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PUC/SP
SÃO PAULO
2013
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC/SP
SÃO PAULO
2013
Banca Examinadora
____________________________________
____________________________________
____________________________________
Por que é que vocês estão procurando entre os mortos
quem está vivo? Ele não está aqui, mas foi
ressuscitado!
Lucas 24:5b-6 a
Aos meus amigos, especialmente, Nair Feld, Jorge Torresan, Patrícia Gimenez
Camargo e Rodrigo Leite, por me ajudarem e por terem palavras motivadoras,
sempre que precisei.
Dedicatória
Este trabalho está inserido nos postulados da Análise do Discurso de linha francesa
e tem como tema o exame da constituição da cenografia e do ethos discursivo no
processo de revelação do sujeito enunciador em o Artigo do Mestre Masaharu
Taniguchi, publicado na revista Pomba Branca da Seicho-No-Ie. Esse tema mostra-
se relevante, pois buscamos entender a forma como os sujeitos interagem em um
discurso utilizado para a propagação e a manutenção de valores e conceitos
institucionais. Para tanto, tomamos como base as abordagens de Dominique
Maingueneau sobre interdiscurso, cena enunciativa e ethos discursivo. A
investigação realizada utiliza um procedimento teórico-analítico, em que analisamos
a cena enunciativa, em sua tripartição em cena englobante, genérica e cenografia,
bem como a forma de desvelamento do ethos discursivo. Nosso estudo apontou o
papel da interdiscursividade na organização do discurso da Seicho-No-Ie,
principalmente, o atravessamento dos campos discursivos da religiosidade, do
pedagógico, do científico, entre outros e a imagem construída pelo sujeito
enunciador que é a de um mestre que atua em uma cenografia de sala de aula para
conseguir a adesão do co-enunciador.
This study is based on the postulates by the French line of the Theory of Disiscourse
and has as theme the examination of the scenography as well as the discourse ethos
in the process of revelation of the enunciator subject in Master Masaharu
Taniguchi's Article, published in Seicho-No-Ie’s Pomba Branca (White Dove)
magazine. Such theme proves to be relevant, since we aimed at understanding the
way how subjects interact in a discourse used for the propagation and maintenance
of institutional values and concepts. For this purpose, we elected as basis
Dominique’s Maingueneau approach on interdiscourse, enunciative scene and
discoursive ethos. The carried out investigation deals with a theoretical analytical
procedure in which we analyze the enunciative scene, in its tripartition in englobing
scene, generic and scenography as well as the form of unveiling of the discoursive
ethos. Our study emphasized the role of interdiscoursivity in the organization of
Seicho-No-Ie’s discourse, especially the crossing of the discoursive fields of
religiosity, pedagogical and scientific ones, among others, as well as the fact that the
image constructed by the enunciator subject is the one of a master who acts in the
scenery of a classroom with the target of achieving the adhesion of the co-
enunciator.
ANEXOS.................................................................................................................. 147
1
CONSIDERAÇÕES INICIAIS
Apesar de uma produção vasta, a SNI possui poucos estudos sobre seus
discursos, principalmente, sob o ponto de vista da Linguística. Um dos instrumentos
de divulgação de seus ensinamentos é a revista mensal Pomba Branca publicada
pela Associação Feminina Pomba Branca, que traz artigos que particularizam
aspectos da vida cotidiana, sob o ponto de vista filosófico e espiritual.
CAPÍTULO I
1
A doutrina surgiu, em um período de instabilidade econômica e social, no Japão. Ao longo dos anos 1930 a
1940, diante da política territorial expansionista instituída pelos seus Imperadores, o país buscou por matéria-
prima para o seu desenvolvimento industrial e por pontos geográficos no Pacífico, os quais eram considerados
importantes para a comercialização e para os negócios com os países do Ocidente. Dentro dessa política
expansionista territorial japonesa, esse país enfrenta a China e, em diversos momentos, a Indochina, a Malásia,
a Filipinas, a Birmânia e alguns outros pontos geográficos que possuem portos marítimos e comerciais na região
do Pacífico. Paralelamente, a esses fatos, o Japão já era reconhecido como um país importante na região da
Ásia e articulado com países da Europa, como Alemanha, Itália, Holanda, da América, como os EUA. No
entanto, essa política imperialista sofreu retaliações de países ocidentais, os quais praticaram o embargo de
exportações de matéria-prima ao Japão e, mais adiante, na Segunda Guerra Mundial, o bombardeio de seus
territórios.
2
Em uma tradução livre “Lar do Progredir Infinito”.
5
3
O papel e o ideograma são tradições chinesas milenares, nas quais o Japão se baseou, inicialmente, para
veicular seus contos e suas poesias. A educação japonesa, aberta a todas as classes, o que inclui o letramento,
data de meados de 1800. A imprensa periódica, como conhecida, atualmente, surgiu, aproximadamente, em
1860. Na década de 1930, o Japão possuía uma educação universal, com preceitos nacionalistas, cuja literatura
enfatizava os feitos dos Imperadores.
6
4
Ao longo de sua existência, no Japão, a SNI atingiu números expressivos de adeptos: até 1954, por exemplo,
teve 1.461.604 membros. In: <http://en.wikipedia.org/wiki/Statistics_for_major_new_religions_in_Japan>.
Acessado em 17 de janeiro de 2013.
7
André (2008, p.10) lembra que a instituição converteu-se numa das ‘novas
religiões japonesas’ mais populares no país, ao lado de alguns templos budistas. A
organização tem seu pleno estabelecimento, na década de 1970, com o crescimento
no número de adeptos e assinantes, acompanhado pelo aumento de núcleos locais.
Seu objetivo era alcançar um milhão de assinantes.
Conforme afirmam Mullins & Kisala 6 , é difícil saber com precisão quem é
“adepto" de uma nova religião japonesa, pois os padrões para se tornar um membro
ou para ser considerado um, diferem entre os movimentos. Dados estatísticos
mostram que a SNI tinha três milhões de adeptos, em 1985, e que, em 1989, tinha
80.000. Segundo os autores, essa discrepância nos números não foi devido à perda
massiva de adesão, mas a diferentes maneiras de calcular o número de membros.
Assistir a algumas palestras ou a rituais ou preencher um formulário para tal fim, por
exemplo, pode ser critério para uma pessoa ser considerada uma adepta.
651.119 são do Japão. Há, ainda, 22.995 preletores: 7.202, em outros países e
15.793 atuam no Japão.
Taniguchi comenta, em suas obras, que em sua busca pela paz interior e pela
compreensão de alguns de seus problemas, começou a meditar e, que após pedir a
Deus, que revelasse a Verdade, recebeu a seguinte revelação divina:
8
Doutor em Filosofia, Mestre em Educação, Professor de Química, membro da Ordem Maaat, membro dos
Iluminados de Kemet, membro da Ordem Rosacruz, Iniciado do Sétimo Grau do Faraó. In:
<http://svmmvmbonvm.org/aum_muh.html>. Acessado em 15 de novembro de 2012.
9
9
Taniguchi produziu os 40 volumes da coleção A Verdade da Vida (obra que possui a base do ensinamento da
SNI) e mais de 400 livros, escritos, segundo ele, sob ‘inspiração divina’.
10
A sua proposta é estabelecer o reino do céu na Terra, porém para que isso
aconteça, é preciso que todos se empenhem e progridam espiritualmente. Sobre o
estabelecimento do “paraíso”, neste mundo terreno, Taniguchi (2008, p.60) afirma
que:
Segundo o líder, pelo correto modo de viver, ou seja, pela correta filosofia, os
sofrimentos deixarão de existir e, por meio do método educacional da SNI, as
pessoas, desde a infância, viverão de acordo com a natureza divina delas e
manifestarão talentos que lhe são inatos. Para tanto, ele preconiza que é preciso
saber utilizar a mente, pois por meio da conscientização da ‘imagem verdadeira’
(filho de Deus) é que os problemas serão dissipados.
