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Debates teóricos das relações internacionais, política externa

e a interação entre o nível internacional e o doméstico


Discussion theory of international relations, foreign and interaction between the
international level and domestic
Debates teoría de las relaciones internacionales, la política exterior, y la interacción entre el
nivel internacional y nacional
Tamara Silvana Menuzzi Diverio*
Luiz Gustavo Zuliani Da Silva**
Carlos Guilherme Adalberto Mielitz Netto***

Resumo Introdução
Este artigo tem por objetivo apresentar Cientistas políticos discutiram e indi-
algumas contribuições das teorias de re- caram teorias, buscando compreender os
lações internacionais e dos principais au- eventos e acontecimentos em relações inter-
tores que até hoje provocam debates nes- nacionais. Os modelos teóricos desenvolvi-
sa área de estudos. Neste espaço, serão
*
Economista. Doutora em Desenvolvimento Rural.
destacadas algumas abordagens do tema, Universidade de Cruz Alta e Universidade Regional
tais como o realismo e o neorrealismo, o Integrada do Alto Uruguai e das Missões, campus
Frederico Westphalen. Docente do Mestrado Profis-
liberalismo e o liberalismo neoinstitucio- sional em Desenvolvimento Rural da Universidade
nal. Na sequência, será apresentada uma de Cruz Alta. Email: tdiverio@unicruz.edu.br
revisão da literatura e dos principais con-
**
Economista. Mestre em Desenvolvimento Regional
pela Universidade de Santa Cruz do Sul. Docente
ceitos da análise de política externa, além do Departamento de Ciências Sociais e Aplicadas
da interação entre os níveis doméstico e da Universidade Regional Integrada do Alto Uru-
guai e das Missões, campus Frederico Westphalen.
internacional, utilizando a Teoria dos Jo- E-mail: zuliani@uri.edu.br.
gos de dois níveis, de Putnam. ***
Doutor em Ciência Econômica pela Universidade
Estadual de Campinas. Docente associado da Uni-
versidade Federal do Rio Grande do Sul. E-mail:
Palavras-chave: Política externa. Relações mielitz@ufrgs.br
internacionais. Jogos de dois níveis. Recebido em 02/10/2015 - Aprovado em 28/02/2016
http://dx.doi.org/10.5335/hdtv.16n.1.6268

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dos acabaram possibilitando um avançado mento aumenta tanto o foco a ser analisado
conhecimento, em face da abrangência e da quanto a quantidade de atores que tomam
percepção parcial do mundo, em diversas parte das relações internacionais. Assim
situações políticas ou momentos históricos. sendo, descarta-se a ideia de que os estudos
São muitos os modelos que almejam escla- de relações internacionais seriam restringi-
recer os elementos que compõem a temáti- dos à análise da ação externa do Estado, pois
ca das relações internacionais. Sendo assim, se sabe que na arena internacional existem
há problemas na concepção de uma única muitos atores envolvidos. O referido autor
teoria, pois existem muitas interpretações lembra ainda que a atuação externa dos Es-
possíveis sobre o que representa e que obje- tados e dos diversos atores internacionais
tivos tem esse ramo do conhecimento. Nesse não deverá ser compreendida sem a devida
sentido, o conjunto de teorias que procuram análise das condições internas que a moti-
explicar as relações internacionais é excessi- vam, já que existe um grande vínculo entre
vamente complexo. a percepção ideológica de um governo e sua
Do estudo das relações internacionais, atuação internacional.
não se extrai apenas um único modelo de Inserindo-se nessa temática, este artigo
explicação, que seria aceito pelos diversos apresenta uma revisão de literatura das te-
pesquisadores. A sistemática dos princi- orias de relações internacionais e da análise
pais modelos teóricos parece mais lógica de política externa, além das contribuições
se analisada, sempre que possível, sob uma teóricas que tratam da interação entre os ato-
perspectiva lógico-histórica, pois os fatos res internacional e doméstico, a tomada de
históricos sugerem que, para determinadas decisão e os grupos de interesses. Com isso,
ocasiões, algumas perspectivas teóricas são pretende-se compreender o aprofundamen-
mais adequadas para o estudo das relações to das inter-relações entre atores domésticos
internacionais do que outras. Contudo, tal e internacionais.
separação estanque é impraticável diante da
realidade social que dinamiza os contornos
Concepções teóricas clássicas das
teóricos (CARVALHO, 2007).
Na visão de Seitenfus, relações internacionais: realismo,
[...] as relações internacionais (RI) definem-
neorrealismo, liberalismo e
-se como o conjunto de contatos que se es- institucionalismo neoliberal
tabelecem através das fronteiras nacionais
entre grupos socialmente organizados
Dentro da teoria das relações interna-
(2004, p. 2).
cionais, há uma perspectiva denominada
Nesse sentido, são internacionais todos realismo político, também conhecida como
os fenômenos que transcendem as fronteiras realismo clássico, tradicional ou estatocên-
de um Estado, fazendo com que os sujeitos, trico. As origens dessa corrente estão no
privados ou públicos, individuais ou cole- pensamento de Maquiavel (1469-1527), em
tivos, relacionem-se entre si. Esse discerni- especial, na sua obra O príncipe, e de Thomas

