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Patrimônio Cultural:
proteção do conhecimento e das
expressões culturais tradicionais
Organizadores:
Eliane Moreira
Carla Arouca Belas
Benedita Barros
Antônio Pinheiro
13- 15 de outubro de 2004
Belém-Pará
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
Patrocinadores:
Petrobrás, Lei de Incentivo à Cultura
Realização:
Museu Paraense Emílio Goeldi (MPEG)
Centro Universitário do Estado do Pará (CESUPA)
Co-Realização:
Amigos do Museu, Governo do Estado/Fundação Tancredo Neves,
UNESCO, IPHAN.
Apoio:
MCT, MinC.
ISBN 85-7098-122-8
•
Coordenação Geral:
Museu Paraense Emílio Goeldi (MPEG)
Carla Arouca Belas & Benedita da Silva Barros
Centro Universitário do Estado do Pará (CESUPA)
Eliane Moreira & Gysele Amanajás
Organização:
Carla Arouca Belas
Eliane Moreira
Benedita Barros
Antônio Pinheiro
Equipe:
Antônio Pinheiro
Neila Cristina Barboso da Silva
Alyne Marcely Fernandes de Souza
Wiliams Barbosa Cordovil
Bruno Mileo
Cíntia Reis Costa
Gisele Amanajás
Capa:
Imagens: Ns. Sra. de Nazaré
Gravura rupestre da região da Prainha-PA, provável representação da gravidez
- Edithe Pereira / Livro: Arte da Terra, 1999
•
Normalização:
4 Hilma Celeste Alves Melo
Revisão:
Maria das Graças da Silva Pena
6
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
SUMÁRIO
Coica Y el Consentimiento Fundamento Previo ....................................................... 15
Iza Roná Dos Santos Tapuia
Salvaguarda do Patrimônio Cultural: bases para
constituição de direitos .............................................................................................. 27
Ana Gita de Oliveira
O INRC e a Proteção dos Bens Culturais ................................................................. 33
Carlas Arouca Belas
Bem Imaterial - Seminário ........................................................................................ 49
Mario Sérgio Sobral Costa
Círio de Nossa Senhora de Nazaré em Belém/PA: inventário e
registro como patrimônio cultural brasileiro .............................................................. 55
Maria Dorotéa Lima
Objeto etnográfico, coleções e museus....................................................................... 71
Lucia Hussak
Patrimonio Indígena. Derrotero Hacia Su Regulación
Legal en la Argentina................................................................................................. 79
Teodora Zamudio
Museus e Patrimônios Indígenas ............................................................................... 103
Eliane Potiguara
Gravações e acervos a partir da pesquisa lingüística e cultural
como um passo para revitalização, fortalecimento e resgate cultural ........................ 109
Ana Vilacy Galucio
O Jogo de Espelhos: reflexões sobre a questão da reintegração de
gravações históricas do candomblé baiano nas comunidades atuais .......................... 117 •
Angela Lühning
7
Audio And Audiovisual Archives, Intellectual Property,
And Cultural Heritage: some comparative considerations......................................... 127
Anthony Seeger
Patrimônio Magüta: artefatos como meios de comunicação
entre diferentes contextos sócio- culturais.................................................................. 141
Priscila Faulhaber.
Educação Patrimonial em Comunidades Quilombolas: o resgate
do saber e do saber fazer louça de barro das artesãs
da região de Porto Trombetas-PA............................................................................. 155
Luiz Guilherme Campos Reis
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
ANENOS
MOÇÃO DE APOIO
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
Nota dos Organizadores
Mario Quintana, poeta da simplicidade, no seu poema “Das Utopias” nos fala.
Se as coisas são inatingíveis... ora!
Não é motivo para não querê-las...
Que tristes os caminhos, se não fora
A presença distante das estrelas!
Nos últimos três anos, a parceria entre o Museu Paraense Emilio Goeldi
(MPEG) e o Centro Universitário do Pará (CESUPA), têm proporcionado
discutir o Acesso à Biodiversidade, ao Conhecimento Tradicional e a sua
interface com a Proteção do Conhecimento (a propriedade intelectual).
O Seminário Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: Proteção
dos Conhecimentos e das Expressões Culturais Tradicionais, se configura em
mais uma forma de abordar um prisma desse cenário a partir do Patrimônio
Cultural e suas formas de Proteção.
Nossa intenção é aproximar pesquisadores e comunidades tradicionais de
forma que possam dialogar e construir entendimentos, uma vez que o espaço de
trabalho de um é o espaço de existência do outro e ambos estão dependentes de
ações para execução de suas atividades e manutenção de sua existência. Nossa
Utopia é buscar construir a ponte entre o sonho e a realidade.
Na construção de um cenário que crie possibilidades de realização do
almejado, contamos com a conjugação de esforços de uma equipe, a partir da qual
se tem conseguido pensar e executar os trabalhos.
Os textos reunidos nessa publicação são representativos do profícuo,
debate ocorrido durante o Seminário de Propriedade Intelectual e Patrimônio
Cultural, cuja realização cabe nos agradecer, a Cláudia Lopez, Gisele Amanjás e
•
Nelson Sanjad, que avaliaram e selecionaram os trabalhos apresentados na forma
de Painéis e a Lúcia Hussak, por ter aceitado compor o grupo de trabalho, a 9
Lilian Barros pelas excelentes contribuições na elaboração do projeto e sugestão
de palestrantes. Institucionalmente agradecemos a Petrobrás pelo Patrocínio, aos
Amigos do Museu Goeldi, a Fundação Cultural do Pará Tancredo Neves, a
Unesco e IPHAN, pela parceria na Co-realização, ao Ministério da Cultura e
Ministério da Ciência e Tecnologia pelo Apoio.
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
Relação de Palestrantes e
Coordenadores de Mesa
13
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
Coica Y el Consentimiento
Fundamentado Previo
Iza Roná dos Santos Tapuia
1
Declaración de Kimberly , 2003, p.
2
Haji Yine: una visión Yine sobre el desarrollo sostenible:, 2003, p.1-2).
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
Nuestro esfuerzo en hacernos entender, sobretodo por los gobiernos de
los Estados Nacionales, tiene sido ardua y penosa, el escenario internacional de
los derechos indígenas han logrado sacar algunos instrumentos internacionales,
en foros y convenciones internacionales como al CDB y en Convenio 169, el
derecho de nuestros pueblos sobre sus territorios, conocimientos colectivos y
sabidurías ancestrales. Pero, no se ha resuelto la pobreza, marginalidad y aun
desprecio que sufrimos por sermos indígenas. Y ahora enfrentamos nuevas
agresiones con el interese en el patrimonio bio diverso de la cuenca amazónica y la
invasión de nuestros territorios y riquezas.
Como COICA hemos participado en las discusiones globales sobre temas
ambientales durante los últimos 15 años, desde la misma Cumbre de la Tierra
(Río/92). En los foros globales y regionales el que más se ha privilegiado son el
Convenio sobre la Diversidad Biológica (CDB), una incidencia en la
Organización Mundial de la Propiedad Intelectual (OMPI), en la Comisión de
las Naciones Unidas sobre Comercio y Desarrollo (UNCTAD), en el Foro
Intergubernamental de Bosques (FIB), en la Convención Marco de las Naciones
Unidas sobre el Cambio Climático (CMNUCC), en el Protocolo de Kioto (PK),
en la Cumbre Mundial sobre Desarrollo Sostenible (CMDS/PNUD), y en el
Protocolo de Bioseguridad, de la Comunidad Andina de Naciones (CAN), entre
los más destacados sobre el tema.
La existencia de clausulas relativas a nuestros derechos como pueblos en el
marco jurídico internacional, tiene sido alcanzada gracias a una labor colectivas
de lideres indígenas y la presión social de las bases, porque al final y al cabo, son
en los territorios que llegan las amenazas de mayor y menor grado. Lo que
tenemos hoy reconocido como Derechos Internacional se debe a nuestra
presencia organizada en el escenario nacional e internacional, esa participación
indígena tanto técnica, como política ha presionado a los Estados y organismos
internacionales a buscar mecanismos para responder a nuestras demandas, sobre
todo, las que tiene que ver con la protección, garantía y ampliación de nuestros
•
derechos: a la salud, educación, desarrollo y territorio.
