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CARAGUATATUBA - SP
2020
DANIELE BUENO DA SILVA
CARAGUATATUBA – SP
2020
BANCA EXAMINADORA
Presidente: Prof.
AGRADECIMENTO
Gratidão é a palavra que me define neste momento. É o momento de poder agradecer a todas
as pessoas por tudo que me foi passado em face de aprendizado.
Gratidão a Deus, por ter me fortalecido e me orientado nos momentos mais difíceis, pois ele é
minha base e minha estrutura.
Gratidão a meus pais, que foram meus grandes apoiadores, pois sem eles eu definitivamente
não teria chegado até aqui.
Gratidão ao meu marido Eduardo, que foi meu alicerce em todos os momentos dessa jornada.
Gratidão aos meus filhos Felipe e Eduardo, por toda compreensão que tiveram com minhas
ausências.
Ao meu prezado orientador, Dr. Marcelino Sato Matsuda pela excelente orientação durante a
elaboração deste trabalho, por toda a dedicação e amizade durante a minha vida acadêmica.
Não poderia deixar jamais de agradecer aos meus professores de graduação, Alexandre Motta,
Mozart Morais, Carlos Alberto, Renildo, Moaci, Fernanda Nicacio, dentre outros, que me
passaram muito além de teoria, me passaram aprendizados que levarei para o resto da vida,
pois compartilharam, e ainda compartilham, todo o conhecimento jurídico e de suas vidas.
Gratidão a todos os meus amigos que dividiram comigo essa trajetória, compartilhando
momentos de alegria, de tristeza e de angústias, em especial, Maria Michelina, Rafael Gomes,
Thais Moreira, Marilene, Ayrla, Natali Bocato. Sem vocês, esses cinco anos de graduação não
teriam sido os mesmos.
“A grandeza não consiste em receber honras, mas
em merecê-las”
(Aristóteles)
RESUMO
O presente trabalho visa demonstrar a impossibilidade de desconstituição da paternidade
socioafetiva, conceito este que tem se consolidado nas atuais doutrinas e jurisprudências. Esse
instituto tem como base a posse do estado de filho e a convivência duradoura, abordando as
diversas mudanças no âmbito familiar até chegar ao contexto atual, apresentando uma breve
evolução legislativa no Direito de Família e como foi instaurada a paternidade socioafetiva no
ordenamento jurídico brasileiro. Versa ainda sobre as alterações sofridas no Código Civil de
1916 traçando um comparativo entre este e o Código Civil de 2002, citando a importância do
afeto e das mudanças realizadas pela Constituição Federal de 1988.
ABSTRACT
The present work aims to demonstrate the impossibility of deconstitution of socio-affective
paternity, a concept that has been consolidated in current doctrines and jurisprudence. This
institute is based on the possession of the child's state and the long-lasting coexistence,
approaching the several changes in the family scope until reaching the current context,
presenting a brief legislative evolution in Family Law and how the socio-affective paternity
was established in the Brazilian legal system. It also discusses the changes made to the Civil
Code of 1916, drawing a comparison between it and the Civil Code of 2002, citing the
importance of affection and the changes made by the 1988 Federal Constitution.
INTRODUÇÃO.........................................................................................................................9
1. FAMÍLIA.............................................................................................................................10
1.1 CONCEITO DE FAMÍLIA.................................................................................................12
1.2 ORIGEM E EVOLUÇÃO DA FAMÍLIA..........................................................................13
1.3 A FAMÍLIA NA HISTÓRIA DO CONSTITUCIONALISMO BRASILEIRO.................14
1.4 A CONCEPÇÃO DE FAMÍLIA ENTRE O CÓDIGO CIVIL DE 1916 E O CÓDIGO
CIVIL DE 2002.........................................................................................................................17
2. FILIAÇÃO...........................................................................................................................21
2.1 ESPÉCIES DE FILIAÇÃO.................................................................................................22
2.2 DO RECONHECIMENTO DOS FILHOS.........................................................................24
2.4.1. Modos de reconhecimento dos filhos...........................................................................25
3. PRINCÍPIO DA SOCIOAFETIVIDADE........................................................................28
3.1 APLICABILIDADE DO PRINCÍPIO DA SOCIOAFETIVIDADE..................................28
3.2 ENTENDIMENTOS JURISPRUDENCIAIS.....................................................................29
CONCLUSÃO........................................................................................................................302
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS..................................................................................34
9
INTRODUÇÃO
O direito de família vem passando por inúmeras mudanças, tendo em vista que, com a
metamorfose que vem ocorrendo na sociedade desde o império romano, ocorre a necessidade
de mudanças no ordenamento jurídico, pois o direito precisa se adequar a realidade da
sociedade no momento atual, tendo as decisões reavaliadas, mobilizando os moldes atuais de
família e os direitos de filiação, pois o Novo Código Civil não deu a devida prioridade no que
se refere a paternidade socioafetiva, destacando-se apenas a paternidade no conceito
biológico, não tendo a devida notoriedade dos legisladores. Porém as novas teorias das
doutrinas modernas e diversas jurisprudências estão se encarregando de preencher essa
lacuna.