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Hobbes (1615), cuja principal obra é Leviatã. é o protagonista único, não há um protago-
Esses autores são os maiores inspiradores do nista subnacional tentando derrubar a deci-
alargamento desse paradigma.1 O realismo são do governo ou subverter os interesses
político sistematiza suas inquietações em do Estado. A terceira é que os tomadores de
torno de dois conceitos-chave: o poder e o decisão, que agem em nome do Estado, são
conflito. A percepção da natureza humana protagonistas racionais, ou seja, Tucídides
é de uma visão do indivíduo como primor- acreditava que os indivíduos são seres racio-
dialmente egoísta e sedento de poder, logo, nais e tomam decisões ponderando as forças
segurança, glória, prestígio são objetivos a e fraquezas de várias opções em relação à
serem perseguidos. Segundo essa teoria, os meta a ser alcançada. A quarta é que Tucí-
indivíduos são organizados em Estados, e dides, como os realistas contemporâneos,
esses agem de um modo unitário na busca preocupava-se com questões de segurança,
de seu próprio interesse, definido em termos isto é, com a necessidade de o Estado pro-
de poder. teger-se contra inimigos internos e externos.
A origem clássica do realismo é encon- Entre 354 e 430 a.C., o bispo e filóso-
trada na obra História da Guerra do Pelopo- fo cristão Santo Agostinho acrescentou uma
neso, que examina o conflito entre Atenas e premissa fundamental ao realismo, argu-
Esparta, na Grécia. Tucídides (471-400 a.C.) mentando que a humanidade é falha, ego-
é considerado o primeiro autor a tratar de ísta e egocêntrica, embora não predestinada
um assunto central no estudo das relações a ser assim, desse modo, Agostinho atribui a
internacionais: a guerra. Podem-se destacar culpa da guerra a essas características bási-
algumas lições importantes deixadas por cas da humanidade.
Tucídides: os Estados buscam elevar ao má- Já a obra de Nicolau Maquiavel (1532),
ximo seu poder, com a tendência de balan- O príncipe, foi escrita no contexto e período
cear esse poder, os Estados são conduzidos histórico referentes à formação dos Estados
por seus próprios interesses e pela questão na Europa Ocidental, e concentra-se na teo-
da segurança, a cooperação e a lei são secun- ria do poder político e das relações dos po-
dárias, a hegemonia é baseada na legitimi- deres entre os Estados com base na observa-
dade do Estado que detém poder econômi- ção dos comportamentos. Para Maquiavel, a
co e militar, mas exerce sua hegemonia por responsabilidade e a conduta dos governan-
meio de ações ideológicas que o legitimam tes estão desobrigadas de qualquer preceito
enquanto hegemônico (SARFATTI, 2005). moral, vale dizer, uma das características
Mingst (2009) observa que pelo menos básicas do paradigma clássico encontra-se
quatro das premissas principais do realismo no pressuposto que afasta a conduta do Es-
são encontradas na história de Tucídides. A tado e de seus governantes de todo e qual-
primeira é que o Estado é o grande e prin- quer princípio moral, tanto no campo inter-
cipal protagonista na guerra e na política no como externo (OLIVEIRA, 2004).
em geral, como demandam os realistas mais Maquiavel deixou como legado para os
modernos. A segunda é que, como o Estado realistas a ênfase na sobrevivência do Esta-

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do como ator, ou seja, um príncipe sem um uso legítimo da força nas relações interna-
Estado perde todo seu valor. Sendo assim, o cionais é comparável ao estado de natureza,
poder se faz necessário, e o uso da balança de de Hobbes.
poder, assim como de alianças, é crucial para Para os realistas, Tucídides, Maquiavel
lidar com o desafio da segurança. Nogueira e Hobbes destacam elementos de sobrevi-
e Messari (2005) afirmam que a perspectiva vência, tais como poder, medo e anarquia
realista destaca que Maquiavel queria lidar internacional, que compõem as premissas
com o mundo real, e não com o mundo como centrais do realismo nas relações internacio-
deveria ser. Segundo essa leitura, para Ma- nais (NOGUEIRA; MESSARI, 2005).
quiavel, a moralidade que orienta as ações Os realistas operam, portanto, a partir
dos indivíduos não se aplica, nem deveria da hipótese central de que a política mun-
orientar as ações do príncipe. dial desenvolve-se em uma anarquia inter-
Por sua vez, Thomas Hobbes, em Le- nacional: um sistema sem uma autoridade
viatã, apresentou um estado de anarquia predominante ou um governo mundial. O
internacional, ou seja, uma deficiência de Estado é o ator relevante na política mun-
autoridade internacional, na qual os Estados dial e nas relações internacionais. Os outros
contêm precárias regras ou normas. Desse atores (indivíduos, organizações internacio-
modo, impera o estado de natureza e com- nais, ONGs, etc.) são irrelevantes.
petição original, no qual a anarquia é fator Sarfatti (2005) observa que, no realis-
definidor e a guerra uma probabilidade real mo clássico, os Estados são essencialmente
(PECEQUILO, 2004). atores racionais que, para construir sua polí-
Hobbes adentra na teoria do estado de tica externa, calculam coerentemente os cus-
natureza anárquico, marcado pelo Homo ho- tos e benefícios de todas as suas ações. Outro
mini lúpus, no qual vive o ser humano sem destaque é que há nessa perspectiva teórica
regras e sem leis, sem igualdade e sem justi- uma hierarquia entre os assuntos importan-
ça imparcial, pois a sociedade é uma guerra tes de relações internacionais, ou seja, a se-
de todos os homens contra todos os homens, gurança nacional é a matéria mais relevante
na qual apenas o mais forte tem possibilida- na ordem de preferência dos Estados. Desse
de de sobrevivência. Conforme Hobbes, na modo, a segurança é vista como “alta políti-
vida internacional, também não se encontra ca”, enquanto a economia e outros assuntos
qualquer princípio de sociabilidade, uma sociais são percebidos com uma importância
vez que a vida internacional é dominada reduzida e, portanto, como “baixa política”.
por três causas de discórdia: a competição, O realismo clássico entende o conceito
a desconfiança e a glória. Os Estados e os de poder político como processo de concen-
homens combatem-se pela competição, ten- tração e coerção em nível doméstico, e de
tando uns impor o domínio sobre os outros, processo de descentralização, conflitivo, em
podendo, assim, obter a glória (OLIVEIRA, âmbito internacional, introduzindo a figura
2004). Na concepção dos realistas, a ausência do Estado como unidade política, soberana e
de um soberano que tenha o monopólio do suprema (OLIVEIRA, 2004)

