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ESCOLA DA MAGISTRATURA DO

ESTADO DO RIO DE JANEIRO

CADERNO
DIREITO ADMINISTRATIVO

Aluna: Priscilla C. Ribeiro Dantas


Turma: CPIII A - 2 Semestre de 2018
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

Aula 1 – Prof. Luana Aita


4/10/18

EMENTA:  Limitações à liberdade e à propriedade.


 Função social da propriedade.
 Distinções entre as limitações e restrições à propriedade.
 Poder de Polícia.
 Restrições Administrativas.
 Modalidades de intervenção do Estado na propriedade:
 Fundamentos;
 Competência; e
 Limites.
 Domínio público e domínio eminente.

Abordaremos nesse módulo de Direito Administrativo as principais formas de


intervenção do Estado na propriedade. Logo, iniciariaremos nosso estudo com uma
introdução acerca do direito de propriedade.

 LIMITAÇÕES À LIBERDADE E À PROPRIEDADE:

Em regra o Estado não intervirá na propriedade privada. A intervenção acontece em


caráter excepcional. Por ser exceção deve ser sempre bem fundamentada.

Em que consiste o direito de propriedade?

O DIREITO DE PROPRIEDADE consiste no direito de usar, gozar, usufruir e reaver. Está


nos incisos XXII e XXIII do art. 5º da CF. É exercido em caráter exclusivo (usa sozinho
ou com quem deseja), absoluto (é a liberdade sobre aquele bem) e perpétuo.

Na intervenção da propriedade, o Estado vai interferir em um dos caráteres da


propriedade, quais sejam:

(i) Faculdade de usar: utilizar a coisa, atendidos os limites dispostos na


Constituição Federal e no próprio CC/2002;

(ii) Faculdade de gozar (ou fruição): retirar os frutos da coisa, que podem ser
naturais, industriais ou civis (rendimentos);

(iii) Faculdade de dispor: dispor da coisa, seja por atos inter vivos (ex.: compra e
venda, doação) ou causa mortis (ex.: testamento);

(iv) Direito de reivindicar: reivindicar a coisa de quem injustamente a detenha, por


meio de ação de natureza petitória (mais comum é a ação reivindicatória), que
é imprescritível (STJ).

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Obs.: Na ação petitória é possível discutir a propriedade; nas ações possessórias não é
possível discutir a propriedade.

A concomitância de todos os atributos da propriedade caracterizará a propriedade


plena; a titularidade de apenas algum deles poderá caracterizar a posse.

Quais as principais características do direito de propriedade?

O direito de propriedade é direito:

 Absoluto: o titular do direito da propriedade pode utilizar a coisa como bem


entender ou mesmo não utilizá-la;

 Exclusivo: a coisa pertence a um determinado titular, com exclusividade. O


caráter de exclusividade não é retirado pelos institutos do condomínio e da
copropriedade. Somente o titular do direito de propriedade (ou coproprietário
ou condôminos) é que poderá exercer as faculdades de usar, gozar e dispor,
bem como o direito de reivindicar.

 Perpétuo: existe independentemente do seu exercício. O direito de


propriedade somente se interrompe com a ocorrência de um fato novo.

 Elástico: para Orlando Gomes, a propriedade tem variados graus de


elasticidade, na medida em que pode sofrer redução nos direitos reais de gozo
ou fruição e nos direitos reais de garantia;

 Complexo: é constituída por quatro atributos, que devem estar presentes para
a caracterização da propriedade plena; e

 Fundamental: previsto como direito individual fundamental (Art. 5º, XXII e


XXIII, da Constituição Federal), que deve ser observado tanto pelo Estado
(eficácia vertical) como pelos particulares (eficácia horizontal).

Quais as garantias do direito de propriedade?

Entre as garantias do direito de propriedade, destacam-se:

(i) Garantia de conservação: ninguém pode ser privado de seus bens fora das
hipóteses previstas na Constituição.

(ii) Garantia de compensação: caso privado de seus bens, o proprietário tem o


direito de receber a devida indenização equivalente aos prejuízos sofridos.

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O conceito constitucional de propriedade transcende à concepção privatista estrita,


abarcando outros valores de índole patrimonial, como as pretensões salariais e as
participações societárias. O conceito constitucional de propriedade contempla as
hipotecas, penhores, depósitos bancários, pretensões salariais, ações, participações
societárias, direito de patentes e marcas. Assim, embora integre o conceito de
propriedade a definição constante da legislação civil, é certo que a garantia
constitucional da propriedade abrange não só os bens móveis ou imóveis, mas também
outros valores patrimoniais.

O direito de propriedade abrange tanto os bens corpóreos como incorpóreos


(propriedade intelectual). A propriedade intelectual abrange os “direitos de autor” e
os direitos relativos à “propriedade industrial”, como a proteção de marcas e patentes.

Os direitos autorais têm sua proteção regulamentada na Lei nº 9.610/98, que no artigo
7º define obras intelectuais protegidas como “as criações de espírito, expressas por
qualquer meio ou fixadas em qualquer suporte, tangível ou intangível, conhecido ou
que se invente no futuro” (exs: textos de obras literárias, composições musicais, obras
audiovisuais, programas de computador, etc.).

A propriedade industrial é regulamentada na Lei nº 9.279/96, que no seu artigo 2º


assegura a “proteção dos direitos relativos à propriedade industrial mediante a
concessão de patentes de invenção e concessão de registro de marca e repressão à
concorrência desleal”.

A Constituição enumera ainda como direito individual o direito à herança (artigo 5º,
XXX), através do qual o proprietário tem a garantia de que o patrimônio que acumulou
durante toda a vida poderá ser transmitido conforme sua vontade, não permitindo a
apropriação do Estado.

A intervenção do Estado na propriedade privada é autorizada pela CF?

A CF/88, em diversos dispositivos explícitos e normas implícitas, determina ou autoriza


variadas formas de intervenção do Estado na propriedade privada. Trata-se de
decorrência da asserção categórica de que a propriedade deve cumprir sua FUNÇÃO
SOCIAL e corolário do postulado mais genérico da SUPREMACIA DO INTERESSE PÚBLICO
sobre o dos particulares.

A CF/88 assegura o direito individual à propriedade, mas desde já, expressamente,


condiciona o exercício desse direito ao atendimento da FUNÇÃO SOCIAL da propriedade
(art. 5, XXIII da CF). E, nos dois incisos seguintes, prevê a DESAPROPRIAÇÃO por
necessidade ou utilidade publica, ou por interesse social, observado o procedimento
que a lei estabeleça e a REQUISIÇÃO de propriedade particular por autoridade
administrativa, no caso de iminente perigo público (inciso xxv).

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Ainda, como exemplo de norma constitucional explicitamente alusiva à intervenção do


Estado na propriedade, podemos citar o art. 216, par. 1 da CF, que impõe ao poder
público a PROTEÇÃO AO PATRIMÔNIO CULTURAL BRASILEIRO, por meio de inventários,
registros, vigilância, tombamento e desapropriação, e de outras formas de
acautelamento e preservação.

Como visto acima, o Estado dispoe de uma série de instrumentos – todos eles lastreados
no seu poder de império – passíveis de utilização para cumprimento do seu dever
constitucional de assegurar que a propriedade cumpra a sua função social.

Em geral esses instrumentos implicam limitações ou condicionamentos ao exercício dos


poderes inerentes ao domínio (uso, gozo, fruição, disposição e reivindicação),
hipóteses a que a doutrina se refere como “INTERVENÇÃO RESTRITIVA”.

Especificamente em relação à desapropriação, não se tem apenas uma limitação, e


sim a perda da propriedade, que é transferida, de regra, para o domínio público. A
desapropriação, por esse motivo, é classificada como “INTERVENÇÃO SUPRESSIVA”.

 FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE:

Para José Afonso da Silva, a função social é elemento que compõe o direito de
propriedade (e não mera decorrência de limitações impostas pelo poder de polícia do
Estado), fazendo parte da sua estrutura, de modo que não existe direito de
propriedade sem atendimento da sua função social.

Para o referido autor, o direito de propriedade é instituto de direito público, sendo


que apenas as relações civis decorrentes do direito de propriedade é que são regidas
pela legislação civil.

A função social da propriedade faz com que a propriedade envolva a situação jurídica
de mão dupla, ou seja, o proprietário tem direitos e deveres em relação ao não
proprietário, que da mesma forma, os tem em relação ao proprietário. Não há
definição apriorística da função social da propriedade, ou seja, trata-se de um conceito
indeterminado.

Desde a CF/46, fala-se na função social da propriedade (ordem econômica), mas,


somente na CF/88 (a primeira na história brasileira a fazer isso) o direito de
propriedade foi tratado no artigo 5º, que garante os direitos fundamentais da pessoa
humana.

A função social da propriedade está prevista na Constituição Federal nos seguintes


termos:

Art. 5º XXII da CF: é garantido o direito de propriedade;


XXIII - a propriedade atenderá a sua função social;

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Art. 170 da CF: “A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano


e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os
ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:
II - propriedade privada;
III - função social da propriedade;

A propriedade continua a dar as mesmas prerrogativas, que sempre deu, mas o


conteúdo e o exercício foram modificados desde a CF/88 pela ideia de funcionalização
do direito de propriedade, ou seja, é a função social da propriedade que dá o tom de
modificação do direito de propriedade.

Vige uma noção moderna de verificação do direito de propriedade, já que deve atender
a função social, ou seja, o dono não faz o que quer com a coisa, deve respeitar o
interesse da coletividade.

A propriedade que descumpre a sua função social não tem a mesma proteção da CF.

Na mesma linha, mas acrescentando ainda a função socioambiental da propriedade,


em atenção aos preceitos do art. 225 da Constituição Federal, o § 1º do art. 1.228 do
CC/2002 dispõe que:

Art. 1228 do CC: “O direito de propriedade deve ser exercido em consonância com
as suas finalidades econômicas e sociais e de modo que sejam preservados, de
conformidade com o estabelecido em lei especial, a flora, a fauna, as belezas
naturais, o equilíbrio ecológico e o patrimônio histórico e artístico, bem como
evitada a poluição do ar e das águas”.

No caso de PROPRIEDADE RURAL, dispõe o art. 186 da Constituição Federal que a


FUNÇÃO SOCIAL é cumprida quando a propriedade rural atende, simultaneamente,
segundo critérios e graus de exigência estabelecidos em lei, aos seguintes requisitos:

Art. 186 da CF: [...]


I - aproveitamento racional e adequado;
II - utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio
ambiente;
III - observância das disposições que regulam as relações de trabalho;
IV - exploração que favoreça o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores.

Nesse sentido, a CF estabelece condições mínimas para que se considere atendida a


função social da propriedade rural (art. 186) , autorizando a União a desapropriar por
interesse social, para fins de reforma agrária, o imóvel rural que não esteja cumprindo
sua função social, com indenização em títulos da dívida agrária.

De outro lado, a PROPRIEDADE URBANA cumpre a sua FUNÇÃO SOCIAL quando atende
às exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor (art.

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182, § 2º, CF), sendo que, de acordo com o § 1º do art. 182 da CF, o plano diretor é
obrigatório para cidades com mais de 20 mil habitantes.

Verifica-se que o legislador constituinte deixou expresso que o atendimento da função


social da propriedade urbana está condicionado à observância das regras estabelecidas
no plano diretor do município. Se não for atendida a função social da propriedade
urbana, conforme o plano diretor, a própria CF já confere ao município poderes de
intervenção na propriedade do particular. Caso não sejam observadas as exigências do
município, tem ele o poder de impor o parcelamento ou edificação compulsória, o IPTU
progressivo ou a desapropriação com indenização em títulos públicos (art. 182, par. 4
da CF).

Para José Afonso da Silva, o direito de propriedade somente é garantido pela


Constituição Federal na medida em que atende a sua função social.

Marcelo Novelino, porém, entende que o que varia é o grau de proteção conferido ao
direito de propriedade, sendo que mesmo em relação àquelas que não atendam a sua
função social, além do da possibilidade de utilização das ações possessórias, é vedada
a invasão por movimentos sociais organizados, mesmo sob o pretexto de promover a
reforma agrária, bem como a supressão legislativa da propriedade privada e, ainda, a
retirada arbitrária do direito de propriedade sem a observância do devido processo
legal.

A função social da propriedade restringe-lhe o caráter absoluto, vez que o proprietário


não poderá utilizá-la da forma como bem entender, mas de acordo com a
normatividade prevista para o atendimento da sua função social.

Todas essas disposições permitem afirmar que o direito de propriedade está delineado
em nossa Constituição como uma típica NORMA CONSTITUCIONAL DE EFICÁCIA
CONTIDA, pois pode ser restringida por meio de certos conceitos de larga difusão no
direito público: necessidade e utilidade pública, interesse social, perigo público
iminente.

Não existe um conceito constitucional fixo, estático de propriedade, afigurando-se,


fundamentalmente, legítimas não só as novas definições de conteúdo como a fixação
de limites destinados a garantir a sua função social. Deve-se reconhecer que a garantia
constitucional da propriedade está submetida a um intenso processo de relativização,
sendo interpretada de acordo com os parâmetros fixados pela legislação ordinária. Tais
limitações devem preservar o direito de propriedade enquanto garantia constitucional,
observando o PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE, que exige que as restrições sejam
adequadas, necessárias e proporcionais.

Abaixo jurisprudência sobre a função social da propriedade:

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JULGADO FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE


ADI 2213  O direito de propriedade não se reveste de caráter absoluto, eis que,
sobre ele, pesa grave hipoteca social, a significar que, descumprida a
função social que lhe é inerente (CF, art. 5º, XXIII), legitimar-se-á a
intervenção estatal na esfera dominial privada, observados, contudo,
para esse efeito, os limites, as formas e os procedimentos fixados na
própria Constituição da República.
 O acesso à terra, a solução dos conflitos sociais, o aproveitamento
racional e adequado do imóvel rural, a utilização apropriada dos
recursos naturais disponíveis e a preservação do meio ambiente
constituem elementos de realização da função social da propriedade.

RE 192737  O STF firmou o entendimento – a partir do julgamento do RE 153.771,


Pleno, 20-11-1996, Moreira Alves – de que a única hipótese na qual a
Constituição admite a progressividade das alíquotas do IPTU é a do art.
182, § 4º, II, destinada a assegurar o cumprimento da função social da
propriedade urbana.

RE 211385  A garantia da função social da propriedade (art. 5º, XXIII, da


Constituição) não afeta as normas de composição de conflito de
vizinhança insertas no Código Civil (art. 573 e seus parágrafos), para
impor, gratuitamente, ao proprietário a ingerência de outro particular
em seu poder de uso, pela circunstância de exercer este último
atividade reconhecida como de utilidade pública.

RE 178.836  O direito de edificar é relativo, dado que condicionado à função social


da propriedade.

MS 22.164  A própria Constituição da República, ao impor ao Poder Público dever


de fazer respeitar a integridade do patrimônio ambiental, não o inibe,
quando necessária a intervenção estatal na esfera dominial privada, de
promover a desapropriação de imóveis rurais para fins de reforma
agrária, especialmente porque um dos instrumentos de realização da
função social da propriedade consiste, precisamente, na submissão do
domínio à necessidade de o seu titular utilizar adequadamente os
recursos naturais disponíveis e de fazer preservar o equilíbrio do meio
ambiente.

 DISTINÇÕES ENTRE LIMITAÇÕES E RESTRIÇÕES À PROPRIEDADE:

A intervenção do Estado na propriedade privada pode se dar, sempre observado os


limites constitucionais, com várias intensidades: podem consistir em:

(i) LIMITAÇÕES ADMINISTRATIVAS: é a conformação da propriedade a sua


função social, ou seja, o Estado conforma a liberdade ou propriedade à

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função social, ao bem estar da coletividade, dando concreção ao respectivo


direito.

É uma determinação geral, pela qual o Poder Público impõe a proprietários


indeterminados obrigações de fazer ou de não fazer, com o fim de garantir
que a propriedade atenda a sua função social. Em geral, as limitações
administrativas não dão ensejo à indenização.

Exemplo: Proibição de desmatamento de 20% de área florestada (art. 16,


“a”, da Lei 4771/65) é limitação administrativa, pois há uma limitação no
uso da propriedade, cujo objetivo maior é conformá-la a sua função social.
Aqui não dá ensejo à indenização ao proprietário.

Note, contudo, que uma proibição de desmatamento em toda a


propriedade, é forma de desapropriação indireta, já que não é de se esperar
que alguém adquira terras para não aproveitá-la economicamente,
devendo, portanto, o proprietário ser indenizado.

(ii) RESTRIÇÕES ADMINISTRATIVAS: a propriedade permanece privada, mas o


próprio conteúdo do direito de propriedade fica coarctado em alguns dos
seus aspectos.

Há afetação do conteúdo do direito. O conteúdo do direito é atingido pela


restrição em algum dos seus aspectos essenciais. A restrição vai se referir,
portanto, ao exercício em si das faculdades inerentes ao direito de
propriedade.

As restrições administrativas podem dar ensejo a indenização, mas no limite


do dano.

Exemplo: servidões e ocupações temporárias.

(iii) ABLAÇÕES ADMINISTRATIVAS: ocorre mediante a extinção da liberdade ou


aquisição compulsória do bem pelo Estado, o que se dá na maioria das vezes
através da sua desapropriação, além de outras figuras como a requisição
administrativa.

Caracteriza-se pelo o sacrifício do direito, a supressão do direito. A regra


no âmbito da ablação é a indenização.

Vê-se, portanto, que a função social da propriedade pode levar à sua supressão,
restrição ou mera limitação. Na escolha de cada um desses instrumentos o Estado deve
observar o PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE, só adotando um instrumento mais
interventivo se os demais não forem adequados para as finalidades visadas.

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As limitações administrativas, enquanto tais, devem apenas conformar o direito de


propriedade, nunca suprimi-lo, total ou parcialmente. Se isto ocorrer, tomando-se em
conta a destinação econômica que o bem normalmente seguiria, estaremos
materialmente diante de restrição administrativa, em geral servidão, ou de
desapropriação indireta, ambas indenizáveis. As restrições administrativas chegam a
afetar as faculdades inerentes ao direito de propriedade, enquanto as limitações
administrativas em princípio apenas dão o contorno do próprio direito de propriedade
com a função social a ele constitucionalmente inerente.

EM SUMA: as limitações administrativas constituem o próprio perfil do direito de


propriedade, definindo-o; as restrições e ablações retiram parte ou totalidade do
próprio direito.

 PODER DE POLÍCIA:

Há uma grande divergência doutrinária a respeito das relações entre as limitações


administrativas e o poder de polícia, divergência decorrente das críticas e revisões que
têm sido feitas ao poder de polícia.

As críticas ao poder de polícia vêm de várias frentes. Parte da doutrina entende que o
próprio conceito de poder de polícia deve ser abolido, uma vez que a sua origem
absolutista pressupõe um poder geral e ilimitado da Administração Pública. Já Lucia
Valle Figueiredo prefere integrá-la, substituindo-a ao conceito de limitações
administrativas, considerando-as equivalentes.

Alexandre Santos de Aragão sustenta que, se o poder de polícia, só pudesse ter a


conotação que possuia no Estado absolutista, deveria certamente ser abolido. Mas a
necessidade que ele expressa, de adequação das liberdades individuais ao bem-estar
da coletividade, sempre estará presente em qualquer grupo social. Sendo assim, este
poder continua a existir, sujeito, porém, aos ditames do Estado Democrático de
Direito.

Os pontos de contato entre as limitações administrativas e o poder de polícia são


imensos, representando na verdade aspectos do mesmo fenômeno – de constrição
estatal da liberdade e da propriedade – razão pela qual poderiam perfeitamente ser
equiparados.

Uma crítica mais específica que se faz à nomenclatura do “Poder de Polícia


Administrativa” é que ela denotaria um atributo da Administração Pública, quando, na
verdade, ele é oriundo da lei e executado, muitas vezes discricionariamente, pela
Administração Pública.

Obviamente, o Poder de Polícia não há de servir para afastar a necessidade de esteio


legal das limitações a serem impostas aos particulares, mas, por outro lado, trata-se
apenas de uma questão de nomenclatura, devendo-se entender a polícia administrativa

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como um poder conferido pela lei à Administração Pública para exercê-lo nos exatos
limites legais para atender aos objetivos legais.

Assim, podemos concluir que as limitações administrativas e o poder de polícia


representam aspectos diferentes do mesmo e idêntico fenômeno da ponderação de
direitos e valores consitucionais aplicada ao Poder Executivo: as limitações
administrativas referem-se aos seus aspectos mais gerais e constitucionais e o poder
de polícia aos seus aspectos mais operacionais e administrativos.

Alguns autores afirmam que a intervenção da propriedade tem como fundamento o


poder de polícia, que significa a compatibilização de interesses em prol do bem-estar
social. Para a maioria dos autores o poder de polícia é fundamento para todas as
modalidades, salvo a desapropriação. Hely Lopes Meireles = o poder de polícia é
fundamento apenas para a limitação administrativa.

 MODALIDADES DE INTERVENÇÃO DO ESTADO NA PROPRIEDADE:

A intervenção do Estado na propriedade pode se dar de duas formas:

1. INTERVENÇÃO RESTRITIVA: é forma de intervenção do Estado que implica em


limitações ou condicionamentos ao exercício dos poderes inerentes ao domínio
(uso, gozo, fruição, disposição e reivindicação).

São espécies de intervenção restritiva do Estado na propriedade:

(i) Requisição Administrativa;


(ii) Ocupação Temporária;
(iii) Servidão Administrativa;
(iv) Tombamento; e
(v) Limitações Administrativas.

2. INTERVENÇÃO SUPRESSIVA: é forma de intervenção em que o Estado retira


coercitivamente a propriedade do terceiro, transferindo-a para si, tal como
ocorre nas diferentes modalidades de desapropriação.

Vejamos, em breve síntese, as principais características de cada uma dessas formas de


intervenção do Estado na propriedade:

 MODALIDADES DE INTERVENÇÃO RESTRITIVA:

(i) REQUISIÇÃO ADMINISTRATIVA:

A requisição administrativa é modalidade de intervenção por meio da qual o Estado,


em situações de perigo público iminente, utiliza bens móveis, imóveis ou serviços
particulares, com indenização ulterior, se houver dano.

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Em princípio, a requisição é uma modalidade de intervenção restritiva, que visa sanar


a situação de perigo público.

Exemplo:
Guarda que pega o carro do terceiro para ir atrás de um ladrão e salvar a criança.

Contudo, se o bem pereceu (carro bateu), então, nesse caso, o Estado terá que
indenizar pois ocorreu o sacrifício do direito (supressão do direito), passando-se a ter
uma hipótese de intervenção supressiva.

Com a ocorrência da requisição administrativa o particular perde a exclusividade do


uso do bem.

A requisição administrativa tem amparo no art. 5, incisos “xxii” ao “xxv” da CF.

Art. 5 da CF: “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,
garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a
inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à
propriedade, nos termos seguintes:
xxii – é garantido o direito de propriedade.
xxiii- a propriedade atenderá a sua função social.
xxiv - a lei estabelecerá o procedimento para desapropriação por necessidade ou
utilidade pública, ou por interesse social, mediante justa e prévia indenização em
dinheiro, ressalvados os casos previstos nesta Constituição;
xxv - no caso de iminente perigo público, a autoridade competente poderá usar
de propriedade particular, assegurada ao proprietário indenização ulterior, se
houver dano.

(ii) OCUPAÇÃO TEMPORÁRIA:

A ocupação temporária é uma modalidade de intervenção em que o Poder Público usa


transitoriamente imóveis privados como meio de apoio a execução de obras e serviços
públicos.

Exemplo:
Quando a administração precisa fazer uma obra pública e acaba ocupando o imóvel
vizinho para servir de apoio como “canteiro de obras” para colocar as máquinas que
serão utilizadas na construção.

A ocupação temporária está prevista no art. 36 do DL 3365/41.

Art. 36 do DL 3365/41: “É permitida a ocupação temporária, que será indenizada,


afinal, por ação própria, de terrenos não edificados, vizinhos às obras e
necessários à sua realização. O expropriante prestará caução, quando exigida.”

Aqui também o particular perde a exclusividade do uso do bem.

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(iii) SERVIDÃO ADMINISTRATIVA:

A servidão administrativa é modalidade de intervenção do Estado em que o direito real


público autoriza o Poder Público a usar a propriedade imóvel para permitir a execução
de obras e serviços de interesse coletivo.

São três, portanto, as características fundamentais do instituto da servidão


administrativa:

 Ônus real;
 Bem particular (imóvel alheio): nada impede, contudo, que a União institua
servidões em bens estaduais ou municipais; e
 Utilização Pública.

Exemplos: instalação de rede elétrica e implantação de gasodutos em áreas privadas


para a execução de serviços públicos.

A servidão administrativa está prevista no art. 40 do DL 3365/41.

Art. 40 do DL 3365/41: “O expropriante poderá constituir servidões, mediante


indenização na forma desta lei.”

Aqui também o particular perde a exclusividade do uso do bem.

Segundo a doutrina, a servidão administrativa incide sobre bens privados, mas não há
impedimento que em situações excepcionais possa incidir sobre bens públicos.

A servidão NÃO gera em regra direito à indenização, pois há um sacrifício de toda a


coletividade de proprietários que se encontram numa mesma situação, salvo se houver
um prejuízo maior. Quando a servidão administrativa recair sobre um imóvel
específico, em decorrência de contrato ou decisão judicial, a regra será a indenização.

(iv) TOMBAMENTO:

O tombamento é modalidade de intervenção do Estado na propriedade privada por


meio da qual o Poder Público visa proteger o patrimônio cultural brasileiro.

No tombamento, o Estado intrvém na propriedade privada para proteger a memória


nacional, protegendo bens de ordem histórica, artística, arquiológica, cultural e etc.

O tombamento pode recair também sobre bens móveis.

A CF trata do tombamento no art. 216, § 1. A matéria também está prevista no DL


25/37.

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Art. 216 da CF: “Constituem patrimônio cultural brasileiro os bens de natureza


material e imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de
referência à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadores da
sociedade brasileira, nos quais se incluem:
§ 1 - O Poder Público, com a colaboração da comunidade, promoverá e protegerá
o patrimônio cultural brasileiro, por meio de inventários, registros, vigilância,
tombamento e desapropriação, e de outras formas de acautelamento e
preservação.”

(v) LIMITAÇÕES ADMINISTRATIVAS:

As limitações administrativas são determinações de caráter geral, por meio das quais
o Poder Público impõe a proprietários, em regra indeterminados, obrigações positivas
(de fazer), negativas (de não fazer) ou permissivas, para o fim de condicionar a
propriedade ao atendimento de sua função social.

Tem-se uma norma geral que atinge em regra pessoas indeterminadas. Enquanto que
nas demais modalidades de intervenção restritiva, atinge-se pessoas determinadas.

Passemos à analise da modalidade de intervenção supressiva.

 MODALIDADE DE INTERVENÇÃO SUPRESSIVA:

(i) DESAPROPRIAÇÃO:

A desapropriação é procedimento de direito público mediante o qual o Estado, ou quem


a lei autorize, retira coercitivamente a propriedade de terceiro e a transfere para si –
ou, excepcionalmente, para outras entidades – fundado em razões de utilidade pública,
de necessidade pública, ou de interesse social, em regra, com o pagamento de justa e
prévia indenização.

A desapropriação está prevista no art. 5, xxiv da CF e também no DL 3365/41.

Art. 5 da CF: “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,
garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a
inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à
propriedade, nos termos seguintes:
XXIV - a lei estabelecerá o procedimento para desapropriação por necessidade ou
utilidade pública, ou por interesse social, mediante justa e prévia indenização em
dinheiro, ressalvados os casos previstos nesta Constituição”

Aqui há perda da característica de perpetuidade da propriedade.

Quais modalidades de intervenção do Estado na propriedade são temporárias?

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São modalidades de intervenção temporária (transitórias):

(i) Requisição administrativa; e


(ii) Ocupação temporária.

Sao modalidades de intervenção definitivas:

(i) Servidão administrativa;


(ii) Tombamento; e
(iii) Limitações administrativas.

Pode a lei estabelecer outras modalides de intervenção do Estado na propriedade?

SIM!!! A lei pode estabelecer outras modalidades de intervenção do Estado na


propriedade. Isso pode ser visto, por exemplo, nos instrumentos previstos no Estatuto
da Cidade.

 FUNDAMENTOS DA INTERVENÇÃO DO ESTADO NA PROPRIEDADE:

Entre os fundamentos utilizados pela doutrina para justificar as formas de intervenção


do Estado na propriedade, destacam-se:

(i) Domínio Eminente;


(ii) Adequação a função social da propriedade; e
(iii) Supremacia do interesse público.

Em que consiste o domínio eminente?

Parte da doutrina entende que a intervenção do Estado na propriedade tem como


fundamento o domínio eminente.

O DOMÍNIO EMINENTE é o poder que pode ser exercido pelo Estado sobre todos os bens
em seu território, que vai conferir a possibilidade de intervir na propriedade para
promover o interesse público.

Nesse sentido, o domínio eminente é o poder geral do Estado quanto a tudo que esteja
nas suas linhas territoriais, em virtude da sua soberania. Inclui: bens públicos, privados
e não sujeitos ao regime normal da propriedade, como o espaço aéreo.

O domínio eminente não se confunde com o domínio público, que é uma expressão que
possui diversas acepções.

Ao presente estudo o que interessa é a questão de que o domínio público corresponde


ao patrimonio público, ou seja, conjunto de bens pertencentes ao patrimônio público.

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 COMPETÊNCIA & INTERVENÇÃO DO ESTADO NA PROPRIEDADE:

Em termos de competência para que o Estado intervenha na propriedade, destacam-


se as seguintes modalidades:

(i) COMPETÊNCIA LEGISLATIVA (FORMAL): a União tem competência para


legislar sobre direito de propriedade (dto. civil), sobre desapropriação e
sobre requisição (art. 22, I, II e III da CF).

O art. 24 da CF diz que compete a União, aos Estados e ao DF legislar


concorrentemente sobre patrimônio histórico/cultural/artístico etc. (inciso
VII). Vide ainda o art. 30, IX, da CF.

Exemplos:
Uma lei que disponha sobre casos de requisição da propriedade privada, por
exemplo, tem que ser federal (art. 22, III, CF). Mas uma lei que estabeleça
casos de restrição ao uso da propriedade para a proteção do meio ambiente
pode ser federal, estadual, distrital ou municipal (art. 24, VI, e art. 30, I e
II, da CF).

Não confLundir a competência legislativa com a competência executória. A


competência legislativa para legislar sobre desapropriação é só da União.
Contudo, todos os entes da federação têm competência para promover a
desapropriação.

(ii) COMPETÊNCIA ADMINISTRATIVA (MATERIAL): em regra, é comum a todos os


Entes (art. 23, III, CF/88).

Assim, temos que é competência comum da União, dos Estados, do DF e dos


Municípios proteger as obras, os bens de valor histórico, artístico e cultural,
os monumentos, as paisagens naturais notáveis e os sítios arqueológicos.

 LIMITES À INTERVENÇÃO DO ESTADO NA PROPRIEDADE:

Como visto acima, o domínio eminente é o poder que o Estado exerce potencialmente
sobre as pessoas e os bens que se encontram no seu território. Esse poder não é um
poder arbitrário, estando limitado e condicionado à observância da:

(i) Ordem jurídico-constitucional; e


(ii) Princípios, direitos e garantias da CF.

Ademais, a intervenção do Estado na propriedade deve sempre buscar preservar o


direito de propriedade enquanto garantia constitucional, observando o PRINCÍPIO DA
PROPORCIONALIDADE, que exige que as restrições sejam adequadas, necessárias e
proporcionais.

15
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

 DOMÍNIO PÚBLICO E DOMÍNIO EMINENTE:

O estudo dos bens públicos e do domínio público está intimamente ligado às


concepções de “domínio eminente” e de “domínio patrimonial”.

O Domínio Eminente é uma denominação usada para indicar que o Estado projeta sua
soberania sobre todos os bens que estão em seu território, ou seja, o Estado tem poder
para intervir na propriedade privada sempre que o interesse público o exigir, ex.
desapropriação, tombamento, ocupação temporária, instituição de servidões
administrativas, requisições administrativas, e sempre com o objetivo de implementar
a função social da propriedade e os direitos fundamentais.

O domínio eminente é exercido sobre todo e qualquer bem que esteja situado no
respectivo território do ente Federado, a saber:

 Bens Públicos;
 Bens Privados;
 Res Nullius ou Bens Adéspotas (bens de ninguém).

Por outro lado, o domínio público patrimonial refere-se ao direito de propriedade do


Estado, englobando os bens das pessoas estatais, submetidas ao regime jurídico
especial de Direito Administrativo.

Casos Concretos:

Questão 1)

O novo governador do estado X pretende promover a harmonia social e a ordem


pública mediante a melhoria de diversos serviços públicos e a implementação de
uma série de obras, que atingirão, inclusive, a propriedade privada. Para tanto, o
Governador questiona a sua assessoria jurídica para saber se a desapropriação seria
a única modalidade de intervenção do Poder Público na propriedade de competência
do ente federativo em questão ou se existiriam outras medidas menos drásticas
para as finalidades almejadas e, em caso positivo, quais seriam elas, em linhas
gerais, bem como se existiria um fundamento comum para todas elas. Na qualidade
de assessor jurídico, responda aos questionamentos suscitados, à luz do
ordenamento vigente.

Resposta:

O assessor juridico deverá explicar para o novo governador sobre a existência das
seguintes modalidades de intervenção do Estado na propriedade:

(i) Requisição Administrativa;

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(ii) Ocupação Temporária;


(iii) Servidão Administrativa;
(iv) Tombamento; e
(v) Limitação Administrativa.

O fundamento comum a todas as limitações administrativas é a ideia do domínio


eminente, da função social da propriedade e da supremacia do interesse público.

Questão 2)

O Estado do Rio de Janeiro declara que determinada área passará a ser reserva
florestal permanente. Por entender que não há, nessas hipóteses, apossamento
administrativo, não efetua indenização. Para a Administração ocorreu mera
limitação parcial do imóvel. O proprietário, por sua vez, entende que, dessa forma,
ocorreu verdadeira restrição à sua propriedade, esvaziando-a economicamente, pois
dela não mais poderá usar e fruir, segundo sua natural destinação. Afinal, o Poder
Público o está punindo justamente por tê-la preservado. Pondere o interesse do
Poder Público em criar Parques em face do direito de propriedade e suas
conseqüências quanto à indenização.

Resposta:

O caso concreto abarca a diferença entre restrição e a limitação administrativa.

O direito de propriedade não é absoluto, de forma que deverá atender finalidades


econômicas e sociais, dentras as quais a proteção ao meio ambiente.

Trata-se de uma limitação administrativa em sentido lato, que, em regra, não dará
ensejo à indenização. Excepcionalmente, se ficar caracterizado o prejuízo demasiado
ao particular por conta da conduta lícita da Administração é possível a indenização sob
o fundamento da TEORIA DA REPARTIÇÃO DOS ÔNUS E ENCARGOS SOCIAIS, que se dá
quando um particular sofre um prejuizo excessivo em relação aos demais.

Em regra, a criação de uma reserva florestal conforma o direito de propriedade, ou


seja, não caracteriza uma restrição, na verdade, aquela restrição irá conformar o uso
daquela propriedade (dá conteúdo ao direito de propriedade). A limitação
administrativa, nesse caso, busca a conformação da propriedade à sua função social e
proteção ao meio ambiente, diretos assegurados constitucionalmente.

A regra é que a indenização so incide automaticamente no caso da ablação (supressão


do direito). Com relação a limitação administrativa a indenização é excepcional, e
somente incidirá se restar comprovado um prejuizo excessivo ao particular. Assim, o
prejuízo concreto do particular é que dará ensejo a indenização.

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AREsp 457837: “ADMINISTRATIVO. CEMIG DISTRIBUIÇÃO S/A. DESAPROPRIAÇÃO


INDIRETA. NÃO CONFIGURAÇÃO. NECESSIDADE DO EFETIVO DESAPOSSAMENTO E DA
IRREVERSIBILIDADE DA SITUAÇÃO. NORMAS AMBIENTAIS. LIMITAÇÃO
ADMINISTRATIVA. ESVAZIAMENTO ECONÔMICO DA PROPRIEDADE. AÇÃO DE DIREITO
PESSOAL. PRESCRIÇÃO QUINQUENAL. 1. Não há desapropriação indireta sem que
haja o efetivo apossamento da propriedade pelo Poder Público. Desse modo, as
restrições ao direito de propriedade, impostas por normas ambientais, ainda que
esvaziem o conteúdo econômico, não se constituem desapropriação indireta. 2. O
que ocorre com a edição de leis ambientais que restringem o uso da propriedade
é a limitação administrativa, cujos prejuízos causados devem ser indenizados por
meio de ação de direito pessoal, e não de direito real, como é o caso da ação em
face de desapropriação indireta. 3. Assim, ainda que tenha havido danos ao
agravante, diante de eventual esvaziamento econômico de propriedade, deve ser
indenizado pelo Estado, por meio de ação de direito pessoal, cujo prazo
prescricional é de 5 anos, nos termos do art. 10, parágrafo único, do Decreto-Lei
n. 3.365/41. Agravo regimental improvido.”

Questão 3)

O Município do Rio de Janeiro pretende impedir o crescimento desordenado dos


imóveis no entorno de importante cartão postal da cidade, bem como manter a
harmonia do conjunto arquitetônico e cultural daquela localidade. Consultado, o
procurador do Município opinou no sentido de que a previsão na legislação municipal
que viabiliza a criação de Área de Proteção do Ambiente Cultural (APAC), mediante
a notificação dos proprietários viabilizadora da ampla defesa e do contraditório
para a finalidade almejada, é inconstitucional. Invoca como fundamento da
mencionada conclusão a inexistência de dispositivo na Lei Maior que autorize o
Município a instituir a APAC, bem como o fato de que somente a União seria
competente para introduzir no ordenamento mecanismos de intervenção do Estado
na propriedade. Analise se os argumentos apresentados pelo procurador estão em
consonância com a jurisprudência acerca do tema, mediante o apontamento,
sobretudo, das normas constitucionais pertinentes.

Resposta:

Os argumentos apresentados pelo procurador não merecem prosperar. Isso porque, a


competência privativa da União é para legislar sobre o tema da desapropriação e
requisição (art. 22, II e III da CF), sendo certo que as demais modalidades de restrições
da propriedade são de competência concorrente entre os Entes, conforme se
depreende do art. 24, VII da CF.

Assim, em princípio, o Município pode legislar sobre o tema. Ademais, estaria no


ambito de suas atribuições levar a efeito esse tipo de atividade. Na verdade, para a
maioria da jurisprudência a APAC se traduz em uma hipótese de limitação
administrativa. Ela impõe obrigações negativas para um grupo de imóveis, para uma

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Emerj CPIII-A Direito Administrativo

determinada área. Ela não é especificamente um tombamento pois atinge diversos


bens.

O art. 216 da CF trata do tema. Vejamos:

Art. 216 da CF: “Constituem patrimônio cultural brasileiro os bens de natureza


material e imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de
referência à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadores da
sociedade brasileira, nos quais se incluem:
I - as formas de expressão;
II - os modos de criar, fazer e viver;
III - as criações científicas, artísticas e tecnológicas;
IV - as obras, objetos, documentos, edificações e demais espaços destinados às
manifestações artístico-culturais;
V - os conjuntos urbanos e sítios de valor histórico, paisagístico, artístico,
arqueológico, paleontológico, ecológico e científico.
§ 1º O poder público, com a colaboração da comunidade, promoverá e protegerá
o patrimônio cultural brasileiro, por meio de inventários, registros, vigilância,
tombamento e desapropriação, e de outras formas de acautelamento e
preservação.

No caso em tela, a princípio, não teria ocorrido a violação ao contraditório e ampla


defesa, uma vez que os proprietários foram notificados.

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Aula 2 – Prof. Valter Shuenquener


5/10/18

EMENTA:  Bens Públicos I:


 Classificação dos bens públicos:
 Quanto à titularidade; e
 Quanto à destinação.
 Afetação e Desafetação.
 As Terras Devolutas.
 Regime jurídico: inalienabilidade, impenhorabilidade,
imprescritibilidade, não-onerabilidade.
 Bens privados afetados a serviços públicos.

 BENS PÚBLICOS:

Em todas as relações que envolvam o Estado há uma tendência que se aplique o regime
de direito público. Por isso, construiu-se um regime próprio do direito de propriedade
para os bens públicos.

Qual o conceito de bem público?

O BEM PÚBLICO é aquele bem móvel ou imóvel pertencentes às pessoas de direito


público, bem como aqueles que, ainda que pertencentes à iniciativa privada, estão
sendo destinados à prestação de serviço público (afetados ao serviço público, ou seja,
destinados ao serviço público).

Exemplo: ônibus usado pelas concessionárias de transporte público coletivo.

Celso Antônio Bandeira de Mello inclui ainda aqueles bens que, embora não pertençam
a uma dessas pessoas, estejam afetados à prestação de um serviço público, sob o
fundamento que, uma vez afetados, se submetem ao regime jurídico dos bens de
propriedade pública.

O CC/02 restringiu bastante os bens públicos, afirmando em seu artigo 98 que:

Art. 98 do CC: “São públicos os bens do domínio nacional pertencentes às pessoas


jurídicas de direito público interno; todos os outros são particulares, seja qual for
a pessoa a que pertencerem.”

Os bens públicos são os bens pertencentes às pessoas jurídicas de direito público. Entes
políticos (U/E/M/DF), autarquias, fundação pública de direito público.

Obs: pessoa jurídica de direito privado prestadora de serviço público (empresa pública
e SEM), desde que os bens estejam diretamente ligados à prestação de serviço.
Fundamento: garantir a o princípio da continuidade do serviço público.

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Emerj CPIII-A Direito Administrativo

Há, portanto, uma divergência em relação ao conceito de bens públicos. Isso porque o
CC considera bens públicos apenas aqueles que integram o patrimônio de pessoas
jurídicas de direito público. A divergência cinge-se, portanto, em relação aos bens
pertencentes às empresas públicas e às sociedades de economia mista, que integram
a Administração Indireta, mas são pessoas jurídicas de direito privado.

Pelo conceito do CC, os bens das EP e das SEM não são considerados bens públicos. É
possível, porém, que se apliquem a alguns bens das EP e das SEM características
próprias dos bens públicos, tal qual a impenhorabilidade, quando afetados à prestação
de um serviço público. O que inviabiliza a penhora, portanto, não é o fato de ser bem
público, mas sim o PRINCÍPIO DA CONTINUIDADE DO SERVIÇO PÚBLICO.

Qual a natureza juridica dos bens de uma sociedade de economia mista e empresa
pública?

As SEMs e EPs são pessoas jurídicas de direito privado integrantes da Administração


Indireta.

Predomina na doutrina o entendimento que os bens destas entidades são BENS


PRIVADOS e isso não afasta o controle dessas entidades pelo Tribunal de Contas. É por
isso que os bens destas entidades podem ser penhorados, usucapidos, oferecidos em
garantia.

Será que todos os bens de sociedades de economia mista e de empresas públicas são
bens privados?

Não!!! Predomina na doutrina e jurisprudência o entendimento de que os bens que


estiverem afetados à prestação do serviço público terão natureza jurídica de BENS
PÚBLICOS.

#FIQUEATENTO:
 Os titulares de bens públicos são as pessoas jurídicas públicas e não os órgãos. Ex.
Tribunal de Justiça, Assembleia Legislativa – o titular é o Estado membro.
 Art. 28 da Lei 8987/95 – concessionárias e permissionárias (Empresas Privadas. Estão
fora da Administração), não podem dar em garantias os bens que irão comprometer
o serviço público. O fundamento é o mesmo: continuidade do serviço público.
 Obs. Doutrina minoritária (José dos Santos): só é bem público aquele pertencente à
pessoa jurídica de direito público.
#COMOFOICOBRADO¹: Bem de empresa pública é penhorável – Correto – essa é a regra.
#COMOFOICOBRADO²: Bem de empresa pública prestadora de serviço público é penhorável
– correto
#COMOFOICOBRADO³: Bem de empresa pública prestadora de serviço público que esteja
diretamente ligado à prestação do serviço é penhorável – ERRADO.

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OBS. Bicicleta da ECT? Em razão da exclusividade do serviço postal ganhou tratamento de


Fazenda Pública. STF na ADPF 46 fixou esse posicionamento. Dessa forma, no caso da ECT
não precisamos buscar saber se o bem está diretamente ligado à prestação de serviços
públicos, será sempre considerado bem público e portanto impenhorável.
#SELIGA: O STF fez a distinção entre exclusividade e monopólio. Se estiver falando de serviço
público deve usar o termo exclusividade. Se for atividade econômica o termo é monopólio.

EM SUMA: Bem público não é só aquele bem integrante do patrimônio das pessoas de
direito público, mas também aqueles que estão afetados a algum tipo de serviço ou
finalidade pública. E em relação aos que estão afetados, já não importa se aquele bem
é regido por uma pessoa de direito privado, pois é a afetação que torna o bem público.

 CLASSIFICAÇÃO DOS BENS PÚBLICOS:

Estudaremos as três principais classificações de bens públicos cobradas em concursos,


quais sejam:

CLASSIFICAÇÃO DOS BENS PÚBLICOS


Quanto à  Federais
titularidade  Estaduais
 DF
 Municipais e autárquicos
Quanto à  Bens de uso comum do povo
destinação  Bens de uso especial
 Bens dominicais
Quanto à  Bens indisponíveis por natureza
disponibilidade  Bens patrimoniais indisponíveis
 Bens patrimoniais disponíveis
Quanto à  Bens de uso comum ordinário
utilização  Bens de uso comum extraordinário
 Bens privativos

Passemos à analise de cada uma dessas classificações:

1. Classificação Quanto à Titularidade:

Os bens públicos podem pertencer à União (art. 20), aos Estados (art. 26), ao DF e aos
Municípios. Os bens das autarquias e fundações serão regidos pela mesma lei aplicada
aos bens do ente federativo a quem estejam vinculadas.

A CF traz um rol dos bens pertencentes à União em seu artigo 20. Era preciso
tratamento constitucional em relação a esses bens, ex. terras ocupadas pelos índios,
riquezas do subsolo, mar territorial, terrenos de marinha, terras devolutas etc.

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Os recursos minerais são de propriedade federal. Tanto é que a exploração de uma


jazida mineral depende de consentimento de órgão federal. Uma jazida é
transformada em mina quando ela passa a ser explorada. É impossível desapropriar
uma mina, porque é impossível desapropriar bens da União.
Terrenos de marinha são bens federais e paga-se um foro anual e ao fazer a alienação
do bem, paga-se laudêmio a União. O domínio direto do terreno de marinha é da União
e o domínio direto não pode ser desapropriado porque é bem federal (art. 2, par. 2 do
DL 365). O que pode ser desapropriado é o domínio útil do terreno de marinha quando
ele for do particular.

São bens federais as cavidades naturais, subterrâneas, sitios arqueológicos e etc.

São bens da União as terras tradicionalmente ocupadas pelos índios. Súmula 650 do
STF.

No art. 20, II, a CF enumera as terras devolutas que pertencem à União. Já no art. 26,
IV, a CF enumera as terras devolutas que pertencem ao Estado. Terra devoluta é aquela
que ainda não foi incorporada ao domínio privado.

O constituinte entendeu que não havia necessidade de previsão na CF dos bens


municipais, mas é evidente que o Município exerce direito de propriedade sobre seus
bens.

2. Classificação Quanto à Destinação:

Esta classificação está consagrada no art. 99 do CC. Vejamos:

a) Bens de Uso Comum do Povo:

Também é chamado de bem de domínio público em virtude de sua natureza ou por lei.
É um bem público que está afetado (desempenha uma função pública), mas que não
possui uma função pública para a administração. São bens insuscetíveis de avaliação
patrimonial.

Estão à disposição da coletividade. Destinam-se à utilização geral sem distinção.

Exemplos:
 Mar;
 Praia; e
 Praça pública.

 Não precisa de autorização para uso normal. No entanto, o poder Público


pode regulamentar, disciplinar a sua utilização. Ex. praça que fecha às 22h
devido à violência.
 Art. 5º, XVI – como conciliar o direito de reunião e o uso do bem comum do
povo? O Poder Público pode impedir que a reunião aconteça em determinado

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local ou horário, devendo indicar outro local que tenha a mesma visibilidade,
repercussão – jurisprudência.

São, portanto, aqueles bens destinados ao uso da população em geral, ou seja, as


pessoas têm, em princípio, livre acesso a esses bens.

Excepcionalmente, em determinadas situações, é possível restringir o acesso das


pessoas a esses bens, desde que tal restrição não se paute em critérios
discriminatórios, ex. praças que são fechadas no período noturno, praia em área de
preservação ambiental.

