Você está na página 1de 12

99

Jornalismo, memória e mito:


um olhar sobre a vitória de Barack Obama em 20081

Michele da Silva Tavares


Doutoranda em Comunicação Social da UFMG
Integrante do GRIS – Grupo de Estudo e
Pesquisas Imagem e Sociabilidade
Bolsista Capes
E-mail: micheletavaresjor@yahoo.com.br
Resumo: O objetivo desse artigo é discutir o papel do jorna-
lismo como lugar de articulação e operador da memória do
personagem político, através da análise comparativa da manei- Elton Antunes
ra como a imagem de Barack Obama foi apresentada nas revis-
tas Time e Veja nas eleições presidenciais norte-americanas de
2008. Do ponto de vista metodológico fizemos um mapeamen- Professor em Comunicação Social da UFMG
to dos enquadramentos que privilegiam esse passado biográfi- Doutor em Comunicação e Cultura pela UFBA
co, identificando o que é acionado pelo discurso jornalístico, e integrante do GRIS - Grupo de Estudos e
o modo como os relatos jornalísticos fizeram apelo à sua pecu- Pesquisas Imagem e Sociabilidade
liaridade biográfica e ao ineditismo que permeia o significado E-mail: eantunes@ufmg.br
da sua vitória em âmbito mundial.
Palavras-chave: Jornalismo, revista, enquadramento, memória.

Periodismo, memoria y mito: una mirada sobre la victoria de Ba-


rack Obama en 2008
Resumen: El objetivo de este artículo es discutir el papel del
periodismo como el lugar de articulación y operador de la me-
moria de el personaje político, a través de un análisis compa-
rativo de la forma en la que la imagen de Barack Obama se ha
presentado en revistas Time y Veja en el año electoral de 2008.
Desde un punto de vista metodológico, haciemos un levan-
tamiento de los encuadramientos que favorecen la presencia
de este pasado biográfico, para determinar lo que se acciona
por el discurso periodístico y cómo los informes periodísticos
apelaron a su particularidad biográfica y a la originalidad que
impregna la importancia de su victoria en el mundo.
Palabras clave: Periodismo, revista, encuadramiento, memoria. Considerando o contexto de campanha
Journalism, memory and myth: a look on the victory of Barack
eleitoral como cenário plural de vozes e dis-
Obama in 2008 cursos em disputa na mídia, sobretudo em
Abstract: This article aims to discuss the role of journalism países de regime democrático, a emergência
as a place of articulation and a memory operator of political
character, through a comparative analysis of the way Barack de líderes políticos como símbolo de popu-
Obama’s image has been presented in Time and Veja maga- laridade fomenta na imprensa mundial uma
zines throughout the United States presidential campaign of
2008. From a methodological point of view, we’ve mapped the
ampla discussão sobre as expectativas e con-
frames that favor this biographical background, identifying
what is triggered by journalistic discourse, and how journalis- 1
Uma primeira versão deste artigo foi apresentada durante o V
tic reports have made appeal to its biographic peculiarity and Encontro Anual da Associação Brasileira de Pesquisadores em
the originality that permeates the significance of his victory in Comunicação e Política, V Congresso da Compolítica, junto
the world. ao Grupo de Trabalho Jornalismo Político (GT8), na Univer-
Keywords: Journalism, magazine, framing, memory. sidade Federal do Paraná, Curitiba, 08 a 10 de maio de 2013.

Líbero – São Paulo – v. 18, n. 35, p. 99-110, jan./jun. de 2015


Michele da Silva Tavares / Elton Antunes – Jornalismo, memória e mito: um olhar sobre a vitória de Barack...
100

sequências sociais, políticas e econômicas (Inauguration) – para, então, procedermos


diante da nomeação do chefe de Estado. Esse à elaboração de um mapeamento inicial dos
fervor discursivo é ainda mais amplo dian- enquadramentos que privilegiam a trajetória
te de uma situação marcada por elementos de vida do personagem político Barack Oba-
de ineditismo e peculiaridade em relação à ma, identificando o que é acionado e como é
trajetória do líder político em questão. Esse acionado pelo discurso jornalístico.
nos parece o caso da cobertura noticiosa da
vitória de Barack Obama nas eleições presi-
Um breve cenário
denciais norte-americanas de 2008.
No início de 2008, momento em que é
dada a largada para a corrida das Eleições
Compreendemos o mundo Primárias (Primary Election),2 o cenário po-
através de narrativas lítico nos Estados Unidos é caracterizado por
culturais que uma forte crise e recessão econômica, pelo
perduram porque estouro da bolha imobiliária que desarticu-
são socialmente lou as finanças do país, o aumento da taxa de
desemprego, a elevação da inflação ocasiona-
construídas e também
da pela dependência econômica do petróleo,
circulam socialmente os gastos com uma guerra “mal administra-
da”, além de uma série de fatores que con-
tribuíam para uma percepção de fragilização
do poderio norte americano (Crotty, 2009).
Nesse artigo identificamos elementos que Neste cenário, o então jovem senador de-
do ponto de vista do relato jornalístico pro-
mocrata Barack Obama, que emerge como
duzem várias associações da figura do can-
uma aposta de “mudança” e “novidade polí-
didato à ideia do mito político, por meio de
tica”, traz em si a marca da globalidade bio-
forte apelo a aspectos de sua biografia e ao
gráfica (nasceu no Havaí, filho de Barack
significado da sua vitória em âmbito mun-
Obama, negro, economista queniano, e de
dial. Discutimos então esse papel do jorna-
Ann Dunham, branca, antropóloga america-
lismo como lugar de articulação e operador
na, morou na Indonésia e estudou direito em
da memória do personagem político, através
Harvard). Os holofotes da mídia mundial,
da análise comparativa da maneira como a
portanto, se direcionam às peculiaridades
imagem do candidato foi apresentada nas re-
que transbordam de sua biografia e trajetória
vistas semanais de informação Time e Veja.
política e promovem em si uma ampla discus-
Do ponto de vista teórico-metodológico,
são sobre as consequências da possível vitória
discute-se a noção de memória verificando
de um candidato negro, num país marcado
como determinadas relações temporais que
pelas lembranças do segregacionismo, com
configuram a biografia de Barack Obama
se materializaram em determinados enqua- certa inexperiência política, mas imbuído de
dramentos do discurso jornalístico e foram um discurso pacifista e renovador.
acionadas durante o período eleitoral para 2
A primeira etapa do processo eleitoral nos Estados Unidos
dar conta do relato dos acontecimentos. To- corresponde às Eleições Primárias, quando os partidos Demo-
mamos como referência empírica a cobertu- cratas e Republicanos escolhem os candidatos oficiais que con-
correrão à presidência nas Eleições Gerais (General Elections).
ra jornalística das revistas em quatro recor- As primárias ocorrem ao longo do primeiro semestre do ano
tes episódicos – início e término das Eleições eleitoral, com a tradicional disputa nos meses de janeiro e/ou
fevereiro nos estados de Iowa e New Hampshire, finalizando a
Primárias (Primary Elections), término das eleição no mês de junho. Disponível em: <http://www.usa.gov/
Eleições Gerais (General Elections) e Posse Citizen/Topics/Voting/Learn.shtml>