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Os realistas adotam o Estado como Morgenthau (2003), que escreveu A política
uma caixa-preta e o adaptam dentro do que entre as nações: a luta pelo poder e pela paz,
chamam de modelo bola de bilhar. Isso leva publicado originalmente em 1948, logo após
os adeptos dessa perspectiva teórica a des- a Segunda Guerra Mundial. Morgenthau
cartar os processos internos de tomada de instituiu as bases teóricas do realismo mo-
decisão e as motivações políticas que levam derno.
os Estados a atuar no plano internacional. Os No que se refere a Carr (2001), duas
realistas avaliam que o Estado age de modo características são principais em suas obras:
uniforme e homogêneo e em defesa do in- o foco no Estado-nação como único ator re-
teresse nacional. A unicidade do Estado se levante das relações internacionais e o foco
expressa no fato de ele ser considerado no no poder como motivador das ações dos Es-
seu conjunto, mas atuando nas relações in- tados. Carr retoma as ideias de Maquiavel e
ternacionais de maneira a representar o todo complementa que a ética não pode ser vis-
de maneira homogênea e uniforme. Obser- ta como esfera independente da política ou
va-se que, nessa visão, a complexidade dos como sua norteadora, mas acredita que os
processos internos não é levada em conside- Estados são guiados por certo darwinismo
ração (NOGUEIRA; MESSARI, 2005). político, no qual os mais fortes e mais bem
Carvalho (2007) destaca que, frequen- preparados se mantêm no sistema interna-
temente, a postura adotada pelos realistas cional. Além disso, esse autor aponta que
no ambiente interno difere daquela assu- não é a moral o cerne da política interna-
mida no cenário internacional. Os realistas cional, e sim a questão de como se adaptar
observam a política externa como um ele- e sobreviver no sistema internacional. Ele
mento fundamental para a consecução de define o poder em três categorias: o militar,
certos objetivos estratégicos e, como conse- considerado a expressão mais alta de poder
quência, fazem uso dela para ações que não (high politics), o econômico, que se subme-
têm vínculo com as agendas internas. Nessa te ao poder militar e pode vir a serviço do
visão, a política interna e a política externa poder político, no sentido dos interesses do
são esferas distintas na ação estatal, e o com- Estado, e o poder sobre a opinião, ou seja, a
portamento do Estado em matéria de políti- arte da persuasão.
ca é sempre racional e atento aos interesses Por sua vez, Morgenthau (2003) so-
nacionais. Essa característica destaca-se em lidificou a visão realista das relações inter-
função da ausência de limites que o Estado nacionais, recuperada por Carr. Nogueira
exige para fazer valer seus interesses. e Messari (2005) observam que as relações
Perante as lacunas das teorias vigen- internacionais, em geral, e o realismo, em
tes, houve uma reação intelectual, que tem particular, podem ser claramente separados
como exemplo a análise crítica de Carr em períodos pré e pós-Morgenthau, pois,
(1892-1982), que escreveu o livro Vinte anos em sua obra, o autor organizou e deu consis-
de crise (1939), e, finalmente, essa reação inte- tência ao realismo como abordagem teórica
lectual foi complementada pelo trabalho de das relações internacionais.

