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M. J. SUEIRO · R. DORDA · L. BARBERO · J. GARCÍA
Um jogo de horror lovecraftiano e ação de
Manuel J. Sueiro, Ricardo Dorda, Luis Barbero e Jokin García

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CRÉDITOS
Escrito por Tradução
Manuel J. Sueiro, Ricardo Dorda, Luis Barbero e Jokin García Manu Gouveia

Capa de Revisão
Javier Charro Elisa Guimarães e Flávia Najar

Ilustrações interiores de Colaboração


Borja Pindado Arribas e Marga F. Donaire Diego Hernandez

Relatos de
Rosendo Chas Patier O sistema Hitos se declara Open Content e pode ser utilizado li-
vremente em virtude da licença OGL. A Ambientação dos Mitos
Correção e textos adicionais por de Cthulhu corresponde a obra de H. P. Lovecraft e está sob o
Edén Claudio Ruiz domínio público, segundo a legislação vigente. Os personagens,
grupos e situações próprias de Cultos Inomináveis, assim como
Desenho e layout por o nome do jogo e sua logo, podem ser utilizados com prévia au-
Manuel J. Sueiro y Javier Charro torização do editor, declarando-se Product Identity no marco da
licença OGL. As ilustrações e o material gráfico que acompan-
Publicado por
ham o texto são propriedade de seus respectivos autores, usados
Nosolorol Ediciones
por Nosolorol Ediciones com seu consentimento explícito e não
C/ Ocaña 32, 28047 Madrid
www.nosolorol.com podem ser reproduzidos sem sua autorização expressa.
ediciones@nosolorol.com

Edição Geral ISBN: 978-65-81633-01-1


Antonio Sá Rego Neto Copyright © Nosolorol Ediciones, 2020

Agradecimentos de Manu Agradecimentos de Ricardo


Foi uma longa viagem e não euclidiana, mas por fim se vê a luz das Em primeiro lugar, meu mais sincero agradecimento a Manuel J.
estrelas. E nada disso poderia ter sido possível sem Luis, Ricardo e Useiro, por me convidar para este culto... digo, projeto, para maior
Jokin, fiéis companheiros de viagem que conseguiram que coroemos
glória dos Grandes Antigos. Também meu agradecimento aos de-
estas montanhas da loucura pessoais. Obrigado, companheiros, vocês
são os melhores. mais coautores, sem os quais este livro não seria possível: Luis e
Jokin, e a Pilar e Betty, por aquelas partidas de Cultos Inominá-
Obrigado também a Rosendo por enlouquecer e me enlouquecer com
veis juntos e por sua paciência com nossas “reuniões de trabalho”.
seus relatos. A Pedro e Sergio, por permitir um novo começo. Sem vocês
já não haveria Nosolorol. A Edén e Charro por colocar uma parte deles. Dedico esta, minha obra-prima, a Ana, por aguentar e partilhar
A Borja e Marga por converter as ideias em arte. A Enrique por nos minhas loucuras, a meus cultistas habituais: Pedrosa, Rebeca,
deixar entrar, ou ao menos nos juntarmos. A Betty por nos apoiar de Mike, Sergio, Luz e Carlos, por compartilhar de tantas aventu-
tantas maneiras que nem imagina. A Marién, Ana N., Ana D., Arancha ras (e tantos corredores que se perdem na escuridão) e a Josete e
e Iván por manterem a máquina funcionando. Hiro, por seguirem me convidando a sua casa, apesar da minha
E milhões de obrigados, tantas que não cabem nesse livro, a Pili, minha capacidade de jogar bebida fora.
musa inspiradora. Obrigado por seu apoio incondicional, pela sua pa- Finalmente, às estrelas se alinharam.
ciência, por me presentear com suas ideias, por me fazer rir todos os dias
e por rir de minhas palhaçadas. Obrigado por me fazer feliz. Agradecimentos de Luis
Agradecimentos de Jokin Espero, com este livro e sua nova visão, ter agregado um valioso grão
de areia aos Mitos de Chtulhu. O tempo e o espaço dirão.
Meus agradecimentos não poderiam ser de outra maneira, a Ma-
nuel, Luis e Ricardo por me permitir colaborar com eles em seu E agora é momento de agradecer e dedicar. A Beatriz Piñeiro por
projeto e a “Igore” Esquerdo por fotocopiar por anos aquele manual converter meu lar em Ulthar. Ao culto dos Boa Noite do Saara (Car-
de O Chamado de Cthulhu. los Pérez, Sr. Blanco, David García, Rober, Fer, Alber García, Toño),
Tenho palavras também para meus jogadores Apo, Paula, Jontxu, que sempre estão aí. Ao meu círculo interior, Magdalena, E. Barriu-
Aitor, Isa, Johny e Gabri por terem me ajudado a terminar, por fim e so, Malena B., Mali, Ángel Barbero, Amalia N. C., SonSo, Sara, José
depois de várias tentativas, As Máscaras de Nyarlathotep e em geral Gamo, Carlos e Alba. E, claro, a outros tantos que, de uma maneira
a todos que me fizeram sofrer em alguma partida "cthulhuoidea". ou outra, são parte do meu culto, ainda que não estejam todos os que
E claro a Ana Rosa, que ainda que nunca jogue uma partida de Cul- são: Manu, Pilar, Borch, Roca, Agus, Vera Discordia, Marcos DLFU,
tos Inomináveis nem sob a mira de um revólver, sempre está presen- Nast, Pablo Valcárcel, Leo, Pau, Guillermo Fernández, Hiro e José,
te e faz com que tudo seja melhor. Occelote, Rafa Mr. Hannigan e Bas.

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CONTEudo
I. INTRODUÇÃO.................................................. 8 VII. MAGIA........................................................ 184
Quem é H. P. Lovecraft?..........................................................8 Magias e habilidades arcanas............................................. 184
O que é um jogo de RPG?.......................................................9 Poderes superiores.............................................................. 193
Cultos Inomináveis................................................................10 Objetos de poder................................................................. 202
Tomos.................................................................................... 210
II. PERSONAGENS..............................................16 Degeneração......................................................................... 224
Criação de personagens.........................................................17
Personagens prontos..............................................................28 VIII. DIREÇÃO.................................................230
O papel do mestre de campanha....................................... 230
III. SISTEMA........................................................ 38 Aventuras e campanhas...................................................... 233
Acerto e erro crítico...............................................................39 O culto.................................................................................. 237
Ação resistida .........................................................................39 Elementos das histórias de cultos...................................... 237
Provas de ação prolongada ...................................................39 Antagonistas......................................................................... 238
Aspectos...................................................................................42 O sobrenatural..................................................................... 240
Ação e combate.......................................................................45 Criação de criaturas............................................................ 242
Saúde........................................................................................52
Sanidade..................................................................................55 IX. AVENTURAS............................................... 252
Evolução do personagem......................................................61 A Conspiração Luveh-Kerapf............................................ 253
Equipamento...........................................................................61 Sua dor é sua oferenda........................................................ 262

IV. AMBIENTAÇÃO............................................66 Ficha de personagem.......................................................... 282


Os Mitos..................................................................................66 Ficha de culto....................................................................... 283
Contexto atual.........................................................................72
Últimas palavras.................................................................. 286
As terras dos sonhos..............................................................76
Cronologia...............................................................................80
Rumores...................................................................................87
RELATOS
V. CRIATURAS....................................................94 Sem fio.......................................................................................4
Re: Nyarlathotep.....................................................................12
Os deuses externos.................................................................94
Legado......................................................................................34
Primogênitos........................................................................ 112
Do vento..................................................................................62
Criaturas dos Mitos............................................................. 126
Às mães....................................................................................90
Corro para teus braços........................................................ 156
VI. CULTOS....................................................... 160 Guia de viagem.................................................................... 180
O culto na campanha.......................................................... 161 O último ato......................................................................... 226
Criação de um culto............................................................ 166 Coda...................................................................................... 248
O culto em regras gerais..................................................... 169 Metragem encontrada......................................................... 276
Alguns cultos conhecidos................................................... 169

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Sem Fio

Eu não queria incomodar, e era óbvio que, para ela era extremamente importante que tudo estivesse
em seu devido lugar. Foi como se, por fim, tivesse me atrevido a entrar numa daquelas luxuosas
lojas de móveis de Shibuya como as que passava quando ia visitar minha avó. Cada objeto tinha
uma razão de ser e um lugar próprio, me explicou a mulher enquanto circundávamos o salão; seu
piso era uma máquina perfeitamente oleada, disse enquanto apenas entrávamos no dormitório, e não
havia forma de que funcionasse com suas engrenagens dispostas de outra forma, sentenciou já de
volta ao hall de entrada, ignorando em suas explicações o banheiro e a cozinha. Pude ver este último
ambiente pelo canto do olho, ainda que em sua entrada, voltado para a frente e em posição de abso-
luta atenção, estivesse o marido de guarda. Era evidente que tudo nele também fora arranjado pela
mulher: pantufas idênticas às dela, exceto pela cor, o roupão de corte semelhante ao de um quimono
clássico, com uma elegante linha violeta, a gravata sóbria, até mesmo a expressão do rosto, ardua-
mente ensaiada e, entretanto, falha. Eu temia que ele estivesse incluído na compra.
—Terá que comprá-la tal qual está, levaremos somente a roupa e alguns pertences pessoais —
concluiu ela.
Basicamente, morei em uma casa-modelo por meses, sem me atrever a levar minhas coisas, já
que ali qualquer alteração soava acusadora. O depósito onde havia guardado todas as minhas coi-
sas na realidade não estava muito longe. Comigo tinha apenas uma mochila — que levava quase
sempre arrumada — que, além de uma muda de roupa, estava meu laptop. Apenas usava a cozinha,
essencialmente a geladeira e, ocasionalmente, o micro-ondas. Pensei até mesmo em ir aos banheiros
públicos, mas, finalmente, como um compromisso, me impus a demorar o mínimo possível durante
o banho — a mochila pendurada em um gancho atrás da porta — e limpar imediatamente depois. À
noite, encolhida em um canto da sala excepcionalmente clara, dormia abraçada a mochila. E muitas
vezes, quando acordava de madrugada ejetada de um pesadelo — um de muitos — deslizava o zíper
e abria levemente o laptop, o suficiente para deixar sair um pouco de luz da tela e o cooler ser colo-
cado em movimento, com seu hálito quente e o arranhar das lâminas tão reconfortante.
Foi, no entanto, uma melhora. Minha vida tinha sido um vagar confuso em busca do aluguel mi-
nimamente viável, de um buraco imundo para outro ainda mais imundo, e com sorte mais barato.
Mas procurar por aluguéis levava muito tempo e, o que é pior, me forçava a sair pela rua. Tentei,
por um tempo, me mudar sem antes visitar o lugar — o que provou ser uma abordagem desastrosa
para o meu problema.
Ao longo dos anos, consegui refinar os algoritmos que regiam a minha vida para maximizar
o número de horas que passava conectada: assegurava-me, por exemplo, de estar no caminho de
vários supermercados onde se poderia comprar on-line e que entregassem em casa, tinha anotado
os restaurantes na área em que se poderia pedir, também costumava confiar pequenas encomendas
para o filho de um vizinho, ou o porteiro de plantão. Tudo estava pensado.
Ganhava a vida gerenciando recursos virtuais, regando jardins semânticos e pastoreando reba-
nhos de blogs nas fazendas de links, e os clientes me contatavam através da minha página. Podia

