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Estudos Amazônicos 7º ano

A Amazônia Negra

Quando se fala sobre a presença negra na Amazônia é frequente ver o espanto das pessoas.
Ainda hoje, especialmente fora da região, é comum ouvir a pergunta: “Mas, afinal, existiu escravidão
na Amazônia? ”
Podemos começar respondendo que a experiência da escravidão africana também marcou a trajetória
da parte norte da colônia portuguesa na América. Em decorrência disso, hoje a presença negra na
Amazônia é inegável, com enorme impacto na vida da região, marcando sua história, suas formas de
comer, vestir, amar, dançar, cantar, rezar, trabalhar, juntamente com todas aquelas heranças
intangíveis que as pessoas levam na pele, nos olhos e na alma.

São inúmeros os sinais dessa presença. Existem


hoje 406 comunidades quilombolas nos estados do
Amapá, Amazonas, Maranhão e Pará. Os dados são
da Fundação Cultural Palmares, entidade do
governo federal responsável pela certificação
dessas comunidades, etapa necessária para o
reconhecimento de suas garantias constitucionais e,
especialmente, o direito às terras em que vivem.
Em todo o Brasil, são cerca de 2 mil comunidades
já certificadas.
Agora, pergunta-se: se a presença negra na
Amazônia é tão relevante, por que sabemos tão
pouco sobre ela? Para começar, é preciso lembrar
que, durante muito tempo, boa parte da
historiografia partiu do princípio de que a
escravidão não teve grande importância na região,
Casal dançando o carimbó, dança típica do Pará que já que ali se costumava usar o trabalho indígena
“sofreu” forte influência negra em maior escala que o africano. Inclusive, havia
certo consenso de que estudar a presença africana
no Brasil era relevante apenas nos lugares onde existia grande número de escravos. Basicamente,
isso significava falar das regiões Sudeste e Nordeste do País.

Durante anos, esses argumentos foram usados para


justificar a falta de aprofundamento da pesquisa
sobre a presença negra na Amazônia. O resultado
disso repercutiu fundo na produção historiográfica
sobre o tema e alcançou os livros didáticos. Afinal,
quanto menos se pesquisava sobre o assunto, mais
difícil era falar sobre ele.
Desde o fim da década de 1980, esse cenário vem
sendo revertido em razão da notável expansão dos
estudos sobre a escravidão africana e as
experiências de trabalhadores cativos e libertos,
ancorados em sólida pesquisa documental, novas
temáticas e métodos.
O mergulho nesse universo vem revelando outras
histórias sobre a vida dos africanos Brasil afora. Habitação de negros escravizados, a Senzala
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Tais resultados ajudam a fortalecer as lutas contemporâneas dos movimentos sociais de negritude
porque iluminam trajetórias de indivíduos e comunidades, colaboram nos processos de
reconhecimento de terras quilombolas e fundamentam reivindicações de políticas de ação afirmativa
e combate ao racismo.
Hoje, as pesquisas revelam um Brasil muito mais diverso do ponto de vista étnico-racial do que se
pensava no passado. Os estudos fazem isso trazendo outros personagens para a cena, entre
eles, homens e mulheres de origem africana, escravizados ou não, que viveram na Amazônia.

Os Negros no Pará

Estudos recentes indicam que a Amazônia foi conectada às redes do tráfico atlântico ainda no fim do
século XVII e, até meados de 1750, estima-se a entrada de cerca de mil indivíduos na região,
provenientes, em especial, da Costa da Mina, área tradicional de comércio negreiro na África.
O tráfico era feito com forte comprometimento da coroa portuguesa e, considerando que o Grão-Pará
e o Maranhão não eram uma de suas rotas mais rentáveis, havia certa irregularidade nos
desembarques até a segunda metade do século XVIII, quando foi criada a Companhia Geral de
Comércio do Grão-Pará e Maranhão.
A partir daí, coube à nova empresa a tarefa de ampliar a oferta de escravos para os proprietários
da região, em especial porque a coroa portuguesa resolveu, no mesmo período, abolir a escravidão
dos índios (1755) que eram trazidos dos altos cursos dos rios amazônicos para servir nas
propriedades no Pará e no Maranhão. No Pará, a defesa dos indígenas pelos missionários, defendendo
a liberdade dos nativos, criou as condições para a importação de escravos africanos para o Estado do
Pará.
Os índios eram trabalhadores indispensáveis e o fim de sua escravidão, somado à presença dos
escravos, não representou uma redução dessa importância.
Eles continuaram a ser empregados em diversas formas de trabalho compulsório e, inclusive,
compartilharam muitas dessas experiências com os escravos negros.
Foi somente com a criação da Companhia Geral do Grão-Pará e Maranhão (1755-1778), visando o
estabelecimento da política pombalina de fomentar as atividades comerciais na Amazônia, que as
cifras dos cativos traficados entre a África e a Amazônia portuguesa aumentam significativamente.
Entretanto, isso não irá dar conta totalmente da carência por trabalhadores escravos na região.
Enquanto a Companhia esteve em funcionamento (1755-1778), estima-se que tenha comercializado
perto de 25 mil escravos na imensa área que hoje conhecemos como Maranhão, Pará, Amazonas e
Mato Grosso. Até meados do século XIX,
seguindo os novos fluxos do tráfico internacional,
as populações desembarcadas na Amazônia
serão procedentes, em sua maioria, da África
Central Atlântica.
Assim, no século XIX já era bastante evidente a
presença da população escrava africana nas
vastidões amazônicas, trabalhando com os índios
nas lavouras de café, tabaco, cana-de-açúcar, na
coleta de produtos da floresta, nas canoas do
comércio e também nos diversos núcleos urbanos
existentes floresta adentro. Como disse o
historiador Flávio dos Santos Gomes, há muito
tempo a floresta já estava enegrecida.
Índios do norte da província do Grão-Pará
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Como a região amazônica a ser explorada era imensa, seja para a agricultura ou pela coleta de produtos
de origem florestal necessitava-se de um maior número de força de trabalho para a região. Desta
forma a mão-de-obra na região amazônica se apresentava como uma problemática para os colonos.
Em Portugal já se utilizava a mão-de-obra escrava africana há séculos: a dos negros ou a de árabes
do norte da África. Desde o início da colonização do Grão-Pará houve a necessidade de resolver
problemas de mão-de-obra e Portugal buscou o problema com a escravidão negra africana. Na
Amazônia, o número de escravos negros não chegou a ser tão numerosos quanto em outras regiões
do Brasil. Isto devia-se ao fato de que a atividade básica da região – o extrativismo florestal – exigia
o conhecimento da floresta amazônica e os negros não a conheciam.
As nações africanas que abasteceram o tráfico na região entre o século XVIII e nas primeiras décadas
do XIX foram os bantos, o grupo Sudanês e nações do grupo Guineo-sudanês, além de outras
indicações étnicas consideradas duvidosas.

A maioria da população de escravos negros


presentes eram originados diretamente da África,
pois o número de escravos nascidos na região
ainda era pequeno. Neste contexto, houve a
presença dos cativos africanos desempenhando
várias atividades em diversas regiões do território
amazônico e do Grão-Pará como a presença
africana no Baixo Tocantins na coleta das drogas
do sertão; no Marajó com o trabalho na criação de
gado; no Baixo Amazonas, onde a coleta do cacau
representava a principal atividade econômica no
século XIX; na Ilha das Onças no trabalho de
artesanato de cerâmica; além da presença de
escravos no próprio espaço urbano da capital
paraense. De fato, o trabalho escravo africano na
Tráfico negreiro com destino a província do Grão-
região amazônica possuiu grande importância
Pará
para a economia regional.

Que tipo de atividades realizavam os escravos?

Circulando pelas ruas de Belém e Manaus estavam carregadores africanos, vendedoras de açaí,
mucamas e criados, forros negociando suas produções de tabaco, artigos de latão e cobre, oferecendo
seus serviços de sapateiro, carpinteiro e ourives, divertindo-se nas festas do Espírito Santo, de Nossa
Senhora de Nazaré ou, ainda, como membros da Irmandade do Rosário.
Escravos foram empregados na construção de fortalezas, condução de embarcações para Mato
Grosso, n a s f a z e n d a s , a r r o z , t a b a c o , m a n d i o c a , milho, na criação de gado e de cavalos na
Ilha de Marajó. Também eram artesãos, tecelões de chapéus e redes de algodão, apanhadores
de açaí, pescadores, trabalhadores do porto, dos arsenais de guerra e da Marinha, das obras públicas,
calafates, carpinteiros, p e d r e i r o s , f e r r e i r o s , v e n d e d o r e s d e tabaco, garapa e frutas. Também
estavam nas casas senhoriais servindo, ninando, zelando, cozinhando, lavando e costurando. Estavam
em todos os lugares dividindo espaços com os trabalhadores índios, o que tornava essas cidades
diferentes das outras. Foram utilizados para trabalhar na lavoura de cana- de-açúcar, e m
e n g e n h o s c o m o o E n g e n h o d o Murutucu em Belém e o Engenho do Cafezal em Barcarena.

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As ruínas do Engenho Murutucu, em Belém nas imagens acima e abaixo. O engenho possui quase trezentos anos de
história. Foi obra do arquiteto italiano Antônio Landi

Ao longo da história o Grão-Pará abrigou


vários quilombos com expressiva
população. Espalharam- se na calha do
Amazonas, Tocantins, ilha do Marajó,
Amapá e, principalmente, a leste de
Belém a caminho do Maranhão.
Por exemplo, no século XIX, o quilombo
de Alcobaça (hoje Tucuruí) contou com
mais de 300 indivíduos.
Em 1835, negros do quilombo de Caxiú,
cerca de
400, comandados pelo preto Félix, e um
tal Manuel Maria, reforçaram o grupo do chefe cabano Eduardo Angelim.
Um líder quilombola foi o negro Cristóvão, que levantou os escravos do engenho Caraparu. Nos anos
de 1835, Benfica e Caraparu, proximidades de Belém, eram engenhos de açúcar, com vasta
escravaria.
O núcleo rebelde, como os negros do Murutucu, nas terras do poderoso Rodrigues Martins, destruiu
totalmente o engenho e deu o que fazer ao general Andreia que, para batê-lo, organizou nada menos
do que três expedições. Somente a última, comandada pelo capitão-tenente Osório, com cerca de 200
homens, enfrentou cerca de 150 amotinados.

A Capoeira

O negro escravo organizou seu próprio sistema de defesa. E começou usando o próprio corpo. A defesa
com o corpo gingando, com o ataque rápido e certeiro, característico do negro de Angola: era a
capoeira.

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A capoeira enquanto jogo ou luta, é de origem
africana, tendo raízes em Angola, portanto
tradição dos negros bantos.
No século XIX, no jornal O Publicador Paraense,
Diário de Notícias e a folha ilustrada A Semana
eram constantes as notícias de capoeiras no Pará.

Texto e Contexto

“Os capoeiras não são mais que vagabundos,


livres ou cativos, dados à crápula, à velhacaria, a
vícios infames. (...) aparecem até de dia, já não
Negros praticando capoeira nos arredores de Belém
procuram envolver-se no escuro manto da noite;
de dia mesmo praticam das suas. ”

(O Publicador Paraense, Ano II, nº 58, p. 2.)

“Ante-ontem, às 8 horas da noite, no largo da Santana, um negro, metido à capoeira, fazia troça com
outros companheiros”

(Diário de Notícias, Belém, 15/11/1882. p. 3.)

“O grosso cacete é a arma predileta para os exercícios de capoeiragem; a navalha, a tira-teima, se


porventura o freguês está jurado. A polícia é a única que não vê os vadios, em grupos, pelos cantos e
tascas, fazendo a apologia da cachaça e pondo em risco a vida dos pacíficos cidadãos! ”

(A Semana, Ano 4, nº 5, 24/03/1890. p. 2.)

Abolição da escravidão no Pará

Com o término do tráfico negreiro transatlântico entre o Grão-Pará e a África (1834) não
representou a interrupção desta atividade, pois já havia todo um comércio interno entre os Estados
do Brasil e do Grão-Pará e Maranhão. Com isto, é importante notarmos que Belém não se limitava
apenas em ser um polo receptor de cativos africanos, mas também um polo exportador de escravos.
Através do porto de Belém ocorria um tráfico interprovincial de escravos a fim de abastecer as
necessidades de mão-de-obra africana para o mercado de trabalho de outros pontos da Amazônia.
No século XIX, no Brasil, ocorreu a luta para abolir
a escravidão no país. No Pará, em Belém foi
fundada a Sociedade Filantrópica Emancipadora da
Província do Grão-Pará, criada pelo médico Carlos
Seidl, em 1869. Em 1882, surgiram organizações
abolicionistas como o Clube Felipe Patroni e o Clube
Batista Campos.
Em abril de 1888, com a ascensão na Corte do
Gabinete de João Alfredo, os abolicionistas
criaram, n o G r ê m i o L i t e r á r i o , u m a
a s s o c i a ç ã o denominada Liga dos Cativos da
Imagem retrata a redenção de Benevides do trabalho
escravo. A Vida Paraense, Belém, 30/03/1884. Província do Pará. Após discussão sobre o
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estatuto, decidiram: a) que todos os membros da diretoria dariam liberdade aos seus cativos; b) que
escolheriam a data de 13 de maio para a abolição total dos escravos do Pará; c) como o dia 13 de
maio estava próximo, adiaram para o ano seguinte (1889) a extinção do cativeiro.
A colônia agrícola de Benevides torna-se importante nesse contexto, na medida em que atuava como
centro receptor de escravos fugidos, desde pelo menos 1881, três anos antes de ter sido decretada
como livre de escravos.

