
REVISÃO DE LITERATURA zeres. Nesta perspectiva, (GUIMARÃES; SIL-
VA 2010) comentam a respeito do papel que
A Lei 11.892/2008, que cria os Institutos
a educação profissional e tecnológica teria
Federais de Educação, Ciência e Tecnologia 111
na contemporaneidade, tendo esta modali-
(IFs), propõe, em seu art. 7, que os Institu-
dade de ensino como potencializadora da
tos, além de ofertarem Educação em Nível
emancipação da classe trabalhadora3, além
Médio, têm como objetivo ofertar cursos
de defender a ideia de que ela não deve
de Licenciatura, bem como “[...] programas
ser direcionada somente ao preparo para o
especiais de formação pedagógica, com
mercado de trabalho4, mas, sim, possa ter
vistas na formação de professores para a
o trabalho como principio educativo5. Para
educação básica, sobretudo nas áreas de ci-
Pimenta (1999, p.23).
ências e matemática, e para a educação pro-
fissional”, isso com o propósito de dispor A finalidade da educação escolar na socieda-
diferentes níveis e modalidades, visando à de tecnológica, multimídia e globalizadora é
verticalização do ensino. Aos professores, possibilitar que os alunos trabalhem os co-
desses espaços, cabe transitar em todos os nhecimentos científicos e tecnológicos, de-
níveis e modalidades de ensino ofertados senvolvendo habilidades para operá-los, re-
nessas instituições, promovendo a forma- vê-los e reconstruí-los com sabedoria. O que
ção humana e a autonomia dos alunos, implica analisá-los, confrontá-los, contex-
juntamente com a formação profissional. tualizá-los. Para isso, há que os articular em
totalidades que permitam aos alunos irem
Nesse sentido, faz-se necessário mapear e
construindo a noção de ‘cidadania mundial’.
discutir sobre as produções que vem sendo 3 Marx (1980) Define a classe trabalhadora como aquela que
move e produz riqueza para o Estado. Classe trabalhadora  é
realizadas desde a implantação dos Insti- um conceito mais amplo da categoria clássica de proletariado,
tutos de Educação Profissional e Tecnoló- definida por Marx e Engels no Manifesto do Partido Comunista
de 1848. O conceito de  classe trabalhadora  abrange não só o
gica em 2008 até o ano de 2016, para que proletariado, mas todas as camadas sociais que vivem da venda
da sua força de trabalho.
se possa perceber o que tem mudado neste
4 Ciavata (1990) descreve sobre mercado de trabalho [...] há de se
período e estabelecer relações e aproxima- considerar o trabalho na sociedade moderna e contemporânea
onde à produção dos meios de existência se faz dentro do sistema
ções teóricas sólidas a respeito da constitui- capitalista. Esse se mantém e se reproduz pela apropriação
ção profissional destes sujeitos. Para tanto, privada de um tempo de trabalho do trabalhador que vende
sua força de trabalho ao empresário ou empregador, o detentor
trabalhamos realizando a análise dos arti- dos meios de produção. O salário ou remuneração recebida pelo
trabalhador não contempla o tempo de trabalho excedente ao
gos disponibilizados no banco de dados da valor contratado que é apropriado pelo dono do capital.

plataforma Scielo Brasil. 5 Segundo Gramsci (1991), encontramos o significado do trabalho


como princípio educativo: o trabalho como uma categoria
Ao delinearmos o Estado da Arte de temá- que, por ser ontológica, nos permite compreender a produção
material, científica e cultural do homem como resposta às suas
ticas como a formação de professores para necessidades, num processo histórico-social contraditório.

ACTA TECNOLÓGICA v.12, nº 1, 2017


Levando-se em consideração o exposto, 152 trabalhos publicados. Estes dados nos
pode-se perceber os desafios pelos quais o indicam uma maior preocupação em relação
docente que atua na EPT terá que permear ao tema formação de professores, a partir do
para formar cidadãos conscientes e respon- ano de 1998, visto aumento considerável de
sáveis pela sua própria prática. Nesse sen- publicações realizadas após esta data. Ao es-
tido, estabelecer processos reflexivos sobre tabelecermos o filtro de pesquisa “Formação
a constituição da docência nesses espaços, de Professores para a Educação Profissional
112
vai ao encontro das preconizações de Tar- e Tecnológica - EPT” encontramos 27 traba-
dif (2002), que tem demarcado sobre a im- lhos publicados, dos quais analisamos pri-
portância de se ter uma prática reflexiva e meiramente seus resumos, nos direcionan-
inovadora, que os saberes docentes se dão do para 5 trabalhos que comentam sobre os
a partir de experiências profissionais e de docentes da EPT e sua formação, sendo estes
outras nuances formativas. analisados e categorizados.

2.1 Mapeamento das produções


2 DOS CAMINHOS
METODOLÓGICOS Após a leitura e análise dos resumos dos ar-
tigos mapeados, emergiram 11 trabalhos,
Ao realizar investigação no banco de dados
divididos entre os temas “Formação de Pro-
da Scielo, com as palavras “Formação de
fessores para Educação Profissional e Tec-
Professores”, estipulando o filtro de que nos
nológica” e “Narrativas de Formação Do-
sejam apresentadas pesquisas realizadas no
cente”, os quais foram observados em sua
Brasil, encontramos 1833 artigos relaciona-
totalidade. Destes, destacam-se 2 catego-
dos, sendo que destes, 392 em português.
rias, sendo elas: Formação Docente e Nar-
Tais publicações tem início em 1981, com
rativas de Formação. A seguir, no Quadro
o artigo “A psicopedagogia experimental
1, é possível visualizar os resultados para a
aplicada a formação de professores”, de
primeira temática pesquisada.
Lauro da Silva Becker, o mais recente na
data de 08 de Abril de 2016, “Formação de Quadro 1: Publicações do banco de dados da
professores universitários: tarefa (im)possí- plataforma Scielo sobre a Formação de profes-
vel”, de Maura Maria Morita Vasconcellos e sores para EPT, entre os anos de 2008 e 2016.
Mara Regina Lemes de Sordi.
Tema: Formação de Professores para
Após 1981, encontramos um novo artigo so- Educação Profissional e Tecnológica
mente no ano de 1993, o que indica um perí- Título Autores Ano
odo significativo sem registro de publicação O desafio da Lucília Regina 2011
nessa plataforma. As pesquisas passam a ter formação dos de Souza Ma-
um aumento significativo em 1998 com o professores para a chado
registro de 12 artigos, crescendo ano a ano, EPT e PROEJA
chegando, em 2013, com um montante de

ACTA TECNOLÓGICA v.12, nº 1, 2017


Saberes, identida- Vera Fortes e 2011 Quadro 2: Publicações do banco de dados da
des, autonomia Adriana Paula plataforma Scielo sobre Narrativas de forma-
na cultura docen- Q. Oliveira ção de docentes, entre os anos de 2008 e 2016.
te da EPT Santos
Tema: Narrativas de Formação de Docentes
Título Autores Ano
Trabalho docen- Eneida Oto 2011 Desafios e po- Maria Teresa 2008
te na Educação Shiroma e Do- tencialidades da Menezes Freitas 113
Profissional e mingos Leite escrita na forma- e Dario Fioren-
Tecnológica e no Lima Filho ção docente em tini
PROEJA matemática

Saberes da docên- José Ângelo 2012 Educação Am- Regina Mendes 2009
cia na EPT: um Gariglio e Su- biental no ensino e Amarildo Vaz
estudo sobre o zana Burnier formal: narra-
olhar dos profes- tivas de profes-
sores sores sobre suas
experiências e
Formação do do- Olgamir Carva- 2014 expectativas
cente da EPT no lho e Francisco Experiências de Maria Alice de 2012
Brasil: um diálo- Souza humanização Amorin Garcia
go com as facul- por estudantes et al.
dades de Educa- de medicina
ção e o curso de Aspectos da Maria José 2013
Pedagogia integração Sanches Marin
ensino-serviço et al.
Fonte: dos autores.
na formação de
Já ao estabelecermos o filtro de pesquisa enfermeiros e
“Narrativas de Formação”, encontramos médicos
128 trabalhos publicados, dos quais seis Narrativas na Angela Apare- 2014
(06) direcionam-se aos docentes e sua for- formação comum cida Capozzol
mação, e nenhum especificamente em rela- de profissionais et al.
ção a narrativas de formação de professores da saúde
da EPT. Os seis (06) trabalhos encontrados Narrativas na Edna Maura 2014
sobre narrativas de formação serão os aqui formação do pro- Zuffi et al.
analisados e categorizados, visto que os de- fessor de mate-
mais são direcionados a áreas extrínsecas a mática: o caso da
esta pesquisa, conforme é possível visuali- professora Atíria
zar no Quadro 2 a seguir. Fonte: dos autores.