11
figura 1
O termo ‘novas religiões japonesas’ é definido por Arai (apud Paiva 2005,
p.210) como:
10
A distinção entre positivo (masculino) e negativo (feminino) é fundamentada no Taoismo, tradição filosófica e
religiosa originária da China, que enfatiza a vida em harmonia com o Tao. Para essa filosofia, o mundo é
composto pelos elementos opostos Yin e Yang que se complementam, que estão em infinito movimento e que
são equilibrados por Tao. Yang é considerado a força positiva do bem, da luz e da masculinidade, já o Yin é a
essência negativa do mal, da morte e da feminilidade. Os taoistas acreditam que esses elementos não podem
existir separados e que nenhum deles é mais importante ou melhor que o outro ( BLOFELD, 1995 & TSAI,1997).
14
Ainda sobre esse sincretismo religioso que permeia a instituição, Davis (1970,
p.55), ao escrever a biografia de Masaharu Taniguchi, diz que o fundador recorreu
às escrituras de todo o mundo para modelar uma filosofia praticável que possa ser
aceita pelas pessoas de todas as crenças religiosas.
Outro motivo que pode ter levado a adesão das pessoas à SNI, é a diluição
da ideia de pecado, que é considerado fruto do pensamento e uma ilusão. Segundo
os ensinamentos do líder, estudos no campo da psicanálise, afirmam que os
problemas enfrentados pelas pessoas são formas de autopunição, devido o ser
humano ter sedimentado no subconsciente tal ideia. As dificuldades são, para ele, o
resultado da projeção de uma punição (social ou do próprio eu) por alguma
atitude/ação apreendida, socialmente e/ou espiritualmente, como negativa pelo
indivíduo.
Sobre esses métodos de cura, Davis (1970) afirma que eles não têm
identificação com a hipnose, a sugestão, o magnetismo ou com outra forma de cura
mental ou magia. Para ele, a idéia central dessa filosofia é mostrar que somente o
despertar espiritual pode libertar as pessoas da limitação.
Diante desse aspecto, para Taniguchi (2010), existem duas verdades: a vertical
e a horizontal. Ele prega que a primeira é a existência infinita, apenas, de Deus e de
Sua criação e que, devido ao ser humano fazer parte dessa criação, ele é possuidor
da mesma natureza de seu Criador. Dessa convicção, veio a seguinte afirmação: ‘o
homem é filho de Deus’. O que não tiver a natureza divina trata-se de manifestação
da mente humana, não tendo, assim, existência eterna, mas temporária.
16
Sobre livros sagrados, vale lembrarmos sua frequente presença nas principais
religiões e que seus autores, geralmente, afirmam que receberam ‘revelações
divinas’ para produzí-los. Esses escritores são considerados, muitas vezes, pelos
adeptos, pessoas iluminadas, profetas que se comunicam com Deus, com anjos,
com deuses, entre outros. Para exemplificarmos, citamos os livros sagrados das
principais religiões: a Bíblia, no Cristianismo; o Alcorão, no Islamismo; a Torá e a
Bíblia, no Judaísmo; a codificação de Allan Kardec, no Kardecismo.
Merece, também, destaque, por ser muito divulgada, a Oração para a Cura
Divina, mais conhecida como Forma Humana. Trata-se de um formulário de pedido
de orações, em duas vias. A primeira fica na sede central e a segunda, com o
interessado. Nele, há uma relação de quinze ‘desejos’ para que o solicitante opte por
aquele(s) que atende a seus anseios, como por exemplo: manifestar a imagem
verdadeira (manifestar o Deus interior), ter saúde, alcançar a prosperidade, ter
harmonia entre outros. Feita a(s) escolha(s), ele é quem decide o tempo de duração
da oração: um mês, três meses, seis meses ou um ano. Em horários determinados,
as orações são feitas seis vezes por dia, sendo, a última, realizada pelo presidente
doutrinário da América Latina.
18
11
Informações obtidas nos sites: <http://www.livrariasaraiva.com.br/pesquisaweb/pesquisaweb.dll/pesquisa?ID>,
da livraria Saraiva e http://www.livrariacultura.com.br/Produto/Busca?Buscar=masaharu%20taniguchi> da livraria
Cultura. Acessados em 19 de janeiro de 2013.
19
Diante desse cenário, para reiterar o compromisso dos adeptos com a instituição
e reforçar sua ideologia, Taniguchi (1995, p.39) elaborou, ainda, as oito normas
fundamentais dos praticantes que são lidas, em voz alta, nas reuniões:
20
Ele lembra, ainda, que essa ‘nova religião japonesa’ não possuía um objeto
especial de culto e que, somente depois de muito tempo, adotou como objeto de
culto e veneração pública um símbolo sagrado: a palavra Jissô. Essa palavra está
inscrita em um quadro (explicitado pela figura 2) afixado no alto da parede central do
salão, onde ocorrem as palestras, de maneira bem visível, com o intuito de fazer os
adeptos recordarem a presença de Deus. Ao entrarem no local, eles fazem um sinal
de reverência diante do Jissô, fazem preces e participam das cerimônias.
21
Figura 2
12
A revista pode ter chegado com outros imigrantes japoneses e ter se disseminado no Brasil, timidamente, já
que Kobe, a cidade das primeiras manifestações dessa doutrina, possui o maior porto do Japão e é o local de
onde partiu o primeiro navio de imigrantes japoneses em 1908, assim, como os demais até os idos de 1941. A
imigração de japoneses, para o Brasil, tem como marco oficial 18 de junho de 1908, quando o navio Kasato-maru
aportou em Santos. No período de 33 anos, até 1941, cerca de 1.500 japoneses chegaram ao Brasil com o
propósito de enriquecerem, rapidamente, para assim regressarem à terra natal. Cabe ressaltar, que esses
imigrantes japoneses partiram de um Japão, cujo cenário político-religioso caracterizava-se pelo retorno do poder
imperial, com o término do regime feudal e pela proclamação do Xintoísmo como religião do Estado e da Nação,
pelo imperador Meiji, dessa forma, o budismo deixou de ter liberdade de ação sobre a sociedade. Nesse período,
que compreende de 1904 a 1941, Osaki (1999) diz que os santuários e as celebrações de cultos eram de total
responsabilidade do governo, o cristianismo era perseguido e a crise econômica se lastreava, por conta de
embargos e gastos com guerras.
22
após a leitura do livro A Verdade da Vida (Seimei no Jissô), disse ter sido curado de
disenteria amebiana. Ele e o irmão Miyoshi Matsuda entraram em contato com a
SNI, do Japão, para obterem uma assinatura da revista. A partir de então, eles
começaram a tratar das doenças de seus vizinhos e a disseminarem o movimento,
atraindo japoneses da região.
Vale ressaltar que a primeira revista foi editada no Japão, em 1930, portanto a
distância temporal entre o produzido e o publicado é pequena, de dois anos, o que
nos faz pensar sobre uma concomitância de tempos entre o Brasil e o Japão, quanto
à difusão dos ensinamentos de Taniguchi, pela SNI, nesses países.
13
Os dois municípios de Gália e Duartina, respectivamente, tornaram-se unidades administrativas, em 1928 e
1930, eles juntos somam 10.000 habitantes. O reconhecimento público, dessas cidades, coincide com a ida de
imigrantes japoneses para a região que, apesar de serem poucos, trabalhavam na produção de seda e no
desenvolvimento da agricultura nessas cidades.