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Pecequilo (2004) lembra que deman- (1979), que afirma que todas as explicações
das morais e idealistas não devem ser le- sobre as causas da guerra podiam ser aco-
vadas em consideração na visão realista, modadas na primeira imagem: a imagem do
pois a política internacional e a doméstica indivíduo, na segunda: a imagem do Estado,
representam esferas separadas e de lógicas e na terceira: a imagem do sistema interna-
diferentes, ao passo que o Estado atua ra- cional. Isso significou uma renovação e, ao
cionalmente, avaliando riscos e benefícios. mesmo tempo, uma crítica ao realismo mo-
A ordem internacional é sustentada pelo derno. A diferença entre o realismo moder-
equilíbrio de poder, e Morgenthau define a no e o neorrealismo está no nível de análise:
diplomacia como um fator de relevância na o realismo moderno foca no Estado, enquan-
condução dos Estados e suas interações no to o neorrealismo foca no sistema internacio-
ambiente mundial. nal (SARFATTI, 2005).
Entre 1950 e 1970, abrem-se novos Nogueira e Messari (2005, p. 38) des-
pontos de vista teóricos, e o domínio do tacam que o objetivo de Waltz não era pri-
realismo passa a ser rebatido. No final dos vilegiar uma imagem em detrimento das
anos 1970, as propostas do neorrealismo fo- demais, mas, sim, sistematizar o estudo das
ram apresentadas de forma clara em obras relações internacionais e de suas principais
de destaque, como The Anarchical Society, de fontes em termos científicos. A teoria de
Hedley Bull (2002), e Theory of international Waltz condiz com a revolução behaviorista3
relations, de Kenneth Waltz (1979). Ambos os que estava ocorrendo nas demais ciências
autores tentaram refutar as críticas dirigidas sociais nos Estados Unidos, na mesma época.
ao modelo do realismo tradicional, princi- Pecequilo (2004) observa que o neorre-
palmente no que se refere à centralidade do alismo de Waltz abre espaço para as intera-
Estado como ator unitário e racional, desta- ções interno-externas no processo de elabo-
cando tanto a importância do poder do Es- ração de políticas e tomada de decisão, mas
tado no sistema internacional e o papel de essa teoria não avança muito na resolução
subordinação dos atores não estatais, como dos dilemas relativos à cooperação dos Es-
também a importância dos grandes poderes tados.
na administração das relações internacio- Nesse sentido, a teoria da política in-
nais. Tanto Bull quanto Waltz conservaram- ternacional de Waltz (1979) busca apresen-
-se céticos quanto ao crescente movimento tar uma explicação científica para o sistema
da interdependência, da globalização, dos político internacional, cuja abordagem expli-
processos econômicos transnacionais e de cativa é bastante influenciada por modelos
sua significação à agenda internacional positivistas da economia. Segundo Waltz,
(OLIVEIRA, 2004). a melhor teoria de relações internacionais
Dessa forma, na década de 1970, surge é sistêmica e neorrealista, que enfoque a es-
o neorrealismo ou realismo estrutural, como trutura do sistema, as suas unidades intera-
desafio às premissas clássicas. Surgem os tivas, seus atributos permanentes e dinâmi-
níveis de análise ou três imagens,2 de Waltz cos. No realismo clássico, os líderes estatais

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e suas avaliações subjetivas das relações cional, como empresas multinacionais e or-
internacionais estão no centro das atenções. ganizações internacionais governamentais e
No neorrealismo, ao contrário, a estrutura não governamentais, isso levou ao questio-
do sistema, em particular a distribuição do namento de premissas básicas do realismo.
poder relativo, é o aspecto analítico central. Igualmente, surgiram críticas à separação
Os atores são menos importantes, porque a entre política doméstica e política interna-
estrutura os obriga a agir de determinadas cional bem como à divisão entre high e low
maneiras, ou seja, as estruturas determinam politics (alta política, relativa à segurança, e
mais ou menos as ações dos atores. baixa política, referente a temas econômicos,
De uma forma geral, críticas são feitas tecnológicos, etc.) e à primazia da primeira
à teoria de Waltz, em face da rigidez do mo- em relação à segunda. Começou a se falar da
delo e de seu caráter estático, principalmen- exagerada ênfase dos realistas na questão da
te porque o autor não se prende a analisar guerra em detrimento de outras questões de
as perspectivas e os papéis dos novos atores política internacional, e surgiram críticas ao
nas relações internacionais. Ao contrário, excesso de ênfase no conflito em detrimento
fixa-se nas unidades estatais e sua distribui- da cooperação e da interdependência.
ção de poder político-militar, consolidado O livro de Robert O. Keohane e Joseh S.
pelo status quo, em detrimento das transfor- Nye Jr. (1977), Power and independence, foi em-
mações globais da sociedade internacional blemático a esse respeito. De acordo com os
(OLIVEIRA, 2004). autores, a “interdependência complexa” do
O foco de Waltz (1979) é na estrutura pós-guerra é qualitativamente diferente dos
do sistema, e não nos seres humanos que tipos anteriores de interdependência.4 Antes
criam ou operam o sistema. Nesse sentido, disso, as relações internacionais eram coorde-
líderes estatais são prisioneiros da estrutura nadas pelos líderes de Estado, que lidavam
do sistema estatal, e suas lógicas determinís- com outros líderes, e o uso da força militar
ticas comandam suas políticas externas. As- sempre foi uma opção no caso do conflito en-
sim, não há espaço, na teoria de Waltz, para tre eles. A “política superior” da segurança
a formulação de uma política externa inde- e da sobrevivência tinha prioridade sobre a
pendente da estrutura do sistema. Waltz “política inferior” da economia e das ques-
opera também com um conceito de interesse tões sociais (KEOHANE; NYE, 1977, p. 23).
nacional, que defende que “cada Estado pla- Sob condições de interdependência
neja o curso que servirá melhor a seus inte- complexa, contudo, a situação não é mais a
resses” (1979, p. 113). mesma por duas razões: primeiro, as rela-
Desse modo, no final da década de ções atuais entre os Estados não são somen-
1960, e no decorrer da década de 1970, vários te ou basicamente interações entre líderes de
desafios se impuseram ao realismo como te- Estados, há relações em níveis muito varia-
oria dominante das relações internacionais. dos por meio de muitos atores e de diver-
Na área acadêmica, passou-se a considerar sos departamentos de governo; segundo,
novos atores não estatais na política interna- há um grande número de relações transna-