ATENÇÃO!!!
O bem de uso comum do povo pode ser submetido ao uso privativo. Ex: praia que
vai ser cercada para uma festa de Reveillon e só entra naquele pedaço da praia
quem pagar ingresso.

b) Bens de Uso Especial ou Patrimônio Administrativo:

São aqueles bens usados pelo Poder Público para prestar os seus serviços, ex.
repartições públicas, escolas públicas, hospitais públicos, automóveis públicos,
cemitérios etc. As pessoas têm acesso a estes bens na qualidade de usuários dos
serviços públicos ali prestados. Por isso, o Poder Público pode regulamentar o acesso
das pessoas no que diz respeito a horários, controle de ingresso de armas, indumentária
etc.

Constituem patrimônio indisponível e enquanto mantiverem essa qualidade não podem


ser alienados ou onerados (art. 100 do CC).

A alienação de tais bens somente será possível com sua transformação, via
desafetação, em bens dominicais.

STF entende que não perde a característica de bem de uso especial aqueles que,
objetivando a prestação de serviços públicos, estejam sendo utilizados por
particulares, sobretudo sob regime de delegação. Caso de bens da CODESP (Porto
de Santos) – imunidade recíproca – IPTU.

c) Bens dominiais ou dominicais:

São aqueles bens que integram o patrimônio público, mas não têm nenhum tipo de
destinação pública, ou seja, são bens desafetados, ex. terreno vazio, terras devolutas,
repartições públicas desativadas, bens imóveis inservíveis, terreno baldio.

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Emerj CPIII-A Direito Administrativo

Os bens dominicais são estabelecidos por exclusão, trata-se de um conceito residual,


portanto é dominical aquele que não é de uso comum do povo e não é de uso especial.

OBS: Dominical X Dominial: para a maioria da doutrina tem o mesmo significado. Para
Cretella Jr. há uma diferença: segundo esse autor, bens dominiais são todos os bens
que estão sob o domínio do Estado. Já bens dominicais seriam os bens que não possuem
finalidade pública.

3. Classificação quanto à Disponibilidade:

Em virtude da destinação com o uso específico ou não, os bens públicos podem ser
classificados juridicamente em:

 Bens de Domínio Público: uso comum e uso especial - são inalienáveis;


 Bens de Domínio Privado: sem utilização pública, bens dominiais, podem ser
alienados.

Com maior rigor técnico, tais bens são reclassificados, para efeitos administrativos,
em:

 Bens indisponíveis por natureza: são os bens que, em razão de natureza não
patrimonial, não podem ser alienados ou onerados pelas entidades a que
pertencem. São normalmente os bens de uso comum do povo, tais como: praia,
rios, mares e etc.

 Bens patrimoniais indisponíveis: são os bens que possuem valor patrimonial,


mas que a administração pública não pode dispor em razão de possuírem uma
específica finalidade pública. São os bens públicos de uso especial, tais como:
prédios públicos e etc.

 Bens patrimoniais disponíveis: são os bens públicos que possuem natureza


patrimonial e não estão afetados a uma finalidade pública. São os bens
dominicais.

Quais as principais características dos bens públicos?

Entre as principais características dos bens públicos destacam-se:

 Bens do Domínio Público: caracterizam-se por serem afetados ao uso coletivo


(bens de uso comum) ou ao uso da Administração, submetidos a regime jurídico
de direito público derrogatório e exorbitante do direito comum.

Características: AFETAÇÃO + REGIME DE DIREITO PÚBLICO

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Emerj CPIII-A Direito Administrativo

Em razão destas características tais bens estão fora do comércio jurídico de direito
privado (Di Pietro)

 Bens do Domínio Privado (dominicais): comportam função patrimonial ou


financeira e submetem-se a um regime jurídico de direito privado:

Características: DESAFETAÇÃO + REGIME DE DIREITO PRIVADO

DI PIETRO, no entanto, adverte: “Hoje, já se entende que a natureza desses bens não
é exclusivamente patrimonial; a sua administração pode visar, paralelamente, a
objetivos de interesse geral. (...) Esse novo modo de encarar a natureza e função dos
bens dominicais leva alguns autores a considerar a sua administração como serviço
público sob regime de gestão privada. O duplo aspecto dos bens dominiais justifica a
sua submissão a regime jurídico de direito privado parcialmente derrogado pelo
direito público.”

4. Classificação quanto à Forma de Utilização do Bem Público:

Em relação a forma de utilização dos bens, estes podem ser classificados como:

 Bens Públicos de Uso Comum Ordinário: é o uso de um bem público que


independe do preenchimento de qualquer condição. Ex: posso andar pelo
forum sem pagar.

 Bens Públicos de Uso Comum Extraordinário: é o uso de um bem público


que depende do preenchimento de alguma condição. Ex: precisa pagar
pedágio para usar a rodovia federal.

 Bens de Uso Privativo: é um bem de uso especial que tem um uso


privativo, um uso exclusivo, somente aquele particular usa. Ex:
lanchonete no forum, festa cercada na praia.

 AFETAÇÃO E DESAFETAÇÃO:

Consideram-se afetados os bens que tenham destinação pública, tais quais todos os
bens de uso comum do povo e os bens de uso especial.

Consideram-se desafetados os bens que não tenham destinação pública, tais quais os
bens dominicais.

O bem público desafetado é aquele em que é retirada a sua finalidade pública,


transformando-o em bem disponível e alienável, nas condições legais.

A afetação ou desafetação pode fazer com que o bem passe de uma categoria para a
outra.

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Exemplos:

 Foi construída uma praça pública no terreno vazio – o bem foi afetado e deixou
de ser dominical para ser de uso comum do povo.
 Uma repartição pública foi desativada – o bem foi desafetado e deixou de ser
bem de uso especial para ser bem dominical. A desafetação pode ser formal
ou decorrer de mera constatação.

AFETAÇÃO DESAFETAÇÃO
Transformação do bem dominical em uso Transformação do bem de uso
comum ou especial comum/especial em bem dominical
Pode ser feita de qualquer maneira: lei, Não é desafetado pelo simples uso não.
ato ou simples uso. Tem que ser lei ou ato administrativo
autorizado por lei.
Obs: pode ser também desafetado por
um evento da natureza. Ex: chuva que
derruba a escola.

A competência para afetar é exclusiva da pessoa jurídica proprietária do bem, que


também tem competência exclusiva para dizer “se” e “quando” o bem poderá ser
afetado ou desafetado.

A desafetação ocorre, necessariamente, por lei ou por ato do chefe do executivo.


Contudo, alguns autores defendem que existem outros meios de desafetação, exemplo:
hospital que pega fogo e não tem mais como ser utilizado, logo, um evento provocou
a desafetação do bem de forma tácita. Nota-se que, se o prédio pertence ao Estado,
ele pode servir para a ocupação com o serviço público, independentemente de um ato
específico.

A desafetação tácita é objeto de divergência da doutrina.

A jurisprudência, contudo, consagrou entendimento de que não existe no direito


brasileiro a chamada “desafetação tácita”, entendida esta como uma mudança de
categoria do bem pela falta de uso. A jurisprudência consolidou o entendimento de
que não é possível a desafetação pelo não uso, ainda que prolongado, como, por
exemplo, de uma rua que deixa de ser utilizada.

REsp 650.728: “... É incompatível com o direito brasileiro a chamada desafetação


ou declassificação jurídica tácita em razão de fato consumado.”

Bens que estão afetados só podem ser utilizados por particulares por intermédio de
instituto de direito público. Institutos de direito privado tb podem servir para uso de
bem público (enfiteuse, locação), mas somente em relação aos bens públicos que nao
estejam afetados. Assim, nao se pode falar em locação de praça público, porque a
praça pública é um bem afetado, então, o seu uso depende de intrumentos de uso de
direito público (autorização, concessão de uso, permissão de uso e etc).

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Emerj CPIII-A Direito Administrativo

 TERRAS DEVOLUTAS:

As Terras Devolutas são bens públicos que não possuem afetação pública (bens públicos
dominicais), ou seja, sem destinação pelo Poder Público e que em nenhum momento
integraram o patrimônio de um particular, ainda que estejam irregularmente sob sua
posse. O termo "devoluta" relaciona-se ao conceito de terra devolvida ou a ser
devolvida ao Estado.

Esse instituto surgiu a partir da falência do regime de capitanias hereditárias. As terras


ficaram sem dono e o Estado assumiu. Hoje essas terras ainda não estão
demarcadas/discriminadas.

As terras devolutas são conceituadas POR EXCLUSÃO, isto é, seu conceito é RESIDUAL.

São terras vagas, abandonadas, não utilizadas quer pelo Poder Público quer pelos
particulares. Seu conceito é residual justamente porque não se encontram destinadas
a qualquer uso público, nem incorporadas ao domínio privado.

Art. 5 do DL 9769/46: “São devolutas, na faixa da fronteira, nos Territórios


Federais e no Distrito Federal, as terras que, não sendo próprias nem
aplicadas a algum uso público federal, estadual ou municipal, não se
incorporaram ao domínio privado:
a) por força da Lei nº 601, de 18 de setembro de 1850, Decreto nº 1.318, de
30 de janeiro de 1854, e outras leis e decretos gerais, federais e estaduais;
b) em virtude de alienação, concessão ou reconhecimento por parte da
União ou dos Estados;
c) em virtude de lei ou concessão emanada de governo estrangeiro e
ratificada ou reconhecida, expressa ou implicitamente, pelo Brasil, em
tratado ou convenção de limites;
d) em virtude de sentença judicial com força de coisa julgada;
e) por se acharem em posse contínua e incontestada com justo título e boa-
fé, por termo superior a 20 (vinte) anos;
f) por se acharem em posse pacifica e ininterrupta, por 30 (trinta) anos,
independentemente de justo título de boa-fé;
g) por força de sentença declaratória nos termos do Art. 148 da Constituição
Federal, de 10 de novembro de 1937.
Parágrafo único. A posse a que a União condiciona a sua liberalidade não
pode constituir latifúndio e depende do efetivo aproveitamento e morada
do possuidor ou do seu preposto, integralmente satisfeitas por estes, no
caso de posse de terras situadas na faixa da fronteira, as condições especiais
impostas na lei.”

Qual a origem histórica das terras devolutas?

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Emerj CPIII-A Direito Administrativo

As terras, no Brasil, foram divididas em 03 etapas: SESMARIAS, OCUPAÇÕES e a


PRIMEIRA REGULAMENTAÇÃO DA LEI 601/1850.

As SESMARIAS estão associadas à ideia de capitanias hereditárias, no Brasil Colônia;


aqui surgiu a presunção de que todas as terras pertenciam ao Poder Público, pois todas
pertenciam a Portugal (que era a Coroa). Sesmaria era um pedaço de terra que o
donatário da capitania outorgava ao interessado, que tivesse interesse em ocupá-la,
demarcá-la, fazer dela sua residência, cultivá-la. A outorga era feita por meio de uma
CARTA DE SESMARIA (eram os primórdios da enfiteuse, porque o sesmeiro não tinha o
domínio pleno, que permanecia à Coroa Portuguesa). Caso os deveres do sesmeiro não
fossem cumpridos, a sesmaria caía em comisso, ou seja, voltava para a coroa.

As OCUPAÇÕES substituíram as sesmarias e consistiam na ocupação desordenada pelos


posseiros, sem registro. Em 1850, foi editada a Lei 601, que regulamentou a questão
das terras: foram legitimadas as ocupações, foram revogadas as sesmarias, proibidas
novas ocupações e quem assim agisse seria considerado delinqüente; foi estabelecido,
ainda, o primeiro conceito de terra devoluta.

Atualmente, o conceito de terras devolutas compreende: aquelas terras que não são
utilizadas pelo poder público e não estão no domínio privado.

As terras devolutas pertencem ao patrimônio de qual Ente?

Atualmente é possível encontrar terras devolutas no patrimônio da União, Estados e


Municípios.

Em regra, as terras devolutas pertencem ao dos Estados (art. 26, IV da CF), ressalvadas
as terras devolutas “indispensáveis à defesa das fronteiras, das fortificações e
construções militares, das vias federais de comunicação e à preservação ambiental,
que pertencem à União (art. 20, II da CF), bem como aquelas que historicamente foram
transferidas ao patrimônio dos Municípios.

Art. 20 da CF: “São bens da União:


II - as terras devolutas indispensáveis à defesa das fronteiras, das fortificações e
construções militares, das vias federais de comunicação e à preservação
ambiental, definidas em lei;”

Art. 26 da CF: “Incluem-se entre os bens dos Estados:


IV – as terras devolutas não compreendidas entre as da União.”

Em que consiste o procedimento discriminatório de terras devolutas da União?

29
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

O PROCEDIMENTO DISCRIMINATÓRIO das terras devolutas, regulado pela Lei 6.383/76,


tem por objetivo estabelecer a linha divisória entre terras públicas ou privadas. No
âmbito federal, a ação discriminatória é proposta pelo INCRA.

O procedimento discriminatório é composto por 2 fases:

1. Fase Administrativa: no Estado o órgão responsável é o IDAF; nessa fase são


feitas as publicações de editais para reclamação da terra, se ninguém
comparece, passa a ser o Estado; se comparece e há título passa a ser do titular.

2. Fase Judicial: ocorre por meio da AÇÃO DISCRIMINATÓRIA de rito especial,


sendo a titularidade de seu ajuizamento do poder público. Se o Estado não
discrimina as terras, elas poderão ser usucapidas e o ajuizamento da usucapião
impede a instauração do procedimento discriminatório.

De quem é o ônus da prova no procedimento discriminatório de terras devolutas?

Há divergência na doutrina sobre o ônus da prova no tocante à comprovação do domínio


e na presunção relativa do caráter público ou privado do bem não registrado no RGI.

CORRENTE 1) Parte da doutrina sustenta que, na falta de registro, se presume que o


bem integra o patrimônio público, incorporando o conceito de terra devoluta. Essa
corrente entende que o interessado é quem deve comprovar que as terras foram
transferidas para o domínio privado mediante algum título hábil. Caso o interessado
não consiga comprovar a titularidade das terras, estas serão consideradas públicas por
presunção.

CORRENTE 2) Alguns doutrinadores afirmam que os bens não registrados no RGI são
presumidamente privados. Para essa corrente, a presunção milita em favor do
particular, devendo o Poder Público comprovar a sua propriedade. Nesse sentido, STJ,
4 Turma, REsp 964.223/RN de 2011.

Destaca-se, por fim que o próprio STF decidiu ora de acordo com uma, ora com outra
das correntes. Nada obstante, tem dominado o pensamento segundo o qual cabe ao
Estado provar a sua propriedade no caso de ausência de registro imobiliário.

Abaixo jurisprudência sobre terras devolutas:

JULGADO TERRAS DEVOLUTAS


ADI 255/RS  O Tribunal, por maioria, julgou parcialmente procedente pedido
formulado em ação direta de inconstitucionalidade requerida pelo
PGR para dar ao inciso X do art. 7º da CE do RS (Art.7º... X. São bens
do Estado ... as terras dos extintos aldeamentos indígenas)
interpretação conforme a CF, no sentido de que o dispositivo

30
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

impugnado refere-se somente aos aldeamentos indígenas extintos


antes da Constituição de 1891.
 Na linha da jurisprudência da Corte, entendeu-se que tais terras
teriam sido excluídas do domínio da União e as demais a ela
pertenceriam, de modo que o Estado-membro não poderia legislar
sobre a matéria. Vencido o Min. Joaquim Barbosa que julgava o pleito
procedente.

Súmula 477, STF  Súmula 477 do STF: As concessões de terras devolutas situadas na faixa
de fronteira, feitas pelos Estados, autorizam, apenas, o uso,
permanecendo o domínio com a União, ainda que se mantenha inerte
ou tolerante, em relação aos possuidores.

MS 21.572-AL  É inegável que a CF/88 mudou o enfoque atribuído à questão indígena


e trouxe novas regras mais favoráveis a tais povos, permitindo a
demarcação das terras com critérios mais elásticos, a partir da
evolução de uma perspectiva integracionista para a de preservação
cultural do grupamento étnico.
 Isso, contudo, não é motivo suficiente para se promover a revisão
administrativa das demarcações de terras indígenas já realizadas,
especialmente nos casos em que se passou o prazo decadencial.
 Exemplo: em 2000, João comprou uma fazenda que fica ao lado da
reserva indígena Wassú-Cocal. Essa reserva indígena foi demarcada em
1987, ou seja, antes da CF/88. Em 2012, o Ministro da Justiça, a partir
de estudo da FUNAI, editou portaria ampliando os limites da reserva
indígena Wassú-Cocal. Pela nova demarcação proposta, João perderia
a sua fazenda, que passaria a fazer parte da reserva indígena. Segundo
argumentaram a FUNAI e o Ministério da Justiça, a remarcação agora
realizada é um procedimento destinado a "corrigir falhas" cometidas
na demarcação originária já que esta não teria observado os
parâmetros impostos pela CF/88. Desse modo, seria uma correção
para adequar a demarcação às regras da CF/88.
 A jurisprudência concorda com essa prática? Se uma terra indígena foi
demarcada antes da CF/88, é possível que agora ela seja
“remarcada”, ampliando-se a área anteriormente já reconhecida?
NÃO. Tanto o STF como o STJ condenam essa prática. A alegação de
que a demarcação da terra indígena não observou os parâmetros
estabelecidos pela CF/1988 não justifica a remarcação ampliativa de
áreas originariamente demarcadas em período anterior à sua
promulgação. Desde o julgamento da Pet 3.388-RR (Caso Raposa Serra
do Sol), a jurisprudência passou a entender que é vedada a ampliação
de terra indígena já demarcada, salvo em caso de vício de ilegalidade
do ato de demarcação e, ainda assim, desde que respeitado o prazo
decadencial.

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Emerj CPIII-A Direito Administrativo

Súmula 650, STF  Súmula 650 do STF: Os incisos I e XI do art. 20 da CF não alcançam
terras de aldeamentos extintos, ainda que ocupadas por indígenas em
passado remoto. Segundo critério construído pelo STF, somente são
consideradas “terras tradicionalmente ocupadas pelos índios” aquelas
que eles habitavam na data da promulgação da CF/88 (marco
temporal) e, complementarmente, se houver a efetiva relação dos
índios com a terra (marco da tradicionalidade da ocupação).

ACO 362/MT e  As terras tradicionalmente ocupadas pelos índios são bens da União
ACO 366/MT (art. 20, XI, da CF/88) e, portanto, não podem ser consideradas como
Info 873 (2017) terras devolutas de domínio do Estado-membro.
 O Estado de Mato Grosso ajuizou contra a União e a Funai ação
ordinária de indenização por desapropriação indireta, sob a alegação
de que as rés teriam incluído, dentro do perímetro de áreas indígenas,
terras devolutas que pertenceriam ao Estado autor. Em outras
palavras, Mato Grosso alegou que a União, no momento de fazer a
demarcação de terras indígenas, utilizou parte de terras devolutas que
pertenceriam ao Estado, razão pela qual ele deveria ser indenizado
por isso. O pedido foi aceitou pelo STF? NÃO.
 O STF julgou improcedente a ação. As terras tradicionalmente
ocupadas pelos índios são bens da União (art. 20, XI, da CF/88) e,
portanto, não podem ser consideradas como terras devolutas de
domínio do Estado-membro.
 Os laudos antropológicos juntados aos autos deixaram claro que as
áreas em questão eram habitadas historicamente por indígenas.
Diante disso, o STF reconheceu que a titularidade das terras não é do
Estado do Mato Grosso, sendo indevida, portanto, a indenização
pleiteada. Vale ressaltar que, desde a Constituição de 1934 é
reconhecida a proteção da posse dos indígenas das terras que
tradicionalmente ocupam. Assim, desde a Carta de 1934, não se pode
caracterizar as terras ocupadas pelos indígenas como devolutas.
 A demarcação se dá por meio de processo administrativo (não é
judicial). Além disso, importante ressaltar que o Congresso Nacional
não participa da demarcação, ocorrendo ela apenas no âmbito do
Poder Executivo.
 Mesmo após o processo de demarcação, a propriedade dessas terras
continua sendo da União (art. 20, XI). Os índios detêm apenas o
usufruto exclusivo das riquezas do solo, dos rios e dos lagos nelas
existentes. Em regra, os não índios que forem retirados das terras
demarcadas não têm direito à indenização. Isso porque eles estavam
ocupando terras que pertenciam à União. Logo, mesmo que tivessem
supostos títulos de propriedade, estes seriam nulos porque foram
expedidos em contrariedade com o art. 20, XI e art. 231 da CF/88.
 Exceção: tais pessoas poderão ser indenizadas pelas benfeitorias que
realizaram no local, desde que fique provado que a ocupação era de

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Emerj CPIII-A Direito Administrativo

boa-fé. Se estiverem de má-fé, não terão direito nem mesmo à


indenização pelas benfeitorias.

 REGIME JURÍDICO DOS BENS PÚBLICOS:

Não há um único regime a ser aplicado a todos os bens públicos, pois as empresas
públicas e as sociedades de economia mista, apesar de comporem a Administração
Indireta, estão submetidas ao regime jurídico privado, mas com algumas imposições
do regime jurídico público, daí porque a doutrina ensina que tais bens estão
submetidos a um regime jurídico híbrido ou misto (ora público, ora privado).

Portanto, em relação aos bens públicos, alguns são submetidos ao regime jurídico
público, outros a um regime jurídico híbrido.

Os bens públicos sujeitam-se a regime jurídico distinto daquele aplicável aos bens
privados em geral.

Em breve síntese, as principais características dos bens públicos são:

CARACTERÍSTICAS PRINCIPAIS DOS BENS PÚBLICOS


INALIENABILIDADE  Os bens públicos não pdoem ser alienados, salvo as
exigências legais
IMPENHORABILIDADE  Os bens públicos não podem ser penhorados
IMPRESCRITIBILIDADE  Os bens públicos não se submetem à prescrição
aquisitiva (não podem ser usucapidos)
NÃO-ONERABILIDADE  Os bens públicos não são sucetíveis de oneração

Passemos ao exame de cada uma dessas características dos bens públicos:

(I) INALIENABILIDADE:

Em princípio, os bens públicos (bem de uso comum e bem de uso especial) não podem
ser livremente alienados pelo Poder Público.

Contudo, excepcionalmente, poderão ser alienados, respeitados os requisitos previstos


no ordenamento jurídico nos arts. 100 e 101 do CC e art. 17 da Lei 8.666/93.

OBS: essa inalienabilidade é relativa, pois podem ser tornar dominicais. Ou seja, eles
são alienáveis, mas de forma condicionada. Bem dominical – alienável. Para ser
alienável tem que ser primeiramente desafetado.

O Novo CC dispõe serem inalienáveis apenas os bens públicos de uso comum do povo e
de uso especial (art. 100). Os dominicais perderam essa peculiaridade (art. 101). Mas,

33
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

observa-se que a perda dessa inalienabilidade não vulnera os bens públicos à aquisição
por usucapião (essa proibição foi mantida no novo texto, art. 102, com fundamento
em comando expresso da CF/88, art. 183, §3º).

Carvalho Filho, ao tratar dessa característica dos bens públicos, prefere denominá-la
de ALIENABILIDADE CONDICIONADA, termo tecnicamente mais correto.

Quais os requisitos para que um bem público possa ser alienado?

A alienação de um bem público deverá obedecer às normas dos artigos 17 a 19 da Lei


8.666/93.

a) ALIENAÇÃO DE BEM IMÓVEL PÚBLICO:

São requisitos para alienação de bem imóvel:

(i) Desafetação: isto é, o reconhecimento formal de que aquele bem imóvel não tem
destinação pública;

(ii) Autorização do Poder Legislativo: se for bem de pessoa jurídica de direito


público. É obrigatória quando se tratar de pessoa jurídica de direito público. Obs:
Pessoa jurídica de direito privado, via de regra, NÃO precisa de autorização
legislativa.

Há regra específica no art. 23 da Lei. 9.636/98 para a alienação de bens


imóveis da União: autorização, mediante ato do Presidente da República, e
será sempre precedida de parecer do SPU quanto à sua oportunidade e
conveniência, quando não houver interesse público, econômico ou social, nem
inconveniência quanto à preservação ambiental e à defesa nacional.

(iii) Interesse Público: a Adm. Pública deverá demonstrar o interesse público


(justificativa ou motivação);

(iv) Avaliação prévia feita pela Administração Pública: para definição do valor do
bem;

(v) Licitação: em se tratando de bem imóvel, a modalidade licitatória, em regra, é


a concorrência.

O art. 19 da Lei 8.666, contudo, prevê a possibilidade de utilização do leilão para


alienação de bem imóvel adquirido pelo Poder Público através de processo
judicial ou de dação em pagamento.

34
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

O art. 17, I, da Lei 8.666 enumera casos de dispensa de licitação na alienação


de bens imóveis públicos.

Obs. SEM e EP – os bens, em regra, são privados. Não precisa de autorização


legislativa para alienar, mas por se submeterem a 8666 é necessária a
motivação, avaliação e modalidade concorrência.

b) ALIENAÇÃO DE BEM MÓVEL PÚBLICO:

São requisitos para a alienação de bem móvel:

(i) Desafetação: é feita através de um procedimento administrativo no qual é


constituída uma comissão, formada por servidores, que constata que
determinado bem móvel não tem mais utilidade para a Administração, ou seja,
não é conveniente mantê-los (inservível não significa “estragado”, ex.
ambulâncias que precisam de muitos reparos);

(ii) Avaliação prévia do bem;

(iii) Licitaçao: aqui, a modalidade é o leilão. O art. 17, II, da Lei 8.666 enumera casos
de dispensa de licitação na alienação de bens móveis públicos.

Por meio de quais instrumentos poderá ser formalizada a venda de um bem público?

Cumpridos os requisitos legais, a alienação dos bens públicos poderá ser formalizada
por meio dos seguintes institutos jurídicos:

 Contrato de Compra e Venda;


 Doação;
 Permuta;
 Dação em Pagamento;
 Investidura: (art. 17, par. 3 da Lei 8666);
 Incorporação; ou
 Retrocessão.

Quais os bens públicos considerados absolutamente indisponíveis pelo nosso


ordenamento jurídico?

O ordenamento jurídico consagra DUAS hipóteses de indisponibilidade absoluta de


determinados bens públicos, a saber:

1. Terras Devolutas ou arrecadadas pelos Estados, por ações discriminatórias,


necessárias à proteção dos ecossistemas naturaus (art. 225, par. 5 da CF); e

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Emerj CPIII-A Direito Administrativo

2. Terras tradicionalmente ocupadas pelos índios (art. 231, par, 4 da CF).

Passemos à analise da segunda característica dos bens públicos:

(II) IMPENHORABILIDADE:

Os bens públicos não podem ser penhorados por dívidas da Fazenda.

Quais os fundamentos para justificar a impossibilidade de constrição judicial de


bens públicos?

Entre os fundamentos que justificam a característica de impenhorabilidade dos bens


públicos, destacam-se:

(i) Necessidade de cumprimento dos requisitos legais para alienação;


(ii) Princípio da continuidade do serviço público;
(iii) No caso específico das pessoas jurídicas de direito público, pelo
procedimento constitucional especial exigido para pagamento de débitos
oriundos de decisão judicial transitado em julgado.

Isso significa que a execução contra a Fazenda Pública está sujeita a um procedimento
especial, previsto no art. 100 da CF, qual seja a REQUISIÇÃO JUDICIAL, que tem como
principal instrumento o precatório (será incluído no orçamento do ano seguinte e pago
na ordem cronológica de apresentação – art. 730 do CPC). As requisições de valores
considerados por lei como pequeno valor não se dão via precatório, mas via requisição
de pronto pagamento (RPV).

A impenhorabilidade do bem público admite alguma exceção?

A impenhorabilidade dos bens públicos, admite EXCEÇÃO para a hipótese de:

(i) Sequestro de bens, nos termos do artigo 100, par. 6, da CF;


(ii) Concessão de garantia, em condições especialíssimas, em operações de
crédito externo, cabendo ao Senado Federal dispor sobre limite e
concessões, nos termos do artigo 52, VIII, da CF.

Os bens das Sociedades de Economia Mista e Empresas Públicas podem ser


penhorados?

As estatais (SEMs e EPs) são pessoas jurídicas administrativas, mas estão sujeitas ao
regime de direito privado, sendo assim, via de regra, seus bens estão sujeitos à

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Emerj CPIII-A Direito Administrativo

penhora, bem como, elas não podem se beneficiar com o pagamento de suas dívidas
judiciais por precatório.

Contudo, para as estatais que desempenham atividade econômica, sob a forma de


serviço público, aqueles bens diretamente ligados à prestação de serviço público NÃO
podem ser penhorados.

RE 220906: “CONSTITUCIONAL. EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELÉGRAFOS.


IMPENHORABILIDADE DE SEUS BENS, RENDAS E SERVIÇOS. RECEPÇÃO DO ARTIGO 12
DO DECRETO-LEI Nº 509/69. EXECUÇÃO. OBSERVÂNCIA DO REGIME DE
PRECATÓRIO. APLICAÇÃO DO ARTIGO 100 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. 1. À
empresa Brasileira de Correios e Telégrafos, pessoa jurídica equiparada à Fazenda
Pública, é aplicável o privilégio da impenhorabilidade de seus bens, rendas e
serviços. Recepção do artigo 12 do Decreto-lei nº 509/69 e não-incidência da
restrição contida no artigo 173, § 1º, da Constituição Federal, que submete a
empresa pública, a sociedade de economia mista e outras entidades que explorem
atividade econômica ao regime próprio das empresas privadas, inclusive quanto
às obrigações trabalhistas e tributárias. 2. Empresa pública que não exerce
atividade econômica e presta serviço público da competência da União Federal e
por ela mantido. Execução. Observância ao regime de precatório, sob pena de
vulneração do disposto no artigo 100 da Constituição Federal. Recurso
extraordinário conhecido e provido.

Verifica-se, por meio do julgado acima, que o STF vem fazendo DISTINÇÃO entre
empresa pública e sociedade de economia mista (i) exploradora de atividade
econômica e (ii) prestadora de serviço público. Quanto as EPs e SEMs prestadoras de
serviços públicos, consolidou-se o entendimento de que não se submetem ao regime
próprio das empresas privadas, devendo ser observado o regime de precatório e
impenhorabilidade dos bens diretamente ligados ao serviço público prestado.

Passemos à análise da terceira característica dos bens públicos:

(III) IMPRESCRITIBILIDADE:

A imprescritibilidade dos bens públicos somente foi adotada a partir da vigência do CC


de 1916, razão pela qual era admissível, até aquela época, a aquisição de bens públicos
por usucapião.

O bem público não pode ser adquirido por particulares por meio da usucapião, ainda
que determinada pessoa detenha a posse prolongada sobre o bem público (art. 183,
§3º e art. 191, p.ú, da CF c/c art. 102 do CC e art. 200 do DL 9760/46).

Ainda sobre o tema destaca-se a Súmula 340 do STF:

Súmula 340 do STF: “Desde a vigência do Código Civil, os bens dominicais, como
os demais bens públicos, não podem ser adquiridos por usucapião.”

37
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

Em contrapartida verifica-se que o Poder Público pode adquirir bens por usucapião.

Em que pese não ser admissível a aquisição da propriedade, é possível a regularização


da ocupação de bens ocupados por particulares. Exemplo: MP 2.220 prevê o direito à
concessão de uso a aqueles que ocupavam imóveis públicos urbanos de até 250m² há
mais de 5 anos na data da edição da MP. Não há, contudo, direito de aquisição da
propriedade.

Bens públicos, portanto, não podem ser objeto de prescrição aquisitiva. Além disso,
não são indenizáveis acessões e benfeitorias realizadas sem autorização do poder
público.

Obs. Lei 11.977/2009 (Programa Minha Casa, Minha Vida) = prevê a conversão da posse
em registro de propriedade, erroneamente utilizando o termo ‘usucapião’. É caso de
legitimação da posse – urbana. 5 anos.

Os bens dominicais podem ser usucapidos?

A doutrina majoritária defende que os bens dominicais NÃO podem ser usucapidos.

Contudo, Rafael Oliveira, defende, de forma minoritária, que os bens dominicais


podem ser objeto de usucapião pois esses bens não atendem a função social da
propriedade pública, devendo prevalecer, portanto os direitos fundamentais do
particular em detrimento do interesse público, uma vez que o bem dominical, por estar
desafetado, não atende às necessidades coletivas.

Por outro lado, o poder público pode usucapir bem particular.

É possível a usucapião do domínio útil (enfiteuse) do bem público?

Sim!!! Há precedentes nesse sentido, a exemplo do que segue:

REsp 575.572/RS: “Civil e processo civil. Recurso especial. Usucapião. Domínio


público. Enfiteuse. É possível reconhecer a usucapião do domínio útil de bem
público sobre o qual tinha sido, anteriormente, instituída enfiteuse, pois, nesta
circunstância, existe apenas a substituição do enfiteuta pelo usucapiente, não
trazendo qualquer prejuízo ao Estado. Recurso especial não conhecido.”

É possível falar em direito de retenção de benfeitoriais para particular que detem


a “posse” de bem público?

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Emerj CPIII-A Direito Administrativo

A jurisprudência do STJ diz não ser possível a posse de bem público, pois sua ocupação
irregular (ausente de aquiescência do titular do domínio) representa mera detenção
de natureza precária.

REsp 841.905-DF: “Consoante precedente da Corte Especial, são bens públicos os


imóveis administrados pela Companhia Imobiliária de Brasília (Terracap), empresa
pública em que figura a União como coproprietária (Lei n. 5.861/1972) e que tem
a gestão das terras públicas no DF, possuindo personalidade jurídica distinta desse
ente federado. Sendo assim, na ação reivindicatória ajuizada por ela, não há falar
em direito de retenção de benfeitorias (art. 516 do CC/1916 e art. 1.219 do
CC/2002), que pressupõe a existência de posse.”

Mas, deve-se ter cuidado com a jurisprudência recente do STJ sobre o assunto:

REsp 1296964/DF (2016): “RECURSO ESPECIAL. POSSE. DIREITO CIVIL E PROCESSUAL


CIVIL. BEM PÚBLICO DOMINICAL. LITÍGIO ENTRE PARTICULARES. INTERDITO
POSSESSÓRIO. POSSIBILIDADE. FUNÇÃO SOCIAL. OCORRÊNCIA. 1. Na ocupação de
bem público, duas situações devem ter tratamentos distintos: i) aquela em que o
particular invade imóvel público e almeja proteção possessória ou
indenização/retenção em face do ente estatal e ii) as contendas possessórias entre
particulares no tocante a imóvel situado em terras públicas. 2. A posse deve ser
protegida como um fim em si mesma, exercendo o particular o poder fático sobre
a res e garantindo sua função social, sendo que o critério para aferir se há posse
ou detenção não é o estrutural e sim o funcional. É a afetação do bem a uma
finalidade pública que dirá se pode ou não ser objeto de atos possessórias por um
particular. 3. A jurisprudência do STJ é sedimentada no sentido de que o
particular tem apenas detenção em relação ao Poder Público, não se cogitando de
proteção possessória. 4. É possível o manejo de interditos possessórios em litígio
entre particulares sobre bem público dominical, pois entre ambos a disputa será
relativa à posse. 5. À luz do texto constitucional e da inteligência do novo Código
Civil, a função social é base normativa para a solução dos conflitos atinentes à
posse, dando-se efetividade ao bem comum, com escopo nos princípios da
igualdade e da dignidade da pessoa humana. 6. Nos bens do patrimônio disponível
do Estado (dominicais), despojados de destinação pública, permite-se a proteção
possessória pelos ocupantes da terra pública que venham a lhe dar função social.
7. A ocupação por particular de um bem público abandonado/desafetado - isto é,
sem destinação ao uso público em geral ou a uma atividade administrativa -,
confere justamente a função social da qual o bem está carente em sua essência.
8. A exegese que reconhece a posse nos bens dominicais deve ser conciliada com
a regra que veda o reconhecimento da usucapião nos bens públicos (STF, Súm 340;
CF, arts. 183, § 3°; e 192; CC, art. 102); um dos efeitos jurídicos da posse - a
usucapião - será limitado, devendo ser mantido, no entanto, a possibilidade de
invocação dos interditos possessórios pelo particular. 9. Recurso especial não
provido.

Assim, temos em síntese que:

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Emerj CPIII-A Direito Administrativo

Particular invade imóvel público e Particular invade imóvel público e


deseja proteção possessória em face do deseja proteção possessória em face de
PODER PÚBLICO: OUTRO PARTICULAR:

 Não terá direito à proteção  Terá direito, em tese, à proteção


possessória; possessória;
 Não poderá exercer interditos  É possível o manejo de interditos
possessórios porque, perante o possessórios em litígio entre
Poder Público, ele exerce mera particulares
detenção. sobre bem público dominical, pois
entre ambos a disputa será relativa à
posse.

Ainda sobre o tema destaca-se importante julgado de 2018:

EREsp 1.134.446-MT: “Em ação possessória entre particulares é cabível o


oferecimento de oposição pelo ente público, alegando-se incidentalmente o
domínio de bem imóvel como meio de demonstração da posse.”

Os imóveis da Caixa Econômica Federal vinculados ao Sistema Financeiro de


Habitação podem ser adquiridos por usucapião?

NÃO!!! O critério legal adotado para fins de definição de bens públicos no ordenamento
brasileiro foi o subjetivo ou da titularidade dos bens, de forma que os bens de pessoas
jurídicas de direito privado, como os da empresa pública em análise, mesmo que
afetados a determinado serviço público, não seriam considerados bens públicos para
fins legais.

Em que pese a adoção legal do critério da titularidade, as prerrogativas dos bens


públicos, como a imprescritibilidade, devem ser estendidas aos bens privados das
empresas estatais atrelados à prestação de serviços públicos, tendo em vista o
princípio da continuidade destes, positivado na Lei nº 8.987/95 que regula o tema.

No sentido de considerar os bens como públicos de acordo com a finalidade de sua


atuação (critério material ou funcionalista) leciona Celso Antônio Bandeira de Mello:
“Todos os bens que estiverem sujeitos ao mesmo regime público deverão ser havidos
como bens públicos. Ora, bens particulares quando afetados a uma atividade pública
(enquanto estiverem) ficam submissos ao mesmo regime dos bens de propriedade
pública. Logo, tem que estar incluídos no conceito de bem público”.

Adotando esta corrente doutrinária, o STJ decidiu que:

RE 1.448.026/PE: “Mesmo uma empresa pública tipicamente exploradora de


atividade econômica, como a Caixa Econômica Federal, quando prestar serviços

40
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

públicos de viés incontestável deve titularizar os atributos que os bens públicos


ostentam, dentre os quais a imprescribitibilidade (art. 102 do Código Civil), de
forma que os bens vinculados ao sistema financeiro habitacional não poderiam ser
usucapidos. Nestes termos, a Ministra Nancy Andrighi conclui “o imóvel vinculado
ao Sistema Financeiro de Habitação, porque afetado à prestação de serviço
público, deve ser tratado como bem público, sendo, pois, imprescritível”.

Passemos ao estudo da última característica do bem público:

(IV) NÃO-ONERABILIDADE:

Não podem incidir sobre bens públicos nenhum tipo de ônus (daqueles previstos no
direito privado), notadamente direitos reais de garantia, ex. hipoteca. Essa
característica nada mais é do que consequência da característica da
impenhorabilidade.

Assim, a doutrina tradicional entende que o bem público não pode ser dado em garantia
real, não podendo ser hipotecado, dado em penhor, anticrese. Isso decorre do art.
1.420 do CC/02, que determina que apenas os bens que podem ser alienados podem
ser dados em garantia real. (Carvalho Filho, Maria Sylvia)

Os bens dominicias podem ser dados em garantia?

A matéria é objeto de divergência na doutrina. A corrente majoritária entende que os


bens dominicais não podem ser objeto de oneração.

Contudo, Rafael Oliveira, minoritariamente, entende que essa não seria a


interpretação mais adequada, pois o bem público domincal pode ser alienado, desde
que sejam satisfeitos os requisitos legais para a alienação. Pelo raciocínio do professor:
“se o poder público pode mais (alienar), pode menos (dar o bem em garantia)”.

Por fim, destaca-se que nada impede, porém, que um bem público sofra intervenções
promovidas por outros entes estatais. Um bem público estadual, por exemplo, pode
ser desapropriado pela União, pode ser tombado (o que cria um regime especial de
administração do bem visando à sua conservação) etc.

 BENS PRIVADOS AFETADOS A SERVIÇOS PÚBLICOS:

Tal situação irá ocorrer essencialmente nos contratos de concessão (de serviços
públicos, de serviços públicos precedidos de obra pública, patrocinada - PPP,
administrativa - PPP).

Nesses contratos de concessão, fala-se em bens reversíveis, ou seja, aqueles bens


utilizados pelo concessionário para prestar serviços públicos. Portanto, são bens
afetados ao serviço público ainda que pertençam a particulares. Ao final da concessão,

41
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

tais bens são incorporados ao patrimônio público. Em princípio, os bens reversíveis não
são indenizados, porque são amortizados ao longo da execução do contrato mediante
o pagamento da tarifa pelo usuário. Somente serão indenizados, após o termino do
prazo de concessão, caso comprovada a não amortização.

Tal afetação gera restrição também quanto à penhora. Um credor de uma


concessionária de serviço público não poderá penhorar o bem que esteja afetado à
prestação daquele serviço, sob pena de violar o princípio da continuidade do serviço
público, ainda que tal credor também seja um ente público.

Os bens reversíveis devem estar definidos precisamente no contrato para que não
sejam alienados no curso do contrato.

Em algumas concessões, não há transferência de propriedade para o concessionário,


mas mera administração do bem pelo concessionário, ex. concessão do metrô,
concessão da rodovia etc. Isso também tem que ser verificado contratualmente.

Casos Concretos:

Questão 1)

Cornélio invadiu há mais de dez anos certa terra devoluta, devidamente


discriminada e registrada, de propriedade do Estado X, e nela constituiu a sua
residência e a de sua família, sem qualquer oposição do Poder Público. Contudo, ao
verificar a intenção de seu antigo desafeto, Amarilídio, que estava realizando atos
preparatórios para a invasão do bem em questão, Cornélio ajuizou a ação
possessória pertinente com vistas a impedir o esbulho. Diante dessa situação
hipotética, é possível reconhecer proteção possessória em favor de Cornélio?
Descompatibilize eventuais controvérsias, à luz da orientação do C. STJ.

Resposta:

É possível reconhecer a proteção possessória em favor de Cronélio pois o STJ tem


assegurado a proteção possessória em um bem público quando particulares estão
disputando a posse do bem público.

Assim, é possível o manejo de interditos possessórios em litígio entre particulares sobre


bem público dominical, pois entre ambos a disputa será relativa à posse.

Em contrapartida, se o reconhecimento da proteção possessória for em face do Estado,


então, nesse caso, a jurisprudência do STJ é sedimentada no sentido de que o
particular tem apenas detenção em relação ao Poder Público, não se cogitando de
proteção possessória.

É o que se depreende do julgado abaixo transcrito:

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Emerj CPIII-A Direito Administrativo

REsp 1296964/DF (2016): “POSSE. DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. BEM PÚBLICO
DOMINICAL. LITÍGIO ENTRE PARTICULARES. INTERDITO POSSESSÓRIO.
POSSIBILIDADE. FUNÇÃO SOCIAL. OCORRÊNCIA. 1. Na ocupação de bem público,
duas situações devem ter tratamentos distintos: i) aquela em que o particular
invade imóvel público e almeja proteção possessória ou indenização/retenção em
face do ente estatal e ii) as contendas possessórias entre particulares no tocante
a imóvel situado em terras públicas. 2. A posse deve ser protegida como um fim
em si mesma, exercendo o particular o poder fático sobre a res e garantindo sua
função social, sendo que o critério para aferir se há posse ou detenção não é o
estrutural e sim o funcional. É a afetação do bem a uma finalidade pública que
dirá se pode ou não ser objeto de atos possessórias por um particular. 3. A
jurisprudência do STJ é sedimentada no sentido de que o particular tem apenas
detenção em relação ao Poder Público, não se cogitando de proteção possessória.
4. É possível o manejo de interditos possessórios em litígio entre particulares
sobre bem público dominical, pois entre ambos a disputa será relativa à posse.”

Questão 2)

A União vem cobrando os valores pertinentes (foros) sobre os aforamentos


constituídos em terrenos de marinha situados em determinada ilha costeira em que
há sede de Município, situação que atinge o bem em que Marcelo reside com sua
família há mais de vinte anos. Analise a constitucionalidade da cobrança efetuada,
mediante o apontamento da titularidade dos bens públicos em questão, de acordo
com a normas constitucionais pertinentes e em consonância com a orientação do C.
STF.

Resposta:

A cobrança feita pela União foi feita de forma correta e esta em consonância com o
entendimento jurisprudencial de que as ilhas costeiras em que situadas sede de
município continuam a ser terreno de marinha e, portanto, de propriedade da União,
na forma do art. 20, VII da CF.

Abaixo vejamos explicação do Dizer o Direito sobre o tema.

EXPLICAÇÃO DIZER O DIREITO


INFO 862 – ABRIL DE 2017

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Emerj CPIII-A Direito Administrativo

A EC 46/2005 não interferiu na propriedade da União, nos moldes do art. 20, VII, da
Constituição Federal, sobre os terrenos de marinha e seus acrescidos situados em ilhas
costeiras sede de Municípios. (RE 636199/ES).

A quem pertencem as ilhas?

ESPÉCIES DE ILHAS
FLUVIAIS E LACUSTRES OCEÂNICAS COSTEIRAS
Regra: pertencem aos Regra: pertencem à União. Regra: pertencem à União.
Estados. Exceção: dentro da ilha Exceção 1: dentro da ilha pode
Exceção: pertencem à União pode haver áreas que haver áreas que estejam no
se estiverem nas zonas estejam no domínio do domínio do Estado, do
limítrofes com outros países Estado, do Município ou de Município ou de terceiro
(art. 20, IV) terceiro particular. Neste particular. Neste caso,
caso, pertencem ao Estado, pertencem ao Estado, ao
ao Município ou ao terceiro. Município ou ao terceiro.
Ex: Fernando de Noronha, Exceção 2: se a ilha costeira
que é uma autarquia do for sede de Município, então,
Estado de PE. Em regra, neste caso, ela não pertence à
pertencem à União. União, salvo as áreas da ilha
afetadas ao serviço público ou
que forem unidade ambiental
federal.

A exceção 2 acima prevista para as ilhas costeiras foi instituída pela EC 46/2005.

Veja a mudança promovida pela emenda:

Redação originária da CF/88 Redação atual (dada pela EC 46/2005)


Art. 20. São bens da União: (...) Art. 20. São bens da União: (...)
IV - as ilhas fluviais e lacustres nas zonas IV - as ilhas fluviais e lacustres nas zonas
limítrofes com outros países; as praias limítrofes com outros países; as praias
marítimas; as ilhas oceânicas e as marítimas; as ilhas oceânicas e as costeiras,
costeiras, excluídas, destas, as áreas excluídas, destas, as que contenham a sede de
referidas no art. 26, II; Municípios, exceto aquelas áreas afetadas ao
serviço público e a unidade ambiental federal,
e as referidas no art. 26, II

Antes da EC 46/2005, a regra geral era a de que as ilhas costeiras pertenceriam à


União. Esta emenda criou uma exceção. Com a nova redação dada ao art. 20, IV, da
CF/88, não mais se pode presumir a propriedade da União sobre terras localizadas nas
ilhas costeiras em que contida sede de Município.

Antes da EC 46/2005, presumia-se que toda a ilha costeira pertencia à União. Agora
não mais. A propriedade da União sobre determinada área localizada dentro de ilha
costeira sede de Município depende da existência de outro título para legitimá-la.

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Exemplos de Municípios que se localizam em ilhas costeiras: São Luís, Florianópolis e


Vitória.

Terrenos de marinha são “todos aqueles que, banhados pelas águas do mar ou dos rios
e lagoas navegáveis (estes últimos, exclusivamente, se sofrerem a influência das
marés, porque senão serão terrenos reservados), vão até a distância de 33 metros para
a parte da terra contados da linha do preamar médio, medida em 1831”.

Os terrenos de marinha são bens da União (art. 20, VII, da CF/88). Isso se justifica por
se tratar de uma região estratégica em termos de defesa e de segurança nacional (é a
“porta de entrada” de navios mercantes ou de guerra).