14
Em relação ao Brasil, a SNI surge, em 1932, durante o governo de Getúlio Vargas. Dentre as diversas
características do Estado brasileiro, salientamos aquelas que coibiram as práticas da difusão da doutrina
japonesa, com a perseguição ao comunismo, no Brasil, principalmente, no campo, onde a política era
latifundiária. Com a Segunda Guerra Mundial, os adeptos, ainda, enfrentavam dificuldades na chegada de novas
revistas da SNI.
23
De acordo com Davis (1990), essa divisão provocou vários conflitos, com
vítimas fatais, porém, com o término dessa situação, a maioria dos imigrantes
preferiu permanecer no Brasil a voltar para o Japão e sofrer as consequências da
Guerra. Esse, portanto, foi o momento ideal para as ‘novas religiões’ agirem em
favor desses estrangeiros.
14
No primeiro momento, século VII, houve a introdução e domínio do Budismo, no país, que resultou na fusão
xintô-budismo. O poder era militar e a figura do imperador não se destacava, trata-se do regime feudal que teve
a duração de seis séculos. No segundo momento, de 1908 a 1941, houve o retorno do poder imperial com o
término do regime feudal e a proclamação do Xintoísmo, como religião do Estado e da Nação pelo imperador
Meiji e, assim, o Budismo deixou de ter liberdade de ação sobre a sociedade. Nessa época, os santuários e as
celebrações de cultos eram de total responsabilidade do governo e o cristianismo era perseguido. No terceiro
momento, o Xintoísmo deixou de ser a religião oficial, ocorrendo o ressurgimento das religiões, que eram
oprimidas pelo governo imperial. O Cristianismo teve seu espaço conquistado e o Budismo pôde reabrir seus
templos. Nesse cenário, da reforma Meiji, houve o surgimento de várias novas religiões japonesas – dito,
anteriormente, sobre a oficialização de outras denominações, como a própria Seicho-No-Ie.
24
16
Teosofia se constitui na sabedoria presente nas grandes religiões, filosofias e nas principais ciências da
humanidade. Pode ser encontrada, em maior ou menor grau, na origem dos variados sistemas de crenças ao
longo da história (BLAVATSKY, 2004).
25
A partir daí, André (2008, p. 7) ressalta que esse aspecto se diferencia do que
acontecera, na primeira metade do século XX, quando o Estado Novo de Getúlio
Vargas empreendeu uma política repressiva em relação aos imigrantes japoneses,
considerados súditos do eixo comunista.
Diante disso, para resolver esse problema, foi decidido que, para ultrapassar
essa barreira, seria necessário adaptar os textos religiosos para o contexto dos
brasileiros sem ascendência japonesa. Para Waragai (2008), assim como os
jesuítas, esses missionários, para atingirem seus objetivos, tiveram que abrir
concessões como, por exemplo, criar ou suprimir ritos para atender às necessidades
dos adeptos.
Diante dessa realidade, Paiva (op.cit., p.212) comenta que não foi encontrada
nessa ‘nova religião’ a xenofilia, que disporia os convertidos a aceitarem,
positivamente, ‘coisas do Japão’, não foi encontrada nenhuma predisposição
particular favorável à cultura japonesa.
Por conseguinte, Clarke (op.cit., p.25) defende que, muito mais que ‘misturar’,
as religiões descobrem similaridades subjacentes muito significativas, que tornam,
assim, as diferenças irrelevantes ou que mantêm o compartilhamento de rituais
como algo separado da aceitação intelectual que diz respeito à doutrina, não
ocorrendo, nos adeptos, nenhuma mistura em nível intelectual, em suas mentes,
pois eles sabem quando alguma prática não tem a ver com a sua doutrina.
À vista disso, Verger (apud Clarke, 2008, p.35), ao discorrer sobre esse
envolvimento, considera-o mais como um processo de “justaposição” do que como
sincretismo e cita, para exemplificar, os praticantes do Candomblé, religião afro-
brasileiras, pertencentes, por exemplo, das tradições católicas, que se esforçam em
não misturar o que consideram católico com o que consideram ser de origem
africana, por terem consciência das diferenças entre o catolicismo e sua religião.
A SNI, da mesma forma que muitas novas religiões japonesas, não quer que
o movimento se descreva como uma religião, sob o argumento de o termo religião
ter sido, conforme Clarke (op.cit., p.42), corrompido pelo uso que dele fizeram os
sucessivos governos, desde os tempos de Meiji (1868-1912) até o fim da II Guerra
Mundial. Para o estudioso, isso torna a identidade da SNI no Brasil ambígua,
permitindo, assim, uma maior flexibilidade no que diz respeito ao recrutamento e
filiação. Pessoas de outras religiões sentem-se à vontade ao ouvir ou praticar o que
é ensinado, no entanto, ele afirma que, seguramente, a ambiguidade pode, também,
afugentar aqueles que estão buscando, logo de início, uma identidade religiosa,
claramente, definida.
17
Segundo o Novo Mapa das Religiões (2011), análises feitas pela FGV em 2011. In:
<http://www.cps.fgv.br/cps/bd/rel3/REN_texto_FGV_CPS_Neri.pdf >. Acessado em 20 de janeiro de 2013.
18
IBGE / Censo 2000 e 2010. In:
<http://www.ibge.gov.br/estadosat/temas.php?sigla=sp&tema=censodemog2010_relig>. Acessado em 20 de
janeiro de 2013.
19
Dados do censo 2000, pela primeira vez, mostraram a presença de cerca de 151 mil brasileiros que se
autodeclararam fiéis de seis “novas religiões japonesas”: da Igreja Messiânica, 109.310 pessoas; da Seicho-No-
Ie, 27.784; da Perfect Liberty, 5.465, da Tenrikyo, 3.785 da Mahicari, 3.054 e da Hare Krishna. A pesquisa do
IBGE revelou, também, que as mulheres lideram a adesão a essas novas religiões: para cada 100 adeptas, há,
apenas, 64 homens” (O ESTADO DE S. PAULO, 2003). Já, o último censo, realizado em 2010, pelo IBGE,
revelou que há cerca de 311 mil adeptos nas ‘novas religiões japonesas’: 184 mil mulheres e 127 mil homens e,
na pesquisa organizada por cor ou raça, segundo os grupos de religião, os dados mostraram que há 171 mil
brancos e 44 mil amarelos. Não foram citadas as igrejas do censo anterior, com exceção da Igreja Messiânica
(incluída nesses números), pois as estatísticas, ainda, não foram liberadas pelo IBGE.
31
Figura 3
20
Informação obtida no site da Seicho-No-Ie: <http://www.sni.org.br/materia-bolsa-de-estudos.asp>. Acessado
em 02 de fevereiro de 2012.
32
Diante desse contexto, Castilho (2006) diz que a SNI, ao se expandir no Brasil
e ao se aproximar da sociedade brasileira, não tem, somente, dado destaque às
características da cultura nipônica, mas, concomitantemente, tem mantido os
princípios da doutrina preconizados pelo fundador. Ademais, essa aproximação
proporciona o contato com os mais variados temas, como alimentação,
comportamento, educação, saúde, meio ambiente, política, entre outros.
Por não ser considerada uma religião sectária, essa religiosidade é legítima e
atraente para sua atuação. Essa estratégia está relacionada às relações de poder, já
que seus representantes se tornam livres para criarem meios que a legitima.
Ademais, ao serem utilizados temas que fazem parte do universo religioso, são
definidos os modos de produção de sentido de seu discurso.
33
Tendo como característica, essa aceitação religiosa, são comuns, nas obras,
em palestras e em cerimônias referências à Kojiki (mitologia japonesa), à Bíblia, às
escrituras budistas, aos ensinamentos e as práticas de seitas japonesas como Shin,
Zen, Shingon. Conforme Taniguchi (2008, p. 21), devido a esse “acolhimento”, não
se deve falar mal delas, pois a SNI se funde com a essência de todas as religiões.