Líbero – São Paulo – v. 18, n. 35, p. 99-110, jan./jun. de 2015


Michele da Silva Tavares / Elton Antunes – Jornalismo, memória e mito: um olhar sobre a vitória de Barack...
101

Em novembro de 2008, Barack Obama é os jornalistas exercem então um papel vital e


eleito o 44º presidente dos Estados Unidos, crítico de agentes da memória (Zelizer, 2008).
com uma vitória construída e alicerçada, so- Entretanto, os jornalistas ajustam a re-
bretudo, na simpatia e popularidade que di- memoração e as reconstruções dos aconteci-
namizaram os slogans que davam a sua cam- mentos não apenas tomando como referên-
panha e candidatura a aura da empreitada cia eventos passados, mas também de acordo
coletiva (tais como “Yes, we can”, “We are the com sua agenda e pauta de notícias. O recor-
ones we’ve been waiting for”, “... if you’re ready te do passado que é retomado no texto e o
for change”). Ora retratado como fenômeno tipo de futuro que é especulado depende do
da democracia norte-americana ou como que os editores e jornalistas acreditam em
bálsamo para as feridas abertas pelo ante- âmbito público, das convenções jornalísti-
cessor George W. Bush, Obama recebe como cas e das ideologias pessoais (Zelizer, 2008).
herança uma administração considerada por Mas, o fato é que as referências ao passado
muitos “desastrosa” e a missão de “endireitar” ajudam os jornalistas a dar sentido ao pre-
a casa e reconquistar o respeito do mundo em sente, estabelecendo relações, sugerindo in-
relação ao poderio dos Estados Unidos. ferências, atuando como critério para medir
Na configuração desse quadro destaque- a magnitude e o impacto de determinado
-se o papel da mídia na difusão de informa- evento, oferecendo analogias e explicações
ção fundamental para consagrar a imagem (Lang e Lang apud Zelizer, 2008).
do líder político popular. É imprescindível Segundo Zelizer (2008), o passado apre-
considerar o discurso midiático como ins- senta-se como um rico repositório dispo-
trumento não somente formador de opinião, nível aos jornalistas para explicar determi-
mas ferramenta que agrega valor e atribui nados eventos. De fato, compreendemos o
sentidos ao personagem político, reforçando mundo através de narrativas culturais que
e/ou desmistificando determinadas simbolo- perduram porque são socialmente constru-
gias. É a partir de tal perspectiva que refle- ídas e também circulam socialmente, não
timos acerca de certa dimensão mítica que apenas através do jornalismo como tam-
permeia o personagem Barack Obama nos bém por meio da literatura, folclore, teatro,
relatos jornalísticos, sinalizando tal aspecto arte, entretenimento midiático, entre outras
a partir da análise de enquadramentos que formas culturais e de comunicação. Mas o
organizam os elementos biográficos de tal jornalismo, especificamente, constitui um
figura. extenso repertório narrativo ao qual retoma-
mos para compreender os acontecimentos
Os elementos biográficos como ao nosso redor. É um sistema simbólico du-
operadores da memória radouro: seja uma história sobre corrupção
política, o triunfo de um atleta ou um grave
O jornalismo e a memória possuem uma acidente, seu enredo básico e os personagens
relação simbiótica e, ao mesmo tempo, de- ficam registrados em nossa memória (Kitch,
sigual: são campos que sabem da existência 2011a; Kitch, 2012b).
mútua, admitem intersecções e se tornaram No caso da cobertura de eventos histori-
fenômenos autônomos, sem demonstrar de- camente importantes há uma forte dimen-
pendência um do outro. Em linhas gerais, o são moral atribuída à natureza dos episó-
jornalismo precisa do trabalho de memória dios. Neste sentido, os jornalistas não são
para contextualizar o recontar de eventos apenas testemunhas, mas condutores da ex-
públicos, ao passo que a memória precisa tensa cerimônia cultural, política e histórica
do jornalismo para fornecer um “rascunho que acontece na sociedade e, ao trazer o pre-
público” dos acontecimentos. Nesse sentido, sente para a perspectiva do passado, propor-

