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Estrutura, Desempenho E Perspectivas Do Transporte Ferroviário de Carga
Estrutura, Desempenho E Perspectivas Do Transporte Ferroviário de Carga
Tendo como principal motivação o marco de cinco anos do início do processo de reingresso da inicia-
tiva privada nas operações ferroviárias do país, este artigo visa analisar a estrutura, o desempenho
recente e as perspectivas do setor de transporte ferroviário de carga, abrangendo, inicialmente, uma
caracterização do setor e um exame dos principais determinantes da sua estrutura de produção e
custos privados. Em seguida, estimam-se funções de custo que buscam relacionar indicadores
operacionais aos custos dos serviços, confrontando-os com os fretes praticados, de modo a realçar os
limites de geração de caixa das empresas do setor. Os resultados obtidos remetem a uma reflexão
sobre as perspectivas setoriais, notadamente em relação aos investimentos essenciais para garantir a
integração do sistema e a necessária expansão dos serviços.
1 INTRODUÇÃO
A privatização de serviços de transporte no Brasil avançou com inegável êxito nos
últimos anos. No caso do setor ferroviário, as realizações de destaque incluem o
desmanche das onerosas organizações que operavam e administravam o sistema e
os ganhos significativos de produtividade obtidos pelas concessionárias privadas,
pelo menos no tocante ao fator mão-de-obra. A continuidade desse processo, no
entanto, exige uma reflexão aprofundada sobre as reais possibilidades de a ferro-
via vir a desempenhar um papel de destaque na matriz de transporte brasileira,
papel esse que, em grande medida, motivou e norteou a privatização desse siste-
ma. A importância da reflexão torna-se ainda maior pela aproximação do marco
de cinco anos de celebração dos contratos de concessão de ferrovias, em que estão
previstas revisões de aspectos fundamentais que regulam esses contratos.
A partir dessas motivações, este artigo analisa a estrutura, o desempenho
recente e as perspectivas do setor de transporte ferroviário de carga (TFC), abran-
gendo, inicialmente, uma caracterização do setor e um exame dos principais
determinantes da sua estrutura de produção e custos privados. Em seguida, esti-
mam-se funções de custo que buscam relacionar indicadores operacionais aos
custos dos serviços, confrontando-os com os fretes praticados, de modo a realçar
os limites de geração de caixa do setor.
A seção a seguir destaca o tamanho do setor de transportes no Brasil e a
participação do TFC no quadro global de produção desses serviços, ressaltando
* O autor agradece a Fernando Limeira, J. R. Espósito, Jorge Silveira e também a dois pareceristas anônimos os valiosos
comentários a uma primeira versão deste artigo.
252 pesquisa e planejamento econômico | ppe | v.32 | n.2 | ago 2002
TABELA 1
PIB BRASIL
[em US$ 10E6]
2. Ver Balanço Energético Nacional 2000 — Ministério das Minas e Energia (MME), Brasília.
Estrutura, desempenho e perspectivas do transporte ferroviário de carga 255
3. O consumo de óleo diesel é o principal indicador utilizado na obtenção de estimativas da evolução da produção de
toneladas-quilômetro, pelo Geipot, ou do valor adicionado do setor de transportes, pelo IBGE.
256 pesquisa e planejamento econômico | ppe | v.32 | n.2 | ago 2002
TABELA 3
EVOLUÇÃO RECENTE DA PRODUÇÃO FERROVIÁRIA — 1995-2000
1995 1996 1997 1998 1999 2000 Crescimento (%)
Ferrovias da CVRD (1.000 tu) 149.257 144.537 156.117 154.742 147.113 162.415 1,70
Outras concessões (1.000 tu) 99.239 90.887 99.761 105.013 112.521 128.588 5,32
Ferrovias da CVRD (10E6 tku) 93.470 89.588 98.376 97.565 92.692 100.766 1,51
Outras concessões (10E6 tku) 42.464 38.821 39.833 44.487 47.675 54.178 4,99
Consumo de diesel (índice) 437 463 490 519 531 537 4,23
Fontes: AET/Geipot de 1998 e 2000 e DTF/Siade (dados primários).