Em que pese o bem estar da criança, o direito de família da prioridade e primazia ao
interesse da mesma, diante de tantas transformações no direito de família, o cenário atual se
baseia no vínculo de amor e afetividade não priorizando somente os laços sanguíneos, ou seja,
a afeição e o carinho se manifestam nos princípios constitucionais de maneira implícita.
Podemos encontrar a evolução social da família brasileira nos fundamentos do princípio da
afetividade em nossa constituição, equivalendo-se ao respeito à dignidade da pessoa humana.
Tendo em vista a evolução histórica que a definição de família vem sofrendo até os
dias atuais, uma das grandes conquistas foi à promulgação da Constituição Federal de 1988,
onde foi igualada a filiação, decretando que todos os filhos são filhos, independentemente de
sua origem. Nos referidos artigos, todos os filhos são iguais, independentemente de sua
origem (art. 227, §6°); a adoção, como escolha afetiva, equipara-se integralmente a igualdade
de direitos (art. 227, §§5° e 6°); a comunidade composta por qualquer dos pais ou seus
descendentes, incorporando-se os filhos adotivos, tem a mesma proteção da família
constitucionalmente amparada (art. 226,§4°); (art.227, caput) o direito a convivência familiar,
sem distinção de origem biológica, é absolutamente assegurada à criança e ao adolescente.
(LOBO, 2019, p. 73).
Os artigos mencionados aduzem mudanças para ambientes familiares promovendo
grande relevância no que diz respeito à filiação socioafetiva, que perante o ponto de vista
sociológico, aponta para a adequada confraternização entre os membros da família,
cumprindo com os direitos e deveres, tendo respeito e afeto, direcionando para a efetiva
convivência de ordem familiar. Para essa nova definição de paternidade, podendo ser exercida
também pela mãe, tem sido criada uma nova visão, sendo desempenhadas as funções que
suprem a criança em todos os aspectos.
10
1. FAMÍLIA
O termo família procede à expressão de origem latina de famulus que tem seu
significado como “escravo doméstico”, termo este destinado aos trabalhadores legais da
agricultura familiar das tribos ladinas.
A unidade social mais antiga do ser humano pode ser considerada a família, pois
ascende desde antes das formações das comunidades, sendo estabelecidas pela união de
pessoas com um ancestral em comum ou através da celebração que resulta no matrimônio,
onde todos os membros têm obrigações morais entre si, unindo todos que compartilhavam o
mesmo laço sanguíneo de parentesco em uma mesma região, essa união passou a ser
conhecida como clã.
As comunidades foram aumentando e as entidades familiares passaram a se unir
formando grupos compostos não mais somente pelos ascendentes, mas corporações
compostas pelos descendentes, resultando nas primeiras sociedades humanas originadas pelas
relações de parentesco sanguíneo (MIRANDA, p. 57, 2001).
De modo geral, podemos definir família como sendo a união de pessoas que integram
o mesmo grupo com objetivos em comum, pela possibilidade de manifestação de afeto e
amor, através da convivência diária, adquirindo estabilidade de relações intersubjetivas
(PASSOS, 2017).
A palavra família pode ser relacionada como um conjunto de pessoas que possuem
laços de parentesco entre si e compartilham o mesmo lar. Partindo desse ponto, família é tida
como a junção da mãe e pai, unidos pelo matrimônio, com um ou mais filhos, tendo a
responsabilidade de promover educação para os mesmos, como hábitos sociais, valores
morais, éticos e de cidadania, quanto educação escolar, sendo ambas fundamentais para o
desenvolvimento e socialização da criança.