Líbero – São Paulo – v. 18, n. 35, p. 99-110, jan./jun. de 2015


Michele da Silva Tavares / Elton Antunes – Jornalismo, memória e mito: um olhar sobre a vitória de Barack...
102

cionam uma relação de familiaridade com pensarmos com Hartog (2013) e Koselleck
determinados eventos. Eles são construtores (2006), de uma composição peculiar de me-
de memória social, criam documentos histó- mória, atenção e expectativa.
ricos, como as reportagens e as imagens icô- Para Bakhtin (2011), a capacidade de ver
nicas para que no futuro possamos lembrar e ler o tempo no todo espacial do mundo
quem somos e como nos sentíamos (Kitch, equivale à capacidade de ler os indivíduos no
2011a; Kitch, 2011b). curso do tempo em tudo, desde a natureza
Cabe ressaltar que a construção da memó- até as regras e ideias humanas. A busca por
ria coletiva não é intencional na prática jor- vestígios visíveis do tempo histórico é capaz
nalística, mas determina-se pelas forças cul- de trazer à tona as contradições socioeconô-
turais internas e externas ao campo. Ela pode micas, cujas manifestações mais profundas e
ser apreendida a partir de duas perspectivas: sutis se apresentam nas relações e ideias hu-
por um lado, os jornalistas fazem referência manas. Esse despertar do sentimento do tem-
direta a algum fato histórico para que se possa po está associado à questão da visibilidade:
compreender o evento no presente; por outro,
Todos os demais sentimentos exteriores, a
a memória coletiva não se refere ao tempo vivência interior, as reflexões e conceitos
histórico, mas à forma como a sociedade se abstratos se uniram em torno do olho que
lembra do fato em termos de valores e normas vê como seu centro, como a primeira e úl-
(Berkowitz; Raaii, 2010; Berkowitz, 2011). tima instância. Tudo o que é essencial pode
A articulação entre memória e jornalis- e der ser visível; tudo o que é invisível é se-
cundário (Bakhtin, 2011, p. 227).
mo, no escopo desse artigo, precisa levar em
conta ainda as temporalidades próprias da Os objetos e fenômenos se manifestam
política. Por se tratar de um recorte episó- como remanescentes ou relíquias dos dife-
dico que registra quatro momentos do pro- rentes graus e formações do passado e como
cesso eleitoral nos Estados Unidos (início e embriões de um futuro mais ou menos dis-
término das eleições primárias, resultado das tante (Bakhtin, 2011). E o “olho que vê” pro-
eleições gerais e posse), partimos da neces- cura e encontra em toda parte o tempo, o que
sidade de compreender a complexidade dos está em formação e as marcas da história.
eventos aplicada à uma noção de tempo po- Assim, é justamente em contextos de gran-
lítico e suas diferentes durações. de mobilização coletiva, como as eleições,
Considerando o calendário político de que vemos emergir com intensidade os laços
um Estado, tomamos as eleições presiden- necessários do passado com o presente e o
ciais como evento que impõe coletividade ao futuro. É quando fragmentos de um passado
tempo político, que se repete periodicamen- isolado são pinçados estrategicamente, cons-
te. Segundo Pomian (1993), na história de tituindo “fantasmas” detestáveis ou grandes
cada país as eleições por um lado invocam o trunfos de campanha. Mas, esse passado efi-
passado para mostrar progressos alcançados caz, que determina o presente, fornece deter-
ao longo do mandato e, por outro, se voltam minada direção para o futuro.
para o futuro para anunciar os que serão Assim, cabe-nos pensar que a vitória pre-
realizados. Assim, o “tempo político” é mui- sidencial de Obama nos Estados Unidos mar-
tas vezes descrito como linear e orientado ca um tempo histórico e simbólico seja em
(mesmo comportando elementos cíclicos) termos políticos como também em termos
e também irreversível, pois marca rupturas biográficos graças à peculiaridade de vida
fundadoras e abre-se para o futuro infinito. do personagem. Mas, ao pensar a constru-
Com o período eleitoral estamos diante da ção biográfica no jornalismo nos deparamos
problemática de se estabelecer certas rela- com a forma como as revistas semanais de
ções entre presente, passado, futuro ou, para informação convocam certos elementos das

Líbero – São Paulo – v. 18, n. 35, p. 99-110, jan./jun. de 2015


Michele da Silva Tavares / Elton Antunes – Jornalismo, memória e mito: um olhar sobre a vitória de Barack...
103