José dos Santos Carvalho Filho explica que, em algumas regiões, a União permitiu que
particulares utilizassem, de forma privada, imóveis localizados em terrenos de
marinha. Como essas áreas pertencem à União, o uso por particulares é admitido pelo
regime da enfiteuse (aforamento), que funciona, em síntese, da seguinte forma:

A União (senhorio direto) transfere ao particular (enfiteuta) o domínio útil; o


particular (enfiteuta) passa a ter a obrigação de pagar anualmente uma importância a
título de foro ou pensão.

Como ficou a situação dos terrenos de marinha em ilhas costeiras sedes de


Municípios após a EC 46/2005?

Quando a EC 46/2005 foi editada surgiu um debate acerca de sua influência sobre os
terrenos de marinha.

Como vimos acima, os terrenos de marinha pertencem à União (art. 20, VII, da CF/88).

No entanto, surgiu uma corrente defendendo que, por força da EC 46/2005, se o


terreno de marinha estiver situado dentro da ilha costeira, então neste caso ele teria
deixado de ser terreno de marinha e teria passado a pertencer ao Município.

Mais uma vez recorremos à lição de Carvalho Filho: "A nova redação do art. 20, IV, tem
suscitado interpretações divergentes quanto à situação dos terrenos de marinha
situados nas ilhas costeiras. Uma delas reside em que o citado dispositivo teria excluído
tais áreas do patrimônio da União, sendo elas repassadas ao Município, o que geraria a
extinção das enfiteuses e ocupações legítimas de terrenos nelas situadas."

Essa tese foi acolhida pelo STF? Os terrenos de marinha situados em ilhas costeiras
que forem sede de Município deixaram de pertencer à União?

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Emerj CPIII-A Direito Administrativo

NÃO!! A EC 46/2005 não interferiu na propriedade da União, nos moldes do art. 20,
VII, da Constituição Federal, sobre os terrenos de marinha e seus acrescidos situados
em ilhas costeiras sede de Municípios. RE 636199/ES, Rel. Min. Rosa Weber, julgado
em 27/4/2017 (repercussão geral) (Info 862).

Uma interpretação sistemática do texto constitucional conduz à conclusão de que a


alteração introduzida no inciso IV do art. 20 pela EC 46/2005 não teve a intenção de
mudar a propriedade dos terrenos de marinha que continuaram previstos normalmente
no inciso VII como sendo bens da União.

Os terrenos de marinha e seus acrescidos, do ponto de vista histórico, já integravam o


rol de bens da União, mesmo antes de as ilhas costeiras passarem a compor o
patrimônio federal.

Em outras palavras, algumas Constituições não previram as ilhas costeiras como sendo
bens da União. No entanto, já diziam que os terrenos de marinha pertenciam ao ente
federal. Assim, por exemplo, os terrenos de marinha e seus acrescidos situados na ilha
costeira em que está sediado o Município de Vitória (ES) continuam sendo bens
federais.

Questão 3)

Adroaldo ajuizou ação de usucapião extraordinária, visando a regularizar a situação


do imóvel que ocupa, sob o fundamento de que detém a posse mansa e pacífica de
tal bem, como se dono fosse, há mais de 20 anos. O Cartório do Registro de Imóveis
informou a inexistência de registro do terreno, em razão do que o Procurador do
Estado em que situado o imóvel pugnou pela rejeição do pedido de usucapião, ao
argumento de que se trata de terra devoluta. Diante dessa situação hipotética,
analise se existe presunção em favor do Poder Público no sentido de que a terra é
devoluta, em decorrência da inexistência de registro imobiliário. Enfrente, ainda,
a natureza jurídica da terra devoluta, bem como quem é o seu proprietário.

Resposta:

Terras Devolutas são áreas que integrando o patrimônio das pessoas federativas, nao
são utilizadas para quaisquer finalidades públicas específicas, tendo natureza de bens
públicos dominicais.

A regra é que as terras devolutas pertencem ao Estado (art. 26, IV da CF), mas a CF
atribui à União “as terras devolutas indispensáveis à defesa das fronteiras, das
fortificações e construções militares, das vias federais de comunicação e à preservação
ambiental, definidas em lei (art. 20, II da CF).

Existe presunção de domínio público na ausência de menção quanto ao seu


proprietário no Registro de Imóveis?

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Emerj CPIII-A Direito Administrativo

Este tema é polêmico existindo divergência. Contudo, as decisões mais recentes do


STJ e do STF defendem que não há presunção em favor do Estado de que o bem seja
público e, portanto, não há óbice à usucapião. Cabe ao Estado o ônus da prova de que
é titular do terreno/bem objeto da controvérsia.

REsp 964223: “DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. USUCAPIÃO. IMÓVEL URBANO.


AUSÊNCIA DE REGISTRO ACERCA DA PROPRIEDADE DO IMÓVEL. INEXISTÊNCIA DE
PRESUNÇÃO EM FAVOR DO ESTADO DE QUE A TERRA É PÚBLICA. 1. A inexistência
de registro imobiliário do bem objeto de ação de usucapião não induz presunção
de que o imóvel seja público (terras devolutas), cabendo ao Estado provar a
titularidade do terreno como óbice ao reconhecimento da prescrição aquisitiva.
2. Recurso especial não provido.”

AgRg no AREsp 692824: “AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL.


PROCESSUAL CIVIL. IMÓVEL. USUCAPIÃO. FAIXA DE FRONTEIRA. POSSIBILIDADE.
TERRA DEVOLUTA. PRESUNÇÃO. INEXISTÊNCIA. TITULARIDADE. UNIÃO. ÔNUS DA
PROVA. SÚMULA Nº 83/STJ. 1. A jurisprudência desta Corte Superior é firme no
sentido de que as terras situadas em faixa de fronteira não são, por si só, terras
devolutas, cabendo à União o encargo de provar a titularidade pública do
bem. 2. Estando o acórdão recorrido em consonância com o entendimento do
Superior Tribunal de Justiça, incide o disposto na Súmula nº 83/STJ. 3. Agravo
regimental não provido.”

Tem que analisar bem o caso concreto e mostrar a divergência sobre o tema. Ex. Em
uma área urbana densamente povoada, se sobrar uma área pequena entre uma
propriedade registrada e outra, não há presunção de que seja bem público.
Diferentemente, em uma floresta, há tal presunção, visto que tais áreas jamais foram
registradas por particulares.

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Aula 3 – Prof. Valter Shuenquener


5/10/18

EMENTA:  Bens Públicos II:


 Gestão dos bens públicos.
 Uso privado dos bens públicos.
 Aquisição de bens públicos.
 Alienação de bens públicos.

 GESTÃO DOS BENS PÚBLICOS:

Importante destacar que a utilização do bem público pode ser dividida em 3 categorias:

(i) Uso Comum:


(ii) Uso Especial; e
(iii) Uso Privativo.

Passemos à analise de cada uma dessas formas de utilização do bem público:

(i) Uso Comum: hipótese pela qual pode ser utilizado por todos os indivíduos,
sem qualquer distinção ou sem nenhuma exigência especifica. É o que
acontece com os bens de uso comum do povo. Ex: ruas, praias e praças.

A utilização comum pode ser dividida em duas espécies:

 Ordinária/Normal: compatível com a própria destinação daquele


bem (ex.: usar uma rua p/ passagem de veículos); e

 Extraordinária/Anormal: quando há a fixação de exigências para


que o bem público possa ser utilizado (ex.: pedágios em vias
públicas), ou quando se dá uma destinação diversa para aquele bem
(ex.: fechamento da rua p/ festa junina.)

(ii) Uso Especial: destinado à própria administração pública ou a determinados


indivíduos que preencham certos requisitos legais. Ex: bem público de uso
especial: escola pública, praia

Os bens públicos de uso especial, destinados a um serviço específico da


Administração, também podem ser de:

 Uso Comum: não existe nenhuma restrição ao acesso, ex. prédio de


repartição pública com acesso livre; museu público que não cobra
ingresso.

48
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

 Uso Especial: existe restrição ao acesso, ex. prédio de repartição


pública em que se exige apresentação da identificação; museu
público em que se cobra ingresso

(iii) Uso Privativo: ocorre nas situações em que o Poder Público expressamente
consente/concorda com a utilização de um bem público de forma privativa,
por um particular. Ex.: permissão para instalação de banca de jornal em via
pública. Autorização para bar instalar mesa nas calçadas.

 USO PRIVATIVO DOS BENS PÚBLICOS:

Se o bem é público, a princípio, não é possível seu uso privativo por particulares. Logo,
a utilização privativa dos bens públicos por particulares é situação excepcional, que
sempre exigirá uma titulação específica.

O Poder Público pode, em alguns casos, autorizar, permitir, conceder, ceder, o uso
privativo de determinado bem jurídico à pessoa física ou jurídica de direito privado.
Para que isso ocorra, é necessária a elaboração de um instrumento jurídico especifico.

O uso privativo dos bens públicos pode ser dividido em:

(i) Uso Privativo do Bem Público por Instrumento Público:

Qualquer bem público, seja ele de uso comum, de uso especial ou dominical, é possível
à administração pública outorgar a particulares determinados o seu uso privativo. A
outorga sempre exigirá um instrumento formal, sujeito ao juízo de oportunidade e
conveniência da Administração Pública, podendo ser feita mediante remuneração pelo
particular ou não.

Os principais instrumentos de direito público para formalizar o uso privativo de bem


público são os seguintes:

1. Autorização;
2. Permissão;
3. Concessão; e
4. Cessão de Uso.

(ii) Uso Privativo do Bem Público por Instrumento do Direito Privado:

Os principais instrumentos do direito privado para formalizar o uso privativo de bem


público são os seguintes:

1. Enfiteuse;
2. Locação; e
3. Comodato.

49
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

Abaixo vejamos cada uma dessas modalidades de uso privativo de bem público:

(i) USO PRIVATIVO DO BEM PÚBLICO POR INSTRUMENTO PÚBLICO:

Quais características devem ser observadas nas situações de uso privativo dos bens
públicos?

Algumas características comuns devem ser observadas em toda e qualquer situação de


uso privativo, destacando-se:

 O particular só poderá usar o bem de acordo com o interesse público


(compatibilidade com o interesse público);
 Tem que haver um ato de consentimento do poder público;
 Cumprimento pelo particular dos requisitos estabelecidos na legislação;
 Tem como regra a remuneração – o particular deverá remunerar o poder público
(regra);
 Precariedade como regra geral – ou seja, poderia o poder público requerer, a
qualquer momento, a retomada do bem.

Feita essa introdução inicial, passemos ao estudo de cada uma dessas formas de uso
privativo do bem público por instrumento público:

1. AUTORIZAÇÃO DE USO DE BEM PÚBLICO:

A autorização de uso de bem público é um ato administrativo discricionário e precário


editado pelo Poder Público, que tem por objetivo o consentimento para que uma
pessoa venha utilizar privativamente do bem público, desde que respeitadas os
requisitos legais e as condições firmadas.

Na autorização de uso, a relação é precária e discricionária. Por isso, não há direito


subjetivo do indivíduo, à permanência daquela autorização.

Como regra geral, independe de licitação e pode ser revogado a qualquer momento
(discricionário e precário).

Exemplos:
 Autorização de utilização de rua para festa;
 Barraca na rua para venda de produtos;
 Autorização para instalação de mesas na calçada.

#CONCEITO “AUTORIZAÇÃO DE USO DE BEM PÚBLICO”: PROVA ORAL

50
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

 “A autorização de uso é um ato negocial, unilateral e discricionário, em que


a Administração Pública faculta ao particular, de forma precária, a
utilização do bem público com exclusividade.”
 A autorização poderá ser:
(i) Simples: quando não há um prazo de duração (não há exigência de
licitação); ou
(ii) Qualificada: quando há um prazo determinado para a utilização do
bem público (depende de licitação).
 Caso o Poder Público fixe um prazo na autorização, retirará o caráter de
precariedade, e poderá sujeitar-se a indenizar o particular, caso revogue
antes do prazo, em razão do Princípio da Boa-Fé e Princípio da Confiança
Legítima.
 Via de regra, a autorização de uso é realizada sem licitação, e a utilização
do bem se dá em razão de interesse predominantemente privado, como por
exemplo, autorização da instalação de mesas na calçada.

1.1. Autorização de Uso Urbanística:

A autorização de uso urbanistica é tratada na MP 2.220/2001, estabelece alguns atos


de consentimento, fala de autorização de uso, e, em seu art. 9o (que teve redação
alterada pela MP 759/2016) estabelece que:

Art. 9o da MP 2.220/2001: “É facultado ao poder público competente conceder


autorização de uso àquele que, até 22 de dezembro de 2016, possuiu como seu,
por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, até duzentos e cinquenta
metros quadrados de imóvel público situado em área com características e
finalidade urbanas para fins comerciais.
§ 1o A autorização de uso de que trata este artigo será conferida de forma
gratuita.
§ 2o O possuidor pode, para o fim de contar o prazo exigido por este artigo,
acrescentar sua posse à de seu antecessor, contanto que ambas sejam contínuas.”

Temos, basicamente, uma tentativa de solução para a imprescritibilidade. Pequenas


propriedades públicas que são ocupadas por pessoas, de longa data, e, essas pessoas,
a princípio, não poderiam se satisfazer/adquirir a propriedade pela usucapião.

A saída encontrada pelo legislador foi a de reconhecer o direito do particular de


permanecer neste bem público, não como proprietário (porque não é passível de
usucapião), mas sim como autorização de uso urbanística, de modo que o possuidor
goze de certa tutela – e permaneça no bem.

Alguns autores dizem que se trata de ato vinculado e não discricionário, uma vez que
a lei traz requisitos objetivos no art. 9º. Contudo, para a maioria, trata-se de ato
discricionário, em razão da própria redação do art. 9º (“é facultado”).

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Emerj CPIII-A Direito Administrativo

2. PERMISSÃO DE USO DE BEM PÚBLICO:

A permissão de uso de bem público é instituto muito semelhante da autorização de uso


de bem público. Apresenta, em princípio as mesmas características da autorização,
sendo um ato administrativo discricionário e precário.

Pode ser revogada a qualquer tempo, sem indenização (como regra), e a edição da
permissão não precisa de licitação.

#CONCEITO “PERMISSÃO DE USO DE BEM PÚBLICO”: PROVA ORAL


 A permissão de uso é ato negocial, unilateral e discricionário, em que a
Administração Pública consente na utilização pelo particular de um bem
público no interesse público e também no coletivo.
 Caso conferida a permissão de uso, o particular não possui faculdade, mas
sim obrigação de utilizar o bem, pois há um interesse predominantemente
público, como por exemplo, a exploração de bancas de jornais.

A doutrina majoritária tenta estabelecer uma diferenciação entre a permissão e


autorização.

Qual a diferença entre autorização de uso de bem público e permissão de uso de


bem público?

Para a doutrina tradicional, apesar das características acima citadas serem idênticas
para ambos os institutos, prevalece a seguinte diferença:

 Autorização de Uso: prevalece o interesse do autorizatário, do próprio


particular – o interesse público seria satisfeito de maneira indireta.

 Permissão de Uso: o interesse privado do permissionário e o interesse público


seriam satisfeitos com igual intensidade.

(*) Rafael Oliveira entende que essa distinção não tem nenhuma relevância prática,
uma vez serem absolutamente similares ambos os institutos. Para o professor, a
autorização e a permissão seriam fungíveis. E, na prática, ambas teriam o mesmo
tratamento.

Qual a diferença entre (i) permissão de uso de bem público e (ii) permissão de
serviço público?

Quando dizemos que a permissão de uso de bem público é um ato discricionário e


precário, falamos especificamente em relação ao uso de bem público. Não podemos
confundir a permissão de uso de bem público com a permissão de serviços públicos.

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Emerj CPIII-A Direito Administrativo

Os institutos se diferenciam quanto ao objeto, e quanto ao instrumento a ser realizado.


Na concessão de serviço público, celebra-se um contrato (art. 175, §único da CRFB e
Lei 8.666/93). E trata da prestação de serviço público.

E na permissão de uso de bem público, edita-se um ato discricionário e precário e trata


exclusivamente do uso de bem público.

 Autorização de Uso e Permissão de uso Qualificadas (Condicionadas):

Como regra geral, a permissão e a autorização são atos administrativos discricionários


e precários. Mas, em alguns casos, a doutrina fala em autorização e permissão de uso
condicionadas, nos quais o próprio poder público estabelece restrições, condições,
prazos, direitos e obrigações. Assim, ao estabelecer direitos e obrigações, o poder
público se vincula.

Nesse sentido, ao contrário das autorizações/permissões tradicionais, as


autorizações/permissões condicionadas se assemelhariam mais a um contrato. Ideia
que decorre do art. 2o, §único da Lei 8.666/93: “seja qual for a denominação
utilizada”.

Tem prevalecido na doutrina que, apesar de na autorização ou permissão de uso de


bem público simples, não ser obrigatória a ocorrência de licitação, deve ser respeitado
o princípio da impessoalidade – deve estabelecer um procedimento simplificado que
garanta a impessoalidade à todos aqueles interessados.

Já na autorização/permissão condicionadas, por serem tratadas como contrato


administrativo, a licitação passa a ser uma exigência.

Além disso, se o poder público resolve descumprir as obrigações impostas,


revogando/rescindindo o contrato, terá que indenizar o particular.

É passível indenização no caso de revogação de uma permissão qualificada?

A doutrina diverge sobre o tema. Vejamos:

CORRENTE 1) Para a corrente majoritária, a revogação antes do prazo gera direito à


indenização somente pelos danos emergentes.

CORRENTE 2) Corrente minoritária defende que a revogação antes do prazo gera direito
à indenização pelos danos emergentes e pelos lucros cessantes (Celso Antônio Bandeira
de Melo).

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Autorização/Permissão de uso de Autorização/Permissão de uso


bem público SIMPLES de bem público CONDICIONADA
Licitação Não tem licitação, uma vez que se É exigida licitação, uma vez que
trata de ato discricionário e são tratadas como contratos.
precário
Indenização Por ser precária, pode ser revogada A indenização é uma regra, se
a qualquer tempo, sem a exigência houver descumprimento dos
do pagamento de indenização. termos e condições.

3. CONCESSÃO DE USO DE BEM PÚBLICO:

A concessão de uso de bem público NÃO se confunde com a concessão de serviço


público.

Na concessão de uso de bem público, o objeto é a utilização do bem – é o


consentimento para que o particular se utilize privativamente de um bem público. Na
concessão de serviços públicos, o objeto é que a empresa privada preste serviços
públicos.

Tanto a concessão de uso de bem público, quanto a concessão de serviços públicos,


são contratos.

Ex.: Riocentro no RJ: contrato de concessão de uso de bem público.

É contrato, pressupõe licitação, prazo máximo e, se houver descumprimento, surgirá


o dever de indenizar pelo Estado, pelos prejuízos sofridos.

#CONCEITO “CONCESSÃO DE USO DE BEM PÚBLICO”: PROVA ORAL


 A concessão de uso de bem público é instrumento para que o particular possa
usar o bem público temporariamente, em caráter privado.
 A concessão de uso de bem público é contrato administrativo bilateral,
portanto se dá mediante licitação, pelo qual o Poder Público outorga o uso
privativo de bem público a particular mediante um prazo determinado.
 A concessão de uso de bem público poderá ser gratuita ou remunerada, por
prazo certo ou por prazo indeterminado.
 Se na concessão por prazo determinado houver a rescisão antecipada, pode
ensejar o dever de indenizar, desde que não haja culpa por parte do
concessionário.
 Qualquer tipo de bem público poderá ser objeto de concessão de uso,
inclusive o bem de uso comum do povo.
 Exemplos: cantinas de escola, dependências dos aeroportos, sepulturas de
cemitérios, estações de rodoviárias.

Existem várias subespécies de concessão de uso de bem público, quais sejam:

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(i) Concessão de Direito Real de Uso de Bem Público;


(ii) Concessão de Uso Especial para Fins de Moradias; e
(iii) Concessão Florestal.

Vejamos, abaixo, cada uma dessas subespécies de concessão de uso de bem público:

(i) CONCESSÃO DE DIREITO REAL DE USO DE BEM PÚBLICO:

A concessão de uso de direito real encontra-se prevista no DL 271, nos arts. 7 e 8.

Art. 7 do Dec.Lei 271: “É instituída a concessão de uso de terrenos públicos ou


particulares remunerada ou gratuita, por tempo certo ou indeterminado, como
direito real resolúvel, para fins específicos de regularização fundiária de interesse
social, urbanização, industrialização, edificação, cultivo da terra,
aproveitamento sustentável das várzeas, preservação das
comunidades tradicionais e seus meios de subsistência ou outras modalidades de
interesse social em áreas urbanas.
§1 - A concessão de uso poderá ser contratada, por instrumento público ou
particular, ou por simples têrmo administrativo, e será inscrita e cancelada em
livro especial.
§ 2 - Desde a inscrição da concessão de uso, o concessionário fruirá plenamente do
terreno para os fins estabelecidos no contrato e responderá por todos os encargos
civis, administrativos e e tributários que venham a incidir sôbre o imóvel e suas
rendas.
§ 3 - Resolve-se a concessão antes de seu têrmo, desde que o concessionário dê ao
imóvel destinação diversa da estabelecida no contrato ou têrmo, ou descumpra
cláusula resolutória do ajuste, perdendo, neste caso, as benfeitorias de qualquer
natureza.
§ 4 - A concessão de uso, salvo disposição contratual em contrário, transfere-se
por ato inter vivos, ou por sucessão legítima ou testamentária, como os demais
direitos reais sôbre coisas alheias, registrando-se a transferência.
§ 5 - Para efeito de aplicação do disposto no caput deste artigo, deverá ser
observada a anuência prévia:
I - do Ministério da Defesa e dos Comandos da Marinha, do Exército ou da
Aeronáutica, quando se tratar de imóveis que estejam sob sua administração; e
II - do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência de República,
observados os termos do inciso III do § 1o do art. 91 da Constituição Federal.”

Art 8 do DL 271: “É permitida a concessão de uso do espaço aéreo sôbre a


superfície de terrenos públicos ou particulares, tomada em projeção vertical, nos
têrmos e para os fins do artigo anterior e na forma que fôr regulamentada.”

Percebe-se que os arts. 7o e 8o tratam especificamente da concessão de direito real de


uso de bem público, sendo o decreto lei 271 uma regulamentação própria.

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(ii) CONCESSÃO DE USO ESPECIAL PARA FINS DE MORADIA:

A concessão de uso especial para fins de moradia está prevista nosta na MP 2.220/2001.

Art. 1 da MP 2.200/2001: “Aquele que, até 22 de dezembro de 2016, possuiu como


seu, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, até duzentos e cinquenta
metros quadrados de imóvel público situado em área com características e
finalidade urbanas, e que o utilize para sua moradia ou de sua família, tem o
direito à concessão de uso especial para fins de moradia em relação ao bem objeto
da posse, desde que não seja proprietário ou concessionário, a qualquer título, de
outro imóvel urbano ou rural.
§ 1 - A concessão de uso especial para fins de moradia será conferida de forma
gratuita ao homem ou à mulher, ou a ambos, independentemente do estado civil.
§ 2 - O direito de que trata este artigo não será reconhecido ao mesmo
concessionário mais de uma vez.
§ 3 - Para os efeitos deste artigo, o herdeiro legítimo continua, de pleno direito,
na posse de seu antecessor, desde que já resida no imóvel por ocasião da abertura
da sucessão.”

Quais os requisitos para a concessão de uso especial para fins de moradia ?

Destacam-se entre os requisitos para a concessão de uso especial para fins de moradia:

 Posse;
 Por 5 anos no mínimo, até 22/12/2016;
 De um bem imóvel público, situado em área urbana (com até 250 m2); e
 Desde que o indivíduo não seja proprietário ou concessionário, a qualquer
título, de outro imóvel urbano ou rural.

Quais as principais características da concessão de uso especial para fins de


moradia?

A concessão de uso especial para fins de moradia tem como principais características:

 Gratuita;
 Não pode ser reconhecida ao mesmo concessionário mais de uma vez;
 Proteção ao herdeiro – direito que passa via sucessão.

O art. 2o da MP 2.220/01 trata ainda da Concessão de Uso Especial para Fins de


Moradia em Caráter Coletivo para população de baixa renda

Art. 2 da MP 2.220/01: “Nos imóveis de que trata o art. 1o, com mais de duzentos
e cinquenta metros quadrados, ocupados até 22 de dezembro de 2016, por
população de baixa renda para sua moradia, por cinco anos, ininterruptamente e

56
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sem oposição, cuja área total dividida pelo número de possuidores seja inferior a
duzentos e cinquenta metros quadrados por possuidor, a concessão de uso especial
para fins de moradia será conferida de forma coletiva, desde que os possuidores
não sejam proprietários ou concessionários, a qualquer título, de outro imóvel
urbano ou rural.
§ 1- O possuidor pode, para o fim de contar o prazo exigido por este artigo,
acrescentar sua posse à de seu antecessor, contanto que ambas sejam contínuas.
§ 2 - Na concessão de uso especial de que trata este artigo, será atribuída igual
fração ideal de terreno a cada possuidor, independentemente da dimensão do
terreno que cada um ocupe, salvo hipótese de acordo escrito entre os ocupantes,
estabelecendo frações ideais diferenciadas
§ 3 - A fração ideal atribuída a cada possuidor não poderá ser superior a duzentos
e cinqüenta metros quadrados.

(iii) CONCESSÃO FLORESTAL:

A Concessão Florestal está prevista na Lei 11. 284/2006

A concessão florestal é, basicamente, uma autorização onerosa do direito de praticar


o manejo florestal para a exploração de produtos e serviços à pessoa jurídica que
atenda as condições no edital de licitação.

Trata-se de concessão para gestão de bem público imóvel (floresta) que deve ser
devolvido ao Poder Público no fim do contrato.

Quais as principais características que as licitações e contratos de concessão


florestal apresentam?

Entre as principais características dos contratos de concessão florestal destacam-se:

 Concessão será sempre onerosa;


 Será sempre precedida de licitação na modalidade de concorrência;
 Necessidade de licenciamento ambiental;
 Apenas PJs constituídas sobre as leis brasileiras e que tenham sede no país
poderão participar da licitação;
 O prazo dos contratos relaciona-se com o ciclo da colheita, na forma do art.
35, caput e parágrafo único da Lei 11.284 (mínimo 5 anos e no máximo 20 anos).

#DICA: COMO DIFERENCIAR AUTORIZAÇÃO & PERMISSÃO & CONCESSÃO:


A doutrina faz uma avaliação da relação grau de interesse público x grau de
interesse do particular, como também do investimento a ser feito, para verificar se
é caso de autorização, permissão ou concessão.
 Se o interesse preponderante for do particular, é caso de autorização de
uso. Há um investimento menor e costuma ter prazo mais curto.

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 Se há um equilíbrio entre interesse público e o privado, é caso de permissão


de uso. Há um investimento considerável e costuma ter prazo razoável.
 Se há prevalência do interesse público sobre o privado, é caso de concessão
de uso (doutrina majoritária). Exige maior investimento e,
consequentemente, prazo maior para sua amortização. Para José dos Santos
Carvalho Filho, na concessão de uso, não importa se o interesse que desponta
é o do particular ou o da Administração. Ele se volta mais ao investimento
realizado. Trata-se de direito pessoal.

Para fins de fixação da matéria vejamos abaixo a seguinte tabela:

De uso de bem público De serviço público


Autorização Ato administrativo Ato administrativo
Permissão Ato administrativo Contrato administrativo
(art. 40 da Lei 8.987/95)
Concessão Contrato administrativo Contrato administrativo

4. CESSÃO DE USO DE BEM PÚBLICO:

Não há um consenso doutrinário em relação à conceituação da cessão de uso de bem


público.

Parte da doutrina utiliza a expressão cessão de uso de bem público como gênero, de
modo a englobar autorização, permissão e concessão [transferência, ainda que
temporária, do bem para um terceiro].

Outros tem uma visão intermediária, pela qual a expressão cessão diz respeito à cessão
de uso de bem público para outro órgão ou entidade administrativa, ou apenas para
pessoas de direito privado sem fins lucrativos. Posição prevalente.

E outros autores, de forma mais restrita, utilizam a expressão cessão de uso de bem
público apenas quando da transferência entre as entidades administrativas (da
Administração Direta ou Indireta). José Santos Carvalho Filho entende ser possível
também a cessão de uso para particulares sempre que evidenciado o interesse público.
A cessão de uso pode ser gratuita ou onerosa.

A questão da cessão aparece regulada na Lei 9636/1998, que, no art. 18, prevê a cessão
gratuita ou em condições especiais, de cessão de bens públicos federais para estados
e municípios e para entidades sem fins lucrativos de atividade educacional, etc.
Também prevê a cessão de uso de bem público entre entes privados – pessoas físicas
ou jurídicas, que atuem no interesse social. No art. 18, não se fala em ausência de
atividade lucrativa.

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Concluído o estudo do uso privativo de bem público por instrumento de direito público,
passemos a analisar os instrumentos jurídicos de direito privado que permitem o uso
privativo do bem público.

(ii) USO PRIVATIVO DE BEM PÚBLICO POR INSTRUMENTO DE DIREITO PRIVADO:

Além dos instrumentos de direito público acima citados (autorização/ permissão/


concessão e cessão), o ordenamento jurídico admite que o uso privativo dos bens
públicos seja viabilizado por instrumentos jurídicos de direito privado, a saber:
enfiteuse, locação e comodato.

A competência para legislar sobre Direito Civil é da União, mas todos os Entes podem
utilizá-los para transferir o uso privativo de seus bens a terceiros.

1. ENFITEUSE OU AFORAMENTO:

O instituto da enfiteuse está previsto no art. 2.038, §2º do CC, bem como no DL
9.760/46 e art. 49, §3º do ADCT.

A enfiteuse ou aforamento é forma por meio do qual o Ente Federado (senhorio direto
que mantém o domínio direto) transfere a outrem (enfiteuta ou foreiro) o uso do bem
público (domínio útil), mediante o pagamento do foro anual.

Após o CC/02, não se podem criar novas enfiteuses, mas se mantêm em vigor àqueles
que já existiam (art. 2038 do CC). É outra forma de utilização do bem público pelo
particular.

Em âmbito federal, o foro anual equivale a 0,6% sobre o valor do domínio pleno e o
inadimplemento por 3 anos consecutivos, ou 4 anos intercalados, importará na
caducidade da enfiteuse.

A transferência onerosa, entre vivos, do domínio útil e da inscrição de ocupação de


terreno da União depende do prévio recolhimento do laudêmio pelo vendedor, em
quantia correspondente a 5 % do valor atualizado do domínio pleno do terreno,
excluídas benfeitoriais.

2. LOCAÇÃO DE BEM PÚBLICO:

A locação é contrato de direito privado que tem por objetivo transferir a posse direta
do bem de propriedade do locador ao locatário, mediante o pagamento de
remuneração (aluguel).

O art. 1, p.u, a, 1 da Lei 8.245/91, a Lei de Locações não é aplicável aos contratos de
locação de imóveis de propriedade da União, dos Estados e dos Municípios, de suas
autarquias e fundações públicas que continuam reguladas pelo CC.

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Em relação aos bens públicos federais o contrato de locação está previsto nos arts. 64,
par. 1 e 86 a 98 do DL 9760/46 que estabelecem a possibilidade de locação dos imóveis
federais para residência de autoridades federais ou de outros servidores federais e,
eventualmente, para outros interessados.

É a locação compatível com a transferência do uso privativos dos bens públicos?

Apesar da previsão legal do contrato de locação de bens públicos, a doutrina diverge


sobre a sua viabilidade jurídica, existindo duas correntes sobre o tema:

CORRENTE 1) Corrente defendida por José dos Santos Carvalho Filho entende que os
bens públicos podem ser locados a terceiros na forma do CC e da legislação especial.

CORRENTE 2) Corrente defendida por Diogo de Fiegueiredo, Hely Lopes e outros


entende que o uso privativo de bens públicos deve ser instrumentalizado por institutos
de direito público, sendo inadmissível a locação de referidos bens.

Na mesma linha da corrente 2, o STJ entende que, ainda que a Administração dê o


nome de locação a determinado contrato, a natureza jurídica é de contrato de
concessão de uso remunerado e bem público, ou seja, um contrato administrativo, ao
qual não se aplicam as normas da Lei 8.245 ou as normas do CC.

Atenção!!! Tais assertivas valem quando a Administração é locadora e não quando ela
é locatária, caso em que será aplicada a Lei de Locações.

3. COMODATO DE BEM PÚBLICO:

O comodato é contrato do direito privado que tem por objetivo emprestar,


gratuitamente, coisas fungíveis (art. 579 do CC). Ao contrário do contrato de locação,
que é caracterizado pela onerosidade, o comodato é gratuito.

É o comodato compatível com a transferência do uso privativos dos bens públicos?

A doutrina diverge sobre a sua viabilidade jurídica, existindo duas correntes sobre o
tema:

CORRENTE 1) Corrente defendida por José dos Santos Carvalho Filho entende que os
bens públicos podem ser objeto de comodato a terceiros na forma do CC.

CORRENTE 2) Corrente defendida por Diogo de Fiegueiredo, Hely Lopes e outros


entende que o uso privativo de bens públicos deve ser instrumentalizado por institutos
de direito público, não sendo admissível o comodato de bens públicos.

60
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

 AQUISIÇÃO DE BENS PÚBLICOS:

Quanto aos bens públicos, temos formas de aquisição originária ou derivada.

Na aquisição originária, não há transferência de domínio entre proprietário anterior e


proprietário posterior.

Na aquisição derivada, existe essa transferência, gratuita ou onerosa.

Sendo originária, o novo proprietário recebe a propriedade do bem livre de quaisquer


ônus ou encargos. Sendo derivada, não.

Vejamos abaixo as principais formas de aquisição de bens públicos:

(i) CONTRATOS:

Em regra, a Administração Pública, para adquirir ou alienar bens, tem que fazer
licitação prévia, excetuados os casos de dispensa/inexigibilidade de licitação.

Na dispensa, a licitação em tese é possível, mas a lei deu ao administrador a faculdade


de não realizá-la.

Na inexigibilidade, a competição é impossível e, portanto, não pode haver licitação.

(ii) USUCAPIÃO:

A Administração pode adquirir propriedade por usucapião. Muitos autores criticam tal
forma de aquisição, sob o argumento de que fere a moralidade administrativa.

Na desapropriação indireta, quando a Administração ocupa imóvel particular sem


observar os procedimentos legais para a desapropriação, para a maioria da doutrina,
cabe defesa possessória por parte do proprietário, desde que ainda não tenha havido
afetação do bem ao interesse público. Depois que houver a referida afetação, qualquer
questão se resolverá em perdas e danos. Portanto, pode-se falar em usucapião por
parte da Administração.

O Des. Jessé Torres entende que a nomenclatura desapropriação indireta é imprópria,


pois não se trata de modalidade de desapropriação, mas sim uma ilegalidade diante
da não observância do procedimento da licitação. Sendo assim, para que a
Administração adquira a propriedade do bem, o fará mediante usucapião.

Diferentemente, o particular não pode usucapir bem público, pois uma de suas
características é a imprescritibilidade – não cabe prescrição aquisitiva de bem público.

PEGADINHA EM CONCURSO!!
Pode haver usucapião no bem público?

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Sim, desde que haja um desmembramento do domínio.

Exemplo:
Enfiteuse – a Administração Pública é a proprietária do bem, enquanto o particular
enfiteuta tem o domínio útil do bem. Se o particular não utilizar o bem e outro passar
a utilizá-lo, esse terceiro poderá usucapir o direito real do enfiteuta. Pode haver,
portanto, uma usucapião no bem público, mas não uma usucapião do bem público (não
poderia haver usucapião do direito real de propriedade da Administração).

Há um entendimento minoritaríssimo que fala em bens materialmente públicos e bens


formalmente públicos.

Os bens materialmente públicos são aqueles que cumprem alguma função social, que
tem alguma destinação pública, quais sejam os bens públicos de uso comum do povo e
os bens públicos de uso especial.

Os bens apenas formalmente públicos são aqueles que, embora registrados em nome
da Administração, não cumprem nenhuma função social, pois não tem nenhuma
destinação pública, ou seja, os bens dominicais. Essa tese defende que os bens apenas
formalmente públicos – dominicais – podem ser usucapidos.

(iii) COMPRA:

Nada mais é do que um contrato administrativo de compra e venda. A administração


pública também pode adquirir bens por meio de compra e venda.

(iv) DESAPROPRIAÇÃO:

A Administração também pode adquirir bens por meio de desapropriação. Será visto
em aula posterior.

(v) DOAÇÃO:

A Administração pode receber bens por doação.

(vi) ACESSÃO:

A acessão se dará por formação de ilhas, aluvião, avulsão, abandono de álveo e


construção de obras ou plantações, na forma do CC.

(vii) AQUISIÇÃO CAUSA MORTIS:

É o caso de herança jacente, quando em não havendo herdeiros, os bens passam para
a propriedade do Município ou do DF (arts. 1822 e 1844 do CC)

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Emerj CPIII-A Direito Administrativo

(viii) ARREMATAÇÃO:

Dá-se mediante praça ou leilão. Devemos analisar o grau de interesse público do bem.
Afinal, se há interesse público relevante, poderia a Administração desapropriar o bem.

(ix) ADJUDICAÇÃO:

Se a Administração é credora, ela pode adjudicar os bens penhorados de determinada


pessoa.

(x) RESGATE NA ENFITEUSE:

Se a Administração é a enfiteuta, depois de 10 anos, pode proceder ao resgate da


enfiteuse, pagar o valor determinado e se tornar proprietária do bem.

(xi) AQUISIÇÃO EX VI LEGIS:

São hipóteses de aquisição ex vi legis:

 Loteamentos (Lei 6766/79);


 Perdimento de bens (CP, art. 91, I e II, e Lei 8.429/92);
 Reversão nas concessões e permissões de serviço público (Lei 8.987/95, art. 35,
§1º). Na concessão de serviço público, a tarifa é composta de diversos fatores,
dentre os quais a parcela de lucro, a amortização dos investimentos etc. Extinta
a concessão, os bens que são utilizados diretamente na prestação do serviço
passam para a propriedade da Administração. Em regra, a Administração não
tem que pagar nada por esses bens, salvo se não houve a total amortização do
investimento feito.

(xii) DAÇÃO EM PAGAMENTO:

A dação em pagamento também é forma de aquisição da propriedade pela


Administração na forma do art. 156, XI do CTN.

 ALIENAÇÃO DE BENS PÚBLICOS:

A alienação de bens públicos é regida pelos arts. 17 a 19 da Lei 8.666. Lembrando que
o bem público afetado não pode ser alienado. A alienação deve ser precedida da
desafetação.

Quais os requisitos para alienação de bens públicos?

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Entre os requisitos para que se proceda a alienação de bens públicos destacam-se:

(i) Prévia Desafetação: esse requisito por não possuir previsão específica,
poderá ser suprimido por meio de autorização legislativa. Atenção: os bens
dominicais por não possuírem uma destinação específica, não precisam ser
desafetados;
(ii) Demonstração de interesse público;
(iii) Prévia avaliação do bem;
(iv) Autorização legislativa: exigível no caso de alienação de bens imóveis
pertencentes as PJs de Direito Público (Adm. Direta, Autarquias e
Fundações), sendo que para os bens imóveis dos entes privados da Adm.
Indireta (entidades paraestatais) não há necessidade de lei autorizativa
para a alineção dos bens;
(v) Licitação: como regra a alienação deverá ser precedida de licitação, na
modalidade de concorrência (art. 17, I da Lei 8666).

Entre as principais formas de alienação de bens públicos, destacam-se:

(i) VENDA:

Uma das características dos bens públicos é a inalienabilidade. Contudo, existem


hipóteses em que a alienação de tais bens é possível, razão pela qual José dos Santos
Carvalho Filho prefere falar em alienabilidade condicionada (art. 17 da Lei 8666).

a) Desafetação;
b) Autorização legal;
c) Avaliação prévia – é sempre necessária, mesmo em se tratando de caso de
dispensa ou inexigibilidade de licitação. A Administração sempre terá que
instaurar um processo administrativo.
d) Licitação – em alguns casos, será dispensada.

(ii) DOAÇÃO:

A licitação é dispensável quando a doação for para outro ente da Federação (art. 17,
I, b da Lei 8666).

A doutrina discute a possibilidade de doação, pois pode a Administração de


determinado ente celebrar um convênio com a Administração do outro (interesses
convergentes), sem que necessariamente proceda à doação do bem. Há, portanto, de
se observar o princípio da proporcionalidade.

(iii) PERMUTA:

A permuta está prevista no art. 17, I, c da Lei 8666. Aqui também não se exige
licitação. É quando a Administração troca um de seus bens por outro.

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(iv) DAÇÃO EM PAGAMENTO:

Sendo a Administração devedora, pode ela, eventualmente, dar um bem seu para
satisfação do débito (art. 356 do CC).

(v) INVESTIDURA:

Se a Administração realiza determinada obra pública e determinada faixa de terra


fique inutilizável pela Administração, é permitido que ela proceda à venda desta faixa
para o proprietário lindeiro, ou seja, o proprietário vizinho (art. 17, par. 3 da Lei 8666).

(vi) INCORPORAÇÃO:

Quando a Administração Pública Direta cria um ente da Administração Pública Indireta,


transferindo bens de seu patrimônio.

(vii) RETROCESSÃO:

Se a Administração desapropriou o bem, mas não lhe deu a destinação prevista no


decreto expropriatório, pode ela oferecer o bem de novo ao proprietário expropriado
para que este exerça a opção de comprá-lo.

(viii) LEGITIMAÇÃO DE POSSE:

A Legitimação de Posse está prevista no art. 29 da lei 6.383/76.

Art. 29 da Lei 6383/76: “O ocupante de terras públicas, que as tenha tornado


produtivas com o seu trabalho e o de sua família, fará jus à legitimação da posse
de área contínua até 100 (cem) hectares, desde que preencha os seguintes
requisitos: [...]”.

Se a Administração resolver alienar, o possuidor terá preferência na aquisição,


conforme §1º:

§ 1º - A legitimação da posse de que trata o presente artigo consistirá no


fornecimento de uma Licença de Ocupação, pelo prazo mínimo de mais 4 (quatro)
anos, findo o qual o ocupante terá a preferência para aquisição do lote, pelo valor
histórico da terra nua, satisfeitos os requisitos de morada permanente e cultura
efetiva e comprovada a sua capacidade para desenvolver a área ocupada.

Casos Concretos:

Questão 1)

Certa associação pretende obter uma concessão de direito real de uso de bem
municipal para a construção de uma nova sede para o exercício de suas atividades.

65
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

Considerando que a mencionada associação, apesar de não ter fins lucrativos, não
desenvolve atividade de interesse social e não integra a Administração Pública,
esclareça se há necessidade de realização de licitação para operacionalizar a
concessão de direito real de uso almejada, à luz da orientação do C. STJ.

Resposta:

Associação sem fins lucrativos quer utilizar bem público e quer fazê-lo por meio de
concessão de direito real de uso. A discussão é se essa concessão precisa ser feita
precedida de licitação ou não.

A Lei 8666 ao tratar da concorrência destaca que ela é modalidade necessária quando
o contrato envolver valores mais elevados. Entretanto, a propria lei de licitações prevê
em seu art. 23, par. 3 da Lei 8666 que a concorrência poderá ser exigida em algumas
situações independentemente do valor, dentre elas, a hipótese de concessão de direito
real de uso.

A lei 8666 prevê ainda hipóteses de dispensa de licitação para a concessão de direito
real de uso de bens imóveis (art. 17, I, “f” “i” da Lei 8666). Destaca-se, porém, que o
caso concreto não se amolda a nenhuma dessas hipoteses de dispensa de licitação para
a concessão de direito real de uso.

O STJ entende ser exigível a licitação no caso em tela porque a hipótese nao se encaixa
em nenhuma hipótese de dispensa de licitação.

REsp 1435594: “ADMINISTRATIVO. CONCESSÃO DE DIREITO REAL DE USO DE


TERRENO PÚBLICO A PARTICULAR. CONSTRUÇÃO DE SEDE RECREATIVA DE
ASSOCIAÇÃO DE DIREITO PRIVADO SEM FINS LUCRATIVOS. AUSÊNCIA DE INTERESSE
EMINENTEMENTE SOCIAL. HIPÓTESE NÃO ENQUADRADA NA DISPENSA DE
LICITAÇÃO. INTELIGÊNCIA DO ART. 17, INC. I, ALÍNEA "F", E § 2º, INC. I, DA LEI
8.666/1993. NECESSIDADE DE CONCORRÊNCIA PRÉVIA. 1. Na origem, o Ministério
Público do Estado do Maranhão propôs ação civil pública contra o Município de São
Luís e a Associação dos Delegados de Polícia Civil do Maranhão - ADEPOL, sob a
alegação de que a Municipalidade teria celebrado ilegal concessão de direito real
de uso de um terreno de 4.940 m2 para construção da sede recreativa da
associação, sem autorização legislativa e sem licitação. 2. A sentença julgou
procedente o pedido do Parquet para anular a concessão de direito real de uso;
estabelecer que a Municipalidade se abstenha de edificar na área concedida e
venha a demolir qualquer edificação lá existente; e determinar à ADEPOL que se
abstenha de ocupar, utilizar, construir e edificar no local, sob pena de multa
diária. O Tribunal maranhense deu provimento à apelação da Municipalidade para
reformar a sentença e julgar improcedente o pedido formulado na ação civil
pública. 3. A concessão de direito real de uso corresponde a contrato pelo qual a
Administração transfere a particular o uso remunerado ou gratuito de terreno
público, sob a forma de direito real resolúvel, a fim de que dele se utilize para

66
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

fins específicos de regularização fundiária de interesse social, urbanização,


industrialização, edificação, cultivo da terra, aproveitamento sustentável das
várzeas, preservação das comunidades tradicionais e seus meios de subsistência
ou outras modalidades de interesse social em áreas urbanas. 4. A concessão de
direito real de uso a particulares requer autorização legal e concorrência prévia.
5. Nos termos do art. 17, § 2º, inc. I, da Lei 8.666/1993, a Administração poderá
conceder direito real de uso com dispensa de licitação quando a utilização
destinar-se a outro órgão ou entidade da Administração Pública. 6. Em situações
de caráter eminentemente social, o art. 17, inc. I, alínea "f", da Lei 8.666/1993
também prevê a dispensa de licitação na "alienação gratuita ou onerosa,
aforamento, concessão de direito real de uso, locação ou permissão de uso de bens
imóveis residenciais construídos, destinados ou efetivamente utilizados no âmbito
de programas habitacionais ou de regularização fundiária de interesse social
desenvolvidos por órgãos ou entidades da administração pública". 7. As associações
de direito privado, ainda que sem fins lucrativos, não se enquadram nas hipóteses
de dispensa de licitação previstas no art. 17, inc. I, alínea "f", e § 2º, inc. I, da Lei
8.666/1993. Recurso especial do Parquet conhecido em parte e, nessa, provido
para restabelecer a sentença de primeiro grau que torna nula a concessão de
direito real de uso do terreno.”

Concessão de Direito Real de Uso:

 Instaura relação de Direito Real;


 Se a Administração descumprir dá ensejo ao direito de sequela por parte
do particular;
 Está prevista no art. 7 do DL 271/66;
 Pode ser remunerado ou gratuita;
 Por tempo certo ou indeterminado (pode ter caráter perpétuo). Ex:
assentamentos que são feitos por Estado.

Questão 2)

Certo Município entendeu que uma grande praça situada em seu território seria o
local adequado para a promoção de programas habitacionais e assentamento de
pessoas que residiam em área de risco. Para tanto, após os trâmites cabíveis, na
forma da lei, promoveu a alienação de frações ideais do bem para os cidadãos que
cumpriram os requisitos objetivos determinados pela edilidade. Não obstante,
passados mais de 25 anos da mencionada venda, ainda não foram efetuados os
registros das transferências das aludidas frações ideais. K.H.W. foi um dos legítimos
agraciados com a alienação em comento, mas, logo em seguida, decidiu se mudar e
alienou a sua posse para F.L.M., que exerce tal direito de forma mansa e pacífica
há mais de 20 anos, razão pela qual ajuizou ação de usucapião da respectiva fração
ideal. Diante dessa situação hipotética, analise se é possível a alienação de uma
praça e enfrente se a pretensão de F.L.M merece acolhida.

67
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

Resposta:

De acordo com o art. 100 do CC a praça que é um bem de uso comum do povo, poderá
ser alienada se for desafetada, ou seja, se deixar de ser praça. Enquanto praça não
pode ser alienada.

O ordenamento juridico brasileiro veda usucapião de bem público (qq bem público,
inclusive, os dominiais, com base nos seguintes dispositivos: art. 102 do CC c/c art.
183, par. 3 e art. 191, par. únic da CF c/c Sumula 340 do STF.