No prefácio dessa obra, o autor afirma que o Evangelho segundo João deve
ser lido dezenas e centenas vezes, para que se compreenda os ensinamentos e a
personalidade espiritual de Cristo. Além disso, ele comenta que apesar de não
pertencer a nenhuma igreja cristã, ele leu a bíblia, sob inspiração divina, e
apreendeu sobre a Vida de Cristo, e complementa, afirmando que as pessoas que
pertencem às igrejas tradicionais, talvez, não estejam conseguindo apreender a Vida
de Jesus.
Assim sendo, para o autor (op.cit., p. 239), por exemplo, é uma blasfêmia
dizer que o homem, um impuro filho do pecado, seja filho de Deus. Ele faz referência
ao ensinamento cristão, que se baseia no antigo testamento (Gênesis 3:23), que
afirma que o homem passou a ter o pecado original desde a expulsão de Adão e de
Eva do paraíso. Ele afirma que o homem não é descendente de Adão e Eva, que
desobedeceram às ordens de Deus para não comerem o fruto proibido e postula que
o homem não é pecador, pois nasceu de Deus e é filho de Deus e que, portanto,
nesse ensinamento cristão, a relação homem/Deus está comprometida, devido a
ambos estarem separados.
Taniguchi (2007, p. 155) comenta que devido a essa ideia de pecado original
a humanidade passou considerar o ser humano “pó da terra” - um mero corpo
material - e a considerar o mundo um aglomerado de elementos materiais, sendo
essa crença, a origem do sofrimento das pessoas.
Além disso, as orientações espirituais e a relação com Deus não são tratadas
de forma autoritária (Deus manda), pois o homem é ensinado a não ser ver como
um ser inferior ao Criador, mas como alguém que consegue interagir com Deus de
maneira livre, sem as ‘ameaças’ concretizadas pela figura do inferno, de castigo, de
punição, caso a doutrina não seja obedecida.
21
Relato extraído da revista Pomba Branca (2004, p.38), edição especial, da comemoração do Jubileu de Ouro
da Associação Pomba Branca (1954-2004).
38
22
Informação obtida no site <http://www.sni.org.br/pomba_branca/>. Acessado em 11 de novembro de 2012.
23
Capa da revista Pomba Branca, em japonês, de fevereiro 2013. Extraída do site
<http://www.ssfk.or.jp/gekkansi/backnom/b/sirohato.htm>l. Acessado em 10 de fevereiro de 2013.
39
Ele, nesse primeiro artigo, orienta as leitoras sobre como deixarem seus
maridos satisfeitos em seus lares, afirmando que o segredo de um lar feliz está na
expressão sorridente que a mulher mostra quando fala com o marido e com os
demais membros da família e que um lar é infeliz quando a mulher, em vez de se
mostrar satisfeita com o marido e os filhos, fica reclamando deles o tempo todo.
24
Destacamos, também, que o fundador escreveu centenas de textos para o público feminino e, muitos deles,
estão reunidos, hoje, em obras que contém coletâneas de seus artigos. Entre eles, destacamos as obras A
Razão de ser da Mulher, volumes 1 e 2, que contêm artigos que abordam questões diversas, referente à vida
cotidiana, como divórcio, maternidade, sexo, trabalho, traição, entre outros; A felicidade da mulher, volumes 1 e
2, neles há 365 itens, destinado à cada dia do ano, que abordam, do ponto de vista espiritual, a postura mental
para a mulher ser feliz.
40
25
A Constituição, de 1947, e o Código Civil, de 1948, favorecem a instituição de igualdade entre homens e
mulheres. Em 1985, a título de exemplo, tem-se a primeira lei que prega a igualdade no trabalho entre homens e
mulheres, em 1999, houve revisão dessa mesma lei, ampliando os artigos para outros aspectos da sociedade.
41
Todavia, ele adverte que tal mudança não deve ser apenas de reação ao
sistema machista do passado, já que em toda mobilização reacionária, sempre se
acaba cometendo excessos (TANIGUCHI, 2010, p. 7). Assim, no que se refere ao
movimento feminista, ainda, no prefácio, de 1966, do livro A Razão de ser da
Mulher, volume 2, ele, ao continuar sua análise, afirma que:
Ele postula, também, que ela se tornou um ser humano deformado que não é
homem nem mulher, quando decidiu reagir ao sexo masculino e, para que não
existam essa deformação e a desigualdade feminina ou masculina, é preciso que
haja a união das características de ambos os gêneros e não o domínio de uma
sobre a outra. Para ele, devido a essa confusão de papéis, as pessoas não têm
discernimento sobre o modo correto de viver nem sobre a correta razão de ser das
mulheres.
Diante desse contexto, para ensinar sobre esse modo correto de viver e de
ser, Taniguchi recorre à mitologia japonesa (2008b, pp. 18-19), segundo a qual da
união do deus Izanagi com a deusa Izanani, nasceram as oito ilhas que compõem o
Japão e os mais de trinta deuses que nelas habitam, como dos ventos, dos rios, das
montanhas etc. Ele explica, também, que o mundo é formado pela união do polo
negativo com o positivo, respectivamente, identificados como natureza Izanani
(feminino) e natureza Izanagi (masculino). Dessa união, sobressai a natureza
42
feminina, tal qual ela é, pacífica e com o dom superior no amor; e a masculina,
conquistadora e com o dom superior na sabedoria.
Dessa forma, é preciso tirar a influência negativa dessas idéias que subjugam
a mulher para que ela possa evoluir ainda mais, logo orienta as senhoras membros
da Associação Pomba Branca que expulsem do subconsciente da humanidade o
velho mito de que a mulher é fraca e inferior (TANIGUCHI, 2011, p.28).
Por ter esse enfoque, a instituição possui associações que são responsáveis
por essas publicações. No caso da revista de onde extraímos o nosso corpus, a
Associação Pomba Branca é o departamento responsável por sua edição e que atua
no Brasil, desde 1954, oferecendo atividades e divulgando os ensinamentos ao
público feminino com mais de 35 anos. Inicialmente, os assuntos abordados, nos
exemplares, estavam relacionados ao desempenho da mulher no lar como esposa e
como mãe. Nos dia de hoje, temas como atuação no mercado trabalho, ganham
destaque. Há ainda, nessa associação, os departamentos da Sabedoria, dirigido
para mulheres, na 3ª idade, das Mães e o departamento Infantil.
26
NRJ – abreviatura de Novas Religiões Japonesas.
44
extraído de uma das obras de Taniguchi, que pode ser utilizado como mentalização
e/ou oração. Na contracapa, são divulgados os eventos dos meses seguintes.
Há, no rodapé, das páginas ímpares, situadas do lado direito, frases para
reflexão que são extraídas das obras do fundador. Além disso, no espaço
publicitário, são divulgadas as programações da SNI existentes nas emissoras de
rádio, de televisão e do site e, ainda, são vendidos alguns livros e assinaturas das
revistas Fonte de Luz, Pomba Branca e Mundo Ideal, além do Jornal Querubim.
Isto posto, contata-se que a SNI comercializa, nas livrarias da sede e dos
núcleos, obras cujo conteúdo visa ensinar, na prática, o correto modo de viver, que
conforme Taniguchi prega seria viver como um ser espiritual, como um filho de
Deus, isento de doença, de pecado e da morte. No site da SNI, no link, intitulado
mulher, são divulgadas a assinatura Revista Pomba Branca e diversas obras do
fundador e de alguns preletores.