TABELA 4
EVOLUÇÃO DA PRODUÇÃO FERROVIÁRIA
[em 10E6 tku]
TABELA 5
DISTÂNCIA MÉDIA DE TRANSPORTE DOS FLUXOS FERROVIÁRIOS POR CONCESSÃO OU
SISTEMA — 1995-1999
[em quilômetros]
De/para ALL CFN EFVM FCA Ferroban MRS Novoeste Subtotal Total (tku) %
TABELA 7
CARACTERÍSTICAS DOS FLUXOS DE TRANSPORTE NOS ESTADOS UNIDOS — 1993
Valor Volume Produção Distância de Distância de
Modos de transporte
(US$ milhão) (mil t) (milhão de t/milhas) transporte (milhas) transporte (km)
Todos os modos 6.037.220 9.865.526 2.517.089 255 411
Unimodal
Correios/encomendas 563.603 18.682 12.901 691 1.111
Caminhão/carga própria 1.789.798 3.556.030 237.617 67 108
Caminhão/comercial 2.775.836 2.921.436 634.599 217 350
Aéreo 4.152 492 613 1.246 2.005
Ferroviário 250.534 1.570.087 958.658 611 982
Hidroviário interior 41.645 366.207 164.514 449 723
Grandes lagos 624 34.337 12.293 358 576
Dutoviário 84.053 466.578
Multimodal
Caminhões próprios 22.567 32.418 4.654 144 231
Caminhão e aéreo 107.736 2.296 2.822 1.229 1.978
Caminhão e ferrovia 82.895 38.014 43.127 1.135 1.825
Caminhão e hidrovia 8.232 72.051 48.256 670 1.078
Caminhão e dutovia 649 3.386 - - -
Ferrovia e hidrovia 326 6.674 55.719 835 1.343
Hidrovia e grandes lagos 16.514 80.042 126.386 1.579 2.541
Outros modos
Outros e desconhecido 246.056 624.846 131.635 211 339
Fonte: US Department of Transportation, Bureau of Transportation Statistics, Commodity Flow Survey (1993).
Nota: Transporte dutoviário exclui petróleo cru.
diversas outras particularidades que podem implicar custos reais bastante dife-
renciados por unidade de produção [Wilson (1959)].
Há várias dimensões que são usualmente indicadas como determinantes da
diferenciação do produto e dos custos de transporte. Dentre elas, destacam-se
[Corrêa Junior et alii (2001)]:
• tamanho do lote de carga que o usuário deseja transportar;
• distância de transporte;
• mix e volume total de mercadorias dos diversos usuários, por trecho, linha
ou segmento da malha de transporte;
• cobertura geográfica do serviço oferecido, incluindo as possibilidades de
arranjos e conexões intra e intermodais;
• dimensões temporais do transporte, incluindo tempo médio esperado,
variabilidade, freqüência e disponibilidade do serviço;
• probabilidade de perdas e danos; e
• disponibilidade de informações sobre o transporte e serviços acessórios.
A análise dessas diversas dimensões do produto de transporte esbarra invaria-
velmente na disponibilidade de dados para a especificação e a estimação das fun-
ções de custo relevantes.
Idealmente, as funções de custo devem ser diferenciadas ao longo dessas
dimensões, de maneira a incorporar mais fielmente as variações relevantes de
custo, para fins de tarifação.
(TOC/MT) = a + b . (GTM/MT)
onde TOC era o custo operacional total; MT as milhas da via férrea; e GTM a
tonelada-milha bruta produzida.
