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ABORDAGENS DO CONCEITO DE SAÚDE

Saúde como ausência da doença


A constituição da Organização Mundial da Saúde (OMS) afirma: “Saúde é um estado de completo bem-estar físico,
mental e social e não apenas a mera ausência de doença ou enfermidade”. Porém, essa visão não contempla a todos.
Uma parte das pessoas acredita que a saúde é a ausência da doença. Antes, a doença era vista como algo que existia
no meio da natureza, que era castigo dos deuses por conta dos pecados da humanidade. A partir disso, com o
desenvolvimento da humanidade e com a valorização da medicina/ciência, o sintoma passa a ser a primeira
expressão do corpo doente. A doença, então, se transforma em uma patologia. A nova forma de pensar baseada na
observação e na experiência, das mudanças morfológicas, orgânicas e estruturais, fez com que a saúde passasse a ser
entendida como a ausência de doença Essa profunda transformação na forma de conceber a doença irá assentar as
bases do sistema teórico do modelo biomédico, cujo conceito é presente até os dias de hoje. O foco desse modelo
não leva em conta o papel dos fatores sociais ou subjetividade individual. É incapaz de oferecer respostas conclusivas
para muitos problemas e, principalmente, para os componentes psicológicos ou subjetivos que estão presentes em
qualquer doença. Além disso, a divisão que ocorre do indivíduo em partes prejudica a valorização do todo. Ao não ter
em conta a sociedade em geral, a prevenção da doença pode não ser alcançada. Cristopher Boorse foi um dos que
tentou conceituar a saúde como ausência de doença. Canguilhem conceituou a saúde como a possibilidade de
enfrentar a doença. Saúde envolve muito mais que exames, dados, sintomas, diagnósticos. Educação, alimentação,
atividade física, saneamento básico, meio ambiente, trabalho, a renda, moradia, transporte, lazer, bons hábitos
físicos e alimentares, acesso aos direitos e deveres: todos esses fatores configuram o âmbito cultural, social e o
econômico, que podem afetar a qualidade de vida dos indivíduos e, consequentemente, a sua saúde.
Assim, o anúncio dado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) da pandemia gerou diversas mudanças no
funcionamento da sociedade, como as atividades que antes eram realizadas de maneira fisicamente, estão sendo
feitas através do meio tecnológico. Paralelamente a isso, surgiu outra pandemia, oculta: o medo e o estresse.
Começou a surgir à incerteza sobre o dia de amanhã diante de tantos casos diários e de óbitos. O pavor tomou conta
das pessoas, fazendo com que elas desenvolvessem problemas como ansiedade e depressão. Diversos fatores podem
colocar em risco a saúde mental dos indivíduos, em especial, nesse cenário atual, destacam-se as rápidas mudanças
sociais, o isolamento social e as condições de trabalho estressantes, vivenciadas principalmente pelos profissionais da
saúde que atuam na linha de frente. Mesmo que o indivíduo não esteja doente do coronavírus, uma parte delas está
doente psicologicamente devido a esses fatores. A população esqueceu a existência de outras doenças, que também
tem uma taxa de mortalidade, todo o foco foi para o COVID-19, negligenciando a prevenção e tratamento das outras
enfermidades que acometem a humanidade muito antes desse vírus. A saúde mental é mais do que a ausência de
transtornos mentais, ela está no “não estou conseguindo dormir”, “não estou com vontade de comer”, “não quero
assistir minha série favorita que eu costumo assistir todos os dias ás 19h”, “não vou me levantar da cama hoje”, “vou
parar de responder as mensagens dos meus amigos”. Ela depende de fatores sociais, econômicos, culturais,
biológicos e ambientais. Tudo está intrinsecamente relacionado. A saúde é o objetivo e o subjetivo como um só.