Contudo, no caso em tela, a alegação de impossibilidade de usucapião de bem público


deve ser afastado, se tiver ocorrido a desafetação do imóvel de natureza pública.
Assim, assistirá razão a F.L.M na sua pretensão de usucapião se a praça tiver sido
desafetada.

Questão 3)

O prefeito de uma cidade litorânea decide incrementar a orla do município


mediante a liberação de espaços no calçadão para a instalação de quiosques. O chefe
do Poder Executivo municipal decide consultar a Procuradoria para saber o que deve
fazer para viabilizar essa utilização do espaço público por particulares.
Diferenciando os institutos da autorização de uso, permissão de uso e concessão de
uso, esclareça qual o mais adequado para a situação concreta e se haverá
necessidade de prévia licitação.

Resposta:

O gabarito trouxe que a forma adequada para exploração dos quiosques é a autorização
ou permissão, ficando a critério da municipalidade. A previsão da lei reforça a
competência do Município, mas não afasta a necessidade de licitação.

O professor discorda do gabarito oficial, sob o fundamento de que muitas vezes o


Município chama de “autorização” com o intuito de não submter à prévia licitação. O
prof. entende que se é exploração de quiosque, deveria ter uma licitação, sendo
hipótese, portanto, de permissão ou concessão de uso.
Vejamos abaixo as diferenças de cada um dos institutos:

(i) Autorização de Uso:

 É consentimento dado pelo Estado no interesse predominante do


particular. É claro que o interesse público está presente, mas o interesse
que predomina é o do particular, que se beneficia da autorização.
 O autorizatário não está obrigado a fazer uso do bem público e faz sentido
que seja assim, pois, afinal de contas, a autorização foi dada no seu
interesse.

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Emerj CPIII-A Direito Administrativo

 A autorização é um instituto mais apropriado para situações efemeras,


transitórias, urgentes, excepcionais.
 A autorização de uso independe de licitação.

Exemplo: enchente em friburgo em que o Prefeito autoriza o uso do ginásio


público da cidade para abrigar as familias que sofreram com a enchente.

O prof. entende que é incompatível exploração de quiosque na praia com a


autorização. Muitos municipios fazem uso de autorização com o objetivo de nao
licitar.

(ii) Permissão de Uso:

 É consentimento dado pelo Estado no interesse predominante da


coletividade;
 O permissionário fica obrigado a fazer uso do bem público;
 A permissão é instituto apropriado para situações menos instáveis,
situações mais duradouras. A permissão é precária; e
 A permissão de uso depende de licitação (art. 2, caput, da Lei 8666).

(iii) Concessão de Uso de Bem Público:

 Relação Obrigacional.
 Concessão tem natureza contratual;
 Não tem natureza precária;
 Ela se justifica quando houver necessidade de investimentos de grandes
vultos;
 Precedida de Licitação SEMPRE.

Conferir a Lei 13.311 de 2016 que traz normas gerais para ocupação e utilização de
área pública urbana por equipamentos urbanos do tipo quiosque, trailer, feira e banca
de jornais.

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Emerj CPIII-A Direito Administrativo

Aula 4 – Prof. Daniela Bandeira


8/10/18

EMENTA:  O Estatuto da Cidade.


 Política urbana.
 Instrumentos urbanísticos e restrições à propriedade.
 Parcelamento e Edificação compulsória.

 ESTATUTO DA CIDADE:

Há quem defenda a autonomia do Direito Urbanístico, principalmente após o advento


do Estatuto da Cidade, e em razão dos princípios e diretrizes definidos na própria
Constituição. Contudo, tal entendimento não é uníssono. Apesar disso, é certo que o
Direito Urbanístico não se encaixa perfeitamente no Direito Administrativo.

O Direito Urbanístico tem um caráter multidisciplinar (normas de caráter urbanístico,


administrativo, ambientais, penais etc.). Ele tem por objetivo combater os problemas
inerentes à urbanização desordenada, fruto do século XXI, criando uma cidade
sustentável.

O Estatuto da Cidade é a principal norma do Direito Urbanístico, sendo responsável


também por delimitar a função social da propriedade urbana.

Em que consiste o Urbanismo?

A origem do Urbanismo está ligada a um conceito filosófico e se entrelaça naquilo que


é belo, ligado a ideia de construção, de arquitetura.

Posteriormente, surgiu na Inglaterra a ideia de ocupação da cidade com espaços que


assegurem o bem-estar social, o meio ambiente.

O Urbanismo visa propiciar melhores condições de vida ao homem, inserido na sua


comunidade. Com objetivo de garantir, a sua circulação, lazer e trabalho.

O urbanismo envolve matérias de zoneamento, uso e ocupação do solo urbano e normas


jurídicas, normas meios, que servem para atingir o objetivo das normas técnicas.
Ciência técnica que estuda o ordenamento e organização das cidades. Garantindo ao
homem os seus objetivos pessoais.

O Direito do Urbanismo vai beber da fonte do regime jurídico administrativo, mas


também tem questões de natureza privada que se entrelaçam com direito civil e direito
ambiental.

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Emerj CPIII-A Direito Administrativo

Em que consiste o conceito de URBE?

O conceito de URBE foi construído por Hely Lopes, e posteriormente o STJ e a


jurisprudência consolidaram o tema de URBE em matéria de direito tributário. Isso
porque aquilo que é considerado urbano é passível de cobrança de IPTU e aquilo que é
considerado rural, via de regra, é passível de cobrança de ITR.

URBE é um aglomerado urbano de pessoas ou indivíduos que se reúnem e se organizam


para garantir a sua própria moradia, trabalho, lazer e livre circulação (prestação de
serviços, garantia de transporte público, pequeno posto de saúde, posto de cartórios
extrajudiciais, uma escola municipal).

Segundo Hely Lopes, URBE consiste em todos os espaços definidos em lei em que o
homem exerce coletivamente qualquer de suas 4 funções essenciais na comunidade
que são:

(i) Habitação;
(ii) Trabalho;
(iii) Circulação; e
(iv) Recreação.

O Urbanismo vai trabalhar com dois tipos de normas:

(i) Normas Técnicas: são também chamadas de normas imperfeitas, ou seja,


que apenas descrevem questões técnicas, questões que não são jurídicas,
são meramente descritivas. O direito do urbanismo está recheado de
normas descritivas, normas técnicas.

(ii) Normas Jurídicas: são regras que descrevem condutas, são as chamadas
regras perfeitas, mas não impõe qualquer sanção.

As limitações administrativas urbanísticas podem ser definidas por meio de ato


administrativo?

Sim, desde que seja um ato administrativo normativo que goze das mesmas
características de uma lei em sentido material, ou seja, desde que o ato administrativo
tenha as seguintes características: (i) abstração; (ii) generalidade e (iii)
territorialidade.

71
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

Qual é a diferença entre (i) limitações administrativas urbanísticas e (ii) limitações


de natureza civil (de direito privado)?

Quando estamos diante de LIMITAÇÕES ADMINISTRATIVAS URBANÍSTICAS, a relação


jurídica se estabelece entre Administração Pública e o cidadão. Há uma imposição de
conduta ou limitação legal de respeito as normas de construção, recuo, nivelamento,
postura. São limitações que garantem o interesse público na área urbana (tem relação
com poder de polícia).

No âmbito das LIMITAÇÕES DE NATUREZA CIVIL PRIVADAS não há interferência do


Estado, o Estado não é parte na relação jurídica, ele é apenas regulador externo. A
relação se dá entre os particulares.

Nas limitações urbanísticas somente posso fazer aquilo que está em lei. Já nas
limitações no âmbito de natureza privada pode se fazer tudo aquilo que as partes
pactuarem.

As limitações administrativas são imprescritíveis, irrenunciáveis e indisponíveis.

 BASE CONSTITUCIONAL:

Entre os arts. 21-25 e 30 da CF, há normas definidoras das competências dos entes
federativos. As competências podem ser legislativas ou administrativas/materiais.

Enquanto a competência legislativa é a competência para legislar sobre um assunto, a


competência administrativa diz respeito à execução de determinado ato.

O art. 21 da CF elenca como competências administrativas da União:

Art. 21 da CF: “Compete à União:


IX - elaborar e executar planos nacionais e regionais de ordenação do território e
de desenvolvimento econômico e social;
XX - instituir diretrizes para o desenvolvimento urbano, inclusive habitação,
saneamento básico e transportes urbanos;

O art. 24 da CF elenca como competência legislativa concorrente entre a União, os


Estados e o DF legislar sobre direito urbanístico.

A União fica responsável pela edição de normas gerais (no exercício dessa
competência, foi que a União editou o Estatuto da Cidade), e aos Estados cabem
suplementar a legislação federal.

Art. 24, I da CF: “Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar
concorrentemente sobre:
I - direito tributário, financeiro, penitenciário, econômico e urbanístico;”

72
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

Embora o art. 24 da CF não mencione os Municípios, devemos recorrer ao art. 30, que,
em seus incisos I e II, também autoriza os Municípios a suplementar a legislação federal
e estadual no que couber.

Contudo, as políticas públicas municipais no sentido do planejamento e controle do


uso do solo urbano, previstas no inciso VIII do art. 30, devem ser realizadas de acordo
com as diretrizes traçadas pela legislação federal/estadual, de forma que haja uma
cooperação dos entes na concretização da política urbana.

Art. 30 da CF: “Compete aos Municípios:


I - legislar sobre assuntos de interesse local;
II - suplementar a legislação federal e a estadual no que couber;
VIII - promover, no que couber, adequado ordenamento territorial, mediante
planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano;”

O art. 182 da CF dispõe que:

Art. 182 da CF: “A política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder


Público municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo
ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem-
estar de seus habitantes.
§ 1º O plano diretor, aprovado pela Câmara Municipal, obrigatório para cidades
com mais de vinte mil habitantes, é o instrumento básico da política de
desenvolvimento e de expansão urbana. [combinar com o art. 41 do Estatuto da
Cidade – os requisitos são alternativos]
§ 2º A propriedade urbana cumpre sua função social quando atende às exigências
fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor.
§ 3º As desapropriações de imóveis urbanos serão feitas com prévia e justa
indenização em dinheiro.
§ 4º É facultado ao Poder Público municipal, mediante lei específica para área
incluída no plano diretor, exigir, nos termos da lei federal, do proprietário do
solo urbano não edificado, subutilizado ou não utilizado, que promova seu
adequado aproveitamento, sob pena, sucessivamente, de:
I - parcelamento ou edificação compulsórios;
II - imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana progressivo no tempo;
III - desapropriação com pagamento mediante títulos da dívida pública de emissão
previamente aprovada pelo Senado Federal, com prazo de resgate de até dez anos,
em parcelas anuais, iguais e sucessivas, assegurados o valor real da indenização e
os juros legais.

Esse dispositivo ressalta a ideia de que o Município deve observar as diretrizes fixadas
no Estatuto da Cidade. Dele podemos extrair os dois objetivos básicos do direito
urbanístico:

73
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

1. Pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade:

A funcionalização de determinado instituto nada mais é do que a busca de um direito


supra-individual, para além do próprio indivíduo. Cidade é o espaço físico onde a
urbanização se desenvolve.

Quando se fala em funções sociais da cidade, fala-se em atendimento a demandas


primárias e secundárias daquela coletividade, no sentido de promover os direitos
fundamentais e alcançar o interesse público. A função social da cidade é diferente da
função social da propriedade, mencionada no art. 182, §2º, da CF, pois aquela tem por
objeto as demandas da coletividade, enquanto está olha para o particular,
condicionando o exercício de seu direito de propriedade.

Para atender a função social da propriedade urbana, a propriedade deve atender as


exigências fundamentais da ordenação da cidade expressas no plano diretor. O plano
diretor é obrigatório naqueles Municípios que tenham mais de 20 mil habitantes,
conforme §1º, sendo o instrumento básico da política de desenvolvimento e de
expansão urbana. O art. 186 da CF fala da função social da propriedade rural.

O art. 2º, I, do Estatuto da Cidade (Lei 10.257) também menciona alguns objetivos, tal
qual o direito às cidades sustentáveis. Esse direito parte da ideia de que é impossível
desvincular a política urbana do conceito de sadia qualidade de vida. A política urbana
tem como norte o princípio da dignidade da pessoa humana, e consequentemente, a
sadia qualidade de vida a ser promovida nas cidades. Sustentabilidade traduz uma
preocupação transgeracional. Ela busca o equilíbrio entre o desenvolvimento
econômico e a proteção de outros direitos fundamentais. O princípio do
desenvolvimento sustentável é o princípio delineador do direito ambiental.

Art. 2 da Lei 10.257: A política urbana tem por objetivo ordenar o pleno
desenvolvimento das funções sociais da cidade e da propriedade urbana, mediante
as seguintes diretrizes gerais:
I – garantia do direito a cidades sustentáveis, entendido como o direito à terra
urbana, à moradia, ao saneamento ambiental, à infra-estrutura urbana, ao
transporte e aos serviços públicos, ao trabalho e ao lazer, para as presentes e
futuras gerações
II – gestão democrática por meio da participação da população e de associações
representativas dos vários segmentos da comunidade na formulação, execução e
acompanhamento de planos, programas e projetos de desenvolvimento urbano;
[vide art. 4 da Lei 10.257]

2. Garantir o bem-estar de seus habitantes.

Por fim, destaca-se a Lei 6.766/79 que também está associada ao tema do Direito
Urbanismo.

74
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

 DIRETRIZES DO ESTATUTO DA CIDADE:

A diretriz fundamental do Estatuto da Cidade já foi comentada acima, qual seja a


promoção de cidades sustentáveis.

Outras diretrizes genéricas importantes do Estatuto da Cidade são:

a) Regularização fundiária;
b) Ocupação urbana (estudo dos instrumentos urbanísticos);
c) Gestão democrática das cidades (art. 2º, II c/c arts. 43 a 45 do EC,
especialmente o art. 40, §4º) – reafirma a noção de consensualismo. É a
mitigação de uma postura imperativa e unilateral por parte do Poder
Público, buscando-se a conformação das vontades do Poder Público e do
particular.

O Poder Público, na qualidade de gestor público, deve ouvir o particular


para poder atender melhor às suas necessidades. Por isso, são marcantes no
consensualismo o princípio da eficiência e o princípio da participação
democrática. O EC exige a participação popular, que vai se operacionalizar
através de audiências públicas e debates, por exemplo, para a elaboração
do plano diretor.

 INSTRUMENTOS DO ESTATUTO DA CIDADE (ART. 4º):

Para a maioria dos institutos, o Estatuto da Cidade é uma norma intermediária, pois
não dá aplicabilidade imediata aos institutos, sendo necessária, muitas vezes, a edição
de lei municipal regulamentadora, notadamente os instrumentos de direito urbanístico
(direito de preempção, outorga onerosa do direito de construir etc.).

Contudo, existem alguns dispositivos que têm aplicabilidade imediata, principalmente


aqueles referentes aos instrumentos de direito civil, como a usucapião especial de
imóvel urbano (art. 183 da CF c/c arts. 9º a 14 do EC) e o direito de superfície (arts.
21 a 24 da EC).

a) Instrumento preventivo:

 Estudo de impacto de vizinhança (arts. 36 a 38 do EC) – é matéria afeta ao


direito ambiental.

b) Instrumentos sancionatórios:

 Parcelamento, edificação e utilização compulsórios – IPTU progressivo –


Desapropriação Urbana Sancionatória (art. 182, §4º, da CF e arts. 5º a 8º do EC)
– se há descumprimento da função social da propriedade urbana, aplicam-se
tais sanções na ordem aí citada.

75
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

Primeiro, determina-se o parcelamento/edificação/utilização compulsórias. Se


o proprietário não cumpre, é a ele imposto um IPTU progressivo. Por fim, caso
ainda assim não dê função social à sua propriedade, será expropriado. Trata-se
de norma intermediária que depende da edição de norma municipal.

 Usucapião especial de imóvel urbano (art. 183 da CF c/c arts. 9º a 14 do EC).

c) Instrumentos ordenadores/indutores/financiadores:

 Direito de superfície (arts. 21 a 24) – é instrumento de direito civil. Nesse ponto,


o Estatuto da Cidade tem aplicabilidade imediata.
 Direito de preempção (arts. 25 a 27);
 Outorga onerosa do direito de construir (arts. 28 a 31);
 Operação urbana consorciada (arts. 32 a 34);
 Transferência do direito de construir (art. 35).

Em linhas gerais temos que:


 O Estatuto da Cidade fixa diretrizes gerais e prevê os meios necessários.
 O Município, posteriormente, editará um Plano Diretor, que vai eleger os
instrumentos que serão utilizados pelo Município, fixando também as áreas
destinatárias das ações.
 Por fim, o Município editará leis locais específicas para concretizar as
decisões traçadas no Plano Diretor.
 Isso reitera a ideia de que o Estatuto e o Plano Diretor são normas
intermediárias, pois dependem de lei específica para ter aplicabilidade.

 PLANO DIRETOR (ARTS. 39 A 42-B):

É instrumento básico da política urbana, integrante do planejamento municipal. É ele


quem dá conteúdo a função social da propriedade urbana, prevista no art. 182, §2º, da
CF.

O Plano Diretor é obrigatório para qualquer Município?

Não!!! Nos termos do art. 182, §1º, da CF, o plano diretor é obrigatório para cidade
com mais de 20 mil habitantes.

O artigo 182 da CF deve ser analisado conjuntamente com o art. 41 do Estatuto da


Cidade.

Art. 41 da Lei 10.257/2001: “O plano diretor é obrigatório para cidades:


I - com mais de vinte mil habitantes;
II - integrantes de regiões metropolitanas e aglomerações urbanas; [vide art. 25,
§3º, da CF. Trata-se de competência estadual. Vide STF, ADI 1842]

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Emerj CPIII-A Direito Administrativo

III - onde o Poder Público municipal pretenda utilizar os instrumentos previstos no


§ 4o do art. 182 da Constituição Federal;
IV - integrantes de áreas de especial interesse turístico;
V - inseridas na área de influência de empreendimentos ou atividades com
significativo impacto ambiental de âmbito regional ou nacional.
VI - incluídas no cadastro nacional de Municípios com áreas suscetíveis à
ocorrência de deslizamentos de grande impacto, inundações bruscas ou processos
geológicos ou hidrológicos correlatos. (Incluído pela Lei nº 12.608, de 2012)
§ 1 - No caso da realização de empreendimentos ou atividades enquadrados no
inciso V do caput, os recursos técnicos e financeiros para a elaboração do plano
diretor estarão inseridos entre as medidas de compensação adotadas.
§ 2 - No caso de cidades com mais de quinhentos mil habitantes, deverá ser
elaborado um plano de transporte urbano integrado, compatível com o plano
diretor ou nele inserido.
§ 3 - As cidades de que trata o caput deste artigo devem elaborar plano de rotas
acessíveis, compatível com o plano diretor no qual está inserido, que disponha
sobre os passeios públicos a serem implantados ou reformados pelo poder público,
com vistas a garantir acessibilidade da pessoa com deficiência ou com mobilidade
reduzida a todas as rotas e vias existentes, inclusive as que concentrem os focos
geradores de maior circulação de pedestres, como os órgãos públicos e os locais
de prestação de serviços públicos e privados de saúde, educação, assistência
social, esporte, cultura, correios e telégrafos, bancos, entre outros, sempre que
possível de maneira integrada com os sistemas de transporte coletivo de
passageiros.”

Atenção!!! O rol do art. 41 do Estatuto da Cidade é taxativo e alternativo e deve ser


analisado conjuntamente com o art. 182 da CF

Essa ampliação trazida pelo art. 41 do Estatuto da Cidade é constitucional?

Há divergência na doutrina sobre o tema. Vejamos:

CORRENTE 1) Parte da doutrina defende que é inconstitucional e, portanto, só deve


ser exigido o plano diretor nos moldes do art. 182, §1º, da CF.

CORRENTE 2) Tem prevalecido a orientação, porém, de que a ampliação promovida


pelo art. 41 do Estatuto da Cidade deve ser observada, uma vez que segue a lógica da
própria CF, que, por vezes, condiciona sua aplicação à edição de um plano diretor
(Carlos Ari Sundfeld, Jacintho Arruda).

O art. 182, §1º, da CF só teria estabelecido o mínimo, podendo a lei ampliar tal
exigência.

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Emerj CPIII-A Direito Administrativo

Qual a sanção aplicável se não for criado o plano diretor em um Município cuja sua
exigência seja obrigatória?

Dos arts. 49 a 52 do EC, a lei cuida de algumas sanções relacionadas ao Município que
descumpre tal condição. Poderá até mesmo configurar hipótese de improbidade
administrativa.

Para quem tem menos de 20 mil habitantes, a princípio, não cabe sanção pela ausência
de plano diretor, sendo sua edição uma faculdade, caso queira implementar os
instrumentos urbanísticos previstos na CF e no EC.

Qual a diferença entre parcelamento e desmembramento?

No caso do PARCELAMENTO haverá procedimento no RGI de abertura de novas


matrículas e pressupõe-se um acordo com o município para proporcionar os serviços
públicos básicos.

No caso do DESMEMBRAMENTO não há presunção de participação do município, porque


não se exige a prestação e instalação dos serviços públicos [vide arts. 1 e 2 da Lei
6.766/79]

Art. 5 da Lei 10.257: “Lei municipal específica para área incluída no plano diretor
poderá determinar o parcelamento, a edificação ou a utilização compulsórios do
solo urbano não edificado, subutilizado ou não utilizado, devendo fixar as
condições e os prazos para implementação da referida obrigação.
§ 1 - Considera-se subutilizado o imóvel:
I - cujo aproveitamento seja inferior ao mínimo definido no plano diretor ou em
legislação dele decorrente;
II - (VETADO)
§ 2 - O proprietário será notificado pelo Poder Executivo municipal para o
cumprimento da obrigação, devendo a notificação ser averbada no cartório de
registro de imóveis.
§ 3 - A notificação far-se-á:
I - por funcionário do órgão competente do Poder Público municipal, ao
proprietário do imóvel ou, no caso de este ser pessoa jurídica, a quem tenha
poderes de gerência geral ou administração;
II - por edital quando frustrada, por três vezes, a tentativa de notificação na
forma prevista pelo inciso I.
§ 4 - Os prazos a que se refere o caput não poderão ser inferiores a:
I - um ano, a partir da notificação, para que seja protocolado o projeto no órgão
municipal competente;
II - dois anos, a partir da aprovação do projeto, para iniciar as obras do
empreendimento.

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Emerj CPIII-A Direito Administrativo

§ 5 - Em empreendimentos de grande porte, em caráter excepcional, a lei


municipal específica a que se refere o caput poderá prever a conclusão em etapas,
assegurando-se que o projeto aprovado compreenda o empreendimento como um
todo.

Vide art. 6 da Lei 10.257 que é muito pedido em prova.

Art. 6 da Lei 10257: “A transmissão do imóvel, por ato inter vivos ou causa mortis,
posterior à data da notificação, transfere as obrigações de parcelamento,
edificação ou utilização previstas no art. 5o desta Lei, sem interrupção de
quaisquer prazos.”

O que acontece se a lei municipal que determinar o parcelamento não for


observada?

O Município, nesse caso, poderá valer-se do instrumento do IPTU progressivo.

A matéria é tratada no art. 7 no Estatuto da Cidade.

Art. 7 da Lei 10.257: “Em caso de descumprimento das condições e dos prazos
previstos na forma do caput do art. 5o desta Lei, ou não sendo cumpridas as etapas
previstas no § 5o do art. 5o desta Lei, o Município procederá à aplicação do
imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana (IPTU) progressivo no
tempo, mediante a majoração da alíquota pelo prazo de cinco anos consecutivos.
§ 1 - O valor da alíquota a ser aplicado a cada ano será fixado na lei específica a
que se refere o caput do art. 5o desta Lei e não excederá a duas vezes o valor
referente ao ano anterior, respeitada a alíquota máxima de quinze por cento.
§ 2 - Caso a obrigação de parcelar, edificar ou utilizar não esteja atendida em
cinco anos, o Município manterá a cobrança pela alíquota máxima, até que se
cumpra a referida obrigação, garantida a prerrogativa prevista no art. 8o.
§ 3 - É vedada a concessão de isenções ou de anistia relativas à tributação
progressiva de que trata este artigo.”

O art. 8 do Estatuto da Cidade traz a hipótese de desapropriação sanção.

Art. 8 da Lei 10.257: “Decorridos cinco anos de cobrança do IPTU progressivo sem
que o proprietário tenha cumprido a obrigação de parcelamento, edificação ou
utilização, o Município poderá proceder à desapropriação do imóvel, com
pagamento em títulos da dívida pública.
§ 1 - Os títulos da dívida pública terão prévia aprovação pelo Senado Federal e
serão resgatados no prazo de até dez anos, em prestações anuais, iguais e
sucessivas, assegurados o valor real da indenização e os juros legais de seis por
cento ao ano.
§ 2 - O valor real da indenização:

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Emerj CPIII-A Direito Administrativo

I - refletirá o valor da base de cálculo do IPTU, descontado o montante


incorporado em função de obras realizadas pelo Poder Público na área onde o
mesmo se localiza após a notificação de que trata o § 2o do art. 5o desta Lei;
II - não computará expectativas de ganhos, lucros cessantes e juros
compensatórios.
§ 3 - Os títulos de que trata este artigo não terão poder liberatório para
pagamento de tributos.
§ 4 - O Município procederá ao adequado aproveitamento do imóvel no prazo
máximo de cinco anos, contado a partir da sua incorporação ao patrimônio
público.
§ 5 - O aproveitamento do imóvel poderá ser efetivado diretamente pelo Poder
Público ou por meio de alienação ou concessão a terceiros, observando-se, nesses
casos, o devido procedimento licitatório.
§ 6o Ficam mantidas para o adquirente de imóvel nos termos do § 5o as mesmas
obrigações de parcelamento, edificação ou utilização previstas no art. 5o desta
Lei.

E se o Município depois de desapropriar o imóvel não der a destinação ao imóvel


que foi fundamento da desapropriação?

O Prefeito incorrerá em improbidade administrativa, na forma do art. 52 da Lei 10.257:

Art. 52 da Lei 10.257: Sem prejuízo da punição de outros agentes públicos


envolvidos e da aplicação de outras sanções cabíveis, o Prefeito incorre em
improbidade administrativa, nos termos da Lei no 8.429, de 2 de junho de 1992,
quando:
I - (VETADO)
II - deixar de proceder, no prazo de cinco anos, o adequado aproveitamento do
imóvel incorporado ao patrimônio público, conforme o disposto no § 4o do art. 8o
desta Lei;
III - utilizar áreas obtidas por meio do direito de preempção em desacordo com o
disposto no art. 26 desta Lei;
IV - aplicar os recursos auferidos com a outorga onerosa do direito de construir e
de alteração de uso em desacordo com o previsto no art. 31 desta Lei;
V - aplicar os recursos auferidos com operações consorciadas em desacordo com o
previsto no § 1o do art. 33 desta Lei;
VI - impedir ou deixar de garantir os requisitos contidos nos incisos I a III do § 4o
do art. 40 desta Lei;
VII - deixar de tomar as providências necessárias para garantir a observância do
disposto no § 3o do art. 40 e no art. 50 desta Lei;
VIII - adquirir imóvel objeto de direito de preempção, nos termos dos arts. 25 a
27 desta Lei, pelo valor da proposta apresentada, se este for, comprovadamente,
superior ao de mercado.

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Emerj CPIII-A Direito Administrativo

 PLANO DIRETOR E GESTÃO DEMOCRÁTICA (ART. 40, §4º, EC):

A Constituição do Estado do RJ, nos arts. 231, 236 e 359, se refere à gestão democrática
e à participação popular na elaboração de planos diretores.

O PRINCÍPIO DA GESTÃO DEMOCRÁTICA, regulado nos arts. 43 a 45, exige a participação


da sociedade na construção de uma política urbana para aquela cidade, de forma a
aproximar o Poder Público da sociedade e melhor atender às suas demandas. Não é
possível a elaboração de um plano diretor sem a oitiva popular, conforme art. 40, §4º,
da CF. Tal obrigatoriedade está diretamente ligada à noção de consensualismo.

E eventuais alterações ao plano diretor vigente também demandam a participação


popular?

SIM!! Eventuais alterações no plano diretor também dependem de participação


popular, com base nos mesmos princípios e fundamentos ligados à elaboração do plano,
de forma a não descaracterizar a participação popular. Vide TJRJ, Órgão Especial, RI
0034721-61.2009.8.19.0000, Rel. Des. Alexandre H. Varella, julg. em 25/10/2010.

 DIREITO DE PREEMPÇÃO (ARTS. 25 A 27):

O direito de preempção confere ao Poder Público municipal preferência para aquisição


de imóvel urbano objeto de alienação onerosa entre particulares (art. 25, caput).

Para o exercício de tal direito, deve existir uma lei municipal, que tenha por base o
plano diretor, delimitando as áreas em que tal direito incidirá, bem como fixando o
prazo de vigência deste direito, não superior a 5 anos, renovável a partir de 1 ano após
o decurso do prazo inicial de vigência (art. 25, §1º). O art. 26 do EC fixa as hipóteses
em que tal direito será cabível.

Estabelecido o direito de preempção, deve o proprietário do imóvel notificar o


Município da sua intenção de alienar o imóvel para que este exerça o direito de
preempção no prazo de 30 dias. Findo esse prazo, se o Município não se manifestar, o
proprietário está autorizado a vender seu imóvel para terceiros validamente. Contudo,
caso o proprietário venda o imóvel sem notificar o Município, tal alienação será nula,
conforme art. 27, §5º, do EC.

Atenção!!! Eventuais direitos de preferência de particulares, tal qual o locatário, não


prevalecem em face do direito de preferência do Município, em razão do princípio da
supremacia do interesse público sobre o privado.

 OUTORGA ONEROSA DO DIREITO DE CONSTRUIR (ARTS. 28 A 31):

A outorga onerosa do direito de construir tem um antecedente histórico que é o


instituto do solo criado, no qual há uma dissociação entre a propriedade do solo (nua-

81
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

propriedade) e o direito de construir. O Município, ao elaborar o plano diretor,


instituirá um coeficiente básico em que será possível construir. Ele leva em conta a
área do terreno, bem como a possibilidade de construção para cima no terreno. Todas
as pessoas naquele Município se submetem ao coeficiente básico.

O plano diretor poderá, contudo, fixar áreas nas quais o direito de construir poderá
ser exercido acima do coeficiente de aproveitamento básico adotado, desde que
respeitado o limite do coeficiente máximo, mediante contrapartida a ser prestada pelo
beneficiário ao Poder Público municipal. Essa contrapartida é a outorga onerosa do
direito de construir.

ATENÇÃO!!!
 A outorga onerosa é ato discricionário do Poder Público municipal, que não
é obrigado a autorizar a construção acima do coeficiente básico.
 Diferentemente, a licença para construir dentro do coeficiente básico é
direito subjetivo do administrado, sendo, portanto, ato vinculado.
 O STF entende que essa contrapartida não tem natureza tributária.

Se a edificação for implementada além do coeficiente básico, sem que haja previsão
no plano diretor ou sem que haja o pagamento da contrapartida, há descumprimento
das normas edilícias municipais, pelo que o Poder Público municipal pode exigir a
adequação ao coeficiente de aproveitamento da área ou até mesmo a demolição da
construção. Não se aplica aqui a teoria do fato consumado, pois se entende que há
uma perpetuação da ilegalidade.

É possível também a alteração do uso do solo mediante contrapartida a ser prestada


ao Poder Público Municipal, ex. pré-fixação de zona residencial em que é construída
uma edificação com fins comerciais (art. 29).

Casos Concretos:

Questão 1)

No Município Y, situado no estado do Rio de Janeiro, foi construído um condomínio


de luxo em uma área que não permitia construções de tal porte, em flagrante
contrariedade ao Plano Diretor. Em razão disso, o legislativo local, sem a oitiva de
eventuais interessados, promoveu a alteração do Plano Diretor, a fim de
possibilitar, especificamente, a regularização das mencionadas construções. Diante
desta situação hipotética, esclareça se qualquer município brasileiro é obrigado a
elaborar um Plano Diretor, bem como enfrente a viabilidade de realizá-lo sem a
oitiva popular, mediante o apontamento da base legal pertinente e dos princípios
específicos atinentes à matéria. Analise, enfim, a conduta do Município X é
compatível com o ordenamento vigente.

82
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

Resposta:

O Plano Diretor é uma das principais ferramentas do planejamento urbanistico, pois se


apresenta como instrumento norteador das ações municipais.

Não há exigência no ordenamento jurídico brasileiro no setido de que TODOS os


Municípios tenham um Plano Diretor. As hipoteses em que tal norma se revela
indispensável estão previstas no art. 182, par. 1 da CF, bem como no art. 4 da Lei
10257/2001.

O Município com menos de 20 mil habitantes não é obrigado a elaborar um Plano


Diretor, conforme se depreende da análise do art. 182, par. 1 da CF c/c art. 41 do
Estatuto da Cidade, que traz um rol taxativo e alternativo.

Ademais, a imposição de participação popular para a elaboração do plano, no âmbito


da gestão democrática das cidades, está prevista no art. 40, par. 4 do Estatuto da
Cidade, de modo que o legislador conferiu-lhe qualificação de verdadeira garantia.
Não é possível a realização de um plano diretor sem a oitiva popular, na forma do art.
2, II c/c art. 40, par. 4 do Estatuto da Cidade. Exige-se a oitiva popular, sob pena de
nulidade do plano.

No caso em tela, a conduta do Município não se mostrou compatível com o nosso


ordenamento jurídico, pois violou o Princípio da Impessoalidade (uma vez que a medida
ocasionou privilégio para poucas pessoas), além de ter violado também o Princípio da
Moralidade, da Legalidade, todos previstos na CF. Por fim, a conduta violou também o
Princípio da Gestão Democrática da Cidade, previsto no art. 43 do Estatuto da Cidade.

Questão 2)

Maria da Enunciação é proprietária de uma casa, na qual nasceu e viveu importante


personagem da história pátria. Tal imóvel foi alugado para Zezinho Aparecido, para
quem Maria da Enunciação pretende vendê-lo, diante da proposta oferecida, e em
observância do disposto no art. 27, da Lei nº 8245/91 (Lei de Locações), in verbis:
"Art. 27. No caso de venda, promessa de venda, cessão ou promessa de cessão de
direitos ou dação em pagamento, o locatário tem preferência para adquirir o imóvel
locado, em igualdade de condições com terceiros, devendo o locador dar - lhe
conhecimento do negócio mediante notificação judicial, extrajudicial ou outro meio
de ciência inequívoca. Parágrafo único. A comunicação deverá conter todas as
condições do negócio e, em especial, o preço, a forma de pagamento, a existência
de ônus reais, bem como o local e horário em que pode ser examinada a
documentação pertinente." No entanto, o Município no qual se situa a casa em
questão pretende adquiri-la, para construir um museu em memória do importante
personagem que ali viveu. Diante dessa situação hipotética, esclareça se existe
algum mecanismo no ordenamento pátrio que possibilite a aquisição do imóvel em
foco pelo Município, caso não seja viável a realização de desapropriação. Em caso
positivo, enfrente se o direito de preferência do locatário seria oponível ao Poder

83
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

Público local e quais seriam os efeitos de eventual alienação do bem a Zezinho


Aparecido em tais circunstâncias.

Resposta:

Sim, trata-se do instituto da preempção, previsto no art. 25 do Estatuto da Cidade, em


que o Município pode instituir direito de preferência para aquisição de imóvel urbano,
mediante previsão em lei municipal, baseada no Plano Diretor do Município, que
identifique o imóvel que será objeto de tal direito, na forma do par. 1, do art. 25.

Trata-se de limitação administrativa que prevalece sobre as relações privadas


estabelecidas sobre o bem, de modo que o direito de preferência do locatário nao pode
ser oponível ao Município.

Se o direito de preempação nao for observado, a compra e venda será nula de pleno
direito (art. 27, par. 5 do EC), consequentemente, o registro também será nulo, e o
Município poderá comprar o terreno pelo preço do carne de IPTU, ou o valor do
negócio, o que for menor, na forma do art. 27, par. 6 do Estatuto da Cidade.

Questão 3)

Certa entidade religiosa visa a construir um grande templo em terreno de sua


propriedade e, para tanto, buscou a licença cabível, perante o ente federativo
competente. Contudo, o ente federativo em questão entendeu que a construção
pretendida extrapola o coeficiente de aproveitamento básico determinado para a
localidade, razão pela qual depende do pagamento de outorga onerosa do direito
de construir, em consonância com ordenamento local. Inconformada, a referida
entidade religiosa apresenta o recurso administrativo cabível sob o fundamento de
não ser devida tal cobrança, considerando que as entidades religiosas gozam de
imunidade tributária, na forma do art. 150, VI, b, da CRFB/88. Diante dessa situação
hipotética, analise no que consiste e como deve ser operacionalizada a outorga
onerosa do direito de construir, para então enfrentar se merece acolhida o
argumento da citada entidade religiosa.

Resposta:

A outorga onerosa não tem natureza juridica de tributo, sendo apenas uma obrigação
de natureza pecuniária e retributiva pelo direito de construir, além do que é previsto
no coeficiente de aproveitamento pelo Plano Diretor. Logo, não cabe a alegação de
imunidade tributária pleiteada pela Igreja, uma vez que a outorga onerosa nao tem
natureza de tributo.

Também não cabe inscrição em dívida ativa, pela mesma razão (a outorga não tem
natureza de tributo).

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Emerj CPIII-A Direito Administrativo

RE 226942: “Tributário. Parcela do solo criado: Lei municipal nº 3.338/89.


Natureza jurídica. 1. Não é tributo a chamada parcela do solo criado que
representa remuneração ao Município pela utilização de área além do limite da
área de edificação. Trata-se de forma de compensação financeira pelo ônus
causado em decorrência da sobrecarga da aglomeração urbana. 2. Recurso
extraordinário a que se nega provimento.”

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Emerj CPIII-A Direito Administrativo

Aula 5 – Prof. Daniela Bandeira


8/10/18

EMENTA:  Servidão Administrativa.


 Ocupação temporária.
 Requisição.

 INTRODUÇÃO:

No âmbito da organização do convívio social, temos a atividade de intervenção do


Estado na propriedade privada. É uma atividade tipicamente administrativa, mas que
interfere no âmbito dos particulares.

Existem duas espécies de intervenção do Estado na propriedade:

a) Regulação do direito de propriedade: por meio de mecanismos como os


estudados no Estatuto da Cidade;

b) Instrumentos típicos de intervenção do Estado na propriedade: são


instrumentos revestidos de imperatividade e, por vezes, de
autoexecutoriedade, de forma a viabilizar o desenvolvimento de atividades
públicas. A ideia de consensualismo aqui é mitigada, não podendo o
particular se opor às intervenções estatais em sua propriedade. Eles
traduzem um desafio que é promover o equilíbrio entre o direito de
propriedade e o atendimento do interesse público. Ex. servidão
administrativa, ocupação temporária, requisição.

Todos os instrumentos típicos de intervenção do Estado na propriedade partem de três


fundamentos principiológicos:

 Domínio eminente: é a ideia de que o Estado exerce poder sobre todos os


bens em seu território.

 Função social da propriedade; e

 Supremacia do interesse público (visando o bem estar da coletividade em


detrimento do particular)

Os três instrumentos típicos que serão objeto da aula – servidão administrativa,


ocupação temporária e requisição – são instrumentos com baixa densidade normativa,
isto é, que não tem uma regulação bem definida.

Enquanto a requisição é mencionada no art. 5º, XXV, da CF, a servidão e a ocupação


temporária são mencionadas no Decreto 3.365/41. Portanto, o contorno destes
institutos é firmado em sua maior parte pela doutrina e pela jurisprudência.

86
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

Passemos ao estudo detalhado de cada um desses instrumentos, a começar pelo


instituto da servidão administrativa.

 SERVIDÃO ADMINISTRATIVA:

A servidão administrativa é espécie de intervenção do Estado na propriedade privada,


é direito real público que autoriza o Poder Público a usar a propriedade imóvel alheia
para permitir a execução de obras e serviços de interesse coletivo (José dos Santos
Carvalho Filho).

A servidão administrativa, em razão de constituir direito real de uso em favor do Estado


sobre uma propriedade de um particular, deverá ser inscrita no Registro de Imóvel para
produzir efeitos contra todos (erga omnes)

De quem é ônus de provar o prejuízo sofrido em razão da instituição da servidão


administrativa?

Na servidão administrativa não há presunção de prejuízo, estamos diante de poder de


polícia que é legitimo auto executável.

O ônus da prova, nesse caso, é do réu/ particular de provar o prejuízo sofrido na


propriedade em razão da instituição da servidão administrativa.

A servidão administrativa não é exatamente igual à servidão civil, porque, na servidão


civil, há a ideia de prédio dominante/prédio serviente, que fica comprometida em
termos de servidão administrativa.

Na servidão administrativa, há uma relação de vinculação entre a propriedade do


particular e a execução de uma obra/um serviço coletivo, na qual aquela
instrumentaliza esta.

A servidão administrativa não importa perda da propriedade, mas restrição das


faculdades inerentes ao direito de propriedade, notadamente o uso e o gozo/fruição
de imóvel específico.

Por essa razão, é considerada uma modalidade de intervenção branda (não implica
perda da propriedade) e permanente (≠ precário, pois não se submete a um prazo
determinado, via de regra, o que não significa que seja perpétua) na propriedade.

Exemplo: passagem de aqueduto, instalação de poste, instalação de placa de rua,


instalação de rede elétrica, implantação de gasodutos etc.

O particular tem a obrigação de aceitar que o Poder Público intervenha no uso e gozo
daquela propriedade.

87
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

Qual a diferença entre (i) servidão administrativa e (ii) limitação administrativa?

Por incidir sobre imóvel específico, a servidão administrativa não se confunde com a
limitação administrativa, que, embora possa se restringir a determinada área, tem
caráter genérico.

Assim, a principal diferença é que a servidão administrativa restringe o uso de um


imóvel específico, enquanto que a limitação administrativa restringe determinada
área, tendo, portanto, um caráter mais genérico.

Qual a base legal da servidão administrativa?

O art. 40 do Decreto 3.365/41 é o que trata de servidão administrativa. Ele determina


que o expropriante poderá constituir servidões, mediante indenização, no âmbito
desta lei.

Embora o art. 40 fale em “mediante indenização”, a instituição de uma servidão


administrativa não vai ensejar necessariamente indenização. A indenização não é a
regra. Ela incidirá na medida do prejuízo concreto sofrido pelo particular devidamente
comprovado. Ex. a rigor, servidão para colocação de placa de rua não gera indenização.

O fato de a indenização não ser a regra na servidão, faz com que esta se diferencie
das modalidades ordinárias de desapropriação, que dependem de prévia e justa
indenização em dinheiro.

Pode o possuidor do imóvel buscar indenização em razão de prejuízos causados por


uma servidão?

Sim!!! Se a servidão atinge o uso e a fruição do bem, ela atinge não apenas os direitos
do proprietário, mas também do legítimo possuidor. Se um possuidor tiver prejuízo
individualizado e concreto por conta da servidão, ele será indenizado. Portanto, ele
tem legitimidade para buscar indenização. Vide TJRJ, AC 0009259.49.2003.8.19.0021.

Assim, temos que além do proprietário, o possuidor do imóvel que sofrer a restrição
também poderá pedir indenização em razão da servidão, desde que comprove os
prejuízos sofridos.

Atenção!!!
Em regra, as modalidades de intervenção do Estado na propriedade não ensejam dano
moral, pois feitas em prol do interesse público.

88
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

Qual o rito a ser seguido para a instituição da servidão administrativa?

Na teoria, a servidão deveria seguir o devido processo legal atinente à desapropriação,


ou seja, o rito previsto no Decreto 3.365/41.

O rito da desapropriação é composto de:

a) Fase Administrativa:

a.1. Fase Declaratória: em regra, se manifesta pelo decreto expropriatório


(identificação do bem e da finalidade da expropriação). Quem tem
competência declaratória são os entes federativos nos limites materiais de
sua atuação.

a.2. Fase Executória: visa levar a efeito a desapropriação já declarada. Em


regra, a competência executória também é dos entes federativos, mas nesse
caso, cabe delegação para outros entes da Administração Pública Direta e
Indireta e até mesmo para as concessionárias de serviço público mediante
autorização em lei ou no contrato.

É possível que, já na fase executória, seja estabelecido um acordo com um


particular, caso em que há a desapropriação amigável, sem posterior fase
judicial.

Se não houver concordância do particular com o valor oferecido pelo Poder


Público a título de indenização, dá-se início à fase judicial.

b) Fase Judicial: não concordando o particular com o valor da indenização, o


Poder Público promoverá ação de desapropriação. O mérito na ação de
desapropriação é o valor da indenização e não a própria desapropriação,
visto que o particular não pode se opor à intervenção.

É prevalente o entendimento de que a servidão para ser legitimamente instituída, a


rigor, deve seguir esses mesmos passos. A particularidade cinge-se ao fato de que a
indenização no caso da servidão não é a regra, cabendo ao particular prová-la.

Quais as formas de instituição de servidão administrativa?

As servidões administrativas podem decorrer:

a) DE ACORDO: deve ser precedido de ato declaratório de utilidade pública.


Nesse caso, houve composição amigável entre o Poder Público e o
particular.

89
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

b) DE SENTENÇA: se o particular se opôs à servidão, sem poder fazê-lo, ou


mesmo ao valor pago a título de indenização, o Poder Público promove a
ação de instituição de servidão administrativa, que segue o mesmo rito da
ação de desapropriação.

c) DE USUCAPIÃO: a instituição de servidão por meio da usucapião é prevista


no art. 1379 do CC.

Art. 1.379 do CC: “O exercício incontestado e contínuo de uma servidão aparente,


por dez anos, nos termos do art. 1.242, autoriza o interessado a registrá-la em
seu nome no Registro de Imóveis, valendo-lhe como título a sentença que julgar
consumado a usucapião.
Parágrafo único. Se o possuidor não tiver título, o prazo da usucapião será de vinte
anos.”

É possível instituir servidão por meio de lei?

A doutrina diverge a cerca da possibilidade de instituição de servidão administrativa


por meio de lei. Vejamos:

CORRENTE 1) Parte da doutrina (José dos Santos Carvalho Filho) entende que a servidão
somente pode ser instituída por meio de acordo ou sentença judicial, sendo precedida
de decreto de utilidade púbica, NÃO sendo possível a instituição por meio de lei. Isso
porque se não há especificação do imóvel e da finalidade, a lei estaria criando
restrições a diversos imóveis, pelo que seria uma limitação administrativa e não uma
servidão.

Assim, para essa corrente a servidão deveria ser instituída por ato concreto,
individualizado. Assim, se uma servidão já for instituída por lei ou ato normativo, ela
já será conceituada e considerada limitação administrativa (seria justamente o que
diferencia a limitação administrativa [sempre por lei], da servidão administrativa).

CORRENTE 2) Corrente defendida por Maria Sylvia Di Pietro entende que pode sim a
servidão administrativa ser instituída por lei.

Para a prof. Maria Sylvia, a distinção entre as duas intervenções (limitação adm. e
servidão adm.) não seria a forma de instituição, mas sim, que, no caso da limitação
administrativa, a lei estabelece a restrição para atender a um interesse público geral,
genérico, uma vez que o interesse protegido é um direito difuso, coletivo, mais
abrangente. Já a servidão administrativa poderia ser instituída por lei, mas o interesse
público a ser protegido é um interesse público corporificado, a ser identificado, num
determinado bem.

A doutrina majoritária entende que pode ser tanto por lei quanto por ato
administrativo.

90
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

De quem é a competência para tratar de servidão administrativa?

A servidão administrativa pode ser instituída pelo Poder Público ou por seus
delegatários. Nesse último caso, os delegatários dependem de autorização legal ou
negocial para promover os atos necessários à efetivação da servidão e serão
responsáveis pelas respectivas e eventuais indenizações.

Assim, são competentes para instituir uma servidão administrativa:

 Entes Federativos;
 ANEEL: conforme art. 10 da Lei 9.074/95; e
 DNIT: a Lei 10.233 confere competência declaratória para decretar a
desapropriação ao DNIT; portanto, a princípio, também teria competência
declaratória para instituir servidão.

 APLICABILIDADE DO DECRETO 3.365/41:

1. Necessidade de declaração da utilidade ou necessidade pública por ato


indelegável;

2. Avaliação e proposta de conciliação;

3. Ajuizamento de ação (se for a hipótese) com a possibilidade de imissão


provisória na posse;

4. Incidência dos acrescidos legais (questão do justo preço pelo prejuízo em


concreto – STJ, REsp 1050641) – abarca juros moratórios, juros compensatórios
(Súmula 56, STJ) e atualização. O art. 40 do Dec. 3.365/41 manda indenizar
“nos termos da lei”, portanto, incidem os acrescidos previstos neste decreto.