O jornal Diário de Notícias, de João Campbel, engajou-se na campanha abolicionista, denunciando o


tráfico e desembarque de negros no Pará.

Texto e Contexto

Pele Negra

“O vapor Bahia trouxe 13 escravos para serem


vendidos nesta província, graças à proteção
facultada pela assembleia aos especuladores dessa
torpíssima indústria. ”

(Diário de Notícias, Nº 154, 06/07/1881, p. 2.)


Sátira das festas de doação de cartas de liberdade aos
escravos no Teatro da Paz. A Semana Ilustrada, “Do Maranhão entrou ontem o vapor Alcântara,
Belém, 30/03/1884 trazendo o formidável carregamento de 57
escravos e 20 ingênuos.
Esses infelizes vieram com destino a Olaria do Sr. Domingos Noguez. Esse facto depõe seriamente
contra nós, e devemos o conceito péssimo feito a nosso respeito, dentro e fora do país, unicamente à
politicagem dos nossos deputados.

(Diário de Notícias, 24/06/1882, p. 2.).

Poesia antiescravista também circulava no jornal, como as de Tobias Barreto.

Texto e Contexto

“Se Deus é quem deixa o mundo


Sob o peso que o oprime
Se ele consente este crime
Que se chama escravidão;
Para fazer homens livres,
Para arrancá-los do abismo,
Existe um patriotismo,
Maior que a religião. ”

(Tobias Barreto. Diário de Noticias, 02/07/1884. Citado em SALLES, Vicente. O negro na formação
da sociedade paraense. Belém: Paka-Tatu, 2004. pp. 73-74.).

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Em 13 de maio de 1888, a Lei Áurea, assinada pela princesa Isabel, aboliu a escravidão em todo
Brasil. Recebendo a notícia, o presidente da província Miguel Almeida Pernambuco fez publicar, pela
imprensa, um edital, determinando a execução do Decreto nº 3.353 em todo o território do Pará.

Influência negra no Pará

A contribuição do negro no Pará se manifesta nos folguedos populares, na culinária, no vocabulário e


nos vários aspectos do folclore regional.
O negro que veio como escravo para o Pará, assim como o indígena e o branco, sobretudo o
português, contribuiu e influenciou para a formação da sociedade paraense. O negro contribuiu com
o seu trabalho durante séculos, mas também contribuiu com sua cultura, seja na culinária com a
feijoada típica, seja na capoeira, na música e na dança.

Texto e Contexto

Observaram Spix e Martius, nos anos de 1820, os


negros e mulatos paraenses.
“Os mulatos são os mesmos também aqui; é a
mesma gente facilmente excitável, exuberante,
pronta pra qualquer partida, sem sossego, visando
a efeitos espalhafatosos. Para a música, o jogo e a
dança, está o mulato sempre disposto e agita-se
insaciável, nos prazeres, com a mesma leviandade
dos seus congêneres do Sul, aos sons monótonos,
sussurrantes, do violão, no lascivo lundu ou no
desenfreado batuque. ”

(SPIX & MARTIUS. Viagem pelo Brasil, 1817-


1820. São Paulo, 1962, 3 v. p. 22.).
A maniçoba é um prato típico paraense influenciado
pela cultura africana Uma grande contribuição dos negros no Pará foi a
sua participação ativa no movimento revolucionário
da Cabanagem, onde negros escravos e ex-escravos se destacaram como o negro Manuel Barbeiro, o
negro liberto de apelido Patriota e o escravo Joaquim Antônio.

Texto e Contexto

Negros e a Cabanagem

“Emergindo dos mocambos e das senzalas ou afluindo dos quilombos ignotos, no seio das selvas e
nas praias desabitadas, os escravos acostaram-se à causa cabana, com o objetivo da reconquista da
liberdade. ”

(HURLEY, H. J. Traços cabanos. Belém: Off Gráficas do Instituto Lauro Sodré, 1936. p. 209.)

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Cabanos Negros – Foram muitos,
porém poucos nomes chegaram aos
nossos dias. As informações sobre
cada um deles também são
escassas, mas, suficientes para
figurarem no panteão dos grandes
heróis libertários de nossa terra.
Quase todos se libertaram da
escravidão, aderindo ao movimento
cabano de armas na mão. Por sua
audácia guerreira e liderança
política conquistaram chefias
militares e ao reivindicarem
abertamente que o terceiro governo
cabano abolisse formalmente o
cativeiro tornaram-se a vanguarda
programática do movimento.
Entre outros podemos citar o negro
cabano Pedro Figueiredo, nomeado
pelo segundo presidente cabano
Francisco Vinagre, comandante do
destacamento de guardas nacionais
Negros lutando durante a Cabanagem numa total inversão da hierarquia
militar, causando escândalo na
época. Este destacamento guarnecia o Arsenal de Guerra e o comandante Pedro Figueiredo, nas
palavras do historiador Domingos Rayol era “Homem da raça africana que se recomendara por seu
v a l o r e i n t r e p i d e z n o f o g o d a p r a ç a d a s Mercês”.
Em seus escritos, Rayol que foi o cronista da Cabanagem também faz referência aos negros Manuel
Barbeiro, Antônio Pereira Guimarães (o gigante Maquedum) o escravo Francisco Sipião “ que fora
capitão dos cabanos e influente nas desordens na cidade e desse rio”, Custódio Teixeira,
considerado um dos “influentes” na toma de Belém, em janeiro de 1835 e o aprendiz de sapateiro
José Manuel Pereira Feio. Outros antigos escravos também foram lembrados, especialmente o negro
Patriota, Joaquim Antônio e João do Espírito Santo, também conhecido como “ Diamante”. Todos os
três depois de terem se destacado como propagandistas das ideias revolucionárias e como
combatentes tiveram que enfrentar a repressão do terceiro governo cabano, de Eduardo Angelim,
acusados de ¨proclamarem a liberdade a seu jeito, incluindo a dos escravos em geral”. Patriota e
Joaquim Antônio foram fuzilados pelo governo cabano. Diamante penetrou na mata onde formou um
grupo que se autodenominou de “guerrilheiros”. Estes três grandes libertários, vindos da escravidão,
ousaram exigir que a revolução assumisse oficialmente a abolição do cativeiro, num momento em que
a Cabanagem retrocedia, uma vez que não se decidia a romper com o Brasil escravocrata e
latifundiário. Seus nomes ficarão na nossa memória para sempre.

Enegrecendo a floresta

No século XIX, Manaus e Belém surpreendiam os viajantes estrangeiros que por ali passavam. Suas
belezas naturais eram atrativos inquestionáveis, mas a diversidade étnico-racial de suas populações
era o tema recorrente nos relatos. Os dados mostram que existia, ao lado de uma grande maioria de
índios vivendo nas cidades, dos escravos africanos e dos chamados brancos, uma grande variedade
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de tipos mestiços que tornava a Amazônia um laboratório extraordinário para estudo dos efeitos
das “misturas raciais”.
Mas outros laços ligavam as histórias de índios e africanos relacionados com suas experiências de
solidariedade construídas a partir do duro cotidiano que muitas vezes compartilharam. As tentativas
de constituir novos espaços fora da escravidão levaram à formação de muitos
quilombos/mocambos que, eventualmente, reuniram índios e africanos no mesmo espaço. As fugas
também foram frequentes e, em vários casos, épicas, porque atravessavam amplos espaços do
território amazônico.
Escravos lançaram mão de muitas estratégias para sobreviver em um mundo adverso e se esforçaram
para manter, no limite de suas possibilidades, o controle de suas vidas. Buscaram juntar dinheiro
para alcançar alforria, formaram comunidades independentes, guardaram segredos no fundo da alma
e transmitiram a seus descendentes.
Mas a presença negra não se reduziu à escravidão. Outros homens e mulheres viveram na região
sendo professores de música, chefes de polícia, capoeiras, gráficos, lavadeiras, oleiros, carpinteiros
– uma lista sem fim. Apesar de o silêncio sobre essas histórias notáveis ainda ser persistente, não
há como negar que está sendo revertido pela força inquebrantável de todas essas experiências
históricas.

Festas de Abolição da Escravidão na província do Grão-Pará

Na província do Grão-Pará, encontramos diversas contribuições da Escravidão enquanto instituição,


contribuições essas que tiveram reflexos culturais e sociais importantes no qual podemos perceber as
suas influencia na formação da mestiçagem da sociedade paraense. Dessa forma, podemos perceber
durante o final do século XIX a sociedade paraense passava por diversas transformações; Tais
metamorfoses passavam no campo social em relação às novas situações postas no campo
político e social que estavam se processando. Nesse aspecto, ideias e modas surgem, dando como
resultado acelerar o processo abolicionista, a entrada de imigrantes, a fuga de escravos, as alforrias
compradas ou doadas, a decadência das lavouras, a proletarização do negro e do caboclo, livres ou
escravos, recrutados pela indústria nascente, principalmente a que se associou às oficinas das
companhias de navegação e vapor. No começo da década de 1880, a campanha abolicionista atingia
o auge, em toda parte. Muitas províncias haviam fechado suas alfândegas a importação de escravos;
mas abriram-nas à exportação.
O movimento de Abolição da Escravidão na província do Grão-Pará, especificamente em Belém
esteve dentro de um raio de ação que contagiou todo o Império Brasileiro, principalmente no final da
década de 80 dos oitocentos.
Essa euforia que contagiou a capital do império foi um reflexo do movimento de emancipação escrava
que ocorrera no Ceará e que também se espalhou na província do Amazonas. Em Belém não poderia
ser diferente. Os abolicionistas de Belém também utilizaram diversas formas de contestar a questão
da Escravidão que se processava na província. Principalmente por meio da imprensa, a Escravidão
fora denunciada e combatida de maneira veemente; nesse aspecto podemos destacar a atuação
do periódico Diário de Notícias. Jornal circulante que tinha um público acentuado para os padrões da
época, aproximadamente 3.000 exemplares de tiragem diária, fora um importante instrumento de
atuação abolicionista em Belém. Havia na capital da província outros periódicos tais como O Liberal
do Pará, Diário de Belém e outros. Mas sem dúvida o Diário de Notícias foi o periódico que mais
se destacou durante esse período por declara-se tanto abolicionista como, passado algum tempo,
simpatizante do ideário republicano.

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As festas de abolição - as suas comemorações em Belém

Nesse prisma de análise, vamos perceber que as festas de comemoração do movimento de Abolição
da escravatura em Belém se apropriavam desses elementos acima explicitados.
Para que essas festas pudessem ocorrer de forma exemplar, era necessário dar um sentido a festa
e, ao mesmo tempo apagando um passado e construindo outro. No dia 13 de maio de 1888, o jornal
Diário de Notícias publica em suas páginas sob a forma de editorial:

Ergamos em frente que chegou a nossa vez!


Que o nosso grito de enthusiamo vá hoje aos confins do mundo levar a grata noticia de que o Brazil –
livre, completamente livre! —Reclama o logar que lhe compete no grande banquete da humanidade!
Denodados heróes da idéia abolicionista, vós que fostes infastigaveis na sacrosanta propaganda em
prol d’uma raça mizerrima, nós vôs saudamos com todos os échos da patria, com todos os sentimentos
de humanidade!
E os que foram coibidos pela morte, antes de verem brilhar a aurora da redenção, receberam a nossa
solemme homenagem! Que seus manes venerando-se regosigem com a felicidade que começa para
aquelles por quem tanto trabalharam!
E vós escravos de hontem e cidadãos de hoje, unamo-nôs para o engrandecimento da patria querida!

Podemos perceber que há um discurso no qual se deseja apagar um passado que não representava a
civilização moderna. As representações da instituição escravista geralmente se reproduziam por seus
aspectos negativos. Frases tal como “negra instituição” dava ideia de como o regime era designado
palavras de significados fortes.