Independente da composição que cada família apresente, a unidade familiar deve ser
proporcionada por um ambiente seguro e harmonioso, proporcionando bem estar aos
integrantes da família e apoio na resolução dos problemas que podem aparecer.
O direito à igualdade sobre essa nova visão de família tem trazido mudanças no
cenário atual do Direito Familiar, sendo cada vez mais exigível, no que tange uma tutela
jurídica em relação à liberdade de constituição, convivência e dissolução da relação de
família.
Segundo art. 226 da Constituição brasileira (1988) a união entre pessoas cujos laços
sanguíneos se entrelaçam tornando-se similares entre si, laços afetivos de convivência e
baseados no afeto é designada família.
11
Família é um conceito que tem se tornado cada vez mais abrangente e flexível, dentre
os tipos conhecidos de família, a família classificada como tradicional, conhecida também
como nuclear é composta por pai, provedor da casa; mãe, cuidadora da família, e seus filhos e
vem sendo substituída por novos tipos de família e igualdade nos direitos, o entendimento
jurídico vem sofrendo alterações e, atualmente, comporta vários tipos de agregado familiar e
visa dar conta de toda a complexidade dos fatores que unem as pessoas.
Diversas formas de união estabelecidas pela relação afetiva, além da sanguínea, entre
os seus membros têm sofrido modificações, o conceito de família abrange diversas formas de
organizações fundamentadas nessa relação afetiva, tornando esse conceito mais moldável e
amplo e, atualmente, o direito brasileiro recentemente assumiu que a constituição familiar tem
como base o afeto, tornando os conceitos anteriores baseados no matrimônio e procriação
obsoletos (MENEZES, 2020).
Ao longo dos anos até a chegada dos dias atuais, as formas e definições do significado
de família passaram por diversas alterações, tendo como entendimento jurídico alguns tipos
de agregados familiares estendendo a composição da família para além dos laços
matrimoniais e filhos.
12
1
Maria Berenice Dias é Desembargadora aposentada do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, Advogada
especializada em Direito das Famílias, Sucessões e Direito Homoafetivo e atualmente Vice-Presidente Nacional
do Instituto Brasileiro de Direito de Família _ IBDFAM.
13
O conceito de família vem sendo alterada, pois o pluralismo das relações familiares ao
longo dos anos vem assumindo uma maior amplitude, não se tratando mais de conceito rígido
ou imutável. O Código Civil de 2002 traz apenas alguns modelos de família entre as
diversidades.
“A constância da relação entre pais e filhos caracteriza uma paternidade que existe
não pelo simples fato biológico ou por força de presunção legal, mas em decorrência
de uma convivência afetiva. Constituído o vínculo da parentalidade, mesmo quando
desligado da verdade biológica, prestigia-se a situação que preserva o elo da
afetividade. Pai afetivo é aquele que ocupa, na vida do filho, o lugar do pai,
desempenha a função de pai. É uma espécie de adoção de fato. É aquele que ao dar
abrigo, carinho, educação, amor ao filho, expõe o foro mínimo da filiação,
apresentando-se em todos os momentos, inclusive naqueles em que se toma a lição
de casa e ou verifica o boletim escolar. Enfim, é o pai das emoções, dos sentimentos
e é o filho do olhar embevecido que reflete aqueles sentimentos que sobre ele se
projetam” (DIAS, 2016).
Kátia Regina (p. 05, 1999) enuncia que a formação das famílias era diferente a
depender da região que se situavam, ou seja, não havia homogeneidade nas estruturas
familiares ou nos grupos de regiões espaciais ou diferentes.
As unidades familiares de uma determinada região poderiam ser formadas
unicamente pela união de um homem e uma mulher, já em outras famílias essa união
poderia ter como base unidades matriarcais ou, também, patriarcais com pluralidade de
mulheres, ou seja, poliginia, e, menos frequente, mas não inexiste, o contrário, a união de
uma mulher com vários homens, conhecido como poliandria.
Conforme a evolução da sociedade foi passando o tempo e, somado à um
aumento populacional, o Estado começou a ter uma maior interferência nos
relacionamentos matrimoniais, a Igreja Católica também começou interferir impondo a
união conjugal para validação da entidade familiar.
Na fase da Idade Moderna, o conceito família começou a ter cada vez mais
normatizações, pois o Estado regulamentou códigos e leis que regulavam, dentre diversos
assuntos, as relações familiares.