trajetórias dos sujeitos operacionalizando a palavras chave, frases de estoque, imagens es-
noção de memória e estabelecendo relações tereotipadas, fontes de informação reforçan-
presente-passado/passado-futuro no discur- do julgamentos; o receptor, ressaltando que
so jornalístico, sobretudo a partir da confi- o pensamento e a conclusão podem ou não
guração de determinados enquadramentos. refletir os quadros do texto e a intenção de
enquadramento do comunicador; e por fim,
Mapeando “enquadramentos a cultura, com seu conjunto de quadros co-
biográficos” em Time e Veja muns exibidos no discurso e no pensamento
da maioria das pessoas de um grupo social.
A cobertura jornalística das eleições presi-
denciais oferece por natureza uma represen-
tação fortemente seletiva de aspectos da vida Em Veja percebe-se
dos candidatos que entram na corrida pelo que o texto
cargo mais alto da nação. Entre os temas em jornalístico explora o
destaque, a personalidade, o estilo e o cará- “perfil” de Obama de
ter muitas vezes se sobrepõem em relação às
forma diferente do
plataformas políticas que diferenciariam as
propostas de campanha. Do mesmo modo, que é apresentado
os consumidores midiáticos frequentemente pela revista Time
julgam primeiro os candidatos pelo caráter e,
em seguida, deslocam a atenção para as ques-
tões de campanha (Berkowitz; Raaii, 2010).
Nesse sentido, a noção de enquadramen- Para identificar a presença dos enqua-
to (framing) torna-se útil, pois ela permi- dramentos construídos e personificados é
te analisar o comportamento da imprensa necessário observar aspectos tais como as
na cobertura de diversas temáticas, como palavras-chave, metáforas, conceitos, sím-
cobertura de eleições, discursos políticos, bolos e imagens visuais enfatizadas na no-
corrupção política, entre outros, oferecen- tícia narrada (Entman apud Colling, 2001).
do uma resposta ao modo como os homens Segundo Entman (1993), esse processo de
conhecem e agregam significado aos aconte- enquadramento engloba não apenas seleção
cimentos ao seu redor (Sádaba, 2007). Tal é como também destaque, ou seja, tornar um
a perspectiva defendida por Entman (1993), pedaço de informação mais notável, signi-
para quem o conceito do framing oferece ficante ou memorável para audiências. Para
uma forma de descrever o poder de um tex- analisar como a imagem de Barack Obama
to de comunicação, pois mostra exatamente foi apresentada nas revistas ao longo do ano
como os quadros se tornam embutidos e se eleitoral, estabeleceu-se duas etapas de in-
manifestam em um texto, ou como o enqua- vestigação. Na primeira etapa, realizou-se a
dramento influencia o pensamento. catalogação das edições de Veja e Time.3 Para
Entman (1993) identifica quatro funções selecionar o período de análise, adotou-se
do frame (definir problemas, diagnosticar
3
Segundo dados publicados no World Magazine Trends
causas, emitir julgamentos morais e sugerir 2010-2011, em termos numéricos, a Time, do grupo Time
soluções) e reconhece pelo menos quatro lo- Inc. (USA) e a Veja, da Editora Abril (Brasil) representam os
calizações dos frames no processo de comu- maiores títulos com publicação semanal, na categoria genérica
que engloba economia, negócios e notícias mundiais: a revista
nicação: o comunicador, que faz julgamentos norte-americana Time, apresenta a maior circulação média em
de enquadramentos de forma consciente ou nível mundial, com cerca de 3.350.415 exemplares; a brasileira
Veja, apresenta-se entre as maiores revistas de circulação mun-
inconsciente; o texto, com quadros que são dial, sendo nacionalmente a mais representativa em termos
manifestados pela presença ou ausência de numéricos, com circulação média de 1.097.485 exemplares.

Líbero – São Paulo – v. 18, n. 35, p. 99-110, jan./jun. de 2015


Michele da Silva Tavares / Elton Antunes – Jornalismo, memória e mito: um olhar sobre a vitória de Barack...
104

como parâmetro os quatro recortes episódi- momentos eleitorais (Tabela 1). A exten-
cos que marcam o ano eleitoral:4 início e tér- são desses períodos de análise favoreceu a
mino das Eleições Primárias (Primary Elec- seleção de um corpus considerável para
tions), correspondente aos meses de janeiro verificação dos questionamentos que mo-
e junho, respectivamente, término das Elei- tivam este artigo. Entretanto, cabe destacar
ções Gerais (General Elections), ocorrida no que foram considerados como elementos
mês de novembro, e a Posse (Inauguration), de análise as capas das edições, os editoriais,
que acontece no final de janeiro de 2009. A as reportagens e os textos opinativos (colu-
partir de tal procedimento, foi possível per- nas) com referência direta a Barack Obama.
ceber a presença constante da estratégia de Optou-se por, nesse primeiro momento,
recuperação de alguns elementos do passado não diferenciar os gêneros informativos dos
biográfico de Obama na cobertura jornalís- opinativos para que fosse possível observar
tica a partir do início das Eleições Primárias. a disposição dos elementos biográficos ao
No total, foram analisadas cinco edições longo de toda a composição editorial das
de cada revista, que noticiam os referidos revistas.

Tabela 1- Disposição do Corpus de Análise ao longo dos Episódios Eleitorais


Nº de Nº de
Destaque na Capa Editorial
Reportagens Opinativos
Episódio
Eleitoral
Veja Time Veja Time Veja Time Veja Time

Início das margem margem


não sim 2 4 - -
Primárias superior superior

Término das margem


manchete sim sim 2 2 - 1
Primárias superior

Término das
manchete manchete sim sim 7 7 2 5
Eleições Gerais

manchete manchete não não 6 4 - 3


Posse
margem
manchete não sim 3 2 - 1
superior
Fonte: Elaborada pelos autores

Na segunda etapa de investigação, esta- nas reportagens e nos textos opinativos. De


beleceu-se a realização de um mapeamento modo geral, nos textos das reportagens e do
temático que teve como objetivo destacar material opinativo as revistas apresentam
os principais temas associados à figuração uma pequena variação entre os subtemas
de Barack Obama ao longo da cobertura de agrupados no quadro das temáticas gerais
Time e Veja, seja nas capas como também (“Pessoal”, “Estados Unidos”, “Eleições”). Já
no que se refere à leitura temática das capas
e manchetes, em uma abordagem compara-
4
Calendário Eleitoral norte-americano de 2012, disponível
em: <http://www.eac.gov/assets/1/Documents/election.calen-
tiva, percebe-se certo equilíbrio no destaque
dar.2012.pdf>. concedido ao tema geral “Eleições”, no qual o