ACTA TECNOLÓGICA v.12, nº 1, 2017


O artigo “Desafios e potencialidades da escri- ensinados e aprendidos. Dessa forma, se-
ta na formação docente em matemática”, de gundo os autores, lembrar e narrar histórias
Freitas e Fiorentini (2008), baseia-se nas da trajetória formativa, experiência dada
teorias de Larrosa (2002, p.2), para o qual pelo protagonista da pesquisa, contribuiu
“as palavras produzem sentido, criam reali- para que esse sujeito se desenvolvesse pes-
dades e, às vezes, funcionam como poten- soalmente e profissionalmente. Conforme
tes mecanismos de subjetivação”; o artigo Freitas e Fiorentini (2008, p.148),
114
traz como objeto de estudo o processo de A liberdade de pensamento instau-
formação docente, a partir da disciplina de rada pela prática da escrita permitiu

geometria plana, tendo como aporte teóri- e propiciou que muitos dos protago-
nistas (re) significassem seu modo
co-metodológico a pesquisa narrativa, sen-
de atuar e organizar o trabalho peda-
do feita uma breve discussão sobre o papel gógico, empenhando-se para que a
e o lugar da escrita na formação docente. liberdade de expressão no ambiente
Diante da narrativa de formação de um de ensino-aprendizagem ocorresse
protagonista da referida disciplina, traz a em suas aulas. As narrativas de for-
mação oportunizaram, entre outras
suposição de que os cursos de Licenciatura
contribuições da inserção da escrita
em Matemática exploram pouco as intera-
no contexto de formação de profes-
ções mediadas pelas atividades discursivas, sores de matemática, o incentivo ao
suposição essa confirmada a partir do de- desenvolvimento da capacidade de
poimento do participante da pesquisa. Os análise durante a investigação, elu-
cidando serem a escrita e a análise
autores Freitas e Fiorentini (2008, p.139)
elementos indissociáveis.
acreditam ainda que
De acordo com o exposto, para que nossas
[...] a dificuldade dos alunos em es-
tabelecer uma comunicação escrita
narrativas se tornem experiências formati-
compreensiva, durante a licencia- vas, segundo Larrosa (2002, p. 3), requer-se:
tura, pode ser consequência de uma [...] parar para pensar, parar para
prática que prioriza a escrita técnica olhar, parar para escutar, pensar
e formal em detrimento da escrita mais devagar, olhar mais devagar,
reflexiva, discursiva e narrativa sobre e escutar mais devagar; parar para
aquilo que se aprende e se ensina. sentir, sentir mais devagar, demo-
rar-se nos detalhes, suspender a opi-
Nesse contexto, apontam para uma ca- nião, suspender o juízo, suspender
rência da escrita discursiva nos cursos de a vontade, suspender o automatis-
formação em Matemática, tendo a forma mo da ação, cultivar a atenção e a
oral de comunicação como predominante, delicadeza, abrir os olhos e os ou-
vidos, falar sobre o que nos aconte-
forma essa que ajuda na sistematização do
ce, aprender a lentidão, escutar aos
conteúdo específico deste curso, porém que outros, cultivar a arte do encontro,
pouco contribui para exploração e proble- calar muito, ter paciência e dar-se
matização dos conceitos que estão sendo tempo e espaço.

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Dessa forma, nossas experiências formati- da prática ambiental dos professores

vas só têm relevância se pararmos para re- junto a seus alunos depende desse
saber e com ele se enriquece. Assim,
fletir sobre elas, se nos deixarmos invadir
além de contribuírem para a difusão
pelo conhecimento do outro e por nosso
da prática de EA nas escolas, as tro-
próprio conhecimento, renovando-se sem-
cas de ideias permitem ao professor
pre, procurando aprendizado em cada mo- explicitar aos seus colegas um saber
mento vivido, respeitando o espaço e o que ele mesmo desenvolveu e do
tempo necessários para que possamos nos 115
qual pode resultar o estabelecimen-
apropriar de cada saber instituído. to de uma identidade profissional
docente desses professores.
A produção “Educação Ambiental no ensino
formal: narrativas de professores sobre suas ex- Mendes e Vaz (2009, p.398) dizem que “a
periências e expectativas”, de Mendes e Vaz comunicação através de narrativas não é
(2009), é baseada na dissertação de mestra- considerada na área acadêmica, que valori-
do intitulada “O Papel da Escola na Educação za mais a linguagem proposicional, à qual
Ambiental: experiências e perspectivas de profes- associa maior domínio do conhecimento
sores”, com ênfase na Educação Ambiental. que se quer transmitir”. Essa desvalorização
das narrativas docentes leva-nos a acredi-
A produção considera que os saberes do-
tar que o professor não é capaz de produzir
centes permeiam as experiências e as
conhecimento, apenas reproduzir um saber
perspectivas desses professores através da
que é do outro. Porém, após as análises rea-
composição de um repertório de conheci-
lizadas, diante das narrativas dos professo-
mentos sobre educação ambiental em espa- res da EA, os autores Mendes e Vaz (2009,
ços formais de ensino. Isso se deu a partir p.409) concluem que
da organização e observação das narrativas
Os professores geram, assim, um
de um grupo focal, formado pela oferta de
novo tipo de conhecimento a ser
uma oficina de “Formação de Líderes de Gru-
aplicado na escola: o conhecimento
pos de Discussão em Educação Ambiental”, pedagógico da Educação Ambiental,
com o objetivo de investigar o processo de que alia o conhecimento discipli-
inserção da Educação Ambiental (EA) na es- nar, o conhecimento pedagógico, as
cola e fazê-lo com base nas perspectivas dos experiências e a perspectiva profis-

próprios professores. Dessa forma, Mendes sional e pessoal do professor à reali-


zação de atividades de EA na escola,
e Vaz (2009, p.397) dispõem que
através da valorização dos saberes
O professor, por ser um profissio- docentes e da sua importância no
nal que vive situações conflituosas, estabelecimento de processos de en-
complexas e instáveis, possui um sa- sino-aprendizagem.
ber particular e próprio da sua pro-
fissão (Cf. SCHÖN, 1983; NÓVOA, Sendo assim, foi possível perceber que,
1992; TARDIF, 2008; TARDIF; LES- através das narrativas de formação, propor-
SARD, 2008). Portanto, a construção cionou-se um espaço de reflexão, tornando

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possível a identificação das fragilidades e no mundo do trabalho e a construção de
potencialidade existentes na formação do- conhecimento pautado na prática, sugerin-
cente, constituídas diante de seus trajetos do-se a inserção do professor colaborador
formativos, e fazendo com que seus saberes nas atividades acadêmicas. De acordo com
sejam valorizados e, muitas vezes, fomen- Marin et al. (2013, p.503),
tando crescimento ao grupo e estabele- A inserção nos contextos de prática
cendo, assim, uma identidade profissional permite ao estudante perceber, des-
116
docente, a partir do processo de ensino e de o primeiro ano, a complexidade
aprendizagem entre seus pares, é possível. das situações reais e, com isso, bus-
Para Josso (2002, p. 28), car informações que possibilitem
uma visão ampliada do cuidado em
[...] o que faz a experiência formado-
saúde. Proporciona, também, viven-
ra é uma aprendizagem que articula,
ciar o trabalho em equipe, com rela-
hierarquicamente, saber-fazer e co-
ções mais horizontais entre os traba-
nhecimentos, funcionalidades e sig-
lhadores da saúde, com autonomia
nificação, técnicas e valores num es-
e vínculos solidários, assim como o
paço-tempo que oferece a cada um
exercício da cidadania e uma prática
a oportunidade de uma presença de
mais humanizada e de qualidade.
si e para a situação pela mobilização
de uma pluralidade de registros [...]. Definem (p.503) ainda que
Assim, possibilitar espaços de trocas, em As novas propostas de ensino e
que as experiências e vivências pessoais e aprendizagem têm como finalida-

profissionais são expostas, enriquece o gru- de a formação de um profissional

po, fortalece as particularidades de cada crítico, cidadão, preparado para


aprender a aprender, criar, propor
um e renova as práticas e repertórios dos
e participar da construção do novo
colaboradores. E isso faz com que o sujeito
modelo de atenção à saúde. Para
possa (re)construir-se e inovar-se.
isso, o processo formativo deve
A pesquisa “Aspectos da integração ensino- ocorrer de forma articulada com o
-serviço na formação de enfermeiros e médi- mundo do trabalho, com ênfase no

cos” (2013), de Maria José Sanches Marin et desenvolvimento de um olhar críti-


co e reflexivo, visando à transforma-
al., é uma pesquisa qualitativa que tem por
ção das práticas assistenciais.
objetivo identificar as contribuições, limi-
tes e sugestões indicados para o aperfeiçoa- A partir do exposto, podemos perceber a
mento da integração ensino-serviço entre a importância do professor formador em di-
Faculdade de Marília e a Secretaria Munici- ferentes espaços, demonstrando como se dá
pal de Educação, para a formação de enfer- a constituição do perfil profissional, dando
meiros e médicos, destacando as narrativas ênfase à participação desses formadores
de formação desses sujeitos. Igualmente, nos cenários de prática de seus discentes,
verifica a inserção precoce do estudante pois são nos momentos de confronto com