Vemos algunos avances en las normativas nacionales e internacionales, 19
pero, no hemos logrado que estas se traduzcan en hechos concretos y lleguen
hasta nosotros en forma de beneficios, es lo que ocurre con las constituciones
nacionales que tiene artículos altamente avanzados en términos de derechos, pero
que en la practica no se efectiva. Los tratados y convenciones a nivel internacional
como es el caso del Convenio 169 ratificado por case todos los países de
Suramérica, de igual manera no llegan a concretarse en la realidad, un ejemplo es
que la totalidad de las tierras y territorios hay presencia arbitraria de terceros
públicos y privados, en frontal irrespetó al Convenio 169, articulo 18, sobre las
tierras: “la ley deberá prever sanciones apropiadas contra toda intrusión no
autorizada en las tierras de los pueblos interesados a todo uso no autorizado de las
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
mismas por personas ajenas a ellos, y los gobiernos deberán tomar medidas para
impedir tales infracciones”. Tener una ley no es todo, y nuestro esfuerzo esta en
sentido de hacer valerla en la práctica, pero no hemos logrado y en la cuenca hay
un cien números de reclamos en contra de invasores de toda naturaleza presentes
en los territorios.
Los textos constitucionales en general, garantizan el usufructo del
patrimonio ambiental existente en nuestro territorio, pero resguarda para si la
propiedad, determinando que “las tierras indígenas son de usufructo exclusivo,
pero en el mismo texto se resalta que las misma son patrimonio de la unión”. La
soberanía y el poder de definir el uso no esta sobre nuestro control y eso tiene sido
una amenaza, pues en nuestro territorio se encuentran los minerales estratégicos
y que ofrecen mayor ventaja comparativa en el mercado internacional.
Como vemos la aplicación de las normas establecidas tanto por el
Convenio 169 como por el CDB, en relación a las consultas. En el caso de
recursos no renovables (minerales y petróleo) porque necesitan de una
infraestructura básica y presentan serio riesgo de impacto inminente tanto al
ambiente como a la población, se busca en cierta medida cumplir los Estados, en
parte las normas de protección y aprobación en la forma de la ley, pero eso
cumplimiento se debe fundamentalmente a la presión social tanto de grupos
indígenas como de otros sectores sociales como los ecologistas, y en muchos de
los caso solamente se da para espaciar las presiones. Para nosotros hacer la
consulta no significa que se esta tonando en cuenta nuestras demandas, porque, al
realizar la consulta, lo que anhela el gobierno y las empresas es obtener el visto
bueno de los grupos indígenas afectados al emprendimiento a ser desarrollado.
Es importante resaltar que las consultas son un derecho, que tiene que ver con la
información previa y amplia de una determinada actividad a ser desarrollada en
los lá territorios indígenas. Pero eso derecho se va convirtiendo en un negocio de
toma daca que involucra Estado, Empresas e Indígenas.
• Las empresas aprovechan el proceso para hacer el ofrecimiento e incluso
financian ciertos individuos para estimular que en las asambleas de consulta, los
20 mismos aprueben la explotación. Y mucha veces la propia comunidad ya tiene
dicho no, y la consulta sirve solamente para dejar en el seno de las comunidades el
conflicto entre los que aceptan y los que no. Las directrices de la CDB, referentes
al Consentimiento Fundamentado Previo, van en el mismo sentido, es decir, el
mismo es un principio por medio del cual los solicitantes de un recurso genético
pueden tener acceso, siempre y cuando cuenten con la autorización o la decisión de
la Parte (gobierno), que es “propietaria” o tiene soberanía sobre los recursos
genéticos solicitados, es decir, que el CFP es un requisito fundamental para otorgar
acceso y sienta las bases para elaborar un contrato en condiciones mutuamente
convenidas para una justa y equitativa distribución de los beneficios. Es decir es un
mecanismo de respaldo a los gobiernos y no a los pueblos indígenas.
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
Frente a esta apropiación de nuestras sabidurías, hemos alertado y claro
demandamos que el CFP cumpla su papel el de ser un mecanismo capaz de
garantizar que se atienda a los detenedores de las informaciones y que para eso es
fundamental que se informe previamente y se tenga la aceptación, o no, de lo que
va negociar entre el Estado y las empresas y tengan origen en nuestros
territorios, es decir como aboga el convenio 169, articulo 2 “los gobiernos
deberán asumir la responsabilidad de desarrollar, con la participación de los
pueblos interesados, una acción coordinada y sistemática con miras a proteger los
derechos de esos pueblos y a garantizar el respeto de su integridad”.
El Convenio 169 de la OIT, piedra angular en el derecho internacional
cuando se trata de nuestros derechos como afirma el Articulo 3: “No deberá
emplearse ninguna forma de fuerza o de coerción que viole los derechos humanos
y las libertades fundamentales de los pueblos interesados incluidos los derechos
contenidos en el presente Convenio”. Abogamos por el derecho a decir no, y
afirmamos que las consultas de la forma como están siendo desarrolladas, son
mecanismos que solamente sirve para que empresas entren en los pueblos para
destruir la organización y unidad del pueblo.
Nuestro compromiso tiene sido en el sentido de garantizar que los
procesos de consultas de acuerdo a que determina el, Articulo 6 del dicho
Convenio, a lo cual alude los gobiernos a aplicar tales derechos con vistas a dotar a
los pueblos indígenas de condiciones adecuadas con vista a tener una posición
conciente sobre lo que estará sucediendo en su territorio: “a) consultar los pueblos
interesados, mediante procedimiento apropiado y en particular a través de instituciones
representativas, cada vez que se proveen medidas legislativas o administrativas
susceptibles de afectarlas directamente; y añade que “Las consultas llevadas a cabo en
aplicación de este Convenio deberán efectuarse de buena fe y de una manera apropiada a
las circunstancia, con la finalidad de llegar a un acuerdo o lograr el consentimiento
acerca de las medidas propuestas”;
Somos actores activos en todos los Estados Nacionales, por medios de la •
actuación de nuestras organizaciones de representación, hemos estamos firmes
en el proposito de hacer valer nuestros derechos y denunciando los actores, 21
cuando estos pretenden desviarse de los procedimientos correctos, en búsqueda
de lograr beneficio a los intereses mercantilista tanto del Estado, como de las
empresas privadas. Nos preocupa mucho la explotación de alto impacto, pero
nos preocupa mas todavía son la explotación de bajo impacto y eso tiene que ver
con la explotación de los recursos de la biodiversidad, sobre eso nuestra propuesta
es que el propio Estado ejerza un control mayor frente a esas actividades, porque
las misma traen graves impactos a nuestra sabiduría ancestral, debido al robo das
nuestras ciencias, tecnologías de manejo, mejoramiento y domesticación de
espécimen forestales y animales. Todo eso acervo fue desarrollado con en
proposito de ampliar el abanico de productos en beneficio del colectivo. Nuestro
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
cuidado esta en el sentido de que cada día nuestros sabios amplían sus
conocimientos a cerca del espacio y de los recursos existentes en el territorio, pero
esa información tiene estado en la mira de los biopiratas.
Contemplando en parta nuestra preocupación, pero no atendiendo
nuestra petición, la Convención de la diversidad biológica - CDB, considerado el
más importante instrumento jurídico internacional que busca contemplar
nuestro anhelos, en relación a la defensa de nuestros derechos, sobre todo con
relación a la conservación de la biodiversidad, el uso sostenible de sus recursos y la
distribución equitativa de beneficios, tiene sus vacíos pues sus propuestas
responden al intereses de los grupos del capital transnacional que operan en la
explotación de los recursos biogenéticas, que están trabajando con miras a suplir
la demanda de las industrias farmacéutica y de sus laboratorios, en esto contexto
la información privilegiada de primera mano sobre la ciencia amazónica y su
potencialidad y uso las tiene nuestros sabios indígenas.
El articulo 8, literal “j” trata directamente del tema de la biodiversidad,
pero eso recurso esta bajo la soberanía de los Estados, y como tal nosotros
tenemos poca chance en términos de la legislación para hacer frente a los
intereses de los Estado y de sus políticas. Sin embargo nosotros como colectivos
de origen ancestral hemos concertados una posición que refleje nuestros anhelos,
así planteamos que El libre consentimiento fundamentado previo está relacionado con
nuestros derechos territoriales, sociales y culturales y forma parte del derecho a la libre
determinación. El derecho al libre consentimiento fundamentado previo promueve la
participación plena y efectiva y el respeto de los derechos de los Pueblos Indígenas. La
adopción de disposiciones o directrices que pretendan limitarlo, restringirlo o someterlo a
las legislaciones nacionales, es contraria al derecho internacional existente y emergente
sobre los derechos de los Pueblos Indígenas.