Funções lineares de custos ferroviários foram amplamente usadas e criticadas
na literatura [ver Meyer et alii (1959) e Meyer e Kraft (1961)], tendo se notabili-
zado nos trabalhos de Harris (1977) e Keeler (1974). Keeler derivou as funções
de custo a partir das funções de produção Cobb-Douglas para os serviços de
passageiros e de mercadorias de uma parcela das companhias ferroviárias dos
Estados Unidos, seguido por Harris, que introduziu a seguinte função linear de
custo [Oum e Waters II (1997)]:
C = B0 . RTM + B1 . RFT + B2 . MR
problema que, como sugerido pelo próprio Harris, pode ser resolvido por meio
da utilização de formas funcionais mais flexíveis, como a Cobb-Douglas, utiliza-
da no trabalho de Keeler [ver Espósito (2001)].
A especificação Cobb-Douglas, na forma logarítmica, é freqüentemente
adotada nos estudos de função de produção e custos em geral, mesmo os mais
recentes. Uma das possíveis razões é a facilidade de interpretação dos resultados e
as boas qualidades estatísticas dessa especificação, geralmente em termos de ade-
rência aos dados observados. Esses aspectos parecem compensar as restrições des-
sa especificação no tocante às elasticidades de substituição unitárias entre os
insumos e a não-possibilidade de relações de complementaridade entre insumos
[Hakfoort (1996)].
Por outro lado, a alternativa, mais explorada recentemente, das formas fun-
cionais flexíveis também apresenta inconvenientes. Primeiro, o número de
parâmetros cresce rapidamente com o número de variáveis, devido aos termos
quadráticos e cruzados (no caso da translog) dos regressores, e a multicolinearidade
torna-se um problema. Em muitas ocasiões também a disponibilidade de dados
pode ser um fator limitativo. A análise estatística da função translog é um exem-
plo clássico de balanceamento entre, de um lado, a qualidade da aproximação
obtida pela especificação e, de outro, a qualidade estatística das estimativas dos
parâmetros da especificação. A aproximação é geralmente satisfatória se as variá-
veis independentes mudam pouco, mas boas estimativas dos parâmetros reque-
rem exatamente o contrário [Theil (1980)].
No caso da Ferroban, por exemplo, a própria empresa admite que ainda não
concluiu essa fase de ajuste.7
Das seis concessões do sistema da RFFSA, ainda se ressalta o caso da malha
da Ferrovia Teresa Cristina (FTC) em Tubarão, por se tratar de um subsistema
isolado, dedicado e de extensão reduzida. Os subsistemas da CVRD (EFVM e
Carajás) não possuem um sistema contábil de fato independente das operações
da empresa-mãe, sendo também praticamente dedicados ao transporte de miné-
rio de ferro, com características operacionais mais simples se comparadas com
ferrovias não-dedicadas.
Outra limitação relevante é o fato de as concessionárias terem arrendado a
malha e o material rodante por um preço que refletia a expectativa de fluxo de
caixa líquido de cada subsistema. Esse fluxo, por sua vez, não guarda necessaria-
mente relação com o valor de reposição desse estoque de capital. No caso do
material rodante, esse fato se torna mais importante, tendo em vista a vida útil
mais curta desses ativos. A Tabela 8 resume os dados operacionais e financeiros
mais importantes das concessionárias em 2000.