Saúde e bem-estar
A Organização Mundial de Saúde (OMS), agência subordinada à Organização das Nações Unidas (ONU) foi criada em
1948 após a segunda guerra mundial tendo como seu objetivo “um completo estado de bem-estar físico, mental e
social, e não apenas ausência de doença ou enfermidade“.
O atual ensejo suscitou em um amplo debate acerca da disseminação da COVID-19, com mais de 1 milhão de
pessoas infectadas e sistemas de saúde em colapso no mundo todo foi a partir daí que vimos quão devastador é o
coronavírus. A falta de transparência e responsabilidade com a população tornou-se contrária ao objetivo inicial da
OMS desde a falta de monitoramento na investigação do primeiro caso de COVID-19 em Wuhan até a discrepância
no número de casos.
O fato é que a “expressão ‘completo estado’, além de indicar uma concepção pouco dinâmica do processo - uma vez
que as pessoas não permanecem constantemente em estado de bem-estar revela uma idealização do conceito, que
tornado inatingível, não pode ser usado como meta pelos serviços de saúde”.
Para Canguilhem, a saúde não poderá ser pensada como carência de erros e sim como a capacidade de enfrentá-los.
Apesar de todos os fracassos, erros, e mal-estar formamos parte constitutiva de nossa história, a qual passamos a
valorizar a vida e priorizar o coletivo, saindo dessa crise mais fortes como pessoas, como profissionais e como nação.

Saúde e Norma ou Dimensão Normativa da saúde

De acordo com Foucault (1982a), o surgimento do Estado Moderno coloca a saúde como um valor, como fonte de
poder e riqueza para o fortalecimento dos países. Consequência dessa perspectiva, a medicina do século XIX se
modifica, introduzindo o controle dos corpos através da normatização dos espaços, dos processos e dos indivíduos,
necessários para a sustentação do capitalismo emergente. Percebe-se, então, que foi preciso traçar medidas,
normas, para atenuar ou combater os problemas de saúde caudados por doenças, infecciosas ou parasitárias.
Essas medidas foram para ajudar no combate de doenças, na França, por exemplo, ouve uma reforma urbana, a qual
promoveu a remoção de amontoamentos de casas sobre as pontes, de cemitérios e matadouros localizados no
centro de Paris e a abertura de avenidas amplas e arejadas. Já Inglaterra a medicina social caracterizou-se como
medicina dos pobres, da força de trabalho e dos operários, conjugando um sistema de assistência e de controle
médico. À medida que os pobres eram beneficiados pelo tratamento gratuito ou de baixo custo, deveriam submeter-
se a vários controles médicos, inclusive a obrigatoriedade da vacinação.
Em comparativo com o ano de 2020, ano que a Organização Mundial da Saúde (OMS) declarou o surto causado pelo
o novo coronavírus (SARS-Cov2), uma pandemia global. Detectado pela primeira vez em dezembro de 2019, na
cidade de Wuhan, China, esse vírus causa uma doença denominada de COVID-19, cujo quadro clínico varia de
infecções assintomáticas a quadros respiratórios graves.
As primeiras medidas de combate, utilizadas mundialmente, foram a quarentena e o distanciamento social, para
evitar a transmissão dessa doença. No entanto, outras medidas foram usadas para atenuar o progresso da doença,
como o uso de máscaras e a higienização das mãos (com água e sabão ou com álcool 70%). Nesse viés, observa-se
que as normas, utilizadas no mundo todo, são necessárias para combater essa problematização social, o covid-19.
No Brasil, o Sistema Único de Saúde (SUS), considerado o maior sistema público de saúde do mundo, mesmo tendo
sido subfinanciado desde sua criação, vem fornecendo a base necessária para as ações de enfrentamento da COVID-
19, como a vacinação, por dispor de uma rede de serviços, equipamentos e recursos humanos. Entretanto, a falta de
investimentos, seu desmonte e sua desestruturação ficam mais evidentes nos momentos de crise, denotando o
número insuficiente de recursos humanos na saúde; a falta de treinamento das equipes da atenção básica e da média
complexidade para lidar com as suspeitas e com os casos da COVID-19; o número insuficiente de equipamentos de
proteção individual (EPI); a falta de profissionais especializados em serviços de urgência; as poucas ações de
prevenção interna nos espaços de cuidado, dentre outras ações necessárias ao enfrentamento de situações
emergenciais de saúde pública, isso acaba se tornando um problema para o enfretamento dessa pandemia.