En la realidad, se ve un mayor número de productos siendo patentados
por las grandes empresas transnacionales, si el menor controle de los Estados y
• mucho menos esfuerzos en el sentido de reverter las patentes ya otorgadas. Las
empresas se han lanzado a patentar (se adueñar) de las informaciones sobre el uso
22 de plantas medicinales y alimenticias. Informaciones desarrolladas
milenariamente por los sabios y sabias indígenas, que en la era de la bíopiratería
se han convertido en oro verde. Frente a todo eso la COICA, ha desarrollado una
posición coherente con nuestros derechos y de acorde a nuestros intereses,
porque entendemos que las sapiencias milenarias son informaciones
desarrolladas en el colectivo de nuestros pueblos, bajo el sistema de protección
mutuo sobre su usufructo. Estaríamos hablando de la responsabilidad
compartida entre las generaciones y el compromiso de ampliar las informaciones
científicas que a su vez son alimentadas por el sistema de reciprocidad, que
envuelve tanto la distribución material, como simbólica del conjunto de los
miembros de pueblo indígena. Dentro de esto contexto pensar en usar las
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
informaciones sobre determinado especie de planta o animal solamente debe ser
mediante el consentimiento del conjunto del Pueblo o de los pueblos, como es el
caso de la Ayahuasca, orientadora espiritual de varios pueblos amazónicos y así
muchos otros productos.
El establecimiento de un mecanismos de resguardo a los pueblos como es
el Consentimiento Fundamentado Previo, en una lectura mas detallada, se
convierte, mas bien, en dotar el Estado de un respaldo a lo se a definido como
derecho del Estados: el control sobre los recursos de los bienes de la
biodiversidad, de esa forma los beneficiarios de esta ley, aunque se diga, no son
los pueblos indígenas. Mirando desde esta óptica, cuando los Estados no toman
en cuanto nuestras preocupaciones y demandas, no lo hacen solamente de gana,
lo hacen, porque entiende que deben seguir sus orientaciones y intereses,
evidentemente que no son los nuestros. En eso sentido nuestra pelea en frontal
con los Estados, porque no aceptamos la presencia como detentaría de recursos
que no son de dominio publico y desde el FIIB hemos afirmado que nosotros
tenemos y vamos nos esfuerzas para mantener el control de nuestra sabiduría y de
ahí definir de que manera vamos ayudar a nosotros y a la humanidad.
Muchas veces, procuramos posicionarnos como un colectivo mayor, pero
muchas veces eso colectivo tiene sido débil y por veces aceptamos, mismo que no
nos conviene a ciertos discursos y conceptos, es decir procuramos ubicar un
lenguaje general a nuestros planteamiento, sin embargo, para la COICA
tenemos muy claro la visión a cerca del termino “conocimiento tradicional”,
como definición de nuestras sapiencias y así, desde el establecimiento de la
Agenda Indígena Amazónica como el marco orientador de las políticas indígenas
y de las políticas hacia nosotros, consideramos importante destacar y
diferenciarnos de los demás grupos humanos amazónicos y denominar de
“sabidurías ancestrales” toda la sapiencia sobre planta, animal, espiritualidad y
todo lo que usamos para nuestra sostenibilidad a lo largo de años de vida en la
amazonía, para nosotros el término ancestral remota una origen muy mas allá de
la invasión colonial y preceptos occidentales. En eso sentido, nombramos como •
guardines de esas informaciones los sabios y sabias mayores de nuestros pueblos. 23
En la onda de la protección de los “conocimientos tradicionales”
entendido como “aquellos saberes que poseen los pueblos indígenas, afro
americanos y comunidades locales transmitidos de generación en generación,
habitualmente de manera oral y desarrollados al margen del sistema de educación
formal”3. La definición es un marco que atrapa todo, es decir estamos de alguna
forma incluyendo varios procesos de visión y apropiación de un sentido que tiene
3
CRUZ, Rodrigo de la, “Protección a los Conocimientos Tradicionales, el Consentimiento Fundamentado
Previo y la Distribución de Beneficios, 2004.
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
mucho que ver con lo hemos viniendo construyendo a lo largo del nuestra
existencia, mucho mas allá de lo abogan los arqueólogos.
Embarcado en la lógica del sistema se ha avanzado en tener un marco
legal de protección a lo que se ha denominado “conocimiento tradicional” lo cual
hemos usado, pero que no expresa todo lo que sabemos, en este proceso se viene
diseñando en el marco regional una Estrategia sobre Biodiversidad para los
Países del Trópico Andino. La CAN, en Lima – Perú, julio 7 del 2002, Decisión
524, en donde se incorpora el tema de los conocimientos tradicionales y para
tratar del tema especifico de los pueblos indígenas se crea la Mesa de Trabajo
sobre Derechos de los Pueblos Indígenas. Se destaca en ella el derecho de
propiedad colectiva de los conocimientos tradicionales, el consentimiento
fundamentado previo y la distribución de beneficios. Y se acuerda también la
elaboración del Régimen Común Andino para la Protección de los
Conocimientos Tradicionales, en consulta y participación con los pueblos
indígenas (CRUZ, 2004). Todavía en proceso de consolidación.
Algunos países han se preocupado en elaborar legislación de protección a
los recursos de la biodiversidad, es el caso do Brasil que ha iniciado en 1995 a
elaborar una propuesta legislativa en el Senado, con el Proyecto de Ley nº 306/95
da Senadora Marina Silva, que fue de alguna forma atropellada por otra propuesta
surgida del Grupo Interministerial de Acceso a los Recursos Genéticos del
Gobierno Federal, y solamente genero desde la Presidencia de la República una
Medida Provisoria 2,126-8, sin fuerza de ley como deseaban tanto los pueblos
indígenas como la sociedad. Vale sin duda destacar también las iniciativas de los
Estado en proteger su patrimonio ambiental, es el cado del estado de Acre, que
aprobó la Ley Estadual nº 1,235 que dispone sobre los instrumentos de control del
acceso a los recursos genéticos (1997) y el Estado de Amapa con la Ley Estadual nº
0388/97, sobre Acceso a los Recursos Genéticos (1997)”.4
Lo hemos planteado en general cuales son elementos fundamentales para
• un sistema Alternativo de Protección, con algunos argumentos traídos de la
reflexión del conjunto de los pueblos indígenas, pero importante para el mundo
24 indígena amazónico, porque tenemos apostata de decir que en nuestra manos
colectivas se encuentran las informaciones imprescindibles para los llamados
“descubrimientos científicos” dicho por el mundo occidental. Estos elementos son:
El reconocimiento de los pueblos indígenas como pueblos con derecho a
la libre determinación, inclusive en cuanto a decidir sobre el uso de sus sabidurías
ancestrales y conocimientos intelectuales colectivos.
4
Análisis de Jorge Caillaux y Manuel Ruiz de la Sociedad Peruana de Derechos del Medio Ambiente.
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
El reconocimiento al carácter colectivo de las sabidurías ancestrales,
conocimientos, innovaciones y prácticas de los pueblos indígenas.
La innovación en los pueblos indígenas es un proceso acumulativo que incluye
todas las manifestaciones de la creatividad indígena.
Seguridad jurídica de las tierras y territorios de los pueblos indígenas,
garantiza la continuidad de las sabidurías ancestrales y conocimientos colectivos.
Respetar y garantizar a los pueblos indígenas sus propias instituciones
organizativas incluyendo sus lenguas originarias.
Establecimiento de un mecanismo de registro, diseñado y conducido por las
propias organizaciones de pueblos indignas sobre sus sabidurías ancestrales,
conocimientos colectivos, innovaciones y prácticas, de acuerdo a las prácticas
consuetudinarias.
Derecho a impulsar el intercambio no comercial de las sabidurías ancestrales,
conocimientos colectivos, innovaciones y prácticas entre los pueblos indígenas.
El derecho a veto, es decir, a cualquier investigación que vaya en contra del
respeto y reconocimiento de los derechos de pueblos indígenas.
La declaratoria de nulidad de cualquier transacción que tenga por objeto
destruir o menoscabar la integridad de las sabidurías ancestrales y conocimientos
colectivos, innovaciones y prácticas de los pueblos indígenas.
Incluir estrategias de prevención de impactos contra la conservación de las
sabidurías ancestrales y conocimientos colectivos, innovaciones y prácticas de los
pueblos indígenas, especialmente por la ejecución de proyectos y megaproyectos
en territorios indígenas.
La custodia y administración de las sabidurías ancestrales y conocimientos
colectivos corresponde a las propias organizaciones de los pueblos indígenas.
•
Garantizar el principio del consentimiento fundamentado previo de los
pueblos indígenas. Una forma sui generis debe regular que este consentimiento 25
sea otorgado de manera colectiva a un pueblo indígena de acuerdo a sus prácticas
consuetudinarias.