O fator sanguíneo é apenas um dos meios para formação do conceito de família,
podendo estar atrelado a fatores culturais, econômicos e religiosos. Em consequência das
constantes transformações sociais das famílias o legislador precisa pautar a conceituação
jurídica do termo, apoiando-se ao auxílio da hermenêutica para se aliar a uma norma dos
padrões atuais (GONÇALVES, p.15, 2008).
"§ 4º "A República só reconhece o casamento civil, cuja celebração será gratuita".
Ainda no parágrafo 7º do mesmo artigo apregoou que nenhum culto ou igreja gozará
de subvenção oficial, nem terá relações de dependência ou aliança com o Governo
da União ou dos Estados.
Art 144 - A família, constituída pelo casamento indissolúvel, está sob a proteção
especial do Estado.
Parágrafo único - A lei civil determinará os casos de desquite e de anulação de
casamento, havendo sempre recurso ex officio, com efeito suspensivo.
Art 145 - A lei regulará a apresentação pelos nubentes de prova de sanidade física e
mental, tendo em atenção as condições regionais do País.
Art 146 - O casamento será civil e gratuito a sua celebração. O casamento perante
ministro de qualquer confissão religiosa, cujo rito não contrarie a ordem pública ou
os bons costumes, produzirá, todavia, os mesmos efeitos que o casamento civil,
desde que, perante a autoridade civil, na habilitação dos nubentes, na verificação dos
impedimentos e no processo da oposição sejam observadas as disposições da lei
civil e seja ele inscrito no Registro Civil. O registro será gratuito e obrigatório. A lei
estabelecerá penalidades para a transgressão dos preceitos legais atinentes à
celebração do casamento.
Parágrafo único - Será também gratuita a habilitação para o casamento, inclusive os
documentos necessários, quando o requisitarem os Juízes Criminais ou de menores,
nos casos de sua competência, em favor de pessoas necessitadas.
Art 147 - O reconhecimento dos filhos naturais será isento de quaisquer selos ou
emolumentos, e a herança, que lhes caiba, ficará sujeita, a impostos iguais aos que
recaiam sobre a dos filhos legítimos.
“Art 144 - A família, constituída pelo casamento indissolúvel, está sob a proteção
especial do Estado.
Parágrafo único - A lei civil determinará os casos de desquite e de anulação de
casamento, havendo sempre recurso ex officio, com efeito suspensivo.”
O Decreto Lei 4.737, de 24 de setembro de 1942, continha apenas dois artigos, onde,
em seu artigo 1º possibilita o filho concebido fora do matrimônio e após a separação do
cônjuge, ser reconhecido ou litigar que fosse declarada sua filiação.
18
Ainda no final da década de 40, a Lei 883/49 revogou o Decreto Lei e ampliou a
possibilidade de reconhecimento da paternidade do filho dito como não legítimo, permitindo
que qualquer dos cônjuges, após a dissolução do casamento, fizesse este reconhecimento, bem
como ao filho a possibilidade de ação para declaração de filiação (FACHIN, 2012).
O modelo de família patriarcal, predominante até o presente momento da década de
60, começou a entrar em declínio. De acordo com Eduardo Leite (2000, p.65):
Entre os principais artigos relativos ao direito de família estão o Artigo 888, inciso
VI, que possibilitava ao juiz ordenar ou autorizar o afastamento temporário de um dos
cônjuges da morada do casal; e o Artigo 155, inciso II, que determinava o segredo de justiça
para ações sobre casamento, filiação, desquite, separação de corpos, alimentos e guarda de
menores (SILVA, 2002).
Em 26 de dezembro de 1977 foi promulgada a Lei 6.515, conhecida como a Lei do
Divórcio, que foi considerada como uma revolução no Direito de família.
A partir desta lei, o princípio da indissolubilidade do matrimônio foi completamente
abolido. Cumpre ressaltar que diferentemente do desquite, o divórcio rompe totalmente o
vínculo conjugal, permitindo a criação de um novo vínculo.
Esta lei também alterou a Lei 883/1949, permitindo o reconhecimento de filho havido
fora do matrimônio ainda na vigência do casamento, desde que em testamento cerrado.
Porém, os filhos incestuosos continuavam sem ter direito ao reconhecimento (SILVA, 2002).