CAPÍTULO II
FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
Assim, segundo Mussalim (2003), nessa época, ocorria a relação entre três
domínios disciplinares: a linguística, o marxismo e a psicanálise. Nesse contexto, o
lexicólogo e linguista Jean Dubois e o filósofo Michel Pêcheux, apesar de serem
49
Diante desse aspecto, Mussalim (2003) e Brandão (2004) explicam que a AD,
inicialmente, procura entender o momento político no qual surgiu, ao analisar os
discursos produzidos. Além de estudos puramente linguísticos, ou melhor, além de
50
Assim, Cano (2012) lembra que esses conhecimentos não estão justapostos,
somente, pois eles se entrelaçam e dão espaço para uma nova análise. No entanto,
eles são submetidos às restrições da AD, da mesma forma que a Linguística, e
deverão atender aos seus objetivos para tratar de seu objeto: o interdiscurso. Para
ele, de maneira geral, a AD objetiva examinar os lugares sociais dos
52
30
Serão usados os termos: co-enunciador para se referir ao destinatário do discurso e coenunciador para
designar tanto enunciador como co-enunciador como corresponsáveis pela cena de enunciação.
53
Dessa forma, Fernandes (2008, p.13) afirma que as escolhas lexicais e seu
uso revelam a presença de ideologias que se opõem e, além disso, revelam a
presença de discursos diferentes, que expressam o posicionamento de grupos de
sujeitos sobre um mesmo tema. Tais escolhas, inseridas em discursos específicos,
ultrapassam os significados prescritos nos manuais, pois para os sujeitos os
sentidos decorrem de sua ideologia, da maneira pela qual eles compreendem a
realidade política e social da qual fazem parte. Então, para a constituição do sentido,
que é integrante do discurso, a linguagem não deve ser vista como um suporte para
transmitir informações.
Acerca do discurso visto como uma ação social do sujeito, Orlandi (2010,
p.16) observa que ele (o discurso) é um objeto sócio-histórico em que o linguístico
intervém como pressuposto, por conseguinte, estudá-lo, na perspectiva da AD,
implica pensar o sentido, saber como um texto, como uma música, por exemplo,
produzem efeitos sentidos. Para ela, é preciso ver como eles estão investidos de
significância para e por sujeitos e não, somente, analisar o significado de palavras,
já que implica interpretar os sujeitos em ação, produzindo sentido em suas
atividades sociais.
Esses sentidos são produzidos devido aos sujeitos ocuparem lugares sociais
diferentes e, por isso, uma palavra ou uma figura, por exemplo, pode ter sentidos
diferentes em conformidade com o local ocupado por aqueles que a usam.
Assim, o discurso, utilizado pelo sujeito, revela o seu lugar social e transmite
outros discursos que fazem parte de uma realidade histórica e social. Dessa forma,
para compreendermos o sujeito discursivo, é preciso entender quais são os
discursos utilizados para sabermos sua inscrição socioideológica.
Logo, quando o sujeito faz uma escolha lexical, ele integra um conjunto de
sujeitos cuja natureza ideológica revela seu posicionamento. Esses sujeitos se
opõem a um outro conjunto de sujeitos dispersos, no âmbito social, contrários ao
seu posicionamento, estes, por conseguinte, utilizarão outra palavra para mostrar
sua posição. Notamos, assim, que o sujeito discursivo é heterogêneo.
Desse modo, Maingueneau (2011, pp. 53-55) e Charaudeau (2008, pp. 170-
172), ao discutirem essa noção de discurso, enumeram oito características
essenciais. A primeira, é que o discurso supõe uma organização que se situa além
da frase, pois ele mobiliza estruturas de outra ordem, não se manifestando somente
por sequências de palavras de dimensões superiores à frase. Os discursos,
enquanto unidades transfrásticas, submetem-se a regras de organização, vigentes
em um grupo social determinado: regras para produção de uma narrativa, de um
diálogo etc.
31
Enunciação, aqui, é tratada como posição ideológica no ato de enunciar e que integra a enunciação, lugar
sócio-histórico-ideológico de onde os sujeitos dizem e marcam o momento e ato de dizer (ORLANDI, 2010, p.
20). Enunciação, na concepção discursiva, é um acontecimento, em um tipo de contexto, apreendido na
multiplicidade de suas dimensões sociais e psicológicas (CHARAUDEAU & MAINGUENEAU, 2008, p. 193).
58
Para a AD, o falante se inscreve em lugares sociais nos quais alcança sua
identidade e as escolhas de suas palavras revelam seu lugar e seus
posicionamentos (formações discursivas) em que coexistem diversos
posicionamentos, aparecendo, assim, o interdiscurso. Por estar relacionado à
memória, esse espaço de trocas permite que o que já foi dito tenha sentido em suas
palavras, pois o sujeito não é a fonte de seu dizer e o discurso, somente, adquire
sentido, ao se relacionar com outros discursos em uma relação de
confronto/embate/polêmica. Daí ser impossível definir exterioridade entre o sujeito e
seu discurso.
Nesse sentido, Maingueneau explica, ainda, sobre essa interação, que cada
discurso:
em outra dimensão que ultrapassa o som, a sintaxe, o texto escrito, não sendo,
dessa forma, apreendido, concreto, palpável.
representa um conjunto finito e, por isso, serve para definir o horizonte, a partir do
qual serão construídos domínios possíveis de serem estudados, os campos
discursivos (MAINGUENEAU 2008, p. 33).
Desse modo, Bakhtin (op.cit., p. 272) postula, ainda, que os gêneros são elo
da cadeia muito complexa de outros enunciados, evidenciando o caráter dialógico de
seus estudos. Para o autor, o dito já-aqui possui partes do dito antes, ou seja, partes
de outros enunciados usados para a interação humana e implica uma resposta do
outro, assim como ocorre no diálogo. Essa dialogia liga o enunciado a outros elos,
na corrente complexa da comunicação/interação, sendo, a historicidade, a marca
constitutiva do enunciado concreto.
Apesar dessa noção de gênero ter vindo dos antigos poetas e retóricos
gregos e ser bastante recente, por influência de Bakhtin, tem sido usada para
descrever uma multiplicidade de enunciados produzidos na sociedade, conforme
comenta Maingueneau (op.cit. p.152). Assim, como a sociedade está em constante
mudança, os gêneros de discursos, por seu caráter historicamente variável, diferem-
se, desse modo, das tipologias comunicacionais. O estudioso explica que:
• uma finalidade: todo gênero é produzido com uma finalidade que é definida,
ao se responder à indagação implícita: “estamos aqui para dizer ou fazer o
quê?”. Identificá-la é importante para que o destinatário tenha um
comportamento adequado perante a uma prática social (gênero de discurso);
O linguista francófono afirma que essa divisão dos gêneros em três regimes
pode ser utilizada para fins didáticos, no entanto, não está correta dos pontos de
vista terminológico e empírico, por isso ele modifica essa tripartição e propõe dois
regimes genéricos, submetidos a regras distintas: gênero conversacional e gênero
instituído, este no lugar dos gêneros autorais e dos gêneros rotineiros. Para ele,
esses regimes podem estar juntos em um mesmo ato de fala.
70
O estudioso lembra, ainda, que muitos desses gêneros possuem outro tipo de
cena, que depende das escolhas de quem os produz: a cenografia. Para ele, a cena
genérica é parte de um contexto, trata-se da cena o que gênero indica, e a
cenografia é produzida no texto, no entanto, nem todos os textos a possuem. A lista
telefônica, por exemplo, obedece às regras de sua cena genérica, por outro lado, a
publicidade escolhe as cenografias conforme as estratégias do marketing. O
estudioso, ao levar em conta a variedade de gêneros instituídos, distingue vários
graus:
- gêneros de primeiro grau são aqueles que não variam: certidões de nascimento,
listas telefônicas, entre outros;
- gêneros de quinto grau não seguem formatos preestabelecidos, pois isso depende
da maneira pelo qual o autor coloca sua identidade em jogo. Um autor religioso pode
chamar seu texto de meditação, por exemplo.