Tener presente que un contrato de acceso a los recursos genéticos no
garantiza necesariamente un permiso para utilizar las sabidurías ancestrales y
conocimientos colectivos, sin consulta y consentimiento por las organizaciones de
los pueblos indígenas
Para la COICA y sus objetivos superiores, el establecimiento de un
régimen de protección sui generis de las Sabidurías Ancestrales, solamente tiene
validez se reconoce la propiedad intelectual colectiva e se incorpore elementos
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
26
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
Salvaguarda do Patrimônio Cultural:
bases para constituição de direitos
Ana Gita de Oliveira
Antecedentes
Para Mauss (1971) “Uma parte importante de nossa moral e de nossa vida
estacionou em uma atmosfera mesclada de dons, obrigações e liberdade.
Felizmente, nem tudo foi classificado em termos de compra e venda. As coisas
têm ainda um valor sentimental, além de seu valor venal, caso houvesse apenas
este tipo de classificação. Existem outras moralidades além daquelas
estabelecidas pelo mercado; existem ainda pessoas e grupos sociais que
conservam costumes de outros tempos, costumes aos quais todos nos
submetemos, eventualmente, em algumas épocas ou ocasiões do ano (...) As
coisas que se vendem têm também uma alma e são perseguidas por seus antigos
donos, e as coisas a eles” (MAUSS, 1971, p. 246-247).
Mauss (1971) se referia, desta forma, ao “mana” como uma
espiritualidade contida nas expressões da cultura. Assim, tanto a produção
material quanto suas expressões simbólicas constituem matéria-prima para a
construção e manutenção de tradições, na modernidade. Os constantes novos
sentidos, a permanente construção de novos sentidos e de novas referências
culturais propõem um movimento de natureza política, articulador dos processos
de construção de identificações contemporâneas. São, portanto, os suportes
materiais e a imaterialidade que expressam, os elementos organizadores de
políticas de referenciamento cultural.
Aqui interessam ambos: as “coisas”, conforme expressou Mauss, ou os •
bens culturais classificados como importantes para o mercado – seja por seu valor
venal, seja pelo valor simbólico como, por exemplo, prestígio – sendo o mercado, 27
ele próprio, em razão de sua dinâmica, produtor e recriador de bens referenciais,
como aqueles inseridos nos costumes, nas tradições, ainda sem visibilidade
comercial, mas profundamente enraizados no cotidiano de indivíduos e de
grupos sociais. Conforme afirmou Gonçalves “tais bens são, simultaneamente,
de natureza econômica, moral, religiosa, mágica, política, jurídica, estética,
psicológica e fisiológica. Constituem, de certo modo, extensões morais de seus
proprietários e estes, por sua vez, são partes inseparáveis de totalidades sociais e
cósmicas que transcendem sua condição de indivíduos.” (2003, p.23).
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
Quero dizer com isso que, assim entendido, esse instrumento dá conta dos
processos de construção de identidades datadas historicamente, e resultantes do
manejo e do remanejamento dos elementos existentes no interior das tradições
que lhe dão sentido.
Como inventário cultural, ele pode ser instrumento importante no
mapeamento dos conhecimentos tradicionais associados ou não à biodiversidade,
incluindo-se, nesta vertente, os conhecimentos tradicionais associados à
agrobiodiversidade, como aqueles realizados pelos chamados “melhoristas”. A
metodologia propõe sínteses, entre estas, uma, reveladora dos contextos da
biodiversidade e como eles são apropriados pelos grupos sociais a partir de suas
configurações culturais. Ele realiza, na verdade, esta convergência sócio-ambiental.
REFERÊNCIAS
Anteprojeto de Lei que regulamenta a coleta, o acesso e a remessa de material
biológico, genético e seus produtos, a proteção e o acesso a conhecimentos
tradicionais associados e a repartição de benefícios.
BRASIL.Constituição (1988).
1
Mestre em Sociologia pela Universidade de Brasília, coordenou o setor de Propriedade Intelectual do Museu
Paraense Emílio Goeldi. Atualmente é professora do departamento de direito do Centro Universitário do Pará
(CESUPA) ministrando disciplina de introdução à propriedade intelectual. É também coordenadora do
a
Inventário de Bens Culturais da ilha do Marajó, como colaboradora da 2 .SR do IPHAN.
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
2
Andrade, M. de “Anteprojeto para a Criação do Serviço do Patrimônio Artístico Nacional”. Revista do
Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, no.30, 2002.
3
De acordo com Falcão “...a defesa de Mário de Andrade do patrimônio imaterial não granjeava o mesmo apoio político
da classe média que o patrimônio material de pedra e cal obtinha de nossa elite. Era proposta restrita a um grupo de
intelectuais avançados no tempo. Demanda de ninguém politicamente poderoso. Nem dos partidos de esquerda, nem dos de
direita. Nem dos democratas, nem dos ditatoriais. A preservação da lenda ou da dança indígena não tinha a mesma
legitimidade social de um altar barroco resplandecendo a ouro. Era quase uma extravagância intelectual. Ter razão antes
do tempo, diz o ditado, é errado” (2001, p. 169-170)
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
4
Os requisitos para o registro de um bem cultural de natureza imaterial encontram-se disponíveis no site do
IPHAN: http://www.iphan.gov.br
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
Por outro lado, a documentação dessas fontes não codificadas pode
também servir, numa outra situação, como meio de provar a autoria de
comunidades em ações judiciais envolvendo processos de apropriação de
conhecimento. Neste caso, entretanto, o acesso ao conteúdo deve ser controlado,
mantendo-se sigilo, a exemplo do que ocorre com o registro de software, no qual
as informações referentes ao programa são depositadas no Instituto Nacional de
Propriedade Intelectual (INPI) em envelope lacrado, a ser aberto apenas por
interesse do inventor a fim de comprovação da autoria.
No caso de conhecimentos tradicionais, que não constituem mais
novidade, já amplamente codificados, documentados em artigos científicos e
outros meios, pode-se trabalhar com a idéia da prevenção. O Comitê
Intergovernamental da Organização Mundial de Propriedade Intelectual
(OMPI) tem utilizado informações contidas nos bancos de dados de
conhecimentos tradicionais na consulta prévia dos examinadores de patentes.
Dessa forma, é possível não apenas anular patentes concedidas, como evitar a
própria concessão, se encontrada referência das reivindicações solicitadas em
conhecimentos já documentados. O banco de dados de conhecimento medicinais
Ayurvédicos da Índia, por se constituir apenas de informações já documentadas e
pertencentes ao domínio público, tem como base esse princípio preventivo
(WIPO/GRTKF/IC/3/6).
Decisões sobre o tipo e o grau de detalhamento das informações e as formas
de permissão de acesso ao conteúdo dos bancos de dados costumam ser polêmicas,
gerando muitas discordâncias entre os atores envolvidos. Alguns bancos trabalham
com a idéia da criação de níveis de acesso, limitando o grau de detalhamento das
informações disponíveis de acordo com a natureza do que se é documentado. O
primeiro nível de acesso funcionaria como uma espécie de banco de índices, onde
apenas se indica o tipo de conhecimento que uma dada comunidade possui sobre
um determinado assunto, sem detalhá-lo o suficiente para iniciar qualquer pesquisa
a partir da informação disponível. Dessa forma, a autoria da comunidade e também
•
o seu conhecimento são resguardados, pois os interessados em obter mais
informações devem necessariamente negociar e estabelecer um contrato com a 37
comunidade detentora do saber. Contudo, mesmo os bancos de índices
apresentam problemas quanto ao estabelecimento dos critérios e decisões sobre o
que deve ser divulgado e de que forma deve ser divulgado.
Em fins da década de 90, a Fundación para el Desarrollo de las Ciencia
Físicas, Matemáticas y Naturales da Venezuela (FUDECI) iniciou um grande
inventário nacional com o objetivo de documentar os conhecimentos tradicionais
de povos pertencentes às 24 etnias e comunidades locais do território
venezuelano, reunindo-os num banco de dados. Em três anos de pesquisa, a Base
de Dados BIOZULUA contou com mais de 9.000 entradas referentes a
conhecimentos sobre recursos naturais de interesse comercial e tecnologias
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
5
ver http://www.ictsd.org/dlogue/2001-02-22/eugui.doc
6
ver referência WIPO/GRTKF/IC/3/6
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
cadastramento deve ser gratuito e pode ser solicitado por qualquer comunidade,
sem que haja qualquer avaliação quanto a critérios de relevância para o registro.
Além disso, o registro não constituiria condição obrigatória para atestar a
titularidade do bem cultural indígena. Neste caso, também, não houve
continuidade devido a dificuldades de infra-estrutura institucional.
7
A mesorregião do Marajó, além dessas duas microrregiões, inclui outras ilhas menores que compõem o
arquipélago, como a ilha de Gurupá, e, ainda, uma parte de continente, onde localizam-se os municípios de
Melgaço, Portel, Bagre e Oeiras do Pará. Como o inventário se restringe à ilha Grande, essas localidades não
farão parte deste levantamento preliminar.