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levar meses até que um desses procedimentos administrativos, em que era preciso ver alguém
pessoalmente, me forçassem a sair.
Aquele apartamento foi, em suma, uma peça essencial em um elaborado plano para abandonar
a realidade quase que inteiramente. Embora, é claro, uma mudança tão drástica nas minhas rotinas
tivesse consequências negativas. Não me refiro a restrição do meu habitat, não me importava de
viver sob o regime dos objetos — às vezes voltando da casa da avó, já muito tarde, parava nas
vitrines das lojas de móveis, fechadas, e encostava o rosto no vidro imaginando que, em vez de
voltar ao meu apartamento escabroso alugado poderia dormir ali, em qualquer canto. Adaptei-me
imediatamente às regras do espaço, mas o que estava prestes a ser dramático eram as questões
de cobertura e conexão com a Internet. Eu previ que, no pior dos casos, levaria alguns dias para
registrar a linha de fibra ótica e, como achei satisfatórios os testes de cobertura que havia feito
com o meu celular no primeiro dia desde as escadas — a ex-proprietária me permitiu ficar den-
tro do apartamento quando necessário — pensei que não haveria problema. Mas resultou que o
edifício tinha uma instalação inadequada, o que atrasou a chegada da fibra por vários dias e, para
completar, meu telefone perdia o sinal só de cruzar a porta. Depois de alguns ensaios precipitados,
vendo que meu telefone realmente não conseguia se conectar à rede de dados e que o meu laptop
não detectava qualquer vestígio de roteadores ou pontos de acesso sem fio, entrei em pânico e saí
correndo dali com a intenção de nunca mais voltar.
Havia certas coisas que podiam me fazer perder o controle e, talvez a mais grave, era a possibi-
lidade de ficar incomunicável. No entanto, voltei naquela mesma noite — enquanto passava mais
e mais tempo no exterior, a ideia de voltar acabou por parecer aceitável. Passei a primeira noite
procurando redes Wi-Fi e um lugar incerto no apartamento, que supostamente deveria existir, em
que o sinal chegasse ao meu celular com intensidade suficiente. Nada.
Passei o resto da semana perambulando, tentando me adaptar a cafeterias barulhentas que ofe-
reciam conexão a seus clientes, parasitando o Wi-Fi aberto de algum prédio público ou as fracas
conexões nos locais de passagem. Não que eu pudesse ir longe demais, porque estava à espera
que quem viesse instalar a fibra em casa me ligasse. E para piorar as coisas, redes Wi-Fi públicas
não permitiam a conexão do meu celular, dependendo de quais operações fizesse. Começava a
imaginar como o conteúdo dos meus jardins murchava, os blogs batiam nas cercas das fazendas,
fugindo aterrorizados.
E cada noite voltava para procurar redes Wi-Fi em casa, no caso de que um novo vizinho
aparecesse ou alguém retornasse de uma viagem. Procurava até adormecer. E somente uma vez
uma nova rede apareceu timidamente na lista de varredura do meu celular, um nome estranho que
esqueci imediatamente. Apareceu e voltou a desaparecer. Talvez tenha sido um sonho.
Finalmente, eles instalaram a fibra e, embora o sinal Wi-Fi do roteador inexplicavelmente se per-
desse quando me distanciava apenas alguns metros, podia me conectar por cabo. Assim que voltei
para meus jardins e fazendas, abasteci a geladeira, usei o banheiro com agilidade e dormi no meu
canto, abraçando minha mochila e meu laptop, muito perto do roteador.
Mas, uma noite, a terra tremeu. Não foi um estremecimento como os muitos que costumávamos
sofrer, e sim violentas convulsões que pareciam nunca terminar. O assoalho de madeira rangeu e
algumas placas saltaram. Muitos dos ornamentos, que permaneceram até o momento no lugar que
o proprietário anterior lhes dera, caíram no chão e se desfizeram em pedaços. E embora quase não
houvesse luz alguma e mesmo que eu não tenha certeza do que vi, pareceu-me que as paredes se
arqueavam como juncos curvados por um forte vento – paredes onduladas.
Não parou de repente, adormeceu pouco a pouco, ainda rosnando de vez em quando, já em
sonhos, até se dissolver numa suave vibração. No fim, ouvia-se os alarmes de carros e os latidos
dos cães da vizinhança.
Eu, no entanto, ainda levei alguns segundos para me atrever a andar pelo apartamento porque pen-
sava que uma réplica podia ser produzida a qualquer momento. Havia falhas em todos os lugares. Não

-5-
ousei tocar em nada, como se tivesse encontrado um animal moribundo à beira da estrada e temesse
que meu contato fizesse mais mal do que bem. Rachaduras nas paredes, tábuas levantadas do assoalho
de madeira, restos de vasos e figuras de porcelana cobriam grande parte do chão e, no quarto, uma
prateleira que ocupava uma parede inteira desmoronara. Havia também uma nova porta.
Quando caiu, a estante de livros no quarto havia deixado uma pequena porta descoberta. Senti
como se tivesse desbloqueado um nível secreto em um videogame. A porta não tinha maçaneta, en-
tão tive que usar uma faca para abri-la. Poderia ser uma despensa, um simples armário, mas eu dese-
java com todas as minhas forças que fosse outra coisa, algo surpreendente. Cruzei para o outro lado
com o meu coração apertado, saindo pela boca. Sob a luz fria do celular — a única luz disponível
— e com a poeira girando lentamente a cada passo, parecia que havia mergulhado nos destroços de
um naufrágio: um pequeno quarto com móveis igualmente pequenos e muitos brinquedos atirados
pelo chão, um quarto de um menino.
Sentei-me encostada na parede do fundo, repassando a anatomia da sala, cada detalhe. Notava-
-me diferente. O apartamento-máquina estava quebrado, ou pelo menos não funcionava mais de
acordo com o que a proprietária anterior havia arranjado. O terremoto destruiu uma rotina que,
apesar de ter pouco tempo de vida, cheguei a pensar que permaneceria indefinidamente. E, no
entanto, me encontrava surpreendentemente calma. O quarto da criança era um espaço há muito
esquecido e lá, pela primeira vez na vida, não parecia me importar. Naqueles primeiros momentos
pensei que talvez tivesse abandonado a realidade por fim.
No quarto, a espontaneidade havia sido permitida. Pareceu-me que poderiam coexistir sem pro-
blemas os velhos brinquedos do menino com a minha coleção de consoles e computadores antigos,
os pequenos móveis de plástico com a minha enorme poltrona de massagem, suas roupas ao lado
das minhas em um pequeno armário de lona que fechava com zíper. A cama era um carro de corrida.
Eu tinha decidido, quase ao passar pela porta, mas ainda levou alguns minutos para articular um
plano: naturalmente, me mudaria para lá e deixaria o resto da casa como era. Teria que limpar a
poeira, trazer algumas extensões para conectar computadores e um cabo de rede desde o roteador.
Continuaria a usar a cozinha e o banheiro com rapidez, porque, afinal, esses cômodos eram cone-
xões com a realidade, e eu não via sentido em voltar para ela se não fosse extremamente necessário.
Distraí-me por um momento e quando me dei conta a onda já estava quase em cima de mim.
Brincava, como sempre, de costas para o mar, com as mãos prontas para amassar a negra areia da
praia. E quando me virei a onda estava tão perto que alguns passos seriam o suficiente para tocar
sua superfície. Tão alta quanto as torres de apartamentos onde minha família morava quando eu era
pequena. Era inevitável, não havia sentido em fugir. Pois, embora a onda parecesse viver seu próprio
tempo e se espiralasse na beira do mar, como presa em uma filmagem de alta velocidade, cada passo
meu na direção oposta, dava com ela vindo para mim. Cobri meus olhos e chorei.
—Tem medo? —Soou. —Por quê?
A voz pertencia a um menino de cerca de seis anos. Tinha cabelos e olhos negros. Sua pele tão
pálida contrastava com o calor da minha praia, com o sol brilhante que lançava seus raios através da
onda e provocava reflexos ondulados na areia. O menino parecia um adulto em miniatura, com um
terno escuro e gravata.
— Eu não quero morrer — respondi em um soluço.
— Talvez seja porque você não entende o que está acontecendo.
Acordei e fiquei surpresa ao perceber que o sonho recorrente do tsunami havia mudado pela pri-
meira vez em anos. Logo descobriria que as noites no quarto secreto eram carregadas de interferência.
Lá, meus sonhos mais familiares tinham estranhos e desconhecidos como convidados, e, às vezes,
até a narração onírica era interrompida subitamente, por inserções distantes que, mais tarde, eu seria
incapaz de lembrar. Quando pensava em voz alta, costumava chamar essas intrusões de “espaços pu-
blicitários”, porque, embora não conseguisse me lembrar do conteúdo, suspeitava que eles queriam
me vender alguma coisa.

-6-
Em todo caso, sempre tive a cabeça cheia de coisas. Desde muito jovem, havia sido uma
pessoa muito preocupada, atenta a perigos que só poderiam viver em minha imaginação, mas
que poderiam parecer muito reais durante a fase REM do sono. Então, cansada de reprises que
me atormentavam desde a infância, os espaços publicitários passaram rapidamente de estranhas
interferências a um pequeno oásis em minhas noites agitadas — a propaganda pode ser melhor
do que o programa habitual. Cansada de pesadelos, acho que não ofereci muita resistência, e o
número de espaços publicitários aumentou até encher quase toda a programação da noite.
Consegui viver um ano praticamente fora da realidade, fazendo apenas algumas incursões por
dia, e os novos algoritmos para otimizar minhas visitas melhoravam a cada tentativa. Começava a
fantasiar com cultivos hidropônicos e reciclagem de resíduos, sistemas que me permitiriam aban-
donar a realidade definitivamente. Com o aumento de horas conectada, meus jardins semânticos
haviam crescido muito e eu tinha adicionado novas fazendas de blogs ao meu território virtual.
Estava mais feliz do que nunca.
Mas meu corpo, essa pobre interface, resistia ao meu plano. Meu isolamento tinha trazido
consequências inesperadas: dores de cabeça e musculares, problemas gastrointestinais, tontu-
ras... E embora durante semanas tentasse ignorar os sintomas, o dia em que comecei a ver luzes
fantasmagóricas que perfuravam as paredes, me fazendo sangrar através do meu nariz e orelhas,
fiquei impressionada e abandonei meu refúgio.
Aparentemente, a evidência não deixava dúvidas: tinha um tumor cerebral inoperável, eu ia morrer.
No entanto, chegar a esta conclusão não tinha sido tão fácil, e de fato me pareceu uma eternidade, sem
meu computador, incapaz de usar o celular, presa por dias numa cama de hospital sempre cercada por
pessoas, empurrada de um lado para outro, esquecida em um corredor sem meu computador, incapaz
de usar o celular. Naquelas noites no hospital, longe do quarto secreto, os espaços publicitários me
abandonaram e os pesadelos começaram a retornar, o primeiro de todos, a minha praia, a minha onda.
Estava na praia de areia negra e pela primeira vez não era uma criança, era eu mesma, com a
estúpida camisola do hospital. E havia também o menino em seu terno de homem velho.
—Tem medo? —Ele disse. —Por quê?
—Não quero morrer.
—Talvez seja porque você não entende o que está acontecendo.
Quando acordei, solicitei imediatamente a alta voluntária. O médico estava espantado, insistia
que, embora o resultado fosse inevitável, o hospital poderia me ajudar a tornar a experiência menos
tortuosa: “A dor será terrível”, disse ele tristemente. Mas com uma determinação com a qual me
surpreendi, levantei-me e lhe assegurei que sairia de qualquer maneira.
Cheguei em casa sem saber muito bem como. Com a minha última gota de força consegui ras-
tejar para dentro do quarto secreto e deitei-me no futon. De canto de olho vi que na tela do meu
laptop brilhava um número infinito de alarmes, mas não tinha forças. De repente, comecei a tossir
sangue, não conseguia parar. Pelo que disse o médico, pensei que me restassem ainda alguns dias,
mas a caminho de casa tinha começado a perceber como meu corpo era um estranho para mim, eu
comecei a ir-me. A tosse não parou e a cada vez minha cabeça doía mais. Minhas mãos tremiam e
as luzes fantasmas voltaram. Senti tanta dor que me levantei num momento, tirando forças de não
sei onde, e comecei a bater minha cabeça contra a parede: precisava quebrar o crânio para abrir
espaço para o que estava crescendo lá ou pelo menos, com sorte, perder a consciência. Em algum
momento, eu pensei ter visto meu reflexo no espelho pequeno na parede — a combinar com o
resto de móveis em miniatura. Havia conseguido abri-lo? Meu crânio parecia ter uma estranha
protuberância na frente, bem acima dos olhos: latejava, respirava.
Meu corpo desistiu com um grito horrível. E demoraria muito até que o descobrissem, com
certeza. Eu, no entanto, me sentia bem.
Ao meu lado, o menino apareceu de novo.
—E agora o que? —perguntei-lhe.
—Agora você está conectada.
-7-
INTRODUcao

B

CAPITULO I

B Quem é
em-vindos a Cultos Inomináveis, o RPG de intri-
ga contemporânea e terror, baseado nas histórias
de H. P. Lovecraft. Com as regras contidas neste
livro, você poderá mergulhar nas histórias mais terríveis
H. P. Lovecraft?
que a raça humana enfrentou. E o fará do ponto de vista No início do século XX, um jovem escritor americano escrevia
dos seguidores de um poder inimaginável e perigoso que histórias de horror sob forte influência de um grande escritor
nem eles mesmos são capazes de quantificar. Felizmente do gênero, Edgar Allan Poe, e seu nome era H. P. Lovecraft. No
para a grande parte da humanidade, esse poder perma- entanto, ao contrário de Poe, Lovecraft desenvolveu um estilo
nece oculto; suas verdades enlouquecedoras, enterradas, próprio e atraente, que transformou suas histórias e seu mundo
e as portas para outros mundos, seladas e esquecidas. em uma referência para muitos outros autores. Ainda hoje, um
século depois, seu estilo continua influenciando filmes, videoga-
Mas para sua desgraça, sempre haverá quem procura re-
mes, jogos de tabuleiro, RPG, literatura e assim por diante.
velar terríveis segredos arcanos e usá-los para seus pró-
prios propósitos, mesmo pondo em risco sua vida, sua Suas histórias foram, principalmente, focadas em uma mis-
sanidade e a vida na Terra como a conhecemos. tura sutil de terror e ficção científica, que é chamada de “ter-

P
ror cósmico”. Em suas histórias, ele desenvolveu toda uma
ara mergulhar no mundo dos Cultos Inomináveis, mitologia, que nomeou de “Mitos de Cthulhu”, baseada em
o melhor que podemos fazer é começar apresentando- abomináveis s​​ eres alienígenas e terríveis verdades escondidas
-lhe ao pai da mitologia em que este livro se baseia, o da frágil humanidade. Seu nome se deve à incrível quantida-
“sumo sacerdote”: H. P. Lovecraft. de de histórias, que sem dúvida constituíram uma verdadeira
8
mitologia, e a importância nelas de uma das criações mais este livro. Estes serão utilizados para determinar alguns
peculiares: Cthulhu. efeitos durante o jogo, fazendo das ações dos jogadores algo
nem sempre esperado e trazendo incerteza ao resultado. Final-
Seu estilo arcaico e erudito, dotado de referências bibliográfi-
mente, um lápis também será necessário para escrever o que
cas e enciclopédicas conferiu uma sensação de plausibilidade,
seja preciso, alguns marcadores e este livro.
que foi combinada com seus Mitos para transformá-lo em
uma fonte de inspiração para outros autores de seu tempo: o Neste livro que tem em mãos, você poderá aprender tudo
Círculo de Lovecraft. Esses autores continuaram a desenvol- o que precisa para ser um Mestre de Jogo e jogar Cultos
ver os Mitos, mesmo depois da morte de Lovecraft. Até hoje, Inomináveis com seus amigos. Nós explicamos como fazer
ainda há uma corrente que bebe de seu legado. os personagens para os jogadores, bem como as regras do
jogo que você e os jogadores devem conhecer antes de jogar.
Lovecraft escreveu sobre a insignificância do homem frente
Ao longo do livro, indicaremos se a seção também pode ser
a forças desconhecidas que existem no universo. Os avanços
lida pelos jogadores ou é reservada para o Mestre de Jogo,
científicos que ocorreram na época em que Lovecraft viveu,
pois, em certos casos, é melhor que os jogadores não saibam
indubitavelmente, levaram à existência desse medo. No en-
o que está por trás da cortina, para poder surpreendê-los
tanto, sua leitura hoje ainda continua a provocar a mesma
nas aventuras.
sensação de insignificância: não são poucos os que, lendo
suas histórias, mergulham no terror que se supõe não ser Finalmente, lembre-se que o importante é se divertir jogando
nada mais que uma gota d’água em um imenso oceano. e interpretando os personagens do jogo, com seus defeitos
e virtudes, suas convicções e suas toli-
ces, no universo imaginário deste
O que é um livro. Mas uma vez que você
terminar de jogar, volte à rea-
jogo de RPG? lidade e seja você mesmo.