Festa da liberdade

Hontem por ocasião da sessão do conselho diretor da liga redentora, reuniram se varios membros da
sociedade que ahi fizeram por diversas formas comemorar o grande facto pedido da abolição,
apresentado ao parlamento pela augusta princeza imperial regente.
Durante a sessão, que foi concorridíssima, distribuíram se perto de 30 cartas a maior parte d’ellas
dadas em homenagem aos generosos sentimentos da excelsa princeza.
Muitos quarteirões e ruas foram considerados livres pelas comissões no meio de constantes applausos
e vivas.
Duas bandas de músicas tocavam a porta da casa. O honrado comerciante Domingo José Dias
declara que os vapores da cia Pará e Amazonas estão (SIC) do movimento libertador no interior da
província.
Declara mais que o commercio de Belém vai declarar não possuir mais escravos, nem servir-se de
escravos.
Calorosos aplausos e vivas cobrem a palavra do distinto cidadão.
Decidia-se mandar cunhar medalhas de ferro para comemorar o 13 de maio que vai ficar redimida a
cidade de Belém.
Em seguida, foi lido o topico da falla do trhono relativo a abolição, levantando-se vivas a
princeza, ao ministerio, a todos os trabalhadores da causa da liberdade, ao som do hyno nacional
executado pelas bandas e enquanto uma basta girandola de fogos levava as saudações ao ar livre da
Amazonia.
Depois dirigiram se todos ao palacio da presidencia para cumprimentar a primeira autoridade (...)
Para a noite foi desde logo anunciada uma passeata (...)

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Nesse sentido, concebemos a tradição das festas de redenção da cidade de Belém como uma tentativa
de transformação social apoiado numa ideologia que se afastava das tradições do império liderado
por Pedro II. Nesse ínterim, as tradições inventadas realmente necessitaram “criar” novos acessórios
ou linguagens ampliando o seu vocabulário, trabalhando a continuação histórica que é recorrente para
que as “tradições inventadas” possam estabelecer-se.
As festas de liberdade refletem bem a forma como as tradições inventadas são utilizadas com o
propósito principal de socialização e a inculcação de ideias ou sistemas de valores e até mesmos
padrões de comportamento. As tradições inventadas de festas preenchem um pequeno espaço
cedido pelas velhas tradições. Nesse sentido, podemos observar que as pessoas só tomam
consciência da sua cidadania através da assimilação de símbolos ou práticas aliada a participação de
pessoas que representam o Estado e o povo em si, contemplando a ação. Além disso, o próprio
discurso do abolicionismo colocava-se como uma “imagem” que se configurava no sentido
de perceber que a extinção do trabalho escravo no Grão-Pará e, consequentemente no Brasil se deu
sem nenhum trauma e que tal processo era uma prova de que a nação estava totalmente “redimida”
de seu passado escravista, mas que a partir desse ato de “humanidade”, o país escalava um cume
bastante difícil e alcançava o seu topo no qual a nação elevou-se sobre todos os outros países da
América e da Europa.

Amazônia colonial: exploração da mão de obra indígena (Ouro Vermelho)

O escambo de pau-brasil, intensamente


praticado no litoral, foi a primeira
atividade importante onde se utilizou a
mão-de-obra indígena. Na região
amazônica, o uso da força de trabalho dos
índios era importante, pois estes
conheciam e região, sendo utilizados na
navegação nos rios, na orientação na
mata, assim como no trabalho na
floresta, na extração das chamadas
“drogas-do-sertão”.
O uso da mão-de-obra indígena no Brasil,
como no Pará, determinou a adoção de
diversas medidas legais em relação aos
indígenas e o uso de sua força de
trabalho.
A liberdade era garantida para os índios
aldeados e aliados, ou seja, os que viviam
nos aldeamentos e foram convertidos e
Para o Estado português, a prioridade era assegurar a participação aculturados. Livres, eram senhores de
dos indígenas nas atividades produtivas e sua colaboração na
suas terras nas aldeias, passíveis de
defesa do território.
serem requisitados para trabalharem
para os moradores mediante pagamento de salário.
Aos olhos dos colonizadores, o Vale Amazônico apresentava-se com possibilidades incalculáveis,
inclusive dando a impressão de que seus produtos podiam substituir as especiarias das Colônias
perdidas no Oriente.
A colonização que ali se impôs, portanto, fundamentou-se nas atividades extrativas, compondo um
sistema original e peculiar que constituiu e marcou a vida econômica da região.
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Estudos Amazônicos 7º ano
A Legalidade

A disputa ao acesso e controle desses índios marcou a história política de


toda a região amazônica. Vários conflitos entre colonos e missionários foram
inevitáveis pela disputa da mão de obra indígena. Diversas formas de recrutamento
foram utilizadas para obter essa força de trabalho.
Assim, diversas leis foram criadas, ora beneficiando os colonos leigos na exploração da mão-de-obra
indígena e, em outras, aos colonos religiosos.
A lei de 1595 previa um único motivo para escravizar o índio: somente a prisão, feita durante alguma
guerra, e efetuada por ordem direta da Coroa Portuguesa. Os decretos de 1605, 1608 e 1609
suprimiram inteiramente a escravidão do índio, declarando por princípio a liberdade indígena e a
igualdade dos seus direitos políticos ao dos brancos. Mas essas leis não puderam ser instauradas,
devido à pressão dos colonos leigos, os quais alegavam falta de mão-de-obra para continuar seus
negócios.

Os indígenas entre os colonos leigos e os missionários

A expansão do mercantilismo europeu transformou a


Amazônia num palco de batalhas, onde os principais
protagonistas eram estrangeiros que disputavam a
posse do território e as riquezas nele contidas.
Colonos de diferentes nacionalidades, armados,
instalaram-se na área, realizando um intenso
comércio e a exploração da força de trabalho
indígena.

Processo de Recrutamento

Descimentos

Eram expedições, em princípio não militares,


realizadas desde o início da colonização do Brasil
Representação de uma Tropa de Resgate
pelos missionários, com o objetivo de convencer os
nativos para que "descessem" de suas aldeias de origem para os aldeamentos dos religiosos. Os
descimentos eram feitos através do convencimento dos nativos para saírem de suas terras por livre e
espontânea vontade.
Os missionários, para conseguirem tal objetivo, faziam inúmeras promessas de melhorias nas
condições de vida dos nativos caso fossem viver nos aldeamentos; quando isso não funcionava,
usavam a coação, obrigando-os, através do medo, a aceitarem a convivência indesejada nos
aldeamentos. Após o descimento os nativos eram armazenados em "aldeias de repartições", pois eram
considerados "livres", para daí serem alugados e distribuídos entre os colonos, os missionários e o
serviço real.
O aldeamento era um projeto da colonização portuguesa para garantir a conversão dos índios ao
catolicismo, a ocupação do território, sua defesa e ainda servia como uma reserva da mão-de-obra
para o desenvolvimento da colônia.
A repartição da mão-de-obra era estabelecida pela “terça parte”: um terço permanecia na aldeia, um
terço servia à Coroa (guerras, descimentos), o restante era repartido entre os moradores, para
atividades remuneradas.
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Estudos Amazônicos 7º ano
O comércio de escravos ficou tão intenso que se estima que até meados do século XVIII cerca de 20
mil índios foram apresados e descidos do Alto Rio Negro. Nas listas dos escravos retirados dessa
região, já estão incluídos em grande número índios Tukano, Baniwa, Baré, Maku, Werekena e outros
que vivem hoje em dia nesta mesma área, trazidos para trabalhar em Belém e São Luís.

Índios de Repartição

Também chamados de índios "livres" em oposição aos escravos, eram todos aqueles que aceitavam
ser descidos sem oferecer resistência armada.

Tropas de Resgate

Eram expedições armadas realizadas pelas tropas de resgates, com o objetivo de fazer uma troca
comercial entre os portugueses e as tribos consideradas aliadas. Os colonos trocavam quinquilharias
(espelhos, facões, miçangas, colares, panelas, etc.), por nativos prisioneiros de guerras intertribais,
os chamados "índios de corda".
Os índios resgatados podiam ser escravizados durante dez anos em retribuição ao seu salvador, que
os livrava da morte. No entanto, 1626, quando completaria os dez primeiros anos de presença
portuguesa na Amazônia e os primeiros escravos deveriam ser libertados, a legislação foi modificada,
estabelecendo que pudessem ser escravizados por toda vida.

Guerras Justas

Eram expedições armadas, realizadas pelas tropas de guerra. Invadiam os territórios indígenas com o
objetivo de capturar o maior número possível de índios, inclusive mulheres e crianças. De acordo com
o conjunto de leis de 1611, a guerra só era considerada justa quando:

 Os nativos atacavam e roubavam colonos;

 Se os nativos se negassem a ajudar os portugueses na luta contra outras tribos ou na defesa


de suas vidas;

 Fossem contra o Cristianismo, impedindo a pregação do Santo Evangelho;

 Se os nativos se aliassem a outros povos europeus como holandeses, franceses, ingleses e


irlandeses.

 Enfim, qualquer demonstração de independência e vontade própria poderia servir de pretexto


para a guerra justa.

Além dos pontos já mencionados, podemos citar como causas legítimas para a realização de uma
guerra justa a recusa à conversão, a prática de hostilidades contra os portugueses e a quebra de pactos
celebrados. O impedimento à pregação era apontado como causa justificada de guerra, para punir e
castigar aqueles que punham obstáculo à propagação da fé cristã. As hostilidades das tribos também
eram causas das guerras justas. Era então estabelecida a hostilidade, a guerra devia destruir as aldeias
inimigas, matando ou escravizando a todos a quem de algum modo resistir.
Os nativos presos eram conduzidos ao mercado de escravos da aldeia, onde também eram repartidos
entre os colonos, os religiosos e os serviços da coroa portuguesa.
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Estudos Amazônicos 7º ano
Foram incontáveis as expedições que penetraram no sertão amazônico com o objetivo de capturar
nativos forçados.
Porém, a lei de 1655, profundamente influenciada pelo padre Antônio Vieira, exímio combatente da
causa da liberdade indígena na região amazônica, estabeleceu com grande moderação sérios esforços
para acomodar, de um lado, as vantagens materiais dos colonos, e de outro, a proteção dos índios.
Apesar disso, a escravidão particular continuou a existir; em se tratando de índios prisioneiros de
guerra, ela devia, inclusive, ser vitalícia e hereditária. A escravidão dos índios resgatados, contudo,
devia durar somente cinco anos. Com essa lei a situação dos índios livres mudou, pois, a fiscalização
deles, antes atribuída a funcionários civis, foi designada aos jesuítas. A atuação dos funcionários civis
era geralmente prejudicial aos “índios livres”, pois compactuavam com os colonos que os tinham sob
guarda, fazendo os índios prestar serviços aos portugueses por prazos maiores que os estabelecidos.
Pela lei de 1655 foi organizado um tribunal que tinha como função sentenciar os índios apanhados,
prisioneiros de guerra ou resgatados. Este tribunal era composto pelo governador do Estado, ouvidor-
geral, vigário do Maranhão ou Pará, e pelos prelados de quatro ordens religiosas: carmelitas,
franciscanos, mercedários e jesuítas. Mas deve-se ressaltar que quase todos membros do tribunal
estavam comprometidos com o sistema colonial e geralmente votavam pela escravidão vitalícia e
hereditária por “guerra justa”. O Padre Antônio Vieira e o então governador, André Vidal - que apoiava
os preceitos do padre jesuíta quanto à proteção dos índios -, geralmente viam-se derrotados, em
particular, pelos mercedários e carmelitas.
O fato é que a aplicação do conceito de guerra justa variou, não só ao sabor da discussão empreendida
entre teólogos e juristas, mas também, e principalmente, devido a considerações econômicas e
políticas conjunturais. No que se refere às expedições de resgate dos “índios de corda”, a legislação
da Coroa reconhecia a legalidade da compra dos índios condenados pelas tribos ao sacrifício ritual. O
Estado português apenas tentou coibir as fraudes dos colonos e garantir que o resgate constituísse
uma prática efetivamente espontânea por parte dos vendedores indígenas.
Com a Lei de 28-4-1688, o próprio Estado tornava-se empresário dos resgates, que a partir de então
seriam feitos pela Fazenda Real: duas tropas – uma para o Pará e outra para o Maranhão – deveriam
ser anualmente enviadas ao sertão. A Fazenda Real forneceria 3000 réis para a compra de
quinquilharias necessárias ao resgate de escravos, devendo ser empregados dois mil para o Pará e mil
para o Maranhão. Cada índio escravizado seria taxado em 3000 réis, e a renda desses impostos
formaria um fundo intitulado “Tesouro dos Resgates”, para ser aplicado em benefício das missões, de
novas entradas, e de outros itens relativos à obtenção da mão-de-obra. O Estado intervinha, assim,
em seu próprio benefício, desde que sobre a venda de escravos resgatados por tropas oficiais era
possível cobrar dízimos, enquanto o apresamento por particulares, no mais das vezes clandestino,
deixava invariavelmente vazios os cofres régios.
Continuando a tratar das leis vemos, aqui mais um exemplo do posicionamento ambíguo da Coroa:
pela lei de 1663, a fiscalização sobre as reduções indígenas voltava as câmaras de Belém e São Luís,
e o cuidado das almas dos índios perdia o monopólio jesuíta, agora repartido entre as ordens. A
escravidão desenfreada não tinha agora obstáculos, já que os membros escolhidos para a Câmara
eram os mesmos interessados na escravidão. Totalmente contrária aos preceitos da lei anterior, a lei
de 1680 suprimia quase que por completo a escravidão dos índios, declarava libertos todos os
prisioneiros resgatados de tribos indígenas e ordenava que fossem agasalhados nos aldeamentos;
somente os prisioneiros de guerra permaneciam escravos. A fiscalização temporal e das almas
retornava assim ao monopólio dos jesuítas. Poucos anos mais tarde o rei voltou atrás e novamente
concedeu o direito de escravizar os índios nos casos de “guerra justa”, com a justificativa que o plano
de substituir o índio pelo escravo negro não dera certo, devido principalmente ao preço.