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cionais entre indivíduos e grupos externos ção, tornam-se recorrentes no campo liberal.
ao Estado; e, além disso, a força militar é Essas visões são conhecidas como liberal
um instrumento de política menos útil sob institucionalismo, neoliberalismo ou para-
condições de interdependência complexa digma da interdependência.
(JACKSON; SORENSEN, 2007). Consequen- Os neoliberais compartilham antigas
temente, as relações internacionais assim se ideias liberais sobre a possibilidade de pro-
tornam mais parecidas com a política nacio- gresso e mudança, mas rejeitam o idealismo.
nal: “Questões diferentes geram coalizões Ademais, tentam formular teorias e aplicar
diferentes, ambas dentro de governos e en- novos métodos científicos. Sendo assim, o de-
tre governos, e envolvem diversos graus de bate entre liberalismo e realismo continuou,
conflito” (KEOHANE; NYE, 1977, p. 25). Na mas passou a se basear na configuração inter-
maioria desses conflitos, a força militar é ir- nacional pós-1945 e na persuasão metodológi-
relevante. Portanto, recursos de poder, além ca behaviorista (JACKSON; SORENSEN, 2007).
das armas, como habilidade de negociação, Para Keohane e Nye (1977), as relações
passam a ter suma importância. Por fim, sob entre os Estados ocidentais caracterizam-
uma interdependência complexa, os Estados -se por uma complexa interdependência:
se preocupam mais com a “política inferior” há muitas formas de conexões entre as so-
do bem-estar e menos com a “política su- ciedades, além das relações políticas dos
perior” da segurança nacional (NYE, 1993; governos, como elos transnacionais entre
KEOHANE; NYE, 1977, p. 24-26). corporações de negócios. Também há uma
Assim sendo, desde a década de 1970, ausência de hierarquia entre questões, a se-
o liberalismo passa por um renascimento gurança militar não domina mais a agenda,
sob a rubrica de institucionalismo liberal. não sendo mais usada como instrumento de
Diferentemente dos liberais clássicos, os política externa.
institucionalistas neoliberais não acreditam De acordo com Keohane e Nye (1977),
que os indivíduos cooperem naturalmen- a evolução da política internacional, desde
te, em razão de uma característica inata da 1945, e as estruturas multilaterais, cons-
humanidade. Para os institucionalistas neo- truídas para organizar as relações entre os
liberais, a cooperação emerge porque, para Estados nos mais diversos campos, incre-
protagonistas que mantêm interações contí- mentaram as possibilidades de cooperação
nuas mútuas, a cooperação é do interesse de entre as nações, reduzindo a incerteza e
cada um. Instituições podem ser estabeleci- aumentando a transparência nas relações
das e afetar as possibilidades de cooperação, interestatais. Com base nesses mecanismos
mas não as garantem. facilitadores, explicam os autores que o con-
Pecequilo (2004) lembra que assim flito passa a ser secundário diante da coope-
como as discussões sobre o neorrealismo do- ração, uma vez que os Estados começam a
minam os anos de 1970, as obras de Keohane dar preferência a esse âmbito institucional e
e Nye, a partir da introdução de conceitos a mudar a natureza de seu comportamento,
como interdependência e transnacionaliza- voltado apenas para o conflito. Com isso, é

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estabelecido um conjunto claro de regras e Cabe observar também que, cada vez
princípios, facilitando a ação coletiva. Além mais, as relações econômicas e sociais se
de participarem em Organizações Interna- aprofundam entre os Estados, causando um
cionais Governamentais, os Estados tam- aumento da interdependência entre eles, fa-
bém apoiam a criação de regimes, regulando zendo com que os objetivos econômicos e de
suas relações. segurança se entrelacem.
Para Keohane (1989), de um ponto de Moravcsik (1997) expôs uma refor-
vista neoliberal, os atores não estatais são mulação da teoria liberal que visa ser “não
considerados complacentes para a concep- ideológica” e “não utópica”. O autor explica
ção das relações internacionais. Todos os que os atores fundamentais na política inter-
atores internacionais que não são os Esta- nacional são indivíduos racionais e grupos
dos, como as empresas multinacionais (Em- privados, além do fato de que as políticas
presas Transnacionais - ETNs, Organizações dos Estados representam o que os indiví-
Internacionais não Governamentais - OINGs duos e os grupos da sociedade e dentro do
e Organizações Internacionais Governamen- aparato estatal desejam. Portanto, a política
tais - OIGs), são considerados atores não es- governamental reflete as preferências de as-
tatais das relações internacionais. sociações diferentes de grupos e indivíduos
Cada dia mais ocorre o aumento de de- na sociedade nacional.
pendência e interdependência entre os Esta- Os esforços de Moravcsik (1997) de-
dos, que podem depender da comunicação monstram a tentativa de fornecer uma “re-
internacional, da ajuda humanitária ou mes- formulação geral de uma teoria liberal posi-
mo de arranjos comerciais internacionais. tiva” com base em fortes premissas liberais.
Nesse sentido, pode ocorrer o aumento da O autor propõe que, contemporaneamente,
capacidade de influência de alguns governos, o liberalismo seja baseado em suposições,
pois eles podem usar as organizações trans- tais como a primazia dos atores sociais, isto
nacionais para manipular os seus interesses. é, são os indivíduos e os grupos privados
Sarfatti (2005) afirma que o neoliberalis- que se relacionam de forma racional e, por-
mo é a primeira teoria de relações internacio- tanto, são avessos a riscos e tendem a se or-
nais a oferecer um papel destacado aos ato- ganizar de forma coletiva a fim de promover
res transnacionais na política internacional. os seus interesses ante a sociedade.
Obviamente que as relações transnacionais O ambiente social é entendido como
sempre existiram, sobretudo desde meados naturalmente conflituoso, dados os interes-
dos séculos XIX e XX, mas essas semelhanças, ses distintos dos indivíduos. Assim, o exame
hoje, são díspares, dada a multiplicação dos das relações internacionais tem o seu nível
atores não estatais, de fóruns de negociação de análise no indivíduo que, por definição,
internacional, além do efeito da revolução da comporta-se racionalmente, buscando satis-
tecnologia de informação e comunicação, que fazer suas preferências de modo a maximi-
faz com que as sociedades estejam mais co- zar os benefícios e minimizar os custos. Des-
nectadas e mais interdependentes. se modo, este estudo leva em consideração