Se você já é um jogador de RPG, não precisamos explicar nada


que você não conhece. Pode começar a entrar no mundo dos
Cultos Inomináveis lendo a seção seguinte (pág 10). Mas
também é possível que esta seja sua primeira abordagem aos
RPG. Se for assim, seja bem-vindo a um novo mundo cheio
de emoções em que a sua imaginação e a do seu grupo de
jogadores lhes proporcionarão o máximo de entretenimento
que você jamais imaginou. O limite será sua imaginação
e o desejo de se divertir. Mas vamos por partes.
O que é um jogo de RPG? Um jogo de RPG é composto por
um grupo de jogadores que assumem papéis diferentes (role-
play) e os interpretam ao longo de uma história que contam
juntos. É como fazer teatro, mas improvisando à medida que
a obra caminha, ou assistir um filme e entrar na pele de um
de seus protagonistas, imaginando o que você faria na mes-
ma situação em cada cena em que ele se envolve. Às vezes
meditando o que fazer, ou mesmo seguindo seu instinto;
às vezes fazendo a coisa certa e às vezes nem tanto, mas
sempre com total liberdade.
Em um RPG, existe um Mestre de Jogo, que é o res-
ponsável por dirigir a aventura. É como o diretor
de um filme e a pessoa que maneja todas as cria-
turas que aparecem na aventura e os personagens
secundários. Nos jogos de RPG, nós os chamamos
de personagens do Mestre ​​(PdM). Por outro lado,
existem os outros jogadores no jogo, que são res-
ponsáveis pela
​​ interpretação de um personagem de
jogador (PJ) e que devem enfrentar os desafios que
aparecem na história.
Jogos de RPG geralmente são jogados em volta de uma mesa
e apenas alguns dados (com dez lados, neste jogo) são neces-
sários, o que você pode obter na mesma loja onde comprou

9
Cultos Inomináveis NOSSO LADO DO ESPELHO
As histórias dos jogos ambientados na mitologia lovecraftiana
são frequentemente protagonizadas por investigadores, pesso-
Este é um RPG baseado nas histórias de H. P. Lovecraft que, ao as normais que são expostas ao horror dos Mitos e lutam para
contrário de suas histórias, transcorre na atualidade em vez de combater o horror cósmico e seus adoradores humanos. Esses
nos anos vinte. O cenário das histórias que ocorrem em Cultos seguidores são os cultistas, dementes disfarçados que tentam
Inomináveis tem
​​ certos toques de terror, intriga, mas também propiciar o fim do mundo.
ação, fantasia e ficção científica.
Mas é necessariamente dessa forma? Ou essa é a visão que os
Recomendamos que, se você não sabe nada sobre a bibliografia investigadores têm? Não seriam eles pesquisadores fanáticos
de Lovecraft, leia alguns dos seus contos para entender melhor tentando destruir o que eles não entendem para negar uma
o universo deste jogo, especialmente se você tiver a intenção realidade que foi revelada apenas a alguns poucos? Cultos
de ser a pessoa encarregada de dirigir e introduzir jogadores Inomináveis ​​quer fugir da visão maniqueísta dos cultistas e
neste cenário. converter os membros dos cultos em protagonistas da his-
Nas histórias dos Mitos de Cthulhu, os protagonistas costumam tória. Talvez haja cultistas disfarçados tentando promover o
encontrar eventos que os fazem perder a sanidade ao superar fim do mundo no porão de uma igreja antiga, e talvez alguém
completamente a compreensão humana. Além disso, criaturas tenha que detê-los, mas a maioria dos cultos são diferentes e
perseguem interesses distintos.
diferentes, de formas horrendas e natureza incognoscível tam-
bém fazem aparições, seja para devorar os pobres pesquisadores E por culto entendemos qualquer grupo humano que teve
do oculto, ou para dar-lhes destinos piores. contato com a realidade dos Mitos e, em vez de rejeitá-la, tem
procurado o caminho para explorá-la para seu próprio ga-
Nessas aventuras, os pesquisadores lutam para impedir o
nho ou a estudado para obter respostas para as questões fun-
que muitas vezes descobrem ser impossível parar: as forças
damentais do universo. Assim, a cúpula de uma empresa que
do desconhecido. Forças muito mais poderosas e antigas que
descobriu uma cidade perdida enquanto desmatava a Amazô-
a própria humanidade. Lutam para a humanidade sobreviver
nia pode ser um culto, como também uma família endogâmi-
mais um dia, sempre sob a sensação de que isso não é uma ca da América em cujo poço dorme algo caído do espaço há
vitória definitiva, mas apenas o adiamento do inevitável. E muito tempo. Não importa se a motivação do grupo é obter
muitas vezes eles morrem na tentativa, de forma anônima e benefícios materiais, defender-se contra estranhos ou alcançar
quase sempre altruísta, preferindo manter os terríveis segre- um objetivo maior: se eles escolhem usar o conhecimento dos
dos que descobriram longe dos outros por causa do perigo e Mitos como uma ferramenta ou buscam isso como um fim em
da loucura que representa para eles. si, então eles são um culto. Embora originalmente o propósito
No entanto, esses infelizes transformados em heróis anôni- do cultista fosse outro, acumular poder e examinar a realida-
mos têm seu contraponto, pois também há certos humanos de dos Mitos logo se torna um objetivo obsessivo, irresistível.
dispostos a empregar essas forças, que mal entendem e sobre Cultos Inomináveis é​​ sobre o vício de um poder que destrói
as quais seu controle é muito pobre, em benefício próprio. a identidade de alguém, o que o transforma em algo que não é
Não vamos dizer que eles são o outro lado da moeda, mas humano. Trata de forças que poucos indivíduos tentam con-
eles são a mesma face de outra moeda: os cultistas. trolar... para terminar controlados por elas.

Os cultistas colaboraram com as forças ocultas, consciente


ou inconscientemente, por suas próprias razões: poder, co- OS BANDIDOS DOS FILMES
nhecimento, riqueza, imortalidade, curiosidade ou loucura. Todos vimos filmes, lemos livros ou jogamos centenas e cen-
E normalmente a única vida humana que eles valorizam é​​ tenas de jogos nos quais interpretamos o bom, o nobre e o
a deles, porque sabem o escasso valor que têm na ordem sagrado protagonista. Esse ser insuperável que alcança tudo,
cósmica. Ao lidar com seres que viram a passagem de eras, que luta contra os bandidos e que sempre consegue superar
que vivem em lugares completamente fora do nosso espaço qualquer desafio, sempre confrontando os vilões carentes de
e tempo, a vida humana passa a valer o mesmo que a de um ideias, meros espectadores dos feitos heroicos da história.
inseto. O que é uma vida humana comparada com a possi- No entanto, você nunca parou para pensar que seria bom
bilidade de viajar pelas Terras dos Sonhos e desvendar seus se seus antagonistas fossem mais espertos? Já se perguntou se
segredos? O que vale a moralidade, a honra ou o amor contra aqueles pobres coitados que caem nas mãos dos heróis têm
o poder dos deuses primitivos ou externos? Qual o valor de uma família? Ou se eles têm uma boa razão para confrontar
nossa sanidade se é apenas uma barreira que nos impede de esses heróis? Certamente você já o fez, mas não acha que essas
entender como funciona a tecnologia de ponta Mi-Go? razões podem ser tão coerentes e válidas para eles tanto quanto
Essas pessoas geralmente se organizam em grupos conheci- as dos heróis? Em todas as guerras existem duas frentes que
dos como “cultos”. Os cultos têm os motivos e objetivos mais acreditam estar lutando do lado correto.
variados, mas compartilham um elo comum: eles estão dis- É verdade que na vida real ninguém pensa que faz algo erra-
postos a usar todo o poder que possam reunir para realizar do. Todos temos nossas convicções que justificam nossos atos
seus objetivos. Para eles, o fim justifica os meios. E os meios como bons, enquanto percebemos os mesmos atos, realizados
costumam ser atrozes. por outra pessoa, como maus. É verdade, também, que na vida
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real não há cor clara representada por heróis e a escura representada
pelos vilões. Tudo é mais borrado, cinzento. Os bons não são
tão bons, ou pelo menos não sempre. E os bandidos não
são tão ruins, ou pelo menos têm uma justificativa.
No mundo de Cultos Inomináveis, interpretaremos
​​
personagens cinzentos, com suas justificativas pessoais para fazer
o que fazem. Eles não são maus, apenas não são altruístas e estão
dispostos a desvendar os segredos dos Mitos para seu próprio benefício.
No entanto, isso faz com que sejam rotulados de “bandidos” da história
em mais de uma ocasião.
É hora de deixar de lado a ideia de que tudo vai dar certo, que o bem triunfará
sobre o mal, não importa o que aconteça. É hora de entrar naquela sala escura
que é a realidade e continuar acendendo fósforos que iluminam um pouco a
verdade. Assim, os personagens dos jogadores adquirirão poder e conheci-
mento proibido que os ajudarão a revelar o que realmente está acontecendo
no mundo. Contudo, esse conhecimento e poder também têm um preço. Os
personagens precisarão levar em consideração o quanto estão dispostos a
se doar e precisarão estabelecer a fronteira do que acreditam pertencer
a luz e o que pensam ser da escuridão.

E A BIBLIOGRAFIA?
Em quase qualquer RPG dos Mitos que se preze, no final do primei-
ro capítulo há uma lista de contos e romances escritos por Lovecraft
e outros membros de seu Círculo pertencente ao Mitos de Cthulhu.
Nós não a incluiremos porque qualquer consulta rápida a Wikipedia
permitirá que você obtenha informações mais atualizadas e completas do
que poderíamos coletar aqui. Além disso, todas essas histórias clássicas dos
Mitos compartilham um cenário de fundo com Cultos Inomináveis, mas
geralmente são ambientadas em outra época e são apresentadas a partir de
outra perspectiva, assim podem não ser tão inspiradoras para jogar este jogo.
Isso não significa que não sejam uma grande fonte de ideias e quase
de leitura obrigatória para quem quer entrar na cosmologia de
Lovecraft. E se você quiser condensar tudo em um único livro
e temperar com um pouco de humor, então Conhecendo
Cthulhu é o seu livro.
Também resistiremos à tentação de colocar uma lista de filmes
que tocam, às vezes tangencialmente, o tema dos Mitos. Seriam
muitos e variados, desde adaptações de Lovecraft até outras cujas
semelhanças com o trabalho do escritor de Providence podem
existir apenas em nossas mentes. De obras-primas do cinema aos
subprodutos de série B, maltratados pelo tempo, novamente na
Internet é possível encontrar listas muito mais abrangentes e bem
fundamentadas do que o que poderíamos fazer aqui.

CULTOS INOMINÁVEIS

Nos relatos de H. P. Lovecraft, é mencionado um volu-


me dos Mitos de Cthulhu, chamado Cultos Inomináveis.
Este volume, também chamado O livro negro devido a
sua capa de cor totalmente preta, foi escrito em 1839 pelo
alemão Friedrich Willheim von Junzt. O nome do livro em
alemão era Unaussprechlichen Kulten, e relata a proximidade
de diversos cultos, desde os primeiros homens até o tempo de
sua escrita. Depois de passar por várias mãos, o livro acabou
perdido no tempo. Até hoje.

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Re: Nyarlathotep

Sentimo-nos desamparados. Foram anos de grande incerteza.