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Estudos Amazônicos 7º ano
Cabo das Canoas

Encarregado de dirigir as primeiras expedições de exploração da mão de obra indígena, usava esta
para a coleta das drogas do sertão, assim como a função de remeiros, sua função daria a coroa de
Portugal o entendimento de que seria preciso a criação de uma legislação que melhor controlasse o
processo de exploração das riquezas da região daí em 1611 foram implantados os sistemas de chefia:

1- Sistema de Capitães de Aldeia

(1616-1686) - quando Portugal decidiu ocupar a Amazônia, enquadrou-a no sistema legal de


organização do trabalho indígena vigente na época: o sistema de "capitães de aldeia".

Tarefas do Capitão de aldeia:

 Representar e fazer cumprir as atribuições impostas pela Coroa portuguesa à aldeia;


 Comandar as formas de recrutamento e escravização de mão-de-obra indígena;
 Empreender a distribuição e aluguel dos índios entre colonos, missionários e o serviço real da
Coroa portuguesa;
 Atuar como juiz, civil e criminal, julgando e estabelecendo penas;
 Fiscalizar o pagamento dos "salários" aos índios, a fim de impedir que esses fossem enganados
pelos colonos.

Os Colonos Missionários

Os missionários constituam uma categoria de colonos que, além dos interesses econômicos e
materiais, tinham objetivos espirituais declarados: converter os índios à religião e a disciplina para
que aceitassem as novas condições de trabalho. Nesta época, a igreja não estava separada do estado
como agora. E os missionários das três ordens religiosas carmelitas, capuchinhos e jesuítas eram
funcionários da Coroa Portuguesa que lhes pagava o Côngrua, uma espécie de salário pelos serviços
prestados. Como os colonos leigos controlavam os dois sistemas de trabalho: os índios repartidos e
dos índios escravos, os missionários estavam descontentes e começaram a luta contra os colonos, para
tentar obter o controle da força de trabalho indígena.

O Regimento das Missões (1686)

O Regimento fez crescer o poder das ordens religiosas, que passaram a ter não só importância no
trabalho espiritual, mas também no político e temporal, das aldeias sob sua administração. Com o
Regimento, os episódios se precipitaram e os missionários de diversas ordens adquiriram uma
liberdade maior, uma força de contestação que o sistema não pôde suportar. Os religiosos puderam
então obter a posse exclusiva das aldeias, com a exclusão dos moradores brancos e mestiços, e, além
disso, o controle de toda a vida econômica e social das aldeias. Os missionários, portanto, passaram a
funcionar como centro e articuladores de todas as atividades nas aldeias, e como intermediários entre
as aldeias e o sistema colonial.
Incluía, afora a conversão católica dos gentios, sua incorporação ao domínio político da coroa mediante
o aprendizado da língua portuguesa, a organização das tribos em núcleos de caráter urbano
e, sobretudo, o aproveitamento racionalizado de sua força de trabalho em atividades extrativas e
agrícolas.

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Estudos Amazônicos 7º ano
As Missões Religiosas e a Ocupação do Vale Amazônico

O papel do indígena na ocupação do Vale do


Amazonas era de extrema importância. Não se dava
um passo sem ele, pois conhecia o território,
sabendo se movimentar naquela área desconhecida
pelo europeu.
Os nativos eram os guias pela floresta ou pelos rios.
Canoeiros, conduziam as embarcações nas longas
expedições fortemente escoltadas, em meio a
milhares de quilômetros, pelos cursos emaranhados
d'água. Eram também caçadores, identificando a
variada fauna, e coletores das "drogas do sertão",
pois conheciam como ninguém a flora local.
A coleta se organizou no Vale sob a coordenação dos
missionários. Os padres, que monopolizavam o
trabalho indígena, usavam um artifício para que os nativos extraíssem elementos da flora em grande
quantidade. Alegavam que, além das partes destinadas aos adultos, aos velhos e às crianças, deveriam
extrair outra, destinada a Tupã. Esta fração - "Tupã baê" - acumulada nos depósitos das missões, era,
posteriormente, exportada para a Europa onde seria comercializada com grande lucro.
Conduzido pelos nativos, o "homem branco"
penetrava pelo coração pulsante da mata espessa,
formada por imenso e heterogêneo verde, onde não
bastava querer para efetivamente ocupar. Era uma
tarefa complexa, em meio a terrenos submetidos a
chuvas constantes que provocavam um aumento no
nível das águas que, por sua vez, arrastavam e
deslocavam grandes porções de terra próximas aos
cursos dos rios. Por conta disto, a exploração detinha-
se no que a floresta oferecia e possibilitava
espontaneamente.
O isolamento de alguma canoa significava extremo
risco; por isto, iam em grupos pelos igarapés, sob a
copa de árvores gigantes, geralmente de folhas
largas, cercados pelo silêncio cortado pelo zumbido
dos insetos e pelo canto das aves. Assim, pouco a
pouco, estes aventureiros divisavam, no lusco-fusco
da floresta equatorial, um vale repleto de diferentes espécies animais e vegetais vivendo em equilíbrio.
Pelos cursos d'água - "estradas líquidas", segundo o historiador Caio Prado Júnior -, vias de
comunicação natural, iam sendo coletadas especiarias diversas, aproveitadas e utilizadas no comércio:
plantas alimentícias e aromáticas como cravo, canela, castanha dita do Maranhão, salsaparrilha, cacau
etc. Também eram extraídas madeiras valiosas e produtos de origem animal, desconhecidos, como
uma espécie de óleo utilizado na alimentação e na iluminação, obtido dos ovos da tartaruga, ou o
"manacuru" (peixe-boi), exportado salgado e seco.
Regulada a divisão do território entre as ordens, por meio de cartas régias (1687-1714), vários
grupos de religiosos iniciaram a tarefa sistemática de colonização, espalhando suas missões num raio
de milhares de quilômetros pelo vale amazônico.

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Estudos Amazônicos 7º ano
Foram os carmelitas, acompanhados de perto pelos inacianos e mercedários, que mais aprofundaram
a colonização nos antigos domínios espanhóis, ocupando a área atual do estado do Amazonas. As
missões jesuíticas espalharam-se pelo vale contíguo do Tapajós e, mais a oeste, pelo do Madeira,
enquanto os mercedários se estabeleceram próximo à divisa com o Pará, nos cursos do Urubu e do
Uatumã. Os carmelitas disseminaram seus aldeamentos ao longo do Solimões, do Negro e, ao norte,
do Branco, no atual estado de Roraima.
Assim distribuídas, as missões entregaram-se a diligente trabalho de exploração econômica em
suas circunscrições. A própria metrópole incentivou tal empreendimento, uma vez que perdera seu
império asiático e necessitava dar continuidade ao comércio de especiarias, de que o Amazonas se
mostrava muito rico.
Os religiosos corresponderam de imediato a essa solicitação, iniciando as primeiras atividades
extrativas de vulto. Firmou-se, dessa maneira, a exportação regular de cravo, cacau, baunilha, canela,
resinas aromáticas e plantas medicinais, toda ela sob o controle dos missionários, que dispunham do
indígena como mão-de-obra altamente produtiva.
No empenho de converter os gentios à fé católica e de ampliar o comércio de especiarias, ou "drogas
do sertão", os religiosos com frequência transferiam suas missões de um ponto a outro,
seguindo sempre a margem dos rios. Da multiplicidade desses aldeamentos surgiram dezenas de
povoados, a exemplo de Cametá, no deságue do Tocantins; Airão, Carvoeiro, Moura e Barcelos, no rio
Negro; Santarém, na foz do Tapajós; Faro, no rio Nhamundá; Borba, no rio Madeira; Tefé, São Paulo
de Olivença e Coari, no Solimões; e em continuação, no curso do Amazonas, Itacoatiara e Silves.
Os sertanistas acompanharam os missionários na intensa atividade de exploração do Amazonas. Sua
ação, em geral estimulada pelas autoridades coloniais, devia facilitar o trabalho dos provedores da
fazenda, sob a direção dos quais corriam os serviços do fisco.

Os Franciscanos

Os Franciscanos da Província de Santo Antônio chegaram a Belém em 1618, mas já estava a mais
tempo no Maranhão. Os da Província da Piedade e da Província da Conceição da Beira do Mecho
chegaram a Belém nos anos 1693 e 1706, respectivamente.
Esses missionários, até o século XVIII, administraram cerca de 20 aldeamentos indígenas distribuídos
por diversas áreas do baixo Amazonas: La do Marajó, região entre a margem esquerda do
rio Amazonas e a fronteira da Guiana Francesa, adjacência de Gurupá, distritos do Amazonas até
Nhamundá, inclusive o Xingu e Trombetas.

Os Jesuítas

Antes mesmo de ser iniciada a colonização da Amazônia, os Jesuítas já tinham se apresentado na


parte norte da América Portuguesa. Em 1607, estiveram na serra de Ibiapaba, no Ceará, sob a
liderança do padre Luís Figueira. Outros chegaram a São Luís nos anos de 1615, 1622 e, em 1636
e 1643, chegaram até Belém. Mas suas obras missionárias, propriamente ditas, iniciam-se com
a chegada do padre Antônio Vieira na Amazônia, em 1653. Essa obra passou por várias fases,
perdurou até 1759, quando foram expulsos definitivamente da Amazônia e de todos os domínios
portugueses.
No tempo do padre Vieira, os jesuítas defenderam veementemente a liberdade dos índios, o que lhe
custou duas expulsões da região (1661 e 1684). Esses atos foram liderados por colonos
leigos descontentes com a política indigenista que praticavam. A partir de fins do século XVII, atuaram
como administradores espirituais e temporais em cerca de dezenove aldeamentos indígenas ao longo

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Estudos Amazônicos 7º ano
do rio Amazonas. Pela margem direita e seu sertão azul, no trecho compreendido do delta do rio até a
região do rio Madeira.

Os Carmelitas

Os primeiros carmelitas chegaram a Belém em 1627. Esses missionários administravam todos os


aldeamentos indígenas do Solimões a partir do século XVIII quando os portugueses expulsaram os
espanhóis da região. Administraram também os aldeamentos do Rio Negro e Branco. A grande maioria
desses núcleos coloniais foi transformado em vilas, que atualmente são cidades e municípios.
Alguns dos aldeamentos missionários do Solimões administrados pelos carmelitas foram fundados
em fins do século XVII e início do XVIII pelo padre Samuel Fritz, jesuíta a serviço do governo espanhol.

Os Mercedários

Os mercedários espanhóis da ordem de Nossa Senhora das Mercês chegaram a Belém, com
expedição de Pedro Teixeira, em 1639, oriundo do vice-reino do Peru. Administraram uns poucos
aldeamentos no delta do Amazonas, mas atuaram, principalmente, na porção territorial que
compreende o Rio Urubu até o baixo Rio Negro.

O extermínio dos indígenas

Em consequência do contato com os portugueses, uma epidemia de varíola devastou o Alto Rio Negro
em 1740, matando grande número de índios, pois é muito provável que ela tenha se alastrado por
certas partes da região sem contato direto com os "brancos", por meio de tecidos e roupas de algodão.
Entre 1749 e 1763, epidemias recorrentes de varíola e sarampo continuaram assolando a região,
sendo que a de sarampo de 1749 foi tão terrível que passou a ser chamada "o sarampo grande".
A revolta indígena mais famosa desse período foi a de 1757, liderada pelos principais de Lamalonga
no Médio Rio Negro. Esta rebelião marca a revolta dos índios contra os missionários, pela ênfase dada
à destruição das igrejas e paramentos religiosos e o assassinato do padre carmelita.