Súmula 56 do STJ: “Na desapropriação para instituir servidão administrativa são


devidos os juros compensatórios pela limitação de uso da propriedade.”

Quais as formas de extinção da servidão administrativa?

A servidão administrativa é em princípio permanente, contudo, podem ocorrer fatos


supervenientes que acarretam a extinção da servidão.

A doutrina afirma existir algumas formas de extinção da servidão administrativa, quais


sejam:

 Desaparecimento do bem (ex: inundação permanente do imóvel objeto da


servidão de trânsito);
 Incorporação do bem ao patrimônio público; e

91
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

 Desafetação do bem dominante (ex: desafetação do imóvel que era utilizado


como hospital público).

Qual o prazo prescricional para a ação de indenização em face de servidão


administrativa?

A matéria é tratada no art. 10 do Decreto 3.365, prevalecendo o prazo de 5 anos (a


contar da data do ato restritivo) para que o particular pleiteie indenização em razão
dos prejuízos sofridos com a instituição da servidão.

Podem consórcios públicos celebrar servidão administrativa?

SIM!!! Dispõe o art. 2, par. 1, inc. II da Lei 11.107/2005, que o consórcio público
poderá, para fins de cumprir seus objetivos, conforme o contrato de consórcio de
direito público, promover desapropriações e instituir servidões nos termos de
declaração de utilidade ou necessidade pública, ou interesse social, realizada pelo
Poder Público.

Concluído o estudo das servidões administrativas, passemos ao estudo da ocupação


temporária, modalidade de intervenção do Estado na propriedade.

 OCUPAÇÃO TEMPORÁRIA:

A ocupação temporária é forma de intervenção do Estado por meio do qual o Poder


Público usa, por prazo determinado, imóveis privados, como meio de apoio à execução
de obras e serviços públicos (José dos Santos Carvalho Filho). Ver art. 36 do Dec.
3.365/41.

Trata-se de intervenção branda, pois não implica na perda da propriedade, e


transitória, pois tem prazo para seu término, qual seja o término da obra e serviço
público para o qual serve de apoio.

Em regra, a ocupação temporária incidirá sobre bens imóveis, principalmente diante


do art. 36 do Dec. 3.365/41. Contudo, excepcionalmente, o art. 58, V, da Lei 8.666
prevê a ocupação temporária de bens móveis, imóveis e serviços para dar
prosseguimento a serviços considerados essenciais.

A ocupação temporária é direito pessoal, enquanto que a servidão é direito real


(precisando a servidão ser registrada no RGI). Assim, temos que a ocupação temporária
não possui caráter de direito real e tem a característica da transitoriedade (igual a
requisição), contudo não exige situação de perigo público iminente (diferente da
requisição), há apenas a exigência do interesse público.

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Emerj CPIII-A Direito Administrativo

Quais as modalidades de ocupação temporária existentes no nosso ordenamento


jurídico?

Com base no art. 36 do DL 3365, alguns doutrinadores, como José dos Santos Carvalho
Filho, entendem que há duas espécies de ocupação temporária:

a) Vinculada ao processo de desapropriação: quando para realizar a


obra/serviço em imóvel que tenha sido objeto de desapropriação, o Poder
Público precisa ocupar temporariamente o imóvel vizinho.

b) Desvinculada do processo de desapropriação: quando para realizar a


obra/serviço em imóvel que não tenha sido objeto de anterior
desapropriação, o Poder Público precisa ocupar temporariamente o imóvel
vizinho.

Quais as formalidades que devem ser seguidas para a instituição da ocupação


temporária?

A legislação não estabeleceu regras para a instituição da ocupação temporária, razão


pela qual parte da doutrina afirma o seu caráter autoexecutável.

Outros autores, contudo, entendem que as formalidades para instituição da ocupação


temporária dependem da modalidade de ocupação:

 A ocupação temporária vinculada à desapropriação depende de um ato formal


de instituição (decreto), especialmente pela maior duração da ocupação e pelo
dever de indenizar o proprietário.

 A ocupação temporária desvinculada da desapropriação é autoexecutória e


dispensa ato formal.

Prof. Rafael de Oliveira defende que a ocupação temporária, em qualquer caso,


depende de edição prévia de decreto, bem como de acordo com o proprietário ou
sentença judicial.

É cabível indenização ao proprietário no caso de ocupação temporária?

O art. 36 do DL 3365 estabelece que a ocupação temporária será indenizada por ação
própria.

A doutrina diverge sobre o tema verificando-se as seguintes posições:

93
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

CORRENTE 1) José dos Santos Carvalho Filho, minoritariamente, entende que só há


direito de indenização quando a ocupação temporária está vinculada ao processo de
desapropriação.

CORRENTE 2) Parcela da doutrina entende que a ocupação temporária deve ser


indenizada. O Poder Público deve pagar pelo uso da propriedade do particular,
independentemente de ter ocorrido prejuízo efetivo à propriedade. É como se fosse
uma “taxa de ocupação” (um aluguel). A indenização será paga ao final. [posição
majoritária – confirmar]

CORRENTE 3) Existe ainda corrente que defende que, em qualquer caso, a indenização
somente será devida se comprovado o dano pelo proprietário do bem ocupado, sob
pena de se admitir o pagamento de indenização sem ocorrência do efetivo prejuízo, o
que acarretaria enriquecimento sem causa do particular.

Quais as formas de extinção da ocupação temporária?

A ocupação temporária deve ser efetivada, em regra, por prazo determinado. Expirado
o prazo da ocupação cessa a intervenção.

Caso não haja prazo prefixado, a ocupação cessará com a execução da obra ou do
serviço que justificou a sua instituição.

Qual o prazo prescricional para a ação de indenização em face de servidão


administrativa?

O prazo prescricional para a propositura da ação indenizatória é de 5 anos, na forma


do art. 10, par. único, do DL 3365/41.

 REQUISIÇÃO:

A requisição é modalidade de intervenção estatal por meio da qual o Estado utiliza


bens móveis, imóveis e serviços particulares, independentemente de sua vontade ou
de decisão judicial, por razão de eminente perigo público ou em tempo de guerra (José
dos Santos Carvalho Filho). É a necessidade de eminente perigo público que distingue
esse instituto da ocupação temporária.

Trata-se de um ato unilateral, de utilização transitória, compulsória, discricionária e


autoexecutória da Administração Pública.

Tem sede constitucional no art. 5º, inc. XXV, da CF/88.

Art. 5 da CF: “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,
garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a

94
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à


propriedade, nos termos seguintes:
XXV - no caso de iminente perigo público, a autoridade competente poderá usar
de propriedade particular, assegurada ao proprietário indenização ulterior, se
houver dano;

CUIDADO!!! A competência legislativa é exclusiva da União (art. 22, inc. III da


CRFB/88). Mas todos os Entes têm competência para implementar requisições.

Fala-se em indenização se houver dano. Ex.: perseguição policial em que a polícia pega
o carro do particular para correr atrás do bandido. O uso da gasolina será indenizado.
Se o carro der perda total, haverá indenização pelo carro na sua totalidade. Logo,
temos uma intervenção drástica na propriedade.

Assim, a regra é ser transitória e branda, contudo, se o bem for destruído


(perecimento), teremos uma intervenção drástica que importa na perda da
propriedade e indenização sofrida pelo particular. A regra, entretanto, não é a
indenização, que somente ocorrerá se houver dano.

A requisição administrativa também pode incidir sobre bens imóveis. Ex.: quando há
chuva forte que destrói casas, assim, Poder Público precisa de terreno para montar
tendas para as pessoas que perderam suas casas.

Ainda, é possível a requisição de serviços, em casos de convocação de mesários para


eleição, de jurados pelo Tribunal de Juri e conscritos para o serviço militar obrigatório,
em que pese a CF fazer menção à “propriedade particular”.

É possível instituir a requisição sobre bens e serviços públicos?

O art. 136, §1º, inc. II da CF/88 permite que isso ocorra no âmbito do Estado de Defesa
e o art. 139, inc. VI e VII d CF/88 permite que isso ocorra em havendo Estado de Sítio.

O STF ao analisar a requisição federal de hospitais públicos municipais, entendeu que


a requisição administrativa tem por objeto, em regra, os bens e serviços privados e
que a requisição de bens e serviços públicos possui caráter excepcional somente
podendo ser efetivada após o procedimento constitucional para a declaração formal
do Estado de Defesa e do Estado de Sítio. Não é possível a requisição de bens públicos
em situação de normalidade institucional.

Abaixo julgado sobre o tema:

Ver MS 25295: “CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA.


MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO. UNIÃO FEDERAL. DECRETAÇÃO DE ESTADO DE
CALAMIDADE PÚBLICA NO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE NO MUNICÍPIO DO RIO DE
JANEIRO. REQUISIÇÃO DE BENS E SERVIÇOS MUNICIPAIS. DECRETO 5.392/2005 DO

95
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

PRESIDENTE DA REPÚBLICA. MANDADO DE SEGURANÇA DEFERIDO. Mandado de


segurança, impetrado pelo município, em que se impugna o art. 2º, V e VI
(requisição dos hospitais municipais Souza Aguiar e Miguel Couto) e § 1º e § 2º
(delegação ao ministro de Estado da Saúde da competência para requisição de
outros serviços de saúde e recursos financeiros afetos à gestão de serviços e ações
relacionados aos hospitais requisitados) do Decreto 5.392/2005, do presidente da
República. Ordem deferida, por unanimidade. Fundamentos predominantes: (i) a
requisição de bens e serviços do município do Rio de Janeiro, já afetados à
prestação de serviços de saúde, não tem amparo no inciso XIII do art. 15 da Lei
8.080/1990, a despeito da invocação desse dispositivo no ato atacado; (ii) nesse
sentido, as determinações impugnadas do decreto presidencial configuram-se
efetiva intervenção da União no município, vedada pela Constituição; (iii)
inadmissibilidade da requisição de bens municipais pela União em situação de
normalidade institucional, sem a decretação de Estado de Defesa ou Estado de
Sítio. Suscitada também a ofensa à autonomia municipal e ao pacto federativo.
Ressalva do ministro presidente e do relator quanto à admissibilidade, em tese,
da requisição, pela União, de bens e serviços municipais para o atendimento a
situações de comprovada calamidade e perigo públicos. Ressalvas do relator
quanto ao fundamento do deferimento da ordem: (i) ato sem expressa motivação
e fixação de prazo para as medidas adotadas pelo governo federal; (ii) reajuste,
nesse último ponto, do voto do relator, que inicialmente indicava a possibilidade
de saneamento excepcional do vício, em consideração à gravidade dos fatos
demonstrados relativos ao estado da prestação de serviços de saúde no município
do Rio de Janeiro e das controvérsias entre União e município sobre o
cumprimento de convênios de municipalização de hospitais federais; (iii) nulidade
do § 1º do art. 2º do decreto atacado, por inconstitucionalidade da delegação,
pelo presidente da República ao ministro da Saúde, das atribuições ali fixadas;
(iv) nulidade do § 2º do art. 2º do decreto impugnado, por ofensa à autonomia
municipal e em virtude da impossibilidade de delegação.”

Existe alguma formalidade para a instituição da requisição?

Em razão do estado de necessidade pública (urgência), o Poder Público possui a


prerrogativa de requisitar bens e serviços para afastar o iminente perigo público,
independentemente de processo administrativo prévio. A emergência da situação
justifica a autoexecutoriedade da medida.

Como se dá a extinção da requisição?

Enquanto perdurar o perigo eminente a requisição continuará válida.

Considera-se, portanto, extinta a requisição quando desaparecer a situação de perigo.

Qual o prazo prescricional para ação de indenização em face de requisição?

96
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

O prazo prescricional para a propositura da ação indenizatória é de 5 anos, na forma


do art. 10, par. único, do DL 3365/41.

Casos Concretos:

Questão 1)

Certa empresa pública federal, devidamente autorizada e após o devido processo


administrativo, ajuizou uma ação em face de Florêncio a fim de instituir uma
servidão para a construção de um mineroduto, com vistas ao escoamento de
produção mineral, que atingirá parcela da propriedade do réu. A demandante
pleiteou a imissão provisória na posse e depositou os valores apontados pelos
técnicos da estatal. Em sede de defesa, Florêncio assevera que a instituição de uma
servidão não pode ser confundida com desapropriação, de modo que não cabe a
imissão na posse pretendida e, ainda que se entenda pelo seu cabimento, há
necessidade de realização de avaliação judicial para o deferimento da liminar
pretendida. Alega ainda que o Estado não pode impor ao proprietário medida que
irá beneficiar empresas privadas, notadamente as mineradoras existentes na
região. O Juízo deferiu a imissão na posse e, posteriormente, na fase instrutória,
determinou a realização de perícia, que alcançou valor superior ao previamente
depositado, correspondente ao montante da terra nua efetivamente atingida pelo
mineroduto, que não continha nenhuma construção e à qual ainda não havia sido
conferida nenhuma destinação econômica. Diante dessa situação hipotética,
responda, fundamentadamente, aos questionamentos a seguir:
A) É possível a imissão provisória na posse na ação em comento? Aponte os requisitos
para a concessão da medida.
B) É cabível a fixação de juros compensatórios, para fins de indenização?

Resposta:

A – Sim. Aplicam-se ao procedimento de constituição de servidão administrativa, no


que couber, as regras que norteiam o instituto da desapropriação por utilidade pública,
como previsto no art. 40 do DL 3365. Por isso o beneficiário da limitação administrativa
do imóvel poderá ser imitido na posse do mesmo, em caso de urgência, quando
efetivado o depósito-prévio, em consonância com os critérios previstos no art. 15, par.
1 do DL 3365.

Entre os requisitos destacam-se declaração de utilidade pública, deposito prévio do


valor e urgência, e a legalidade do decreto. Há quem entenda ainda que a liminar pode
ser deferida mesmo sem depósito prévio, uma vez que, nesse caso, o depósito nao é
presumido e que a empresa não estaria obrigada a depositar o valor previamente.

97
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

O decreto que declara a servidão administrativa é ato discricionário da Adm. Pública,


logo, o juiz não pode se imiscuir nas questões de oportunidade e conveniência da
Administração Pública (mérito administrativo). A atuação do Judiciário, nesse casos,
limita-se a questões relacionadas à legalidade do ato.

B – Sim, é cabivel juros compensatórios, pois a jurisprudência consolidou o


entendimento de que são devidos pela simples perda antecipada da posse, na hipótese
de desapropriação, como também pela limitação da propriedade, no caso de servidão
administrativa.

O pagamento de juros compensatórios funciona como se fosse uma espécie de


remuneração, de aluguel pelo uso de parte da propriedade. Como não há uma
regulação legal, discute-se a previsão do pagamento desses juros compensatórios. A
discussão também passa sobre a servidão administrativa para fins de desapropriação e
servidão administrativa por si só. Há quem defenda que só é cabivel juros
compensatórios para os casos de servidão por desapropriação.

Juros compensatórios é o valor que se cobra durante o período que o Poder Público
limitou o de uso da propriedade pelo particular. Se a empresa foi emitida na posse e
usou a propriedade, cabe sim os juros compensatórios (que começam a contar a partir
da emissão na posse). A matéria encontra-se, inclusive, sumulada (Súmula 56 do STJ)

Juros de mora é uma penalidade moratória, só pode ser 1 % ao mês (tem uma limitação
legal). Também incidem a partir da data de emissão na posse. Ele não incide sobre o
valor total, mas sim sobre a diferença que foi apurada na perícia.

Questão 2)

Veruscia Schock ajuizou ação ordinária em face de certa concessionária de energia


elétrica, sob o fundamento de ter sofrido inúmeros prejuízos e restrições no uso de
imóvel rural de sua propriedade, decorrentes da instalação de um eletroduto de
alta tensão, com as respectivas torres, devidamente autorizada pelo ente
competente. A autora alega que firmou um acordo com a ré para fins de instituição
de servidão, em uma faixa predeterminada pelo que recebeu a quantia de R$
20.000,00 (vinte mil reais), mas tal montante se revelou ínfimo para cobrir os
prejuízos decorrentes da instalação do eletroduto e suas respectivas torres, que
comprometeram a utilização do imóvel em mais do que o dobro do inicialmente
avençado; razão pela qual pede indenização pelos danos sofridos. Em sede de
defesa, a concessionária informa que não houve qualquer vício de consentimento na
constituição da servidão, para a qual foi dada quitação, formalizada, inclusive,
mediante escritura pública. Considerando que restou comprovado nos autos que
houve o pagamento do acordo inicial e que a servidão, de fato, compromete uso de
área maior do que a prevista em tal avença, esclareça se cabe indenização em
decorrência da modalidade de intervenção do Estado na propriedade em apreço,
mediante o apontamento de suas características e formas de constituição.

98
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

Resposta:

É cabivel a complementação por meio de indenização se restar comprovado que houve


prejuízo. O ônus da prova é da proprietária de provar o prejuízo. É uma servidao
administrativa, é um direito real. A sentença ou acordo deveriam ser registrados no
RGI.

O prazo prescricional para interposição dessa ação é de 5 anos na forma do art. 10 DL


3.365/41.

REsp 1050641: “ADMINISTRATIVO. SERVIDÃO. ENERGIA ELÉTRICA. ÁREA NÃO


INDENIZADA. JUSTO PREÇO. 1. Aferida que a servidão de passagem ocupa área
maior do que aquela prevista na escritura pública, deve haver a complementação
do valor para que se respeite o princípio do justo preço. Precedentes de ambas as
Turmas de Direito Público.”

REsp 977875: “PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA.


LEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM. CISÃO DE EMPRESAS. RESPONSABILIDADE.
REEXAME DE MATÉRIA FÁTICO-PROVATÓRIA. SÚMULA 07/STJ. PRAZO
PRESCRICIONAL. SÚMULA 119/STJ. JUROS COMPENSATÓRIOS. SÚMULA 69/STJ.
TERMOS INICIAL. EFETIVA OCUPAÇÃO. 3. As servidões administrativas, em regra,
decorrem diretamente da lei (independente de qualquer ato jurídico, unilateral
ou bilateral) ou constituem-se por acordo (precedido de ato declaratório de
utilidade pública) ou por sentença judicial (quando não haja acordo ou quando
adquiridas por usucapião), por isso que não observadas as formalidades
necessárias, em atenção ao princípio da eficiência e da continuidade do serviço
público, deve ser mantida a servidão, com a indenização correspondente à justa
reparação dos prejuízos e das restrições ao uso do imóvel, como ocorre com a
desapropriação indireta, obedecido o regime jurídico desta. 4. Consectariamente,
pertinente a aplicação da Súmula 119/STJ e a inaplicação do art. 10, do Decreto-
lei n.º 3.365/41, porquanto "o prazo de que trata o art. 10 do Decreto-lei 3.365/41
dirige-se ao expropriante, a quem cabe ajuizar a ação de desapropriação direta
ou efetivar acordo dentro do prazo quinquenal, o que não se confunde com o prazo
vintenário de que dispõe o expropriado para intentar ação de desapropriação
indireta (Súmula 119/STJ)". (Resp. 788282/PR, Rel. Min. Eliana Calmon, DJU de
30.04.07). 5. O prazo prescricional da ação de desapropriação indireta é
vintenário, não se aplicando o lapso qüinqüenal estabelecido pelo DL 20.910/32,
matéria que, ademais, foi sumulada no verbete n. 119 do STJ, que dispôs: "A ação
de desapropriação indireta prescreve em vinte anos". 6. Os juros compensatórios
na desapropriação indireta são devidos a partir da efetiva ocupação do imóvel,
nos exatos termos da Súmula 69/STJ: "Na desapropriação direta, os juros
compensatórios são devidos desde a antecipada imissão na posse e, na
desapropriação indireta, a partir da efetiva ocupação no imóvel".

Questão 3)

99
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

Certo Município se apossou do imóvel vizinho àquele em que foram realizadas obras
para a instalação de rede de esgoto, como meio de apoio à execução da construção,
certo que adentrou no terreno, que estava vazio, sem notificar os respectivos donos,
e ali permaneceu durante o tempo de realização da empreitada, que perdurou por
mais de 1 (um) ano. Frise-se que a utilização do bem sobre o qual efetivamente
foram instalados os dutos necessários para a instalação da rede de esgoto, se deu
na forma da lei. Analise quais as modalidades de intervenção do Estado estão
descritas na referida situação e esclareça se há direito de indenização, mesmo na
hipótese de não ter havido dano ou depreciação dos imóveis em questão.

Resposta:

O caso em tela traz duas modalidades de intervenção, quais sejam, a ocupação


temporária e a servidão.

TJSP APL 994071482976: “SERVIDÃO ADMINISTRATIVA IMPLANTAÇÃO DE REDE DE


ESGOTO – OCUPAÇÃO TEMPORÁRIA DA ÁREA – INDENIZAÇÃO CABÍVEL – ART. 36 DO
DL 3365/41. A ocupação temporária por parte do poder público de área
pertencente a terceiro, para a implantação de servidão administrativa, deve ser
indenizada, nos termos do art. 36 do DL 3365. De outro lado, nao comprovados os
danos ou depreciações alegados pelos proprietários, a indenização deverá
abranger apenas a servidão administrativa instalada na área e a ocupação
temporária do terreno.”

[confirmar gabarito pois está diferente do que o prof falou em sala de aula]

100
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

Aula 6 – Prof. Guilherme Pena


9/10/18

EMENTA:  Limitações Administrativas.


 Tombamento.

Daremos continuidade ao estudo da intervenção do Estado sobre a propriedade. O tema


será abordado no âmbito do direito civil e no âmbito do direito administrativo.

O prof. Guilherme iniciou a aula fazendo uma introdução sobre o instituto da


propriedade.

 PROPRIEDADE:

Propriedade é o direito de usar, fruir e dispor sobre coisa, como também de persegui-
la contra quem injustamente a detenha ou possua.

Quais os aspectos da propriedade?

Em Portugal se fala que a propriedade possui dois aspectos:

(i) Aspecto Interno ou Econômico: é composto por 3 faculdades inerentes ao


domínio (usar/fruir e disposição).

 USO: significa utilização da coisa segundo a sua destinação


econômica;
 FRUIÇÃO: significa a percepção de frutos da coisa; e
 DISPOSIÇÃO: significa alienação da coisa, destruição da coisa, ou
modificação de forma substancial da coisa.

(ii) Aspecto Externo ou Jurídico: é composto por duas outras faculdades, quais
sejam: exclusão e sequela.

 EXCLUSÃO: é o afastamento da esfera de senhorio da coisa; e


 SEQUELA: é a perseguição contra quem tem a posse ou detenção
injusta da coisa.

Quais são as características da propriedade?

Na França costuma se dizer que a propriedade tem três caracteristicas e todas elas
possuem exceções:

101
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

(i) EXCLUSIVIDADE: a propriedade é exclusiva e por consequência excludente,


ou seja, pertence ao proprietário e exclui os demais. Contudo, o condomínio
é exceção a essa característica.

(ii) PLENITUDE: a propriedade, em regra, investe o proprietário nas faculdades


inerentes ao domínio. O proprietário, em regra, é titular de todas as
faculdades inerentes ao domínio. A exceção a essa característica é a
propriedade restrita, quando o proprietário perde alguns faculdades (ex:
aforamento, uso e etc)

Aqui está a distinção que existe entre direito real e pessoal. Quando se fala
em usufruto (direito real), se transmite ao usufrutuário a titularidade. No
caso do locatário (direito pessoal), transmite-se o fato de ser mero
exercente das faculdades de uso e fruição.

(iii) PERPETUIDADE: a propriedade é perpétua, destacando-se as seguintes


subcaracterísticas:

 Hereditariedade: a propriedade se transmite pela causa mortis, o


óbito transmite de modo imediato a propriedade para alguém;

 Imprescritibilidade: o não exercício da propriedade, por si só, nunca


será motivo para que ela se perca sozinha por usucapião;

 Inviolabilidade: a propriedade, enquanto for usada em conformidade


com sua função social, será objeto de proteção, de tutela pelo
Estado. Quando ela for usada em desconformidade com a função
social, ela passará a ser objeto de intervenção por parte do Estado.

A exceção à perpetuidade é a propriedade resolúvel, é aquilo que não é perpétuo. Se


a propriedade é resolúvel é porque está submetida a termo final ou condição
resolutiva, logo não pode ser perpétua.

Não confundir com propriedade restrita, que é aquilo que não é pleno, ou seja, ela
não tem todas as faculdades inerentes ao domínio por não ser plena.

Qual a função social da propriedade?

A propriedade não é vista como um fim em si própria, mas ela é um meio para alcançar
o fim e esse fim chama-se BEM ESTAR SOCIAL. A propriedade deve ser utilizada como
mecanismo para o bem-estar social.

A propriedade pode ser vista sobre dois ângulos: (i) titularidade (próprio do direito
privado) e (ii) exercício (próprio do direito público) .

102
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

(i) Ângulo da Titularidade: direito absoluto, oponível erga omnes; e

(ii) Ângulo do Exercício: direito relativo, e por ser relativo sofre restrições via
ponderação. Se entrar em colisão com outro principio, será objeto de
ponderação e essa ponderação poderá gerar restrições na propriedade.

A matéria é tratada nos arts. 186, caput da CF (propriedade rural) e ainda no art. 182,
par. 2 da CF (propriedade urbana).

Art. 186 da CF: A função social é cumprida quando a propriedade rural atende,
simultaneamente, segundo critérios e graus de exigência estabelecidos em lei, aos
seguintes requisitos:
I - aproveitamento racional e adequado;
II - utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio
ambiente;
III - observância das disposições que regulam as relações de trabalho;
IV - exploração que favoreça o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores.

Art. 182 da CF: A política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder


Público municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo
ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem-
estar de seus habitantes.
§ 2 - A propriedade urbana cumpre sua função social quando atende às exigências
fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor.

Feita essa introdução sobre propriedade, passemos ao estudo da intervenção do Estado


na propriedade:

 INSTRUMENTOS OU MECANISMOS DE INTERVENÇÃO DO ESTADO NA PROPRIEDADE:

Entre os instrumentos ou mecanismos de intervenção do Estado na propriedade


destacam-se:

 Requisição Administrativa;
 Ocupação Temporária;
 Limitação Administrativa;
 Parcelamento e Edificação Compulsória;
 Tombamento;
 Servidão Administrativa; e
 Desapropriação.

Abaixo vejamos as principais características de cada forma de intervenção do Estado


na propriedade:

103
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

 REQUISIÇÃO ADMINISTRATIVA:

A requisição está prevista no art. 5, XXV; art. 22, iii e art. 139, vii da CF. A
fundamentação legal esta prevista no DL 4812/42.

A requisição administrativa é direito pessoal consistente na utilização provisória de


bem imóvel, bem móvel ou serviço alheio para atendimento de situação de perigo
público iminente com indenização posterior dos prejuízos sofridos.

Exemplo:
Ameaça de guerra em que a Argentina invade a fronteira do Brasil. A União poderá
requisitar a utilização de uma fazenda provisoriamente para instalar o acampamento
militar do Brasil. Ao final da guerra, a União deverá indenizar o proprietário da fazenda
e devolver o imóvel objeto de requisição.

Sobre o tema da requisição administrativa, destaca-se ainda o seguinte julgado:

MS 25295: CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA.


MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO. UNIÃO FEDERAL. DECRETAÇÃO DE ESTADO DE
CALAMIDADE PÚBLICA NO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE NO MUNICÍPIO DO RIO DE
JANEIRO. REQUISIÇÃO DE BENS E SERVIÇOS MUNICIPAIS. DECRETO 5.392/2005 DO
PRESIDENTE DA REPÚBLICA. MANDADO DE SEGURANÇA DEFERIDO. Mandado de
segurança, impetrado pelo município, em que se impugna o art. 2º, V e VI
(requisição dos hospitais municipais Souza Aguiar e Miguel Couto) e § 1º e § 2º
(delegação ao ministro de Estado da Saúde da competência para requisição de
outros serviços de saúde e recursos financeiros afetos à gestão de serviços e ações
relacionados aos hospitais requisitados) do Decreto 5.392/2005, do presidente da
República. Ordem deferida, por unanimidade. Fundamentos predominantes: (i) a
requisição de bens e serviços do município do Rio de Janeiro, já afetados à
prestação de serviços de saúde, não tem amparo no inciso XIII do art. 15 da Lei
8.080/1990, a despeito da invocação desse dispositivo no ato atacado; (ii) nesse
sentido, as determinações impugnadas do decreto presidencial configuram-se
efetiva intervenção da União no município, vedada pela Constituição; (iii)
inadmissibilidade da requisição de bens municipais pela União em situação de
normalidade institucional, sem a decretação de Estado de Defesa ou Estado de
Sítio. Suscitada também a ofensa à autonomia municipal e ao pacto federativo.
Ressalva do ministro presidente e do relator quanto à admissibilidade, em tese,
da requisição, pela União, de bens e serviços municipais para o atendimento a
situações de comprovada calamidade e perigo públicos. Ressalvas do relator
quanto ao fundamento do deferimento da ordem: (i) ato sem expressa motivação
e fixação de prazo para as medidas adotadas pelo governo federal; (ii) reajuste,
nesse último ponto, do voto do relator, que inicialmente indicava a possibilidade
de saneamento excepcional do vício, em consideração à gravidade dos fatos
demonstrados relativos ao estado da prestação de serviços de saúde no município
do Rio de Janeiro e das controvérsias entre União e município sobre o
cumprimento de convênios de municipalização de hospitais federais; (iii) nulidade

104
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

do § 1º do art. 2º do decreto atacado, por inconstitucionalidade da delegação,


pelo presidente da República ao ministro da Saúde, das atribuições ali fixadas;
(iv) nulidade do § 2º do art. 2º do decreto impugnado, por ofensa à autonomia
municipal e em virtude da impossibilidade de delegação.”

Como visto acima pode-se requisitar até mesmo a propriedade pública (a União
requisitou 4 hospitais municipais em razão da situação calamitosa). É possível que haja
requisição de bem públicos sim. Nesse caso, a Lei 8080/90 (art. 15) permitiu
expressamente que a União faça a requisição de bem público municipal, desde que
observadas certas condições legais.

Art. 15 da Lei 8080/90: “A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios


exercerão, em seu âmbito administrativo, as seguintes atribuições:
XIII - para atendimento de necessidades coletivas, urgentes e transitórias,
decorrentes de situações de perigo iminente, de calamidade pública ou de
irrupção de epidemias, a autoridade competente da esfera administrativa
correspondente poderá requisitar bens e serviços, tanto de pessoas naturais como
de jurídicas, sendo-lhes assegurada justa indenização;

Logo, a intervenção do Estado não é somente sobre a propriedade privada, também


ocorrer sobre propriedade pública, mas desde que observados as condições legais.

 OCUPAÇÃO TEMPORÁRIA:

A ocupação temporária está prevista no art. 136, par. 1, ii da CF. A fundamentação


legal consta no DL 3365/41 (art. 36) e Lei 3924/61 (arts. 13 a 16).

A ocupação temporária é direito pessoal consistente na utilização provisória de bem


imóvel, para prestação de serviços públicos ou execução de obra pública, com
indenização posterior dos prejuízos causados.

Qual a diferença entre requisição e ocupação temporária?

Na requisição o objeto é mais amplo (bem móvel, bem imóvel e serviço), há também
a situação de perigo.

Na ocupação temporária o objeto é mais restrito (somente bem imóvel) e aqui não não
há o perigo iminente.

Exemplo:
Município que ocupa terreno baldio para guardar maquinário a ser utilizado em obra
pública.

Sobre o tema da ocupação temporária, destaca-se o seguinte julgado:

105
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

Re 84986: “Ocupação temporaria. Terreno não edificado, vizinho a obra pública


realizada pelo estado. Ii. Não precedida de notificação, nem justificada sua
omissao, condição imposta pela lei para que o proprietario possa exigir caução, se
considerada necessaria, caracteriza-se o esbulho possessorio, reparavel pela
reintegratoria e consequente indenização em perdas e danos. Aplicação dos arts.
36 do del. N 3365/41, c.c. 371 e 374 do c.p.c. 1939 (arts. 927 e 925, do c.p.c.,
1973). Iii. Recurso extraordinário limitado ao art. 119, iii, a, da constituição, não
conhecido.”

A causa é o apossamento administrativo e o efeito é que o bem se incorpora ao


patrimônio público, cabendo ao proprietário postular perdas e danos contra o Estado,
na forma do art. 35 do DL 3365/41. Aqui não se trata, portanto, de ocupação
temporária, mas sim de desapropriação indireta. Na desapropriação indireta o Estado
se apodera do bem sem qualquer formalidade.

Art. 35 do DL 3365/41: “Os bens expropriados, uma vez incorporados à Fazenda


Pública, não podem ser objeto de reivindicação, ainda que fundada em nulidade
do processo de desapropriação. Qualquer ação, julgada procedente, resolver-se-á
em perdas e danos.”

 LIMITAÇÃO ADMINISTRATIVA:

A limitação administrativa está prevista no art. 5, xxiii e art. 170 da CF. A


fundamentação legal está prevista na Lei 10257/01 (arts. 4, v, e vi; art. 25 a 27; art.
36 a 38).

A limitação administrativa é ato legislativo ou administrativo contido em lei ordinária


ou decreto executivo e praticado no exercício do poder de polícia, consistente em
restrição permanente ao uso de bem imóvel mediante imposição de obrigação de fazer
ou não-fazer para adequação do bem a sua função social, sem indenização dos
prejuízos causados.

Exemplo:
Gabarito de Prédio é limitação administrativa (lei municipal ou decreto). O Município
limita por exemplo prédios a 5 andares. Recuo de prédio também é limitação
administrativa.

Trata-se de exercício regular do poder de polícia estatal, com a estipulação de


restrições e condicionantes à propriedade alheia.

A extinção das limitações administrativas ocorre com a revogação da legislação ou dos


atos normativos.

Via de regra as limitações administrativas não serão indenizáveis, salvo se:

106
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

(i) Acarretarem danos desproporcioanais ao particular, sob o fundamento da


Teoria da Repartição dos Encargos Sociais, segundo a qual a sociedade, que
se beneficia com a atuação estatal, deve ter o ônus de compensar o
particular que sofreu prejuízos desproporcionais; e

(ii) Configurarem verdadeira desapropriação indireta: as limitações podem, em


certos casos, impor restrições tão fortes que retirarão as faculdades
inerentes do direito de propriedade de alguns particulares (ex: criação de
reserva ambiental que na prática inviabiliza o direito de propriedade do
particular)

Importante destacar que se as limitações administrativas precedem à aquisição da


propriedade, não cabe indenização ao novo proprietário, pois, nessa hipótese, o imóvel
já foi adquirido com a respectiva limitação legal.

O prazo prescricional para o ajuizamento da ação de indenização em face de limitação


administrativa é de 5 anos na forma do art. 10 do DL 3365.

JULGADO LIMITAÇÃO ADMINISTRATIVA


REsp 1454919  Edição de leis ambientais que restringem o uso da
propriedade caracterizam-se como limitações
administrativas.
 O que ocorre com a edição de leis ambientais que restringem
o uso da propriedade é a limitação administrativa, cujos
prejuízos causados devem ser indenizados por meio de ação
de direito pessoal, e não de direito real, como é o caso da ação
em face de desapropriação indireta. Assim, ainda que tenha
havido danos ao agravante, diante de eventual esvaziamento
econômico de propriedade, deve ser indenizado pelo Estado,
por meio de ação de direito pessoal, cujo prazo prescricional
é de 5 anos, nos termos do art. 10, parágrafo único, do
Decreto-Lei n. 3.365/41.
REsp 1317806  Limitação administrativa e indenização.
 Em regra, o proprietário não tem direito à indenização por
conta das limitações administrativas que incidam sobre sua
propriedade (a limitação administrativa é gratuita). No
entanto, excepcionalmente, a jurisprudência reconhece o
direito à indenização quando a limitação administrativa
reduzir o valor econômico do bem. O prazo prescricional para
que o proprietário busque a indenização por conta das
limitações administrativas é de 5 anos.
AR 2075/PR  Se, quando o proprietário adquiriu o imóvel, já havia a
limitação administrativa ele não poderá pedir indenização.
 A responsabilização do Estado na indenização decorrente de
limitação administrativa somente ocorre se a aquisição do
imóvel tiver ocorrido antes da restrição administrativa.

107
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

 PARCELAMENTO E EDIFICAÇÃO COMPULSÓRIA:

O parcelamento e edificação compulsória encontra-se previsto no art. 182, par. 4, i da


CF. A fundamentação legal encontra respaldo na Lei 6766/79.

O parcelamento e edificação compulsória é ato legislativo do município contido em lei


ordinária específica para área incluída em plano diretor consistente em sanção
aplicada ao proprietário do solo urbano não edificado, não utilizado ou sub-utilizado
para adequação do bem a sua função social sem indenização dos prejuízos causados.

Exemplo:
Terreno baldio na Av. Rio Branco. O Município impõe ao proprietário que primeiro se
parcele o bem e depois se edifique para cumprir a função social da propriedade. O
IPTU progressivo pressupõe que tenha havido uma medida urbanística (parcelamento
e edificação compusloria) e esta medida tenha sido inefetiva.

O Município tem que provar que tomou uma medida e que a medida não foi efetiva,
somente após isso o Municpio poderá cobrar o IPTU progressivo.

Sobre o tema do parcelamento e edificação compuslória, destaca-se o seguinte


julgado:

AI 456513: IPTU: progressividade. 1. O STF firmou o entendimento - a partir do


julgamento do RE 153.771, Pleno, 20.11.96, Moreira Alves - de que a única
hipótese na qual a Constituição admite a progressividade das alíquotas do IPTU é
a do art. 182, § 4º, II, destinada a assegurar o cumprimento da função social da
propriedade urbana. 2. Manifestou-se também o plenário da Corte pela
inconstitucionalidade da cobrança do IPTU de forma progressiva, estabelecida
mediante a concessão de isenções parciais, variáveis conforme o valor venal do
imóvel.

 TOMBAMENTO:

O tombamento tem previsão legal no art. 23, iii; 24, vii e art. 216 da CF. Ademais a
matéria também encontra-se prevista no DL 25/37 e DL 3866/41.

Tombamento é o procedimento administrativo consistente no uso e disposição de bem


imóvel ou bem móvel para a tutela do patrimônio histórico e cultural, sem indenização
dos prejuízos causados.

Trata-se de intervenção estatal restritiva que tem por objetivo proteger o patrimônio
cultural brasileiro.

O tombamento não possui natureza real e incide sobre qualquer bem que tenha valor
histórico e cultural.

108
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

De quem é a competência para tratar de tombamento?

Todos os entes têm competência para promover o tombamento, na forma do art. 23,
III da CF.

Contudo, em relação à competência legislativa, o art. 24, VII da CF prevê a


competência concorrente da União, Estados e DF, devendo a União elaborar normas
gerais.

Podem os Municípios legislar sobre matéria relacionada a tombamento?

A doutrina diverge sobre o tema, destacando-se as seguintes posições:

CORRENTE 1) Corrente capitaneada por Maria Sylvia Di Pietro entende que os


Municípios não possuem competência para legislarem sobre tombamento, pois a CF
reconheceu apenas a competencia corrente aos demais entes federados.

CORRENTE 2) Corrente capitaneada por Jose dos Santos Carvalho Filho entende que há
competência legislativa dos Municípios em matéria de tombamento, pois o art. 24, VII
deve ser interpretado em consonância vom os arts. 23, III, art. 30, I, II e IX da CF. Os
Municípios, portanto, podem legislar sobre tombamento levando em consideração o
interesse local, ou, em caráter suplementar.

É possível que o Município tombe um bem federal? É possível o tombamento de bem


público de baixo para cima (tombamento de bens federais por Estados e
tombamento de bens federais e estaduais pelo Município)?

A matéria é objeto de controvérsia na doutrina existindo as seguintes posições:

CORRENTE 1) José dos Santos Carvalho Filho entende que é impossível o tombamento
de bens públicos dos Entes maiores pelos Entes menores. O tombamento deve seguir a
lógica da supremacia do interesse nacional (bens federais) prevalece sobre o interesse
regional (bens estaduais) que, por sua vez, se sobrepoe ao interesse local (bens
municipais). Aplica-se, por analogia, o art. 2, par. 2 do DL 3365/41 que consagra a
hierarquia desses interesses na desapropriação.

CORRENTE 2) O STJ consolidou o entendimento de que os Municípios podem tombar


bens públicos estaduais e federais, assim como os Estados podem tombar bens públicos
federais.

Sobre o tema do tombamento, destaca-se o seguinte julgado.

109
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

ACO 1208 do STF: “Administrativo e Constitucional. 3. Tombamento de bem


público da União por Estado. Conflito Federativo. Competência desta Corte. 4.
Hierarquia verticalizada, prevista na Lei de Desapropriação (Decreto-Lei
3.365/41). Inaplicabilidade no tombamento. Regramento específico. Decreto-Lei
25/1937 (arts. 2º, 5º e 11). Interpretação histórica, teleológica, sistemática e/ou
literal. Possibilidade de o Estado tombar bem da União. Doutrina. 5. Lei do Estado
de Mato Grosso do Sul 1.526/1994. Devido processo legal observado. 6.
Competências concorrentes material (art. 23, III e IV, c/c art. 216, § 1º, da CF) e
legislativa (art. 24, VII, da CF). Ausência de previsão expressa na Constituição
Estadual quanto à competência legislativa. Desnecessidade. Rol exemplificativo
do art. 62 da CE. Proteção do patrimônio histórico, cultural, artístico, turístico e
paisagístico regional. Interesse estadual. 7. Ilegalidade. Vício de procedimento
por ser implementado apenas por ato administrativo. Rejeição. Possibilidade de
lei realizar tombamento de bem. Fase provisória. Efeito meramente declaratório.
Necessidade de implementação de procedimentos ulteriores pelo Poder Executivo.
8. Notificação prévia. Tombamento de ofício (art. 5º do Decreto-Lei 25/1937).
Cientificação do proprietário postergada para a fase definitiva. Condição de
eficácia e não de validade. Doutrina. 9. Ausência de argumentos capazes de
infirmar a decisão agravada. 10. Agravo desprovido. 11. Honorários advocatícios
majorados para 20% do valor atualizado da causa à época de decisão recorrida (§
11 do art. 85 do CPC).”

MS 18952 do STJ: “ADMINISTRATIVO. TOMBAMENTO – COMPETÊNCIA MUNICIPAL. 1.


A Constituição Federal de 88 outorga a todas as pessoas jurídicas de Direito
Público a competência para o tombamento de bens de valor histórico e artístico
nacional. 2. Tombar significa preservar, acautelar, preservar, sem que importe o
ato em transferência da propriedade, como ocorre na desapropriação. 3. O
Município, por competência constitucional comum art. 23, III, deve proteger os
documentos, as obras e outros bens de valor histórico, artístico e cultural, os
monumentos, as paisagens naturais notáveis e os sítios arqueológicos. 4. Como o
tombamento não implica em transferência da propriedade, inexiste a limitação
constante no art. 1º, § 2º, do DL 3.365/1941, que proíbe o Município de
desapropriar bem do Estado.”

Qual a diferença entre tombamento e registro?

Enquanto o tombamento é regulado pelo decreto-lei 25/1937 e visa proteger os bens


imóveis, o registro é tratado no Decreto 3.551/2000 e tem por objetivo a proteção dos
bens imateriais.

A proteção dos bens imateriais (ex: frevo, ofício das baianas de acarajé, modo
artesanal de fazer queijo minas) é realizada mediante o “Registro”, e não
propriamente pelo tombamento, conforme dispoe o Decreto 3551.

110
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

O objetivo é o mesmo (proteção da cultura), a entidade responsavel pela proteção é o


IPHAN (em âmbito federal) e a proteção ocorre por meio de procedimentos
semelhantes (inscrição do bem em livro específico).

Como se institui e cancela o tombamento?

O tombamento é instituído após regular processo administrativo, com respeito aos


princípios da ampla defesa e contraditório, com a inscrição do bem no Livro do Tombo.

O rito processual irá variar de acordo com o tipo de tombamento (de ofício, voluntário
ou compulsório).

O tombamento realizado pelo IPHAN pode ser cancelado (“destombamento”, de ofício


ou mediante recurso, pelo Presidente da República, tendo em vista razões de interesse
público (Decreto 3866/41).

Pode o tombamento ser instituído por lei?

A doutrina majoritária entende que, ressalvado o tombamento instituído pela CF (art.


216, par.5: “Ficam tombados os documentos e os sítios detentores de reminiscencias
históricas dos antigos quilombolas”), o tombamento somente pode ser instituído por
ato do Poder Executivo, sendo inviável a formalizadação por meio da legislação. Essa
é a posição do STF no AI 714949 em 2015.

A impossibilidade do Tombamento Legal decorre da necessidade de análise técnica da


presença do valor cultural do bem, o que se dá por meio do devido processo
administrativo.

Quais os efeitos do tombamento?

O tombamento produz efeitos tanto para o proprietário (ex: dever de proteger o bem,
dever de conservação da bem) quanto para o Poder Público (vigilância permanente do
bem tombado, necessidade de manutenção do bem quando o proprietário nao tem
condições) – arts. 11 a 21 do DL 25/37.

Esses efeitos são provisoriamente observados desde a notificação do particular no curso


do processo de tombamento.

É cabível indenização no caso de tombamento?

111
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

A indenização ao proprietário do bem tombado depende necessariamente da


comprovação do respectivo prejuízo, sob pena de enriquecimento sem causa do
proprietário do bem tombado.

O prazo prescricional para a propositura dessa ação é de 5 anos na forma do art. 10,
par. unico do DL 3356/41.

JULGADO TOMBAMENTO
AgRg no AREsp  Responsabilidade pela conservação do imóvel tombado
176140-BA  A responsabilidade de reparar e conservar o imóvel tombado é
(2012) do proprietário, salvo quando demonstrado que ele não dispõe
de recurso para proceder à reparação.

 SERVIDÃO ADMINISTRATIVA:

A servidão administrativa está prevista no DL 3365/41 (art. 40).

A servidão administrativa é direito real de uso ou fruição, consistente em utilização


permanente de bem imóvel para prestação de serviço público, execução de obra
pública, ou trânsito de agente público, com indenização prévia dos prejuízos aferíveis.

Servidão administrativa será constituída por meio de acordo (escritura pública) ou ação
judicial/sentença.

Súmula 479 do STF: As margens dos rios navegáveis são de domínio público,
insuscetíveis de expropriação e, por isso mesmo, excluídas de indenização.”

O que é terreno reservado?

A definição de terrenos marginais ou reservados pode ser encontrada no Código de


águas e no DL 9760/46.

Para Hely Lopes Meirelles essa faixa de terra era mera área de trânsito. Portanto, em
caso de desapropriação caberia a indenização ao “dono”. Ele entende
minoritariamente que os terrenos reservados são criação de servidão administrativa
por lei (art 14 do Código de Águas). Trata-se de servidão administrativa instituída em
bem particular.

Já Celso Bandeira de Melo (corrente majoritária) entende que o terreno reservado não
é forma de criação legal de servidão administrativa. Esse bem é público, logo não
houve servidão, mas afetação tão somente (trânsito de agentes públicos).

O STF entendeu que os terrenos marginais são bens públicos, portanto, a Súmula 479
do STF está mantida.

112
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

Casos Concretos:

Questão 1)

Diante da importância histórica e cultural de determinado bem pertencente à


União, o Estado X decide tombá-lo, por meio de lei nesse sentido. Analise a
viabilidade de tal intervenção do Estado na propriedade, em consonância com a
orientação dos Tribunais Superiores.

Resposta:

Vigora na jurisprudência o entendimento de que é possível o tombamento de bem


público de baixo para cima, ou seja, que o Município pode tombar bem público da
União. Vide ACO 1208 (STF).

Questão 2)

Em determinada ação que objetivava a anulação do tombamento de certo bem, o


Juízo de 1º grau, na sentença, julgou procedente o pedido, sob o fundamento de se
tratar de imóvel modesto e carente de ostentação, utilizado para a tortura em
determinado momento histórico, fato que deveria ser esquecido, incapaz, portanto,
de ensejar a intervenção do Estado na propriedade. Diante dessa situação
hipotética, enfrente as peculiaridades do controle judicial acerca do tombamento
e analise a pertinência das razões invocadas pelo magistrado em questão.

Resposta:

Não cabe controle externo do mérito administrativo (Súmula 473 do STF). O STF,
contudo, entende que o mérito poderá ser controlado, excepcionalmente, desde que
esse controle ocorra de forma indireta, por meio do controle de proporcionalidade do
ato.

O Poder Judiciário está autorizado a condenar o Estado a indenização por tombamento,


mas nao está autorizado a controlar o mérito do tombamento, sob pena de violar a
Súmula 473 do STF.