Primeiro o colapso do sistema econômico. Depois de tanto tempo apostando com fichas de pôquer,
parece que esquecemos que no final do jogo teríamos que acertar as contas. No entanto, pagamos: com
mais fichas ainda.
Para manter a aposta eram necessários grandes sacrifícios, e as desigualdades, essas que na realidade
tinham existido desde sempre, passaram de uma questão moral que nos lembrávamos uma vez outra para
uma dor dilacerante que não nos permitia pensar em mais nada.
Ainda tinha que machucar muito mais.
Na Tunísia, um jovem se incendiou em frente a um prédio público e finalmente chegou a primavera.
Gritamos. Até aqueles dentre nós que haviam perdido a voz, aqueles que aprenderam a viver em silêncio,
gritaram. Mas logo começaram a jogar palavras ao vento, palavras rápidas que se referiam a conceitos uni-
versais, cada qual com um grau de opinião diferente. Bandeiras eram usadas, antigas afrontas locais eram
usadas em uma guerra que deveria ter sido global. Cada qual encontrou o inimigo que esperava encontrar.
E assim, instalados na injustiça, andamos pelas ruas gritando sem que a mensagem chegasse aos seus
destinatários. Presságios terríveis eram ouvidos através de qualquer alto-falante. E todas as conversas
chegavam à mesma coisa: uma raiva contida que acabou se dissolvendo em desolação.
Desamparados, sim.
Não muito depois, a taxa de desemprego atingiu máximas históricas e a língua começou a se trans-
formar convenientemente. Eufemismos e neologismos devoraram a língua: oficial, jornalística e até
mesmo na rua. Era apenas o começo, uma atualização imprescindível para tornar nossa uma tecnologia
que, em seu lugar de origem, não era mais útil: o sonho americano. Nós abraçamos a esperança como
incentivo para que os escravos voluntariamente estalassem os chicotes uns nos outros. E os novos heróis
surgiram, estudantes universitários que revolucionavam o mundo sustentando-se tão somente da ilusão,
visionários que faziam de sua maior paixão uma profissão.
Foi então que dentre os nomes de empresários heroicos, começou a se ouvir um que exigia atenção,
ainda que apenas pelo estranhamento causado na longa lista composta quase exclusivamente de no-
mes anglo-saxões: Safir Al-Aswad.
Eu o vi pela primeira vez na televisão, em uma mesa redonda com vários empresários do Oriente
Médio que falavam do impacto econômico dos levantes populares na Turquia e no Egito. Um homem
de meia-idade, magro e de traços afilados, pele morena, cabelo preto com um corte moderno e olhos
também negros, talvez até demais.
Suas intervenções foram perturbadoras. Quando o moderador lhe dava o direito de falar, ele perma-
necia em silêncio nos primeiros segundos, olhando diretamente para a câmera, olhando diretamente em
seus olhos, arqueando de maneira exagerada as sobrancelhas para cima e abrindo as pálpebras drama-
ticamente, até mesmo de forma ridícula. De repente, começava a falar e seu discurso se iniciava com
palavras suaves que pouco a pouco se transformavam, de forma tão gradual que a transição era invisível,
em monstros ásperos, que apelavam aos instintos mais básicos. Não eram mais palavras, mas vozes,
gritos. E acabava tão de repente quanto havia começado, deixando até mesmo algum conceito órfão no

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ar. A câmera seguia focando-o por muitos segundos até que alguém se atrevia a falar novamente, visivel-
mente atordoado, ainda olhando para ele com desconfiança, como se fosse um animal perigoso. Pensei
que ele era louco.
Mais tarde, descobri que as pessoas tinham feito upload, para diferentes plataformas de vídeo
na Internet, de outras mesas redondas de que participara esse personagem, assim como conferên-
cias, palestras e até mesmo entrevistas ocasionais. Eram na maioria dos casos vídeos de quali-
dade inferior, onde só se conseguia distinguir seu profundo olhar. Mas, mesmo neste formato
péssimo, o coração congelava em cada silêncio que Al-Aswad fazia antes de falar. Impressionava
o terrível contraste de salas cheias de gente alegre que aplaudiram sua entrada com o silêncio
sepulcral durante seu discurso — as pessoas paralisadas. No final de um desses vídeos, minutos
depois de Al-Aswad deixar o palco, o espectador que segura a câmera ainda gravando: não há
ovação final, o público permanece em um silêncio terrível, o palco vazio e ninguém se move de
seu assento até que finalmente uma mulher, fora de plano, mas muito perto, irrompe a chorar
desconsoladamente — o vídeo é cortado.
Passei semanas obcecado em rever suas conversas. Sempre sua voz, seus olhos. Muitos se per-
guntavam como ainda não existia um compêndio do conhecimento de Al-Aswad, confiantes de que
os empresários logo o tornariam a pedra angular de sua igreja. Mas era impossível costurar seu
discurso, tão errático. Apenas alguns conceitos ressoavam, e mais tarde você se encontrava inserin-
do-os em conversas espontaneamente. Falasse sobre o que falasse, fosse arte, sociologia, psicologia
ou religião, seus tecnicismos econômicos serviam como metáfora, tanto para avaliar o custo de
oportunidade de uma amizade quanto o retorno do investimento em um relacionamento a dois.
Era uma referência mundial e ainda assim não consegui encontrar um projeto em que o egípcio
tivesse depositado toda a sua sabedoria. Sim, dezenas de projetos, supostamente iniciados por ele,
eram conhecidos nos mais diversos países que levavam o capitalismo a lugares onde quase não
havia água corrente, mas ele não ficava no mesmo lugar por muito tempo. Ele também foi conse-
lheiro de dezenas de empresas e até mesmo de algum governo. O empreendimento era, para ele,
uma aventura sem descanso.
Em sua passagem pela Europa das sociedades mais avançadas, Al-Aswad deixou um rastro de
homens e mulheres que, inspirados por ele, abandonaram suas vidas convencionais para se torna-
rem empreendedores. Eles ofereciam suas vidas para as startups que fundaram, como se fosse um
sacrifício para um deus. Depois eles mal se relacionavam com alguém que não era membro de seu
círculo e, na verdade, muitas vezes viviam juntos, trabalhando até a exaustão e humilhando mem-
bros que não conseguiam acompanhá-los, sem tempo para pensar no futuro, apenas no próximo
marco. E à noite, esses discípulos gritavam em sonhos, perseguidos por terrores que invadiam as
horas de vigília, porque dias e noites já eram apenas uma mistura confusa.
Quando Al-Aswad finalmente chegou em minha cidade, pensando que eu o havia estudado com-
pletamente, que conhecia seus truques melhor do que qualquer outro, eu não pude resistir a ver seu
show ao vivo.
Mas naquela noite o céu estava assustadoramente claro, a cortina de poluição, rasgada, mostrava
uma infinidade de corpos celestes no vazio. De repente, fui surpreendido pela ideia de que, a qual-
quer momento, eu poderia cair do nosso mundo definitivamente. Então me refugiei no Palácio dos
Congressos, ao lado de uma multidão que conversava animadamente diante da oportunidade de ver
o líder do picadeiro, finalmente cara a cara.
Me encontrava pela primeira vez cercado por seus seguidores. Fiquei imediatamente ciente de que,
por mais que eu achasse que conhecia o professor, não sabia o suficiente sobre essa parte dele, seus
discípulos. Teria sido fácil participar de uma de suas muitas reuniões — gostaria de tê-lo feito! Eles
se reuniam com qualquer desculpa: às vezes para encontrar o componente que lhes faltava em seus
equipamentos, ou para tentar conseguir aquele contato dos sonhos que lhes ofereceria o financiamento
necessário para evitar a sua provável queda no abismo, ou para receber magistralmente lições daque-
les que conseguiram tornar o empreendimento um modo de vida, mas principalmente para alimentar o

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sentimento de pertinência, para alimentar um ao outro. Mais tarde — tarde demais — entenderia que
foi através deles que a linguagem de Al-Aswad se espalhou pelo mundo.
Meus passos foram ficando curtos conforme cruzava o saguão: procurava um lugar discreto de
onde poderia observar. Formando círculos estritamente configurados, os discípulos desenhavam
espontaneamente um diagrama de castas que, para mim, seria impossível rastrear. Identifiquei os
círculos mais exclusivos, daqueles dos quais a maioria dos recém-chegados foram desviados sem
consideração e, fingindo verificar meu celular, orbitei alguns segundos lentamente em torno de um
desses círculos. Eu os ouvi repetindo os detalhes técnicos apropriados que lhes permitiam identifi-
car uns aos outros, palavras selecionadas de três ou quatro livros essenciais escritos pelos evange-
listas de Al-Aswad. Podia-se sentir a influência do egípcio em todos os lugares, alimentando a frus-
tração predominante, avivando a necessidade de recuperar o controle: somente em tal lugar, usando
seus cargos hipertrofiados, repetindo discursos mil vezes ensaiados para convencer aos outros, mas
principalmente a si mesmos, os líderes dessas pequenas empresas se sentiam livres. Enquanto isso,
das sombras, o capital espreitava. Porque, embora muitos seguidores do egípcio enchessem a boca
dizendo que queriam mudar o mundo, eles estavam dispostos a abandonar qualquer uma de suas
ideias ao menor sinal de que isso poderia ser um fardo na hora de obter benefícios. Eles estavam
mudando o mundo, sim, palavra por palavra: o sucesso já não era mais alcançar o objetivo na aven-
tura empreendida, o sucesso era que o capital os envolvesse em seu manto, que os possuísse.
Talvez tivesse olhado um pouco mais intensamente para algum dos membros desses círculos
exclusivos, pois seus colegas se voltaram para mim, ao mesmo tempo. Perturbado com isso, fui
embora na direção das portas que levavam ao anfiteatro.
No caminho, ainda ouvi alguma estranha admiração intrusiva, observações de turistas fascina-
dos. “Eles são tão jovens!”, disse um deles. Com certeza os curiosos que se aproximaram, alheios
a trama em desdobramento, pensariam que essas pessoas demonstravam uma capacidade e ini-
ciativa incomuns, que deixavam a maioria dos cidadãos como pouco mais que ociosos. Eu ouvira
Al-Aswad incontáveis vezes proferir exageros contra os trabalhadores assalariados, aplaudido
por uma multidão composta em grande parte por esses mesmos trabalhadores: o egípcio conse-
guira convencê-los de todo o esforço heroico envolvido em ser um empreendedor — um esforço
de uma dignidade superior.
Todos enganados. Aqueles que vinham para ver o espetáculo e aqueles que participavam dele.
E mesmo assim eu teria dito que alguns de seus discípulos estavam me observando, cruzando os
olhos com os meus, desafiadores, me avisando que não era bem-vindo, que o melhor a fazer era
partir. Era talvez uma instrução insidiosa de seu mestre que os levou a me perseguir?
Senti uma queda repentina, caí dentro de mim mesmo. Então fui golpeado pela vívida impressão
de que o que me rodeava não passava de uma lembrança, eu era apenas um espectador. Estendi a mão
para um transeunte, uma pessoa que não percebeu a minha existência, e eu senti como se tentasse
agarrar a cauda de um cometa sulcando os céus, uma forma de ilusão de ótica em que as pontas dos
meus dedos pareciam quase tocar o braço do desconhecido quando eu bem sabia que a distância era
intransponível. O bombeamento impertinente que estava batendo em minhas têmporas desde que eu
cruzei as portas começou a prevalecer. Eu havia entrado no Palácio de Congresos, sim, lembrava de
ter visto as portas do lado de fora, o céu, teria sido impossível esquecer esse buraco ameaçador, como
se um gigante tivesse rasgado o telhado e agora me mostrasse o mecanismo dos planetas e estrelas.
Mas, como cheguei à porta? Como havia chegado ali? Eu fantasiei por um momento com a ideia de
que eu não tinha saído da minha casa, sentado no escuro na mesa da sala de estar em frente ao meu
laptop, como em tantas outras noites, revendo vídeos em que o egípcio aparecia. A luz desaparecia por
alguns instantes, o ar começou a ficar escasso. Era um vídeo, tinha que ser, eu dei um passo e estava
dentro: só tinha que dar um passo para trás. Minhas pernas falharam comigo.
Acho que cheguei a cair. Um homem me segurava pelos ombros e uma mulher afrouxava minha
gravata, desabotoando até a gola da minha camisa: ela parecia genuinamente preocupada. Senti,
no entanto, uma onda de olhares que estudaram furtivamente a situação sem sair de seus respec-