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trabalho que serão colocadas em prática os na prática. No caso do artigo supracitado,
conhecimentos aos quais foi exposto no através de histórias de vida de pacientes,
ambiente escolar, permitindo a reflexão so- transcritas pelos alunos e, posteriormente,
bre a prática profissional, com vistas a sua sendo devolvida uma cópia à pessoa acom-
transformação diante das demandas que se panhada e outra deixada no prontuário dos
apresentam. pacientes, há bem mais que relatos, pois

No texto “Narrativas na formação comum de serviram para que se pudesse entender al-
117
profissionais de saúde” (2012), de Capozzol gumas ações da prática, bem como encon-

et al., os estudantes e docentes relatam suas trar soluções a diferentes problemas. Sobre

experiências de quando submetidos a parti- essas narrativas, Capozzolo et al (2014, p.

cipar de situações do cotidiano do trabalho 446) explica que

em saúde, possibilitando, assim, o desen- Após um período de preparação dos

volvimento de tudo que foi lhes ensinado estudantes, no qual são utilizados
recursos como textos e documen-
em sala de aula. Nesse sentido, Pimenta
tários, têm início as atividades de
(2008, p.19) salienta que a
campo. Os estudantes são instigados
identidade [docente] se constrói, a perceber, nos encontros, como o
a partir da significação social da sujeito conta sua história de vida: as
profissão; da revisão constante dos palavras escolhidas, o modo como
significados sociais da profissão; da se refere a si mesmo e aos grupos/
revisão das tradições, também da coletivos de que faz parte, as ruptu-
reafirmação de práticas consagradas ras no fio narrativo que podem ex-
culturalmente e que permanecem pressar sofrimento etc.
significativas.
O artigo “Experiência de humanização por es-
Da mesma forma, reafirma a colocação de tudantes de medicina” (2012), de Garcia et
Zabalza (2004, p. 53), no sentido de que “a al., tem por objetivo analisar as percepções
formação transcende a etapa escolar e os de discentes de medicina referentes às ex-
conteúdos convencionais da formação aca- periências que possibilitaram o desenvolvi-
dêmica, constituindo um processo intima- mento de conteúdos, habilidades e compor-
mente ligado à realização pessoal e profis- tamentos voltados à humanização. Trata-se
sional dos indivíduos”. de um estudo de caráter qualitativo, com
Diante disso, é facilmente observável que base nas narrativas de vivências significa-
a exposição do aluno ao ambiente de tra- tivas de cuidado e acolhimento sessenta e
balho, nos primeiros semestres do seu cur- três (63) estudantes do segundo ano e do
so, proporciona um crescimento pessoal e quarto ano, tendo em vista a humanização
profissional significativo, possibilitando di- na atenção e formação do profissional de
ferentes visões e análises a partir do que é saúde. A análise embasou-se no conteúdo
exposto na sala de aula e o que ele vivencia simbólico das redações, enfocando aspec-

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tos pedagógicos, psicológicos e éticos. Nes- suas experiências, possibilitando, a par-
se sentido, Garcia et al. (2009, p.89) defi- tir destas, o desenvolvimento profissional
nem que de determinado indivíduo, levando-se em
Essas estratégias que acontecem consideração seus saberes docentes e expe-
em cenários de prática permitem o riências anteriores, superando as concep-
desenvolvimento de processos rela- ções de formação clássica.
cionais/comunicacionais inerentes
118 à atuação profissional e fundamen- Pensar sobre os processos que se constituem
tados na multiprofissionalidade, na escola, diante das discussões sobre os
intersetorialidade e interdisciplina- alunos, e sua atuação como docente, atra-
ridade. A comunidade caracteriza-se vés de narrativas escritas, no caso da pro-
por ser um espaço em que se cruzam
fessora Atíria, faz com que o professor pos-
diversas referências que vão dar ori-
sa se (re)construir, pondo em prática seus
gem a saberes distintos daqueles que
circulam nas instituições de ensino, saberes experienciais. Tardif (2014, p.33)
tais como sentimentos, atitudes, co- destaca “que o saber docente se compõe,
operação, solidariedade e responsa- na verdade, de vários saberes provenien-
bilidade social. tes de diferentes fontes. [...] disciplinares,
A partir do exposto, pode-se perceber a im- curriculares, profissionais (incluindo os das
portância da exposição a esses cenários, ciências da educação e da pedagogia) e ex-
concluindo que essas experiências forma- perienciais”; ou seja, o professor se constrói
tivas permitem uma aproximação efetiva independente de sua formação inicial6 e
dos estudantes com as pessoas, famílias e em diferentes fases e contextos de sua vida.
comunidades, pois tornam-se momentos Tardif (2002, p. 64) define ainda que
de desassossego e contato com o trabalho,
[…] o saber profissional está, de um certo
proporcionando construção e (re)constru-
modo, na confluência entre várias fontes
ção de possíveis potencias de humanização.
de saberes provenientes da história de vida
No artigo “Narrativas na formação do profes- individual, da sociedade, da instituição
sor de matemática: o caso da professora Atí-
escolar, dos outros atores educativos, dos
ria” (2014), de Edna Maura Zuffi et al., o
lugares de formação etc. […] quando estes
objetivo era investigar como essa cultura de
saberes são mobilizados nas interações diá-
aula de matemática vinha sendo produzida
rias em sala de aula, é impossível identificar
na formação desses professores e (re)produ-
imediatamente suas origens: os gestos são
zida nas suas práticas docentes, consideran-
fluidos e os pensamentos, pouco importam
do-se que o uso das narrativas proporciona
as fontes, convergem para a realização da
uma formação contínua. O processo se deu
intenção educativa do momento.
diante da implantação de uma metodolo- 6 Formação Inicial: processos institucionais de profissão. Em profissões de
gia investigativa do ensino de matemática, maior prestígio, há um forte controle corporativo e legal sobre o exercício
de práticas profissionais, privilégio dos portadores de diplomas que
utilizada para representar e refletir sobre referendam a formação inicial (CUNHA, 2006).

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Percebemos, nas colocações dos autores, a Paula Q. Oliveira Santos, discute sobre os
complexidade da profissão docente e, con- professores da EPT no Brasil, na perspectiva
sequentemente, da sua formação. Além de construção de uma cultura profissional
disso, conhecer o contexto de atuação do que está diante das mudanças decorrentes
docente, os princípios e objetivos da insti- das políticas públicas para essa modali-
tuição e a modalidade ou nível de ensino em dade de educação no cenário mais amplo
que atua são importantes para verificarmos das exigências, mudanças e crise global do
119
quais os saberes mobilizados. Nesse contex- capitalismo. O trabalho é organizado em
to, os professores constroem sua identidade quatros teses com o foco nos professores
profissional mediante representações de si da Educação Profissional e Tecnológica. Se-
e de suas práticas, articuladas à história de gundo Fartes e Santos (2011, p.380),
vida e de formação, em meio ao desacomo- [...] a primeira tese põe em destaque
dar-se e reconstruir-se. Sendo as narrativas os dilemas e paradoxos vividos por
de formação estratégias fundamentais para esses profissionais; a segunda discu-
que se possa mapear essa identidade profis- te os saberes docentes na perspectiva
sional, proporciona a exposição dos saberes da experiência profissional; a tercei-
ra aborda a identidade docente nes-
constituído pelos docentes. Larrosa (1996,
se tipo de curso como uma categoria
p. 147) reforça que
histórica e culturalmente situada e a
[...] se o sentido daquilo que somos quarta tese discute a autonomia dos
está construído narrativamente, em professores diante do desenvolvi-
sua construção e em sua transfor- mento científico e tecnológico e das
mação terão um papel muito impor- regulações do modelo gerencial das
tante as histórias que escutamos (e instituições de ensino.
contamos) e lemos, assim como o
funcionamento dessas histórias no Leva-se em consideração que, ao docente
interior de práticas sociais mais ou da Educação Profissional, cabe transitar por
menos institucionalizadas. todos os níveis e modalidades de ensino