O projeto pombalino para a Amazônia: a intervenção


do estado português na economia da Amazônia e a
doutrina do índio cidadão

A Amazônia Colonial sempre se constituiu num


grande problema para a Metrópole portuguesa, no
que dizia respeito a sua ocupação efetiva. O
constante assédio de estrangeiros tornava imperiosa
a sua conquista e ocupação. As dificuldades para
deslocar colonos para a Amazônia tornaram-na
celeiro de degredados que, com a justificativa de
virem cumprir suas penas, eram enviados para as
Capitanias do Grão-Pará e Rio Negro, onde assumiram a condição de colonos.
A escassa população branca sempre presente nas referidas capitanias tornava quase impossível a
organização de sua defesa, coisa que só seria conseguida com sua efetiva ocupação. Nesse sentido, a
política pombalina traçada para a Amazônia procurava superar os obstáculos colocados à sua
colonização, através da execução de um projeto que visava transformar o índio em colono. Assim,
Pombal formulou uma política indigenista que objetivava emancipar os índios, retirando-os da tutela
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Estudos Amazônicos 7º ano
das ordens missionárias e procurava integrá-los à população branca. Nesse esforço de fazer do índio
colono, a estratégia chave foi a implantação do regime do Diretório.

A era do Marquês de Pombal e Antônio Landi (1750)

Durante
aproximadamente 30
anos, o primeiro ministro
de Portugal, Sebastião
José de Carvalho e Melo, o
Marquês de Pombal
(1699-1782), foi muito
atuante em Portugal e em
suas colônias. Político
português, verdadeiro
dirigente de Portugal
durante o reinado de José
I, o Reformador, Pombal
nasceu em Lisboa no dia
13 de maio de 1699.
Estudou na Universidade
de Coimbra.
Em 1738, foi nomeado
embaixador em Londres e,
O Marquês de Pombal expulsando os jesuítas (pintura de Louis-Michel van Loo e cinco anos depois,
Claude-Joseph Vernet, 1766). embaixador em Viena,
cargo que exerceu até
1748. Em 1750, o rei José nomeou-o secretário de Estado (ministro) para Assuntos Exteriores.
Quando um terremoto devastador destruiu Lisboa em 1755, organizou as forças de auxílio e planejou
a reconstrução da cidade. Foi nomeado primeiro-ministro neste mesmo ano.
A partir de 1756, seu poder foi quase absoluto e realizou um programa político de acordo com os
princípios do Século das Luzes ou Iluminismo. Aboliu a escravidão, reorganizou o sistema educacional,
elaborou um novo código penal, introduziu novos colonos nos domínios coloniais portugueses e fundou
a Companhia das Índias Orientais. Além de reorganizar o Exército e fortalecer a Marinha portuguesa,
foram desenvolvidos a agricultura, o comércio e as finanças, com base nos princípios do
mercantilismo.
No entanto, suas reformas suscitaram grande oposição, em particular dos jesuítas e da aristocracia.
Quando ocorreu o atentado contra a vida do rei em 1758, conseguiu implicar os jesuítas, expulsos em
1759, e os nobres; alguns destes foram torturados até morrer. Em 1770, o rei lhe concedeu o título
de marquês.

O estabelecimento de fronteiras.

Em 1751, o Marquês de Pombal deu início a três importantes projetos que deveriam marcar o novo
governo absolutista: o projeto militar, o projeto econômico e o projeto social.
Francisco Xavier de Mendonça Furtado (irmão do Marquês de Pombal) recebeu a delicada missão de
demarcar as fronteiras de Portugal e Espanha, estando à frente desses projetos. Em 1751, ao pôr em

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prática o projeto militar, percorreu o território do Grão-Pará e sugeriu a sua divisão, visando uma
administração com maior controle territorial.
Decidido a defender seu direito sobre essas terras, o rei de Portugal fez vários acordos com o rei da
Espanha. O mais importante deles foi o Tratado de Madri, em 1750. Nesse acordo, Portugal foi
representado pelo diplomata brasileiro Alexandre de Gusmão, que defendeu a ideia de que as terras
deveriam ser de quem as conquistou. Assim, terras que hoje formam a região Amazônica (oeste do
Pará, Amazonas. Rondônia, Amapá, Roraima, Mato Grosso e Parte do Estado do Tocantins), como
áreas de outras regiões foram anexadas ao território brasileiro.
Este tratado estabeleceu ainda uma linha divisória da província do Pará e o Maranhão (Rio Gurupi), e
os limites do Pará e Amazonas.
O projeto militar do Marquês de Pombal se consolidaria, portanto, administrando todas as fronteiras,
ao norte e ao extremo oeste, reaparelhando, também antigas fortalezas já existentes ao longo do rio
Amazonas e de seus afluentes.

Uma política de maior controle sobre o território do Grão-Pará

O grande objetivo da política de Pombal era retirar Portugal do atraso econômico e da dependência da
Inglaterra, através do desenvolvimento industrial e da intervenção do Estado na Economia. Para tanto,
Pombal empreendeu uma série de reformas, que iam desde a reorganização econômica do reino até
ao reordenamento da cultura, através de reformas na educação. Assim, o ministro tratou de impor
uma nova política para a Amazônia (política de controle econômico), principalmente, dando ao Estado
português maior autoridade e impedindo, portanto, qualquer tipo de concorrência que viesse prejudicar
os interesses da metrópole na região. Ou seja, o Projeto de Regeneração portuguesa centrava-se na
necessidade de reavaliar e modificar as relações Metrópole-Colônia, na medida em que a elite lusitana
observava o sub aproveitamento e/ou desperdícios de suas potencialidades econômicas, devido a
completa ausência de um projeto político de base científica, daí o interesse de Pombal pela Amazônia.

A criação de uma política econômica.

Como desde a colonização da Amazônia (século XVII), os jesuítas detinham o privilégio de


comercializar as drogas do sertão sem pagar impostos à metrópole e, neste período (segunda metade
do século XVIII), essas especiarias brasileiras estavam cada vez mais escassas, o extrativismo na
floresta amazônica surgia como uma nova possibilidade de ganho para a metrópole portuguesa.
Em virtude disso, não demorou muito para que Pombal executasse um plano, radical, no sentido de
quebrar o privilégio dos religiosos, passando assim, o controle do comércio para a iniciativa privada
(companhia de comercio do Grão-Pará e Maranhão).
A criação da Companhia de Comércio do Grão-Pará e Maranhão tinha como finalidade aumentar
fiscalização da Coroa sobre as atividades mercantis da colônia. Organizada por negociantes
portugueses, a Companhia exercia o monopólio comercial e administrativo, tanto da importação de
mercadorias europeias como da exportação de produtos da colônia. Além disso, era a única empresa
oficialmente autorizada a trazer negros para serem vendidos na região Amazônica. Esta companhia
só foi extinta em 1778, depois que o Marquês de Pombal deixou de ser ministro.
Assim, para que o Estado português lucrasse com o comércio das Drogas do Sertão, o Marquês de
Pombal resolveu acompanhar de perto tudo o que acontecia nas regiões da colônia
Nesse período, os portugueses procuraram dar uma finalidade econômica mais clara para a região.
Embora o extrativismo da coleta das drogas do sertão tenha convivido com as tentativas agrícolas
realizadas pelos missionários, apenas com Pombal, e na companhia do rio Negro é que iria ser
realizada uma experiência agrícola e pecuária de grande importância para a região. Na verdade, os
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portugueses não tinham um interesse mercantil ligado à exploração das drogas do sertão. Eles
pensaram numa alternativa econômica fixadora que garantisse a posse da área conquistada. É claro
que o extrativismo, além de lucrativo, era um meio de usar as possibilidades econômicas naturais da
região. Mas não era suficiente para formar uma sociedade permanente. Era preciso implementar uma
política econômica que garantisse a posse territorial da região e pudesse gerar lucros à metrópole.

Projeto de ordem social

Pombal enviou seu irmão Francisco Xavier de Mendonça Furtado para ser governador do novo Estado
do Grão-Pará e Maranhão e aplicar sua política de transformação da colônia. Mendonça Furtado
organizou uma expedição com físicos, astrônomos, geógrafos, engenheiros, o arquiteto Landi, entre
outros. Seu interesse era conhecer a região amazônica de perto. O então governador possuía seus
objetivos específicos para a região.
A política pombalina ordenou a criação de novos fortes em toda a Amazônia, a fim de que esta se
tornasse de fato um território português. Para isto, havia a necessidade de uma organização militar
permanente na região. Um segundo grande objetivo era incentivar o povoamento na região. Sua
política incentivou a vinda de portugueses para a região e o casamento destes com índias. Em meados
do século XVIII, o marquês de Pombal fez aprovar, em 4 de abril de 1755, o alvará com força de lei,
concedendo privilégios aos portugueses que casassem com índias. O governador também procurou
reorganizar a administração regional.
Em 1751, foi criado o Estado do Grão-Pará e Maranhão. O Grão-Pará foi subdividido em duas
capitanias, à do Grão-Pará e a do Rio Negro. O novo Estado continuava a receber ordens diretamente
de Lisboa (e não da capital do Estado do Brasil, o Rio de Janeiro).