TABELA 8
CARACTERÍSTICAS OPERACIONAIS E FINANCEIRAS DAS CONCESSIONÁRIAS — 2000
Extensão de Locomotivas Vagões Vagões de Volume de Produção Distância de Efetivo de
linhas (km) próprios clientes transporte (tku*10E9) transporte pessoal
(tu*10E6) (km)
ALL 6.534 333 10.132 93 17,5 10,3 587 2.018
CFN 4.238 93 1.252 1,4 0,7 518 694
EFC 892 84 4.711 51,9 44,1 850 1.234
EFJ 68 2 84 8 1,2 0,0 33 29
EFVM 905 205 13.219 110,5 56,7 513 2.691
FCA 7.080 341 8.057 695 19,6 7,6 389 2.590
Ferroban 4.235 159 6.818 1.517 14,9 6,0 400 3.174
Ferronorte 463 50 850 1,4 0,5 375 290
FTC 164 10 449 3,7 0,3 77 142
MRS 1.674 317 8.948 1.091 66,1 26,8 406 2.988
Novoeste 1.626 60 1.780 2,7 1,6 598 639
Total 27.879 1.654 56.300 3.404 291 155 4.746 16.489
(continua)
(continuação)
TABELA 9
PARÂMETROS PARA O CÁLCULO DO CUSTO DE CAPITAL DO MATERIAL RODANTE
Locomotiva Vagão
Potência ou capacidade 3.000 hp 40 t
Custo de aquisição (R$) 940.000 50.000
Custo por hp ou t (R$) 313 1.250
Vida útil (anos) 20 40
Taxa de juros (%) 15 15
Crescimento/custo com hp 0,5 -
Custo anual por locomotiva ou vagão (R$) 150.176 7.528
8. De forma a testar a robustez dos resultados e a importância das variáveis explicativas de custos incorporadas às funções
mencionadas, foi também estimada uma função de custo na forma linear, porém com resultados inferiores.
272 pesquisa e planejamento econômico | ppe | v.32 | n.2 | ago 2002
TABELA 10
DADOS DE CUSTO E CARACTERÍSTICAS DA AMOSTRA UTILIZADA
Distância
Custo Despesa Volume Extensão Custo Despesa
média de
Empresa Ano operacional operacional transportado das linhas unitário unitária
transporte
(R$ 1.000) (R$ 1.000) (t.106) (km) (R$/1.000 tku) (R$/1.000 tku)
(km)
ALL 1997 298.652 198.479 11 541 6.534 48 32
ALL 1998 289.327 179.890 15 553 6.534 35 22
ALL 1999 343.080 223.373 17 572 6.534 36 23
ALL 2000 353.176 226.477 18 587 6.534 34 22
CFN 1998 50.903 34.664 1 500 4.535 80 54
CFN 1999 53.899 35.818 2 538 4.238 59 39
CFN 2000 53.624 36.628 1 518 4.238 76 52
EFA 1997 3.883 2.063 1 180 194 22 11
EFA 1999 2.787 1.224 0 133 194 70 31
EFC 1997 142.430 66.523 49 848 892 3 2
EFC 1998 197.714 119.579 51 844 892 5 3
EFC 1999 164.161 86.358 47 850 892 4 2
EFC 2000 201.273 117.449 52 850 892 5 3
EFJ 1997 2.091 1.253 1 27 68 70 42
EFJ 1998 2.139 1.263 2 25 68 53 32
EFJ 1999 2.042 1.150 2 33 68 41 23
EFJ 2000 2.494 1.636 1 33 68 62 41
EFVM 1997 567.561 383.941 107 530 898 10 7
EFVM 1998 525.674 341.189 105 530 898 9 6
EFVM 1999 536.681 353.852 100 527 905 10 7
EFVM 2000 576.495 393.159 111 513 905 10 7
FCA 1997 282.590 207.862 17 319 7.080 53 39
FCA 1998 283.958 204.195 18 387 7.080 41 29
FCA 1999 325.345 237.259 18 406 7.080 44 32
FCA 2000 375.482 271.372 20 389 7.080 49 36
Ferroban 1999 271.624 191.580 15 340 4.235 54 38
Ferroban 2000 300.128 219.060 15 400 4.235 50 37
Ferronort 2000 64.260 53.503 1 375 463 119 99
e
FTC 1997 14.781 10.353 2 72 164 99 69
FTC 1998 15.024 10.538 2 75 164 88 62
(continua)