Dessa forma, a proposta feita por Maingueneau, para que partamos para esse
“regime de genericidade” em duas categorias, tem como propósito a possibilidade de
distinguir regimes de produção textual, no contexto da interdiscursividade, pois
assim saberemos que a escolha de um gênero e não de outro, nas atividades
discursivas, não é aleatória, mas, com objetivos específicos. Para Maingueneau
(2008), todo gênero modifica a situação da qual participa e, para ele, o co-
enunciador tem seu comportamento influenciado pela finalidade do gênero
produzido.
Então, escolher uma categoria genérica é muito mais que escolher uma
estrutura textual, pois é impossível elaborar um gênero de interação a cada situação
da qual fazemos parte, para tanto buscamos a estabilidade de alguns gêneros, pois
eles podem tornar a interlocução mais eficaz.
- do livro Lições para o cotidiano, foi extraído O pecado não existe. A obra data de
1954, foi escrita em Tókio, teve sua primeira edição em português, em 1979, sua 11ª
edição foi revisada em 1996, estando, hoje, na 16ª impressão. Esse texto foi inserido
na revista Pomba Branca de março de 2012.
- do livro Comande sua vida com o poder da mente, foi extraído O pensamento
iluminador e as ciências naturais. A obra foi escrita em 1948, editada em 1988, sua
72
1ª edição, em português, foi em 1998 e está, hoje, na 16ª impressão. O texto foi
posto na revista Pomba Branca de março 2013.
Apesar de não serem artigos, de não serem produzidos para o suporte revista
Pomba Branca, de não serem escritos para as mulheres do século XXI e não
pertencerem ao momento histórico, político e social em que foram publicados os
exemplares, eles são inseridos nas publicações, em uma ‘moldura’, em uma
estrutura de artigo de revista e recebidos como tal.
Trata-se, assim, de uma publicação para mulheres, que difere de outras para
esse público, já que seu objetivo é divulgar os ensinamentos e as práticas da
instituição. Dessa forma, ela não possui o mesmo posicionamento de outros
exemplares femininos que circulam na sociedade.
Nesse sentido, Rodrigues (apud Cano, 2012, p. 126) lembra que existem
pesquisas que mostram que os gêneros que circulam na mídia são denominados de
artigo, sem o serem. Sobre isso, ele comenta que, por várias vezes o termo artigo é
usado para designar qualquer material que aparece nos jornais ou revistas, não
estando, nesses casos, vinculado à concepção de gênero.
Assim, sobre o papel dos leitores, Maingueneau (2008a, p.174) diz que os
destinatários podem significar muitas coisas: o público real (as pessoas que leem o
texto), o público genérico (o público para quem o texto é destinado), o leitor modelo
(o tipo de leitor que pode ser inferido das propriedades do texto), o leitor invocado
aquele, explicitamente, especificado pelo texto. Para ele, o modo como o gênero
circula evidencia o público.
Dessa forma, o autor afirma que os vários gêneros existentes são feitos para
serem lidos por dois públicos: um de primeiro grau, que lê significados literais e outro
de segundo grau, que é capaz de extrair proposições implícitas de um texto, que
para pessoas comuns, pode parecer unívoco. É o público especialista que
compartilha do mesmo código que os produtores dos textos e, também, podem fazer
interpretações, para, posteriormente, transmiti-las para o público de primeiro grau.
Diante disso, Reis (2009, p. 52) comenta que devido aos gêneros se
apresentarem como tipos relativamente estáveis de enunciados, é esse
‘relativamente’ que garante seu caráter de indefinição. Para ela, é preciso levar em
conta o fato de o gênero não ser algo “engessado” em uma forma pré-estabelecida,
daí a importância da situação comunicativa para a sua configuração.
76
32
Consideramos o artigo um texto argumentativo, porém mantivemos a tipologia apresentada pela autora.
33
Sobre ‘olho’, Lage (2001, p.53) afirma que algumas vezes, em matérias muito longas de revistas ou
suplementos, destacam-se frases do texto como elemento gráfico inserido no meio da composição, em corpo
maior. O objetivo, aí, é duplamente estético e de motivação da leitura.
77
do texto (estatuto de parceiros), o tempo e o espaço. É por ela que olhamos a cena
de enunciação e, por isso, deve oferecer condições para que o co-enunciador
identifique o tipo de discurso produzido, porém, essa cena sozinha, não é suficiente
para garantir as especificações das atividades discursivas (verbais) em que os
sujeitos estão envolvidos. Devido a todo discurso ser enunciado, pelo gênero do
discurso, essa cena não oferece mais elementos para a análise. Será a cena
genérica que revelará outros elementos.
Esses dois tipos de cenas são chamados por Maingueneau (op.cit., p. 87) de
quadro cênico do texto. Nele é definido o espaço estável no interior do qual o
enunciado adquire sentido – espaço do tipo e do gênero do discurso. Todavia, o
leitor não se depara com ele, diretamente, mas com a cenografia, ou seja, com uma
espécie de “cilada” que desloca o quadro cênico para um segundo plano.
Nesse sentido, Cano (2012, p.74) afirma que a cenografia trata-se de uma
estratégia que se utiliza de uma série de recursos linguístico-discursivos de
envolvimento do co-enunciador. Por isso, julgamos ser relevante identificar os
indícios textuais, no discurso na seção Artigo do Mestre Masaharu Taniguchi, que
constroem a cenografia pedagógica, pois se trata de uma estratégia escolhida pelo
enunciador que pretende conseguir a adesão do co-enunciador.
81
Além disso, notamos, nesse discurso, que há uma interação na cena (que a
leitura propiciou) que constrói uma imagem para a SNI e para Masaharu Taniguchi,
criando, assim, uma instância de enunciador. O co-enunciador interage com essa
imagem, corporifica-a e a incorpora, em outras palavras, ele entra em contato, na
cenografia, com o ethos discursivo que será abordado a seguir.
Por isso, Eggs (op.cit., p. 40) comenta, também, que Aristóteles inovou ao
incluir essa noção como uma possibilidade persuasiva, ao postular que o ethos
constitui praticamente a mais importante das provas. Para o retórico, o discurso é
82
construído com base na trilogia comunicativa: logos, pathos e ethos. O logos refere-
se à linguagem, ao discurso; o pathos diz respeito ao convencimento do ouvinte e o
ethos refere-se ao aspecto moral ou ético que o orador deixa ‘transparecer’ pelo
discurso.
A partir desse quadro, Eggs (op.cit., p. 31) explica, também, que, nessa
perspectiva, o lugar que engendra o ethos é, portanto, o discurso, o logos do orador,
e esse lugar se mostra apenas mediante às escolhas feitas por ele e as formas de
se expressar resultam de escolhas entre as inúmeras possibilidades linguísticas e
estilísticas. Segundo o autor, ainda, para Maingueneau, essas escolhas referem-se
às maneiras do orador se exprimir, ou seja, o ethos é mostrado e não dito,
explicitamente.
prévio, sendo esse entendido como imagem construída antes do enunciador tomar a
palavra.
Para ele, todo texto escrito possui, mesmo quando o nega, uma vocalidade
que pode ser relacionada a um ‘fiador’, uma instância subjetiva (não se trata do
locutor extradiscursivo) que, por meio de seu tom, atesta o que é dito. O tom serve
para o oral e o escrito, sendo responsável por fazer o co-enunciador construir uma
representação do corpo do enunciador, ou seja, por fazer emergir essa instância que
afiança o que diz.
CAPÍTULO III
Diante desse quadro, a seleção dos artigos foi realizada com o intuito de
apresentarmos um recorte significativo do discurso elaborado na SNI, visto que a
coluna se marca como um gênero de discurso que atende a funções específicas da
doutrina quer sejam as de ordem pedagógica, simbólica, reparadora ou
mobilizadora, para dar conta de seus objetivos institucionais.