Lei 6.697, de 10 de outubro de 1979 instituiu o Código de Menores, que tinha como
objetivo a proteção, assistência e vigilância a crianças com idade inferior a maior idade,
especialmente em relação ao menor em situação irregular. Em 1984, a Lei 7.250 surgiu para
acrescentar um parágrafo à Lei 883/49, que passou a autorizar o reconhecimento do filho
concebido fora do casamento pelo cônjuge separado há mais de 5 anos corridos
(PEREIRA,2009).
Diante do quadro das décadas passadas, a permissão para o reconhecimento de um
filho fora do casamento reconhecido por lei, foi uma grande conquista, tendo atingido seu
ponto máximo em 1988 com a Constituição Federal, tida como um marco no Direito da
família e, finalmente, através do texto constitucional, a igualdade de direitos para os filhos
havidos dentro ou fora do casamento (PEREIRA, 2009).
Com a implementação da Constituição Federal de 1988, o direito passou a admitir
formas diferentes de constituição de família, que são chamadas de entidade familiar e vão
além da família formada pelo casamento e que incluem também a união estável e as famílias
monoparentais. Há o reconhecimento de que a família não é apenas de forma singular e sim
plural. Conforme explica José Boeira (1999, p.23):
Art. 26. Os filhos havidos fora do casamento poderão ser reconhecidos pelos pais,
conjunta ou separadamente, no próprio termo de nascimento, por testamento,
mediante escritura ou outro documento público, qualquer que seja a origem da
filiação. Parágrafo único. O reconhecimento pode preceder o nascimento do filho ou
suceder-lhe ao falecimento, se deixar descendentes.
Art. 27. O reconhecimento do estado de filiação é direito personalíssimo,
indisponível e imprescritível, podendo ser exercitado contra os pais ou seus
herdeiros, sem qualquer restrição, observado o segredo de Justiça
Há uma mudança de enfoque, do Código Civil de 1916 que via o casamento com o
objetivo de constituir família, para a possibilidade de existência de família sem a necessidade
de casamento, sendo este apenas uma das formas de constituição daquela. Com relação aos
filhos, reafirma a norma constitucional de igualdade entre os filhos havidos dentro e fora do
casamento, bem como os adotados, além de ampliar o conceito de presunção de paternidade e
promover uma abertura no conceito de filiação (GOMES, 1998).
2. FILIAÇÃO
Para uma melhor compreensão sobre filiação é necessário destacar o instituto do
parentesco, base de inúmeras relações que diz respeito à família. Silvio de Salvo Venosa
descreve o instituto de parentesco como sendo o vínculo de união entre duas ou mais
pessoas, descendendo uma da outra com um genitor comum (2011, p. 215).
Diante da equiparação constitucional dos filhos, prevista no artigo 227, §
6° da Constituição Federal:
Art. 1.596. Os filhos, havidos ou não da relação de casamento, ou por adoção, terão
os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações
discriminatórias relativas à filiação.
Segundo o Código Civil de 2002, à origem do filho pode ser biológica ou não
biológica, mas ambos os filhos têm os mesmos direitos e qualificações. É taxativo ao
determinar que são proibidas designações discriminatórias aos filhos havidos ou não do
casamento ou aos adotados, e que ambos têm os mesmos direitos e qualificações.
Na filiação biológica estão incluídos os filhos concebidos pela relação entre a mãe e o
pai ou ainda por inseminação artificial homóloga., dentro da filiação não biológica
encontram-se a filiação por adoção, por inseminação artificial heteróloga e em virtude da
posse de estado de filho.
A paternidade constante do Registro Civil é denominada por paternidade jurídica,
estabelecendo os direitos da criança relativos à filiação. uma vez que é ela quem estabelece,
juridicamente, os direitos da criança relativos à filiação.
Segundo Carlos Roberto Gonçalves (2011, p. 318), filiação é a relação jurídica que
liga o filho a seus pais. É, portanto, um estado status familiae, e os tipos de filiação são:
I- Filiação legítima: filiação legítima que surge do casamento, com base na probabilidade
incisos I e II do artigo 1597 do Código Civil:
23
A paternidade é presumida pela relação do cônjuge com sua mulher, acordo com o
qual é presumida a paternidade do marido em relação ao filho da mulher casada.
Diante dessa conjectura, é evidenciada que os filhos tidos na continuidade do
casamento não precisam ser reconhecidos, vide que a paternidade decorre da união dos pais.