Saúde como Direito: o conceito ampliado de saúde


“A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à
redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal igualitário às ações e serviços para sua
promoção, proteção e recuperação” (Brasil, 1988: 37).
O ano de 2020 trouxe para o Brasil um verdadeiro teste de como o Estado agiria em um momento de crise na saúde
pública, assim tivemos um verdadeiro reflexo sobre como a desigualdade social afeta em momentos críticos.
A quarentena tomou todos de surpresa, mas as palavras e atitudes do atual presidente do País não tinham como
prioridade a redução da COVID-19, mas sim uma autopromoção partindo de discursos sem embasamento. A
propagação de fake News em relação a cura, as aparições e discursos públicos sem bases de biossegurança, a
frequente troca de ministro da saúde afetaram a todos principalmente as classes baixas por dependerem unicamente
das políticas de saúde pública que por consequência gerou o aumento no número de casos e mortes. Além disso, foi
um ano eleitoral para os estados e, visando a vitória, muitos praticaram a política clientelista como exames e testes
particulares que deveriam ser disponibilizados como emergencial em casos de pandemia.
“Capacidade de tolerância para enfrentar as dificuldades está diretamente vinculada a valores não só biológicos,
mas também sociais” (Caponi, 1997: 305). O Estado deveria ter sido mais eficaz no combate a COVID-19 reforçando
as medidas de segurança seguidas por diversos países e buscando sempre fornecer o apoio para aqueles que estavam
na linha de frente no combate ao coronavírus, seja do agente de saúde até o entregador de delivery. O Estado
deveria ser um pilar em meio a crise, deveria transmitir a possibilidade de recuperação através de atitudes, pois
palavras de conforto e boas ações vindas do que deveria ser um ícone teriam sido de grande ajuda para o psicológico
de uma população que foi privada de sair e interagir socialmente; a esperança e confiança de todos foi abalada por
um Estado que tem como dever a saúde pública igualitária.

O enfoque ecossistêmico da saúde

Modelo conceitual dos determinantes sociais da saúde


Segundo Carlos Batistella, “é do conhecimento de todos que alguns grupos da população são mais saudáveis que
outros”. Isso acontece porque a mão do governo não se estende para todos ou as ações existentes são mal
distribuídas, desde a distribuição e qualidade da água (quando há água), da distribuição de renda, do saneamento
básico, da geração de emprego, da assistência médica e social.
Se analisarmos de perto a rotina diária de uma pessoa da classe média alta e de outro indivíduo da classe baixa,
podemos notar a presença de extremos. É possível identificar que de um lado o nível de assistência e garantia que
tudo em sua vida dará certo, apesar das adversidades, é certo; de outro lado, temos o contraste com a incerteza de
se haverá comida na mesa. Tais desigualdades são injustas e inaceitáveis, sendo refletidas diretamente na saúde
física e mental daqueles que não conseguem um emprego ou tem emprego subumanos para tentar se manter. A
desigualdade é um conjunto consequências das condições sociais que essas pessoas vivem e trabalham.
Os determinantes sociais da saúde incluem as condições mais gerais de uma sociedade, e se relacionam com as
condições de vida e trabalho de seus membros, como habitação, saneamento, ambiente de trabalho etc.
Para combater essas injustiças, é necessário conhecer as condições de vida e trabalho de grupos de diversas classes,
fazendo com que a sociedade em geral entenda que esses problemas existem e que é dever de todos somar para que
os injustiçados tenham os seus direitos básicos garantidos, através da boa escolha de políticos. Como também,
tomando consciência que essa dificuldade ao acesso do básico para sobreviver de alguns poucos é e será refletida no
conjunto social como um todo.
Tomemos como exemplo esta pandemia. Enquanto uns se apavoravam e se recusavam a usar a máscara para
garantir o bem maior, pessoas em situação de rua não tinham o conhecimento da situação, como também não
tinham a escolha de usar ou não a máscara, pois o mínimo foi lhe negado. Ao mesmo tempo que pessoas com
sintomas chegavam a hospitais particulares para serem tratados, outros não tinham o transporte necessário para se
deslocar até um hospital público, não tinham água para lavar as mãos, não possuíam álcool para higienização, não
tinham dinheiro e comida para sobreviver a quarentena, e muitas das vezes não tinham a noção do que estava
acontecendo ao seu redor ou era inimaginável que conseguissem o tratamento adequado para se salvar, uma vez
que o atendimento básico faltava.
Quando pararmos de analisar as desigualdades de adoecimento de acordo com a faixa etária e as diferenças
ocasionadas pelas doenças especifica de cada sexo e voltarmos nossa atenção às relações de informações, notasse as
desigualdades consequentes das condições sociais em que as pessoas vivem e trabalham. Tais desigualdades são
injustas e inaceitáveis, e por isso são chamadas de iniquidades.
Temos como exemplo de iniquidade, a probabilidade maior de uma criança morrer por ter nascido no Nordeste e não
no Sudeste ou apenas por sua mãe não ter terminado os estudos. As relações entre os determinando e aquilo que
determinam é mais complexa e mediada do que as relações de causa e efeito.
Se quisermos combater essas injustiças, devemos conhecer melhor as condições de vida e trabalho dos diversos
grupos da população, e saber estabelecer as relações dessas condições de vida e trabalho. Devemos fazer com que a
sociedade tenha consciência do problema que as iniquidades representam, não somente para os que são
injustiçados, mas também para todo o conjunto social. É necessário ter o apoio político necessário à implantação de
intervenções. O Programa de Saúde da Família (PSF) é uma das mais importantes estratégias para interferir nessas
determinações nesse tempo de pandemia.