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
o
O Inventário de Referências Culturais da Ilha do Marajó teve início em 1
de julho de 2004. Num período aproximado de 6 meses de trabalho e uma equipe
composta por três pesquisadores e dois assistentes de pesquisa8, foram visitados
oito municípios e realizadas mais de 200 entrevistas.
Nesse primeiro momento, trata-se apenas do levantamento preliminar,
onde as informações obtidas não têm a mesma profundidade da etapa seguinte,
que constitui o inventário propriamente dito. Contudo, ainda que de forma
preliminar, foi possível ter idéia do tipo de informação que certamente constará
na próxima etapa do inventário. Neste texto, a título de exemplo, serão
registradas apenas 4 situações específicas que se referem a conhecimentos
coletivos de origem difusa associados a biodiversidade, uma inovação de caráter
individual, apropriação para uso comercial de expressão recorrente no imaginário
coletivo local e, por fim, apropriação de direitos autorais no âmbito da música.
8
Além do meu envolvimento pessoal na coordenação do trabalho, fazem parte da equipe a etnomusicóloga Líliam
Barros, o geógrafo Edgar Chaves, a estudante de turismo Karla Oliveira e o técnico em áudio-visual Paulo Carvalho.
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
b) inovações de caráter individual
9
cosméticos havia se apropriado da lenda da priprioca , utilizando-a nas
campanhas publicitárias da sua nova linha de perfumes, sem qualquer
favorecimento das comunidades mantenedoras dessa expressão.
Certamente esse é o tipo de questão que extrapola o âmbito de discussão e
possibilidades de alcance do INRC, pois, pressupõe o estabelecimento de
diretrizes mais globais em termos do uso de imagens ou de qualquer um dos
componentes culturais das populações tradicionais, com o fim de agregar valor a
produtos industrializados. Uma alternativa a essa situação, principalmente em se
tratando de conhecimentos tão difusos como no caso da priprioca, seria o
estabelecimento de um fundo no qual os recursos seriam revertidos para o
desenvolvimento de projetos com comunidades em geral.
O estabelecimento de um fundo visando à repartição de benefícios, nos
casos de conhecimentos de origem difusa, tem constituído objeto de debate no
âmbito do Conselho de Gestão do Patrimônio Genético (CGEN) e outros
fóruns de discussões sobre a criação de um regime sui generis de proteção. Não há,
contudo, até o momento, qualquer perspectiva de consenso sobre o assunto.
9
A lenda conta a estória do índio Piri-Piri, que desapareceu com um encantamento, deixando em seu lugar uma
nuvem de fumaça de aroma agradável. No mesmo lugar nasceu, posteriormente, uma grama de raízes que exalava
o mesmo odor. As índias passaram então a utilizar a raiz para lavar os cabelos e o corpo, chamando-a de
Piripirioca, hoje priprioca.
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
Nesse sentido, a documentação no inventário certamente pode favorecer a
identificação dessas autorias, servindo de prova contra apropriações indevidas,
desde que os pesquisadores estejam sensíveis a essas questões no momento de
realização da pesquisa.
A partir dessas quatro experiências do trabalho de campo do
levantamento preliminar do Inventário da ilha do Marajó, constatamos a
existência de informações ainda não documentadas, que, como vimos, dizem
respeito tanto a práticas e saberes coletivos transmitidos oralmente nas
comunidades, quanto a inovações resultantes de atos individuais. Desse forma, é
importante que se adotem procedimentos administrativos e operacionais visando
a assegurar que a realização do inventário e, sobretudo, o acesso público aos
resultados do mesmo não facilitem a apropriação dos conhecimentos
tradicionais. Mas, num sentido oposto, constitua um instrumento de preservação
dos direitos patrimoniais das comunidades sobre suas criações e saberes.
Dentre esses procedimentos podemos destacar a necessidade de proteção
autoral da base de dados do próprio inventário, o cuidado com o estabelecimento
de contratos com instituições parceiras para o uso da metodologia, a necessidade
de obtenção de consentimento prévio junto às comunidades para a realização da
pesquisa e divulgação das informações, o alerta ao usuário do banco sobre as
implicações legais de usos não-autorizados das informações e a necessidade da
assinatura de termos de sigilo pela equipe contratada no que se refere a
informações a serem definidas como de acesso restrito.
Ações mais amplas, visando à parceira com outros órgãos e entidades
como o CGEN, o INPI e instituições de fomento e geração de renda às
comunidades, como SEBRAE, governos locais e outros, também devem ser
pensadas. Assim, uma vez constatado que esse mecanismo pode servir como
forma de proteção, ainda que indireta, aos conhecimentos tradicionais, faz-se
importante a aproximação dos fóruns de discussão que tratam sobre esse assunto,
mesmo que o viés destes até então tenha sido a proteção ao conhecimento •
tradicional associado à biodiversidade. Neste aspecto, o CGEN tem liderado as 43
discussões no país e, a partir da congregação dos atores interessados na temática,
vem alcançando bons resultados e avanços quanto a legislações e outros
mecanismos referentes ao acesso e à repartição de benefícios de produtos e
processos originados de saberes tradicionais.
10
As missões de enquetes foram realizadas entre 1998 e 1999 e o relatório final encontra-se disponível em:
www.wipo.int/globalissues/tk/repor/final/index.
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
REFERÊNCIAS
BELAS, C.A. A Propriedade Intelectual no Âmbito dos Direitos Difusos. In:
TEIXEIRA, J.G.L.C. et al. (Org.). Patrimônio Imaterial, Performance
Cultural e (Re)Tradicionalização. Brasília: ICS-UnB, 2004.
CARVALHO, L. O desejo de Betinho e o decreto do presidente ou a questão da
autoria no bumba-meu-boi do Maranhão e as políticas para o patrimônio
imaterial no Brasil. In: LONDRES, Cecília et al. Celebrações e Saberes da
Cultura Popular: pesquisa, inventário, crítica, perspectivas. Rio de Janeiro:
Funarte, Iphan, CNFCP, 2004. (Encontros e Estudos, 5), 2004.
_____.2004. Reflexões sobre a experiência de aplicação dos instrumentos do
Inventário Nacional de Referências Culturais. In: LONDRES, Cecília et al.
Celebrações e Saberes da Cultura Popular: pesquisa, inventário, crítica,
perspectivas. Rio de Janeiro: Funarte, Iphan, CNFCP. (Encontros e Estudos, 5).
47
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
Bem Imaterial - SEMINÁRIO
Mario Sérgio Sobral Costa
“OS TERENA”
• Características:
1. Pertencentes ao tronco lingüístico Aruaque.
2. Primeiros relatos datados de 1845 (Francis de Castelnau).
3. População de, aproximadamente, 18.000 (dezoito) mil pessoas.
4. Habitam as reservas indígenas localizadas nos municípios de
Anastácio, Aquidauana, Dois Irmãos do Buriti, Miranda, Nioaque,
Rochedo e Sidrolândia, existindo outros grupos vivendo nas reservas dos •
Kadiwéu em Porto Murtinho, dos Guarani-Kaiowá em Dourados e na 49
reserva dos Kaingang na região de Bauru – SP.
5. Fonte de renda: comercialização de gêneros alimentícios e produtos
artesanais, além de empregar a sua mão-de-obra em destilarias e
fazendas locais.
• Divisão Histórica:
1.“Tempos Antigos”: saída do Êxiva, no decorrer do século XVIII,
passando pelo rio Paraguai e ocupando a região do atual estado de Mato
Grosso do Sul. Ocuparam vasto território e realizaram importantes
alianças com os Guaicuru e Portugueses.
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
• A Guerra do Paraguai:
1. A guerra pôs fim à autonomia dos Terena, que tiveram seu território
ocupado pelos paraguaios.
2. Aliança com as tropas brasileiras para defesa da região.
3. O fim do conflito não significou o restabelecimento de suas terras.
4. O Governo Imperial intensifica a presença de brasileiros na região de
fronteira e a doação de significativas extensões de terra aos oficiais
participantes da guerra.
5. As áreas sofrem drástica redução, acarretando o desaparecimento de
aldeias e a dispersão de parte da população indígena para fazendas e
refúgios da região.
6. Modificação do relacionamento com a população local, antes baseada
na troca recíproca e no comércio justo.
7. Perda das bases territoriais de origem, já ocupadas por terceiros que
permaneceram na região após o conflito.
8. Reorganização das áreas afetadas pela guerra.
“CERÂMICA TERENA”
• Peculiaridades:
1. Queima das peças em 30 (trinta) minutos.
2. Seguem regras de evitação:
- Não coletam barro (argila) durante o período de lua nova.