O regime do diretório

Ponto culminante da política


pombalina, a instituição do
Regime do Diretório que
representou a completa laicização
(exclusão do elemento religioso)
da administração das povoações
indígenas existentes no Grão-
Pará e Maranhão, a partir do
reconhecimento da incapacidade
dos próprios índios de gerirem
seus próprios interesses, devido à
rusticidade e a ignorância de que
são portadores, havendo, por isso,
a necessidade da presença em
cada povoação de “um Diretor,
que nomeará um Governador, e
Capitão General do Estado, o qual
deve ser dotado de bons
costumes, zelo, prudência,
Estátua do Marquês de Pombal, na praça de mesmo nome, em verdade, ciência da língua, e todos
Estátua do Marquês Lisboa. de Pombal, na os mais requisitos necessários para
praça de mesmo nome, em Lisboa.
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Estudos Amazônicos 7º ano
poder dirigir com acerto os referidos índios”.
Um dos fundamentos ideológicos centrais de tal regime era o de levar os índios à civilização através
de sua cristianização, pois só a absorção dos preceitos cristãos os libertaria do estado de selvageria e
barbárie em que se encontravam. Por isso, esta “civilização” era a principal tarefa do diretor, que
deveria utilizar-se para o seu cumprimento do instrumento considerado mais eficaz, ou seja, a língua
portuguesa, que deveria ser disseminada entre os índios, com o objetivo de acabar com a prática de
utilizarem a chamada língua geral indígena, o “nheengatu”. Essa introdução da língua dos
dominadores sobre os dominados é um dos meios mais eficazes de consolidação das conquistas, na
medida em que possibilita aos dominantes, reduzindo-se, assim, a resistência à dominação.
Fazer com que mentalmente o índio passasse de colonizado a colonizador significava, ao menos
retoricamente, tratá-lo como igual, atribuindo-lhe os direitos naturais dos quais todos os seres
humanos seriam portadores, principalmente o de nascer livre.
Para que os índios pudessem se reconhecer como iguais aos portugueses, identificando-se como eles,
precisavam se sentir diferentes dos outros trabalhadores escravos com os quais sempre conviveram,
os africanos. Na Amazônia Colonial o conjunto de elementos despossuídos – índios forros, índios
escravos, negros forros, negros escravos, homens brancos pobres, mestiços – era genericamente
denominado de “pretos” ou “negros”, termo este iminentemente pejorativo pelo sentido discriminador.
Destruir a identidade por eles construída com os outros expropriados exigia que não mais se vissem
como “negros” e foi nesse sentido que o estatuto do Diretório determinou que os diretores das
povoações “... não consentirão (...) daqui por diante, que pessoa alguma chame de Negro aos Índios,
nem que eles mesmos usem entre si deste nome como até agora praticavam para que (...) possam
conceber aquelas nobres ideias, que naturalmente infundem aos homens a estimação e a honra”.
Invertendo a lógica que sempre se fez presente na colonização – a de conceber os dominados como
naturalmente destinados a escravos dos brancos. A política indigenista pombalina procurava produzir
no imaginário colonial a imagem do índio-cidadão, enfatizando que tal situação foi reconhecida pelo
próprio rei que “foi servido nobilitar, e declarar (os índios) por isento de toda, e qualquer infâmia,
habilitando-os para todo o emprego honorífico...” Parece não haver dúvida que o regime do Diretório
pretendia desfechar o golpe de misericórdia sobre a cultura indígena, através da reforma dos
costumes, no sentido de substituí-la pelo do colonizador.
Talvez o mais grave dos problemas enfrentados pelas autoridades portuguesas na Amazônia fosse a
do abastecimento de alimentos das tropas e da cidade, devido as dificuldades de mão de obra, sendo
a base da alimentação a farinha de mandioca produzida em pequenas lavouras. Não só o controle
missionário sobre os aldeamentos era a causa da dificuldade de obtenção de mão de obra pelos colonos,
mas principalmente a resistência indígena em se submeter ao tipo de exploração do trabalho utilizado
pelos mesmos, fundado em jornadas exaustivas, causadoras de inúmeras mortes entre os
trabalhadores. Como na sociedade colonial o ser livre estava diretamente associado ao proprietário, e
o ser proprietário implicava em uma situação de não trabalho, tornava-se bastante difícil convencer
os índios de que a liberdade não era incompatível com o trabalho em suas roças nos moldes da
concepção capitalista de trabalho, que significa realizar trabalho excedente para se obter uma
produção de excedentes.
Habituados a uma produção de subsistência que exigia apenas a realização de trabalho necessário, os
índios nunca demonstraram ter absorvido a disciplina de trabalho capitalista e, ao contrário, sempre
impuseram tenaz resistência a ela. Nesse sentido, o estatuto do Diretório procurou demonstrar aos
índios “o quanto lhes será útil o honrado exercício de cultivarem as suas terras ...”, pois só assim
garantiriam o seu bem-estar e de suas famílias, associando a isso toda uma argumentação que
mostrava quão perniciosa era a ociosidade.
A violência que parece ter marcado as relações de trabalho dos índios com os colonos tornava pouco
eficiente os estímulos previstos no Regimento do Diretório para convencê-los das “vantagens” que
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Estudos Amazônicos 7º ano
teriam de trabalhar para os moradores. A exploração excessiva a que comumente eram submetidos,
tornava-os arredios ao trabalho e levava-os a constantes fugas. Afinal, não devemos esquecer que os
índios preferiam o trabalho nas missões, pois consideravam o convívio com os missionários muito
menos pernicioso para si do que com os colonos leigos, na medida em que ser catequizado implicava
não só em trabalhar, mas também em outras atividades mais suaves. Mesmo assim, a vida com os
missionários não era um mar de rosas, já que, sentindo-se violentados no seu modo de vida tradicional,
não perdiam oportunidades para internar-se no mato.
As experiências vivenciadas pelos trabalhadores indígenas nas suas relações cotidianas com os
colonos e autoridades locais tornavam inúteis os esforços de persuadi-los dos benefícios que poderiam
tirar do trabalho, pois sempre significou para eles violência e morte.
Na visão de Pombal, a garantia da posse da terra era, entre os argumentos, o mais sólido para tentar
persuadir os índios a se tornarem colonos, embora isso pudesse funcionar às avessas.
Aportuguesar os índios não implicava apenas e levá-los a se pensar como tais. Havia também a
necessidade de fazer com que os próprios portugueses os vissem dessa forma e deixassem de tratá-
los como seres inferiores, desprovidos de humanidade e, consequentemente, de direitos de vontade
própria. Entendia Pombal que o meio mais eficaz de fazer com que índios e brancos se sentissem
iguais era estimular o casamento entre brancos e índios. Além de orientar os diretores a trabalhar
ideologicamente os colonos, no sentido de demonstrar-lhes não serem os índios inferiores em nada a
eles, o estatuto estabelecia que todos que casarem com índios portadores de honras e privilégios
passariam a ter igual gozo dos mesmos. Procurava-se, assim, atrair os brancos para um tipo de
convívio diferente com os índios, cuja base era o reconhecimento e o restabelecimento da sua condição
de pessoa.
Ao pretender emancipar os índios através da institucionalização do Regime do Diretório, Pombal tinha
claro a fundamental importância que isso tinha para a efetivação de seu projeto para a Amazônia, na
medida em que, transformados em colonos, os índios garantiriam a ocupação efetiva da terra e a
consequente consolidação da dominação portuguesa, já que não havia qualquer possibilidade que isto
pudesse ser feito com os colonos portugueses.
Dar “liberdade” aos índios significava aprisioná-los às necessidades do governo colonial, que passaria
a ter liberdade para deslocá-los para áreas que lhes fossem mais convenientes como soldados,
completando o processo de destribalização iniciado pelos missionários e utilizá-los como
trabalhadores nas obras públicas e distribuí-los com vantagens financeiras aos colonos. Tal esforço
demonstrou ser infrutífero, pois a laicização das povoações facilitou a ação dos colonos portugueses
no que dizia respeito à exploração do trabalho indígena, tornando, em grande medida, os artigos do
estatuto do Diretório, letra morta.
A substituição da tutela dos religiosos pela tutela laica dos diretores significou para os indígenas uma
mudança trágica, na medida em que os deixou totalmente à mercê dos colonos já que os diretores,
interessados em auferir vantagens pessoais comumente criavam inúmeras facilidades para o acesso
dos colonos ao seu trabalho e encontravam inúmeras maneiras de burlar as normas a que estavam
submetidas pelo Regimento do Diretório.
O Diretório representou um esforço estupendo de integração do índio à sociedade colonial,
contribuindo decididamente para intensificar a desorganização do seu antigo modo de vida e para
tornar as suas condições de sobrevivência praticamente insuportáveis, aproximando-os ainda mais
dos outros seguimentos de não proprietários presentes na população. Contraditoriamente, a
destribalização iniciada pelos missionários com os descimentos e intensificada pelo Regime do
Diretório, contribuiu para aproximar as tribos indígenas existentes na Amazônia, possibilitando a
construção de uma identidade de interesses que inúmeras vezes se exteriorizou em ações de
resistência coletiva.

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Estudos Amazônicos 7º ano
Em resumo, o Diretório enunciava, ao longo dos 95 parágrafos, os principais objetivos a atingir:
expandir a fé cristã, abolir os costumes gentílicos, civilizar os índios, desenvolver a agricultura,
incrementar o comércio, introduzir a moeda metálica em circulação e fortalecer o Estado. O Diretório
definia as regras para a instauração do governo temporal e espiritual nas aldeias indígenas e
enumerava as medidas preconizadas: interdição das línguas nativas, obrigatoriedade do uso da língua
portuguesa, criação de escolas separadas para meninos e meninas, nomeação e pagamento de
professores, utilização de sobrenomes lusitanos, introdução de vestuário, hábitos e costumes do reino
e proibição de apelidar os indígenas de “negros”. Continha, também, disposições relativas à
distribuição de terras pelos ameríndios, intensificação de produções agrícolas (plantações de
mandioca, feijão, milho, arroz, algodão, tabaco e café), ao comércio de drogas do sertão (cacau e
salsaparrilha), às atividades da pesca e extrativas, ao pagamento de dízimos e à política de repartição
e pagamento da mão-de-obra nativa. Estipulava, ainda, as regras referentes à organização das aldeias,
atribuição do estatuto de vila ou lugar, à entrada de colonos nas povoações indígenas e aos casamentos
entre brancos e índias. Definia, finalmente, a responsabilidade dos diretores dos aldeamentos
indígenas.
No entanto, a aversão dos índios em trabalhar para os colonos fazia com que a alternativa de os
transformar em trabalhadores assalariados não parecesse a mais correta. Assim, a alternativa do
índio-colono tornava-se mais viável e, para isso, não bastava conceder-lhe apenas a liberdade. Junto
com esta, havia a necessidade de reconhecer-lhe direito à terra, no sentido de transformá-lo num
agricultor produtivo à Metrópole. Por isso, a referida lei também reconhecia serem os índios senhores
de suas terras, mesmo daquelas que estivessem em poder de particulares.
A obra de Pombal foi aprovada pelo governo metropolitano que a mandou publicar (Lisboa, 1758) e
tornar extensiva ao estado do Brasil. Em pouco tempo, concedeu o estatuto de vila a 40 aglomerados
e de lugar a 23, conferindo-lhes nomes de povoações do reino (Barcelos, Tomar, Melgaço, Santarém,
Óbidos, Porto de Mós, Chaves, Soure, Bragança, Guimarães, Viseu, etc.). O objetivo era
institucionalizar o espaço onde os índios estavam reunidos.
Uma das principais preocupações de Pombal em relação à Amazônia era de garantir sua eficaz
proteção do seu território contra investidas estrangeiras (franceses e espanhóis). No sentido de
atenuar a resistência dos índios ao serviço militar, Mendonça Furtado, encarregado do governo do
Pará e da missão de executar o projeto pombalino na Amazônia, em carta de 20 de julho de 1755,
propõe ao rei:

“Que (...) mande, por uma lei, declarar que todos os descendentes de índios estão habilitados para
todas as honras sem que aquele sangue lhes sirva de embaraço, e que os Principais, seus filhos e
filhas, e quem casar com elas, são nobres e gozarão de todos os privilégios que como tais lhe
competem”.

Fiel a “doutrina do índio-cidadão”, o governador


procurava igualar brancos e índios em direitos, com o
objetivo de estimular o casamento entre eles, pois
considerava que “habilitados assim os índios, se irão
sem dúvida os europeus misturando com eles sem
embaraço, e ficará mais fácil o povoar-se este
larguíssimo país, que, sem aproveitarmos a gente da
terra, é moralmente impossível”.
Palácio do Governo do Grão-Pará ou Palácio Lauro
Para o governador havia a necessidade de se criar Sodré
condições para que os índios pudessem se sentir
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Estudos Amazônicos 7º ano
iguais aos portugueses e, assim, assumirem os interesses dos últimos como seus, cumprindo seu papel
de vassalos da Coroa portuguesa. Contraditoriamente, o governador não os reconhecia como iguais,
como mostra sua carta:

“Que aqueles índios que passassem a oficiais e chegassem a capitães, e daí para cima, gozarão dos
privilégios que competem aos seus postos, ainda que não sejam confirmados, pela razão de que são
uma miserável gente, e não cabe na sua possibilidade o mandar ao Reino confirmar as ditas patentes”.

A Companhia de Comércio do Grão-Pará e Maranhão foi criada com o objetivo de integrar a economia
do norte do Brasil ao sistema colonial. A Companhia foi criada a partir dos moldes que já existiam em
Portugal e em outros países coloniais. Este foi o grande projeto econômico de Portugal para a Colônia,
com incentivos financeiros muito superiores e com maior eficácia que aqueles aplicados na busca das
“drogas do sertão”. A Companhia deteve o monopólio do comércio da região por 20 anos e estimulou
as culturas do algodão e do arroz através da venda de maquinarias e da facilitação de créditos,
transporte e fretes. A Companhia do Grão-Pará e Maranhão fez concessões de terras através de títulos
de sesmarias (lote de terra inculto que o rei de Portugal cedia para ser cultivado pelos sesmeiros). Os
novos donos se beneficiariam com a isenção de impostos, a distribuição de instrumentos agrícolas e
outras vantagens. Além disso, assegurou o fornecimento de mão-de-obra escrava para a região.

Consequências negativas do diretório dos índios

Contudo, no que diz respeito aos índios, é preciso perceber como a política pombalina não foi nada
progressista. Pelo contrário, a implantação do Diretório e a substituição dos jesuítas por funcionários
indicados pelo Estado - que tinham como objetivos abolir o isolacionismo religioso e impulsionar os
índios à integração secular -, na realidade proporcionou os meios para justificar à desafortunada
população indígena as formas mais extremas de exploração e abuso. Isso porque os índios foram
mantidos em um sistema de exploração, mesmo que dentro de uma lei que se propunha liberal. Ao
invés de tutores e protetores, constituíram-se em carrascos dos índios, mantendo-os em troncos, em
cárceres privados e castigando-os com açoites, além de muitas outras violências.
Houve um esforço excepcional dos diretores em engajar os índios na produção de bens comerciáveis.
Assim, tentou-se organizá-los nas expedições extrativistas, na caça, pesca, produção agrícola, etc.,
mas, como o diretor retinha a sexta parte do produto das lavouras e do comércio dos índios, e sendo
certo apenas o lucro da extração das drogas do sertão, o diretor empregava os indígenas quase que
exclusivamente nessa última atividade, em detrimento das lavouras de sustento das mesmas
povoações. Os resultados esperados pelo Diretório, no que se refere à integração indígena, não foram
muito animadores. As contínuas revoltas e fugas para a floresta marcaram o período, numa
demonstração da resistência dos povos indígenas contra o esforço de integrá-los à sociedade colonial
e à economia internacional à maneira pombalina.
Outro aspecto que poderíamos citar, dentre as consequências negativas do Diretório para a população
indígena, foram as constantes epidemias que mataram uma quantidade considerável de índios.
Somente entre os anos de 1779 e 1781, morreram cerca de quinze mil índios em decorrência de
bexiga, sarampo e sarampo grande. Tais epidemias originaram-se do contato entre os brancos e os
índios nas aldeias, imprescindível no projeto pombalino. Essas perdas populacionais acabaram tendo
ressonância na produção das povoações, aumentando a demanda da mão-de-obra. Tal fator reforçou
o não cumprimento das intenções do Diretório, no sentido de iniciar os índios nas escolas públicas,
fixar-lhes turnos de trabalho e assegurar-lhes horas destinadas a seus interesses particulares, fator
somado, como já visto, à má vontade dos diretores das aldeias.