II - Filiação ilegítima: esse tipo de filiação é resultante de filhos que foram tidos a partir de
relações extraconjugais e os filhos provenientes dessa relação podem ser classificados como:
a) Naturais, ou seja, o pai e a mãe não tinham nenhum impedimento matrimonial quando
foram concebidos;
b) Espúrios, no caso, diferente dos classificados como naturais, seriam filhos que foram
concebidos quando uma das partes tinha um conjugue, foi cometido adultério.
Quando o pai ou a mãe tomam a decisão de reconhecer o filho, uma vez declarada à
vontade, a ação passa a ser irrevogável e irrefutável, sendo apenas anulada se for comprovada
coação, erro ou estiver em desacordo com alguma formalidade legal.
O reconhecimento pode ser feito através de testamento, declaração expressa nos autos
ou no próprio termo do nascimento, Para ser de fato reconhecida à paternidade é necessário
uma sentença proferida em ação pela criança ou pelo responsável legal, a partir daí é
processada uma investigação para comprovação de paternidade que é realizada mediante à
ação ordinária, onde, quando comprovado o laço sanguíneo, permitirá o herdeiro a ter todos
os direitos consectários dos irmãos, como direito à pensão alimentícia, custear gastos com
saúde, escola, moradia, propor ação de petição de herança e nulidade de partilha, além do
pátrio poder.
III- filiação socioafetiva: a filiação socioafetiva é diferente das demais, porque ela é
decorrente de um vínculo afetivo, estabelecendo uma relação construída pelo vínculo paterno-
filial, onde decorre da vontade de ambas as partes.
24
Maria Helena Diniz afirma que o reconhecimento voluntário é um meio legal para que
os pais possam validar o vínculo entre os filhos, em que pese o art 1607 do Código Civil do
status de filho:
Esse ato é irrevogável, de eficácia erga ommes, não sendo então admitido qualquer
tipo de arrependimento, não permite que o reconhecimento seja impugnado, exceto com a
comprovação de algum erro no registro ou falsidade ideológica (CC 1.604) em razão do art
1614 do mesmo Código, a condição de sua eficácia ao consentimento do filho maior e dar ao
filho menor a prerrogativa de impugná-la, sob pena de decadência, estando amparado pelos
anos que se seguirem até atingir a maioridade ou emancipação, mediante a ação de
contestação de reconhecimento.
Outro ponto importante a ser destacado, foram alguns ajustes realizados no
provimento 63/2017 do CNJ. É possível perceber que o CNJ agiu de maneira equilibrada ao
manter a essência do provimento quando alterou alguns artigos de sua redação, para atender o
pedido de correntes envolvidas com o tema.
Sua alteração se dá pelo provimento 83/2019, que produziram ajustes nos
procedimentos de registro extrajudicial da filiação socioafetiva, autorizando o reconhecimento
voluntário em cartórios de pessoas acima de 12 anos.
Com as novas alterações em seus artigos, houve uma configuração nos critérios para a
paternidade/maternidade socioafetiva, ou seja, deve ser de maneira estável e exteriorizada
para a sociedade. Para o STF a posse do estado de filho se demonstra com três critérios:
tratamento (tractatio), reputação (reputatio) e nome (nominatio).
O reconhecimento é feito apenas pelos pais, efetivando sua validade através de um
procurador munido de poderes especiais e expresso, independentemente da prova de origem
genética, por se tratar de um reconhecimento opcional de paternidade, pois é um ato
espontâneo, nobre, público e incondicional, portanto, o Estado afirma que a filiação não pode
estar sujeita a termo, não permitindo que qualquer condição seja estabelecida (Código Civil
1613).
Maria Helena Diniz afirma que o reconhecimento, da filiação, independentemente de
sua origem é ato solene e irrevogável, que obedece a forma prescrita no Código Civil art.
1609, I a IV e seu reconhecimento pode ser feito conjunta ou separadamente pelos pais (CC
1607), atestando o reconhecimento do filho e atribuindo todos os direitos pertencentes à
filiação, sendo o pai o declarante, perante a afirmação da legitimidade da paternidade perante
o nascimento de um filho, a mãe só poderá recorrer a falsidade do registro provando a
falsidade do termo ou das declarações nele contidas (CC, art. 1.608), no entanto, um registro
de nascimento feito por quem não sabia ser o verdadeiro pai é tido como adoção simulada e
gera paternidade socioafetiva.