Estrutura, desempenho e perspectivas do transporte ferroviário de carga 273
(continuação)
Distância
Custo Despesa Volume Extensão Custo Despesa
média de
Empresa Ano operacional operacional transportado das linhas unitário unitária
transporte
(R$ 1.000) (R$ 1.000) (t.106) (km) (R$/1.000 tku) (R$/1.000 tku)
(km)
FTC 1999 14.399 9.913 2 77 164 85 58
FTC 2000 20.693 15.889 4 77 164 74 57
MRS 1997 466.205 338.868 51 401 1.674 23 17
MRS 1998 458.612 333.209 51 413 1.674 22 16
MRS 1999 475.997 342.826 55 403 1.674 21 15
MRS 2000 566.775 420.087 66 406 1.674 21 16
Novoeste 1997 58.172 34.484 3 587 1.626 39 23
Novoeste 1998 66.031 41.750 3 530 1.626 42 26
Novoeste 1999 73.514 48.146 3 596 1.626 45 30
Novoeste 2000 52.178 30.091 3 598 1.626 33 19
Destaques da amostra
Média 213.896 145.674 26 415 2.452 44 29
Mínimo 2.042 1.150 0,3 25 68 3 2
Máximo 576.495 420.087 111 850 7.080 119 99
Fonte: Siade/DTF/STT/MT (dados primários).
Nota: Para maiores informações sobre as concessionárias ferroviárias, cujas siglas constam desta tabela, ver www.transportes.gov.br.
9. Para ser uma função de custo no sentido estrito, a especificação deveria incorporar como variáveis explicativas os preços
dos fatores de produção. No caso, entretanto, observa-se uma variância desprezível do preço da mão-de-obra, em face de as
concessionárias terem herdado uma estrutura salarial homogênea da RFFSA. Já para capital e materiais, a dificuldade de se
mensurar adequadamente esses preços aliada à mesma expectativa de homogeneidade de preços entre as concessionárias
(nesse caso também do preço de combustível) justificam um tratamento para o impacto de preços de uma forma agregada,
através de dummies .
274 pesquisa e planejamento econômico | ppe | v.32 | n.2 | ago 2002
TABELA 11
RESULTADOS DA ESTIMAÇÃO
R-quadrado 0,957
R-quadrado ajustado 0,949
Erro-padrão 0,415
Observações 40
Anova gl SQ MQ F
Regressão 6 126,95 21,16 122,84
Resíduo 33 5,68 0,17
Total 39 132,63
GRÁFICO 1
CUSTO PREVISTO E OBSERVADO EM FUNÇÃO DO VOLUME TRANSPORTADO
[custo operacional (R$ mil)]
700.000
600.000
500.000
400.000
300.000
200.000
100.000
0
0 20 40 60 80 100 120
Volume transportado (t10E6)
Custo previsto Custo observado
GRÁFICO 2
CUSTO UNITÁRIO PREVISTO EM FUNÇÃO DO VOLUME TRANSPORTADO
[custo (R$/t)]
100
90
80
70
60
50
40
30
20
10
0
0 20 40 60 80 100 120
Volume transportado (t10E6)
276 pesquisa e planejamento econômico | ppe | v.32 | n.2 | ago 2002
TABELA 12
COMPARAÇÃO ENTRE CUSTO, DESPESA E FRETE FERROVIÁRIO — 2000
TABELA 13
PARÂMETROS DOS MODELOS DE CUSTO, DESPESA E FRETE FERROVIÁRIO
Custo operacional Despesa operacional Frete
Interseção 5,065 4,745 7,72414
Volume transportado (tu*10E6) 0,653 0,678
Distância de transporte 0,252 0,152 0,01655
Linhas principais e ramais 0,508 0,574
Dummy-97 –0,219 –0,309
Dummy-98 –0,192 –0,249
Dummy-99 –0,179 –0,269
10. Frete por tonelada = a + b.(distância de transporte). Para maiores detalhes sobre esse modelo de fretes, ver Castro
(2002).