O juiz, no caso em tela, adentrou no mérito em si, o que não compete ao Judiciário
fazer.

O ato é nulo pois houve violação do art. 2 da CF, ou seja, houve violação da Princípio
das Separação dos Poderes.

REsp 1507783.

113
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

Questão 3)

Jamiro adquiriu certo imóvel situado nos limites de uma rodovia regularmente
construída por certo estado da federação, quando já existia sobre o imóvel restrição
à construção, decorrente da norma pertinente, que a caracterizava como area non
aedificandi. Por entender que a aludida restrição ao direito de construir causava
prejuízo concreto a sua propriedade, mesmo sendo anterior à respectiva compra,
Jamiro ajuizou ação de indenização em face do ente legitimado. Diante dessa
situação hipotética, analise se existe alguma modalidade de intervenção do Estado
na propriedade a incidir sobre o bem de Jamiro e enfrente se a indenização seria
cabível na espécie, em consonância com o entendimento do C. STJ.

Resposta:

Trata-se de limitação administrativa, uma vez que o enunciado relata area non
aedificandi, uma restrição permanente (de não-fazer) no imóvel. A indenização não
será paga porque sendo limitação administrativa não enseja indenização, também
porque esse ato é manifestamente proporcional, até porque a restrição é anterior à
compra do imóvel quando já existia a restrição.

REsp 1078456: PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. ART. 535 DO CPC. NÃO


VIOLAÇÃO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. AREA NON AEDIFICANDI. EXTENSÃO DE
RODOVIA. BR 470. 3. É indevido o direito à indenização se o imóvel for adquirido
após o implemento da limitação administrativa, porque se supõe que as restrições
de uso e gozo da propriedade já foram consideradas na fixação do preço. 4. Quanto
aos juros compensatórios, entendo assistir razão à parte recorrente. A partir da
edição da Portaria do DNER nº 075, em 07 de julho de 1980, com a declaração de
utilidade pública para fins de efetiva desapropriação e com o consequente
alargamento da faixa de domínio da BR-470, ocorreu a efetiva ocupação, uma vez
que houve, neste momento, a limitação das faculdades de uso, gozo e fruição dos
imóveis lindeiros à rodovia, data anterior à edição da Medida Provisória n.º
1.577/97, razão pela qual os juros compensatórios devem ser fixados em 12% ao
ano, contados da data da expedição da Portaria 75/80. 5. Recurso especial
conhecido em parte e provido apenas quanto aos juros compensatórios.”

114
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

Aula 7 – Prof. Guilherme Pena


9/10/18

EMENTA:  Desapropriação.
 Fontes normativas.
 Competências.
 Bens expropriáveis.
 Destinação dos bens desapropriados.
 Fase declaratória.

 DESAPROPRIAÇÃO:

Passaremos ao estudo da última e mais drástica (ou supressiva) forma de intervenção


do Estado na propriedade, qual seja, a desapropriação.

 FONTES NORMATIVAS:

O instituto da desapropriação está previsto nos seguintes dispositivos e leis:

 Art. 5, xxiv; art. 182, par. 4, iii e art. 184 e 186 da CF;
 Decreto Lei 3365/41;
 Lei 4132/62;
 Lei 8629/93; e
 LC 76/93.

Qual o conceito de desapropriação?

Desapropriação é o procedimento por meio do qual há a transmissão de propriedade


de um bem particular para o domínio público em razão de necessidade pública,
utilidade pública ou interesse social.

A desapropriação é, portanto, a intervenção do Estado na propriedade alheia,


transferindo-a compulsoriamente e de maneira originária, para o seu patrimonio, com
fundamento no interesse público e após o devido rpocesso legal, normalmente
mediante indenização.

Quais as características básicas da desapropriação?

Entre as principais características da desapropriação, destacam-se:

 Forma drástica de intervenção da propriedade privada, devendo o particular


sujeitar-se à indenização;
 É forma originária de aquisição da propriedade, pois independe da vontade do
titular anterior.

115
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

 O bem desapropriado nao pode ser reivindicado posteriormente e libera-se de


eventuais ônus reais, devendo os credores se sub-rogar no preço pago pelo
Poder Público (art. 31 do DL3665);
 A propriedade retirada deve ser necessariamente justificada no atendimento
do interesse social (utilidade pública, necessidade pública ou interesse social),
sob pena de desvio de finalidade (tredestinação) e ilegalidade da intervenção;
 A desapropriação depende do devido processo legal; e
 A desapropriação pressupõe a indenização prévia, justa e em dinheiro, mas a
CF admite exceções em relação às desapropriações sancionatórias.

Quais os pressupostos da desapropriação?

Entre os pressupostos da desapropriação, destacam-se:

(i) Utilidade Pública: conveniência da propria Administração Pública;

(ii) Necessidade Pública: situação anômala, execpcional, que jusitifique que o


bem seja desapropriado; e

(iii) Interesse Social: é o melhor atendimento ao bem-estar social.

É possível desapropriar um bem com fundamento na proteção do patrimônio


cultural brasileiro?

Sim!!!! Existem diversos instrumentos, de ordem administrativa ou judicial, capazes


de efetivar a proteção do patrimônio cultural brasileiro. Entre estes instrumentos
estão:

a) Tombamento: cuja finalidade é declarar o valor cultural de um bem móvel


ou imóvel; e
b) Desapropriação: conforme se observa no art. 216, par. 1, da CF.

Art. 216, § 1 da CF: “O Poder Público, com a colaboração da comunidade,


promoverá e protegerá o patrimônio cultural brasileiro, por meio de inventários,
registros, vigilância, tombamento e desapropriação, e de outras formas de
acautelamento e preservação.”

Qual a diferença entre (i) desapropriação e o instituto da (ii) expropriação social


privada?

A EXPROPRIAÇÃO SOCIAL PRIVADA encontra-se previsto no art. 1228, par. 4 do CC e


não se confunde com o instituto da desapropriação. Isso porque a “expropriação social
privada” não é de iniciativa do Ente Federado, inexistindo decreto expropriatório, bem

116
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

como a indenização será devida pelos possuidores do imóvel reinvidicado, na forma do


art. 1228, par. 5 do CC.

O instituto da expropriação social privada também não se confunde com o instituto da


usucapião (já que a expropriação social privada é onerosa).

Art. 1.228 do CC: “O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa,
e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou
detenha.
§ 4 - O proprietário também pode ser privado da coisa se o imóvel reivindicado
consistir em extensa área, na posse ininterrupta e de boa-fé, por mais de cinco
anos, de considerável número de pessoas, e estas nela houverem realizado, em
conjunto ou separadamente, obras e serviços considerados pelo juiz de interesse
social e econômico relevante.
§ 5 - No caso do parágrafo antecedente, o juiz fixará a justa indenização devida
ao proprietário; pago o preço, valerá a sentença como título para o registro do
imóvel em nome dos possuidores.
 COMPETÊNCIA EM MATÉRIA DE DESAPROPRIAÇÃO:

A competência em matéria de desapropriação pode ser dividida em:

(i) Competência Legislativa: prevista no art. 22, ii da CF. É a competência para


produzir normas legais sobre o tema de desapropriação.

A competência sobre o tema da desapropriação é privativa da União.

(ii) Competência Declaratória: prevista no art. 2 e 6 do DL 3365. Via de regra,


a competência declaratória para iniciar o procedimento da desapropriação
é concorrente entre todos os entes que possuam autonomia política (União,
Estados, DF e Municípios).

Trata-se da regra geral e a declaração deve ser formalizada por meio de


DECRETO.

Há, contudo, duas exceções a essa regra geral, quais sejam: (1) DNIT
(estrada de rodagem) e (2) ANEEL (energia elétrica). Essas duas autarquias
possuem competência declaratória. A declaração, no entanto, não será
feita por meio de decreto, uma vez que esse ato administrativo é privativo
do chefe do executivo, mas sim por meio de PORTARIA ou RESOLUÇÃO para
declarar os bens expropriados.

 DNIT: art. 82, ix da Lei 10233/01; e


 ANEEL: art. 10 da Lei 9074/95.

Destaca-se, ainda, que na forma do art. 8 do DL 3665, o procedimento da


desapropriação pode ser iniciado pelo PODER LEGISLATIVO, cumprindo ao

117
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

Executivo praticar os atos necessários à sua efetivação. Parte da doutrina


entende que, nesse caso, a declaração deve ser formalizada por meio de
lei, outra parte da doutrina defende que a declaração deve ser formalizada
por meio de decreto.

(iii) Competência Executória: é a competência para executar a desapropriação.


Aplica-se o disposto no art. 4 do DL 3365. É competência tanto dos Entes
(União, Estados, DF e Municípios) quanto das entidades administrativas
(autarquias, fundações públicas, empresas públicas ou Sociedades de
Economia Mista).

Se houver concessão ou permissão de serviço público, então, a


concessionária ou a permissionária poderão executar a desapropriação, mas
essa competência executória está condicionada à autorização expressa da
lei ou do contrato (art. 31, vi e art. 40, par. único da Lei 8987/95).

É constitucional norma estadual que submete as desapropriações à aprovação prévia


do Poder Legislativo?

Segundo o STF, não, por ofender a separação de poderes e ainda por violar
competência legislativa da União.

ADI 969: “É inconstitucional, por invadir a competência legislativa da União e


violar o princípio da separação dos poderes, norma distrital que submeta as
desapropriações, no âmbito do Distrito Federal, à aprovação prévia da Câmara
Legislativa do Distrito Federal.”

 BENS EXPROPRIÁVEIS:

O objeto da desapropriação é bem de qualquer natureza, desde que sucetível de


avaliação econômica (art. 2 do DL 3365). A condição que se impõe é que o bem tenha
valor econômico e esse valor possa ser aferido.

Destaca-se que bens inalienáveis podem ser desapropriados, considerando que o


interesse público prevalece sobre a características de inalienabilidade.

Pode o Estado desapropriar ações de empresas privadas?

SIM!!! O Estado pode desapropriar ações de empresas privadas, conforme se depreenda


da análise da Súmula 476 do STF:

118
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

Súmula 476 do STF: “Desapropriadas as ações de uma sociedade, o Poder


desapropriante, imitido na posse, pode exercer, desde logo, todos os direitos
inerentes aos respectivos títulos.”

Todavia, a desapropriação de ações, cotas e direitos representativos do capital de


instituições, que DEPENDAM DA AUTORIZAÇÃO DA UNIÃO para funcionarem e se
subordinam à sua fiscalização, depende necessariamente de prévia autorização, por
decreto do Presidente da República (art. 2 e 3 do DL 3365).

Súmula 157 do STF: “É necessária prévia autorização do Presidente da República


para desapropriação, pelos estados, de empresa de energia elétrica”

Em determinadas situações o bem nçao poderá ser desapropriado, em razão de sua


própria natureza ou vedação legal. Há situações de impossibilidade jurídica e
impossibilidade material. Vejamos:

 Impossibilidade Material: direitos personalíssimos são indisponíveis, então, não


se pode desapropriar esse tipo de direitos. Não se pode desapropriar a
intimidade, mas se pode desapropriar a imagem (corporificação da intimidade).
Outro exemplo, não se pode desapropriar moeda corrente, uma vez que é o
modo pelo qual se paga a indenização (admite-se, no entanto, desapropriação
de moedas antigas ou raras que não estejam mais em circulação). Também não
é possível desapropriar a PF ou PJ, uma vez que são sujeitos e nao objeto de
direitos), mas é possível desapropriar bens e direitos das PFs ou PJs

 Impossibilidade Jurídica: art. 182 e art. 184 da CF. É impossível desapropriar,


para fins de reforma agrária, a propriedade produtiva. É impossivel
desapropriar a pequena propriedade rural, desde que seu proprietário não
possua outro imóvel rural. Também não se pode desapropriar as ações ou quotas
cuja funcionamento da empresa dependa de autorização federal (ex: Ações da
Vale do Rio Doce – art. 2 do DL 3365), salvo se houver autorização da União.

As margens dos rios navegáveis são passíveis de desapropriação?

Não!! Segundo a jurisprudência do STF as margens dos rios navegáveis não são passíveis
de expropriação.

Súmula 479 do STF: “As margens dos rios navegáveis são de domínio público,
insuscetíveis de expropriação e, por isso mesmo, excluídas de indenização.”

É possível desapropriar um bem hipotecado?

Sim!! Contudo, a hipoteca não será oponível ao expropriante em razão do modo de


aquisição originária da propriedade.

119
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

O credor hipotecário se sub-roga, de modo que se garante o seu pagamento. O bem


fica livre e desembaraçado para o expropriante.

É possível desapropriar um cadáver, por exemplo?

A doutrina entende que NÃO em razão da ausência de proporcionalidade-necessidade


(possibilidade de utilização de cadáveres de indigentes para pesquisas científicas) e
impossibilidade de fixação do valor indenizatório, uma vez que não é bem de comércio.

EM SUMA: a norma é que pode se expropriar qualquer bem, desde que se tenha valor
econômico aferível e desde que não tenha nenhum tipo de impossibilidade material ou
jurídica.

É possível desapropriar bens públicos?

Sim, é possível!! A matéria é tratada no art. 2, par. 2 do DL 3365/41, sendo possível a


desapropriação de bens públicos, desde que sejam observados:

(i) Autorização Legislativa: o expropriante deve ser autorizado por sua Casa
Legislativa; e

(ii) Desapropriação de Cima para Baixo: a União pode desapropriar bens


públicos estaduais e municipais, assim como os Estados podem desapropriar
bens públicos municipais. A lei estabeleceu uma espécie de hierarquia em
que o interessa nacional (da União) prevalece sobre o interesse regional
(Estado) que, por sua vez, tem primazia sobre o interesse Municipal.

É possível desapropriar bens públicos de “baixo para cima”? Pode o Município


desapropriar um bem do Estado?

Há divergência na doutrina sobre o tema, prevalecendo as seguintes posições:

CORRENTE 1) Doutrina majoritária entende que aplica-se literalmente o disposto no


art. 2 par. 2 do DL 3365, exigindo a presença dos dois requisitos citados para
consumação da desapropriação de bens públicos. Assim, para essa corrente apenas
seria possivel a desapropriação de bens públicos de cima para baixo.

CORRENTE 2) Parte da doutrina entende, contudo, que é possível a desapropriação de


bens públicos de “cima para baixo” e de “baixo para cima”, tendo em vista a igualdade
entre os Entes Federados.

120
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

Há benefício de ordem se dois Entes Federados quiserem desapropriar o mesmo


bem?

A doutrina entende que se tanto a União quanto um Município X tiverem iniciado


processo de desapropriação em relação ao mesmo bem, deverá preponderar o
interesse da União.

Assim, a hierarquia de interesses deverá ser observada também na hipótese em que


Entes federados distintos pretenderem desapropriar o mesmo bem particular.

Observação: No caso de bem tombado, como visto anteriormente, pode ser


desapropriado se o tombamento foi feito por entidade menor e o fim justificar a
desapropriação.

É possível a desapropriação de bens de entidades administrativas integrantes da


Administração Indireta “Maior”, por Entes da Federação “Menores”. É possível um
Município desapropriar bem de uma empresa estatal?

A doutrina encontra-se dividida sobre o tema, destacando-se as seguintes posições:

CORRENTE 1) Segundo Sérgio Andréa Ferreira os Entes Federados podem desapropriar


bens da Administração Indireta Superior, tendo em vista que a autonomia política dos
Entes Federados prevalece sobre a autonomia meramente administrativa das entidades
administrativas.

CORRENTE 2) Segundo Hely Lopes e Maria Sylvia Di Pietro, é possível desapropriar bens
desvinculados do objeto institucional da entidade administrativa. Os bens afetados às
finalidades institucionais das entidades administrativas não podem ser desapropriados
por Entes “menores”, em razão da continuidade do serviço público e a hierarquia dso
interesses, salvo com a concordância do Chefe do Executivo respectivo da entidade
desapropriada.

CORRENTE 3) Corrente defendida pelo STF e STJ entende que não é possível a
desapropriação, em razão da maior hierarquia da pessoa federativa a que está
vinculada a entidade administrativa. A desapropriação somente será possível de forma
amigável, com a concordância do chefe do Executivo da entidade desapropriada.

 DESTINAÇÃO DOS BENS DESAPROPRIADOS:

Via de regra, os bens desapropriados passam a integrar o patrimônio das entidades


ligadas ao Poder Público que providenciaram a desapropriação e pagaram a respectiva
indenização.

121
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

Assim, se um imóvel é desapropriado pela União para instalação de uma Secretaria,


ingresserá ele no patrimônio da União e, então, adquirirá a natureza de bem público.

Em que consistem a integração definitiva e integração provisória dos bens


desapropriados?

Sempre que um bem tiver utilização para o próprio Poder Público, em seu próprio
benefício, dá-se o que a doutrina chama de INTEGRAÇÃO DEFINITIVA.

Em contrapartida, se a desapropriação tiver sido efetuada para que o bem seja


utilizado e desfrutado por terceiro, dar-se-á INTEGRAÇÃO PROVISÓRIA. Exemplo: a
desapropriação para fins de reforma agrária, pois o imóvel rural somente fica em poder
do Estado enquanto não repassados os lotes respectivos aos futuros beneficiários do
projeto de assentamento.

Prof. Celso Antonio Bandeira de Mello afirma, ainda, que é possível que o Poder Público
desaproprie um bem diretamente em favor de pessoa privada, desde que para ela
desempenhar alguma atividade considerada de interesse público.

 FASE DECLARATÓRIA:

Há duas fases diferentes na desapropriação, quais sejam:

(i) FASE DECLARATÓRIA: fase na qual há a declaração da ocorrência dos


pressupostos da desapropriação. Essa fase obrigatoriamente é
administrativa e se formaliza por meio de uma declaração expropriatória.

A declaração expropriatória deve demonstrar a necessidade de


desapropriação do bem, de forma a atender a utilidade pública,
necessidade pública ou interesse social. A declaração deve individualizar o
bem, e apontar a finalidade da desapropriação.

A declaração será feita pelo Presidente, pelo Governador ou Prefeito.


Contudo, ressalta-se que é possível que a iniciativa da desapropriação se dê
por meio do Poder Legislativo. A doutrina diverge sobre o ato a ser utilizado
pelo Poder Legislativo, posicionado-se, a doutrina majoritária, no sentido
de que a declaração expropriatória será veiculada por lei. Mas renomados
autores entendem que o ato deve ser o decreto legislativo.

(ii) FASE EXECUTÓRIA: fase na qual adotam-se as medidas para consumar a


desapropriação, ou seja, ocorre a transferência do bem para o Expropriante
e é assegurado ao expropriado o pagamento da devida indenização.

Essa fase pode ser administrativa (quando ocorre acordo entre expropriante
e expropriado – formaliza-se o consenso por meio de escritura pública) ou

122
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

judicial (quando não há acordo, ajuiza-se a ação de desapropriação. sendo


formalizada por meio de sentença).

Quais os efeitos da declaração de desapropriação?

A declaração formal de desapropriação traz os seguintes efeitos:

(i) Autorização para que as autoridades administrativas ingressem no bem,


podendo recorrer em caso de oposição do proprietário, ao auxílio de força
policial;

(ii) Fixação do estado do bem para fixação de futura indenização das


benfeitorias: o art. 26 do DL 3665 estabelece que as benfeitorias necessárias
serão sempre indenizáveis, as benfeitorias úteis somente se autorizadas
pelo Poder Público e as benfeitorias voluptuárias não serão indenizadas.

(iii) Início do prazo de caducidade do decreto expropriatório:

 Desapropriação por Utilidade Pública: o Poder Público tem prazo de


5 anos, contados da data de expedição do respectivo decreto, para
promover a desapropriação (realização do acordo com o proprietário
ou propositura da ação judicial). Caso não seja promovida a
desapropriação dentro do prazo, o decreto caducará e o bem não
poderá ser objeto de nova declaração pelo prazo de 1 ano (art. 10
do DL 3665)

 Desapropriação por Interesse Social: o prazo de caducidade é de 2


anos, na forma do disposto no art. 3 da Lei 4132/62.

Por fim, podemos concluir que o principal efeito da desapropriação é transmitir a


propriedade do particular para o Estado, ou seja, é converter bem particular em bem
público.

OBS: O modo originário de aquisição de propriedade é modo desvinculado do título


aquisitivo anterior (ex: usucapião). A desapropriação também é modo originário de
aquisição de propriedade.

O poder público pode desapropriar para alienar o bem?

SIM!!! O poder público pode alienar o bem que foi desapropriado, desde que
expressamente conste no decreto de interesse em desapropriação.

Se não declarar isso, a alienação dará direito à retrocessão pelo proprietário.

123
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

Casos Concretos:

Questão 1)

O Município de Verdes Montes, com o objetivo de construir hospital em área carente


da cidade, resolveu desapropriar, por utilidade pública, imóvel pertencente à
Fundação Universidade de Ouro Branco, entidade integrante da Administração
Indireta Federal. Indaga-se: Há possibilidade de acolhimento da pretensão
expropriatória do ente público municipal no ordenamento jurídico vigente?
Fundamente a resposta, informando também a orientação da jurisprudência sobre
a questão.

Resposta:

Não há possibilidade do Município expropriar entidade integrante da Administração


Federal, em razão do disposto no art. art. 2, par. 2 do DL 3665, SALVO se houver
autorização de Decreto Presidencial.

Questão envolve desapropriação de bem pertencente a entidade pública:

 Adm Pública Direta: o bem obrigatoriamente é público. É possível desapropriar


esse bem desde que haja autorização legislativa e respeitada a chamada
hierarquia federativa. Entidade Maior expropria bem de entidade menor. Isso
quer dizer que a União pode desapropriar bem do Estado e do Municpio. O
Estado pode desapropriar bem dos seus Municipios e o Municipio nao pode
desapropriar bem de nenhum Ente.

 Adm Pública Indireta: aqui pode se ter bem público ou particular. Se houver
respeito a hierarquia federativa e se houver a autorização legal, poderá ocorrer
a desapropriação.

A questão mais dificil é de bem que pertenca a Adm Pública Indireta não
respeitada a hierarquia federativa. Vejamos abaixo a posição da doutrina sobre
o tema:

CORRENTE 1) Sergio Ferraz entende que é possível, uma vez que a norma do
art. 1, par. 2 do DL fala em Adm. Pública Direta, ou seja, nao fala em Adm.
Pública Indireta, portanto, não se impõe essa condição, então, entende-se que
seria viável que isso acontecesse.

CORRENTE 2) Hely Lopes Meirelles entende que depende do bem, ou seja, será
possivel que isso aconteça se o bem nao for afetado ao serviço público. Bem
afetado, nao pode. Se o bem nao estiver afetado, então, pode.

124
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

CORRENTE 3) Posição majoritária (Jose dos Santos Carvalho) entende que não
pode, porque a norma fala em Adm. Pública, logo, estaria incluido tanto a Adm
Pública direta como a indireta. A norma se aplica ao caso e se exige a
hierarquia federativa.

Sobre o tema vejamos abaixo o julgado do STJ:

RESP 1188700: “PROCESSUAL CIVIL - ADMINISTRATIVO - RECURSO ESPECIAL -


DESAPROPRIAÇÃO - INEXISTÊNCIA DE VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC -
COMPROVAÇÃO DA PROPRIEDADE DO IMÓVEL - REEXAME DE PROVAS – SÚMULA
7/STJ - DESAPROPRIAÇÃO INTENTADA POR MUNICÍPIO - BEM DE PROPRIEDADE DA
UNIÃO - IMPOSSIBILIDADE, SALVO AUTORIZAÇÃO, POR DECRETO, DO PRESIDENTE
DE REPÚBLICA. 1. Não ocorre ofensa ao art. 535 do CPC, se o Tribunal de origem
decide, fundamentadamente, as questões essenciais ao julgamento da lide. 2. É
inadmissível o recurso especial se a análise da pretensão da parte recorrente
demanda o reexame de provas. 3. É vedado ao Município desapropriar bens de
propriedade da União ou de suas autarquias e fundações, sem prévia autorização,
por decreto, do Presidente da República. Precedentes. 4. Recurso especial
parcialmente conhecido e, nessa parte, não provido.”

Questão 2)

Mauricélia é proprietária de um terreno em zona urbana do Município Y e visa a


construir um edifício em tal localidade, que se adequa a todas as exigências
urbanísticas vigentes. Não obstante, ao apresentar toda a documentação necessária
para o licenciamento de tal obra, o órgão competente indefere o respectivo pedido,
sob o fundamento de que antes de sua protocolização, foi expedido Decreto
expropriatório, por utilidade pública, que atinge o mencionado bem, com vistas à
ampliação das vias públicas locais. Analise se a conduta do Município está em
consonância com o ordenamento vigente e com a jurisprudência do C. STF, mediante
o apontamento dos efeitos jurídicos do Decreto expropriatório.

Resposta:

A conduta do Muncípio não está em consonância com o ordenamento jurídico vigente.


Isso porque, o decreto de utilidade pública ou interesse social para fins de
desapropriação, gera a mera perspectiva de desapropriação, cujo aperfeiçoamento
depende de fatos supervenientes.

Assim, se a licença for requerida pelo particular, a Administração Pública não poderá
negá-la se todos os requisitos para a licença tiverem sido preenchidos, pois trata-se de
ato vinculado. Mas o proprietário já deverá saber, de antemão, que o valor acrescido
não será indenizado.

Súmula 23 do STF: “Verificados os pressupostos legais para o licenciamento da


obra, não o impede a declaração de utilidade pública para desapropriação do

125
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imóvel, mas o valor da obra não se incluirá na indenização, quando a


desapropriação for efetivada.”

Apelação Cível N 70051338184 TJRS: “Declaração de utilidade pública do imóvel


ão obsta o licenciamento da obra, apenas afasta a indenização do seu valor em
caso de efetiva desapropriação. A Súmula 23 do STF aplicável a espécie.”

Questão 3)

Ávido por implementar projetos que ficaram parados em governos anteriores, o


novo prefeito do Município X, quando tomou posse em 2013, verificou a existência
de um decreto expropriatório por utilidade pública, para fins de construção de um
parque de recreação, editado no ano de 2007, em relação ao qual não se alcançou
um acordo administrativamente, mas não foi tomada qualquer outra providência.
Com vistas a dar prosseguimento a tal projeto, solicitou a assessoria jurídica que
tomasse as providências cabíveis para ultimar tal desapropriação, diante da
impossibilidade de acordo entre as partes. Diante dessa situação hipotética,
esclareça se e quais as providências cabíveis para levar a efeito a desapropriação
em comento, mediante o apontamento dos dispositivos legais pertinentes.

Resposta:

O Decreto é de 2007, logo o Municipio teria prazo de 5 anos para executar a


desapropriação. Como em 2013, o Município ainda não tinha tomado nenhuma medida,
caducou seu direito de desapropriar. O Município poderá expedir um novo decreto,
abrindo um novo processo, pelo mesmo motivo, após transcorrido o prazo de 1 ano, na
forma do art. 10 do DL 3665.

REsp 1148437: DIREITO ADMINISTRATIVO. AÇÃO DE DESAPROPRIAÇÃO.


ARBITRAMENTO. INDENIZAÇÃO. SENTENÇA. TRÂNSITO EM JULGADO. ALEGAÇÃO.
PRESCRIÇÃO. INOCORRÊNCIA. CAUSA IMPEDITIVA. FALTA DE PAGAMENTO.
INDENIZAÇÃO. JURISPRUDÊNCIA. VIOLAÇÃO. NORMA CONSTITUCIONAL.
INCOMPETÊNCIA. STJ. OFENSA. PRECEITOS. LINDB. DESCUMPRIMENTO.
PREQUESTIONAMENTO. AUSÊNCIA. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. SÚMULAS 282 E
356 DO STF. MALVERSAÇÃO. DL 3.365/1941. FALTA. CORRESPONDÊNCIA. REGRA.
CADUCIDADE. PRETENSÃO EXPROPRIATÓRIA. SÚMULA 284/STF. DECRETO
20.910/1932. PRESCRIÇÃO. INEXISTÊNCIA. ACÓRDÃO. ELEMENTOS FÁTICOS.
INVIABILIDADE. REVOLVIMENTO. SÚMULA 07/STJ. FUNDAMENTO ÚNICO.
OCORRÊNCIA. CAUSA IMPEDITIVA. FALTA. IMPUGNAÇÃO. SÚMULA 283/STF. 6. A
regra do art. 10, caput, do Decreto-Lei 3.365/1941, contudo, trata da hipótese
em que a fazenda pública não implementa, por acordo administrativo ou pela
distribuição de medida judicial, a desapropriação, assim por que, ao cabo de cinco
anos contados da expedição do decreto expropriatório, perde o direito de
desapropriar com base em tal ato.”

126
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

Aula 8 – Prof. Cláudio Brandão


10/10/18

EMENTA:  Ação de Desapropriação. Partes. Contestação.


 Imissão Provisória na Posse.
 Prova Pericial.
 Intervenção do Ministério Público.
 Transferência da propriedade.
 Desistência.

 AÇÃO DE DESAPROPRIAÇÃO:

Se não houver acordo entre particular proprietário da terra e Poder Público, a


Administração Pública deverá ajuizar uma ação de desapropriação pedindo ao
judiciário que promova, ao final, a substituição compulsória do bem mediante
pagamento de indenização.

Assim, verifica-se que o objetivo principal da ação de desapropriação é estabelecer o


valor justo, para que, ao final, se promova a substituição do bem pelo equivalente em
dinheiro.

A ação de desapropriação está regulamentada a partir do art. 11 do DL 3365/41.

Quem pode ajuizar ação de desapropriação?

O sujeito ativo na ação de desapropriação será a pessoa política que expediu o decreto
expropriatário ou, desde que haja autorização expressa na lei ou contrato, uma
entidade da Adm. Indireta ou uma Concessionária ou Permissionária de serviços
públicos.

O proprietário NUNCA atua como parte no polo ativo da ação de desapropriação. Ele
será sempre sujeito passivo no processo (réu).

O pedido na ação será a consumação da transferência da propriedade do bem para o


patrimônio do expropriante.

Juiz em fase de estágio probatório que ainda nao adquiriu a vitaliciedade pode
julgar ação de desapropriação?

O art. 12 do DL estabelece que somente o juiz com vitaliciedade pode julgar a ação de
desapropriação. Contudo, atualmente entende-se que essa vedação é direcionada
apenas para a categoria de juízes togados que nao tinham aptidão para adquirir a
vitaliciedade (aqueles do art. 21 e 22 do ADCT).

127
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

Assim, um juiz concursado que esteja em estágio probatório em uma comarca do


interior poderá sim julgar uma ação de desapropriação mesmo antes de adquirir a
vitaliciedade.

Quais os requisitos da petição inicial na ação de desapropriação?

Além dos requisitos formais do CPC, a petição inicial deverá conter (art. 13 do DL
3665):

(i) Descrição do bem a ser desapropriado (certidão do registro de imóvel


indicando a metragem e a titularidade do bem);
(ii) Divulgação do decreto expropriatório; e
(iii) Preço a ser pago pela desapropriação.

Atenção!!! Publicado o decreto expropriatório, a Adm. Pública terá um prazo de 5 anos


(DL 3365) para efetivar a desapropriação se esta se der por razões de necessidade ou
utilidade pública. O prazo, contudo, será de 2 anos (Lei 4132/62), no caso de interesse
social. Se não for proposta a ação nesse prazo, o Decreto Expropriatório será extinto
por caducidade.

Como se procede a citação no caso de desapropriação?

Os Tribunais entendem que as regras de citação da desapropriação previstas no art. 16


c/c art. 42 do DL 3365/41 prevalecem sobre as regras do CPC.

REsp 1.404.085: PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. DESAPROPRIAÇÃO POR


UTILIDADE PÚBLICA. CITAÇÃO NA PESSOA DO MARIDO. DISPENSA DA CITAÇÃO DO
CÔNJUGE. ART. 16 DO DECRETO-LEI 3.365/1941. PREVISÃO ESPECÍFICA. 1.
Hipótese em que o Tribunal de origem, com fundamento no art. 10 do CPC,
decretou a nulidade da ação expropriatória em virtude da ausência de citação do
cônjuge do proprietário do imóvel desapropriado. 2. A solução integral da
controvérsia, com fundamento suficiente, não caracteriza ofensa ao art. 535 do
CPC. 3. Em se tratando de desapropriação, prevalece a disposição específica do
art. 16 do DL 3.365/1941, no sentido de que "a citação far-se-á por mandado na
pessoa do proprietário dos bens; a do marido dispensa a da mulher". 4. Conforme
dispõe o art. 42 do DL 3.365/1941, o Código de Processo Civil somente incidirá no
que for omissa a Lei das Desapropriações. Portanto, havendo previsão expressa
quanto à matéria, não se aplica a norma geral. 5. Recurso Especial parcialmente
provido.”

Sobre quais matérias poderá versar a contestação?

O art. 20 do DL 3364/41 limitou o campo de defesa do proprietário na desapropriação.

128
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

A contestação somente poderá versar sobre:

(i) Vício Processo judicial (questões processuais) – inclusive a caducidade; e


(ii) Impugnação do Preço (valor da indenização).

Isso porque a discussão do mérito, na ação de desapropriação, somente pode envolver


o valor da indenização.

Se o proprietário entender que houve alguma ilegalidade, ele poderá discutir o tema,
contudo, deverá fazê-lo em uma ação própria. Assim, qualquer outra matéria
juridicamente relevante poderá ser tratada por uma nova ação – a chamada ação
direta.

O STJ tem permitido, contudo, que se discuta na ação de desapropriação a


propriedade, quando houver dúvida quanto à possibilidade da propriedade do bem ser
pública.

REsp 1004942: “PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO DE DESAPROPRIAÇÃO.


FAIXA DE FRONTEIRA. IMPOSSIBILIDADE DE LEVANTAMENTO DO DEPÓSITO JUDICIAL
RELATIVO À INDENIZAÇÃO EXPROPRIATÓRIA. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO.
INTIMAÇÃO REALIZADA EM NOME DE UM DOS ADVOGADOS CONSTITUÍDOS.
AUSÊNCIA DE REQUERIMENTO DE INTIMAÇÃO EXCLUSIVA. VALIDADE DA INTIMAÇÃO.
OFENSA AO ART. 535 DO CPC NÃO CONFIGURADA. REDISCUSSÃO DA MATÉRIA DE
MÉRITO. IMPOSSIBILIDADE. PREQUESTIONAMENTO PARA FINS DE INTERPOSIÇÃO DE
RECURSO EXTRAORDINÁRIO. INVIABILIDADE. 8. Esta Turma, amparada na
jurisprudência pacífica do STJ, concluiu que, existindo relevante dúvida quanto à
propriedade do imóvel expropriado como ocorre no caso em exame, que se trata
de área localizada na faixa de fronteira do Estado do Paraná, impede-se o
levantamento do depósito judicial referente à indenização expropriatória. 9. Os
Embargos Declaratórios não constituem instrumento adequado para a rediscussão
da matéria de mérito. 10. Inviável a análise pelo STJ de questão constitucional,
ainda que para interposição de Recurso Extraordinário. 11. Embargos de
Declaração rejeitados com aplicação de multa de 1% (um por cento) sobre o valor
da causa, por litigância de má-fé.

Por fim, destaca-se que a doutrina não tem admitido reconvenção no processo de
desapropriação.

Como fica a questão da revelia na ação de desapropriação?

Em relação a ação de desapropriação, não serão aplicados os efeitos da revelia em


relação ao valor da indenização (preço).

Isso porque o art. 5, vviv da CF estabelece que a indenização será justa e não
necessariamente a indenização justa é aquela que foi oferecida pela Adm. Pública.

129
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

Ademais, o art. 23 do DL menciona que se naõ houver concordância expressa por parte
do proprietário quanto ao preço há necessidade de prova pericial para se chegar ao
justo valor da indenização.

Assim, não se opera a revelia em relação ao preço da indenização.

 IMISSÃO PROVISÓRIA NA POSSE:

Em regra, a posse do expropriante sobre o bem expropriado somente ocorre quando


tiver sido ultimado todo o processo de desapropriação, com a transferência jurídica do
bem, após o pagamento da devida indenização.

Porém, desde que haja a declaração de urgência e depósito prévio, é possível a imissão
provisória na posse, isto é, que o expropriante passe a ter a posse provisória do bem
antes da finalização da ação de desapropriação

Art. 15 do DL 3365/41: “Se o expropriante alegar urgência e depositar quantia


arbitrada de conformidade com o art. 685 do Código de Processo Civil, o juiz
mandará imiti-lo provisoriamente na posse dos bens”.

Assim, verifica-se que a imissão provisória na posse é uma etapa facultativa na ação
de desapropriação que implica a transferência da posse provisoriamente para o
desapropriante.

Quais os requisitos legais da imissão provisória na posse?

Para que imissão na posse ocorra, o desapropriante deverá:

(i) Alegar urgência (basta a alegação de urgência não sendo necessária a sua
comprovação – aqui não é possível ao Judiciário substituir o mérito
administrativo); e

(ii) Efetuar o depósito prévio do preço justo. Havia discussão na doutrina se os


critérios estabelecidos no art. 15, par. 1 do DL 3665 eram suficientes para
se chegar a um valor justo, uma vez que tais critérios não se aproximavam
do valor de mercado do bem. O STF pacifou o entendimento que tais
critérios haviam sido recepcionados pela CF.

Súmula 652 do STF: “Não contraria a Constituição o art. 15, § 1º, do Decreto-lei
3365/1941 (Lei da desapropriação por utilidade pública).”

A Administração Pública deverá emitir uma declaração formal de urgência e fazer o


depósito em dinheiro. Feito isso, o juiz DEVE deferir a imissão provisória na posse (é
direito subjetivo que a Adm. Pública tem). Feito o depósito, o proprietário poderá
levantar até 80% do valor depositado.

130
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

Qual o prazo para que a Adm Pública faça a imissão provisória na posse?

O Poder Público terá prazo de 120 da declaração expropriatória para realizar a imissão
na posse do bem.

Art. 15, § 2 do DL 3365/41: “A alegação de urgência, que não poderá ser renovada,
obrigará o expropriante a requerer a imissão provisória dentro do prazo
improrrogável de 120 (cento e vinte) dias.
§ 3 - Excedido o prazo fixado no parágrafo anterior não será concedida a imissão
provisória.”

Quais as formalidades para se configurar a imissão na posse?

O mandado de imissão provisória na posse deve ser registrado no cartório competente,


o que não significa que haja transferência da propriedade para o Poder Público. Este
ficará como possuidor provisório até que se finalize a ação de desapropriação.

Art. 15, § 4 do DL 3365/41: “A imissão provisória na posse será registrada no


registro de imóveis competente.”

ATENÇÃO!!!! NOVIDADE LEGISLATIVA NA IMISSÃO DA POSSE


Em 2017, o art. 34-A do DL 3365/41 trouxe uma mudança na questão da imissão na
posse. Se o proprietário concordar com o preço, ele poderá fazer o levantamento
de 100% do valor, o que implicará na aquisição da propriedade pelo expropriante.
Art. 34 do DL 3365: “O levantamento do preço será deferido mediante prova
de propriedade, de quitação de dívidas fiscais que recaiam sobre o bem
expropriado, e publicação de editais, com o prazo de 10 dias, para
conhecimento de terceiros.
Parágrafo único. Se o juiz verificar que há dúvida fundada sobre o domínio, o
preço ficará em depósito, ressalvada aos interessados a ação própria para
disputá-lo.
Art. 34-A. Se houver concordância, reduzida a termo, do expropriado, a decisão
concessiva da imissão provisória na posse implicará a aquisição da propriedade
pelo expropriante com o consequente registro da propriedade na matrícula do
imóvel. (Incluído pela Lei nº 13.465, de 2017)
§ 1 - A concordância escrita do expropriado não implica renúncia ao seu direito
de questionar o preço ofertado em juízo. (Incluído pela Lei nº 13.465, de 2017)
§ 2 - Na hipótese deste artigo, o expropriado poderá levantar 100% (cem por
cento) do depósito de que trata o art. 33 deste Decreto-Lei. (Incluído pela Lei
nº 13.465, de 2017)

131
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

§ 3 - Do valor a ser levantado pelo expropriado devem ser deduzidos os valores


dispostos nos §§ 1o e 2o do art. 32 deste Decreto-Lei, bem como, a critério do
juiz, aqueles tidos como necessários para o custeio das despesas processuais.
(Incluído pela Lei nº 13.465, de 2017)”

Quem fica responsável pelo pagamento do IPTU após a imissão provisória na posse?

Quando o expropriante é imitido provisoriamente na posse do bem, ele se torna


possuidor com animus domini e, por esta razão, o STJ entende de forma pacífica que,
após esse momento, o proprietário fica desobrigado do pagamento dos tributos sobre
a propriedade, recaindo tal obrigação sobre o expropriante, sujeito passivo da relação
tributária.

Registre-se, contudo, que muito provavelmente haverá a chamada imunidade


tributária recíproca para os impostos se o expropriante for Fazenda Pública (art. 150,
VI, a, da CF). Se for, todavia, um particular, não haverá tal imunidade.

E em relação aos impostos cujos fatos geradores sejam anteriores ao ato de


aquisição originária da propriedade? Quem fica responsável?

Em decisão de 2017, o STJ entendeu que o ente desapropriante não responde por
tributos anteriores ao ato de aquisição originária. Vejamos:

REsp 1.668.058-ES: “O ente desapropriante não responde por tributos incidentes


sobre o imóvel desapropriado nas hipóteses em que o período de ocorrência dos
fatos geradores é anterior ao ato de aquisição originária da propriedade.”

É constitucional o art. 15, §1 do DL 3365/41?

A principal controvérsia quanto à imissão provisória na posse está no §1º do art. 15 do


DL 3365/41.

Isto porque, enquanto o caput menciona o art. 685 do CPC/39, exigindo a oitiva prévia
do réu, o §1º menciona a desnecessidade de citação do réu para a imissão provisória.

Ocorre que o §1º se aplica somente às hipóteses ali descritas, ou seja, quando o
desapropriante já deposita em juízo o preço seguindo alguns parâmetros:

§ 1 do art. 15 do DL 3365/41: “A imissão provisória poderá ser feita, independente


da citação do réu, mediante o depósito:
a) do preço oferecido, se êste fôr superior a 20 (vinte) vêzes o valor locativo, caso
o imóvel esteja sujeito ao impôsto predial;

132
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

b) da quantia correspondente a 20 (vinte) vêzes o valor locativo, estando o imóvel


sujeito ao impôsto predial e sendo menor o preço oferecido;
c) do valor cadastral do imóvel, para fins de lançamento do impôsto territorial,
urbano ou rural, caso o referido valor tenha sido atualizado no ano fiscal
imediatamente anterior;
d) não tendo havido a atualização a que se refere o inciso c, o juiz fixará
independente de avaliação, a importância do depósito, tendo em vista a época em
que houver sido fixado originàlmente o valor cadastral e a valorização ou
desvalorização posterior do imóvel.

Um dos parâmetros é o depósito do valor cadastral do imóvel, também chamado de


valor venal, que é inferior ao valor de mercado. Contudo, isso é flagrantemente
inconstitucional por ofensa ao art. 5º, XXIV, da CF que prevê que a indenização deve
ser justa e prévia, ou seja, deve ser paga ao início do processo, em momento
antecedente à transferência da posse, de forma justa. Ademais, o art. 33, §2º, do DL
3365/41 só autoriza o levantamento de até 80% do valor depositado para fins de
imissão.

O STJ, em um primeiro momento, reconheceu a inconstitucionalidade do art. 15, §1º


do DL 3365.

O STF, divergindo do entendimento do STJ, entendeu que o art. 15, §1º, não ofende a
CF, sob o fundamento de que o pagamento será feito de forma prévia, e, ainda que
fosse feito ao final da ação de desapropriação, por meio da complementação do valor
com expedição de precatório, ele continua sendo prévio, pois ocorre antes da
transferência da propriedade.

O STF editou a Súmula 652 sobre o tema:

Súmula 652 do STF: “Não contraria a Constituição o art. 15, §1º, do Decreto-Lei
3365/1941.”

O DL 1.075/70 (disciplina a imissão provisória na posse de imóveis residenciais urbanos)


busca atenuar os problemas resultantes do art. 15, §1º, do DL 3365/41, criando uma
regra menos injusta para as hipóteses de imissão provisória na posse de imóveis
residenciais urbanos.

O DL 1.075/90 prevê que, se houver impugnação ao preço oferecido pelo


desapropriante, o juiz designará um perito para fazer uma avaliação provisória e o
desapropriante só poderá ser imitido na posse caso deposite ao menos metade do valor
fixado provisoriamente pelo juiz, o que, em regra, é muito melhor que o valor venal.

133
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

Existe alguma modalidade de desapropriação em que a imissão provisória na posse


é obrigatória?

Sim! Como visto anteriormente, o Poder Público tem a faculdade de se imitir


provisoriamente na posse se alegar a urgência da medida e depositar o preço justo.
Contudo, no caso específico da desapropriação para fins de reforma agrária, a imissão
provisória na posse se torna obrigatória (Lei 8.629/93 e LC 76/93 – art. 184, §3º, da
CF).

O art. 5º da LC 76/93 prevê o que deve acompanhar a petição inicial distribuída pelo
INCRA. O decreto presidencial declara o interesse social da reforma agrária e o INCRA
promove a execução da reforma agrária.

Dentre os documentos que precisam ser acostados à inicial, o art. 5º menciona o


comprovante de emissão dos títulos da dívida agrária e do depósito do dinheiro
correspondente às benfeitorias úteis e necessárias.

Por sua vez, o art. 6º da LC 76/93 estabelece que o juiz federal, ao despachar a petição
inicial, mandará imitir o autor na posse do imóvel. Não há espaço para se avaliar a
conveniência e a oportunidade da imissão. A lei prevê a imissão como etapa necessária
da ação de desapropriação.

 PROVA PERICIAL:

A prova pericial é essencial para se alcançar o justo valor da indenização. O laudo


pericial não vincula o juiz, ele pode em tese decidir diferente do laudo.

Na prática quando o laudo está incompleto, o juiz manda fazer outro laudo.

A prova pericial é tratada no art. 23 do DL 3665.

Art. 23 do DL 3665: “Findo o prazo para a contestação e não havendo concordância


expressa quanto ao preço, o perito apresentará o laudo em cartório até cinco dias,
pelo menos, antes da audiência de instrução e julgamento.
§ 1 - O perito poderá requisitar das autoridades públicas os esclarecimentos ou
documentos que se tornarem necessários à elaboração do laudo, e deverá indicar
nele, entre outras circunstâncias atendiveis para a fixação da indenização, as
enumeradas no art. 27.
Ser-lhe-ão abonadas, como custas, as despesas com certidões e, a arbítrio do juiz,
as de outros documentos que juntar ao laudo.
§ 2 - Antes de proferido o despacho saneador, poderá o perito solicitar prazo
especial para apresentação do laudo.”

O valor da indenização é arbitrado no momento da perícia. A jurisprudência é no


sentido de que fixado o valor da indenização por meio da perícia é esse o valor que

134
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

vale. Se a perícia for anulada e se fizer uma nova perícia, será o valor da nova perícia
que passará a valer.

 INTERVENÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO:

A intervenção do MP é obrigatória em uma ação de desapropriação?

Há discussão na doutrina sobre a necessidade de intervenção do MP nas ações de


desapropriação. Sobre o tema existem duas posições:

CORRENTE 1) Parte da doutrina defende que a intervenção do MP é obrigatória, na


forma do art. 178, I do CPC, tendo em vista a presença do interesse público.

CORRENTE 2) Corrente majoritária defende que inexiste obrigatoriedade de


intervenção do MP, em razão de ausência de norma legal nesse sentido, salvo na ação
de desapropriação rural para fins de reforma agrária (atuação do MPF – art. 18, §2º, da
LC 76) e nos casos previstos em lei como de atuação do MP (ex. envolvimento de
menor).

Destaca-se decisão recente do STF (RE 554632) que entendeu pela desnecessidade de
intervenção do MP nas ações envolvendo desapropriação indireta.

RE 554632: “PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO – VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO


CPC – INEXISTÊNCIA – DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA – INTERVENÇÃO DO MINISTÉRIO
PÚBLICO – DESNECESSIDADE. 1. Inexiste ofensa ao art. 535 do CPC se o Tribunal de
origem examina as questões ditas omissas. 2. A ação de desapropriação indireta é
ação de indenização, de cunho patrimonial, não havendo interesse público que
justifique a intervenção do Ministério Público.”

 DIREITO DE EXTENSÃO:

O direito de extensão consiste no direito de o proprietário exigir que a desapropriação


parcial se transforme em total quando a parte remanescente, de forma isolada, não
possuir valoração ou utilidade econômica razoável. Evita-se, dessa forma, que o
proprietário, na prática, perca a integralidade da propriedade com o recebimento de
indenização parcial.