Consequentemente, são nossas trajetórias ofertadas nessas instituições, além de pro-

de vida que nos constituem e nos caracte- mover a formação humana e autonomia

rizam, trajetórias essas transformadas em dos alunos juntamente com a formação

fato diante das narrativas, pois são elas que profissional. Fartes e Santos (2011, p.379)

demostram quem somos e como pensamos observam que


diante das situações que nos são impostas, [...] tratar da docência na EPT, área

deixando transparecer quais os saberes que que, ao mesmo tempo em que com-
partilha problemas gerais da for-
nos são próprios.
mação docente, traz diferenciações
O artigo “Saberes, identidades, autonomia na nada desprezáveis em relação aos
cultura docente da educação profissional e tec- demais docentes de outros níveis e
nológica” (2011), de Vera Fartes e Adriana modalidades de ensino; enfrentar

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esse desafio, a começar pelo fato de da educação profissional estão, hoje,
que a educação profissional e tecno- mais elevadas. Não é mais suficien-
lógica está mais diretamente exposta te o padrão do artesanato, quando
às exigências dos setores produtivos o mestre da oficina-escola se apre-
e das constantes regulações nas polí- sentava como o espelho que o alu-
ticas curriculares, além do que uma no praticante deveria adotar como
boa parcela de seus docentes, por ter referência. Superado também está o
formação superior nas áreas técni- padrão da escola-oficina, que impu-
120
cas, não se identifica como professor, nha ao aluno a aplicação de séries
além de não trazer em sua bagagem metódicas de aprendizagem.
curricular os aportes necessários à
reflexão pedagógica; pensar a docên-
Para tanto, o professor modifica seu papel
cia em meio à diversificação desse de um mero transmissor do conhecimen-
público, constituído por graduados to, detentor do saber, e passa a atuar como
(bacharéis e/ou tecnólogos) originá- um mediador, como um coordenador de
rios de áreas técnicas, sem formação equipes sistematizadas, como instigador
para o magistério, e por licenciados
de questionamentos, possibilitando a seus
para disciplinas da educação básica
alunos crescimento e autonomia, podendo,
sem a formação que lhes permita ar-
ticular as relações entre o mundo do
assim, articular seus saberes com os conhe-
trabalho e a educação profissional. cimentos da docência.

Assim, podemos demarcar que o profissio- Sendo assim, conclui-se, com o texto, que
nal atuante na EPT, algumas vezes, tem o a formação do docente da EPT vai além das
saber de uma determinada área específica, barreiras acadêmicas, sendo construída to-
porém pode vir a desenvolver atividades dos os dias diante das demais formações
de docência para diferentes níveis de ensi- e das experiências vividas, muitas vezes
no, não possuindo uma formação que lhes possibilitada por meio dos poderes institu-
propicie estabelecer relações sólidas e perti- cionais e das políticas públicas da EPT. Em
nentes entre o mundo do trabalho, EPT e a relação aos saberes docentes, Tardif (2002)
formação final do aluno inserido nesse con- comenta sobre os saberes experienciais, sa-
texto. Machado (2008, p.15) salienta que beres esses que são constituídos no cotidia-
[...] para formar a força de trabalho no de trabalho dos educadores e compos-
requerida pela dinâmica tecnológi- tos pelas experiências que o sujeito possui e
ca que se dissemina mundialmente, das interações que estabelece. Se pararmos
é preciso “um outro perfil docente para pensar, podemos dizer que a profissão
capaz de desenvolver pedagogias do
docente se constrói pelos saberes. Portanto,
trabalho independente e criativo,
se pensarmos nos profissionais da EPT, de-
construir a autonomia progressiva
dos alunos e participar de projetos vemos também investigar quais seriam os
interdisciplinares” [...] As exigências saberes necessários para atuação neste es-
com relação ao perfil dos docentes paço de ensino e aprendizagem, enfatizan-

ACTA TECNOLÓGICA v.12, nº 1, 2017


do a importância de estudos que consigam fil do profissional para atuar nesses espa-
revelar as características desses saberes. So- ços, baseando-se em autores como Moura
bre os saberes, Tardif (2002, p. 72) salienta (2014), Tardif (1999) e Schon (1992). Enfa-
ainda que tizam, ainda, a importância de se trabalhar
Ao longo de sua história de vida pes- com esse tema nos cursos de formação de
soal e escolar, supõe-se que o futuro pedagogia. Assim, uma vez que se propõe
professor interioriza um certo núme- uma nova modalidade de ensino, deveria
ro de conhecimentos, de competên- 121
se pensar nas políticas públicas que irão
cias, de crenças, de valores, etc.; os
conversar com os profissionais que atuarão
quais estruturaram a sua personali-
nesse contexto, bem como com seu públi-
dade e suas relações com os outros
co-alvo, visando à melhoria na qualidade
[...] e são reatualizados e reutilizados,
de maneira não reflexiva, mas com do ensino. Carvalho e Souza (2014, p.883)
grande convicção, na prática de seu argumentam que,
ofício. Nesta perspectiva, os saberes [...] duas questões emergem inicial-
experienciais do professor de profis- mente, quais sejam, que tipo de
são, longe de serem baseados unica- formação deve ser efetivada e onde
mente no trabalho de sala de aula, deve ser realizada. As propostas
decorreriam em grande parte de pre- mencionadas evidenciam a comple-
concepções do ensino e da aprendi- xidade e a especificidade da forma-
zagem herdadas da história escolar. ção em EPT, sinalizando diferentes

Segundo o exposto, podemos concluir que possibilidades que incluem tanto a


formação inicial (graduação) quanto
os conhecimentos docentes são inesgotá-
a continuada (pós-graduação).
veis, que sua formação é permanente e que
todas as interferências que lhe são acome- Os autores comentam ainda que
tidas podem modificar a característica de O docente que possui formação téc-
seus saberes, muitas vezes (re)atualizan- nico-pedagógica inicial, adquirida
do-os de forma não reflexiva, o que vai se na graduação, pode compreender o

aprimorando, ao longo de sua trajetória de processo de ensino e de aprendiza-


gem de maneira complexa e abran-
vida, e em sua prática do ofício.
gente, visualizando este processo
Desta forma, Carvalho e Souza (2014), em por meio de conhecimentos técni-
seu estudo “Formação do docente da educação co-pedagógicos e metodologias pró-
profissional e tecnológica no Brasil: um diálogo prias que o auxiliam na construção
com as faculdades de educação e o curso de pe- e no planejamento das atividades

dagogia”, comentam sobre a necessidade de práticas a serem desenvolvidas dia-


riamente na sala de aula (p.892).
novas políticas públicas de formação para o
docente de EPT, visto que a nova constitui- Ao que segue, a formação técnica e peda-
ção dos institutos federais emerge de novos gógica auxilia na construção e no planeja-
preceitos, com o objetivo de analisar o per- mento de atividades, porém esta formação

ACTA TECNOLÓGICA v.12, nº 1, 2017


não garante que o professor seja conside- A falta de formação inicial e conti-

rado um bom professor em sala de aula. nuada e problema reiteradamente


mencionado (Lopes, 2009; Maron;
Desta forma, é preciso que haja a constru-
Lima Filho, 2009). Diferente das ou-
ção de diferentes saberes e fazeres, tornan-
tras modalidades, o profissional que
do necessário o investimento de recursos
atua no PROEJA não possui necessa-
na formação continuada de professores, riamente uma formação específica,
formação essa com enfoque no perfil dos pois raras licenciaturas contemplam
122
profissionais atuantes na EPT, para que es- discussões sobre o ensino e a apren-
ses possam se constituir enquanto docentes dizagem de jovens e adultos.

pertencentes a essa modalidade. Tal realidade nos remete a Nóvoa (2009,


O texto “Trabalho docente na Educação Pro- p.17), que considera que “é preciso passar
fissional e Tecnológica e no PROEJA” de Shi- a formação de professores para dentro da
roma e Lima Filho, por sua vez, tem como profissão”, resgatando a atuação dos profis-
objetivo analisar as especificidades do tra- sionais da educação para, também, se tor-
balho docente no Proeja, dando ênfase às narem autores dos discursos que regem sua
especificidades na organização do trabalho profissão. “Não haverá nenhuma mudança
para esse público diante das políticas pú- significativa se a ‘comunidade dos forma-
blicas que se apresentam. Shiroma e Lima dores de professores’ e a ‘comunidade dos
Filho (2009, p. 732) salientam que. professores’ não se tornarem mais perme-
Nos depoimentos, professores reve- áveis e imbricadas”, remetendo ao enten-
lam questões substanciais sobre suas dimento de que a teoria sobre a profissão
condições de trabalho, tais como: docente desconectada da prática se torna
ausência de formação específica, de vazia e vice-versa.
materiais didáticos, de tempo para
discutir e construir o currículo inte-
Desta forma, é necessário retomar a propos-
grado; a necessidade de se aumentar ta da EPT e dos Institutos Federais, os quais
a hora/atividade e reduzir a carga são instituições destinadas ao oferecimen-
de aulas; necessidade de melhorias to da Educação Profissional e Tecnológica,
salariais e contratuais que permitam integrada à educação básica, destinada a
vincular o docente a uma escola.
superar a dissociação entre o ensino prope-
A pesquisa por eles realizada engloba pro- dêutico e o ensino profissional e levando
fessores das redes federal, estadual e privada em consideração as diferentes formas de
que atuam na EJA ou no Proeja, fator que aprender e os diferentes públicos que dela
determina algumas das colocações feitas fazem parte. Considerando-se a formação
pelos sujeitos da pesquisa, levando-se em de professores e possibilitando-lhes interfe-
consideração o público-alvo da Educação rências na forma como serão realizadas suas
de Jovens e Adultos e suas especificidades. atividades de formação, pode direcioná-las
Para Shiroma e Lima Filho (2011, p. 732), ao que estes realmente necessitam, a partir