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tivos círculos. “Está tudo bem?”, perguntou a mulher. Balancei a cabeça e agradeci a ela e ao ca-
valheiro que me segurou. O local parecia completamente iluminado de novo e, embora meu pulso
ainda estivesse hesitante, senti que teria força suficiente para chegar ao meu lugar. “Você tem
certeza de que não quer que eu chame alguém?”, ela insistiu. Mais uma vez agradeci e me afastei.
Havia estudado o egípcio por meses, horas revendo vídeos de baixíssima qualidade, quadro a
quadro em busca de sinais, mergulhando em anotações manuscritas que cresciam sem destino, em
todas as direções. Claramente estava chegando ao limite de minhas forças.
O anfiteatro era colossal e estava quase completamente ocupado. Tinha conseguido um assento
muito perto do palco e tive que atravessar uma multidão de pessoas que não tinham ocupado seus
lugares ainda, se aglomerando nos momentos antes do show com a esperança de marcar uma reu-
nião ou ganhar um cartão de visitas. A corrente me conduzia, ocasionalmente bloqueado por pelas
caixas de som, descendo pelo corredor central.
Finalmente no meu lugar, olhando em volta, comecei a recuperar certa tranquilidade. Aquilo não
era muito diferente de outras conferências que eu havia assistido e o ar da plateia era definitivamen-
te alegre, um público composto de pessoas de todos os tipos. Você poderia culpá-los? Al-Aswad era
um mentiroso esperto e alimentado pela necessidade. Entre a multidão reunida ali era impossível
distinguir os empresários dos simples espectadores, era impossível distinguir os fiéis dos infiltrados
como eu. Senti-me seguro.
Quando soaram os sinais para que todos tomassem seus lugares, desligassem os telefones celula-
res, respirei profundamente e disse a mim mesmo que não havia sentido em ter medo, que conhecia
muito bem os de sua laia para cair em suas armadilhas. Eu até me permiti soltar um leve sorriso.
As luzes se apagaram. O palco estava completamente vazio, não havia sequer um tablado, nem
uma tela em que os slides pudessem ser projetados. As pessoas irromperam em aplausos ensurde-
cedores quando Al-Aswad apareceu, emergindo de algumas cortinas ao fundo. Elas aplaudiram
e celebraram por minutos. O egípcio permaneceu imóvel, sem nenhum traço de emoção em seu
semblante. Aos poucos, euforia do público foi esfriando e os aplausos cessaram, mas havia ainda
ocasionalmente alguém gritando um slogan, um código de cúmplice que unia todos sob a mesma
bandeira, e depois voltaram a ser ouvidos novamente alguns aplausos, dispersos, confusos. Al-
Aswad permaneceu em silêncio. Mas o verdadeiro silêncio, o silêncio absoluto, não durou mais
do que meia hora.
Mesmo os ruídos mais casuais, tosses, comentários furtivos, mesmo o zumbido vindo do sistema
elétrico, diminuíram até se dissolver completamente: era como estar surdo. Imóvel, paralisado, só
pude olhar na direção de Al-Aswad. Tinha sentido, no entanto, como a temperatura na sala estava
caindo, senti os corpos ao meu redor se desligarem um a um. O mundo havia desaparecido e fica-
mos sozinhos, somente ele e eu.
Então as palavras começaram a ser ouvidas, aquelas palavras que escutei muitas vezes em podcasts
e vídeos, mas dessa vez foram atenuadas como se estivessem acontecendo em outro plano de existên-
cia. Al-Aswad estava me encarando: seus lábios permaneciam selados.
Compreendi que aquelas palavras, para mim totalmente desconhecidas e que ainda assim tinham
me obcecado, palavras que uma e outra vez havia ouvido nos lábios dos discípulos do egípcio, que
graças a eles de um para o outro extremo do globo foram repetidas em dezenas de línguas, careciam
completamente de significado. Eram mais como o efeito audível de um processo que passava sob
a superfície. Uma porta se abria em algum lugar e, em vez do ranger de suas dobradiças, o que se
ouvia era aquela ladainha, cada vez mais alta. A porta estava quase aberta.
Flutuamos no vazio e meu corpo tomado de frio rendeu-se finalmente. Al-Aswad também era
um sinal, um efeito óptico, apenas a sombra de um homem idoso que não podia ser alcançado. As
estrelas e os planetas estavam conosco.
Do mundo, restava apenas um eco; e as cortinas atrás dele se abriram.
Então pude ver.

- 15 -
personagens CAPITULO

II

O O
s personagens são os protagonistas das histórias de
Cultos Inomináveis, o alter ego dos jogadores no
mundo do jogo; enfrentarão as situações misteriosas
e perigosas que o Mestre de Jogo colocará diante deles.
Se você jogou RPG antes, certamente criou dezenas de per-
sonagens; talvez você queira ir diretamente para as questões
mecânicas do processo de criação, ignorando as seções ante-
riores de ideias e dicas sobre o design de personagens. Além
disso, se já jogou outros jogos baseados nos Mitos de Cthu-
lhu, terá certas ideias pré-concebidas sobre os arquétipos de
personagens que usará para criar os seus próprios em Cultos
Inomináveis. Nossa recomendação é que mesmo que você
seja um jogador experiente, versado em mil histórias dos
Mitos, continue lendo, já que este jogo usa uma abordagem
bastante atípica.
As histórias dos Mitos sempre se tratam de pessoas que des-
grupos. De um lado, estão os investigadores, que confrontam
os Mitos como uma encarnação do mal, buscando não atra-
vessar a linha, mas pisando-a de forma sistemática. Do outro
lado da linha, estão os cultistas, que perderam completamente
sua razão e só procuram servir seus mestres alienígenas, assim
como destruir tudo o que é bom ou sagrado, ou até mesmo
humano. Em Cultos Inomináveis essa linha não existe. Longe
do mundo maniqueísta em preto e branco que se apresenta
em outras abordagens, aqui está pintado um panorama cinza
escuro, no qual a exposição aos Mitos é uma descida viciante
em direção à corrupção do corpo e da mente, e também uma
busca pessoal pelo poder, revelações ou vingança. No final não
importa tanto o ponto de partida, mas sim o modo como os
personagens encaram os eventos.
Nesse jogo, os cultistas não são do tipo encapuzado que en-
toam ladainhas para atrair um deus exterior sombrio que
cobriram ou descobrem uma verdade inefável e se encontram causará a destruição do mundo e devorará seus seguidores...
com seres além da compreensão humana. Em outros jogos dos Ou, pelo menos, não a maioria. Não, os cultistas são pessoas
Mitos, há sempre uma linha que divide essas pessoas em dois que descobriram uma ferramenta nova, poderosa, secreta e
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instável: o conhecimento do sobrenatural. E eles estão dis- pouco mais que um obstáculo em seu caminho. Então, será
postos a usá-la para alcançar seus próprios objetivos, tão quando ele quebrará seus grilhões.
louváveis e aceitáveis (ou completamente oposto) como os de
Nesse sentido, a influência dos Mitos pode ser entendida
qualquer pessoa: sucesso pessoal ou profissional, poder,
como uma droga poderosa que, além disso, permite alcan-
riqueza, aceitação social, justiça, conhecimento ou a promes-
çar tudo aquilo que sempre foi sonhado e muito mais. Como
sa de vida eterna que todas as religiões oferecem.
qualquer droga, ela possuirá a vontade de seu consumidor e
Os cultistas não são necessariamente maus, no sentido moral destruirá sua vida e humanidade anteriores. Ela irá forçá-lo
do termo. São os meios escolhidos para alcançar seus obje- a fazer coisas que nunca teria pensado que poderia fazer, e
tivos, esse caminho rápido e sedutor, que os expõe a perigos quanto mais poderoso se sente, mais ele será um prisioneiro
inimagináveis e os forçam a fazer coisas indescritíveis, porque dos poderes que acredita dominar.
o conhecimento dos Mitos é viciante e muito capaz de trans-
formar ou destruir seus portadores. Assim, a vida do cultista
será uma luta constante entre sua vontade de se conformar
com o que ele já alcançou e seu desejo de mais conhecimento Criação de personagens
proibido, o que implica em continuar o caminho descendente
em direção à perda da própria humanidade. A seguir se descrevem os passos para criar um personagem:

Por outro lado, o termo “culto” é usado nesse contexto, vaga-


mente, para se referir a grupos de pessoas organizados em torno 1. CONCEITO
do conhecimento dos Mitos e que os utilizam para obter fins Escolha um conceito para o personagem: uma palavra ou frase
comuns. Você encontrará mais informações sobre os cultos, que resuma o que o personagem é em essência. Pode ser sua ocu-
incluindo uma tipologia e regras para criá-los, no capítulo “Cul- pação, sua vocação, o que poderia ter sido e não foi, ou o que re-
tos” (página 160). Além disso, seria conveniente a todos os presenta para os outros. Seja como for, o conceito é um elemento
jogadores dar uma olhada nesse capítulo para criar, em conjun- central do personagem, é como você o descreveria se remover
to e sob a supervisão do Mestre de Jogo, o culto cujos persona- pudesse usar apenas duas ou três palavras, ou como você se refe-
gens pertencem. Do ponto de vista prático, a criação do culto riria a ele se fosse alguém conhecido, mas sem um nome.
provavelmente deve preceder a criação de personagens para
O conceito do personagem atua como um aspecto que você
garantir que eles se encaixem na estrutura correspondente, mas
pode invocar sempre que o personagem estiver agindo den-
preferimos manter a ordem usual de jogos de RPG nesse livro
tro dos parâmetros do mesmo ou perseguindo motivações,
e apresentar a criação de personagens primeiro. Geralmente é
ou objetivos característicos do conceito. Os aspectos e sua
suficiente ter uma ideia geral do tipo de culto, e os detalhes mais
utilização estão detalhados no capítulo “Sistema” (pág. 42).
concretos podem ser deixados para o fim. Por enquanto, fique
com a ideia de que um culto não precisa ser um grupo religioso,
mas pode ser uma organização científica, comercial, fa-
miliar ou de qualquer outro tipo. Uma organização,
Exemplos de conceitos
isso sim, criada ou transformada pelo contato com os
Mitos. Uma organização que vê o conhecimento dos
o sinistro. De sce ndente de uma bruxa de Salém.
Mitos como um instrumento para atingir seus objeti- Livreir
vos, quando não um fim em si mesmo.
Agricu ltora endogâmica. Viciado em jogo com muitas dívidas.
A vida de um cultista nem sempre é completamen-
Diletante aficionado ao oculto. Assassino em série.
te dedicada aos Mitos, especialmente no começo.
A maioria começa sua vida combinando sua busca Alta Sacerdotisa de Dagon. Justiceiro.
por conhecimento e poder sobrenatural com uma
Advogado inescrupuloso. Eco terrorista.
existência pessoal e profissional padrão. O cultis-
ta terá um emprego, uma família e alguns amigos Descrente assassino de aluguel. Inofensiva aficionada por
os. antiguidades.
Pai de família exemplar com segred
que geralmente são inconscientes e ignorantes de
suas inclinações, e tendem a combinar as duas vi- Policial sem nada a perder.
das tanto quanto possível. Ele não seria o primeiro Alcoólico reabilitado.
Veterano do Afeganistão.
Buscadora da Verdade.
pai de família exemplar, trabalhador incansável e
marido solícito que se encontra com companheiros Drogado sem sorte.
estranhos em algumas tardes e guarda no porão de Líder visionário.
”A caçadora”.
Agente de polícia justiceira.
sua casa algum misterioso artefato. Infelizmente, a
influência dos Mitos sobre a vida pessoal logo será Historiador muito curioso.
notada, e para a maioria dos cultistas logo surgirá Profeta das estrelas.
a necessidade de abandonar o lastro em sua busca Mente Criminosa.
pelo poder. À medida que a alienação do cultis- Cientista pouco ortodoxo.
ta avança, o humano começará a lhe ser estranho, Vingador disposto a tudo.
17
2. CARACTERÍSTICAS: Para cada característica, escolha um traço descritivo, uma
frase ou palavra que ilustre como seu personagem se pare-
DISTRIBUA 20 PONTOS ce por causa de sua pontuação na característica. Isso serve
As características são as habilidades primárias do persona- para descrever o personagem e criar uma imagem de suas
gem que nos dizem como ele é. Existem quatro: duas físicas e características sem aludir aos valores numéricos, para lhe dar
duas mentais. Cada uma realmente inclui um bom número vida além das estatísticas do jogo. Além disso, cada traço atua
de qualidades diferentes, mas por uma questão de abstração como um aspecto. O Mestre de Jogo achará especialmente
consideraremos cada uma como um todo uniforme, atribuin- útil para descrever os PdM e permitir que os jogadores te-
do uma única pontuação a cada característica: nham uma ideia de quem está diante deles.
Força: Representa a força, o vigor, a resistência. Os perso- Como pode ser visto, nem todas as descrições são “positivas”.
nagens com maior Força geralmente serão maiores e mais Algumas delas referem-se claramente a pontuações baixas. Tais
durões que os demais, mais perigosos quando lutam sem descrições podem parecer contraproducentes e, de certa forma,
armas e mais difíceis de derrubar. o são porque permitirão que outros jogadores, ou o Mestre de
Reflexos: É a velocidade de reação, coordenação e tam- Jogo, as ative como aspectos negativos. Agora, tais ativações sig-
bém habilidade manual. Os personagens com Reflexos nificarão que o personagem ganhará pontos dramáticos, que
mais altos reagem antes, têm movimentos mais precisos e podem ser usados depois para ter sucesso em situações futuras.
melhor equilíbrio. Em resumo, as fraquezas de um personagem serão uma fonte de
desvantagem, mas também permitirão que o personagem obte-
Vontade: Esta característica refere-se à presença, ao porte, nha resultados extraordinários com mais frequência.
ao caráter, a sua autoconfiança e segurança, e também a sua
tenacidade e postura. Os personagens com uma grande
Vontade são carismáticos e atrativos. Também são capazes
de resistir a grandes pressões físicas e mentais.
Intelecto: Reflete a inteligência do personagem, sua
capacidade de raciocínio, mas também sua astúcia e
capacidade de memória. Personagens com um Inte- Exemplos de traços
lecto superior aprendem mais rápido e adquirem co-
nhecimento mais facilmente. A percepção também Traços de Força Traços de Vontade
depende do Intelecto. Fisiculturista. Gagueja quando fala.
Distribua vinte pontos entre as quatro características. Compleição forte. Teimoso.
Para cada um delas o mínimo é 1 e o máximo é 10. A Fibroso. Inconstante.
média para uma pessoa normal é de 3 pontos, mas o per- Costas largas. Carismático.
sonagem do jogador é um cultista, alguém que dedicou Muito magro. Resolvido.
sua vida a conhecer uma Verdade terrível e aterrorizante, Corpulento. Olhar frio.
e é servido de poderes que vão além da compreensão Claramente sedentário. Crente devoto.
humana. Uma pessoa, em suma, que tende a estar acima Infatigável. Pertinente.
da média... às vezes. Pequeno, mas valentão. Líder nato.
Delicado. Vira casaca.
Valores das características Fraco.
1 Bastante abaixo da média. Evidentemente baixo.
Supersticioso.
Mirrado. Constante.
2 Baixo, mas dentro da média. Não atrai atenção.
3 Valor médio de uma pessoa adulta em circunstân-
cias normais.
Traços de Reflexos Traços de Intelecto
4 Algo acima da média, mas nada de extraordinário. Dedos ágeis. Olhar despreocupado.
5 Razoavelmente acima da média. É normal, mas Felino. Calculadora humana.
chama a atenção. Flexível. Impulsivo.
6 Muito acima da média. Destaca-se muito e é mais Bem coordenado. Sem imaginação.
do que possível que tenha uma certa fama. Parkinson. Memória prodigiosa.
7 Muito proeminente e certamente famoso por isso. Movimentos desajeitados. Ouvido fino.
8 Elite mundial. A força de um fisiculturista pre- Impossível pegá-lo de Distraído.
miado ou o intelecto de alguém que recebeu o surpresa.
Prêmio Nobel de Física. Ilusionista profissional. Capta todos os detalhes.
9 Entrará na história. Os reflexos de Bruce Lee, o Nunca tropeçou. Concentração
intelecto de Einstein ou a vontade de Gandhi.
impertubável.
Pensa em cad
10 Um dos melhores da história, não só de hoje. movimento. a Sonhador.
Algo lendário. Boa pontaria. Intolerante.
Pés ligeiros. Sabe tudo.
18
Para mais detalhes, veja a página 42, onde se explicam os aspec- MARCOS OCULTOS
tos com mais detalhes.
Se o Mestre de Jogo autorizar, um personagem pode
3. MARCOS: ESCOLHA QUATRO começar com até dois marcos “ocultos”. Simplesmente
Os marcos nos dizem coisas sobre a vida do personagem que existem dois momentos chave na vida do personagem
nos ajudam a entender como ele chegou a ser quem é. Cada que ainda não conhecemos e que serão descobertos du-
marco é uma frase descritiva sobre o personagem que repre- rante a história. Ao criar o personagem, elege-se somente
senta um momento chave em sua história. Não se tratam de dois marcos em vez de quatro habituais. Os dois restan-
qualidades positivas ou negativas, e sim de acontecimentos tes serão os marcos ocultos. Em qualquer momento do
que marcaram o personagem, definindo quem é agora, e po- jogo que queira se ativar um aspecto (ver página 42), mas
dem tanto beneficiá-lo quanto prejudicá-lo. que não tenha um apropriado para a situação, pode-se
“revelar” um dos marcos ocultos do personagem. Nesse
Os marcos são um tipo de aspecto. Eles definem facetas da momento, escolha um marco apropriado para a situação
personalidade do personagem, assim como nos informam do e o introduza na história como se tivesse realizado nesse
que sabe ou não sabe fazer, mas em todo caso sempre são bio- momento uma revelação sobre o passado do personagem.
gráficos. Por exemplo, o correto é “licenciado com desonra por
insubordinação” em lugar de simplesmente “rebelde”.