Exemplo: Ente desapropria 95% do terreno do particular, ficando os 5% remanescentes


sem destinação econômica. Nesse caso, o Ente estará obrigado a desapropriar tudo se
o proprietário assim pleitear.

Em que pese certa discussão na doutrina se o direito de extensão era admissivel ou não
pelo ordenamento jurídico pátrio, a jurisprudência consolidou o entendimento de que
o particular terá direito de compensação pelo remanescente do bem.

135
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

O DL 76/93 consagra o direito de extensão no seu art. 4. Vejamos:

Art. 4 do DL 76/93: “Intentada a desapropriação parcial, o proprietário poderá


requerer, na contestação, a desapropriação de todo o imóvel, quando a área
remanescente ficar:
I - reduzida a superfície inferior à da pequena propriedade rural; ou
II - prejudicada substancialmente em suas condições de exploração econômica,
caso seja o seu valor inferior ao da parte desapropriada.”

 TRANSFERÊNCIA DA PROPRIEDADE:

A matéria é objeto de divergência na doutrina. Vejamos as posições sobre o tema:

CORRENTE 1) Parte da doutrina defende que a transferência de propriedade em razão


de desapropriação somente ocorre com o registro da carta de sentença da ação de
desapropriação no RGI.

CORRENTE 2) A maior parte da doutrina, contudo, entende que a transferência de


propriedade no âmbito de uma desapropriação ocorre com o pagamento da indenização
fixada na sentença.

 DESISTÊNCIA NA DESAPROPRIAÇÃO:

O Poder Público pode desistir da desapropriação. De acordo com o STF, a desistência


não depende de concordância do réu.
Precisamos avaliar, no entanto, até que momento cabe a desistência e quais são as
condições para que ela ocorra.

Até que momento pode a Adm. Pública desistir da desapropriação?

Caso não subsistam mais os motivos que provocaram a iniciativa do processo


expropriatório, pode o Poder Público desistir da desapropriação, inclusive, no curso da
ação judicial.

Contudo, se a transferência já ocorreu de modo definitivo, não se pode mais falar em


desistência. A doutrina diverge sobre até que momento a Adm. Pública pode desistir
da desapropriação. Vejamos:

CORRENTE 1) Predomina na jurisprudência e na doutrina o entendimento de que é o


pagamento integral da indenização definitiva que transfere a propriedade. Pode
acontecer de a ação de desapropriação transitar em julgado e mesmo assim o
desapropriante estar autorizado a desistir da desapropriação. Para essa corrente, o
Poder Público poderia desistir da desapropriação até o momento do pagamento da
indenização. Assim, somente seria possível até o pagamento, ainda que parcial, da
indenização fixada na sentença.

136
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

CORRENTE 2) Hely Lopes Meirelles, minoritariamente, entende que o trânsito em


julgado da ação impediria a desistência. O pagamento integral do preço normalmente
só ocorre ao final da desapropriação no momento em que o precatório é pago.

Ademais a desistência só poderá ocorrer se o bem puder ser restituído ao proprietário


no estado em que se encontrava no momento da imissão provisória na posse. A
irreversibilidade da situação fática impede a desistência.

A desistência obriga o desapropriante a indenizar o proprietário pelos prejuízos


sofridos pela desapropriação seguida de desistência. Raramente, um juiz inclui nesse
montante a parcela de lucros cessantes.

REsp 1397844: “PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. DESAPROPRIAÇÃO POR


UTILIDADE PÚBLICA. DESISTÊNCIA. AUTORIZAÇÃO ADMINISTRATIVA.
POSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE IMISSÃO NA POSSE E DO PAGAMENTO DO PREÇO
JUSTO. 1. A jurisprudência da Corte admite a desistência da ação expropriatória,
antes da realização do pagamento do preço justo, desde que seja possível devolver
ao expropriado o imóvel no estado em que se encontrava antes do ajuizamento da
ação. 2. A declaração de desistência de uma ação de desapropriação pode ser
efetivada por diversos meios, não se restringindo à edição de lei ou decreto
revogando expressamente o decreto expropriatório. 3. Recurso especial conhecido
e provido.”

O STJ vem entendendo que o ônus de demonstrar a inviabilidade de devolução do


imóvel é do expropriado, ou seja, o poder público tem direito de desistir, o que vai
inviabilizar a desistência é quando a Adm. Pública não consegue devolver o bem no
estado em que recebeu. O ônus de demonstrar a inviabilidade da devolução é do
expropriado.

Quais os requisitos para a desistência da ação de desapropriação?

Temos basicamente dois requisitos para a desistência da desapropriação pelo Poder


Público, quais sejam:

(i) A desistência deverá ocorrer até o momento do pagamento da indenização


fixada na sentença (e não do valor decorrente da imissão na posse), ou seja,
se a indenização já tiver sido paga, o Poder Público não poderá desistir; e

(ii) O bem deve ser devolvido nas mesmas condições em que ele foi retirado do
particular.

Quais os efeitos da desistência da desapropriação?

137
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

Entre os efeitos da desistência da desapropriação, destacam-se:

(i) Poder Público deverá indenizar o proprietário por meio de ação autônoma
e indenizatória;
(ii) A sentença de extinção do processo de desapropriação condenará o Poder
Público ao pagamento das despesas processuais e honorários.

 CONTROLE JURISDICIONAL NA AÇÃO DE DESAPROPRIAÇÃO:

Em relação ao controle jurisdicional, destaca-se o art. 9º e art. 20 do DL 3365/41.

Art. 9 do DL 3365: “Ao Poder Judiciário é vedado, no processo de desapropriação,


decidir se se verificam ou não os casos de utilidade pública.”

Não cabe ao Judiciário interferir no mérito da avaliação da Administração. Se o


administrador entendeu que era caso de utilidade pública, a desapropriação deve
prosseguir. Não pode o Judiciário interferir no espaço decisório de incumbência do
administrador.

Ocorre que, em algumas situações excepcionais, o juiz se depara com uma hipótese de
evidente ilegalidade ou mesmo inconstitucionalidade. É o caso, por exemplo, de
utilidade pública ventilada pelo Poder Público que não é hipótese de utilidade pública,
ou, apesar de ser hipótese prevista em lei, fica evidenciado o desvio de finalidade. Em
tais hipóteses excepcionais, o Judiciário poderá interferir.

Exemplo:
Prefeito que pretende desapropriar casa de antigo prefeito que é seu inimigo para
construção de uma praça. A ação de desapropriação será extinta sem julgamento do
mérito por ilegalidade no decreto expropriatório.

Casos Concretos:

Questão 1)

O Município X ajuizou ação de desapropriação por interesse social em face do


proprietário de certo imóvel comercial, situado nos limites de seu território, na
qual pleiteou a imissão provisória na posse, antes da citação, para o que alegou e
demonstrou a respectiva urgência e depositou equivalente ao valor venal do bem
para fins de IPTU, apesar de inferior ao seu valor de mercado. O juiz negou o pedido
de imissão provisória na posse, sob o fundamento de que as desapropriações por
utilidade pública ou interesse social se sujeitam à prévia e justa indenização, de
modo que o montante a ser depositado deveria ser apurado em avaliação provisória,
tal como se depreende, inclusive, do disposto no Decreto-Lei nº 1075/70. Diante
dessa situação hipotética, analise se a postura adotada pelo Juízo de 1º grau está
de acordo com a legislação pertinente, bem como o entendimento jurisprudencial,
notadamente em relação à aplicabilidade do Decreto-Lei nº 1075/70, no caso, e os

138
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

requisitos para a concessão da imissão provisória da posse, de acordo com a


orientação do C. STJ.

Resposta:

O juiz agiu de forma equivocada, uma vez que o DL 1075 somente se aplica aos casos
de desapropriação de imóveis URBANOS e RESIDENCIAIS. O caso em tela trata de um
imóvel comercial, nao se aplicando, portanto, o DL 1075.

RESp 1202448: “ADMINISTRATIVO. DESAPROPRIAÇÃO POR INTERESSE SOCIAL.


IMISSÃO PROVISÓRIA NA POSSE. PRÉVIA AVALIAÇÃO. ART. 15, § 1º, "C", DO
DECRETO 3.365/1941. DESNECESSIDADE. DECRETO 1.075/1970. IMÓVEL
COMERCIAL URBANO. INAPLICABILIDADE. 1. In casu, o Tribunal a quo, não obstante
a alegação de urgência do ente expropriante e o depósito do valor venal do imóvel
para fins de lançamento do IPTU, vedou-lhe a imissão provisória na posse,
fundamentando-se no entendimento de que "a desapropriação por necessidade ou
utilidade pública, ou por interesse social se dá mediante justa e prévia
indenização. Para fins de imissão provisória na posse do imóvel expropriado, a
justa e prévia indenização deverá, necessariamente, ser apurada mediante
avaliação provisória" (fl. 101). 2. Dessume-se do art. 15, § 1º, "c", do Decreto
3.365/1941 que, alegada a urgência na desapropriação e depositado o valor
cadastral do imóvel, para fins de lançamento do IPTU ou do ITR, a imissão
provisória na posse pode ser realizada, independentemente da citação do réu e,
por óbvio, em momento anterior à avaliação, visto que esta ocorre na instrução
processual. Precedentes do STJ. 3. O Supremo Tribunal Federal firmou, pela
Súmula 652, a compreensão de que o art. 15, § 1º, do Decreto-Lei 3.365/1941 não
afronta o princípio da justa e prévia indenização, preconizado no art. 5º, XXIV, da
Constituição Federal. 4. Como obiter dictum, cabe salientar que o disposto no
Decreto-Lei 1.075/1970 - necessidade de avaliação provisória do imóvel antes da
imissão na posse - só se aplica à desapropriação de prédio residencial urbano,
habitado pelo proprietário ou compromissário comprador, conforme prevê o art.
6º da citada norma: "O disposto neste Decreto-lei só se aplica à desapropriação de
prédio residencial urbano, habitado pelo proprietário ou compromissário
comprador, cuja promessa de compra esteja devidamente inscrita no Registro de
Imóveis". 5. Tal hipótese não se vislumbra no presente caso, em que o imóvel sub
judice é comercial, conforme se dessume do seguinte excerto da petição inicial da
ação desapropriatória: "Trata-se de ação de desapropriação de imóvel comercial
urbano, localizado na Praça Júlio Prestes, 29/137, onde funciona um centro de
compras denominado Fashion Center Luz, para construção do Teatro de Dança e
da Companhia Estadual de Dança" (fl. 4). 6. Recurso Especial provido.”

139
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

Questão 2)

Determinado estado limítrofe da federação conferiu a titularidade de certas terras


de fronteira a diversos particulares, sem respeitar, contudo, as pessoas que
ocupavam e cultivavam na localidade, o que ensejou conflitos fundiários gravíssimos
na área. Com vistas a pacificar tais conflitos, a União, por meio do INCRA, decidiu
levar a efeito a desapropriação por interesse social dos imóveis situados na região
de confronto. Não obstante, após o ajuizamento de uma série de ações de
desapropriação, em momento posterior ao depósito prévio em diversas delas, o
próprio INCRA concluiu que o estado federativo em foco não poderia ter conferido
a titularidade de tais bens, por constituírem terras devolutas indispensáveis à
defesa de fronteira, que integram o patrimônio da própria União, razão pela qual
requereu a resolução dos aludidos feitos sem julgamento do mérito, diante da
impossibilidade jurídica do pedido. Os expropriados, por sua vez, asseveram que o
art. 20 do DL nº 3365/41 impede a discussão do domínio no bojo do rito específico
e pretendem efetuar o levantamento da quantia depositada nos autos. Diante dessa
situação hipotética, analise os argumentos dos expropriados à luz da jurisprudência
do C. STJ.

Resposta:

Terra Devoluta é bem público e pode pertencer a União ou aos Estados. O art. 20, ii
enumera as terras devolutas da União e o art. 26 enumera as terras devolutas dos
Estados.

No caso em tela, as terras devolutas de propriedade da União. Logo, o Estado se


equivocou em desapropriar terras da União pois deve ser observado o Princípio da
Hierarquia previsto no art. 2, par. 2 do DL 3665.

Por fim, destaca-se que o STJ entendeu que é possível debater a propriedade pública
dos imóveis na mesma ação de desapropriação. Em relação ao polo ativo é possível a
discussão quanto a propriedade do imóvel, o que não se permite é a discussão da
propriedade em relação ao polo passivo da ação.

RESp 783840: “ADMINISTRATIVO. AÇÃO DE DESAPROPRIAÇÃO. TERRAS DE


FRONTEIRA. DEBATE ACERCA DA PROPRIEDADE PÚBLICA DOS IMÓVEIS.
POSSIBILIDADE. CONDIÇÃO DA AÇÃO: POSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO. ARTS.
20 E 34 DO DL 3.365/1941. INAPLICABILIDADE. 1. Hipótese em que se discute a
possibilidade de debate sobre o domínio público das terras objeto de Ação de
Desapropriação, por tratar-se, excepcionalmente, de possibilidade jurídica do
pedido (alega-se que o bem pertence ao expropriante). 7. O art. 20 do DL
3.365/1941 impede, em regra, a discussão sobre o domínio nas Ações de
Desapropriação. De modo coerente, o art. 34, parágrafo único, veda o
levantamento da indenização no caso de dúvida quanto ao domínio (o que
pressupõe o depósito pelo expropriante). 8. Ocorre que esses dispositivos legais

140
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

(arts. 20 e 34 do DL 3.365/1941) referem-se à questão dominial entre particulares


e são inaplicáveis se a dúvida recair sobre a possibilidade de desapropriação, no
caso de o imóvel pertencer ao expropriante. 9. A dúvida relativa ao proprietário
privado do imóvel (não é o caso dos autos) é irrelevante para o andamento da
desapropriatória, pois, de qualquer forma, a indenização haverá de ser depositada
pelo Poder Público. 10. A discussão quanto ao proprietário privado somente é
relevante para definir quem levantará o depósito, e não para fixar o dever de
depositar ou apurar o seu quantum. Por essa razão, o art. 20 do DL 3.365/1941
refere-se à contestação da desapropriação, que é apresentada, evidentemente,
pelo expropriado. 11. O art. 20 do DL 3.365/1941 é dispositivo inscrito em favor
do Poder Público, que prestigia a celeridade processual e o interesse social. Seria
paradoxal interpretá-lo de modo a compelir a União a pagar por imóvel que lhe
pertence. 12. No caso dos autos, a dúvida refere-se ao domínio da União sobre as
terras a serem desapropriadas. É evidente que seus imóveis não podem ser objeto
de Ação de Desapropriação, muito menos quando por ela intentada. 13. O debate
sobre a propriedade, nessa hipótese excepcional, prejudica a existência da ação
expropriatória. Trata-se de óbice ao desenvolvimento válido do processo, cujo
enfrentamento não pode ser evitado ou adiado pelo Judiciário, sob pena de
condenar absurdamente a União a pagar por imóvel que lhe pertence, o qual foi,
a seguir, retitulado em favor dos particulares. 14. Compreender de modo diverso
oneraria de maneira injustificável o Erário e a máquina judicial, dando
seguimento a centenas de processos sem condições de desenvolvimento válido
(impossibilidade jurídica do pedido). 15. Em síntese, é possível o debate acerca
do domínio público dos imóveis, no bojo da Ação de Desapropriação, desde que
suscitado pela própria entidade pública a quem caberia pagar por eventual
indenização. 16. Embargos de Divergência não providos.”

Questão 3)

Em decorrência de projeto que envolvia a inundação de extensa área para a


construção de uma hidrelétrica, a Agência Nacional de Energia Elétrica - ANEEL
editou Resolução com vistas a desapropriar, por utilidade pública, o imóvel de
propriedade de Maria, tendo sido conferida a devida autorização para que a
concessionaria X levasse a efeito tal intervenção do Estado na propriedade. Diante
da falta de acordo na via administrativa, a concessionária X ajuizou a respectiva
ação de desapropriação e, tendo preenchido os respectivos requisitos, logrou obter
a imissão provisória na posse, mediante depósito prévio da quantia de R$
1.000.000,00 (um milhão de reais). Após os devidos trâmites, o Juízo de 1º grau
prolatou sentença, que adotou o valor indicado pela perícia para fins de justa
indenização, a qual alcançou o montante de R$10.000.000,00 (dez milhões de reais),
pois foi levado em consideração o potencial das jazidas de minério existentes na
localidade, para as quais a proprietária já possuía autorização para exploração. Ao
longo do processo, novos estudos técnicos foram realizados pelos entes
competentes, os quais concluíram no sentido de que o imóvel de Maria não era
necessário para a realização do reservatório da hidrelétrica em questão, ou para
qualquer outra finalidade de interesse público. Em razão disso, determinou-se que

141
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

a demandante desistisse da desapropriação, o que foi pleiteado pela concessionária


X, após o trânsito em julgado da sentença, mas antes do pagamento. A expropriada
insurgiu-se contra a desistência, sob o fundamento de que para tanto seria
necessária a revogação da resolução editada pela ANEEL, bem como pelo fato de
que não poderia ser obrigada a receber de volta o imóvel que já tinha sido objeto
de apossamento pela concessionária. Considerando que não houve modificação no
imóvel em questão, que permanecia nas mesmas condições da imissão provisória na
posse, nada impedindo a sua utilização como antes, analise se é possível a
desistência da desapropriação na situação descrita, mediante o enfrentamento da
competência da ANEEL para submeter o bem à força expropriatória do Estado, à luz
da orientação do C. STJ.

Resposta:

A jurisprudência consolidou o entendimento de que até o pagamento da indenização


definitiva pode haver a desistência da ação de desapropriação, mesmo que após o
trânsito em julgado. O STJ entende ainda que se o expropriado entender que o imóvel
nao pode ser devolvido nas mesmas condições, o ônus da prova é do expropriado.

Resp 1368773: “ADMINISTRATIVO. SENDO A DESISTÊNCIA DA DESAPROPRIAÇÃO


DIREITO DO EXPROPRIANTE, O ÔNUS DA PROVA DA EXISTÊNCIA DE FATO IMPEDITIVO
DO SEU EXERCÍCIO (IMPOSSIBILIDADE DE RESTAURAÇÃO DO IMÓVEL AO ESTADO
ANTERIOR) É DO EXPROPRIADO. 1. Com autorização dada pela Aneel, a Cesp
ajuizou diversas ações de desapropriação de imóveis para formação do lago de
usina hidrelétrica, entre as quais quatro relativas a imóveis da recorrida.
Posteriormente, registra o acórdão recorrido, foram formulados pedidos de
desistência das desapropriações, diante do fato de que, por imposição do
Ibama, a cota de inundação foi diminuída de 259m para 257m, de sorte que os
imóveis foram excluídos da área a ser inundada pelo lago da Usina Hidrelétrica
Sérgio Motta. A jurisprudência do STJ consolidou-se no sentido de que é possível
a desistência da desapropriação, a qualquer tempo, mesmo após o trânsito
em julgado, desde que ainda não tenha havido o pagamento integral do preço
e o imóvel possa ser devolvido sem alteração substancial que impeça que seja
utilizado como antes. A DESISTÊNCIA É DIREITO DO EXPROPRIANTE E A
IMPOSSIBILIDADE É FATO IMPEDITIVO DO SEU EXERCÍCIO. 7. O acórdão recorrido
imputou indevidamente à desapropriante o ônus de provar que o imóvel de cuja
expropriação pretende desistir não foi afetado fisicamente ou em sua finalidade
econômica. 8. Se a desapropriação se faz por utilidade pública ou interesse
social, uma vez que o imóvel já não se mostre indispensável para o atingimento
dessas finalidades, deve ser, em regra, possível a desistência da
desapropriação, com a ressalva do direito do atingido à ação de perdas e danos.
Essa desistência só não será possível se já tiver sido pago integralmente o preço,
pois nessa hipótese já terá se consolidado a transferência da propriedade do
expropriado para o expropriante, ou se tiverem sido feitas alterações de tal
monta no imóvel que impeçam que ele possa ser utilizado como antes. 9. A regra

142
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

é a possibilidade de desistência da desapropriação. Contra essa, pode ser alegado


fato impeditivo do direito de desistência, consistente na impossibilidade de
o imóvel ser devolvido como recebido ou com danos de pouca monta. 10.
CONCLUSÃO 19. Como a regra é a possibilidade de desistência da desapropriação,
o desistente não tem de provar nada para desistir, cabendo ao expropriado
requerer as perdas e danos a que tiver direito por ação própria. Pretendendo
o réu, porém, impedir a desistência, poderá alegar que não há condição de
o bem ser devolvido no estado em que recebido ou com danos de pouca monta,
mas é seu o ônus da prova. 20. No caso concreto, não cabia à Cesp fazer a prova
pretendida pelo acórdão recorrido.”

143
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

Aula 9 – Prof. Cláudio Brandão


9/10/18

EMENTA:  Ação de Desapropriação.


 Sentença: peculiaridades.
 Indenização:
 Juros moratórios;
 Juros compensatórios;
 Atualização monetária;
 Honorários;
 Direitos de terceiros.
 Extensão do controle jurisdicional nas ações de
desapropriação.

Daremos continuidade ao tema da ação de desapropriação.

 SENTENÇA:

A sentença no processo de desapropriação soluciona a lide, decidindo o mérito e


fixando o valor da justa indenização a ser paga pelo expropriante ao expropriado.

Efetuado o pagamento da indenização, consuma-se a desapropriação, e o


expropriante, agora definitivamente imitido na posse do bem expropriado, deve
providenciar a regularização da transferência do bem perante o registro dos imóveis
(caso se trate de bem imóvel, evidentemente).

Quais os efeitos da sentença?

A sentença gera os seguintes efeitos:

 Autoriza a imissão definitiva na posse do bem em favor do expropriante;


 Constitui título hábil para a transcrição da propriedade do bem no registro
imobiliário.

 INDENIZAÇÃO:

Na desapropriação por utilidade pública e por interesse social, a indenização deve ser
prévia, justa e em dinheiro.

A lógica da indenização é a seguinte:

 Quando a desapropriação se der em propriedade que atenda a sua função


social, em razão da utilidade pública ou por interesse social: a indenização
deve ser feita previamente e em dinheiro (art. 5, XXIV da CF);

144
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

 Quando a desapropriação for para fins de reforma agrária – imóvel rural que
não cumpre com sua função social - (art. 184 da CF): indenização não é prévia
e é paga com títulos de reforma agrária;

 Quando a desapropriação for para fins urbanísticos (art. 182, par. 4, III da CF):
a indenização não será prévia e será feita em títulos da dívida pública;

 Quando a desapropriação for confiscatória (em propriedade que cultive drogas


ou trabalho escravo): não há indenização, nem em dinheiro, nem em títulos
(art. 243 da CF).

O valor justo é o VALOR DE MERCADO do bem imóvel e a prova pericial é que vai aferir
o valor justo.

O valor afetivo do bem não é levado em consideração para fins de indenização em ação
de desapropriação. Assim, se a parte alegar que a casa é da família há mais de 100
anos, a jurisprudência entende que isso não pode ser levado em consideração, deve-
se analisar o valor de mercado do bem.

Não cabe dano moral em ação de desapropriação. O objetivo da ação de


desapropriação é estabelecer o valor justo do bem que será expropriado.

Em suma: a indenização deve ser integral, englobando não só o valor o preço do imóvel
no momento da perícia (avaliação), na forma do art. 26 do DL 3365, como também
eventuais danos emergentes, os lucros cessantes, as despesas processuais, os juros, a
correção monetária e o honorário advocatício.

Ademais, no valor da indenização, que será contemporâneo da avaliação, não se


incluirão os direitos de terceiros contra o expropriado.

Vejamos abaixo cada um desses componentes da indenização:

 DANOS EMERGENTES E LUCROS CESSANTES:

Os danos emergentes são aqueles prejuízos sofridos diretamente do fato e que,


portanto, devem ser computados no cálculo do valor da indenização.

Os Lucros cessantes funcionam como parcela que vem para recompor a frustração da
expectativa de lucro do proprietário do bem expropriado. Muitos autores entendem
que o montante referente aos lucros cessantes deve ser incluído na indenização.

O STJ reconhece que, se a parcela de juros compensatórios foi incluída na indenização,


não é possível determinar a inclusão simultânea dos lucros cessantes.

145
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

 JUROS COMPENSATÓRIOS:

Conforme visto acima o juiz pode autorizar que, antes de a ação de desapropriação
chegar ao fim, o Poder Público já assuma a posse do bem desapropriado. A isso se
chama de imissão provisória na posse.

Ocorre que, se o valor da indenização fixada na sentença for maior do que a quantia
oferecida pelo Poder Público, isso significa que o proprietário do bem estava certo ao
questionar esse valor e que ele foi “injustamente” retirado prematuramente da posse
de seu bem. Digo “injustamente” porque o valor oferecido era menor realmente do
que o preço devido. Assim, a legislação, como forma de compensar essa perda
antecipada do bem, prevê que o expropriante deverá pagar juros compensatórios ao
expropriado.

Desse modo, os juros compensatórios na desapropriação são aqueles fixados com o


objetivo de compensar o proprietário em razão da ocorrência de imissão provisória na
posse.

Qual é o termo inicial dos juros compensatórios?

Na desapropriação direta, os juros compensatórios são contados desde a data de


imissão na posse. Os juros compensatórios incidem sobre a diferença eventualmente
apurada.

Na desapropriação indireta, o termo a quo é a ocupação efetiva do bem, uma vez que
não haverá uma etapa de imissão provisória na posse. Os juros compensatórios incidem
sobre todo o valor indenizado.

É o que se encontra na Súmula 69 do STJ.

Súmula 69 do STJ: “Na desapropriação direta, os juros compensatórios são


devidos desde a antecipada imissão na posse e, na desapropriação indireta, a
partir da efetiva ocupação do imóvel.”

A EC 62, ao alterar o art. 100, §12, da CF, vedou a incidência de juros compensatórios
após a expedição do precatório ou RPV. Portanto, os juros compensatórios fluirão da
imissão provisória na posse até o dia em que o juiz determinar a expedição do
precatório. Entre a expedição do precatório e o pagamento não incidem juros
compensatórios.

Qual é a taxa dos juros compensatórios?

É importante, no entanto, fazermos um breve histórico sobre o tema:

146
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

 Em 1941: na redação original do DL 3.365/1941 não havia previsão do


pagamento de juros compensatórios nos casos de imissão provisória na posse
do bem expropriado; •

 Em 1963: o STF, por criação jurisprudencial, entende que devem ser pagos
juros compensatórios e edita a Súmula 164 com a seguinte redação:

Súmula 164 do STF: “No processo de desapropriação, são devidos juros


compensatórios desde a antecipada imissão de posse, ordenada pelo juiz, por
motivo de urgência.”

Como não havia um percentual previsto no DL 3.365/1941, a jurisprudência


entendeu àquela época que o percentual dos juros compensatórios deveria ser
fixado em 6% ao ano, com base no Código Civil de 1916. 4/12

 Em 1984: o Brasil vivia um cenário de inflação crônica com a perda do poder


aquisitivo da moeda sem que existissem mecanismos de correção monetária.
Tudo isso, aliado à excessiva demora dos processos de desapropriação, bem
como a disposição da Lei da Usura que limita a taxa de juros ao dobro da
legalmente prevista, levaram o STF a modificar a jurisprudência e passar a
entender que os juros deveriam ser fixados em 12% ao ano, correspondente ao
dobro dos juros legais do Código Civil de 1916.

Foi, então, editada a Súmula 618, com a seguinte redação:

Súmula 618 do STF: “Na desapropriação, direta ou indireta, a taxa dos juros
compensatórios é de 12% (doze por cento) ao ano.”

 Em 1997 (11/06/1997): o Governo editou a MP 1.577/1997 reduzindo os juros


compensatórios para 6% ao ano. Nas sucessivas edições da Medida Provisória
até chegar à MP 2.183-56, a redação foi alterada para estabelecer a taxa em
“até 6%”, além do ônus do proprietário de provar a perda da renda sobre o
imóvel como condição para o deferimento do pagamento dos juros
compensatórios e afastar o pagamento quando o grau de utilização e eficiência
na exploração da propriedade forem iguais a zero.

 Em 2001: o STF concedeu medida liminar nesta ADI 2332/DF declarando


inconstitucional a redução dos juros para 6% e determinando a volta da taxa
fixa para 12%. A decisão do STF foi publicada em 13/09/2001. Vale ressaltar,
no entanto, que essa decisão do STF foi ex nunc (para frente).

Assim, a MP 1.577/97 produziu efeitos no período de 11/06/1997 a


13/09/2001. Neste período, a taxa de juros foi de 6%, voltando a 12% após a
decisão liminar do STF na ADI 2332/DF.

147
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

Na mesma decisão foi suspensa a eficácia dos §§1º e 2º do art. 15-A, que tratam
das condicionantes para incidência de juros compensatórios (comprovação de
perda de renda e grau de utilização).

Qual foi o novo “capítulo” desse enredo?

O STF julgou o mérito da ADI 2332/DF e resolveu alterar a decisão liminar que havia
tomado em 2001.

Agora, em 2018, o STF, ao julgar em definitivo a ADI 2332/DF, decidiu que é


constitucional o percentual fixo de 6% previsto no art. 15-A do DL 3.365/1941.

Vejamos a redação do dispositivo:

Art. 15-A do DL 3665: “No caso de imissão prévia na posse, na desapropriação


por necessidade ou utilidade pública e interesse social, inclusive para fins de
reforma agrária, havendo divergência entre o preço ofertado em juízo e o valor
do bem, fixado na sentença, expressos em termos reais, incidirão juros
compensatórios de até seis por cento ao ano sobre o valor da diferença
eventualmente apurada, a contar da imissão na posse, vedado o cálculo de
juros compostos. (Incluído pela MP 2.183-56, de 2001)”

Assim, o Plenário do STF reconheceu a constitucionalidade do percentual de juros


compensatórios de 6% ao ano para remuneração do proprietário pela imissão provisória
do ente público na posse de seu bem.

Com essa decisão estão superadas as Súmulas 618 do STF e 408 do STJ:

Súmula 618-STF: Na desapropriação, direta ou indireta, a taxa dos juros


compensatórios é de 12% (doze por cento) ao ano.

Súmula 408-STJ: Nas ações de desapropriação, os juros compensatórios


incidentes após a Medida Provisória 1.577 de 11/06/1997 devem ser fixados em
6% ao ano até 13/09/2001 e a partir de então, em 12% ao ano, na forma da
Súmula 618 do Supremo Tribunal Federal.

Período aproximado Taxa de juros Fundamento


compensatórios
De 1941 até 1963 Não havia Ausência de previsão no
DL
De 1963 até 1984 6% ao ano (0,5% ao mês) Súmula 164-STF e CC-1916
De 1984 até 10/06/97 12% (1% ao mês) Súmula 618-STF
De 11/06/1997 a 6% (0,5% ao mês) MP 1.577/97 reeditada
13/09/2001 sucessivas vezes até a MP
2.183-56.

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Emerj CPIII-A Direito Administrativo

De 14/09/2001 a 12% (1% ao mês) Decisão liminar na ADI


28/05/2018 2332 e Súmula 408-STJ
A partir de 28/05/2018* 6% (0,5% ao mês) Decisão final na ADI 2332
e art. 15-A do DL
3.365/41

* considerando que haja modulação dos efeitos e que a decisão final na ADI 2332 não
tenha efeitos ex tunc.

 PERCENTUAL DE JUROS COMPENSATÓRIOS:

O STF declarou inconstitucional o vocábulo “até” utilizado no art. 15-A do DL


3.365/1941:

Art. 15-A do DL 3365: No caso de imissão prévia na posse, na desapropriação


por necessidade ou utilidade pública e interesse social, inclusive para fins de
reforma agrária, havendo divergência entre o preço ofertado em juízo e o valor
do bem, fixado na sentença, expressos em termos reais, incidirão juros
compensatórios de ATÉ seis por cento ao ano sobre o valor da diferença
eventualmente apurada, a contar da imissão na posse, vedado o cálculo de
juros compostos. (Incluído pela MP 2.183-56, de 2001)

A utilização do termo “até” para a fixação da taxa de juros a ser aplicada nos casos de
imissão provisória na posse cria insegurança jurídica e institui regime de
discricionariedade injustificado. Isso porque não faz sentido a taxa de juros ser variável
sem qualquer justificativa lógica. Isso viola a determinação do texto constitucional de
que o expropriado deverá receber justa indenização.

Qual a base de cálculo dos juros compensatórios?

O STF decidiu interpretar conforme a CF o caput do art. 15-A do DL 3.365/41 de modo


a entender que a base de cálculo dos juros compensatórios será a diferença
eventualmente apurada entre 80% do preço ofertado em juízo e o valor do bem fixado
na sentença. Isso para que não se reste vulnerado o princípio constitucional do prévio
e justo preço.

Vejamos um exemplo para entender melhor o tema:

O Estado ajuizou ação de desapropriação contra João oferecendo R$ 100 mil pelo
imóvel. O art. 33, § 2º do DL autoriza que o proprietário, mesmo que discorde do valor,
levante (saque) 80% da quantia oferecida, o que foi feito por João. O juiz deferiu a
imissão provisória na posse. Ao final, após a perícia, o juiz fixou em R$ 300 mil o valor
da indenização a ser paga ao proprietário (valor real do imóvel). Pela
interpretação literal do art. 15-A, os 6% de juros compensatórios deveriam incidir
sobre a diferença entre o valor fixado na sentença (300) e o preço ofertado em juízo
(100). Assim, os juros compensatórios seriam 5% de 200 (6% de 300-100).

149
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

O STF afirmou que deve ser dada uma interpretação conforme a esse dispositivo.
Assim, a taxa de juros (6%) deve incidir sobre a diferença entre o valor fixado na
sentença (300) e 80% do preço oferecido pelo Poder Público (em nosso exemplo, 80%
de 100 = 80). Assim, segundo o STF, os juros compensatórios seriam 6% de 220 (6% de
300-80).

Repare que a determinação do STF protege o proprietário do bem desapropriado e tem


por base o seguinte raciocínio: ora, o proprietário só poderá levantar 80% do preço
oferecido. É esse valor que ele ficará consigo antes de o processo terminar. Logo, se a
sentença afirma que o bem vale mais que isso, significa que ele (proprietário) ficou
durante todo o processo injustamente privado dessa quantia. Dessa forma, os juros
compensatórios devem incidir sobre essa diferença.

 CONSTITUCIONALIDADE DOS §§ 1º E 2º DO ART. 15-A DO DL 3.365/41:

Os §§ 1º e 2º do art. 15-A do DL 3.365/41 preveem o seguinte:

Art. 15-A (...)


§ 1 - Os juros compensatórios destinam-se, apenas, a compensar a perda de
renda comprovadamente sofrida pelo proprietário. (Incluído pela MP 2.183-56,
de 2001)
§ 2 - Não serão devidos juros compensatórios quando o imóvel possuir graus de
utilização da terra e de eficiência na exploração iguais a zero. (Incluído pela
MP 2.183-56, de 2001)”

Ao apreciar a medida liminar, em 2001, o STF havia considerado que esses dispositivos
seriam inconstitucionais. O argumento utilizado, na época, foi o de que os juros
compensatórios seriam devidos mesmo que o imóvel não gerasse renda. Isso porque o
proprietário estaria sendo indenizado por ter ficado sem seu bem.

Agora, em 2018, ao apreciar o mérito da ação, o STF mudou de entendimento e decidiu


que os §§ 1º e 2º do art. 15-A do DL 3.365/41 são CONSTITUCIONAIS.

Prevaleceu o voto do Min. Alexandre de Moraes, que afirmou que tais dispositivos não
violam o direito de propriedade nem vulneram o caráter justo da indenização. Isso
porque é correto dizer que os juros compensatórios destinam-se a compensar tão
somente a perda de renda comprovadamente sofrida pelo proprietário.

A perda da propriedade é compensada pelo valor principal, pela correção monetária e


pelos juros moratórios.

Em suma, os juros compensatórios não têm a função de indenizar o valor da


propriedade em si, senão o de compensar a perda da renda decorrente da privação da
posse e da exploração econômica do bem entre a data da imissão na posse pelo poder

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Emerj CPIII-A Direito Administrativo

público e transferência compulsória ao patrimônio público, que ocorre com o


pagamento do preço fixado na sentença.

Diante do decidido na ADI 2332, quais os requisitos para o pagamento dos juros
compensatórios?

O pagamento aos juros compensatórios pelo Poder Público fica condicionado aos
seguintes requisitos:

a) Ter ocorrido imissão provisória na posse do imóvel;


b) A comprovação pelo proprietário da perda da renda sofrida pela privação da posse;
c) O imóvel possuir graus de utilização da terra e de eficiência na exploração superiores
a zero.

 INCONSTITUCIONALIDADE DO § 4º DO ART. 15-A DO DL 3.365/41:

O § 4º do art. 15-A do DL 3.365/41 possui a seguinte redação:

Art. 15-A (...)


§ 3º O disposto no caput deste artigo aplica-se também às ações ordinárias de
indenização por apossamento administrativo ou desapropriação indireta, bem
assim às ações que visem a indenização por restrições decorrentes de atos do
Poder Público, em especial aqueles destinados à proteção ambiental, incidindo
os juros sobre o valor fixado na sentença. (Incluído pela MP 2.183-56, de 2001)
§ 4º Nas ações referidas no § 3º, não será o Poder Público onerado por juros
compensatórios relativos a período anterior à aquisição da propriedade ou
posse titulada pelo autor da ação. (Incluído pela MP 2.183-56, de 2001)

O § 3º trata das seguintes ações:

1. Ações ordinárias de indenização por apossamento administrativo ou


desapropriação indireta;
2. Ações que visem a indenização por restrições decorrentes de atos do Poder
Público, em especial aqueles destinados à proteção ambiental.

Esse § 3º é constitucional porque tais ações devem receber o mesmo tratamento da


desapropriação no que tange aos juros. Assim, se o Poder Público realizar o
apossamento administrativo, sem acordo administrativo ou processo judicial, os juros
compensatórios são devidos, com as mesmas condicionantes dos §§1º e 2º, a contar da
data do esbulho (imissão na posse).

Por outro lado, o STF entendeu que o § 4º é INCONSTITUCIONAL. Isso porque ele exclui
indevidamente o direito aos juros compensatórios, violando a exigência constitucional
de justa indenização (art. 5º, XXIV) e o direito fundamental de propriedade (art. 5º,

151
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

XXII). Como já dito, tais ações devem receber o mesmo tratamento da desapropriação
no que tange aos juros.

Questão de Concurso: 😊😊😊


A prova do TRF4 considerou correta a seguinte alternativa: “Os juros compensatórios
visam a ressarcir o proprietário expropriado do que deixou de lucrar com a cessação
da exploração do imóvel, sendo incabíveis em se tratando de terras improdutivas
desapropriadas por interesse social para fins de reforma agrária.”

Incidem juros compensatórios se a indenização fixada na sentença for igual ao valor


ofertado inicialmente pela Adm. Pública?

SIM!!! Conforme orientação do STJ ainda que a indenização fixada seja igual ao valor
ofertado, incidem juros compensatórios sobre o montante indisposnível ao expropriado
(20%).

Incidem juros compensatórios em imóveis improdutivos?

Sim!!! A jurisprudência se firmou no sentido de que “a eventual improdutividade do


imóvel não afasta o direito aos juros compensatórios, pois esses restituem não só o que
o expropriado deixou de ganhar com a perda antecipada, mas também a expectativa
de renda, considerando a possibilidade do imóvel ser aproveitado a qualquer momento
de forma racional e adequada, ou até de ser vendido com o recebimento do seu valor
à vista (Resp 1.116.364).

 JUROS MORATÓRIOS:

Os juros moratórios são devidos em função do atraso no pagamento.

Como seu fundamento é distinto dos juros compensatórios, os dois podem ser cobrados
cumulativamente.

Súmula 12 do STJ: “Em desapropriação, são cumuláveis juros compensatórios e


moratórios.”

Qual o termo inicial dos juros moratórios?

O termo inicial dos juros moratórios em casos de desapropriação irá variar:

 Ações de desapropriação propostas por Pessoas Jurídicas de Direito Público: o


art. 15-B do DL 3365/41 prevê que os juros moratórios serão devidos a partir
de 1º de janeiro do exercício seguinte àquele em que o precatório deveria ter
sido pago.

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Emerj CPIII-A Direito Administrativo

Exemplo 1: Se apresentado até 1º/7/2015, deverá ser pago até 31/12/2016,


correndo juros moratórios a partir de 1º/1/2017;

Exemplo 2: Se apresentado depois de 1º/07/2015, deverá ser pago até


31/12/2017, correndo juros moratórios a partir de 1º/1/2018).

 Ações de desapropriação propostas por Pessoas de Direito Privado: nem todo


mundo que á autor na ação de desapropriação irá pagar por precatório, na
medida em que o autor da ação de desapropriação pode ser uma
concessionária, um particular. Nesses casos, aplica-se a Súmula 70 do STJ, que
basicamente prevê que os juros moratórios serão contados do trânsito em
julgado. Se o valor da indenização for inferior a 60 SM, também não haverá
precatório, mas RPV, pelo que também não se aplica o art. 15-B do DL 3365/41
e sim a Súmula 70 do STJ.

Súmula 70 do STJ: “Os juros moratórios, na desapropriação direta ou indireta,


contam-se desde o trânsito em julgado da sentença”.
Se for desapropriação indireta há quem entenda que seria a partir do trânsito em
julgado.

Qual o percentual dos juros moratórios?

A lei previu que os juros moratórios serão de até 6% ao ano (art. 15-B, DL 3365/41).

Celso Antonio defende que o art. 15-B não definiu o percentual de juros moratórios,
uma vez que estabeleceu DE ATÉ 6% ao ano. Se não definiu, incide a regra do art. 406
do CC: parcela da doutrina entende que os juros serão de 1% ao mês, na forma do art.
161, par. 1 do CTN; e para outra parte da doutrina, os juros devem ser calculados com
base na taxa Selic. Ocorre que a taxa Selic já embute no seu cálculo a correção
monetária, pelo que não poderá ser incluída novamente. Essa última opinião tem
prevalecido.

 CORREÇÃO MONETÁRIA:

Deve ser incluída levando-se em conta a data da avaliação (laudo de avaliação). Não é
cabível a utilização da TR para recomposição monetária.

Assim, a correção monetária passará a incidir desde a data do laudo definitivo de


avaliação.

 HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS:

O § 1º do art. 27 do DL 3.365/41 previu a seguinte regra envolvendo honorários


advocatícios na desapropriação:

153
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

Art. 27 do DL 3365: “(...)


§ 1º A sentença que fixar o valor da indenização quando este for superior ao preço
oferecido condenará o desapropriante a pagar honorários do advogado, que serão
fixados entre meio e cinco por cento do valor da diferença, observado o disposto
no § 4º do art. 20 do Código de Processo Civil, não podendo os honorários
ultrapassar R$ 151.000,00 (cento e cinquenta e um mil reais). (Redação dada MP
2.183-56, de 2001) Obs: a referência é ainda ao CPC/1973.”

Dessa forma, o § 1º do art. 27 prevê a condenação do ente desapropriante em um


percentual de honorários que varia de 0,5% a 5%, sobre a diferença do valor oferecido
pelo Poder Público e aquele estabelecido na sentença da ação de desapropriação.

O STF afirmou que é constitucional essa previsão de parâmetros mínimo (0,5%) e


máximo (5%) para a concessão de honorários advocatícios. Nas ações de desapropriação
direta ou indireta, embora a Fazenda Pública seja parte no processo, não terá
aplicação o escalonamento previsto art. 85, §6º, do CPC no que tange aos honorários
advocatícios. Vale a regra da especialidade, cabendo ao juiz fixar nessas ações
honorários no percentual entre 0,5% e 5%.

Por outro lado, o STF considerou que é inconstitucional a expressão “não podendo os
honorários ultrapassar R$ 151.000,00 (cento e cinquenta e um mil reais)”. Isso porque
limitar os honorários em um determinado valor fixo (que não seja um percentual) viola
o princípio da proporcionalidade e acaba refletindo no justo preço da indenização que
o expropriado deve receber (art. 5º, XXIV, da CF/88). Influencia no preço da
indenização porque se o advogado do expropriado não for remunerado corretamente
pelo ente expropriante, ele acabará exigindo essa diferença do seu cliente, reduzindo
o valor que o expropriado teria para receber.

Desse modo, com base na decisão do STF, o art. 27, § 1º deve ser lido agora assim: “A
sentença que fixar o valor da indenização quando este for superior ao preço oferecido
condenará o desapropriante a pagar honorários do advogado, que serão fixados entre
meio e cinco por cento do valor da diferença.”

RESUMÃO!!!!
Em relação ao “caput” do art. 15-A do DL 3.365/41:
 Reconheceu a constitucionalidade do percentual de juros compensatórios no
patamar fixo de 6% ao ano para remuneração do proprietário pela imissão
provisória do ente público na posse de seu bem;
 Declarou a inconstitucionalidade do vocábulo “até”;
 Deu interpretação conforme a Constituição ao “caput” do art. 15-A, de
maneira a incidir juros compensatórios sobre a diferença entre 80% do preço
ofertado em juízo pelo ente público e o valor do bem fixado na sentença;
 Declarou a constitucionalidade do § 1º do art. 15-A, que condiciona o
pagamento dos juros compensatórios à comprovação da “perda da renda
comprovadamente sofrida pelo proprietário”;

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Emerj CPIII-A Direito Administrativo

 Declarou a constitucionalidade do § 2º do art. 15-A, afastando o pagamento


de juros compensatórios quando o imóvel possuir graus de utilização da terra
e de eficiência iguais a zero;
 Declarou a constitucionalidade do § 3º do art. 15-A, estendendo as regras e
restrições de pagamento dos juros compensatórios à desapropriação indireta.
 Declarou a inconstitucionalidade do § 4º do art. 15-A;
 Declarou a constitucionalidade da estipulação de parâmetros mínimo (0,5%)
e máximo (5%) para a concessão de honorários advocatícios e a
inconstitucionalidade da expressão “não podendo os honorários ultrapassar
R$ 151.000,00 (cento e cinquenta e um mil reais)” prevista no § 1º do art.
27.

 DIREITO DE TERCEIROS:

O artigo 26 do DL 3365/41 estabelece que no valor da indenização que será paga não
se incluirão direitos de terceiros contra o expropriado.

Pode o locatário de um imóvel que está sendo desapropriado participar da ação de


desapropriação de forma a pleitear eventual indenização?

Não!! Eventual direito de terceiros terá que ser resolvido em ação própria, em ação
indenizatória, não cabe esse tipo de intervenção.

O locatário pode ter direito de indenização, só que essa indenização nao será apurada
na ação de desapropriação.

E se incidir sobre o bem desapropriado uma hipoteca? Como fica o direito do credor
hipotecário?

O credor hipotecário passa a ter como garantia o valor da desapropriação, se subroga


no valor da indenização. Isso porque a desapropriação é forma de aquisição originária
da propriedade, ou seja, o Ente recebe o imóvel objeto da desapropriação livre e
desembaraçado de qualquer ônus.

 PARCELA DO BEM E BENFEITORIAS:

Em relação às benfeitorias, o juiz deve observar a Súmula 23 do STF, bem como o art.
26, §1º, do DL 3365/41. A declaração de utilidade pública não gera a transferência da
propriedade, mas um de seus efeitos é o de fixar o estado do bem.

Em regra, o desapropriante pagará o valor do bem à época da declaração, incluindo as


benfeitorias necessárias, úteis e voluptuárias preexistentes.

155
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

O proprietário pode até fazer obras após a declaração, mas, de acordo com a Súmula
23 do STF, as benfeitorias incluídas após a declaração não serão indenizadas:

Súmula 23 do STF: “Verificados os pressupostos legais para o licenciamento da


obra, não o impede a declaração de utilidade pública para desapropriação do
imóvel, mas o valor da obra não se incluirá na indenização, quando a
desapropriação for efetivada.”

Contudo, essa Súmula deve ser lida em conjunto com o art. 26, §1º, do DL 3365/41:

Art. 26, § 1 do DL 3365: “Serão atendidas as benfeitorias necessárias feitas após a


desapropriação; as úteis, quando feitas com autorização do expropriante.”

Portanto, após a declaração, só serão indenizadas as benfeitorias necessárias ou as


úteis que tenham sido autorizadas.

 DESAPROPRIAÇÃO DE TERRENOS DE MARINHA:

Em casos de terreno de marinha, o que pode ser desapropriado é o domínio útil do


terreno de marinha e não o terreno de marinha em si, pois é bem da União.