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que as políticas doméstica e internacional mentais, de empresas e/ou de grupos sociais,
estão frequentemente interligadas. Na pró- a política externa de um país corresponde à
xima seção, apresenta-se os autores que le- atuação do Estado na defesa do conjunto dos
vam em consideração tais vínculos. interesses dessas instituições.
Um fator importante além dos interes-
ses do Estado é a capacidade que cada Esta-
A análise da política externa e a
do detém de convencer os outros a aceitar
interação entre os níveis doméstico e as suas posições ou, em termos mais claros,
internacional o poder que cada Estado dispõe para a im-
posição de seus interesses. Na busca de pro-
Na literatura sobre relações internacio- mover seus interesses, existe um constante
nais, há, muitas vezes, confusão no sentido processo negociador que permite a atuação
de apontar política externa como sinônimo de diferentes Estados (OLIVEIRA, 2005).
de relações internacionais. Para Cervo, A análise de política externa é como o
[...] relações internacionais correspondem estudo do comportamento e da prática das
a um conceito mais amplo, uma vez que relações entre diferentes atores, principal-
incluem a política exterior que, em ordem mente os Estados, no sistema internacional.
decrescente de abrangência, inclui a diplo- Fazem parte do conteúdo de análise de po-
macia (2008, p. 8).
lítica externa a diplomacia, a inteligência, as
Oliveira (2005) acrescenta que as rela- negociações comerciais e os intercâmbios
ções internacionais são uma área, por exce- culturais.
lência, que representa os interesses do Esta- No intuito de compreender as articu-
do no plano internacional e que tem como lações dos atores domésticos sobre uma ne-
objetivo último buscar as satisfações do Es- gociação internacional, será utilizada como
tado, seja para a sua sobrevivência seja para método de análise a teoria dos jogos de dois
a satisfação dos interesses de seus membros. níveis, de Robert Putnam (1988).
Hill define política externa como “a Putnam (1988) começa a discutir a re-
soma das relações oficiais externas condu- lação entre o doméstico e o internacional no
zidas por um ator independente, geralmen- fim dos anos 1980, em seu trabalho intitula-
te um Estado, nas relações internacionais” do Diplomacy and domestic politics: the logic
(2003, p. 3, tradução nossa). No plano das re- of two-level games. Este estudo dá o passo
lações internacionais, há a aceitação consen- inicial para outras pesquisas voltadas para
sual de que os Estados são os atores legítimos a integração das arenas interna e externa
na promoção dos interesses dos cidadãos, em processos de negociação internacional.
das empresas e dos conglomerados que estão Para Putnam (2010), a política doméstica e
dentro do seu território (OLIVEIRA, 2005). as relações internacionais estão vinculadas.
Para Oliveira, ainda que a interação entre Essa vinculação é resultado da aproximação,
os Estados esteja cada vez mais agregando relativamente recente e sistemática, das con-
a participação de organizações não governa- sequências da democracia sobre relações en-