dente.
Exemplos de marcos
Qu an do cria nça , sua av ó lhe contou estra- consequência de um aci
jar um causou ne-
Teve que sair da universidade e. arran nh as hi stória s sobre seres de outros mundos. Seu primeiro assassinato não lhe
trabalho quando seu pai mo rreu
to Nu nca con seg uiu ven der qua lqu er um de seus nhuma emoção.
los mui ao
Desde a infância, tem pesadeos. qua dro s. Su a licença médica foi retirada devido
vívidos sobre um homem sem olh eria dua s vez es. seu comportamento antiético.
ula s Ga nh ou na lot
Tentou cometer suicídio tomando
píl
s os seu s pe rtenc es Ro uba ram a patente de sua invenção, o que
quando sua namorada o deixou. Perdeu a casa e quase todo resultou na perda de milhões.
que seu devido ao fura cã o Ka trina .
Sobreviveu ao acidente de carro em "un icorn io.com ". Lem bra -s e de ter sido abduzido poor
Ficou rico graças a uma dentr
marido e filhos morreram. no alienígenas que colocaram algo
nd o
Lutou na Segunda Guerra do Golfo. Conheceu seu parceiro trabalha da sua cabeça.
Médicos sem Fronteira s. at aq ue de raiva, matou seu psiquiatra.
Percorre u o mundo rês
t vez es. Em um
da de um io
t dist ant e. É inca pa z de lembrar de qualquer coisa de Encontrou uma estranha pedra esculpida em
Herdou uma mansão si ola
s. antes dos dez anos. uma expedição na Amazônia.
em circunst ân cia s estran ha rde u em um
Sua mãe morreu Está obcecada com o bebê que pe pri meiro melhor amigo foi um gato.
ina to que nã o Se u
Cumpriu pena por um assass aborto natural. s pasi
cometeu. pa rce iro dur an te um tiroteio Estudou Direito porque era o que seu
Mataram seu queriam, mas você não queria.
Comp etiu no Big Bro ther . na s fa vel as . rcou-o
do Fa raó Ne gro . lia pra voc ê pa ssa ge ns do Banhar-se nu no mar à noiateobma sessão.
Esteve na presença Seu avô pro fundamente e agora é um
meses. Necronomicon .
Foi diagnosticado com câncer há alguns po r do s
i an os, ma s Nunca perdeu um processo.
acabou Permanece u em com a
Sua carreira como atleta profissional lem bra que os pa sso u em um lugar estranho. Cumpriu dez anos de prisão por se recusar a
quando seu joelho foi ferido. delatar um amigo.
So bre vive u ao genocídio de Ruanda. g
É adotado.
veu -lh e me dicaçã o pa ra Pass ou os últimos dois anos fazendo zappin
suicidou, O psiquiatra prescre dezoito horas por dia.
Seu pai matou sua mãe e depois se evitar ter “ess as alu cin aç ões ”.
tudo na sua frente. irmãos.
o T ec- At é os qui nze an os, tinh a um am igo imaginário É o masi velho dos cinco
tut
Foi a primeira de sua turma no Insti que morava nos cantos e esquinas.
nológico de Massachusetts.
lon ga linh ag em de po liciais. Est eve clin icamente morto por um minuto em
Pertence a uma 19
4. HABILIDADES:
DISTRIBUA QUARENTA PONTOS
As habilidades representam as coisas que seu personagem sabe
fazer e os conhecimentos adquiridos: o que seu personagem
aprendeu ao longo de sua vida. Você pode dividir os pontos
entre quantas habilidades quiser, mas tente escolher entre sete
e doze habilidades. Sete deveria ser o mínimo de coisas que uma
pessoa pode fazer, enquanto doze (quatorze no máximo) repre-
senta um grande grupo de habilidades para o personagem.
Lembre-se que o número máximo de pontos que você pode co-
locar na mesma habilidade é 10, enquanto a mínima é de 1, a
menos que o Mestre de Jogo permita que uma habilidade esteja
em 0 por circunstâncias do contexto.

Valores das habilidades


1 Conhece o básico. Não passaria vergonha em uma conven-
ção profissional sobre o assunto.
2 Tem noções e geralmente as pratica de tempos em tempos.
3 É muito bom nisso, quase poderia se dedicar a isso.
4 Está na média de um profissional.
5 Um proeminente profissional. Provavelmente não terá
problemas para encontrar um emprego.
6 Um profissional altamente qualificado. As empresas o
cortejam.
7 É um dos melhores em seu círculo. Qualquer pessoa em
sua área já ouviu falar dele.
8 É um dos melhores em seu país. Se é uma atividade espor-
tiva, com certeza é conhecido internacionalmente.
9 Certamente o melhor do seu país e um dos melhores
do mundo.
10 Não é apenas o melhor do mundo, mas também um dos
melhores da história. Nikola Tesla teria um 10 em “Gênio
da física” e Mozart o teria em “Tocar piano”.
O sistema Hitos propõe uma lista de oito habilidades básicas
que todo personagem deve ter, cada uma identificada com um
ícone. Mas veja bem, o nome dado a cada uma dessas habilida-
des depende do próprio jogador (com a aprovação do Mestre
de Jogo), uma vez que seu nome será um aspecto do perso-
nagem. Assim, a habilidade básica de de um personagem
deixa de ser apenas “Combate” para se tornar “Jogar Sujo”,
“Pistoleiro” ou “Matar com as Mãos”. Isso não significa que a
capacidade, tendo qualquer um desses nomes, só pode ser usa-
da na forma indicada pela sua descrição. Todas são habilida-
des de combate e podem ser usadas sempre que o personagem
lutar com ou sem armas, mas quando estiver lutando como
indicado pelo nome de sua habilidade, poderá ativá-la como
um aspecto e fazer a diferença (ver página 42).
O personagem com ‘Pistoleiro’ usará sua habilidade quan-
do armado com uma arma, mas também quando usar uma
faca, ou quando lutar com as mãos nuas. Afinal, um pistoleiro
sabe fazer todas essas coisas. Mas note, o nome da habilidade
é, como dissemos, um aspecto, e só pode ser ativado sob cer-
tas condições: armado com uma faca não será capaz de usar
o aspecto “Pistoleiro”, enquanto que com uma Desert Eagle
nas mãos a história será muito diferente. Isso significa que as
chances de sucesso ou resultados extraordinários do perso-