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das demandas que a eles se apresentam. serido. Portanto, ao observarmos o cenário

Sendo assim, a EPT tem uma cultura espe- que se apresenta em torno da EPT no Brasil
cífica de produção de saberes e, sobre esta, e da sua visibilidade desde a instituição dos
o texto “Saberes da docência na educação Institutos de Educação, Ciência e Tecnolo-
profissional e tecnológica: um estudo sobre o gia, cabe pensarmos quais saberes são acio-
olhar dos professores” (2012), de José Ânge- nados por esses profissionais e como se dará
lo Garriglio e Suzana Burnier, faz uma dis- a formação desses sujeitos especificamente
123
cussão inicial. Os autores discutem sobre diante das demandas que se apresentam.
os saberes mobilizados pelos docentes da
EPT em suas atividades educativas e sobre 3 CONSIDERAÇÕES FINAIS
as concepções de formação profissional
Trazer à tona as pesquisas junto ao banco
subjacentes a tais saberes, congregando au-
de dados da Scielo Pesquisas, com o intuito
tores como Gauthier (1998), Tardif (1996),
de vislumbrar o que se tem produzido sobre
Lessard (1996), Oliveira (2006) e Peterossi
a formação dos professores para a Educação
(1992). Favorecem o debate sobre a forma-
Profissional e Tecnológica e narrativas de
ção de professores para atuar nesses espaços,
formação, nos faz repensar sobre a forma-
possibilitando aos professores autonomia e
ção do profissional atuante na EPT, refletir
desenvolvimento de seus saberes para que
sobre o público-alvo desta modalidade de
possam fazer parte da estrutura educacio-
ensino, e quais os saberes necessários para
nal. Diante dessa análise, os autores Garri-
formar cidadãos conscientes. Posto que,
glio e Burnier (2012, p.227) afirmam.
uma vez que se propõe uma nova modali-
[...] tomamos como referência o dade de ensino, deve-se se pensar nas po-
modelo tipológico criado por Tardif
líticas públicas que irão conversar com os
(2002) para identificar e classificar
profissionais que atuarão neste contexto.
os saberes profissionais dos docen-
tes. Nesse modelo, busca-se compre- A análise dos trabalhos supracitados permi-
ender o pluralismo do saber da base tiu identificar uma significativa preocupa-
profissional dos professores, relacio- ção com a formação dos professores da EPT
nando-se com os lugares nos quais
diante das políticas públicas que descrevem
os próprios professores atuam, com
sobre esta modalidade. Enfatizou, também,
as organizações que os formam e/ou
nas quais trabalham, com seus ins-
a importância de se usar as narrativas de
trumentos de trabalho, as fontes de formação desses profissionais para o cres-
aquisição desse saber e seus modos cimento profissional de si e de seus pares.
de integração no trabalho docente.
Evidenciaram-se, ainda, as poucas pesqui-
Contudo, são os saberes acionados pelo sas realizadas em relação às narrativas de
professor que o constrói profissionalmente, formação dos professores da EPT, sendo
sendo esses construídos pelas experiências que, na presente pesquisa, não foi encon-
de si em meio ao contexto no qual está in- trado nenhum trabalho com esta ênfase,

ACTA TECNOLÓGICA v.12, nº 1, 2017


urgindo a preocupação com a formação destes profissionais, visto sua nova contextualiza-
ção a partir da instauração dos Institutos de Educação, Ciência e Tecnologia.

Diante das categorias Narrativas de Formação e Formação Docente, foi possível identificar
que, na primeira categoria, os autores dão ênfase à importância das narrativas de forma-
ção para constituição de grupos, da valorização dos saberes, da troca de experiências, da
constituição integral do sujeito, deixando transparecer, ainda, que os saberes docentes são
estabelecidos diante das experiências vividas em seus trajetos formativos, intenso desaco-
124
modar-se e reconstruir-se, permitindo a reflexão sobre a prática profissional, com vistas à
sua transformação diante das demandas que se apresentam.

Na segunda categoria, evidencia-se a fragilidade das políticas públicas diante da nova


proposta de ensino para EPT, visto que seu público é diferenciado e que o docente tem
que promover a formação humana e a autonomia dos alunos juntamente com a formação
profissional, afirmando que a formação de professores não é pensada com os professores,
muitas vezes não é articulada frente às demandas que se apresentam, mostrando que a
formação inicial de professores é muito focada na área técnica, deixando de lado a lógica
de que serão professores.

ACTA TECNOLÓGICA v.12, nº 1, 2017


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Recebido em 29/09/2017; Aceito em 31/10/2017; Publicado na web em 14/03/2018

Práticas de letramento e igualdade de


gênero: a literatura (trans)formando
leitores
Lívia Maria Rosa Soares1
127
1 Mestre em Letras pela Universidade Estadual do Piaui. Professora EBTT de Língua Portuguesa - Campus Araioses, Coordenadora do
Projeto de Pesquisa A relação entre analfabetismo funcional e fracasso escolar na adolescência: panoramas e iniciativas possíveis através
de oficinas de letramento literário em Araioses-MA.

RESUMO
Quando se fala sobre as questões de gênero no espaço educacional, a Literatura é uma
das maneiras mais acessíveis de fazer esse tema chegar ao mundo infantil e juvenil de
uma maneira eficaz e oportuna, especialmente em um país que ocupa a 5ª posição no
ranking mundial em casos de violência contra as mulheres. Este trabalho objetiva ana-
lisar a importância da leitura de obras que permitam a (res)significação das questões de
gênero na literatura infantojuvenil contemporânea, aqui exemplificada pelos contos de
fadas de Marina Colasanti. Essas narrativas permitem o diálogo com histórias reunidas da
tradição popular e associam-se aos novos discursos sociais, relacionados à igualdade de
gênero, além de ajudar na construção do senso critico dos leitores, constituindo-se como
prática de letramento. Os contos infantojuvenis da autora apresentam personagens que
(re)constroem e (re)dimensionam a representação da mulher, as quais agem de forma in-
dependente e altiva frente às conflituosas relações de afeto com o oponente masculino,
geralmente o pai, o companheiro ou até mesmo toda a sociedade. A partir da linguagem
simbólica proposta nessas obras, os enredos redimensionam papéis que indicam a assimi-
lação/transformação do passado, ao mesmo tempo em que põem às claras desequilíbrios
presentes no contexto histórico, político e social de várias épocas. Isso permite ao leitor
iniciante uma postura crítica e questionadora, uma vez que mais do que decodificar a
linguagem escrita, a produção de Colasanti incentiva a exploração dos sentidos do texto
por meio da relação entre os elementos que compõem as narrativas maravilhosas e a reali-
dade, possibilitando às crianças e jovens um aprendizado que as situações do mundo real
não oferecem. Como fundamentação teórica deste estudo apresentam-se os pressupos-
tos de Arroyo (2010), Lajolo e Zilberman (2005), Cecil Zinani (2009), Lúcia Zolin (2003,
2006), Cosson (2007) para esclarecer de que forma essas configurações literárias contri-
buem para as práticas de letramento e a construção de novos valores, contribuindo para a
consolidação de uma sociedade mais justa e democrática.

Palavras-chave: Formação de leitores. Letramento. Igualdade.