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tre assuntos domésticos e internacionais na processo, em muitas negociações, pode ser
política externa. dinâmico, uma vez que os negociadores ten-
O autor afirma que uma concepção tam diversos acordos e consultam os pontos
mais adequada dos determinantes domésti- de vista de suas bases. Para Putnam, “[...] os
cos da política externa e das relações inter- atores no nível II podem representar agên-
nacionais deve enfatizar as lutas políticas. A cias burocráticas, grupos de interesses, clas-
esse respeito, complementa que: ses sociais ou mesmo a ‘opinião pública’”
(2010, p. 153).
A luta política de várias negociações in-
ternacionais pode ser utilmente concebida Com a metáfora do jogo de dois ní-
como um jogo de dois níveis. No nível na- veis, o autor analisa o fracasso dos acordos
cional, os grupos domésticos perseguem internacionais. De acordo com essa teoria,
seus interesses pressionando o governo a o governo é pressionado pela necessidade
adotar políticas favoráveis a seus interesses
e os políticos buscam o poder constituindo de atender demandas domésticas e, assim,
coalizões entre os grupos. No nível inter- obter apoio às suas decisões. Para Putnam
nacional, os governos nacionais buscam (1988), a cooperação internacional pode
maximizar suas próprias habilidades de avançar ou se limitar conforme o poder de
satisfazer as pressões domésticas, enquan-
veto, ou o apoio de atores internos às deci-
to minimizam as consequências adversas
das evoluções externas. Nenhum dos dois sões a respeito dos acordos internacionais.
jogos pode ser ignorado pelos tomadores O referido autor acredita ainda que mo-
de decisões (PUTNAM, 2010, p. 151). vimentos no plano internacional são capazes
de intervir no ambiente doméstico do ator
Segundo Putnam (2010), os poderes
negociador e de flexibilizá-lo, aumentando
executivos têm função principal nas media-
assim as possibilidades de que os oponentes
ções das pressões internacionais e domésticas
possam tirar dele concessões mais expressi-
pelo fato de estarem diretamente expostos a
vas. Conforme esclarece Putnam (1988), em
ambas as esferas. Desse modo, o líder que
negociações internacionais, mais especifica-
não consegue satisfazer seu ambiente domés-
mente no plano externo, há países que lutam
tico arrisca-se a ser privado de seu posto. O
para obter mais vantagens comerciais para
autor divide o processo em dois estágios: o
si. Já no plano interno, existem grupos de in-
da negociação e o da ratificação. O estágio da
teresse que pressionam o governo para que
negociação, nível I, leva a um acordo provi-
ele adote medidas que lhes favoreçam. Des-
sório e, na fase da ratificação, nível II, ocor-
se modo, na teoria dos jogos de dois níveis,
rem as discussões entre os grupos domésticos
os chefes de governo estão posicionados
de apoio sobre confirmar ou não o acordo.
estrategicamente entre dois tabuleiros: um
De acordo com Putnam, “[...] é bem provável
formado pela política doméstica e o outro,
que haja consultas prévias e barganhas no ní-
pelas negociações internacionais.
vel II com o objetivo de elaborar uma posição
Putnam (2010) acredita que o negocia-
inicial para o nível I” (2010, p. 153).
dor internacional acaba sofrendo pressão de
Assim, a necessidade de confirmação
determinados grupos de interesse domésti-
do nível II afeta as barganhas no nível I, e o

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cos, que têm preferências diferentes uns dos rumos da política externa. Como explica o
outros. Com isso, como explica o autor, o in- autor, para o negociador, o suporte do nível
teresse nacional acaba não sendo definido de II também é muito importante, visto que au-
maneira exclusiva pelo poder central (Execu- xilia na sua argumentação frente aos demais
tivo), pois acaba sendo o resultado do próprio negociadores.
debate interno entre os diversos poderes, tais Por fim, é preciso destacar que, neste
como Legislativo, Executivo e Judiciário, gru- estudo, assume-se que políticas domésticas
pos de interesse e opinião pública. e relações internacionais são intrinsecamen-
Para Putnam (2010), quando os custos te correlacionadas. A posição internacional
e os benefícios de um acordo proposto são de um país exerce impacto em suas questões
relativamente concentrados, é razoável es- domésticas, e essa, por sua vez, depende do
perar que grupos domésticos, cujos interes- comportamento desse país no nível interna-
ses sejam mais afetados, busquem exercer cional.
uma influência especial no processo de ra-
tificação. Desse modo, a composição de gru-
Considerações finais
pos domésticos ativos no nível II também
varia com o grau de politização do assunto. Embora se reconheça que existam inú-
Essa teoria mostra a heterogeneidade meros fatores domésticos e internacionais
do ambiente interno e dá destaque ao papel que podem influenciar o comportamento da
dos atores. Putnam lembra que política externa, essas influências são obriga-
[...] a natureza das questões “homogêneas” toriamente canalizadas pelo aparato político
modifica-se ao compará-las com os casos de um governo que identifica, decide e exe-
em que as preferências dos grupos domésti- cuta a política externa. Ao analisar a política
cos são mais heterogêneas, assim, qualquer externa, é necessário aprender sobre como
acordo do nível I atinge desigualmente cada
um dos grupos envolvidos (2010, p. 158). as decisões de política externa são tomadas,
obter informações sobre as intenções e estra-
Cabe ressaltar que, ainda de acordo tégias dos governos e, principalmente, como
com Putnam (2010), diferentemente das te- as definições da situação são transformadas
orias estatocêntricas, a abordagem da metá- em ação.
fora dos jogos de dois níveis aceita a inevi- Sendo assim, o processo de tomada
tabilidade do conflito doméstico em relação de decisões, por sua parte, vincula-se com a
às exigências do interesse nacional. Isto é, dinâmica decisória. Dele participam atores
essa perspectiva teórica reconhece que os to- governamentais e não governamentais do
madores de decisão lutam para harmonizar país e do exterior, em uma sequência tem-
ao mesmo tempo os ambientes domésticos e poral que se inicia no momento em que uma
internacionais. conjunção de estímulos externos e internos
Dentro da linha de pensamento de requer a tomada de uma decisão determina-
Putnam, vale destacar o interesse do segun- da até que ela seja efetivamente adotada.
do nível em participar da formulação dos