87
Passaram-se vários anos. Ele já era adulto, quando, uma tarde, tomou um
bonde. O sol da tarde refletiu-se na cruz de uma igreja e brilhou ofuscante. A
intensa luz vinda dessa cruz penetrou nos olhos do moço, que então se lembrou
de que, quando criança, havia danificado com uma pedra a imagem de Cristo.
Ele não se lembrou com nitidez. A recordação não veio claramente à tona do seu
consciente, mas a ideia “eu sou pecador”, que estava oculta no subconsciente,
foi despertada pela luz vinda da cruz. E, devido à consciência de que o pecador
deve ser punido, ele ficou cego no primeiro instante em que o raio de luz ofuscou
seus olhos.
Deus, que é amor, jamais iria castigar um homem e torná-lo cego só porque
uma pedra acertou casualmente a estátua de Cristo quando ele, na infância,
simplesmente, brincava de jogar pedras. O fato de ele ter ficado cego não se
deve a uma punição de Deus; deve-se à sua própria convicção de pecador e à
sua ideia de punição segundo a qual o pecador deve pagar os seus pecados
através de sofrimento e infelicidades. Se fosse eliminada da sua mente a
convicção de pecador, os seus olhos seriam curados. Muitas pessoas sofrem de
doenças e outras formas de infelicidade para punirem a si próprias.
Terá dificuldades para conseguir emprego, e não lhe restará outra alternativa
senão a voltar à prática do crime.
porque você é muito obediente. Portanto, basta você trocar de professor, você só
terá que ser bom, pois é muito obediente.
Assim ele despertou. Quando percebeu que não era pecador e que possuía
boas qualidades dentro de si, começou a manifestar a natureza divina que habita
o interior do ser humano, regenerou-se e tornou-se uma pessoa exemplar.
Que é espírito?
O Espírito é um e é onipresente
Espírito é amor
O Espírito é sabedoria
O Espírito está dentro de nós, constituindo a sagrada força vital, e nos guia
em todas as circunstâncias. Ele é nosso pastor, e quando buscamos sua
orientação, nos conduz a verdes pastos e a águas tranquilas. Recebendo do
Espírito a sabedoria, podemos descobrir novas e maravilhosas leis do mundo
natural, bem como ter idéias para novos inventos e, assim, desfrutar da mais
ampla vida.
O Espírito é, portanto, Vida que nos vivifica, amor que nos consola, sabedoria
que nos orienta. O imenso amor do Universo, manifestando-se em nós através da
estrutura cósmica, pulsa em nosso coração. Assim, vivemos envoltos pelo sagrado
amor de Deus, que nos acalenta em Seu colo e jamais nos abandona.
As estrelas que cintilam no céu são os olhos de Kanzeon Bosatsu que zela
por mim. O vento que sussurra entre as copas das árvores, o murmúrio das águas
dos riachos, esses e outros sons da Natureza são palavras que Kanzeon Bosatsu
94
1. Principal ou primária;
2. Secundária;
3. Morta;
4. Morta;
5. Centro ótico;
6. Centro geométrico.
Na zona primária, segundo Silva (1985), tem que haver um elemento forte -
um texto, uma foto, um título grande - para que atraia a atenção e o interesse dos
leitores. A diagramação deve preencher os espaços mortos com elementos de
grande atração visual, a fim de proporcionar e conduzir a leitura de forma confortável
e, ao mesmo tempo, rápida.
98
Essa diagramação não está presente nos volumes de onde foram extraídos
os textos, no entanto, está em toda a revista e na seção Artigo do Mestre Masaharu
Taniguchi.
3.3 Análise
3.3.1 Interdiscursividade
• Marcas do Budismo:
35
Conforme Carlos Alberto Silva , Kanzeon Bosatsu, conhecida, ainda,
por Kannon, é uma das divindades do budismo que simboliza o que Nossa Senhora
representa para os fieis do catolicismo: o espírito que orienta a Igreja Católica
Apostólica Romana.
34
Taniguchi, na Sutra em 30 capítulos, menciona que cada religião dá um nome diferente ao Salvador (Cristo,
Buda etc.), porém todos eles são a grande manifestação do amor de Deus. E acrescenta: Todos eles são,
portanto Kanzeon Bosatsu, e todas as religiões são uma só. Rendo o meu louvor a Kanzeon Bosatsu, que é a
divindade padroeira da Seicho-No-Ie (TANIGUCHI, 2001, pp.19-22).
35
Preletor da sede internacional e presidente da Associação dos Jovens, SNI. In:
<http://carlosalbertodasilvasni.blogspot.com.br/2010/04/kanzeon-bosatsu-deusa-da-misericordia.html>. Acessado
em 10.7.2013.
101
Discurso cristão
Discurso bíblico36
Em João 1:1: No princípio era aquele Em Mateus 5:45: Dessa forma vocês
que é a Palavra, e ele estava com Deus estarão agindo como verdadeiros filhos
e era Deus. Ele estava com Deus no do seu Pai que está no nos céus.
princípio. Porque ele envia a luz do sol tanto sobre
os maus como sobre os bons, e derrama
a chuva sobre os justos e sobre os
Cristo nos ensina o seguinte no injustos.
Evangelho de João: “No princípio era o
Verbo (Palavra) e o Verbo estava com
Deus e o Verbo era Deus. Todas as [...] fazendo nascer o Sol sobre bons e
coisas foram feitas por ele, e nada do maus e mandando chuva sobre justos e
que foi feito se fez sem ele”. injustos.
36
As referências bíblicas foram extraídas de: Nova Bíblia Viva - São Paulo: Mundo Cristão, 2010.
102
Além disso, por meio desses discursos, o co-enunciador tem sua crença
acionada e, esta, serve como uma espécie de ponte, que irá levá-lo a confiar e, por
conseguinte, a acreditar no que está sendo ensinado pelo enunciador:
O enunciador utiliza, ainda, discursos desse campo para validar seu dizer e
para construir uma imagem favorável de si, como detentor de muitos conhecimentos,
conforme vemos a seguir:
Discurso da ciência
O dr. Karl A. Menninger, em seu livro O [...] Confere força vital às plantas e
Homem Contra Si Mesmo, destaca os animais [...].
efeitos da autopunição, atribuindo
inclusive a causa das guerras ao desejo
inconsciente de autopunição.
Células germinadores que existem nos
Marcas do jurídico grãos
Marcas da Física
• Marcas do pedagógico
Discurso pedagógico
Desse modo, o discurso da SNI, para ter existência, precisa dialogar com
outros discursos, não estando, portanto, isolado. Confirmamos, assim, a hipótese do
primado do interdiscurso, pois, esses discursos, podem ser vistos como um conjunto
de discursos que mantém uma relação discursiva entre si e que estão relacionados
105
cego ao se lembrar de que quando era criança tinha acertado, com uma pedra, a
estátua de Cristo, conforme vemos no recorte abaixo:
Deus, que é amor, jamais iria castigar um homem e torná-lo cego só porque uma
pedra acertou casualmente a estátua de Cristo quando ele, na infância,
simplesmente, brincava de jogar pedras. O fato de ele ter ficado cego não se deve a
uma punição de Deus; deve-se à sua própria convicção de pecador e à sua ideia de
punição segundo a qual o pecador deve pagar os seus pecados através de
sofrimento e infelicidades.
Há casos em que o fogo destrói casas, o Sol mata as pessoas com seu calor
abrasador [...]. Isso ocorre quando o ser humano contraria as Leis da Natureza.
108
Portanto, podemos dizer que o espírito, isto é, a força do Universo [...] é a força do
amor. Contanto que não se transgrida as leis da Natureza, o espírito beneficia todas
as pessoas, fazendo nascer o sol sobre os bons e maus e mandando a chuva sobre
justos e injustos. Ele é o bom pastor, é o sábio conselheiro, é o nosso Pai eterno.