278 pesquisa e planejamento econômico | ppe | v.32 | n.2 | ago 2002
5 CONCLUSÃO
Os resultados obtidos na seção anterior trazem um questionamento importante
sobre as reais possibilidades de a ferrovia vir a desempenhar um papel de destaque
na matriz de transporte brasileira, conforme ressaltado na introdução deste arti-
go. A pergunta que se coloca é quais seriam as ações públicas e privadas indispen-
sáveis para ensejar a necessária expansão da produção ferroviária, principalmente
no transporte de longa distância, expansão essa essencial para garantir um bom
desempenho econômico-financeiro dessas concessões. Sem a pretensão de esgo-
tar essa questão, ressalta-se, como exemplo, o papel fundamental que a malha do
Estado de São Paulo cumpre nessa equação de desempenho. Mais especificamen-
te, destaca-se o grande centro de convergência das malhas da ALL, Ferronorte,
Novoeste, FCA e MRS no espaço geográfico que engloba a grande conurbação da
região de São Paulo, Campinas, Santos e adjacências, maior centro econômico
do Brasil, e interligado, por ferrovias, em todas as direções.
Há, entretanto, duas questões fundamentais a equacionar, no médio prazo,
nesta e em outras interseções da malha ferroviária. A primeira é relativa à infra-
estrutura e a segunda, ao domínio institucional. Na questão da infra-estrutura,
notam-se dois problemas centrais: a troca de bitola e a transposição da região
metropolitana de São Paulo (RMSP). A malha que serve à região Sul do país é de
bitola métrica (ALL) e ao chegar na RMSP se conecta aos subsistemas que servem
à região Centro-Oeste e ao Triângulo Mineiro e Goiás, em bitola métrica (Novoeste
e FCA, respectivamente), e de novo às regiões Centro-Oeste e Sudeste, em bitola
larga — Ferroeste e MRS, respectivamente [Lima (2002)].
A troca de bitola se passa em estações situadas em Campinas e dentro da
RMSP (Água Branca). Na primeira, atende a cargas vindas do segmento em bito-
la larga (1,60m) da Ferroban que, eventualmente, viriam a seguir para a malha
que serve à região Sul. Na transposição Sudeste—Sul e Sul—Sudeste, a troca de
bitola se daria na RMSP, obrigando a utilização de linhas congestionadas pelo
tráfego de trens de passageiros de subúrbio, que têm prioridade sobre o tráfego de
cargas [Lima (2002)]. Ocorre, assim, uma superposição de problemas na RMSP
— a troca de bitola e a dificuldade quanto à utilização das linhas que transpõem
essa região —, criando uma barreira concreta ao desenvolvimento de serviços de
transporte de média e longa distâncias que cruzem o maior pólo industrial do país.
Cabe ressaltar que o Plano Diretor de Desenvolvimento de Transportes do
Estado de São Paulo (PDDT - 2000), desenvolvido ao longo do ano 2000, iden-
Estrutura, desempenho e perspectivas do transporte ferroviário de carga 279
11. No início de março de 2002, a Ferropasa Participações, que controla as concessões da Ferronorte, Ferroban e Novoeste,
informava sobre a criação da Brasil Ferrovias, empresa que fará a gestão unificada dessas malhas. Nessa negociação, a CVRD
cedeu sua participação na Ferroban, passando, em troca, a deter o controle do trecho de Paulínia a Uberaba (Mogiana) da
Ferroban.
Estrutura, desempenho e perspectivas do transporte ferroviário de carga 281
ABSTRACT
The privatization of the rail network, which started in 1996, is the main motivation for this analysis of
the recent performance and perspectives of the sector. The paper first presents an overview of the size
and relative importance of the transport sector by mode. The operational and cost structure of the rail
sector is then analyzed in detail and compared to its tariffs. The cash flow generation of the rail
concessionaires is confronted with the investment needs of the sector for service expansion.
BIBLIOGRAFIA
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