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
- Não consomem alimentos (pães e alimentos com farinha) durante a
produção das peças.
- Não efetuam nenhuma espécie de trabalho doméstico durante a
fabricação das peças.
- Não produzem peças durante o período em que estão menstruadas.
• Principais Causas:
1. A pouca ou, em alguns casos, inexistente produção artesanal nas aldeias
indígenas do estado, em conseqüência do contato com o homem branco •
que introduziu, em seu cotidiano, a utilização de novos artefatos.
51
2. A falta de incentivo e de políticas adequadas para tratamento da arte
indígena.
3. Introdução de práticas artesanais estranhas à cultura tradicional que
ocasionaram modificações substanciais em sua forma de expressão.
4. A alteração na forma de produção material dessas comunidades, antes
revestida de caráter ritualístico e hoje caracterizada apenas como produto
destinado ao mercado consumidor.
5. Implementação de mecanismos que permitam o reconhecimento dos
valores tradicionais indígenas.
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
• Finalidades:
1. Levantamento do Patrimônio Cultural Terena.
2. Realização de oficinas para o repasse de saberes tradicionais.
3. Produção e comercialização da cerâmica.
4. Geração de renda para as famílias indígenas Terena.
5. Facilitar o escoamento da produção, tornando-a mais acessível ao público.
6. Melhorar a qualidade da produção.
7. Agregar valor cultural e étnico à produção.
• Etapas:
1. Pré-seleção das aldeias.
2. Reunião com a comunidade e seus representantes.
3. Trabalho de conscientização sobre a importância da retomada da
produção cerâmica.
4. Identificação da iconografia Terena.
5. Verificação das matérias-primas nativas disponíveis.
6. Identificação das mestras artesãs para ministrarem os cursos de
capacitação.
7. Identificação dos rituais que envolvem a produção da cerâmica Terena.
• 8. Início e acompanhamento das oficinas de arte indígena.
52 • Estratégias:
1. Compra de todas as peças produzidas durante o período em que foram
realizados os cursos de capacitação – 2.000 (duas mil) peças.
2. Parceria com o Centro Nacional de Folclore e Cultura Popular, para a
realização de exposição e comercialização destas peças na Sala do Artista
Popular, no Rio de Janeiro/RJ.
3. Divulgação dos produtos e expansão do mercado através de exposição
itinerante.
4. Produção de catálogos etnográficos e etiquetas diferenciais.
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
5. Realização de exposição e comercialização das peças no Museu de Arte
Contemporânea – MARCO, em Campo Grande/MS.
• Conseqüências Indiretas:
1. Convites para realização de exposições e comercialização da produção
Cerâmica em outros estados:
• São Paulo - 27 de abril a 02 de maio.
• Curitiba - 29 de abril a 09 de maio.
• Brasília - mês de maio.
• Circuito Cultural Banco do Brasil - 20 a 23 de maio
• Porto Alegre - mês de junho.
2. Instrução do Processo de Tombamento Estadual da Cerâmica Terena,
aberto durante a exposição realizada em Campo Grande no Museu de
Arte Contemporânea.
3. Realização do “1º Encontro de Discussão sobre Direitos Culturais
Difusos”, realizado nos dias 21 e 22 de junho no Museu de Arte
Contemporânea - Campo Grande, onde foram discutidos:
• Os elementos de amparo legal aos conhecimentos tradicionais,
às culturas populares e indígenas.
• Estabelecimento de condutas para as ações do Estado e da sociedade
com relação a estas populações.
53
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
Círio de Nossa Senhora de Nazaré em
Belém/PA: inventário e registro
como patrimônio cultural brasileiro
Maria Dorotéa de Lima1
1
Arquiteta e urbanista da 2ªSR/IPHAN. Coordenou, em Belém, o inventário e a instrução do processo de registro
do Círio como patrimônio cultural brasileiro. É co-autora do Dossiê Círio de Nazaré.
2
Livro dos Saberes, para o registro de modos de saber e fazer enraizados no cotidiano dos grupos sociais; Livro das
Celebrações destinado à inscrição de festas, rituais e folguedos que marcam a vivência coletiva do trabalho, da
religiosidade, do entretenimento e outras práticas da vida social; Livro das Formas de Expressão para as
manifestações literárias, musicais, plásticas, cênicas e lúdicas; Livro dos Lugares para inscrição de espaços onde se
concentram e reproduzem práticas sociais coletivas como mercados, feiras, praças e santuários (Decreto nº
3.551/2000, Art.1, § 1º)
3
Para maiores informações sobre o Registro e o Programa Nacional do Patrimônio Imaterial ver
http://www.iphan.gov.br/patrimonioimaterial
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
4
sua preservação . Trabalha com as mesmas categorias de bens criadas pelo
5
Decreto nº 3551/2000, acrescidas de edificações .
O plano de salvaguarda pretende assegurar a permanência, de modo
sustentável, daqueles bens cuja continuidade encontra-se ameaçada, conforme
detectado pelo inventário. Sua elaboração e implementação devem propiciar a
melhoria das condições materiais, ambientais e sociais necessárias à transmissão e
reprodução das manifestações cuja existência se encontra sob risco de
desaparecimento. É o conhecimento sobre o bem, resultante do inventário, que
permitirá a identificação das medidas necessárias à sua preservação, que vão do
simples apoio financeiro até a resolução de problemas de organização social,
transposição de dificuldades para obtenção de matéria-prima ou transmissão dos
conhecimentos para novas gerações.
No momento em que se discute a legislação nacional de proteção da
biodiversidade e dos conhecimentos tradicionais, com ênfase na questão do
reconhecimento legal da propriedade intelectual coletiva, é pertinente observar,
também, as possibilidades vislumbradas nesse sentido com os instrumentos acima
referidos que, entretanto, considerados isoladamente, são insuficientes não só para
assegurar a proteção desse patrimônio, mas também para garantir direitos legais de
titularidade. Viana (2004, p. 21-24) reflete sobre essa questão, revelando
preocupações com os possíveis desdobramentos que o registro de um bem de
natureza imaterial como patrimônio nacional possa trazer para seus produtores do
ponto de vista de seu reconhecimento como bem de interesse público:
4
IPHAN (2000, pp.i, ii, 2-5.)
5
Estruturas edificadas associadas a determinados usos, a significações históricas e de memória ou a imagens que se
tem de certos lugares. Representam bens de interesse diferenciado para determinado grupo social, nem sempre
vinculado ao fator estético (IPHAN, 2000, p. 9).
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
no plano federal, pelo Conselho de Gestão do Patrimônio Genético – CGEN,
vinculado ao Ministério do Meio Ambiente – MMA. Formado por representantes
de vários ministérios, dentre os quais o Ministério da Cultura - MinC, o CGEN
conta, também, com a participação de entidades representativas da sociedade civil,
inclusive das populações tradicionais, e, dentre outras coisas, está trabalhando na
elaboração do Anteprojeto de Lei de Acesso ao Material Genético e seus Produtos,
à proteção aos Conhecimentos Tradicionais Associados e à Repartição de
Benefícios Derivados de seu Uso em substituição à Medida Provisória 2186 –
16/01, atualmente o principal instrumento legal de regulamentação do acesso aos
recursos genéticos associados aos conhecimentos tradicionais6.
Não é aleatoriamente, portanto, que este seminário - cujo enfoque é o
patrimônio cultural e a propriedade intelectual - conta com a parceria do IPHAN
na realização e de seus técnicos nas mesas redondas, trazendo relatos da
experiência de aplicação do INRC. Os técnicos do Centro Nacional de Folclore e
Cultura Popular – CNFCP apresentam os resultados da aplicação dessa
metodologia, no bojo do projeto Celebrações e Saberes da Cultura Popular7, nos
inventários do acarajé e da viola de cocho. A 2ª Superintendência Regional -
2ªSR/IPHAN, de Belém, apresenta o inventário e o registro do Círio de Nossa
Senhora de Nazaré, dos quais trataremos com mais detalhes adiante.
Conforme estabelecido pelo Decreto nº 3551/2000 e pela Portaria
IPHAN nº 208, de 24 de julho de 20028, o registro de um bem cultural de
natureza imaterial deve ser iniciado por solicitação dirigida ao presidente do
9
IPHAN , acompanhada, minimamente, da identificação completa do
proponente; da descrição sumária do bem com informações culturais, históricas e
sociais; de documentação iconográfica e referências documentais e bibliográficas.