27
Maria Helena Diniz ressalta que o reconhecimento judicial de filho resulta de sentença
proferida em ação intentada para esse fim, pelo filho, tendo, portanto, caráter pessoal, embora
os herdeiros do filho possam continuá-la (CF, art. 227, §6º). Trata-se de direito
personalíssimo e indisponível, por isso, a ação é privativa do filho.
A legitimidade ativa é dele. Se menor será representado pela mãe ou tutor. Os efeitos
da sentença que declara a paternidade são os mesmos do reconhecimento voluntário e também
ex tunc: retroagem à data do nascimento e deverá, para tanto, ser averbada no registro
competente. Para que ocorra esse reconhecimento é necessário ajuizar ação de investigação de
paternidade/maternidade, o que lhes recai a legitimidade passiva, desde que se observem os
pressupostos legais de admissibilidade de ação, considerados como presunções de fato (CC,
art. 1.615).
28
3. PRINCÍPIO DA SOCIOAFETIVIDADE
O princípio da afetividade é o pilar da existência das famílias reconstituídas (famílias
formadas por pessoas solteiras, viúvas, divorciadas, dentre outras). Em tese, a afetividade faz
com que vários tipos de famílias se conectem em busca de um único propósito,
independentemente de consanguinidade.
Podemos citar uma nova modalidade de família que embora não sendo ainda
positivada pela lei, com seus direitos reconhecidos em nossas jurisprudências e recentemente
estabelecidos pelo Supremo Tribunal Federal, é a família Homossexual, que tem sua ligação
puramente no afeto, não podendo gerar seus descendentes biológicos.
A afetividade vem ganhando sua força de uma maneira tão intensa no direito de
família, que diversos doutrinadores renomados como Paulo Lôbo, Maria Berenice Dias, entre
muitos outros, estão se referindo à existência de um “princípio da afetividade”.
Para esses doutrinadores a afetividade traz em seu bojo as famílias da atualidade,
mostrando de forma explicita que a paternidade não se fundamenta em material genético, mas
sim em laços de afeto.
Para Rose Venceslau (2004), a afetividade é um princípio jurídico constitucional,
posto que a Constituição Federal considera para efeitos jurídicos os “filhos biológicos aos
adotivos” respeitando a escolha de seus pares. A afetividade como fato gerador de relações
familiares é assegurada constitucionalmente em seus artigos 226 e 227, trazendo de maneira
clara que o afeto transcende o fator sociológico e o biológico.
Existe inegável reconhecimento do princípio afetivo, uma vez que de início como
primeira consequência, contribui para constatação jurídica da união homoafetiva, expressão
usada por Maria Berenice Dias, como entidade familiar.
Durante muitos anos houve uma absoluta negação desses direitos, até chegar ao fato
da existência em sociedade, enquadrando este no conceito de família, pare efeitos de união
estável. Fato esse que contemplou a conclusão histórica do STF em 5 de maio de 2011,
publicada pelo informativo n° 625.
29
Uma segunda análise a ser apontada foi a aprovação de reparação por danos
resultados do abandono afetivo. O STJ em decisão anterior concluiu que não incumbiria
indenização por abandono moral (STJ, REsp757.411/MG, Rel. Min. Fernando Gonçalves,
quarta turma, julgado em 29 de novembro de 2005, pontuando não ser possível a imposição
de afeto na referida relação, não havendo a existência um dever jurídico para a convivência.
Após a referida decisão, mostrando de forma mais evolutiva, o próprio STJ revisou
sua decisão admitindo a reparação civil, alegando caber indenização por abandono afetivo
(STJ, REsp1.159.242/SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, terceira turma, julgado em 24/04/2012,
DJe 10/05/2012). Em seus dizeres, a Min. Nancy Andrighi enfatiza que, é dever dos pais dar
apoio moral e psicológico aos filhos, sendo esta uma inevitável obrigação; sobrepondo a ideia
de cuidado como conotação jurídica.
A magistrada impondo sua tese, acrescentou a presença do ilícito e da culpa pelo pai
que abandona afetivamente seu filho, repetindo por diversas vezes a frase usual nos meios
sociais “amar é faculdade, cuidar é dever”.