Complexidade e processo saúde-doença


A doença não pode ser compreendida apenas por meio das medições fisiopatológicas. Quadros clínicos
semelhantes, ou seja, com os mesmos parâmetros biológicos, podem afetar pessoas diferentes de forma distinta. A
necessidade de uma análise com metodologia transdisciplinar tendo como base a perspectiva da complexidade, e
vendo todas as faceta evitando a linearidade na interpretação das relações. O processo saúde-doença, reconhecido a
partir da posição do observador, aparece como alteração celular, sofrimento ou problema de saúde. No nível
coletivo, o processo saúde-doença possui uma expressão populacional, cultural e espacial.
O avanço rápido da COVID-19 nos foi necessário medida de prevenção universal para todos, o que nos faz que trás o
questionamento: a estratégias tomada levaram em conta o fator adoecimento ou há uma analise de cada individuo e
sua particularidades? Percebemos a dificuldade de adaptação devido à falta da própria estrutura nos levando
redefinir os próprios conceitos de saúde.

Operacionalização de um conceito amplo

O novo coronavírus teve um avanço de forma exponencial devido seu alto nível de contágio, espalhando-se mais
rápido do que uma gripe comum. O risco de colapso de todos os sistemas de saúde ao redor do mundo é claro,
forçando até mesmo as maiores economias adotarem medidas de urgência numa escala com impactos sempre
precedentes.
Enquanto cientistas correm contra o tempo para encontrar um tratamento ou cura para COVID-19 e governos ao
redor do mundo buscar maneiras de passar por essa crise, o que implica na superação do modelo biomédico e na
adoção de outros princípios norteadores capazes de auxiliar na necessária reorganização do modelo de atenção à
saúde, ainda voltado as ações curativas e assistenciais. Contudo, buscando a criação de ambientes favoráveis à saúde
ambientes comunitários, como ginásios esportivos transformados em centrais de triagem, os quais são feitos testes
rápidos de COVID-19 para as pessoas que apresentam sintomas e avaliação médica. A tomada de decisões e a
definição e implantação de estratégias para alcançar o melhor nível de saúde também é primordial para o contexto
da pandemia, porém não houve uma garantia de acesso da população a informação sendo divulgadas fake news
durante a pandemia.
No que tange as condições de vida e de trabalho, algo que se expandi para além da doença, dos doentes, dos modos
de transmissão e dos fatores de risco houve a implantação de auxílios para aqueles que ficaram sem fontes de renda,
medida de proteção social que buscou atenuar a crise econômica decorrente da pandemia do novo coronavírus.
Em suma, a operacionalização feita durante a pandemia, apesar de seus altos e baixos, nos trouxe a vacina que é
uma das consequências da capacidade mobilizadora dos atores sociais envolvidos, sejam profissionais de saúde, de
outros setores, ou a própria comunidade.

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