Recebida e conferida a documentação, o processo é encaminhado à
Superintendência Regional em cuja jurisdição esteja localizado o bem, com as
devidas orientações do Departamento de Patrimônio Imaterial - DPI para
instrução técnica do processo e desenvolvimento dos estudos necessários, que
são: inventário; descrição pormenorizada do bem, incluindo sua formação e •
evolução histórica; pesquisas detalhando os demais elementos culturalmente 57
relevantes associados ao bem; documentação audiovisual. O resultado desses
estudos será condensado em um dossiê que também integrará o processo.
6
Belas (2004, p. 7-10) .
7
Cf. Vianna (2004, p. 15-16), o projeto Celebrações e Saberes da Cultura Popular foi criado pelo CNCP no âmbito
do Programa Nacional do Patrimônio Imaterial com o objetivo de testar, refletir e avaliar sobre a aplicação e
possibilidades dos novos instrumentos (Registro e INRC) de proteção e salvaguarda do patrimônio imaterial.
8
Estabelece os procedimentos para instauração e instrução do processo administrativo e efetivo registro dos bens
culturais de natureza imaterial.
9
A solicitação de registro poderá ser apresentada pelo Ministro da Cultura; instituições vinculadas ao MinC;
secretarias de Estado, Municípios e Distrito Federal; sociedades ou associações civis.
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
10
Através da Lei nº 8.313/91 que institui o Programa Nacional de Apoio à Cultura – PRONAC e do Decreto nº
1.494/95 que regulamenta a aplicação desta lei e define os procedimentos de execução do PRONAC.
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
introdução, informações sobre a legislação e os procedimentos
técnico-administrativos pertinentes ao inventário e ao registro dos bens culturais
de natureza imaterial. Seguidamente, traçaremos algumas breves considerações
sobre a festividade do Círio de Nazaré e, depois, abordaremos alguns aspectos
que consideramos relevantes das etapas de execução do inventário e do registro
desse bem, contribuindo, de certa forma, com uma discussão mais ampla já em
curso, compartilhada por pesquisadores do IPHAN e de outras instituições que
vem trabalhando com a metodologia do INRC. Além disso, pretendemos
divulgar esses instrumentos de identificação e registro do patrimônio imaterial
como uma alternativa viável para questões relacionadas à comprovação de autoria
nos processos judiciais de apropriação de conhecimento, ou, ainda, como fonte
de consulta prévia a concessões de patente. Experiências com banco de dados
nesse sentido vêm sendo implementadas por países como Venezuela e Índia. No
Brasil, a Fundação Nacional do Índio – FUNAI e o Instituto Nacional de
Propriedade Industrial - INPI tiveram iniciativas com esse fim que, entretanto,
não chegaram a se consolidar11. A questão precisa ser amadurecida e discutida
com os principais interessados – as populações tradicionais. Há possibilidades e
controvérsias, além de um longo caminho jurídico e institucional a ser percorrido.
Pretende-se, ainda, nesta breve apresentação de nossa experiência com o
Círio, divulgar a legislação, os procedimentos do registro e a própria metodologia
do INRC, ampliando as possibilidades de novas parcerias na identificação e
registro das referências nacionais da cultura imaterial brasileira, de modo que esta
represente, de fato, os diferentes grupos formadores da sociedade brasileira.
11
Belas (2004, p. 11-15)
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
12
O segundo domingo de outubro foi fixado como dia do círio apenas em 1901, pelo bispo Dom Francisco do Rego
Maia. Antes disso, não havia uma data certa para a procissão que poderia ser em setembro, outubro ou novembro.
(Para maiores informações ver Dossiê Círio de Nazaré (IPHAN, 2004, p. 25)
13
A programação dita oficial é aquela estabelecida e divulgada pela igreja, através da Diretoria da Festividade de
Nazaré, instituição, criada em 1910, constituída por representantes de vários segmentos da sociedade local e
presidida pelo pároco de Nazaré.
14
Foram registradas no inventário 2 imagens de N.S. de Nazaré, consideradas as mais importantes nos rituais de
celebração do Círio e na devoção: a imagem dita “original”, que foi “achada” por Plácido, e aquela que é conhecida
como “peregrina”, uma réplica, de feições caboclas e tez morena, confeccionada na cidade de Cortzen, na Itália, na
década de sessenta do século XX, que passou a participar das procissões por questões de segurança da imagem
“original” que, desde então, fica na glória do altar-mor da Basílica de Nazaré. Para maiores informações ver
Inventário do Círio de Nazaré (2004: Formas de Expressão/Imagens de N.S. de Nazaré).
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
como o Arraial, a Feira de Brinquedos de Miriti, a Festa da Chiquita, o Auto do
Círio e, mais recentemente, o Arraial do Pavulagem15.
15
Descrições pormenorizadas dessas procissões e demais eventos podem ser encontradas no Inventário do Círio de
Nazaré (IPHAN, 2004- A, Fichas de identificação dos bens culturais) e também no Dossiê Círio de Nazaré
(IPHAN, 2004-B).
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
16
O parecer transcreve, como exemplo dessa relação dos paraenses com a santa, a letra da música Nazaré (zouk da
Naza) de autoria de Almir Gabriel.
17
Parecer conclusivo do DPI/IPHAN
18
Para maiores informações sobre as discussões estabelecidas pelo Grupo de Trabalho Patrimônio Imaterial –
GTPI para a escolha da expressão que melhor refletisse esse conjunto de bens culturais também denominados
como “intangíveis”, “cultura popular e tradicional”, “patrimônio oral” etc. ver SANT’ANNA (2003,
introdução, p. 16-18).
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
O conceito de referências culturais, muito utilizado pela metodologia do
INRC, pode ser traduzido como fatos, atividades e objetos que mobilizam a gente mais
próxima e que reaproximam os que estão longe, para que se reviva o sentimento de
participar e de pertencer a um grupo, de possuir um lugar. Em suma, referências são objetos,
práticas e lugares apropriados pela cultura na construção de sentidos de identidade.19
Elaborado pelo Departamento de Patrimônio Imaterial com a
participação da 2ª SR/IPHAN, o projeto do inventário do Círio, estruturado a
partir da metodologia do INRC, já apontava a necessidade de equipe
multidisciplinar para realizar as pesquisas. Sendo assim, foi constituída equipe
formada por um consultor na área de antropologia20, que ajudou a identificar os
demais integrantes; supervisor para os trabalhos de campo; quatro pesquisadores
de nível superior nas áreas de história, ciências sociais, filosofia e afins e duas
assistentes21. O inventário foi coordenado pela 2ª SR/IPHAN22 e supervisionado
23
pelo DPI . A etapa de finalização do trabalho, que se deu nos anos de 2003 e
24
2004, foi executada diretamente pela 2ª SR/IPHAN , mas contou com a
25
participação de três dos pesquisadores (envolveu atividades como revisão das
fichas, complementação dos dados, elaboração de mapas e croquis, codificação
do material bibliográfico e audiovisual).
O total de recursos aplicados na instrução do processo de registro foi da
ordem de R$ 242.070,90 (duzentos e quarenta e dois mil, setenta reais e noventa
centavos), provenientes dos recursos orçamentários do IPHAN e do Fundo
Nacional de Cultura – FNC do MinC. Os trabalhos realizados envolveram a
produção de vídeo, pesquisa iconográfica e bibliográfica, inventário e elaboração
do dossiê e estenderam-se de dezembro de 2000 até setembro de 2004, quando o
Círio foi inscrito no Livro das Celebrações26.
No desenrolar da pesquisa, devido a seu caráter experimental, pois a
metodologia utilizada foi aplicada de forma inaugural em bem da categoria
celebrações, foram enfrentados problemas diversos, tanto de ordem conceitual
•
19
20
IPHAN (2000, p. 7-8) 63
Dr. Raymundo Heraldo Maués
21
Supervisor- Msc. Josimar Azevedo; pesquisadores - Elielson Rodrigues da Silva, Gilmar Matta da Silva, Márcio
Couto Henrique, Paulo Roberto Rodrigues Benjamin; assistentes de pesquisa - Altina Marques de Almeida e
Joilma Alves de Castro.
22
Maria Dorotéa de Lima
23
Msc.Ana Cláudia de Lima e Alves e Dra. Ana Gita de Oliveira.
24
Maria Dorotéa de Lima, Carmem Sílvia Viana Trindade, Isís Jesus Ribeiro, Nívia de Morais Brito
25
Márcio Couto Henrique, Gilmar Matta da Silva, Paulo Roberto Rodrigues Benjamin
26
O Decreto 3551, de 4 de agosto de 2000, institui o registro de bens culturais de natureza imaterial e cria 4 livros
para inscrição dos bens: Livro de Registro dos Saberes, Livro dos Registros das Celebrações, Livro do Registro
das Formas de Expressão e Livro do Registro dos Lugares. O INRC propõe trabalhar com essas categorias de
bens e acrescenta Edificações, pela possibilidade de identificar bens passíveis de tombamento por sua relevância
para os grupos sociais pesquisados.