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Literacy practices and gender equality:
literature (trans)forming readers

ABSTRACT
128 When talking about gender issues in the educational space, Literature is one of the most
accessible ways to make this topic reach the world of children and youth in an effective
and timely manner, especially in a country that ranks 5th in the world ranking in violen-
ce against women. This work aims to analyze the importance of reading works that allow
the (re) signification of gender issues in contemporary juvenile literature, here exempli-
fied by the fairy tales of Marina Colasanti. These narratives allow dialogue with stories
gathered from popular tradition and are associated with new social discourses related to
gender equality. The author’s children stories present characters who (re) construct and
(re) dimension the woman’s representation, who act in an active manner in the face of
conflicting affective relations with the male opponent, usually the father, the partner or
even the whole society . From the symbolic language proposed in these works, the entan-
glements re-dimension roles that indicate the assimilation / transformation of the past,
while at the same time putting clear imbalances present in the historical, political and
social context of various eras. This allows the beginning reader a critical and questioning
posture, since rather than decoding the written code, Colasanti’s production encourages
the exploration of the meanings of the text through the relation between the elements
that compose the wonderful narratives and reality, constituting as a practice of literacy,
enabling children and young people to learn what real-world situations do not offer. As
a theoretical basis of this study, we present the assumptions of Arroyo (2010), Lajolo and
Zilberman (2005), Cecil Zinani (2009), Lúcia Zolin (2003, 2006) and Cosson (2007) to cla-
rify how these literary configurations contribute to literacy practices and the construction
of new values, contributing to the consolidation of a more just and democratic society.

Keywords: Training of readers. Literacy. Equality.

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1 INTRODUÇÃO Essas abordagens, mesmo no plano ficcio-
nal, permitem ao sujeito refinar os senti-
O presente texto pretende provocar uma
mentos e harmonizá-los com sua natureza
reflexão acerca da importância de práticas
e cultura, ajudando a superar os dilacera-
de letramento que contribuam para a con-
mentos e a fragmentação da sociedade mo-
solidação de uma sociedade mais democrá-
derna, formando seres humanos completos
tica, especialmente no que diz respeito às
e aptos a atuarem de forma ética, justa e de-
questões de gênero. A partir da seleção e lei- 129
mocrática dentro e fora do espaço escolar.
tura literária no espaço escolar é possível ao
leitor vivenciar questões percebidas exter-
2 LITERATURA E
namente à obra de arte. Este recurso peda-
ENGAJAMENTO NO
gógico pode auxiliar na formação do senso ESPAÇO ESCOLAR
estético, além de contribuir para a supera-
É incontestável a importância da leitura li-
ção de desigualdades observadas ao longo
terária no espaço escolar e/ou familiar. Por
dos anos, uma vez que a literatura trabalha
isso, as obras que circulam em ambientes de
com imagens simbólicas, o que permite um
leitura destinados a crianças e jovens, além
aprendizado que muitas vezes as situações
de estimular o desenvolvimento do senso
reais de aprendizagem não oferecem.
estético dos leitores em formação, devem, a
Dessa forma, este artigo versa sobre inves- partir de um trabalho artístico com a lingua-
tigações relacionadas à mediação e seleção gem, permitir reflexões sobre questões que
de obras no espaço escolar que abordem a os ajudem a perceber as relações entre si, os
representação da mulher na modernidade, outros e o mundo. Considerando que a escri-
aqui representada por um dos contos in- ta acompanha a vida das pessoas do começo
fantojuvenis de Marina Colasanti. ao fim, as práticas sociais que articulam a
Discutiremos como a Literatura pode ser leitura e a produção de textos em contextos
uma ferramenta que pode ajudar na cons- diversificados são denominadas Letramento.
cientização de sujeitos em formação sobre os Entre esses contextos, a literatura ocupa uma
diversos tipos de violência que as mulheres posição privilegiada porque conduz ao do-
foram e são vitimas ao longo do tempo. Para mínio da palavra a partir dela mesma.
tanto, será feita a análise do conto mulher Cabe ressaltar que a Literatura infantil e
ramada de Marina Colasanti. Nele, o leitor juvenil contemporânea produzida por im-
em formação poderá interpretar “o outro portantes autores brasileiros, vem apresen-
lado da história”, pois há uma protagonista tando histórias que descrevem a realidade
que escreve seu próprio destino e apresenta muitas vezes marcada por desigualdades
um comportamento que subverte a passivi- e desequilíbrios, sem deixar de apresentar
dade e a submissão das princesas representa- uma linguagem lúdica adequada aos leito-
das nos contos de fadas tradicionais. res em formação.

ACTA TECNOLÓGICA v.12, nº 1, 2017


E, quando se fala sobre as questões de gêne- ti reflete sobre o preconceito com que ainda
ro no espaço educacional, sem dúvida, a Li- hoje se pensa a relação mulher/escrita:
teratura é uma das maneiras mais acessíveis Ora, as escritoras estão perfeitamen-
de fazer esse tema chegar ao mundo infan- te conscientes de que ainda hoje um
til e juvenil de uma maneira eficaz e opor- preconceito pesado tende a colorir
tuna, especialmente em um país que ocupa de rosa qualquer obra de literatura

a 5ª posição no ranking mundial em vio- feminina. Apesar da onda dos anos


130 sessenta que envolveu os escritos das
lência contra as mulheres segundo a ONU.
mulheres em um grande e esperan-
Cotidianamente, ainda se registram inúme-
çoso movimento, não conseguimos
ras disparidades no meio profissional e so- vencer a barreira. O preconceito per-
cial em relação a homens e mulheres. São dura. Pesquisas mostram que basta a
expressivos os casos de violência explícita e palavra mulher em um título para es-
velada, construindo toda uma rede de pre- pantar os leitores homens e abrandar
conceitos e interdições que se perpetua ao o entusiasmo dos críticos. E embora

longo dos anos. Por essa razão, as questões não precisemos mais nos esconder
atrás de pseudônimos masculinos,
de gênero merecem ter um espaço maior de
como no século XIX, sabemos que
debates dentro e fora da escola.
os leitores abordam um livro de ma-
No passado, as mulheres ocupavam somen- neira diferente quando ele é escrito
te o espaço doméstico, não tinham direito por uma mulher ou por um homem.

ao voto e estavam subordinadas a lugares (COLASANTI, 2004 p.70-71)

periféricos. Eram submetidas aos desarran- Por essa razão, a literarura assume uma fun-
jos de uma sociedade patriarcal e misógi- ção humanizadora, pois é plena de saberes
na, que rotulava suas produções científicas, sobre o homem e o mundo, onde eu amplia
artísticas e profissionais como inferiores ou o saber da vida por meio da experiência do
sem valor algum. Especificamente, em re- outro. Na escola, a leitura literária deve ser
lação às obras de autoria feminina, muitas compartilhada, e isso se faz através de aná-
autoras usavam codinomes masculinos ou lise literária que “toma a literatura como
transvestiam suas insatifações em metáfo- um processo de comunicação” e se efetiva
ras ou alegorias, pois a crítica literária tam- quando a obra é explorada sob os mais va-
bém era essencialmente misógina. Por isso, riados aspectos.
as obras que pertenciam ao cânone literário
Essa exploração cabe ao professor, que cria
também representAavam discursos oriun-
condições para o encontro do aluno com a li-
dos da sociedade patriarcal, que durante
teratura. A esse respeito, Cosson (2006) afirma
muitas décadas dominaram as produções
Em primeiro lugar, o letramento li-
artístico-culturais.
terário é diferente dos outros tipos
A esse respeito, no ensaio Por que nos pergun- de letramento porque a literatura
tam se existimos? a escritora Marina Colasan- ocupa um lugar único em relação à

ACTA TECNOLÓGICA v.12, nº 1, 2017


linguagem, ou seja, cabe à literatura cas, a partir de rotinas escolares que colo-
“[...] tornar o mundo compreensível quem essa temática em protagonismo, fa-
transformando a sua materialidade
vorecendo o debate sobre o feminismo de
em palavras de cores, odores, sabo-
forma contextualizada e condizente com
res e formas intensamente huma-
cada nível de ensino.
nas” (COSSON, 2006, p. 17).