20
nagem aumentarão ao usar uma arma. Idealmente, você deve AS HABILIDADES QUE
tentar personalizar as habilidades com o que significa para o
seu personagem, mas sempre certificando-se que não se perca
VOCÊ NÃO TEM
a referência, ou seja, que fique claro o porquê de a habilidade
poder ser usada. O Mestre de Jogo deve evitar que a mesma Certamente você está se perguntando sobre algumas
habilidade possa ser usada como aspecto em muitas situações, habilidades típicas em um RPG contemporâneo, como
especialmente se a estratégia do personagem for precisamente dirigir, usar o computador ou similares. Os persona-
escolher poucas habilidades muito genéricas com altas pon- gens dos Cultos Inomináveis não sabem como fazer
tuações. Além disso, lembre-se de que as habilidades não são essas coisas? A resposta é sim, mas...
marcos, nem traços e devem refletir os conhecimentos ou as Os personagens saberão dirigir um carro e usar um
perícias adquiridas pelo personagem. computador como qualquer usuário comum. Eles po-
Como um guia geral, uma habilidade cujo nome pode se dem viajar com o carro, estacioná-lo e fazer qualquer
encaixar na função de duas ou mais habilidades básicas não manobra cotidiana. Com o computador, eles enviam
deve ser permitida. Além disso, uma habilidade cujo nome e-mails, pesquisam no Google e escrevem documentos
de texto. Eles não precisam de habilidades para isso,
representa algo que pode não ter sido aprendido ou adquiri-
assim como não precisam delas para usar uma caneta ou
do através de treinamento, certamente não é uma boa ideia
andar na rua sem cair.
para uma habilidade.
Quando usam o computador, as habilidades usadas
Exemplo: “Treinado pela CIA” não seria um bom nome dependerão do que realmente estão fazendo com ele:
para uma habilidade; não deixa claro em que sentido ele é sobre convencer alguém em um bate-papo ou é uma
pode ser usado (combate, furtividade, cultura... ou em to- investigação para descobrir onde está um livro? A ação
dos ao mesmo tempo), já que é muito geral. Isso seria mais concreta determinará a habilidade a ser usada, sendo
apropriado como um marco do que como uma habilidade. o computador uma simples ferramenta. E o que acon-
Se quiséssemos usar algo assim para uma habilidade, tece se o que o personagem quer é algo eminentemente
teríamos que ser mais específicos. “Treinado pela CIA em relacionado à computação, como decodificar uma sen-
combates desarmados” poderia servir como uma habili- ha ou programar um vírus? Bem, essas ações não estão
dade de , enquanto “treinado como analista da CIA” ao alcance de qualquer pessoa, mas é necessário ser um
seria uma habilidade de aceitável. profissional de computação para até mesmo experimen-
Exemplo: “Grande” como uma habilidade de ou “Su- tá-las: o personagem precisará de uma habilidade de
perdotado” como uma habilidade de não faz muito profissão adequada nesses casos.
sentido. Um personagem pode perder a forma física, Quanto à direção, as pessoas normais sabem como se
mas ainda assim ser grande, e um personagem que leve movimentar com o carro, entretanto não sabem mui-
um golpe na cabeça e tenha amnésia não pararia de ser to mais que isso: elas não participam de perseguições
superdotado. Esses nomes descrevem coisas inerentes
arriscadas, não giram no meio da rua, ou pulam rampas
ao personagem, não habilidades adquiridas e, portanto,
colocando o carro sobre duas rodas. Aqueles que fazem
são mais adequadas como uma descrição de traços de
caráter do que como habilidades. isso são motoristas profissionais, loucos por velocidade
ou membros de órgãos de segurança que receberam ins-
truções para fazê-lo. Qualquer personagem não tem ou
Habilidades básicas cobrem a maioria das situações em que
precisa de uma habilidade de condução: você pode diri-
um personagem de Cultos Inomináveis pode estar envol-
gir seu carro normalmente sem ele. Quem quiser realizar
vido. Recomenda-se, portanto, que cada personagem tenha
manobras arriscadas e perigosas deve ter a habilidade de
pelo menos a pontuação de 1 em cada uma delas. A critério
profissão adequada para isso. Os que não têm, possivel-
do Mestre de Jogo, um personagem pode ter 0 em qualquer
mente podem tentar... mas isso é outra história (veja o
uma dessas habilidades básicas se seu histórico o justificar. quadro “Que habilidade escolher?” Na página 40).
Isso não deve ser permitido em mais de uma habilidade e
nunca fora das habilidades básicas. O Mestre de Jogo deve ter
em mente que cada habilidade, mesmo que tenha uma pon-
tuação de 0, ainda é um aspecto acionável e, portanto, não
deve permitir que os jogadores abusem dela colocando várias
habilidades em 0 apenas para ter mais aspectos ativáveis. bem, a pontuação para cada uma dessas habilidades é adqui-
rida de forma independente, já que são habilidades diferentes.
Além das oito habilidades básicas, um personagem pode ter
mais habilidades. Por exemplo, você pode ter uma habilidade Por outro lado, outras habilidades podem ser propostas para
básica duplicada para representar uma maior diferenciação, atividades que não são cobertas por habilidades básicas, con-
porque cada habilidade é um aspecto que pode ser ativado tanto que o Mestre de Jogo as considere úteis ou interessantes
durante o jogo. Você pode ter duas habilidades com a função para o jogo em geral ou para sua campanha em particular.
de “Batedor de carteiras” e “Passos silenciosos” para po- Antes de lançar-se para gerar novos tipos de habilidades,
der aproveitar esses aspectos em diferentes ocasiões. Mas veja pense se não seriam casos particulares do tipo .
21
Exemplos de habilidades de forma
física
Exemplos de habilidades de combat
Atleta amador. Escalar com as mãos nuas. e
Acrobata. Pistoleiro. Desarmar o oponente.
Monstro de academia.
Estivador. Lutar no escuro. Esquivar dos golpes.
Fazer agachamentos.
Nadador profissional. Matar com as mãos nuas. Buscar cobertura.
Apressar-se para não
Maratonista. se atrasar. Especialista em atirar facas. Apunhalar com caneta.
Equilibrista. Contorsionista. Jogar sujo. Lutar agachado.
Perseguir suspeitos. Nunca pega o elevador. Perigoso com navalhas. Bloquear golpes.
Mover-se com esforço. Faz ginástica com videogames. Boxe. Chute giratório.
Derrubar portas. Caratê.
Franco-atirador.
Exemplos de habilidades de intera
ção Exemplos de habilidades de subter
Má reputação. fúgio
Insoso e inofensivo. Fintar.
Etiqueta. Deixar pistas falsas.
Ganhar a confiança.
Mentiroso convincente. Batedor de carteiras.
Impor respeito. Chantagear.
Entusiasta de prestidigitação. Mestre do disfarce.
Sempre tem um bom discurso Dar pena.
preparado. Passar despercebido. Camuflagem.
Extrair informação do inimigo.
Ameaçar. Rosto inexpressivo. Fingir amizade.
Golpista profissional.
Língua venenosa. Furtivo. Ator amador.
Parecer inocente.
Famoso. Ocultar lâmina. Disfarçar a embriaguez
Abomina o contato humano.
Irresistivelmente atraente. Infiltração. ao chegar em casa.
Encontrar esconderijos.

Exemplos de habilidades de percep


ção Exemplos de habilidades de cultur
Olhos na nuca. a
Eles o chamam de Sherlock. Estudou na Universidade
Atento aos detalhes. Viajante incansável.
Ler lábios. Miskatonic.
Ler os rostos. Viciado em Internet.
Encontrar intrusos em Rato de biblioteca.
Audição aguçada. suas terras. Conhecimento das ruas.
Não perde nenhum programa do
Visão panorâmica. Degustador profissional. Discovery Channel. Sempre na moda.
Seu rosto me é familiar. Notar que algo não se encaixa. Fã da história local. Fã de ficção científica.
Sempre alerta. Se eu for aí, eu acho!. Conhece bem a vida noturna Leitor compulsivo.
Aficionado em ornitologia. Essa camisa é tão da cidade. Fofoqueiro(a) da vizinhança.
Entender uma conversa ano passado. Cultura televisiva. Geek.
entre a multidão. Autodidata. Estudante medíocre.

22
Da mesma forma, em Cultos Inomináveis, os poderes arcanos Percepção: As coisas acontecem continuamente ao nosso
e os feitiços funcionam como se fossem habilidades normais redor e temos que estar preparados para percebê-las. O
para fins de custo de aquisição. Verifique o capítulo “Magia” personagem vai precisar de uma habilidade que irá ajudá-lo
(pág. 184) para mais informações, mas no momento lembre-se a detectar mudanças em seu ambiente, perceber as intenções
de que seu personagem pode adquirir um ou mais poderes ar- dos outros, procurar objetos ocultos ou evitar emboscadas.
canos atribuindo-lhe pontos de habilidade. Como sempre, você pode escolher várias habilidades de
Forma física: Correr, pular, escalar, nadar ou segurar a res- percepção para diferenciar as habilidades do personagem e
piração são ações que um cultista precisa enfrentar mais ter diferentes aspectos.
cedo ou mais tarde. Essa habilidade representa precisamen- Subterfúgio: As pessoas mentem, se escondem, ocultam
te as condições atléticas do personagem. Ela será usada para coisas e tentam passar despercebidas. Os personagens mui-
qualquer situação física que exija boa forma, resistência, tas vezes querem fazer essas e outras coisas e, para isso,
velocidade ou força, e não requer treinamento marcial (é precisarão de uma habilidade de subterfúgio. A habilidade
para isso que serve a habilidade de ). pode ser usada para qualquer situação na qual o personagem
Combate: O submundo cultista é um lugar perigoso, e o tente esconder suas intenções ou ações, bem como transmitir
personagem vai precisar de habilidade para atacar e defen- informações falsas que possam passar por verdadeiras.
der. Em princípio, uma única habilidade serve para refle- Cultura: Todos os personagens terão recebido uma educação
tir todo o treinamento marcial do personagem em armas mais ou menos básica, para que eles saibam algo sobre geogra-
corpo a corpo, a distância e combate desarmado. Mas você fia, ciência, história e o que está acontecendo no mundo hoje.
pode escolher diferentes habilidades se quiser enfatizar os Uma habilidade cultural fornece ao personagem informações
diferentes domínios do personagem e organizar vários as- sobre todos esses tópicos e permite-lhe, entre muitas outras
pectos diferentes para ativar durante uma luta. coisas, reconhecer e localizar um sotaque, identificar uma
Interação: Lidar com outros personagens é uma parte pessoa famosa, lembrar-se do endereço de uma antiga biblio-
fundamental de um jogo de RPG. Embora a interpre- teca ou conhecer a medicação usual para o tratamento de uma
tação resolva a maioria das situações, cada personagem doença frequente. A habilidade de do personagem só pode
terá uma capacidade para nos dizer o quão bem funciona ser usada para conhecimentos gerais e não deve ser confun-
em situações sociais, força de caráter, o carisma de sua dida com a habilidade de . E, claro, não fornece nenhum
personalidade ou sua capacidade de movimentação. Em conhecimento sobre os Mitos, pois essa é a habilidade de .
resumo, a mesma frase dita por dois personagens dife- Profissão: As habilidades anteriores refletem habilidades
rentes pode ter um efeito completamente oposto. Isso que todos os personagens possuem em maior ou me-
será especialmente útil para determinar a impressão do nor grau: todos sabem, melhor ou pior, se relacionar com
personagem sobre antagonistas e secundários. Se você os outros, se defender ou perceber o que acontece em seu
quiser, pode enfatizar as habilidades sociais do persona- ambiente. No entanto, existem outras capacidades restritas
gem, adquirindo diferentes habilidades de interação. apenas àqueles que receberam treinamento específico. Por
exemplo, é de conhecimento geral que a aspiri-
na é um anticoagulante, mas apenas aqueles que
receberam educação médica adequada sabem
como curar feridas e tratar os doentes. Da mes-
ma forma, todos podem tentar encontrar algo
lidades de ocultismo no Google, mas somente aqueles com conheci-
Exemplos de habi mento profissional suficiente poderão invadir o
Sussurros da escuridão. banco de dados do Pentágono.
Arqueologia do impossível.
Intuição sobrenatural. Desta forma, dentro do termo “profissão”, in-
O que meu avô me contou. hos
clui-se uma série de capacidades que refletem o
Viaja pelas Terras dos Son conhecimento específico do personagem. Cada
Conhecimento do além. todas as noites.
personagem deve ter pelo menos uma profis-
são. Seu nome pode ser personalizado como o
Sonhos visionários. Iniciado na Sociedade do de qualquer outra habilidade, mas, você deve

Estudioso do Necronomicon.
tentar esclarecer com o Mestre de Jogo os usos
Ressurgir. apropriados. Se, em determinada situação, a ha-
ho.
Discípulo do Ídolo Vermel Seu pai era guardião das bilidade da profissão coincidir com alguma das
habilidades básicas, você pode escolher qual ha-
Especialista em lendas e secretas tradições maias. bilidade usar. Da mesma forma, se um persona-
s
Toma drogas alucinógena
gem tiver duas ou mais habilidades profissionais
mitologia. que possam ser aplicadas a um determinado
ismo. místicas.
Fã de antigos livros de ocult caso, o jogador decidirá qual delas usar em cada
net.
Busca a Verdade na Inter
situação, mas só poderá usar uma delas.
Alquimista autodidata. 23
Exemplos de habilidades de profissão e sugestões de uso

Advogado. Contatos no mundo jurídico. Possivelmente tem bastante dinheiro. Influência com as pessoas que
dependem dele ou que ajudou. Conhecimento de leis. Capacidade de negociação.
r
Arqueólogo. Conhecimento da história, mitologia e línguas mortas. Sabe como conduzir uma escavação ou prepara
uma expedição. Acesso ao material de museus e universidades que não está disponível para todos.
cimento de seu campo
Artista (especifique o tipo: Contatos no mundo da arte, museus, patronos, fundações, etc. Conhe
pintor, designer gráfico, artístico. Provavelmente viajado. Capaz de analisar em grandes detalhes o trabalho dos outros
escultor, escritor, ator, etc.).
em seu campo.
Assistente de voo. Facilidade de viajar para lugares distantes. Acesso a áreas restritas de aeroportos. Conhecimento
de muitos lugares diferentes. Possivelmente atraente ou hábil com pessoas.
Bibliotecário. Pode encontrar informações de forma eficiente e gerenciar arquivos. Acesso a determinadas biblio-
s
tecas e seu material restrito. Você pode conhecer obras raras, onde encontrá-las e outros detalhe
sobre elas.
o
Bombeiro. Bem treinado fisicamente. Capaz de manter a cabeça fria em situações de risco ou tensão. Reaçã
rápida. Sabe lidar com situações problemáticas, como incêndios ou inundações.
o, bem como a insta-
ista ou Engenheiro Conhecimento científico do seu ramo. Acesso a material de trabalh
Cient
(especifique o tipo: robótica, lações: laboratórios e universidades, seja do seu ambiente de trabalho ou de outros colegas
a
telecomunicações, biólogo,
matemático, etc.).
dispostos a colaborar. Pode experimentar ou tentar racionalizar em partes tudo o que tem
ver com os Mitos.
ivo de uma
Execut Influente em sua empresa. Grandes recursos econômicos. Contatos comerciais ou com pessoas in-
multinacional. fluentes do seu nível social. Conhecimento de leis de gestão. Capacidade de negociação.
ade. Amigos e contatos
Estudante universitário Conhecimento avançado sobre o que você estuda. Acesso limitado à universid
(especificar a carreira: no campus.
Biologia, Filologia, etc.).. r
Hacker, TI, Conhecimento de matemática e programação. Busca de informações raras ou difíceis de encontra
Programador. na rede. Hacking e sistemas de segurança de computadores.
nte não lhe é algo es-
Louco por tunados. Ele sabe sobre mecânica de automóveis e eletricidade. Condução imprude
tranho e pode até ser algo habitual. Tem contatos em seu círculo: sabe sobre corridas ilegais, onde
conseguir boas peças, etc. Conhece bem a área em que costuma se deslocar (cidade e subúrbios),
bem como atalhos ou esconderijos para o seu veículo.
Marinheiro. Conhecimento do mar. Manuseio de embarcações. Conhecimento dos portos e cidades que você
visitou. Contatos entre colegas e conhecidos, espalhados pelo mundo todo.
do ou impressionado fa-
Bandido, Mercenário. Capaz de lutar. Contatos no submundo. Intimidante. Não é intimida
cilmente. Acesso limitado a armas. Contatos em seu círculo e “colegas” que podem lhe dever
um favor.
Médico. Conhecimento sobre medicina, anatomia e medicamentos. Capacidade de fazer diagnósticos, pri-
meiros socorros e, dependendo de sua especialidade, atenção profissional para danos graves.
Acesso a áreas restritas de hospitais e equipamentos médicos.