Líbero – São Paulo – v. 18, n. 35, p. 99-110, jan./jun. de 2015


Michele da Silva Tavares / Elton Antunes – Jornalismo, memória e mito: um olhar sobre a vitória de Barack...
105

personagem político Barack Obama é notícia Time diferencia-se da abordagem de Veja de


de capa nos dois países nos quatro momen- forma significante, pois a norte-americana
tos eleitorais, variando apenas a dimensão prioriza, nas reportagens e textos opinativos,
do destaque em função do episódio eleitoral. as informações referentes à corrida eleitoral
Convencionamos, então, o agrupamento numa perspectiva de saga e caminho a ser
das temáticas gerais que caracterizam a figu- percorrido. Time explora também a inova-
ração de Barack Obama nas revistas confor- ção política da forma de fazer campanha da
me a caracterização a seguir. equipe de Obama, o uso da Internet e sua
Pessoal: engloba as questões que se refe- imagem como fenômeno político.
rem à identidade individual de Obama, tais A partir dessas temáticas gerais associa-
como seu perfil político, suas ideias, slogan, das ao personagem político, iniciou-se o
sua identidade e estrutura familiar. Em Veja exercício de refinamento dos enquadramen-
percebe-se que o texto jornalístico explora o tos que acionam a biografia de Obama no
“perfil” de Obama de forma diferente do que discurso das revistas. O esforço metodoló-
é apresentado pela revista Time: enquanto a gico consistiu em agrupar temáticas de na-
primeira figura o personagem político atra- turezas semelhantes numa tipologia gerada
vés de atributos como a juventude, a dinâmi- pela leitura dos textos que sintetizasse os
ca e o talento retórico ao longo de todas as elementos biográficos em consonância com
etapas das eleições, a segunda o apresenta no as relações temporais que eles acionam. Che-
início das primárias como um candidato com gamos então a uma definição de oito tipos
estilo, porém sem substância, mas altera sua de enquadramentos biográficos que a nos-
representação ao final da campanha reconhe- so ver tiveram um lugar central nos relatos
cendo seu carisma e sua intelectualidade. jornalísticos para construção da imagem de
Estados Unidos: refere-se à ligação entre Barack Obama.
a figura de Barack Obama, enquanto perso- História de vida: trata dos percursos de
nagem político, e a simbologia histórica e vida, fragmentos e experiências vividas pelo
política dos Estados Unidos. Neste grupo, os personagem político. Através desse tipo de
subtemas também apresentam uma variação enquadramento é possível caracterizar a
pontual, sobretudo no tocante ao debate so- prática social de Obama seja em grupo, na
bre a “questão racial”, que em Veja é aborda- família ou individualmente, na forma de epi-
da a partir de uma apreensão histórica ligada sódios significativos que fazem a interseção
principalmente à figura de Martin Luther entre a vida individual e o contexto social.
King, enquanto que a revista Time explora Faz parte deste quadro, portanto, a temáti-
a diferenciação racial de forma mais acentu- ca geral “pessoal”. Os elementos biográficos
ada numa perspectiva factual sobre a inten- são acionados no discurso jornalístico numa
ção de votos. Outro aspecto divergente nes- relação temporal passado-presente, ou seja,
ta temática é questão do subtema “relações recorta-se um determinado acontecimento
internacionais”, cuja abordagem da revista do passado, vivenciado pelo personagem,
brasileira enfatiza as relações políticas entre que foi significante e decisivo para justificar
Estados Unidos e América Latina, ao passo um fato situado no tempo presente, como no
que a revista norte-americana enfoca nas trecho da reportagem de Time a seguir, que
questões políticas e intervenções dos EUA no destaca o parentesco de Obama:
Oriente Médio.
At a moment of obvious peril, America
Eleições: agrega os temas de campanha
decided to place its fate in the hands of a
que remetem ao perfil de Obama enquan- man who had been born to an idealistic
to personagem político na arena da dispu- white teenage mother and the charismatic
ta eleitoral. Neste grupo temático, a revista African grad student who abandoned them

Líbero – São Paulo – v. 18, n. 35, p. 99-110, jan./jun. de 2015


Michele da Silva Tavares / Elton Antunes – Jornalismo, memória e mito: um olhar sobre a vitória de Barack...
106

— a man who grew up without money, in the imagination, out of scraps of his-
talked his way into good schools, worked tory and hope. Barack Obama never talks
his way up through the pitiless world of about how people see him: I’m not the
Chicago politics to the U.S. Senate and one making history, he said every chance
now the White House in a stunningly short he got. You are.6 (How Obama rewrote the
period.5(How Obama rewrote the book, book, Time, v. 172, n. 20, nov. 2008).
Time, v. 172, n. 20, nov. 2008).
Identidade Familiar: define-se pelo con-
junto de informações que identificam a ge-
nealogia do personagem político, seja origem
étnica, tradições, costumes, lugares, relações
parentais que caracterizam a origem do per-
sonagem “Obama” enquanto ser humano. As
relações temporais variam de acordo com o
uso dos elementos biográficos. Em caso de
acionamento dos ancestrais de Obama ainda
vivos (avós maternos, por exemplo), trata-se
de uma relação temporal passado-presente
na qual este “passado” não é distante; ainda
permanece no agora.
Figura 1: Obama e suas raízes – mãe, pai e avó paterna
(Veja, p. 62, jan. 2008).