Por essa razão, discutir gênero na escola é


3 PRINCESAS QUE
131
uma forma de ampliar o debate acerca des- ESCREVEM SEUS
sa problemática, contribuindo para apro- DESTINOS: A OBRA
fundar os debates sobre essa questão e es- COLANSANTIANA
timular a construção de novos paradigmas
Marina Colasanti é uma das autoras
e a (re)definição dos papéis sociais. Como
contemporâneas que mostra empenho em
exemplo da importância dessas aborda-
fazer uma literatura que humaniza os lei-
gens no espaço escolar, A ONU Mulheres,
tores, resgatando a tradição dos contos de
desenvolve o projeto Gênero e Educação:
fadas, porém com um discurso que “veste
fortalecendo uma agenda fortalecendo es-
roupa nova”, despertando inquietações e
sas abordagens, que tem por objetivo for-
questionamentos, sem perder as afinidades
talecer relações de igualdade de gênero nas com o passado, a tradição oral e popular.
políticas educacionais. Assim, a maioria de seus contos infanto-
O órgão também lidera algumas iniciativas juvenis segue a esteira dos escritores que
importantes que incentivam a implementa- optam por uma literatura questionadora,
ção de políticas públicas na área de educa- revelando em suas narrativas as relações
ção e gênero, tais como o programa Gênero convencionais existentes entre a criança e
e Diversidade na Escola, Escola sem Homo- o mundo em que ela vive e questionando
fobia, Mulher e Ciência. Contudo, infeliz- os valores sobre os quais nossa sociedade
mente essas são políticas públicas que ainda está assentada (COELHO, 2010).
não chegaram à maioria das escolas, pois co- Ao analisar o protagonismo feminino den-
meçaram a ser desenvolvidas recentemente tro da literatura infantil brasileira, Lajolo
através das recém-criadas Secretarias de Po- (1989) enfatiza a importância de conside-
líticas para as Mulheres, Direitos Humanos rar a historicidade da condição feminina,
e Igualdade Racial, ainda com pouca repre- apontando a “docilidade com que a litera-
sentatividade em estados e municípios. tura infantil espelha e reforça as sucessivas
Assim, além dessas iniciativas, é impor- imagens de mulher endossadas em diferen-
tante que os educadores também abram tes momentos da sociedade brasileira” (LA-

espaço para discussão em torno de ques- JOLO 1989 p. 19).

tões relacionadas a gênero, discriminação, Assim como as autoras Lygia Fagundes Tel-
igualdade, raça, etnia, entre outras temáti- les, Cecília Meirelles, Rachel de Queiroz,

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Lygia Bojunga Nunes, entre outras contem- Um jardineiro realiza seu trabalho com
porâneas femininas, Colasanti encontra-se muita disciplina, contudo nunca é nota-
também, intensamente ligada à libertação do pelos outros habitantes daquele reino:
da mulher por meio das ideologias de suas “Há damas e cavaleiros, mas ninguém o
narrativas. Em seus livros, os assuntos su- via afastado no jardim, confundia-se com
gestivamente nos remetem para o universo as plantas, tão sozinho, pensou no dia que
feminino. Deste modo, as suas narrativas seria bom ter uma companheira” (COLA-
132
se enchem de fantasia com a finalidade de SANTI, 2001, p. 27).
discutir comportamentos sociais, frutos de Apesar da solidão, o jardineiro cumpria sua
convicções dominadoras. tarefa de cuidar das flores para que elas fi-

Boa parte dos contos infantojuvenis da au- cassem sempre vistosas, mas lamentava por
não ter ninguém com quem compartilhar
tora destinados a leitores em formação pro-
a vida. Diante dessa falta, o jardineiro de-
põe uma (re)definição da condição femini-
cidiu “cultivar uma companheira”. No dia
na no mundo. E podem ser usados como
seguinte, trouxe um saco com duas belas
material didático que permite repensar a
mudas. Escolheu o lugar, cavou a primeira
representação dos papéis de gênero na so-
cova e com gestos sábios de amor enterrou
ciedade.
as raízes. Quando os primeiros galhos des-
pontaram, carinhosamente os podou, até
4 A MULHER RAMADA: que outros galhos brotassem mais fortes.
NOVOS TEMPOS, NOVOS
DESTINOS Durante meses, trabalhou conduzindo os
ramos de forma a preencher o desenho que
A seguir apresentaremos a análise de um
só ele sabia, retirando os espigões teimosos
dos contos da autora que permite um diá-
que escapavam à harmonia exigida. O jar-
logo com as questões de gênero e que tam-
dineiro vai trabalhando na imagem de sua
bém possililita ao docente o trabalho com amada, sempre eliminando os excessos,
a leitura a partir de práticas de letramento conforme descrição a seguir:
literário.
Aos poucos, entre suas mãos, o arbusto foi
O conto mulher ramada faz parte da cole- tomando forma, fazendo surgir dos pés
tânea infantojuvenil Antes de virar gigan- plantados no gramado duas lindas pernas,
te, publicada em 2001. A história se passa depois o ventre, os gentis braços da mulher
em um lugar longínquo, com personagens que seria sua. Por último, cuidado maior,
inominados e apresenta um único conflito a cabeça, levemente inclinada para o lado.
central, ou seja, segue a mesma estrutura e O jardineiro ainda deu os últimos retoques
sequência dos contos de fadas tradicionais, com a ponta da tesoura. Ajeitou o cabelo,
porém com novas configurações para os arredondou a curva de um joelho. Depois,
papéis sociais. afastando-se para olhar, murmurou encan-

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tado: - Bom dia, Rosamulher. (COLASANTI E, mesmo no escuro da terra, as raízes acor-
2001. p. 10): daram, espreguiçando-se em pequenas pon-

No trecho acima, o jovem leitor percebe- tas verdes. Mas, enquanto todos os arbustos
rá o insólito, o elemento sobrenatural que se enfeitavam de flores, nem uma só gota
é típico dos contos de fadas que herdaram de vermelho brilhava no corpo da roseira.
muitas caracteríscicas dos contos folclóricos Nua, obedecia ao esforço do seu jardineiro
produzidos a partir dos saberes humanos que, temendo viesse a floração romper tan-
133
empíricos oriundos da tradição oral. Nesse ta beleza, cortava todos os botões. De tanto
trecho também é perceptível ao leitor, as- contrariar a primavera, adoeceu, porém, o
sim como no mito biblico de Adão e Eva jardineiro. E, ardendo de amor e febre na
que a mulher surgiu como obra do homem: cama, inutilmente chamou por sua amada.
nasce a Rosamulher, que se tornaria com- (COLASANTI 2001. p. 08)
panheira do solitário jardineiro. E, da mes-
Neste trecho, percebemos que todos os cui-
ma forma como no mito bíblico a mulher
dados destinados a sua amada impediam o
“recém-criada” deveria ser subordinada ao
desenvolvimento da planta. O jardineiro cor-
seu criador. Talvez fosse esse o desfecho de
tava todos os botões, sempre contrariando a
um conto de fadas clássico, mas essa ordem
natureza. Todavia, a rosa resistia às dificul-
estabelecida será subvertida como forma de
dades. Muitos dias se passaram antes que ele
diálogo com os novos paradigmas típicos
da modernidade e os novos discursos so- pudesse voltar ao jardim. Quando afinal con-

ciais presenciados no mundo real. seguiu se levantar para procurar por sua ama-
da, o jardineiro percebeu que sua ausência
Inicialmente, a personagem “Rosamulher”
havia feito a “Rosamulher” se desenvolver.
tinha a cabeça inclinada para o lado e não
para frente. O amor que o jardineiro parece Isso fez com que o jardineiro se surpreen-
sentir por sua nova companheira apresen- desse, pois a “Rosamulher”, sem os seus
ta um paradigma de dominação. Essa ima- cuidados parecia ainda mais bela: “Florida,
gem simbólica é constante, como um dos pareceu-lhe ainda mais linda” (op cit 2001.
fios condutores da narrativa colasantiana. p. 10). Perdida estava a perfeição do rosto,
Com o passar dos dias, a admiração do jar- perdida a expressão do olhar, mas do seu
dineiro pela “Rosamulher” só aumentava, amor nada se perdia. Nunca “Rosamulher”
por diversas vezes ele é descrito como fiel fora tão rosa e seu coração de jardineiro
contemplador de sua obra. soube que jamais teria coragem de podá-
Porém, mesmo com todos os cuidados de -la. Nem mesmo para mantê-la presa em
seu criador, Rosa mulher não se desenvolvia seu desenho. Então, docemente a abraçou
como as outras plantas daquele jardim. Essa descansando a cabeça no seu ombro. E es-
imagem poética dá margem a interpretações e perou, o jardineiro envolvido por aquele
reflexões referenciadas nos papeis de gênero: contato perdeu-se entre as folhagens.