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Estudos Amazônicos 7º ano
O Diretório foi extinto no ano de 1798, encerrando a legislação pombalina referente aos índios.
Independente das leis, a problemática dos direitos dos índios no Brasil sempre movimentou
mecanismos burocráticos de grande proporção.
O fato é que mesmo quando determinadas leis defendiam os índios de forma acentuada, os colonos e
alguns religiosos não as cumpriam, e o Estado costumeiramente não tomava medidas eficazes para
garantir a efetivação das leis. A burocracia construída por Portugal para tratar de assunto tão delicado
parece não só ter sucumbido ante aos interesses imediatos dos colonizadores, como até, em certos
momentos, reforçado estes últimos.

A carta régia de 1798: o corpo efetivo de índios

Com a extinção do Diretório dos Índios em 1798, a Carta Régia do mesmo ano passou a regulamentar
a política indigenista. A questão da mão de obra marca a nova lei, a qual resultou na organização de
um Corpo Efetivo de Índios que agregasse obrigatoriamente a população ativa da região. Ficou a cargo
dos juízes promover o alistamento “dos homens válidos de seu distrito”. Paralelamente a esse
recrutamento, foi permitido aos particulares irem diretamente às vilas e povoações contratar
trabalhadores. Também foi considerado legal o tratamento direto entre particulares e os índios não
aldeados, regulamentada pelas câmaras através do Termo de Educação e Instrução, pelo qual era
atribuído a esses índios o estatuto da orfandade e os vinculava à jurisdição tutelar dos juízes locais.
Assim como o Diretório, a Carta Régia de 1798 recomendava que a administração das vilas e lugares
fosse feita por índios e brancos. Tal recomendação redundou no fortalecimento da presença de juízes
e vereadores índios, reforçando sua participação nas decisões das povoações. Confiando os índios
aldeados ao controle direto das câmaras, as medidas procuravam minimizar as dificuldades relativas
à obtenção de mão-de-obra pela Coroa na vigência do Diretório, associada às fugas frequentes e às
doenças, às distribuições indevidas e aos desmandos dos diretores.

As transformações no Grão-Pará

Como governador do estado do Grão-Pará e Maranhão, Francisco Xavier de Mendonça Furtado (1701-
1769) gerou grandes transformações na região amazônica. Ele efetuou um amplo reconhecimento do
território amazônico no decurso do qual fundou a vila de S. José de Macapá, inspecionou as fortalezas
do Pará, Pauxis e Gurupá e visitou aldeias de índios situadas às margens dos rios Amazonas, Tapajós
e Xingu. Em 1752 foi investido nas funções de plenipotenciário e principal comissário para o norte
da América Portuguesa, ficando responsável pela execução das disposições do Tratado de Madri
(1750) e do Convênio Adicional Secreto (17 de janeiro de 1751).
Durante cerca de dois anos dirigiu os preparativos da Comissão portuguesa de Demarcação de Limites
do Norte que se deveria reunir com a sua congênere espanhola, chefiada por D. José de Iturriaga, nas
margens do rio Negro. A expedição lusitana partiu de Belém em 1754, sendo composta por centenas
de elementos, contando com engenheiros militares, astrônomos e tropas de infantaria. O governador
aguardou, na aldeia carmelita de Mariuá (futura Barcelos), durante dois anos, os comissários
espanhóis que deveriam subir o rio Orinoco; no entanto, os representantes da Corte de Madri haviam
sido retidos pelos jesuítas espanhóis, não tendo comparecido à conferência acordada entre os dois
governos ibéricos.
Retornou à capital do estado no final de 1756, efetuando, no ano seguinte, uma visita à capitania de
São José do Rio Negro.
A partir da segunda metade do século XVIII, Belém se beneficiou significativamente com a política de
prestígio do Governo Mendonça Furtado e de seus sucessores, que a transformaram em uma capital

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Estudos Amazônicos 7º ano
com aparência de cidade grande. Para isto, este
governo teve a importante ajuda do arquiteto
Antônio José Landi.
Antônio José Landi (1708-1790) nasceu em
Bolonha, cidade do norte da Itália, transferindo-se
para Lisboa, sob o governo de D. José I, o Marquês
de Pombal sendo o todo-poderoso primeiro-
ministro. Inscreveu-se no grupo de cartógrafos,
cientistas e astrônomos que viria à Amazônia. Em
1753 foi a Barcelos, missão carmelita às margens
do rio Negro, centro da Comissão. Depois de anos,
radicou-se em Belém, onde morreu em 1790, após
deixar, nos templos e nos prédios que projetou, seu
senso artístico neoclássico, para a admiração da
comunidade da época e da posteridade. Foi sepultado
na Igreja de Sant’Ana.
De fato, a maior obra de Landi foi a
construção do Palácio do Governo. As suas Igreja de Sant’Ana
dimensões e sua qualidade arquitetônica
deviam demonstrar a vontade do rei em favor do Estado do Grão-Pará e Maranhão, na nova capital,
que saiu de São Luís e passou para Belém do Pará (há quem acredite que Pombal almejava transferir
a sede do reino luso para Belém). O Palácio do Governo do Grão-Pará é um dos mais belos do Brasil
colônia (em 1940 foi denominado Palácio Lauro Sodré; em 1994, foi transformado no Museu do
Estado do Pará).
Landi também trabalhou muito em igrejas. As suas
principais obras são as Igrejas de N. S. do Rosário,
de São João, Sant’Ana. Além destas realizou
reformas nas Igrejas de N. S. do Carmo, além de ter
participado nas obras finais da Catedral de N. S. das
Graças.

Palácio dos Governadores - desenho frontal de


Antônio Landi.

Igrejas de N. S. do Rosário e de São João


Batista 27 | P á g i n a
Estudos Amazônicos 7º ano
Índios no Pará

Antecedentes: a Amazônia paraense antes dos europeus

Na região que abrange a atual Amazônia (que compreende 60% do território brasileiro) antes da
chegada dos europeus viviam povos ameríndios que foram denominados de “índios”, termo que tem
sua origem com a conquista de Cristóvão Colombo que imaginava ter chegado às Índias, na Ásia,
quando “descobriu” o continente que mais tarde veio a se chamar América.
Neste momento, a população indígena não utilizava a escrita. Sua história, mitos e costumes eram
transmitidos oralmente. Por esta razão, para o estudo do passado indígena do Brasil, da Amazônia e
do Pará chegou até nós através de narrativas ou relatos orais, que foram transmitidos de geração a
geração. Outra forma importante, e frequentemente utilizada, para se estudar e compreender a
história dos povos ameríndios que viviam na Amazônia é o estudo dos vestígios materiais que ficaram
daqueles índios do passado longínquo. Através de pesquisas destes materiais pode-se comprovar a
presença de grupos humanos no passado da região, e, a partir de suas análises, podemos compreender
a forma de vida dos mesmos. Os estudos e análises desses vestígios são realizados por arqueólogos.
Os vestígios de materiais mais comumente analisado na região são os fragmentos de cerâmica,
instrumentos em pedra, gravuras e ossos humanos descobertos.
O período anterior à chegada dos europeus é comumente chamado de pré-colombiano (isto é, antes da
chegada de Colombo). Os povos indígenas que vivem ainda hoje na Amazônia são descendentes dos
povos pré-colombianos. As suas línguas, por exemplo, são faladas desde antes da chegada dos
europeus. Estudos recentes mostram que os índios que vivem hoje na Amazônia e no Pará estão nesta
região a mais de 12.000 anos.
Os primeiros grupos humanos eram caçadores e coletores que estavam organizados em pequenos
grupos de famílias, morando em cavernas (ou grutas), geralmente localizadas em serras. Eles eram
predominantemente nômades, pois não moravam durante muito tempo no mesmo local. Sua
alimentação dependia do que caçavam ou coletavam: animais como a paca, a cutia, o jacaré, peixes,
etc. Coletavam raízes, sementes e frutos.
Em um segundo momento viveram na região grupos humanos horticultores de raízes, por volta de
4.000 anos atrás, que começaram a se instalar na beira de rios, nas chamadas “várzeas” da região
amazônica. Formaram aldeias, morando principalmente em grandes casas. Esses grupos buscavam
sua subsistência, água e alimentação, principalmente nos rios e igarapés. A sua alimentação era
baseada na pesca (peixes, peixe-boi e tartarugas) e na caça (roedores e mamíferos terrestres).
Também começaram a plantar milho e mandioca. A agricultura se realizava em áreas pequenas, por
isso são chamados de horticultores.

Os Tupinambá

Antes da chegada dos portugueses ao Estado do Pará, habitavam em nossa região diversos grupos
indígenas. Para a área do atual território amazônico, os indígenas estavam agrupados em três grandes
troncos: Tupi-Guarani, Aruaque e Karib.
Dentre os índios Tupi-Guarani na região, os mais conhecidos são os Tupinambá.
O primeiro grupo indígena que os portugueses entraram em contato ao chegar ao Pará foram os índios
Tupinambá, cujo “morubixaba” (“principal” ou “cacique”) se chamava Guaimiaba, apelidado pelos
portugueses de Cabelo-de-Velha.
Os Tupinambá eram extremamente belicosos, isto é, guerreiros. As guerras entre os Tupinambá
tinham o objetivo de capturar prisioneiros para a execução e a antropofagia ritual. Os mortos e feridos
durante o combate eram devorados no campo de batalha ou durante a retirada; os prisioneiros seguiam
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Estudos Amazônicos 7º ano
com seus algozes, para que as mulheres também os vissem, e pudessem ser mortos. A vingança,
assim, era socializada: era necessário que todos se vingassem. A execução ritual, contudo, poderia
demorar vários meses.

Antropofagia ou canibalismo Tupinambá. A


representação do ritual associa-se às imagens do
purgatório e a ação demoníaca, no âmbito do
imaginário religioso europeu. Gravura de Theodore
De Bry, Grandes Viagens, 1592.
Os belicosos Tupinambás. Gravura de Theodore De
Bry, Grandes Viagens, 1592.
O objetivo da antropofagia ritual era o desejo de
vingar a morte de seus parentes próximos ou os
amigos em batalhas. Também há a crença entre os Tupinambás de que comendo o corpo de um
guerreiro, adquiririam a sua força e habilidades nas batalhas. Tal ritual chocava profundamente os
europeus que o presenciaram; tal choque fora registrado em relatos de viajantes e gravuras da época.

Texto e Contexto

Em 1639, Pedro Teixeira registrou durante sua famosa expedição pelo rio Amazonas, a belicosidade
dos Tupinambá que encontrará na região:
“Havia 120 léguas deste sítio [o estreito de Óbidos] até os Tupinambá; esta nação é de gente mui
feroz carniceira e nunca quis conhecer sujeição; por isso vieram fugidos do Brasil rompendo por terra
e conquistando grande número de gentios até chegar ao grande rio e sítio onde hoje vivem. ”

(De Pedro Teixeira, 1639. In: PAPAVERO, Nelson et. al. O Novo Éden... Belém: Museu Paraense
Emilio Goeldi, 2002. 2ª ed. p. 153).

Matar publicamente um inimigo era o evento central da vida social Tupinambá. Levado ao terreiro,
pintado e decorado, preso pela mussurana (corda), o cativo esperava seu carrasco que, vestindo
seu manto de penas de íbis vermelha (ave pernalta), aproximam-se de sua presa, imitando uma ave
de rapina. Recebia a ibirapema (espécie de porrete), das mãos de um velho matador, desferia um golpe
concreto contra a nuca do cativo, rompia-lhe o crânio e lançava-o ao chão. De imediato, acudiam as
velhas com cabaças para recolher o sangue que se espalhava. Nada deveria ser perdido, tudo precisava
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Estudos Amazônicos 7º ano
ser consumido e todos deviam fazê-lo: as mães besuntavam seus seios de sangue, para que seus bebês
também pudessem provar do inimigo.

Texto e Contexto

Por volta de 1550, um alemão de nome Hans Staden foi aprisionado pelos Tupinambá do Rio de
Janeiro. Em seus relatos, registrou o canibalismo tupi, mas fazendo ressaltar seu caráter ritualístico,
social e guerreiro:

“Não o fazem por fome, mais por ódio e inveja, e quando combatem na guerra gritam um para o outro:
para vingar a morte dos meus amigos, estou aqui; tua carne será hoje, antes que o sol entre, meu
assado”.

(De Hans Staden, “Viagem ao Brasil”, 1557.).