O art. 103, §2º, do DL 9760/46 prevê que a União poderá consolidar nas suas mãos o
domínio pleno do terreno de marinha concedido em regime de aforamento. Para tanto,
deverá pagar ao titular do domínio útil o valor do domínio pleno menos 17% do valor
do bem (corresponde ao valor do domínio direto). Logo, o titular do domínio útil tem
direito de receber em uma ação de desapropriação 83% do valor do domínio pleno.

 DESAPROPRIAÇÃO DE BENS SUBMETIDOS À ENFITEUSE:

Em casos de bem submetidos ao regime da enfiteuse (anterior ao CC/02), existe a


figura do enfiteuta (possuidor direto e titular do domínio útil) e a figura do senhorio
direto (possuidor indireto e titular do domínio direto).

O CC/16 previa que o resgate da enfiteuse nas mãos do enfiteuta poderia ocorrer caso
o enfiteuta pagasse ao senhorio 10 foros anuais e 1 laudêmio (2,5% do valor da
propriedade).

Portanto, em caso de desapropriação de bem enfitêutico, o senhorio terá direito a


receber o correspondente a 10 foros anuais e 1 laudêmio e o enfiteuta terá direito a
receber o valor do bem menos 10 foros anuais e 1 laudêmio.

 DESAPROPRIAÇÃO DE FUNDO DE COMÉRCIO:

Entende-se por fundo de comércio o conjunto de bens materiais ou imateriais


destinados a viabilizar a atividade empresária.

156
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

Se o desapropriante causar algum prejuízo ao titular do fundo de comércio, ele deverá


indenizar o titular do fundo de comércio pelo prejuízo sofrido. Pode ser que este titular
seja o proprietário do imóvel, mas o comum é que a atividade seja explorada por um
terceiro, razão pela qual o titular do fundo de comércio não costuma ser o titular do
imóvel.

Se for o mesmo, o desapropriante deverá incluir na indenização o montante devido


pela perda do imóvel e do fundo de comércio.

Se for um terceiro, não se discute direito de terceiro em ação de desapropriação (art.


26, caput, do DL 3365/41). Ele terá direito à indenização pelo prejuízo sofrido,
podendo ajuizar ação de desapropriação indireta.

 DESAPROPRIAÇÃO DE JAZIDAS:

Tratando-se de desapropriação por utilidade pública, não cabe indenização por jazidas
de minério existentes no subsolo do imóvel, salvo se a autorização de lavra já houver
sido concedida, já que o título de concessão de lavra é um bem suscetível de
apreciação econômica, não o sendo a lavra em si, que é um bem de domínio da União.

Com esse entendimento, a Turma deu provimento a recurso extraordinário para


reformar acórdão do TRF da 4ª Região que considerara indenizáveis jazidas minerais,
mesmo sem a existência da concessão da lavra, se o expropriado estivesse em efetiva
exploração. Segundo o STF, não cabe indenizar aquele que explora irregularmente a
jazida. Precedentes citados: RE 70.132-SP (RTJ 54/500); RE 189.964-SP (DJU de
21.6.96) e RE (AgRg) 140.254-SP (DJU de 6.6.97).

A jazida é de propriedade da União, cf. art. 20, IX, da CF, portanto, não é possível
falar em desapropriação de jazida.

 DESAPROPRIAÇÃO DE COBERTURA VEGETAL:

Desapropriação de cobertura vegetal. Em regra, o desapropriante terá que indenizar o


valor do imóvel e o valor da cobertura vegetal. Pode acontecer, contudo, de a
cobertura vegetal se referir a uma área insuscetível de ser explorada economicamente
(ex. proteção ambiental, parque ecológico, mata nativa etc.).

Nesse caso, o STJ tem uma posição reiterada no sentido de que a cobertura vegetal só
pode ser indenizada de forma isolada em relação à terra nua na hipótese de poder ser
explorada economicamente. Se ela não puder ser explorada economicamente, ela não
será indenizada, diferentemente da terra nua (que será sempre indenizada).

 EXTENSÃO DO CONTROLE JURISDICIONAL NAS AÇÕES DE DESAPROPRIAÇÃO:

157
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

Em regra, o mérito da escolha administrativa quanto a desapropriação não pode ser


objeto de controle do Judiciário.

Contudo, em ação própria (que não seja a ação de desapropriação), o juiz pode analisar
o mérito quando houver desvio de finalidade (Prefeito que desapropria área do
inimigo). Verifica-se, pois, que essas questões não podem ser discutidas na ação de
desapropriação, mas em uma ação própria isso pode ser discutido. Juridicamente, seria
possivel também uma ação popular para anular uma desapropriação.

Assim, o controle judicial é possível, mas somente se a medida for desproporcional,


desarrazoada. Portanto, é possível submeter ao controle do Poder Judiciário a
legalidade de desapropriações. E essas ações podem ser propostas pelo proprietário,
por qualquer cidadão (ação popular), pelo MP ou pelo legitimado em caso de ação civil
pública.

Quais os recursos cabíveis em uma ação de desapropriação?

Os mesmos recursos que são cabíveis em uma ação normal. O art. 28 do DL estabelece
que da sentença que fixar o preço da indenização caberá apelação. A matéria do
reexame necessário está prevista no art. 28, par. 1 do DL 3365.

Casos Concretos:

Questão 1)

O Município Imaginário, em janeiro de 2012, ajuizou ação de desapropriação por


utilidade pública, com pedido de imissão na posse do imóvel de certo imóvel. Para
isso efetuou o depósito do valor de R$100.000,00 (cem mil reais). A imissão na posse
foi deferida em agosto de 2012 e o réu promoveu o levantamento do percentual
máximo autorizado pela lei. Em maio de 2015, a ação de desapropriação foi
definitivamente julgada. O magistrado acolheu o valor apontado no laudo pericial
e fixou o respectivo quantum em R$95.000,00 (noventa e cinco mil reais), acrescido
de juros moratórios de 1% ao mês, a contar do trânsito em julgado da sentença e
justificou a ausência de fixação de juros compensatórios, em decorrência da
inexistência de diferença em favor do expropriado. Diante dessa situação
hipotética, enfrente se a fixação dos juros na sentença, se deu em consonância com
a orientação do C. STJ.

Resposta:

Os juros compensatorios incidem sobre 15 mil, ou seja a diferença entre o valor final
fixado na sentença e o valor levantado no depósito, observado o percentual de 12%,
até maio de 2018 e a partir de então o percentual de 6% (art. 15-A e ADI 2332)

158
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

Os juros moratórios de 6% ao ano devem incidir a partir de janeiro do ano seguinte ao


que deveria ter sido pago o precatório, na forma do art. 15-B do DL 3365.

Questão 2)

Após os trâmites administrativos cabíveis, a concessionária X, devidamente


habilitada, ajuizou ação de desapropriação por utilidade pública do imóvel de
Afrânio, certo que o Juízo de 1º grau, na sentença, fixou o montante indenizatório
superior ao inicialmente ofertado em consonância com os valores alcançados pela
perícia e determinou a incidência de juros compensatórios de 12% ao ano sobre a
diferença entre o valor inicialmente ofertado e aquele determinado na sentença, a
contar da imissão na posse, ocorrida em 10/10/2013, e, ainda, juros moratórios, de
6%, na forma do art. 15-B, do DL 3365/41. Por fim, condenou a concessionária ao
pagamento de honorários de advogado, fixados em 5% sobre o valor da condenação,
compreendendo os juros e a correção monetária. Considerando que o imóvel em
questão constitui área de preservação permanente, que não é passível de qualquer
exploração econômica, enfrente eventuais acertos ou equívocos da decisão, à luz da
orientação do STJ.

Resposta:

Em relação ao juros compensatórios, errou o juiz ao concedê-los uma vez que a


jurisprudência consolidou o entendimento de que NÃO são devidos juros
compensatórios quando a propriedade se mostrar impassível de qualquer espécie de
exploração econômica seja atual ou futura, em decorrência de limitações legais ou da
situação geográfica ou topográfica do local onde se situa a propriedade.

Em relação aos juros moratórios, errou o juiz ao adotar a regra do art. 15-B do DL 3365
que se aplica às PJs de Direito Público (regime de precatório). No caso em tela, trata-
se de pessoa jurídica de direito privado (concessionárias de serviços públicos), logo, as
condenações de quantia certa a PJs de direito privado não estão sujeitas ao regime de
precatório previsto no art. 100 da CF. Aplica-se, portanto, no caso de pessoas juridicas
de direito privado a súmula 70 do STJ, em que o termo a quo dos juros moratórios
começa a correr desde o transito em julgado da sentença.

Súmula 70 do STJ: “Os juros moratórios, na desapropriação direta ou indireta,


contam-se desde o trânsito em julgado da sentença”.

Em relação aos honorários advocatícios, também errou o juiz ao fixar em 5% sobre o


valor da condenação. O valor de 5% deve incidir sobre a diferença entre o valor
oferecido e valor fixado na sentença, na forma do art. 27, par. 1 do DL 3365/41.

Questão 3)

159
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

Ao julgar apelação em ação de desapropriação por utilidade pública ajuizada pelo


Estado X, o Tribunal entendeu que o valor a ser pago deveria corresponder àquele
que o imóvel valia ao tempo da imissão na posse e não no momento em que realizada
a avaliação pericial, no curso do processo, considerando-se, inclusive, que houve
valorização imobiliária e que este último montante se revelou superior. Além disso,
o colegiado consignou no acórdão que o pagamento dos valores devidos pelo ente
federativo deveriam seguir o rito determinado para o cumprimento definitivo de
sentença de condenação em pagamento de quantia certa, na medida em que o art.
5º, XXIV, da CRFB/88, estabelece a justa e prévia indenização em dinheiro. Analise
se a decisão da Corte de origem está em consonância com a orientação dos Tribunais
Superiores, mediante apontamento da base legal pertinente.

Resposta:

O justo valor da indenização é contemporâneo ao momento da avaliação judicial,


tendo em vista que o laudo se reportou ao preço de mercado à época em que
confeccionado, na forma do previsto no art. 26 do DL 3665. Vide REsp 1400296.

O cumprimento de sentença condenatória ao pagamento de quantia certa previsto no


art. 523 do CPC NÃO é aplicável à hipótese, diante do exposto no art. 910 do CPC, em
razão da submissão ao regime de precatório.

Em relação ao rito do pagamento errou juiz, uma vez que a execução será por
precatório, na forma do art. 15-B do DL 3365. REsp 1197306.

160
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

Aula 10 – Prof. Cláudio Brandão


11/10/18

EMENTA:  Desapropriação Indireta.


 Direito de extensão.
 Tredestinação.
 Retrocessão.
 Direito de preferência.

Daremos continuidade na aula de hoje ao estudo do tema da desapropriação.

 DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA:

A desapropriação indireta é desapropriação que NÃO observa o devido processo legal.

Exemplo: O Estado, sem um processo regular de desapropriação, se ocupa de um bem


imóvel de um particular e dá a esse bem uma destinação pública perene, ou seja, o
particular não vai em hipótese alguma conseguir recuperar aquele bem, logo o
particular terá que buscar uma indenização. Indiretamente houve uma desapropriação
e, portanto, a indenização deverá ser a mais ampla possível.

Ela resulta de um esbulho possessório praticado pela Administração Pública.

Qual a base legal da desapropriação indireta no nosso ordenamento jurídico?

A desapropriação indireta encontra-se prevista nos arts. 15-A, §3º e 35 do DL 3365/41.

Quem pode ajuizar ação indenização em face de desapropriação indireta?

Quem ajuiza a ação de desapropriação indireta é próprio particular e não o Poder


Público como no caso da desapropriação. O interessado pode ser o possuidor do imóvel,
não precisa ser necessariamente o proprietário. Há o reconhecimento de que
determinadas posses poderiam ser objeto de desapropriação indireta.

Trata-se de ação indenizatória em face do Poder Público, com fundamento na retirada


substancial dos poderes inerentes da propriedade privada.

OBS: O professor mencionou que entende que a desapropriação indireta, o esbulho por
parte da Administração Pública, é caso de IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. Ele
mencionou que como desembargador, se pegasse um caso de desapropriação indireta,
mandaria oficiar o MP para verificar a hipótese de improbidade administrativa e entrar
com a ação cabível, se for o caso.

161
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

É cabível ação possessória em face do Estado quando configurado o esbulho


possessório?

Cabe reintegração de posse contra o Estado sim, mas desde que o Estado ainda não
tenha dado destinação pública ao bem. O que vai inviabilizar a reintegração é a
destinação pública.

Assim, a doutrina, de modo geral, entende que se a Adm. Pública já começou a obra,
já colocou os tapumes, isso já é suficiente para caracterizar a destinação pública pois
tem-se uma manifestação inequívoca, isso por si só já caracterizaria essa destinação
pública, o que impediria o particular de reivindicar o bem, na forma do art. 35 do DL
3365.

Qual a diferença entre apossamento administrativo e desapropriação indireta?

O APOSSAMENTO ADMINISTRATIVO é o fato administrativo pelo qual o Poder Público


assume a posse efetiva de determinado bem.

Guarda semelhança com a desapropriação Indireta, mas, enquanto esta atinge o direito
do proprietário, acarretando a perda direta do próprio domínio em virtude da ocupação
do bem pelo Estado, no apossamento administrativo a ação estatal investe mais
diretamente contra o indivíduo que tem a posse sobre determinado bem, geralmente
imóvel.

Por esse motivo, somente se consuma o apossamento quando o possuidor não teve
como evitar a turbação e o esbulho através dos mecanismos de proteção possessória,
como examinamos anteriormente.

Essa forma de ação estatal tem o mesmo caráter de definitividade da desapropriação


indireta, já que o Poder Público, ao assumir a posse, deverá utilizar o bem objeto do
apossamento com permanência, isto é, a atividade administrativa exercida sobre o
bem, necessariamente inspirada por fim de interesse público, deve caracterizar-se
como contínua e duradoura. Havendo desvio de poder, é cabível a pretensão de
desalojamento do poder estatal, eis que se afigura inconcebível perante o direito a
legitimação de atividade plasmada em objetivo que retrate violação aos princípios
constitucionais da moralidade e da impessoalidade.

O apossamento administrativo pode implicar, simultaneamente, a desapropriação


indireta do bem: nesse caso, haverá a perda da propriedade juntamente com a da
posse, sejam os mesmos ou diversos os titulares dos respectivos direitos. Poderá,
contudo, ocorrer, embora mais raramente, apenas o apossamento sem a perda da
propriedade.

162
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

O efeito do apossamento administrativo é idêntico ao da desapropriação indireta:


consumado o fato, o titular da posse faz jus à Indenização correspondente à perda de
seu direito.

Aliás, o STJ já decidiu que o possuidor mesmo sem titularidade do domínio, tem
legitimidade ad causam para postular a indenização do seu patrimônio pelo
apossamento administrativo ilícito.

A doutrina costuma criticar a redação do art. 15-A, pois coloca o apossamento


administrativo e a desapropriação indireta como se fossem sinônimos, enquanto o
apossamento administrativo é causa e a desapropriação indireta é efeito.

Se o Poder Público se apossa de um bem sem proceder às formalidades legais da


desapropriação (tem-se o apossamento administrativo), sendo o bem incorporado ao
domínio público, há a chamada desapropriação indireta, pois a situação se torna
irreversível, resolvendo-se em perdas e danos (direito pessoal).

Portanto, o proprietário do bem só pode manejar as demandas petitórias


(reivindicatória) e possessórias (reintegração/manutenção/interdito) antes da
irreversibilidade fática da situação. Tecnicamente não é desapropriação, pois,
enquanto esta tem caráter formal, a “desapropriação indireta” é completamente
informal.

Qual o prazo prescricional para as ações indenizatórias com fundamento na


desapropriação indireta?

O STJ entendeu que o prazo de prescrição para a propositura de ação indenizatória


com fundamento na desapropriação indireta é de 10 anos.

A doutrina majoritária entende que o termo inicial da prescrição corre a partir do


esbulho. O professor, contudo, entende que a prescrição corre a partir do
conhecimento do esbulho pela parte.

REsp 1300442: “O STJ entendia pela prescrição vintenária da ação de


desapropriação indireta (Súmula 119). Contudo, com o advento do CC/02, o STJ
atualizou seu entendimento para entender que o prazo prescricional desta ação é
de 10 anos, nos termos do art. 1.238, p.ú, do CC. A ação é pessoal, com um prazo
de uma ação real (caráter híbrido). O fundamento foi o de que, como o
proprietário não pode se valer de uma ação reivindicatória, no mínimo deve lhe
ser conferido o prazo prescricional dela.”

Como fica a questão dos juros moratórios na desapropriação indireta?

163
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

A jurisprudência é firme no sentido de que os juros compensatórios deverão fluir a


partir do esbulho, contudo, os juros compensatórios deverão incidir sobre o valor total
da indenização e não somente sobre a diferença como no caso da desapropriação
direta.

Súmula 114 do STJ: “Os juros compensatórios, na desapropriação indireta, incidem


a partir da ocupação, calculados sobre o valor da indenização, corrigido
monetariamente.”

O STF considerou constitucional a redução dos juros compensatórios para 6% ao ano na


ação de desapropriação normal. O STF ainda nao se posicionou sobre os juros
compensatórios no caso de desapropriação indireta.

Existe hipótese de desapropriação indireta decorrente de ato lícito do Poder


Público?

A desapropriação indireta também pode ser resultante de um ato lícito da


Administração Pública que retirar de forma significativa o conteúdo econômico de uma
propriedade (questão nova e não pacífica na doutrina e jurisprudência).

Exemplo 1: Poder Público por meio de um ato lícito (criou área de reserva ambiental
na propriedade) que retirou o conteúdo econômico da propriedade.

Parte da doutrina fundamenta essa hipótese como desapropriação indireta, sendo


cabível, portanto, indenização. Isso porque o direito de propriedade não está previsto
apenas no art. 5 da CF, mas também no art. 170 da CF, que trata da Ordem Econômica.

Assim, se esvaziar o conteúdo econômico da propriedade, o particular poderá ser


indenizado.

Exemplo 2: limitação administrativa determina o fechamento da rua para passagem e


veículos, destinando-as a pedestres. Ainfa que lícita a intervenção estatal, ela gera
direito à indenização aos proprietários do posto de gasolina e do estacionamento
localizados na rua, em razão de desapropriação indireta.

Até mesmo o tombamento, se retirar o conteúdo econômico de um bem, poderá


ensejar uma desapropriação indireta.

O STJ, em suas decisões mais recentes, tem exigido o apossamento administrativo,


ou seja, o esbulho pelo Poder Público para que se configure a desapropriação
indireta. Se o esvaziamento do conteúdo econômico da propriedade decorre de
outro fator que não o apossamento administrativo (ex. uma norma ambiental
extremamente restritiva), não há desapropriação indireta (ex. nesse caso, haveria
limitação administrativa), embora haja direito à indenização pelos prejuízos
suportados. Isso tem reflexos importantes no que tange à prescrição, pois, enquanto

164
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

na limitação administrativa, o prazo prescricional é de 5 anos para pleitear a


indenização, na desapropriação indireta, o STJ entende que, por ter finalidade
pública, aplica-se o prazo prescricional de 10 anos da usucapião extraordinária.

 DIREITO DE EXTENSÃO:

Ocorre quando o proprietário é citado para uma desapropriação parcial, e alega que o
remanescente da propriedade perderá seu conteúdo econômico, e que, portanto, faz
jus ao direito de extensão, ou seja, o particular pede para desapropriar tudo e ser
indenizado pelo todo, sob pena de ficar com uma parte remanescente da propriedade
sem conteúdo economico.

O direito de extensão tem como fundamento maior a justa indenização.

Exemplo: O proprietário de um terreno enorme tem 70 por cento do terreno


desapropriado. Ocorre que se a parte remanescente for esvaziada em razão da
desapropriação, ou seja, a parte remanescente da propriedade deixa de ter conteúdo
econômico, logo deverá ser indenizada, passando a propriedade, na sua totalidade, a
ser detida pelo Poder Público.

Parte da doutrina sustenta que o direito de extensão tem que ser alegado pelo
proprietário na contestação, sob pena de preclusão. O professor entende que não é
correta essa ideia de preclusão, podendo a parte alegar o direito de extensão
posteriomente a contestação.

 TREDESTINAÇÃO:

A Tredestinção é o desvio de finalidade por parte do Poder Público que utiliza o bem
desapropriado para atender finalidade ilegítima. Atribui-se ao bem uma destinação
que não é pública.

Exemplo: O Poder Público desapropria o terreno para fazer uma escola; não constroi a
escola e acaba cedendo o terreno para um terceiro construir um bar lá.

Os Tribunais Superiores começaram a trabalhar com o conceito de tredestinação lícita,


para as hipóteses em que o Poder Público dá ao bem uma outra destinação, sendo essa
destinação pública.

Exemplo: O Poder Público desapropria o terreno para fazer uma escola; não constroi
a escola, mas constroi um hospital no lugar.

Tredestinação é alterar o destino da desapropriação. A desapropriação tem um motivo


predefinido. Se o bem expropriado é empregado em outra destinação, há a chamada
tredestinação (art. 35 do Dec. 3365/41 c/c art. 519 do CC).

165
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

Art. 519 do CC: “Se a coisa expropriada para fins de necessidade ou utilidade
pública, ou por interesse social, não tiver o destino para que se desapropriou, ou
não for utilizada em obras ou serviços públicos (tredestinação), caberá ao
expropriado direito de preferência, pelo preço atual da coisa (retrocessão).”

A doutrina brasileira, especialmente José dos Santos Carvalho Filho, subdividiu a


tredestinação em:

 TREDESTINAÇÃO LÍCITA: a motivação justificadora constante do decreto


expropriatório não foi observada, mas há fim público no resultado, ou seja, o
bem expropriado foi empregado em atividade de interesse público.
Ex. desapropriou para construir hospital e construiu escola. Nesse caso,
entende a doutrina que a tredestinação é lícita, não gerando retrocessão e nem
compensação por perdas e danos.

 TREDESTINAÇÃO ILÍCITA:

i. OMISSÃO: é quando o Poder Público apresenta uma justificativa para a


desapropriação, mas não emprega o bem expropriado em nenhuma finalidade.
O Decreto 3.365/41 não previu um prazo específico para a Administração
empregar o bem na finalidade mencionada no decreto.

Qual seria, então, o marco configurador dessa omissão?

Os Tribunais têm entendido que, após 5 anos, já se pode considerar a omissão


estatal, por força da prescrição quinquenal, prevista nos arts. 54 da Lei 9.784
e 1º do DL 20.910/41). O art. 10, p.ú, do Dec. 3365/41 fala que a
desapropriação tem que ser efetivada em 5 anos e, portanto, não se aplica à
hipótese. Configurada a omissão, poderia haver retrocessão.

ii. DESVIO DE FINALIDADE: é quando o Poder Público apresenta uma justificativa


de interesse público para a desapropriação, mas, na realidade, mascara a real
intenção de privilegiar um interesse privado. Nesse caso, poderia haver
retrocessão.

Registre-se que o Judiciário evita conceder a retrocessão em razão do art. 35


do Decreto 3.365/41 que afirma que, uma vez incorporado o bem expropriado
ao patrimônio público, não mais seria possível ao particular reavê-lo. Caberia,
então, compensação por perdas e danos. Há uma tendência moderna, contudo,
de se conceder a retrocessão, exceto quando já tenha sido dado ao bem
expropriado uma finalidade (afetação).

166
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

 RETROCESSÃO:

A retrocessão é direito de o expropriado exigir a devolução do bem desapropriado que


não foi utilizado pelo Poder Público para atender o interesse público.

A retrocessão é o direito de preferência que se estabelece em favor do expropriado


quando a Administração desistir de dar ao bem a destinação mencionada no ato
expropriatório. Direito que se estabelece em favor do expropriado.

Se a Administração desapropriou o bem, mas não lhe deu a destinação prevista no


decreto expropriatório, pode ela oferecer o bem de novo ao proprietário expropriado
para que este exerça a opção de comprá-lo.

O art. 519 do CC prevê o instituto da retrocessão, ou seja, a possibilidade de o


expropriado reaver o bem, desde que haja tredestinação ilícita (ou seja, um desvio de
finalidade em que não seja mais atendido o interesse público).

Qual a natureza jurídica da retrocessão?

Há divergência na doutrina acerca da natureza jurídica da retrocessão. Vejamos:

CORRENTE 1) Direito Pessoal. O expropriado pode pleitear indenização, mas não a


devolução do bem – fundamento art. 35 do DL 3665 e art. 519 do CC

CORRENTE 2) Direito Real. O expropriado pode exigir a devolução do bem


desapropriado que não foi utilizado para atender o interesse público, uma vez que o
art. 5, XXIV da CF apenas admite a desapropriação para atendimento de utilidade
pública, necessidade pública e interesse social, sendo inconstitucional a
desapropriação que nao satisfaz essas finalidades. *** Corrente adotada pelo STJ.

CORRENTE 3) Direito Misto. O expropriado pode optar por exigir a devoluçao do bem
ou pleitear as perdas e danos.

Qual o prazo prescricional para a propositura da ação de retrocessão?

O prazo prescricional irá variar conforme a natureza jurídica da retrocessã. Vejamos:

CORRENTE 1) Para a corrente que defende a natureza de direito real da retrocessão,


o prazo prescricional é de 10 anos, na forma do art. 205 do CC.

CORRENTE 2) Para a corrente que defende a natureza pessoal do direito, o prazo


prescricional para entrar com a ação de retrocessão é de 5 anos, na forma do art. 1 do
DL 20.910

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Emerj CPIII-A Direito Administrativo

REsp 943.604: “PROCESSUAL CIVIL. RAZOÁVEL INTERPRETAÇÃO CONFERIDA AO


ART. 35, DO DECRETO-LEI N.° 3.365/41. SÚMULA 343/STF. MATÉRIA
CONTROVERTIDA NOS TRIBUNAIS. RETROCESSÃO. DESVIO DE FINALIDADE PÚBLICA
DE BEM DESAPROPRIADO. INDENIZAÇÃO. PERDAS E DANOS. 1. Ação rescisória
proposta com fundamento na alegação de ser inadmissível o direito à retrocessão
de bem desapropriado e incorporado ao patrimônio público, ainda que não tenha
sido empregado com a finalidade que ensejou a sua desapropriação. 6. A matéria
in foco - retrocessão de bem desapropriado e incorporado ao patrimônio público -
tem sido objeto de divergência tanto na doutrina quanto na jurisprudência. 7. A
natureza jurídica da retrocessão tem recebida interpretação de três correntes
principais: aquela que entende ser a retrocessão um direito real em face do
direito constitucional de propriedade (CF, artigo 5º, XXII) que só poderá ser
contestado para fins de desapropriação por utilidade pública CF, artigo 5º, XXIV.
Uma outra, entende que o referido instituto é um direito pessoal de devolver o
bem ao expropriado, em face do disposto no artigo 35 da Lei 3.365/41, que diz
que os bens incorporados ao patrimônio público não são objeto de reivindicação,
devendo qualquer suposto direito do expropriado ser resolvido por perdas e
danos.?. Por derradeiro, temos os defensores da natureza mista da retrocessão
(real e pessoal) em que o expropriado poderá requerer a preempção ou, caso isso
seja inviável, a resolução em perdas e danos. (REsp 819.191/SP, Rel. Ministro
JOSÉ DELGADO, DJ 22/05/2006). 8. A Primeira Turma dessa Egrégia Corte já
firmou entendimento diverso acerca da matéria (REsp 623.511/RJ, Rel. Ministro
LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, DJ 06/06/2005; REsp 816.251/SP, Rel. Ministro
FRANCISCO FALCÃO, DJ 27/03/2006), o que revela a justeza da incidência da
Súmula 343/STF ao presente.”

O problema surge quando a Administração Pública não observa o direito de


preferência do expropriado e vende para um terceiro. Pode o expropriado anular
essa venda?

A matéria é objeto de divergência na doutrina, destacando-se as seguintes correntes:

CORRENTE 1) Há uma corrente que sustenta que a retrocessão gera para o expropriado
um vínculo pessoal, que ele somente poderia postular indenização por ter sido
preterido em relação ao direito de preferência. A parte tem que provar que sofreu um
prejuízo e que teria como arcar com a compra do imóvel.

CORRENTE 2) Há um corrente que sustenta que o vínculo é real e que, portanto, o


expropriado deveria propor uma ação de preempção porque foi preterido e tem um
vinculo real. O particular deverá depositar o valor do imóvel e pedir a anulação da
venda do imóvel.

CORRENTE 3) Há uma terceira posição (Maria Silvia Di Pietro) defendendo que os


efeitos são mistos, ou seja, o proprietário poderia optar entre pedir indenização ou
reivindicar o bem (por meio do depósito do valor).

168
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

Em que consiste a ADESTINAÇÃO?

A ADESTINAÇÃO ocorre quando o Poder Público não dá a destinação ao bem que previu
no ato expropriatório, ou seja, o Poder Público desapropria e não constroi nada no
terreno.

Tendo em vista que no DL 3365/41 não estabelece prazo para que a Administração dê
ao bem o destino mencionado no ato expropriatório surgiu discussão na doutrina sobre
o tema.

Em razão do acima exposto, alguns doutrinadores defendem que o prazo para a Adm.
Pública dar a destinação ao bem é, por anologia, o prazo de 5 anos (adotando-se o
prazo contra a Fazenda). O professor particularmente nao concorda com isso.

Prevalece na doutrina o entendimento de que a adestinação não gera retrocessão.

Casos Concretos:

Questão 1)

Olavo é proprietário de um bem que foi invadido pelo Município X, para a construção
de importante via pública na localidade, em fevereiro de 1990. Ocorre que, no
período em que aconteceu o apossamento pelo ente federativo em questão, Olavo
estava trabalhando fora do Brasil e só tomou conhecimento de tais fatos mais de 20
(vinte) anos após o ocorrido, em setembro de 2010. Inconformado, Olavo procurou
um advogado que verificou que o Município em questão, com vistas a regularizar o
ilícito cometido, fez editar um decreto expropriatório em 25 de julho de 1999, mas
não levou a efeito o respectivo pleito expropriatório, certo que somente em 14 de
maio de 2011 foi ajuizada a ação de desapropriação indireta, com vistas a obter a
indenização pela conduta do ente federativo. Diante dessa situação hipotética,
analise se está caracterizada a desapropriação indireta do bem de Olavo e enfrente
se a pretensão está fulminada pela prescrição, em consonância com a orientação do
C. STJ.

Resposta:

A ação de desapropriação indireta prescreve em 10 anos conforme o art. 1238, par.


unico do CC. Ocorre que o esbulho foi praticado antes da edição do CC/02, logo deve-
se aplicar a regra de transição do art. 2028 do CC.

No caso em tela, o prazo prescricional foi interrompido com a publicação do decreto


expropriatório, e que nao decorreu mais da metade do prazo vintenário do CC

169
Emerj CPIII-A Direito Administrativo

revogado. Consoante a regra de transição prevista no art. 2028 do CC, incide o prazo
de 10 anos do atual CC, contado a partir de sua entrada em vigor (11.1.2003)

Assim, tendo em vista que a ação foi proposta em 2011, antes do transcurso de 10 anos
da vigência do CC (11.1.2003), não restou configurada a prescrição no caso em tela.

A jurisprudência entende que a edição do decreto expropriatorio interfere na


contagem do prazo de prescrição. O STJ entende que se houver a publicação do
decreto há a interrupção do prazo.

Para o professor o cara que morava fora e não teve conhecimento disso não poderia
contar a prescrição.

Vide REsp 927989 e REsp 424803.

Questão 2)

Em determinado procedimento de desapropriação por utilidade pública, o Município


X incluiu no respectivo Decreto o imóvel situado na Rua do Além nº 6 e, por não ter
logrado acordo na via administrativa, ajuizou a ação cabível e obteve a imissão
provisória na posse. Para promover a obra de interesse público, almejada pela
expropriação, o Município teve que demolir o imóvel erigido no mencionado
endereço. Ocorre que tal construção era composta por dois blocos, de modo que o
Município X derrubou também o prédio constante da Rua do Além n° 8, que não
constava do Decreto e que possuía registro autônomo. Analise se seria cabível, na
espécie, a invocação de direito de extensão, mediante o delineamento do instituto
no ordenamento pátrio.

Resposta:

Não há como invocar o direito de extensão pois o caso em tela trata de dois imóveis
distintos. O direito de extensão só incide quando se tratar de desapropriação parcial
que envolve o mesmo imóvel. A presente questão deverá ser resolvida por
desapropriação indireta do segundo imóvel e não direito de extensão.

Vide REsp 525644

Questão 3)

O Município X promoveu a desapropriação do bem de Judivaldo para a constituição


de uma reserva biológica. Contudo, o processo expropriatório perdurou por longo
período e, cerca de vinte anos depois, quando efetivamente o bem foi transferido
para o Poder Público, a cidade já havia crescido muito, de modo que, de acordo com
o novo zoneamento urbano da localidade, o imóvel em questão foi utilizado para a
instalação de um polo cultural de cinema e de arte. Diante dessa situação

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hipotética, analise se está caracterizada a tredestinação que poderia,


eventualmente, ensejar a retrocessão, mediante apontamento da base legal
pertinente e em consonância com a orientação do C. STJ.

Resposta:

Tredestinação ilícita não caracterizada. Isso porque, embora a Municipalidade tenha


redirecionado a finalidade da utilização do imóvel expropriado, em nenhum momento
deixou de atender ao interesse público na nova destinação que acabou por conferir ao
bem. Assim, ao criar o polo de cinema, o Poder Executivo buscou priorizar o interesse
Púlico. Entendeu-se que houve tredestinação lícita, logo não há falar em direito de
retrocessão. Vide REsp 1421618.

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Aula 11 – Prof. Cláudio Brandão


] 11/10/18

EMENTA:  Desapropriação urbanística sancionatória.


 Desapropriação para fins de reforma agrária.
 Desapropriação confiscatória.
 Desapropriação por zona.

 DESAPROPRIAÇÃO URBANÍSTICA SANCIONATÓRIA:

A desapropriação urbanística sancionatória encontra-se prevista no art. 182, §4, III, da


CF.

É de competência do Poder Público Municipal, como instrumento de política pública,


com previsão no plano diretor municipal, realizar a desapropriação com fins de
adequação da propriedade urbana à sua função social, com pagamento mediante
títulos da dívida pública, aprovados pelo Senado Federal, portanto, nesse caso, não há
justa e prévia indenização.

Art. 182, § 4 da CF: “É facultado ao Poder Público municipal, mediante lei


específica para área incluída no plano diretor, exigir, nos termos da lei federal,
do proprietário do solo urbano não edificado, subutilizado ou não utilizado, que
promova seu adequado aproveitamento, sob pena, sucessivamente, de:
III - desapropriação com pagamento mediante títulos da dívida pública de emissão
previamente aprovada pelo Senado Federal (vide art. 21, VII e art. 22, VII, da CF),
com prazo de resgate de até dez anos, em parcelas anuais, iguais e sucessivas,
assegurados o valor real da indenização e os juros legais.”

Consiste em SANÇÃO ao proprietário de imóvel urbano que DESCUMPRE A FUNÇÃO


SOCIAL, conforme a política urbana estabelecida no plano diretor.

É de competência do Município. A União e o Estado não podem desapropriar


sancionando o particular nessa hipótese, pois tal plano é votado pela Câmara os
Vereadores. Aqui, o pagamento é feito em TÍTULOS DA DÍVIDA PÚBLICA e não em
dinheiro. Os títulos da dívida pública são necessariamente FEDERAIS.

Quando o inciso II exige prévia aprovação do Senado Federal, não há invasão do Senado
Federal na competência do Município, mas a proteção da competência da União em
tratar dos valores monetários (arts. 21, VII e 22, VII, da CF) e títulos da dívida pública
nada mais são do que uma espécie de valor monetário. Trata-se de desapropriação por
interesse social (finalidade mediata – política urbana).

As benfeitorias necessárias e úteis serão pagas em títulos da dívida pública?

Não. Serão pagas em dinheiro ainda que se trate de desapropriação sancionatória


urbana (art. 182, §4º, III, da CF) ou desapropriação sancionatória rural (art. 184 da CF).

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Entende-se como benfeitoria necessária aquela que dá vida econômica ao bem e


entende-se como benfeitoria útil aquela que acresce a vida econômica do bem. Não
há uma posição definida quanto à indenização das benfeitorias úteis, pois, de um lado,
há quem defenda que a indenização depende de autorização do Poder Público, e por
outro lado, quem sustente que deve sempre ser indenizada, sob pena de
enriquecimento ilícito do Poder Público.

Quais as providências que o Município deve adotar no âmbito da desapropriação


urbana sancionatória?

Em se verificando o descumprimento da função social da propriedade urbana, aplicam-


se as seguintes sanções na ordem abaixo citada:

1) Parcelamento, edificação e utilização compulsórios;


2) IPTU progressivo;
3) Desapropriação Urbana Sancionatória (art. 182, §4º, da CF e arts. 5º a 8º do
EC).

Primeiro, determina-se o parcelamento/edificação/utilização compulsórias. Se o


proprietário não cumpre, é a ele imposto um IPTU progressivo. Por fim, caso ainda
assim não dê função social à sua propriedade, será expropriado o bem.

Trata-se de norma intermediária que depende da edição de norma municipal.

Como é feito o pagamento da indenização no caso de desapropriação urbanística


sancionatória?

A desapropriação urbanística sancionatória é forma de desapropriação na qual a


indenização não é paga em dinheiro, mas sim em TÍTULOS PÚBLICOS, que deverá ser
previamente autorizado pelo Senado Federal.

Trata-se, pois, de exceção a regra da CF que estabelece que a indenização terá que
ser feita em dinheiro.

O Município aqui desapropria não porque pretende usar o imóvel para um fim público,
mas sim porque o proprietário não deu ao imóvel uma destinação compatível com o
Plano Diretor.

Nos termos do art. 8 do EC, o Município terá prazo máximo de 5 anos para dar
destinação àquele imóvel compatível com o Plano Diretor.

ATENÇÃO!!!!

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 A indenização de uma desapropriação de imóvel urbano que ATENDER a


função social será sempre em dinheiro.
 Contudo, se a propriedade NÃO ATENDER a sua função social, aí, então, nesse
caso, a indenização será paga com títulos públicos.

 DESAPROPRIAÇÃO PARA FINS DE REFORMA AGRÁRIA:

A desapropriação sancionatória rural (art. 184 da CF) – é a sanção ao proprietário de


imóvel rural que não atende sua função social, nos termos do art. 186 do CC.

É de competência da União e a indenização será paga em TÍTULOS DA DÍVIDA AGRÁRIA,


a exceção das benfeitorias necessárias e úteis que serão pagas em dinheiro. Não há
menção de prévia aprovação do Senado, pois os títulos da dívida pública já são de
natureza federal. Só a União faz redistribuição de terras para fins de reforma agrária
(finalidade mediata – desapropriação por interesse social).

Art. 184 da CF: “Compete à União desapropriar por interesse social, para fins de
reforma agrária, o imóvel rural que não esteja cumprindo sua função social,
mediante prévia e justa indenização em títulos da dívida agrária, com cláusula de
preservação do valor real, resgatáveis no prazo de até vinte anos, a partir do
segundo ano de sua emissão, e cuja utilização será definida em lei.”

O art. 185 da CF estabelece que:

(i) A pequena e média propriedade rural não podem ser desapropriadas; e


(ii) Os latifúndios produtivos não poderão ser desapropriados para fins de
reforma agrária. Somente os latifúndios improdutivos poderão ser
desapropriados.

 DESAPROPRIAÇÃO-CONFISCO:

A desapropriação confisco encontra-se prevista no art. 243 da CF e trata-se de caso


clássico de desapropriação para fins sociais.

Art. 243 da CF: “As propriedades rurais e urbanas de qualquer região do País onde
forem localizadas culturas ilegais de plantas psicotrópicas ou a exploração de
trabalho escravo na forma da lei serão expropriadas e destinadas à reforma
agrária e a programas de habitação popular, sem qualquer indenização ao
proprietário e sem prejuízo de outras sanções previstas em lei, observado, no que
couber, o disposto no art. 5º.”

É também, em regra, de natureza agrária e de competência da União. Ocorre quando


há glebas com cultivo de plantas psicotrópicas.

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O STJ já se manifestou no sentido de que, ainda que o cultivo de plantas se restrinja


a parte da área do imóvel, a desapropriação englobará todo o imóvel (é a ideia de que
o acessório segue o principal).

O particular perderá o seu patrimônio, sem que haja qualquer compensação financeira,
até mesmo pelas benfeitorias realizadas. A finalidade dessa desapropriação, assim
como ocorre no art. 184 da CF, é o assentamento de colonos (finalidade mediata →
desapropriação por interesse coletivo).

ATENÇÃO!!!!
Estados da Federação não realizam desapropriações sancionatórias. A política
urbana é do Município. A política rural é da União. O combate ao cultivo das plantas
psicotrópicas é da União. Remanescem para o Estado somente aquelas
desapropriações comuns, ou seja, que servem a uma finalidade imediata.

 DESAPROPRIAÇÃO POR ZONA:

A desapropriação por zona abrange a área contígua necessária ao desenvolvimento de


obras públicas e as zonas que se valorizarem extraordinariamente, em decorrência da
realização do serviço (art. 4 DL 3365/41).

Quais os fundamentos para a desapropriação por zona?

(i) Desapropriação de imóveis necessários à realização de obras públicas;


(ii) Desapropriação de imóveis que serão valorizados extraordinariamente em
decorrencia da realização de orbas e prestação de serviços.

Casos Concretos:

Questão 1)

Perivaldo impetrou mandado de segurança com vistas a fulminar procedimento


administrativo realizado pela entidade administrativa competente, com vistas a
realização de desapropriação para fins de reforma agrária de imóvel de sua
propriedade. O impetrante alega que recebeu notificação no sentido de que seu
imóvel será vistoriado em horário determinado em quinze dias, o que afirma violar
o seu direito líquido e certo de não sofrer tal inspeção, na medida em que somente
logrou desocupar tal bem cerca de seis meses atrás, após dura batalha judicial, em
decorrência de invasão promovida por movimento social no bem em questão,
motivado por conflito agrário. Diante dessa situação hipotética, analise se é
necessária a realização de vistoria para promover a desapropriação para fins de
reforma agrária, bem como se houve a violação do direito líquido e certo invocado
por Perivaldo, tudo mediante apontamento da fundamentação normativa
pertinente e à luz da orientação do C. STF.

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Resposta:

Quanto à realização de vistoria, na desapropriação para fins de reforma agrária, a


notificação prévia para fins de vistoriar o imóvel é necessária na forma do art. 2, par.
2 da Lei 8629/93 e é considerada pelo STF como elemento essencial do respectivo
processo legal.

Quanto à impossibilidade de vistoriar imóvel que tenha sido invadido até dois anos da
ocupação, verifica-se que ocorreu a violação a direito liquido e certo invocado por
Perivaldo na medida em que o art. 2, par. 6 da Lei 8629 veda a vistoria de propriedade
que tenham sofrido esbulho motivado por conflito possessório nos dois anos seguintes
à ocupação. Entende-se que o proprietário fica impedido de exercer a função social da
sua propriedade rural quando o imóvel pe invadido.

Questão 2)

Maicon é proprietário de um imóvel rural arrendado para Lourenço, certo que o


arrendatário promoveu o plantio de plantas psicotrópicas no bem em questão, sem
a autorização ou conhecimento do arrendante, que, por sua vez, também não
fiscalizava a destinação que vinha sendo dada ao bem, pois acreditava que Lourenço
realizava o plantio de soja. Ao apurar o ilícito praticado, instaurou-se o processo
pertinente para promover a desapropriação confisco, sem indenização, em
decorrência do uso nocivo da propriedade; certo que o proprietário alega que não
pode ser responsabilizado objetivamente por um ilícito que não foi por ele
praticado. Analise se os argumentos de Maicon merecem ser acolhidos, mediante o
apontamento das normas pertinentes, à luz da orientação do C. STF.

Resposta:

Recurso extraordinário. 2. Constitucional. Administrativo. Cultivo ilegal de


plantas psicotrópicas. Expropriação. Art. 243 da CF/88. Regime de
responsabilidade. 3. Emenda Constitucional 81/2014. Inexistência de mudança
substancial na responsabilidade do proprietário. 4. Expropriação de caráter
sancionatório. Confisco constitucional. Responsabilidade subjetiva, com inversão
de ônus da prova. 5. Fixada a tese: “A expropriação prevista no art. 243 da CF
pode ser afastada, desde que o proprietário comprove que não incorreu em culpa,
ainda que in vigilando ou in eligendo”. 6. Responsabilidade subjetiva dos
proprietários assentada pelo Tribunal Regional. 7. Negado provimento ao recurso
extraordinário. (RE 635336, Relator(a): Min. GILMAR MENDES, Tribunal Pleno,
julgado em 14/12/2016, ACÓRDÃO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO
DJe-209 DIVULG 14-09-2017 PUBLIC 15-09-2017)
Questão 3)

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Ao verificar que ISMAEL FUENTES se utilizava de sua propriedade rural, situada em


território nacional, para o plantio de maconha, sem a devida autorização, o Poder
Público, por meio dos órgãos responsáveis, tomou as medidas pertinentes para
coibir tal conduta, sendo certo que, em âmbito penal, houve a condenação do
proprietário pelo crime de tráfico de entorpecentes. Além disso, a União ajuizou a
pertinente ação expropriatória, com vistas a incorporar a integralidade do imóvel
ao seu patrimônio. No curso do processo, a perícia constatou que, efetivamente,
apenas parte do terreno era utilizada para o plantio de psicotrópicos. Diante dessa
situação hipotética, esclareça qual modalidade de desapropriação constitui o objeto
do aludido processo, aponte as normas pertinentes ao caso e elucide suas
peculiaridades, inclusive em relação à indenização e destinação do imóvel após a
sua incorporação ao patrimônio público. Analise, ainda, se eventual sentença de
procedência deverá abarcar a totalidade da propriedade ou apenas a área em que
era efetuado o cultivo das plantas psicotrópicas, à luz da orientação do C. STF.

Resposta:

É a desapropriação confiscatória.

Entendeu que seria toda a propriedade alcançada pela desapropriação.

EMENTA: RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL. EXPROPRIAÇÃO. GLEBAS.


CULTURAS ILEGAIS. PLANTAS PSICOTRÓPICAS. ARTIGO 243 DA CONSTITUIÇÃO DO
BRASIL. INTERPRETAÇÃO DO DIREITO. LINGUAGEM DO DIREITO. LINGUAGEM
JURÍDICA. ARTIGO 5º, LIV DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. O CHAMADO PRINCÍPIO DA
PROPORCIONALIDADE. 1. Gleba, no artigo 243 da Constituição do Brasil, só pode
ser entendida como a propriedade na qual sejam localizadas culturas ilegais de
plantas psicotrópicas. O preceito não refere áreas em que sejam cultivadas
plantas psicotrópicas, mas as glebas, no seu todo. 2. A gleba expropriada será
destinada ao assentamento de colonos, para o cultivo de produtos alimentícios e
medicamentosos. 3. A linguagem jurídica corresponde à linguagem natural, de
modo que é nesta, linguagem natural, que se há de buscar o significado das
palavras e expressões que se compõem naquela. Cada vocábulo nela assume
significado no contexto no qual inserido. O sentido de cada palavra há de ser
discernido em cada caso. No seu contexto e em face das circunstâncias do caso.
Não se pode atribuir à palavra qualquer sentido distinto do que ela tem em estado
de dicionário, ainda que não baste a consulta aos dicionários, ignorando-se o
contexto no qual ela é usada, para que esse sentido seja em cada caso discernido.
A interpretação/aplicação do direito se faz não apenas a partir de elementos
colhidos do texto normativo [mundo do dever-ser], mas também a partir de
elementos do caso ao qual será ela aplicada, isto é, a partir de dados da realidade
[mundo do ser]. 4. O direito, qual ensinou CARLOS MAXIMILIANO, deve ser
interpretado "inteligentemente, não de modo que a ordem legal envolva um
absurdo, prescreva inconveniências, vá ter a conclusões inconsistentes ou
impossíveis". 5. O entendimento sufragado no acórdão recorrido não pode ser

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acolhido, conduzindo ao absurdo de expropriar-se 150 m2 de terra rural para


nesses mesmos 150 m2 assentar-se colonos, tendo em vista o cultivo de produtos
alimentícios e medicamentosos. 6. Não violação do preceito veiculado pelo artigo
5º, LIV da Constituição do Brasil e do chamado "princípio" da proporcionalidade.
Ausência de "desvio de poder legislativo" Recurso extraordinário a que se dá
provimento. (RE 543974, Relator(a): Min. EROS GRAU, Tribunal Pleno, julgado em
26/03/2009, DJe-099 DIVULG 28-05-2009 PUBLIC 29-05-2009 EMENT VOL-02362-08
PP-01477 RTJ VOL-00209-01 PP-00395)

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