Marco Histórico: caracterizam os acon-


tecimentos que marcam certo momento his-
tórico, provocando rupturas e/ou mudanças,
seja na economia, na política ou na vida so-
cial. Esse enquadramento abrange os aconte-
cimentos considerados “divisores de águas” Figura 2: Obama e a família paterna queniana – identidade
(o antes e o depois), ou seja, que sinalizem familiar (Veja, p. 94-95, jun. 2008).
mudanças significativas na história norte-
-americana. A temática “Estados Unidos”, Em outras circunstâncias, o mesmo uso
por exemplo, faz parte deste quadro. Neste desse enquadramento também pode acionar
caso, o discurso jornalístico é marcado pela expectativas futuras, principalmente quando
relação temporal passado-presente-futuro, a “identidade globalizada” é destacada. Neste
onde o momento “presente” é o marco que caso, evidencia-se o fato de Obama trazer em
divide a condição anterior (passado) e sina- si a marca de etnias diferentes – o branco e
liza o porvir (futuro). No exemplo a seguir, o negro –, a experiência de ter morado em
a revista Time utiliza a fala de Obama para diferentes lugares, ter vivenciado diferentes
demarcar um novo momento histórico: culturas, e a partir disso, espera-se que ele
possa dialogar igualmente de forma pacífi-
Some princes are born in palaces. Some ca com diferentes raças, culturas, países. Na
are born in mangers. But a few are born reportagem How Obama rewrote the book
(Time, nov. 2008), destaca-se que o resultado
5
Tradução nossa: “Em um momento de evidente perigo, a
América decidiu colocar seu destino nas mãos de um homem
que nasceu de uma jovem mãe idealista branca e do carismá- 6
Tradução nossa: “Alguns príncipes nascem em palácios. Ou-
tico estudante africano de graduação que o abandonou - um tros nascem em manjedouras. Mas poucos nascem na imagi-
homem que cresceu sem dinheiro, ingressou em boas escolas, nação, nos restos da história e da esperança. Barack Obama
trilhou seu caminho do impiedoso mundo político de Chicago nunca fala sobre a forma como as pessoas o vê: Eu não sou
para o Senado dos Estados Unidos e, agora, a Casa Branca, em aquele que está fazendo história, ele disse que cada chance que
um surpreendentemente curto período”. teve. Você é”.

Líbero – São Paulo – v. 18, n. 35, p. 99-110, jan./jun. de 2015


Michele da Silva Tavares / Elton Antunes – Jornalismo, memória e mito: um olhar sobre a vitória de Barack...
107

final das Eleições Gerais não foi determinado Jornada: trata-se de uma indicação mais
pela questão racial, mas por uma escolha de metafórica remetendo à trajetória e ao cami-
diferentes raças, gêneros e idades: nho a ser percorrido por Obama ao longo
da campanha eleitoral e após a vitória. Nes-
While it may not have been much of a race
te sentido, o enquadramento está associado,
in the end, it certainly was a choice: not just
black and white or red and blue or young principalmente à temática geral “Eleições”,
and old, though there was a full generation na recorrência temporal presente-futuro.
between them. Over time, it’s become clear Numa perspectiva mais ampla, pode estar re-
that the semen view change very differen- lacionada à caminhada necessária, ao desti-
tly7 (Time, v. 172, n. 20, nov. 2008). no que precisa ser cumprido, uma expedição
que atravessa décadas de lutas. É o caso da
Traço de época: tipo de enquadramento
temática referente às questões raciais e o de-
que engloba as características de um deter-
bate sobre o segregacionismo histórico nos
minado momento ou período importante
Estados Unidos que, por conseguinte, está
que demarca cronologicamente o aconte-
associado à menção de líderes como Martin
cimento de um fato, uma personalidade ou
Luther King. A frequente menção ao líder
certas conjunturas. Está associado à menção
político resgata o tempo passado como fator
e/ou à comparação com outros presidentes
que motiva a caminhada de Obama no pre-
e/ou líderes políticos: “Thirty years before
sente e que justifica a concretização de um
Barack Obama, Reagan offered hope and
sonho de igualdade racial: “We are the ones
change to a nation sick of the status quo”8
we’ve been waiting for, he liked to say, but
(The oficial end of the Reagan Era, Time,
people were waiting for him, waiting for so-
nov. 2008). Assim como o marco histórico,
meone to finish what a King began9” (How
este enquadramento pode acionar no dis-
Obama rewrote the book, Time, v. 172, n. 20,
curso jornalístico tanto elementos históricos
nov. 2008).
como os elementos biográficos, através da
relação temporal passado-presente-futuro.
Entretanto, a marca da dinâmica temporal
produz um efeito comparativo entre duas
“eras” ou dois “períodos”.

Figura 4: A histórica luta pela igualdade racial nos EUA (Veja,


p.84-85, nov. 2008).

Figura 3: O ex-presidente John Kennedy era acionado de


Mensageiro: derivado da essência temá-
forma comparativa a Obama em ambas as revistas (Veja, p. tica que permeia o enquadramento anterior,
100, jun. 2008). neste tipo Obama é figurado como aquele
que é predestinado a disseminar as mensa-
7
Tradução nossa: “Embora não tenha se tratado tanto de raça gens de tolerância e igualdade, além de con-
no final (das eleições), certamente foi uma escolha: não apenas
preto e branco ou vermelho e azul ou jovens e velhos, apesar
de ter uma geração inteira entre eles. Com o passar do tempo, 9
Tradução nossa: “Nós somos aqueles por quem nós estáva-
tornou-se claro que a opinião desses cidadãos varia muito”. mos esperando, ele gostava de dizer, mas o fato é que as pessoas
8
Tradução nossa: “Trinta anos antes de Barack Obama, Reagan estavam esperando por ele, esperando por alguém para finali-
ofereceu esperança e mudança a uma nação doente do status quo”. zar o que (Martin Luther) King começou”.