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Em todo o conto, a plurissignificação é evi- do duas lindas pernas, depois o ventre, os
dente. O trabalho com a linguagem e as gentis braços da mulher que seria sua. (CO-
imagens construídas permite uma correla- LASANTI 2001. p. 10)
ção entre o discurso literário e as tensões so-
Além disso, esta narrativa também apre-
ciais, uma vez que, enquanto vivia subordi- senta uma herança de crenças e práticas ri-
nada aos cuidados de seu criador, a rosa em tualísticas sugeridas a partir das mudanças
nada se desenvolvia. O homem percebe que observadas nos dois personagens do conto.
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enquanto esteve longe, a vida de sua rosa Entretanto, essas transformações destacam
se desenvolveu muito mais. Diante disso, o a inversão de papéis: ao invés de a mulher
jardineiro se entrega eternamente à aman- render-se à imposição masculina, o homem
te, conforme o trecho descrito a seguir: entrega-se à sua beleza e aceita sua liberdade,
E sentindo sua espera a mulher-rosa co- ou seja, a história estrutura-se nos moldes
meçou a brotar: lançando galhos, abrindo das narrativas clássicas, porém, a maneira
folhas, envolvendo-o em botões, casulo de de representar os sujeitos sociais se atualiza.
flores e perfumes. Ao longe, raras damas A partir dessa configuração narrativa, o dis-
surpreenderam-se com o súbito esplendor curso ficcional reproduz valores e compor-
da roseira. Um cavaleiro reteve seu cavalo. tamentos também vivenciados externamen-
Por um instante pararam, atraídos. Depois te à obra literária. É possível localizar uma
voltaram a cabeça e a atenção, remontando interpretação do contexto social no qual a

seus caminhos. Sem perceber debaixo das mulher está inserida, construindo por meio
de recursos enunciativos diferenciados, a
flores o estreito abraço dos amantes. (CO-
representação da imagem feminina. A esse
LASANTI 2001. p. 10)
respeito, Lucia Zolin (2009, p. 107) ressalta
Percebemos que a tessitura narrativa de A as contribuições que essas novas representa-
mulher ramada apresenta o reconhecimen- ções trazem aos estudos culturais:
to da experiência de uma mulher que passa
No contexto da pós-modernidade – profí-
a viver de forma independente por meio de
cuo às manifestações da heterogeneidade e
uma linguagem esteticamente trabalhada
da multiplicidade, e inóspito aos discursos
e acessível à criança e ao jovem, conforme
totalizantes –, a crítica literária feminista,
exemplificado a seguir:
bem como o feminismo entendido como
Verde claro, verde escuro, canteiro de flores, pensamento social e político da diferença,
arbusto entalhado, e de novo verde claro, surge com o intuito de desestabilizar a le-
verde escuro, imenso lençol do gramado; gitimidade da representação, ideológica e
lá longe o palácio. Assim o jardineiro via tradicional, da mulher na literatura canôni-
o mundo, toda vez que levantava a cabeça ca. Após um momento inicial de denúncia
para ir ao trabalho [...]. E aos poucos, entre e problematização da misoginia que per-
suas mãos, o arbusto foi tomando forma, meia as representações femininas tradicio-
fazendo surgir dos pés plantados no grama- nais, ora presas à nobreza de sentimentos e

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ao caráter elevado, ora relacionadas com a construtora do real, explora-se a técnica da
Eva pecadora e sensual, o feminismo crítico intertextualidade (absorção de um texto
volta-se para as formas de expressão oriun- antigo por um novo), técnica resultante de
das dos próprios sujeitos femininos. que não há texto original, pois cada texto
Essa mudança de representação é observada novo depende visceralmente de um texto
neste conto, pois sugere interpretações so- anterior a este. Nesta linha estão as sátiras,
bre a quebra de estereótipos por muito tem- paródias ou reinvenção dos antigos contos
de fadas, fábulas, contos maravilhosos, etc. 135
po conferidos a homens e mulheres. E, em
se tratando de obras voltadas para crianças (COELHO, 2001 p. 103)
e jovens, essas imagens vêm carregadas de Uma nova forma de pensar, mas com carac-
simbologias e de forma subliminar. terísticas centradas nas bases do gênero ma-
Além disso, leva para o espaço escolar uma ravilhoso, permite que uma nova atitude
temática relevante que subjaz várias ten- diante da vida seja engendrada. A literatura
sões presentes no cotidiano dos alunos. Ou- lúdica e metafórica para leitores de várias
tra questão relevante é a semelhança com idades se oferece como espaço de confron-
histórias recolhidas do imaginário coletivo to entre razão e imaginação. É nessa pers-
que faz recordar que durante muitos anos, pectiva que a literatura como prática de le-
as mulheres foram as grandes narradoras tramento é uma das ferramentas adequadas
que mantiveram vivas histórias milenares para a abordagem sobre igualdade de gêne-
propagadoras de valores patriarcais. Agora, ro no espaço escolar, ajudando a construir
na modernidade, as histórias aparecem es- valores verdadeiramente democráticos. A
truturadas e amalgamadas pela própria vi- esse respeito, o crítico Antonio Cândido,
vência do feminino, no ato de viver. Isto em sua obra Literatura e Sociedade repercu-
é, propõem uma realidade outra, traçando tiu sobre essa questão, ao defender que “o
um retrato da memória coletiva que guarda fator social determina a matéria, que são o
um discurso que permite o questionamen- ambiente, os costumes, os traços grupais e
to em relação aos embates de gênero, ao ideias, que servem de veículo para condu-
mesmo tempo em que dialoga com as nar- zir a corrente criadora, como elemento que
rativas tradicionais, sem perder a fantasia e constitui o essencial da obra como obra de
permitindo o despertar da imaginação. Se- arte” (CANDIDO, p. 91 2006).
gundo Nelly Novaes Coelho: Nesse sentido, o conto A mulher ramada é
A consciência desse poder criador é uma das uma narrativa que apresenta uma estrutu-
bases da literatura infantojuvenil contem- ra semelhante com os contos tradicionais
porânea que vem se revelando como um surgidos há vários séculos, porém atuali-
dos férteis campos de experimentação do zada com novos discursos sociais, pois a
verbal e do visual para a invenção de novos protagonista assume funções até então não
modos de ver, sentir, pensar, etc. A partir exercidas por nenhuma mulher e desafia
dessa nova interpretação da palavra como uma ordem já estabelecida. A partir do em-

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prego de um tom lírico e suave e de uma própria vida. Este modelo perpetuou-se nas
ambientação medieval, a autora redesenha produções culturais e na sociedade como
a intervenção do maravilhoso na resolução um todo, ajudando a legitimar a ideia de
dos conflitos. A esse respeito, Cecil Zinani papéis sociais marcados pela tradição.
(2006, p. 22) afirma: Por essa razão, por meio da análise do con-
Dominação e autoritarismo são elementos to A mulher ramada intencionou-se explorar
que envolvem as relações que permeiam a as várias significações que a obra literária
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situação da mulher em sociedade e que são infantojuvenil apresenta, e por meio dela
questionados em obras que procuram veri- é possível trazer para o espaço escolar uma
ficar como ocorre a representação feminina temática que ainda é alvo de conflitos nas
e que são apresentadas a partir de posicio- vivências dos alunos. Por meio da ficção, o
namentos teóricos sempre convergentes, mediador de leitura pode estabelecer novas
mas que apresentam como elemento co- relações com a realidade.
mum a questão da diferença. Cabe ressaltar que, assim como esse conto,
Com base nessas ideias, a análise crítica há outras obras contemporâneas que tam-
bém permitem o debate em torno das ques-
dessa narrativa comprova que sua interpre-
tões de gênero e empoderamento femini-
tação desencadeia reflexões em leitores de
no. Por isso, é fundamental que o Professor
todas as idades. Nesse aspecto, à criança e
atualize e selecione obras que ajudem nessa
ao jovem a representação desses valores é
e em outras discussões, além de contribuir
de fundamental importância, uma vez que
para o desenvolvimento da competência
a relação entre uma leitura mais superficial
leitora contribui para a formação do senso
e outra mais profunda, sem dúvida, contri-
crítico do indivíduo em formação. Desse
bui para a formação do sujeito, ajudando a
modo, a literatura contribuirá para o desen-
ordenar novas experiências.
volvimento da educação estética e assimila-
ção de novos valores, pois o contato e a cor-
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS reta mediação dessas produções artísticas
A partir das análises apresentadas neste es- permitem ao sujeito refinar os sentimentos
tudo, constatou-se que Marina Colasanti e harmonizá-los com sua natureza e cultura.
por meio de seus contos infantojuvenis atu- Isso ajudará na superação dos conflitos pre-
aliza um gênero literário que é cultivado há sentes registrados na sociedade moderna.
muitos séculos: o conto de fadas. Essas his- Ademais, a escola é espaço privilegiado
tórias, no passado, apresentavam uma voz para se desnudar preconceitos, questionar
autoral masculina. As princesas apareciam valores cristalizados ao longo dos anos e
marcadas pela submissão e subserviência abrir espaço para discussões em torno da
à figura masculina. Aquelas que desobede- igualdade de gênero que podem contribuir
ciam à ordem estabelecida eram punidas para a construção de relações sociais mais
com castigos ou até mesmo com a perda da justas e isonômicas.

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REFERÊNCIAS
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COSSON, Rildo. Letramento Literário: teoria e prática. São Paulo: Contexto, 2006.

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Educação

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