Fica exposto de forma clara que, quando houver uma lide judicial envolvendo pais e
filhos menores, o caso terá prioridade, cabendo ao magistrado a decisão na utilização dos
princípios constitucionais. Regulamentado pela lei n° 12.376/2010 – Lei de introdução as
normas do direito brasileiro – LINDB art. 4° que estabelece assim: “Quando a lei for omissa,
o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais do direito”
Em consoante análise com o tema, foi possível verificar de forma mais abrangente a
respeito da paternidade socioafetiva, elemento identificador da relação familiar.
É notório que a decisão do Tribunal de Justiça de Santa Catarina proveu de forma
ímpar ao apelo dos filhos afetivos “enteados” que pleitearam o reconhecimento da
paternidade socioafetiva post mortem em razão da extensa convivência entre eles, pois ficou
provado não somente o afeto mas, todo os encargos anexados a paternidade, bem como,
gastos com saúde, educação e até mesmo horas de laser.
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É inteligível que nesse entendimento está de maneira ampla o que se estabelece no art.
226, §7° da Constituição Federal, ou seja, é vedada qualquer forma de coercitividade por
parte de instituições oficiais ou privadas. Não sendo necessário para configurar a relação entre
as partes o fator consanguíneo.
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CONCLUSÃO
Com a evolução que vem ocorrendo com o passar dos anos, o termo família sofreu
inúmeras modificações no contexto familiar e alterações do ordenamento jurídico. A entidade
familiar pode apresentar em sua constituição o matrimônio, a união estável ou a formação de
uma nova família tanto por parte da mãe, como por parte do pai, e seus descendentes, tendo
uma relação baseada no vínculo afetivo.
Atualmente, o que mais é admissível é o laço de afeto, pois, com a flexibilidade da
sociedade atual, muitas famílias são formadas baseadas nesse contexto.
Deste modo, a família com os pilares da concepção romana alicerçada no contexto
patriarcal, abriu espaço para os tipos mais variados de organizações familiares, tendo como
objetivo principal o suporte emocional do indivíduo.
Família é a base para uma relação psicológica positiva da criança tanto no ambiente
familiar como no convívio em sociedade e para formação de seu caráter, portanto, é
imprescindível que, independentemente do tipo de família que essa criança pertença, o
contexto familiar precisa ser saudável, e acima de tudo, seguro.
Diante disso, é claramente entendível que paternidade não é um atributo somente
concedido ao pai biológico, tendo em vista que, a função de pai está atrelada ao convívio
familiar e suprimento das necessidades emocionais, sociais e financeiras.
Um conflito levado aos autos acerca da paternidade referente a junção originária de
reconhecimento voluntário, praticado por probidade de formação biológica de outrem,
necessita de uma solução de um ponto de vista humanizado, tendo em vista que a criança não
é um objeto ao qual apodera-se o pai para aquisição de geração biológica alheia.
A paternidade socioafetiva é irrevogável, principalmente se a relação já foi
estabelecida, tendo, uma relação de pai e filho entre os envolvidos, apesar do fato de não
haver previsão legal, não significa que há inexistência de direito à tutela jurídica, a legislação
deve adequar-se a essa nova realidade, trazendo o sentido à vida das pessoas que dependem
desse amparo para soluções de conflitos existentes entre paternidade socioafetiva e biológica.
Entende-se que, o Estado tem o dever de cumprir com sua função social e
amparar a vida na sociedade, reorganizando sua imposição de conduta, assim,
regulamentando normas que devem ser respeitadas por todos.
Na presença de vazios legais, o reconhecimento de direitos deve ser observado e
implementado pelo Estado juiz, que não deve negar proteção jurídica e nem mesmo deixar de
assegurar o direito sob argumentos de ausência de lei, tendo em vista que, com a promulgação
da Constituição Federal de 1988 as questões no direito de família, ganharam reconhecimento
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na pluralidade desta, trazendo amparo e proteção à nova ordem familiar que vem se
desenvolvendo.
A constitucionalização do direito civil é indução para readaptar as relações de família,
tornando-se assim, a afetividade um princípio fundamental da filiação, alçada na Constituição
da República Federativa do Brasil de 1988.
Para uma melhor compreensão dessa evolução na igualdade da filiação, devemos
observar o caminho que o direito de família vem percorrendo, para então, obtermos uma
melhor análise da filiação socioafetiva.
Hodiernamente, na doutrina majoritária, defende-se que a paternidade socioafetiva se
sobrepõe à biológica, inclusive é nutrido em um aforismo popular à afirmação de que “pai é
aquele que cria e não aquele que contribui com material genético”.
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