Como sigo ao lado de Kanzeon- Bosatsu, não deparo com nenhuma força que se
oponha a mim.
Os textos da coluna são considerados, por nós, como o rastro deixado por um
discurso em que a fala é encenada (MAINGUENEAU, 2011, p.85) e o discurso,
como sendo composto por três cenas: a englobante, a genérica e a cenografia.
Dessa forma, o gênero de discurso artigo de revista instaura, por sua vez,
uma cena genérica que impõe papéis, socialmente, legitimados, pois eles
evidenciam posicionamentos e imagens que são determinados pelo campo no qual
se desenvolve o discurso. Nesta análise, por exemplo, o gênero artigo, no interior de
campo filosófico, traz papéis para quem o produz (defender uma opinião) e para
quem o lê (concordar ou discordar do ponto de vista).
O pecado não existe Lições para o cotidiano: obra que contém transcrições de
palestras radiofônicas.
papel de aprendiz, apresenta o tema de “sua aula” com uma afirmação polêmica: O
pecado não existe.
• O menino Eddie, de oito anos que era delinquente e, por isso, era sempre
“castigado”. Por se julgar desobediente, seria natural ser punido, todavia, ao
se conscientizar de que não era pecador, regenerou-se e as punições não
foram mais necessárias.
[...] o Sol mata com seu calor abrasador e a eletricidade fulmina as pessoas,
quando o ser humano contraria as leis da natureza.
113
Ele explica, ainda, que se as leis não forem transgredidas, o Espírito beneficia
todas as pessoas, ou seja, o enunciador ensina que ser obediente vale à pena,
reforçando a ideia propagada em todos os setores da sociedade, inclusive nas
religiões.
escolhas erradas, além disso, há uma certa semelhança com a afirmação de Jó 3:25
o que eu tanto temia acabou me acontecendo.
mente humana
a humanidade
o leitor
aluno desobediente
Notamos que o enunciador faz isso, de maneira semelhante, para que seja
visto no papel de professor conhecedor e bem atualizado sobre os acontecimentos
da sociedade.
O que é Espírito?
O que é espírito?
É onipresente,
É amor,
É sabedoria.
119
Explicações:
• além disso, para reforçar tal idéia, em todas as páginas há o nome da seção
Artigo do Mestre Masaharu Taniguchi, que possui o nome do fundador da SNI.
A enunciação da SNI pode ser descrita, então, como sendo uma enunciação
de conhecimento, de sabedoria, de autoridade, de credibilidade e, esse tom de
confiança, está ligado ao caráter do professor, do mestre ou do palestrante, assim
como está no discurso da SNI, como vimos em O pecado não existe:
Como vimos, quando o homem mantém o pensamento de que ele é pecador, chega
inevitavelmente a ferir a si próprio. Logo, torna-se necessário eliminar da mente da
humanidade a ideia de pecado.
Por isso, se ficarmos constantemente falando que o pecado existe, ele jamais
poderá ser extinguido. Por exemplo, se todo mundo se dirigir a um ex-presidiário que
já cumpriu sua pena e lhe disser: “Você é um criminoso, é um mau elemento, é um
pecador...”, ele nunca poderá regenerar-se. Terá dificuldades para conseguir
emprego, e não lhe restará outra alternativa senão a voltar à prática do crime.
Tudo quanto vemos é a concretização do Espírito. Por trás de todas coisas existe a
força superior que as criou cada qual com a forma própria e as mantém em seus
respectivos estados. Diante desta afirmação, o leitor certamente compreenderá que
o Espírito é a força superior que existe no âmago de tudo.
123
Podemos também dizer que o princípio da Vida, que confere força vital a plantas e
animais e promove o seu crescimento, é a corrente da sagrada Vida imanente no
Universo.
compartilha o que sabe para quem quer aprender, para quem quer conhecer
determinado assunto para poder estar no comando de sua vida, dessa forma, o
ethos é corporificado por um tom de seriedade, de confiabilidade, de autoridade,
pela voz da enunciação.
Neste momento, contemplo este mundo em que vivo como sendo manifestação da
admirável sabedoria de Kannon.
professores são autoridade máxima em sala de aula e, por isso, os alunos devem
submeter-se às regras estipuladas pelo docente, para não serem punidos. Essa
autoridade é reforçada em O pecado não existe, quando o enunciador deixa
evidente a importância do mestre na vida de seus alunos:
[...] se tiver um bom professor, você só terá que ser bom, pois é muito obediente.
Ele é nosso pastor e, quando buscamos a Sua orientação, nos conduz a verdes
pastos e a águas tranquilas.
querer ser o sujeito de sua vida, ele terá que se assujeitar ao discurso masculino. Os
papéis, culturalmente, femininos são reforçados, assim como os papéis masculinos:
os homens mandam, têm autoridade, tem a última palavra e as mulheres obedecem.
As estrelas que cintilam no céu são os olhos de Kanzeon Bosatsu que zela por mim.
Com sua grande misericórdia, Kanzeon me ama, me orienta, me infunde nova força
vital.
O dr. Karl A. Menninger, em seu livro O O padre Flannagan já não sabia o que
Homem Contra Si Mesmo, destaca os fazer e orou: “Senhor, que devo fazer
efeitos da autopunição, atribuindo para orientar este menino?” Nesse
inclusive a causa das guerras ao desejo momento, recebeu a inspiração divina e
inconsciente de autopunição. então disse ao menino:
- Eddie, você sabe se a obediência é uma
Muitas pessoas sofrem de doenças e qualidade ou um defeito?
outras formas de infelicidade para
punirem a si próprias. - É claro que a obediência é uma
qualidade. Quem é que não sabe disso?
Só que eu não possuo nem um pingo
131
Por isso, enquanto não for eliminada da de qualidade porque sou um malfeitor.
mente humana a ideia de pecado, os Esta foi a resposta do menino.O padre
homens continuarão a punir a si disse, então:
próprios e a sofrer, fazendo guerras,
- Não é verdade. Não existe ninguém tão
realizando lutas de classe, provocando
obediente como você. Se você praticou
atrito no lar e contraindo doenças.
uma maldade, foi simplesmente porque
você teve “professores” maus.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
Diante desse aspecto, esse sujeito, situado além do texto, tem o perfil
esperado por quem assume uma abordagem pedagógica e tem uma voz que
sustenta a coluna. Esta, por sua vez, encarna, por sua própria enunciação,
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Dessa forma, por meio dos tons pedagógico, didático e autoritário, o co-
enunciador constrói uma imagem do enunciador que faz emergir uma instância
subjetiva com a finalidade de atuar como fiador do que está sendo enunciado e,
além disso, atribui um caráter e uma corporalidade a quem afiança a enunciação
analisada no percurso dessa pesquisa. A qualidade, a eficiência do ethos depende
dessa imagem construída, pois será ela que gerará uma ação sobre o co-
enunciador, ou seja, a incorporação.
Isto posto, a ideia de que obedecer é a forma correta de se viver é, mais uma
vez, ratificada quando o discurso é colocado na coluna identificada como Artigo do
Mestre Masaharu Taniguchi, construída, estrategicamente, com a foto do fundador e
com uma diagramação que conduz o modo de receber a mensagem transmitida.
Portanto, o perfil autoritário de quem está no poder de transmitir os ensinamentos e
a postura submissa esperada por quem recebe o discurso são reforçados.
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
SITES
REVISTAS
Mundo da Imagem Verdadeira - mundo perfeito criado por Deus, tal qual descrito no
primeiro capítulo e no começo do segundo capítulo de Gênesis.
Preletor – pessoa que, após cursos e avaliações, está habilitada para ministrar
palestras, dar orientações etc.
ANEXOS