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Com o desenvolvimento do estudo das Abstract
teorias de decisão, produziu-se uma mudan-
ça fundamental pelo fato de a atenção não This article aims to present some contri-
se dirigir aos Estados, enquanto abstrações, butions of international relations theo-
ou a governos como blocos monolíticos e ries and major authors that still provoke
unidos ante ao exterior, mas aos atores de- debates in this field of study. In this spa-
cisórios de política externa, enquanto seres ce, some approaches will be highlighted
belonging to this area, such as realism
humanos submetidos a diferentes pressões
and neorealism, liberalism and neo-ins-
e influências.
titutional liberalism. Following a review
Logo, segundo Oliveira e Lessa (2006),
of the literature and the main concepts
para melhor entender a política exterior de of foreign policy analysis will be presen-
um Estado, atualmente, torna-se necessário ted in addition to the interaction betwe-
assimilar não apenas a ligação existente entre en the domestic and international level,
as relações internacionais e a política interna, using the Theory of Two-Level Games,
mas também analisar o funcionamento das Putnam.
instituições domésticas de um país, ou seja,
além dos fatores globais, o comportamento Keywords: Foreign policy. International
externo de um país é determinado também relations. Game two levels.
por condicionantes domésticos. Cada vez
mais, os grupos de interesse domésticos se Resumen
dão conta de que as decisões dos formulado-
res de estratégias de política externa incidem Este artículo tiene como objetivo presen-
diretamente sobre suas realidades. tar algunas aportaciones de las teorías
Conforme Lafer (2001), transformar de las relaciones internacionales y los
necessidades internas em possibilidades ex- principales autores que todavía provo-
ternas, o que é a essência da política externa, can debates en este campo de estudio.
En este espacio, algunos enfoques serán
é mais necessário do que nunca nas configu-
destacados pertenecientes a esta área,
rações atuais do sistema internacional. As
como el realismo y el neorrealismo, el
demandas e interesses dos diferentes grupos
liberalismo y el neoliberalismo-institu-
do nível doméstico chegam à arena interna- cional. Después de una revisión de la
cional nem sempre por via direta, muitas ve- literatura y de los principales conceptos
zes nem cruzam a fronteira entre o interno e de análisis de la política exterior se pre-
o externo. Para os grupos políticos e sociais sentará, además de la interacción entre
domésticos, cujos objetivos lograram trans- el nivel nacional e internacional, utili-
passar o nível interno, é certo que foi preciso zando la Teoría de los dos Level Games,
exercer o poder de barganhar, fazer alianças, Putnam.
pressionar e, de alguma forma, estender a
sua influência sobre o processo decisório. Palabras clave: Política exterior. Relacio-
nes internacionales. Juego de dos niveles.

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Notas JACKSON, R. H.; SORENSEN, G. Introdução às
relações internacionais: teorias e abordagens. Rio
1
Série de postulados fundamentais sobre o mundo, de Janeiro: Zahar, 2007.
que concentram a atenção do estudioso sobre cer-
tos fenômenos, determinando sua interpretação KEOHANE, R. O.; NYE, J. S. Power and interde-
(KHUN 1988 apud LARRAÑAGA, 2008, p. 129). pendence. New York: Longman, 1977.
2
Waltz classificou as teorias de relações interna-
cionais em categorias, e as chamou também de LAFER, C. A importância do setor privado
imagens. nas negociações para a Alca. In: SEMINÁRIO
3
Behaviorismo: expressão que significa compor- ALCA: AMEAÇAS OU OPORTUNIDADES?,
tamento ou conduta e faz referência à doutrina 2001, São Paulo. Artigos... São Paulo: Amcham
que analisa o comportamento, ou seja, as atitudes
e as reações dos diferentes atores. Desenvolveu- Brasil, 2001. Disponível em: <http://www2.
-se como uma reação aos excessos do realismo, mre.gov.br/Alca/Artigos/Dis_laf100401.
substituindo os postulados imprecisos e intuitivos htm>. Acesso em: 25 set. 2014.
daquele e procurando uma interpretação científica
capaz de responder às complexidades das relações LARRAÑAGA, F. A. Introdução às relações in-
internacionais. O behaviorismo pretendia deslocar ternacionais. São Paulo: Aduaneiras, 2008.
o foco da prescrição, a indagação ética e a ação para
a descrição, a explicação e a verificação dos fatos MINGST, K. A. Princípios de relações internacio-
(LARRAÑAGA, 2008, p. 135). nais. Rio de Janeiro: Elsevier, 2009.
4
Keohane e Nye (1977) indicam que dependência
significa que o estado dos Estados é determinado MORAVCSIK, A. Taking preferences seri-
largamente por forças externas, enquanto interde- ously: a liberal theory of international politics.
pendência é uma situação caracterizada por efeitos International Organization, Toronto, v. 51, n. 4,
recíprocos entre países ou entre atores de diferentes
países, ou simplesmente o estado de mútua depen- p. 513-553, 1997.
dência. Quando há um alto grau de interdependên- MORGENTHAU, H. A política entre as nações:
cia, os Estados tendem a estabelecer instituições
internacionais para lidar com problemas comuns. a luta pelo poder e pela paz. Brasília: Editora
Ao fornecer informações e reduzir os custos das UnB, 2003.
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promover a cooperação através das fronteiras.
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