Líbero – São Paulo – v. 18, n. 35, p. 99-110, jan./jun. de 2015


Michele da Silva Tavares / Elton Antunes – Jornalismo, memória e mito: um olhar sobre a vitória de Barack...
108

vocar o país a realizar mudanças, sobretudo Star10 (The Voters’ Revenge, Time, v. 171,
amparado numa “identidade globalizada e n. 3, jan. 2008).
multirracial”. As temáticas que permeiam
Cotidiano: entende-se como uma visada
este tipo de enquadramento ficam em evi-
voltada para as ações que sejam habituais ao
dência principalmente nas reportagens que
personagem, seja numa esfera social (em gru-
abordam as ideias transformadoras, o slogan
po) ou individual (personalista). Numa pers-
e as intenções de voto, numa relação tem-
pectiva mais ampla, também incluímos neste
poral presente-futuro. Ou seja, através das
tipo de enquadramento os aspectos da per-
mudanças realizadas num tempo presente
sonalidade de Obama, desde que seu modo
os efeitos dessa renovação serão sentidos de
de agir seja apresentado como um padrão de
forma positiva (ou não) num tempo futuro.
comportamento pelo discurso jornalístico,
ou seja, um comportamento habitual que faz
parte de sua conduta. No âmbito “Pessoal”
são abordados temas como a intimidade e a
estrutura familiar. Assim como o tipo ante-
rior, o cotidiano remete a relação temporal
de um presente continuado. A revista Time,
por exemplo, explora pouco a intimidade de
Obama, mas compara o personagem político
com sua esposa Michelle Obama em termos
de profissão e altura: “But Obama brings
unique stature to the post. “Both professio-
Figura 5: Obama e a possibilidade de mudança (Veja, p. 56-
57, jan. 2008) nally and physically – at5 ft. 11 in. (1.8 m),
she is nearly as tall as Barack - she stands not
Instantâneo: trata-se dos temas associa- behind her husband buts shoulder-to-shoul-
dos ao instante, ao momentâneo, agrupadas der with him”11 (America’s Next Top Model,
em “Eleições” e “Pessoal”. Do ponto de vista Time, v. 173, n. 3, jan. 2009).
jornalístico, inclui as reportagens que abor-
dam os resultados da eleição, o balanço da Considerações Finais
campanha, entre outras ações que importam
apenas à ordem do dia, ao factual. Configura- O contato com o objeto empírico – a
-se, portanto, na esfera de um tempo presen- cobertura jornalística das revistas semanais
te jornalístico, sem repercussões futuras ou de informação – permite indiciar inúmeras
necessidade de resgate do passado. Obama é possibilidades analíticas. Na composição das
figurado como “fenômeno político” pelas re- capas, na disposição texto-imagem das re-
vistas em momentos distintos da campanha. portagens ou no direcionamento opinativo
No exemplo a seguir, a revista Time descreve de editoriais e colunas, o exercício de identi-
o personagem como “Barack Star” (a estrela ficar os enquadramentos biográficos possibi-
Barack) ainda no início das Eleições Primá- lita-nos fazer uma leitura de certa dimensão
rias, enquanto Veja utiliza a expressão “presi-
dente-celebridade” (ed. 2097, p. 58, jan. 2009) 10
Tradução nossa: “Barack Obama projeta-se para fora de
para caracterizá-lo na cobertura da posse: Iowa, saltou nas pesquisas e inspirou as pessoas nos estados vi-
zinhos a pegarem seus carros e dirigir por horas para ver o can-
Obama go this bounce out of Iowa, jum- didato que as manchetes passaram a denominar Barack Star”.
ped in the polls and inspired people in the
11
Tradução nossa: “Mas (Michelle) Obama traz estatura exclu-
siva para o cargo (de primeira dama). Tanto profissional como
surrounding states to get in their cars and fisicamente - (1,80 m de altura), ela é quase tão alta quanto
drive for hours to see the candidate whom Barack - ela não se encontra atrás de seu marido, mas ombro
headline writers started calling the Barack a ombro com ele”.

Líbero – São Paulo – v. 18, n. 35, p. 99-110, jan./jun. de 2015


Michele da Silva Tavares / Elton Antunes – Jornalismo, memória e mito: um olhar sobre a vitória de Barack...
109

mítica que permeia o relato jornalístico em lísticos para apresentação da figura política
torno do personagem político Barack Oba- Barack Obama, os elementos comuns iden-
ma em três esferas que se complementam: tificados nas duas revistas não nos devem
em nível pessoal, nacional e eleitoral. Além fazer esquecer as variações existentes entre
disso, os aspectos propostos “organizam” e elas. Seja pelas diferentes culturas jornalís-
“agregam” esses elementos biográficos e his- ticas dos países em questão – aspectos insti-
tóricos, configurando operações de estabele- tucionais, padrões éticos, etc. – ou mesmo a
cer relações temporais que ajudam a pensar maneira como as realidades sócio-políticas
como a biografia é acionada no discurso jor- e o contexto cultural acionam a cobertura
nalístico. E, embora a experimentação de um do processo eleitoral norte-americano, a
mapeamento dos enquadramentos não seja identificação de semelhanças e diferenças
uma estratégia metodológica definitiva, esta nos relatos jornalísticos demanda ainda
se apresenta como exercício eficaz para um maior refinamento do mapa de enquadra-
contato inicial com o objeto de estudo. mentos proposto. Da mesma forma, os en-
Contudo, é necessário salientar algumas quadramentos até aqui sugeridos podem
limitações da presente reflexão. Conside- merecer um maior refinamento a partir da
rando o objetivo de mapear aspectos ca- análise de um universo mais abrangente dos
racterísticos da forma como os elementos materiais jornalísticos.
biográficos são acionados nos relatos jorna- (artigo recebido ago.2014/aprovado mai.2015)