O único que não comia era o matador, que iniciava um período de resguardo, no qual deveria se abster
de uma série de alimentos e atividades. A antropofagia ritual Tupinambá era seu mais forte elemento
social e cultural, que fazia da morte guerreira uma condição da vida social.
Paradoxalmente, porém, esses “carniceiros” foram antes carniça nas guerras de conquista dos
colonizadores, em suas bandeiras e suas missões. Em menos de dois séculos, os numerosos Tupi
foram varridos da costa brasileira – aqueles que não sucumbiram à violência, às epidemias e à fome
fugiram para o interior.

Índios da Bacia Amazônica

A bacia amazônica foi palco das culturas indígenas mais sofisticadas antes da conquista. Verificou-
se a presença de sociedades complexas na região amazônica. Começaram a se formar em um grande
número de pessoas e a ocupar extensas áreas. A expressão cultural mais importante desses grupos
indígenas da Amazônia é a cerâmica desenterrada na Ilha de Marajó na foz do Amazonas e em
Santarém, no rio Tapajós, sendo as evidências de sociedades indígenas mais avançadas existentes no
Brasil.

A Cultura Indígena Marajoara

As primeiras populações que habitaram a Ilha do


Marajó viviam de forma simples, com organização
social baseada no trabalho doméstico e familiar.
Dedicavam-se à caça, à pesca, à coleta de produtos
da floresta e à horticultura. Cerâmica, tecidos e
outros objetos eram produzidos para a família e para
eventuais trocas com outros grupos.
Os povos que viveram na Ilha do Marajó entre
1.500 anos a.C. até o século XVIII produziam
cerâmica em estilos diversos. A cerâmica marajoara
demonstrava grande valor como objeto artístico e
Zona de influência marajoara
veículo de comunicação social e cultural. Desenhos
geométricos e figuras humanas e de animais podem ser observados na decoração.

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A produção da cerâmica se concentrava no trabalho das mulheres das tribos, responsáveis por todo o
processo, da escolha da argila à modelagem, da queima das peças à pintura dos objetos.
Dentre as peças cerâmicas mais famosas estão as igaçabas, urnas destinadas à guarda de ossos dos
mortos em cerimônias funerárias. Há ainda as estatuetas, muitas utilizadas pelos pajés em rituais
como maracás, e as tangas de cerâmica, usadas por mulheres em cerimônias e ritos de passagem.

Igaçaba Marajoara. Museu do Encontro, Forte do


Presépio. Belém-PA.

A Cultura Indígena Tapajônica

O principal grupo indígena que habitava a região do rio Tanga de cerâmica. Museu Paraense Emílio
Tapajós, no Estado do Pará, chamava-se Tapajó, Goeldi. Belém-PA.
habitando a região pelo menos desde o século X até o
XVII. Sua principal aldeia estava situada na foz do rio Tapajós, local atual do bairro de Aldeia, na
cidade de Santarém.
Os relatos históricos informam que os Tapajó estavam organizados em aldeias com 20 a 30 famílias,
vivendo juntas em casas coletivas. Os grupos familiares possuíam lideres (chefes), a quem deviam
obediência.

Texto e Contexto

Rio y nacion de Tapajosos.

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Cuarenta leguas de esta estrechura desemboca por


la banda del Sur, el grande y vistoso Rio de los
Tapajosos, tomando el nombre de la nación, y
provincia que sustenta en sus orillas, que es muy
poblada de bárbaros, en buenas tierras, y de
abundantes mantenimientos.
Son estos Tapajosos, gente de brios y que les temen
muchas veces de las naciones circunvecinas, porque
usan de tal ponzoña em sus flechas, que con solo a
sacar sangre, quitan sin remedio la vida.

(ACUÑA, Cristóbal de. O “Nuevo descubrimiento del


gran rio de lãs amazonas” do Padre Cristóbal de
Acuña (1641). In: PAPAVERO, op. cit. pp. 198- Zona de influência tapajônica
199.)

A cerâmica indígena tipicamente de Santarém da cultura tapajônica apresentam regularmente a


representação de figuras humanas e animais. Os objetos mais significativos da cerâmica de
Santarém são os vasos de cariátides, os vasos de gargalo, estatuetas e cachimbos.

Vaso de Cariátide. Museu Paraense Emílio Goeldi. Vaso de Gargalo. Museu Paraense Emílio Goeldi.
Belém-PA. Belém-PA.

Sobre os Muiraquitãs:

Redes, Orucu, e pedras verdes que os Índios chamam Buraquites, as quais os estrangeiros do norte
estimam muito; e comte se diz que estas pedras se lavram neste rio dos Tapajos de hû barro verde
que se cria debaixo da agoa, e debaixo desta fazem contas redondas e compridas, vazos para beber,
assentos, pássaros, rãns, e outras figuras: e tirando o feito debaixo dagoa à o ar, se endurece o tal
barro de tal maneira q’ fica convertido em muy duríssima pedra verde, e he melhor contrato destes
Índios, e delles muy estimado.

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Sobre a Cerâmica tapajônica:

Tem estes Índios [do Trombetas] e os Tapajos finíssimo barro, de que fazem muita e boa louça de
toda a sorte, que entre os Portugueses he de estima, e a levam a outras Províncias por contrato.

(In: PAPAVERO, op. cit., pp. 255-256.)

Os vasos de cariátides apresentam curiosamente pequenas figuras modeladas que sustentam uma
vasilha sobre suas cabeças. Esses vasos e os de gargalo apresentam em sua estrutura decorações com
figuras humanas ou animais, como urubus, antas, macacos e pequenos batráquios. As estatuetas, em
sua maioria, representam formas humanas, sobretudo femininas.

Além de sua sofisticada cerâmica, os índios Tapajó


tem como maior expressão de sua criatividade os
Muiraquitãs, que são considerados os elementos de
cultura material indígena mais sofisticado do Brasil.

Estatueta de cerâmica representando uma figura


humana. Museu Paraense Emílio Goeldi. Belém-PA
Muiraquitã. Museu Paraense Emílio Goeldi. Belém-
PA

Os Muiraquitãs, também chamados de “Pedras das Amazonas”, eram adornos produzidos de pedras
verdes (jadeíta, amazonita) em forma de batráquio, possivelmente utilizados como protetores contra
doenças e mordedura de animais peçonhentos, assim como elemento para o aumento da fertilidade
feminina e como figura mitológica astral. Na Amazônia, os muiraquitãs foram encontrados com maior
frequência nos vales dos rios Tapajós, Trombetas e Nhamundá.

Texto Complementar

Os viajantes se encantavam, nas diversas povoações por onde passavam às margens do Amazonas,
com a complicada cerâmica feita pelos índios, uma vez que, tendo em conta aquelas pessoas por
bárbaros, era surpreendente que tivesse tanta habilidade, gosto e destreza para tão elaborada arte,
que era, além de tudo, comercializada.
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Os vestígios arqueológicos de ocupação humana em Marajó aparecem em uma região que tem como
centro o Lago Arari, este cobrindo uma área de cerca de 400 km².
Os sítios da Fase Marajoara se encontram sobre colinas ou aterros artificiais, conhecidos localmente
como “tesos” (em inglês, mound) *, construídos paralelamente ao longo de rios e lagos.
Percebe-se que nos níveis inferiores há o enterramento secundário, com ossos muitas vezes pintados
em vermelho, podendo estar quebrados ou apenas desarticulados, ou ainda com o morto em posição
sentada, com a presença de uma tanga de cerâmica decorada.
Foram encontrados diversos objetos e vasilhas cerâmicas associadas aos enterramentos, como pratos,
vasos menores, cachimbos, fusos, estatuetas, miniaturas, instrumentos musicais, “tinteiros”, além de
adornos e das conhecidas pedras verdes (muiraquitãs).
É bastante curiosa a ocorrência de tangas cerâmicas associadas aos sepultamentos. Elas são
encontradas frequentemente no fundo da urna, sob os ossos; em casos de enterramentos sem urnas
elas também podem aparecer associadas ao esqueleto. As tangas parecem estar associadas a
esqueletos femininos, mas muitos dos esqueletos não tiveram o sexo identificado.
A Fase Marajoara apresenta um quadro em que há um grande contingente populacional, congregado
em alguma forma de organização sócio-política em um extenso território, mantendo-se assim por
centenas de anos. A construção de monumentais aterros, vários metros mais elevados do que o nível
das cheias exigiam, evidencia, por um lado, a necessidade de defesa e fortificação e por outro o fato
de que milhares de trabalhadores estiveram envolvidos em sua construção. Os padrões de
enterramento significando diferenciação social e a cerâmica policrômica indicando a existência de
uma elite de artesãos especializados, são características que, somadas às acima descritas
constituíram-se nas evidências necessárias para que se inferisse a existência de um modo de
organização cacical para a fase.

Os índios da Amazônia nos dias de hoje

Três milhões parece um cálculo aceitável para o total de índios que viviam na Amazônia pré-
colombiana e grande parte dos índios brasileiros vive hoje na Amazônia. De acordo com o último Censo
do IBGE, vivem na Amazônia cerca de 460 mil indígenas, sendo que a maioria vive na zona rural
correspondendo a 60% deste montante. Contam-se 225 sociedades indígenas no Brasil, 162 delas
na Amazônia. A população indígena da Amazônia fala 150 línguas diferentes, divididas em 12
famílias linguísticas (o que não significa inteligibilidade mútua entre falantes de línguas de uma
mesma família). É costume dizer que a identidade brasileira é linguística, isto é, que a língua
portuguesa une o País. No entanto, até o século XVIII, o tupi-guarani sobrepujava o português dos
colonizadores, principalmente com referência às coisas do dia-a-dia.

Vida e cultura

Embora muitas tribos de índios da Amazônia possuam contato com a cultura externa, elas ainda
mantêm os principais aspectos de vida dos seus antepassados. Vivem da caça, pesca, extrativismo
vegetal e agricultura.
Uma das principais figuras nas tribos é o pajé. Espécie de curandeiro, ele é também o sábio que
conhece a cultura do povo e a transmite oralmente para os mais novos. É ele quem domina o contato
com o mundo espiritual e faz os rituais religiosos, principalmente de cura.
A medicina popular vem da sabedoria e cultura indígena. Os índios conviveram há milênios nesse
ecossistema sem a necessidade de destruí-lo, pois eles se identificavam com a natureza de tal forma
que não precisavam desmatar ou causar maiores estragos à natureza. Eles utilizavam os recursos
naturais curando as doenças com as plantas medicinais.
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Assim, a junção do homem branco com o índio (miscigenação) foi o benefício na área cultural.
As crenças religiosas desses povos ocorriam através do culto aos espíritos ou o animismo (é a visão
de mundo em que entidades não humanas - animais, plantas, objetos inanimados ou fenômenos -
possuem uma essência espiritual), e os xamãs funcionavam como uma espécie de ligação entre o nosso
mundo e o mundo espiritual. Danças e ritos de puberdade eram essenciais para dividirem clãs
totêmicos, ou seja, grupos considerados descendentes de ancestrais míticos comuns e se
diferenciavam dos outros em razão de alguns rituais.

Línguas

Os povos indígenas da Amazônia podem ser divididos em seis troncos linguísticos: Tupi, Aruaque,
Tukano, Jê, Karib e Pano.

Problemas enfrentados atualmente

Embora grande parte dos povos indígenas da Amazônia tenha suas terras demarcadas e protegidas
por lei, eles ainda sofrem com a presença de garimpos na região, construção de hidrelétricas e rodovias
e o avanço da agropecuária de grande porte.
Essas Terras, de acordo com a Constituição de 1988, são de uso exclusivo desses povos e protegidas
pelo Estado brasileiro e na Amazônia são maiores que aquelas existentes em outras regiões do país.
Isso acontece porque os europeus ocuparam por último as áreas no interior da Amazônia Legal,
beneficiando os índios que fugiam da escravidão das primeiras áreas ocupadas (próximas ao litoral).

Tribos isoladas da Amazônia

Algumas tribos indígenas que vivem na Amazônia não possuem qualquer contato com outras tribos
ou culturas. Estes povos vivem da mesma forma que seus antepassados de séculos atrás. Como não
possuem contatos externos, não sabem o que há e o que se passa no mundo. Vivem da caça, pesca,
coleta de vegetais e agricultura de subsistência.

Principais grupos indígenas que vivem na Amazônia atualmente

Acre - Jarawara - Tupari


- Korubo
- Amawáka - Wanana Roraima
- Arara
- Deni Pará - Macuxi
- Nawa - Yanomami
- Anambé - Waiwai
Amapá - Jaruna - Ingaricô
- Kayapó
- Karipuna - Munduruku Tocantins
- Palikur
- Wayampi Rondônia - Apinaye
- Guarani
Amazonas - Arara - Karaja
- Aruá - Kraho
- Kambeba - Nambikwara - Xerente
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