24
Mendigo.
Conhecimento da cidad
e e seus aspectos mais
Passar despercebido. S obscuros. Contatos entre
ob reviv ên cia na s ruas. outros marginalizados.
Militar, Ex-militar.
Treinamento físico av
ançado e combate (sab
com veículos de combat e como lidar com armas
e). Possível acesso a ar incomuns e até mesmo
vidas por um antigo pa mas. Amigos durões di
rceiro. Possível experiê spostos a arriscar suas
de sobrevivência e ge ncia em regiões de co
ografia dos lugares onde nflito. Conhecimento
Motociclista. vo cê esteve.
Conhecimento de mec
ânica e estrada (bon
conder, pegar armas s lugares para pass
, ou gasolina barata ar uma noite, se es-
provavelmente pertenc ...). Intimidante e difí
e a um clube de motoq cil de intimidar. Muito
uma luta e até mesm ueiros, que certamente
o em atos criminosos. pode ajudá-lo em
com uma motocicleta. Executa manobras de
condução perigosas
Operário de
manutenção De acordo com seu tipo,
acesso a ferramentas,
(especificar o tipo: mecâ repa rar ou operar dispositivos aos qu materiais e instalações
eletricista, encanador, et
nico, ais está acostumado. Conta de reparo. Você pode
c.). tos no sindicato.
Membro de gangue.
Conhecimento das ruas
. Acesso a traficantes, in
tenha amigos dispostos formantes e mercado ne
a corre r ri
s cos po r ele em situações fora gro. É possível que ele
Jornalista. da lei.
Contatos em diferent
es grupos sociais, luga
Busca de informações res ou organizações. R
na rede. Acesso limita ede de informantes.
Cultura atual. do a determinados locais
Jo restritos ao público.
rnalista de zonas
Sangue frio. Sobrevivên
de conflito. cia. Contatos em zonas
de segurança, etc.). C de conflito (militares, ou
onhecimento sobre conf tros jornalistas, forças
grafia das zonas de gu litos em que você esteve
erra. Capacidade de ne . Conhecimento da geo-
Policial. go cia çã o.
Acesso a armas de fogo
. Treinamento de comb
segurança. Acesso a lu ate. Suporte (até certo
gares restritos graças a ponto) das forças de
coagir, até certo ponto. sua autoridade. Capacid
Conhecimento básico de ade de intimidar ou
pessoas úteis relacionada leis. Terá contatos, info
s a sua posição especí rmantes ou conhecerá
de homicídios têm cont fica (um patrulheiro da
atos distintos, por exemp estrada e um detetive
Político. lo).
Influência na admin
istraçã
comando. Pode ter basta o pública. Poder e recursos dentro da área
nte dinheiro. Contatos em que ele está no
tros políticos, empresár entre as pessoas influe
ios, máfia, banqueiros, nt es do seu nível (ou-
Influenciar, coagir ou etc.). Lábia, capacidad
ameaçar pessoas abai e de mentir e carisma.
Acesso a lugares restritos xo do seu nível social.
na sua área de influê C on hecimento de gestão.
Taxista. ncia.
Sabe dirigir bem e an
dar pelas ruas. Conhe
Facilidade para socializ cimento dos rumores da
ar. Você pode estar cie cidade e do trânsito.
graças aos seus colega nte do que está acontece
s. ndo em toda a cidade,
Traficante, Vapor.
Conhecimento das ruas
, de truques, de como es
tem contatos no mundo conder a droga. Sabe
do crime e acesso a dr andar em sua área,
dinheiro ou favores. Pod ogas. Provavelmente al
e ter um conhecimento gumas pessoas lhe deve
pode saber intimidação básico de leis. Dada a m
. sua clientela habitual

25
Nas páginas 24 e 25 estão listadas algumas habilidades de 6. DRAMA: COMECE COM 5 PONTOS
profissão como amostra, descrevendo os principais, mas
não os únicos, usos deles. Os jogadores são livres para O atributo Drama dá uma medida relativa do nível de poder
inventar novas habilidades profissionais sempre que do personagem enquanto mantém seu equilíbrio na histó-
contar com a aprovação do Mestre de Jogo. ria. Se o personagem for mais poderoso, terá uma pontu-
ação menor no Drama, sendo capaz de influenciar menos
Ocultismo: Em Cultos Inomináveis os personagens vivem a narração e dependendo mais de suas pontuações. Por
quase que diariamente com o desconhecido, o sobrenatural. outro lado, se o personagem for comparativamente menos
Isso reflete em uma habilidade concreta que lhes dá conhe- poderoso, terá uma pontuação maior em Drama, o que lhe
cimento sobre a Verdade escondida atrás do véu. Pode ser permitirá modificar mais a história, o que compensa seus
conhecimento acadêmico, adquirido de volumes antigos e atributos com pontuação baixa. No início de cada sessão de
mofados, encadernados em pele humana; de histórias ou- jogo, um personagem terá tantos pontos dramáticos quanto
vidas de lábios de um avô insensato e um tanto louco ou seu valor de Drama.
o resultado de sonhos estranhos, enviados por criaturas de
outra dimensão. Em qualquer caso, essa habilidade reflete o Durante o jogo, os jogadores podem usar pontos dramáticos
conhecimento autêntico sobre o sobrenatural, embora possa para ativar aspectos ou impedir sua ativação (veja a página
ser misturado com truques ou disfarçado de lenda. Os 42), o que lhes permite influenciar a história, melhorando
pontos atribuídos a esta habilidade contam para o total de suas chances de sucesso em certas ações ou influencian-
conhecimento sobrenatural que determina a pontuação do negativamente as de outros personagens. Por outro lado,
inicial de Degeneração do personagem (veja a página 27). complicações e outros aspectos adversos podem fornecer
pontos dramáticos adicionais ao personagem quando ativa-
Habilidade arcana: Um personagem de Cultos Inominá- dos pelo Mestre de Jogo (ou outro personagem) durante o
veis pode começar o jogo com uma ou mais habilidades jogo. Portanto, é uma boa ideia ter certos aspectos negativos
arcanas. Uma habilidade arcana é um poder sobrenatural ou que podem aparecer facilmente na história. Se um jogador
um reflexo do conhecimento de uma série de feitiços relacio- receber pontos adicionais durante o jogo, seu total de pon-
nados. Durante a criação do personagem deve ser atribuído tos dramáticos pode exceder sua pontuação de Drama. No
pontos de habilidade de uma forma normal, se você quiser entanto, no início da próxima sessão, irá recuperar todos os
começar o jogo com recursos desse tipo. Veja o capítulo pontos gastos e perder qualquer excesso de pontos dramáti-
“Magia” (página 184) para mais informações e exemplos de cos que tinha, e começará com tantos quantos sua pontuação
habilidades arcanas que os jogadores podem escolher. de Drama. O uso de pontos dramáticos é descrito mais
extensivamente no capítulo “Sistema” (ver página 42).
5. CITAÇÃO: ESCOLHA UMA Um PJ normal começa com uma pontuação de Drama 5. No
Escolha a frase que define a maneira de pensar e agir de seu per- entanto, os jogadores podem modificá-lo, com a permissão
sonagem, o tipo de frase que seu personagem diz em situações do Mestre de Jogo, para começar com personagens de maior
dramáticas: “Voltarei”, “Quanto mais você perde, mais ganha”, ou menor poder. Para isso, considera-se que um ponto de
“Eu amo quando os planos dão certo”. Para todas as intenções e Drama pode ser alterado por dois pontos de característica ou
propósitos, trate a citação como um aspecto, com a condição de quatro pontos de habilidade, ou um ponto de característica
que o personagem tenha que dizer a frase para ativá-la. mais dois pontos de habilidade. A mudança inversa também
pode ser feita para ter uma pontuação maior em Drama. Tanto
se aumenta quanto se diminui a pontuação, um
personagem deve começar o jogo com uma pon-
Exemplos de citações tuação de Drama entre 1 e 10.
Eu nunca penso no futuro: ele virá.
Não confie em ninguém. 7. OUTRAS PONTUAÇÕES:
Eu sou o melhor no que faço, mas o que eu faço não é muito agradável. FAÇA OS CÁLCULOS
Não se preocupe, tudo ficará bem. Todos os personagens têm pontuações que
usarão ao longo do jogo e que são calculadas
Estou sempre preparado para o pior. da seguinte forma:
Se precisar de uma segunda chance, você está morto.
  Vigor: Seu Vigor é igual à soma de sua Força,
A caneta é mais forte que a espada. mais metade da sua Vontade.
Conhecimento é poder. Resistência: O total dos seus pontos de Resis-
Os sussurros do abismo me avisam... tência é o seu Vigor multiplicado por 3.
Você pode correr, mas não se esconder. Defesa: Sua Defesa é igual a característica Re-
Nesta votação, tenho dois votos: o meu e o da minha arma. flexos mais a habilidade mais alta entre a forma
física e o combate +5. Sua Defesa estando des-
Carpe diem. prevenido é a sua Defesa -3.
Eu vou encontrar esse bastardo.
26 Curiosidade matou o gato, mas eles têm sete vidas.
Iniciativa: Sua Iniciativa é igual aos seus Reflexos mais meta- disso, se a situação permitir e a imaginação do jogador favore-
de do seu Intelecto. cer, o Mestre de Jogo deve permitir que as complicações sejam
Bônus de dano: Para ataques de longo alcance, bônus de invocadas pelo jogador para beneficiar seu personagem.
dano é sua habilidade de combate dividida por 4 (arredonda-
do para baixo). Para ataques corpo a corpo, adicione
sua Força a sua habilidade de combate e divida o
total por 4 (novamente arredondado para baixo).
plicações
Resiliência: Sua Resiliência é igual a sua Vontade
E x emplos de com
mais metade do seu Intelecto.
Estabilidade Mental: O total de seus pontos de Esta- Pai solteiro.
idade.
bilidade Mental é sua Resiliência multiplicada por 3. Juramento de fidel eres nem crianças.
Degeneração: Os personagens começam o jogo h on ra: nem m ulh
com conhecimentos esotéricos (capacidade de Código de
ocultismo), com magias, poderes ou habilidades Procurado pela lei.
o.
especiais (habilidades arcanas) e já perderam um
Perseg uido por um assassin
pouco de sua humanidade no processo. Isso resul-
.
tará em mutações físicas e mentais que afastam o Fama de malfeitor
personagem daquilo que entenderíamos como ser
humano. Essa corrupção avançará como resultado Racista.
da exposição à influência dos Mitos. Se atingir um Fanático.
valor muito alto, a transformação do personagem
seria tal que ele não poderia mais ser considerado Distraído.
humano, então ele deixaria de ser um personagem Repulsivo.
de jogador para se tornar uma criatura controlada
pelo Mestre de Jogo. Um personagem começa com 1 Sádico.
ponto de Degeneração para cada 5 pontos (comple- Covarde.
tos) que ele investiu no total em habilidades arcanas e .
habilidades ocultas. Veja a página 224 para mais infor- Imprudente. ia na q ual você é viciado)
sub st â nc
mações sobre Degeneração. Vício (escolha uma ligeiramente inca
-
e (um a d oe n ça crônica, irritante oucapaz de jogar com
8. COMPLICAÇÕES: Doent ser
o muito: é preciso , diabetes, enxaquecas,
p acita nte, m a s n ã
exemplo: asma
COMECE COM UMA o personagem. Porofilia, etc.).
Boas histórias estão cheias de complicações pessoais e pode
narcolepsia, hem , p si copata, bipolar, et
c.).
ser divertido para os jogadores inventarem algumas para
l (p ara n oico
seus próprios personagens. O jogador determina uma com- Condição menta
plicação para o seu personagem, que é uma situação que vai
colocá-lo em desvantagem ou causar problemas em deter-
Grande remorso.
minados momentos. Assim, quando uma complicação cau- Azarado.
sar um grande revés a um personagem, ele recebe uma com- oca sua p ro s
fi sã o acima de tudo.
pensação na forma de um ponto dramático. Tenha em mente
Col
que uma complicação muito específica será difícil de entrar Múltiplos inimigos.
em jogo. Isso pode parecer uma coisa boa, mas como lhe dá
Gagueira.
Pontos de Drama, pode realmente ser uma oportunidade per-
a ideia.
dida. O Mestre de Jogo tem a última palavra se considerar que Obcecado com um lavra.
uma complicação é excessiva (ou irrelevante) em sua história
ê se mp re tem q ue ter a última pa
e, portanto, se é permitida ou não.
Voc
oridade.
O personagem recebe um ponto de Drama para cada cena Problemas com aut
us gatos.
que uma complicação entrar em jogo, ou para cada ação em Precisa cuidar de se
que a complicação afetar um teste quando ativada como um
aspecto (veja a página 42). O Mestre de Jogo decide quando Crédulo.
uma certa complicação surge, embora o jogador possa ofere- Não sabe mentir.
cer algumas sugestões quando as oportunidades apropriadas
Casado.
são apresentadas.
p enso a en tr ar em apuros. .
Na verdade, uma complicação é como um aspecto, só que o Irmão p ro
n o se u pa ss ado (especificar qual)
ática
personagem dificilmente pode invocá-lo a seu favor. Apesar Experiência traum
icioso.
Extremamente amb l é a maldição). 27
d o (e sp ec if iq ue q ua
Am a ldiç oa

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