Líbero – São Paulo – v. 18, n. 35, p. 99-110, jan./jun. de 2015


Michele da Silva Tavares / Elton Antunes – Jornalismo, memória e mito: um olhar sobre a vitória de Barack...
110

Referências

BAKHTIN, M. M. O tempo e o espaço nas obras de Goethe. clopédia Einaudi. Lisboa: Imprensa Nacional, v. 29, p. 12-91,
In: Estética da criação verbal. 6ª ed. São Paulo: WMF Martins 1993.
Fontes, 2011. REMNICK, D. A Ponte: Vida e ascensão de Barack Obama.
BERKOWITZ, D.; RAAII, S. Conjuring Abraham, Martin and Tradução Celso Nogueira, Isa Mara Lando. São Paulo: Com-
John: Memory and news of the Obama presidential campaign. panhia das Letras, 2010.
In: Memory Studies. Sage Publications, 2010, p. 364-379. SÁDABA, T. Framing: El encuadre de lasnoticias. El binômio
BERKOWITZ, D. Telling the Unknown through the Familiar: terrorismo-medios. 1ª ed. Buenos Aires: La Crujía, 2007.
Collective Memory as Journalistic Device in a Changing Media SÁDABA, T. New Hampshire Special. Time, v. 171, n. 3,
Environment. In: NEIGER, M.; MEYERS, O.; ZANDBERG, E. jan. 2008. Disponível em: <http://www.time.com/time/co-
(Orgs.) On media memory: Collective memory in a new me- vers/0,16641,20080121,00.html>.
dia age. Palgrave Macmillan, 2011, p. 201-212. SÁDABA, T. Why politics will never be the same. V. 171, n.
COLLING, L. Agenda-setting e framing: reafirmando os efeitos 24, jun. 2008. Disponível em: <http://www.time.com/time/co-
limitados. Revista Famecos, n. 14, Porto Alegre, p. 88-101, abr. vers/0,16641,20080616,00.html>.
2001. SÁDABA, T. CommemorativeIssue: Presidente-elect Barack
CROTTY, W. Policy and Politics: The Bush Administration Obama.Vol.172, n.20, 17/11/08. Disponível em: <http://www.
and the 2008 Presidential Election. Publicação online, p. 282– time.com/time/covers/0,16641,20081117,00.html>.
311, maio 2009. SÁDABA, T. InaugurationPreview: GreatExpectations.
ENTMAN, R. M. Framing: Toward Clarification of a Fractured Vol.173, n.3, 26/01/09. Disponível em: <http://www.time.com/
Paradigm. Journal of Communication, p. 51-58, 1993. time/covers/0,16641,20090126,00.html>.
FIPP, World Magazine Trends. 2010-2011. Disponível em: SÁDABA, T. CommemorativeIssue: Presidente Barack Oba-
<http://www.fipp.com/News.aspx?PageIndex=2002&Item ma.Vol.173, n.4, 02/02/09. Disponível em: <http://www.time.
Id=15733> com/time/covers/0,16641,20090202,00.html>.
HARTOG, F. Regimes de historicidade: presentismo e experi- Por que ele é a grande esperança nas eleições americanas. Veja,
ências do tempo. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2013. ed. 2043, jan. 2008. Disponível em: <http://veja.abril.com.br/
KITCH, C. Keeping history together: the role of social memory acervodigital/home.aspx>.
in the nature and functions of news. Revista Aurora, p. 64-71, Ele pode ser o homem mais poderoso do mundo. Veja, ed.
2011. ­ 2064, jun. 2008. Disponível em: <http://veja.abril.com.br/acer-
KITCH, C. Obamabilia and the Historic Moment: Institutional vodigital/home.aspx>.
Authority and ‘Deeply Consequential Memory’ in Keepsake Edição Especial: Eleições Norte-Americanas. Veja, ed. 2086,
Journalism. In: NEIGER, M.; MEYERS, O.; ZANDBERG, E. nov. 2008. Disponível em: <http://veja.abril.com.br/acervodi-
(Orgs.) On media memory: Collective memory in a new me- gital/home.aspx>.
dia age. Palgrave Macmillan, 2011, p. 189-200. Especial Estados Unidos. Veja, ed. 2096, jan. 2009. Disponível
KOSELLECK, R. Futuro Passado: Contribuição à semântica em: <http://veja.abril.com.br/acervodigital/home.aspx>.
dos tempos históricos. Rio de Janeiro: Contraponto, 2006. A frieza do presidente Power Point. Veja, ed 2098, jan. 2009. Dis-
MAIA, R. Debates públicos na mídia: enquadramentos e troca ponível em: <http://veja.abril.com.br/acervodigital/home.aspx>.
pública de razões. Revista Brasileira de Ciência Política, n. 2, ZELIZER, B. Why memory’s work on journalism does not
Brasília, p. 303-340, jul. - dez. 2009. reflect journalism’s work on memory. In: Memory Studies.
POMIAN, K. Tempo/temporalidade. In: ROMANO, R. Enci- SAGE Publications, 2008, p. 79-87.

Líbero – São Paulo – v. 18, n. 35, p. 99-110, jan./jun. de 2015


Michele da Silva Tavares / Elton Antunes – Jornalismo, memória e mito: um olhar sobre a vitória de Barack...

Você também pode gostar