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
27
Barcas e carros dos anjos e de ex-votos, carro de D. Fuas Roupinho e carro do Plácido.
28
Maués e Lima (2005)
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
dos dados, bem como à comparação destes entre estados e regiões. São, porém,
muito longos e detalhados, logo, exigem disponibilidade de tempo e boa vontade
dos informantes para serem preenchidos.
Como pontos positivos dos questionários apontamos, além da
possibilidade de sistematização e comparação dos dados, os campos direcionados
à descrição minuciosa do processo de produção dos bens. Sem esquecer da
facilidade de conexão, através do banco de dados, entre os bens culturais
inventariados a partir dos códigos atribuídos a cada ficha. Permite também que
sejam formuladas nas fichas de identificação, indicações para tombamentos e
registros considerados pertinentes, além de permitir identificar bens ameaçados
de desaparecimento com indicação de medidas de salvaguarda que assegurem a
continuidade daquelas manifestações ameaçadas.
29
Forma apresentada na Certidão de Registro do Círio
30
Celebração em que grupos homossexuais homenageiam a santa e aproveitam o momento para promover suas causas
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
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Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
OBJETO ETNOGRÁFICO, COLEÇÕES
E MUSEUS
Lucia Hussak van Velthem
1
As mais amplas coleções, históricas e modernas, encontram-se depositadas em quatro museus: Museu Nacional/
UFRJ e Museu do Indio/ FUNAI situados no Rio de Janeiro; Museu de Arqueologia e Etnologia/USP em São
Paulo e Museu Paraense Emílio Goeldi/MCT em Belém. Uma listagem não exaustiva assinala que coleções de
procedência indígena podem ser encontradas no Museu do Estado de Pernambuco, Recife; no Instituto
Histórico e Geográfico de Alagoas, Maceió; no Museu do Indio/UFUb, Uberlândia; no Museu Regional “Dom
Bosco”, Campo Grande; no Museu Antropológico/UFG, Goiânia; na Comissão Demarcadora de
Limites/MRE e no Laboratório de Antropologia do CFCH/UFPa em Belém, no Museu de Arqueologia e
Etnologia/UFBA, Salvador; no Museu Histórico Nacional/MinC, Rio de Janeiro.
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
BIBLIOGRAFIA
Cannizzo, J. 1998. Colonialism and the object
Pinna, G. 1999. Le rôle social des musées d’histoire naturelle. Cahiers d’Étude,
7. Paris: ICOM/NatHist.Mus.
Smith, C.S. 1989. Museum, artefacts, and meanings. The new museology.
Van Velthem, L.H. 2000. Em outros tempos e nos tempos atuais: arte indígena.
Artes Indigenas. Mostra do Redescobrimento. São Paulo: Associação Brasil 500
Anos, 58-99.
77
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
Patrimonio Indígena.
Derrotero Hacia Su Regulación Legal
en la Argentina
Teodora Zamudio
Introduccion
Si bien el término “patrimonio” en su acepción actual se refiere al conjunto
de bienes pertenecientes a alguna persona (física o jurídica), independientemente
de su origen, su raíz es latina y originalmente se refería al conjunto de bienes que
alguien había adquirido por herencia familiar; eran los bienes que provenían del
pater (padre). La terminología en inglés para bienes patrimoniales emplea, hasta el
día de hoy, el término “heritage”, que hace referencia directa al concepto de
preservar lo que se ha heredado de generaciones anteriores.
El patrimonio cultural de un pueblo comprende todos aquellos bienes que
son expresiones y testimonios de la creación humana propios de ese pueblo. Es el
conjunto de obras, arte, sitios y restos arqueológicos, colecciones (zoológicas,
botánicas o geológicas), libros, manuscritos, documentos, música, fotografías,
producción cinematográfica y objetos culturales en general que dan cuenta de la
manera de ser y hacer de un pueblo, de su conocimiento tradicional, de su cultivo
humano y social. Dicho patrimonio es todo aquello que le confiere una identidad
determinada a un pueblo; y como propiedad lo es: comunitaria. Estos bienes son
preservados porque tiene un significado especial, ya sea estético, documental,
histórico, educativo o científico.
Los museos, las bibliotecas y los archivos son quienes conservan el
patrimonio mueble. Frecuentemente se distingue entre el valor económico que •
tienen los bienes culturales de su valor social o cultural. Si bien, en muchos casos, 79
el valor económico de un objeto patrimonial es un antecedente relevante para
determinar la importancia de su preservación, el principal motivo para conservar
bienes culturales radica en el valor social o cultural que estos bienes tienen para un
individuo, comunidad, nación y, en algunos casos, para la humanidad.
A partir del reconocimiento de la existencia de una brecha significativa
entre las nociones de valor cultural y de valor económico del patrimonio cultural
–debido en buena parte a la inexistencia de precios de mercado de gran parte del
patrimonio cultural– lo cual no significa que no tenga ese valor (el económico) y
que no pueda ser disponible y debidamente retribuido.
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
1
Asumido también en los textos constitucionales provinciales: Buenos Aires, artículo 36 inciso 9; Chaco, artículo
37; Chubut, artículos 34 y 95; Formosa, artículo 79; Jujuy, artículo 50; La Pampa, artículo 6, 2° párrafo;
Neuquen, artículo 23 inciso d); Río Negro, artículo 42 y Salta, artículo 5
2
Anteproyectos: Ley marco de la identidad de los pueblos indígenas (presentado ante el Ministerio de Justicia y
Derechos Humanos; mayo 2001) y Decreto reglamentario del artículo 8 inciso j) de la ley 24375 (presentado ante
el Ministerio de Economía, marzo 2003)
3
En octubre de 1994, ratificó –por ley 24.375- el Convenio de Diversidad biológica (conocido como Convenio de
Río de Janeiro ‘92); en diciembre de ese mismo año hizo lo propio con el Acta final que incorpora la Ronda
Uruguay de Negociaciones Comerciales Multilaterales -Declaraciones y entendimientos ministeriales y el
Acuerdo de Marrakech (A.D.P.I.C.)-; más tarde –en julio de 2000- hizo el correspondiente depósito del
Convenio 169 de la Organización Internacional del Trabajo que había ratificado por ley 24.071.
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
animales, vegetales y / o ambientales, tanto de orden material como espiritual, es
un ingrediente importante en los procesos económicos, muchas veces
insustituible y por eso ha de ser retribuido con justicia como el resultado de la
maduración de una nueva posición teórica y práctica respecto de la importancia y
valor de la diversidad cultural para el desarrollo de toda la sociedad; de una
participación que necesita de un claro y expreso pronunciamiento legal sobre la
identidad de los pueblos indígenas y de su organización interna; de su patrimonio
y de la disposición de él de modo seguro, cierto y vinculante.
REGISTRO
El registro de conocimientos tradicionales –propuesto para la Argentina y
abierto a todos los pueblos tradicionales de la Tierra- garantiza a los interesados
la presunción de buena fe sobre el contenido de las inscripciones, en aras de la
seguridad jurídica de quienes pudieran tener un interés legítimo sobre la
propiedad y gestión de los recursos involucrados.
La autoridad de aplicación será responsable del registro que constituirá
jurídicamente la propiedad sobre los conocimientos tradicionales y donde se
volcarán las más importantes contingencias referidas a su gestión y disposición.
Esto permitirá, más allá de la publicidad y oponibilidad de los contenidos
inscriptos, la posibilidad de mantener actualizada la información económica
referida a los intereses en juego, con el mayor detalle para su eficaz protección.
Justamente, ese objetivo ha de concretarse por expreso mandato de la
Constitución de la Nación Argentina. Ha de serlo no sólo porque es una
reivindicación histórica, sino por la específica importancia económica que ese
conocimiento tradicional tiene para el progreso de la técnica y de la ciencia en
general dada su fuerza inspiradora de adelantos y su aplicación demostrativa de
nuevos rumbos para la investigación.
La inscripción es pues de interés no sólo de sus creadores sino de la
sociedad y por ello se propone que la misma esté exenta de aranceles, cuando la
• inscripción la haga un pueblo indígena a su nombre (dejando fuera de tal
exención a miembros individuales o colectivos).
82
Tiene dicho la doctrina más prominente que el constituyente argentino, en
la reforma de 1994, ha contemplado explícitamente en el art. 75, inc.17 a los pueblos
indígenas estableciendo mandatos para el legislador ordinario (Del Dictamen del Dr.
Esteban Urresti). La especial consideración que ha de tener con respecto a lo pueblos
indígenas surge de la propia Constitución como una forma de integrarlos a la
comunidad, por lo cual, el trato que se les brinde tiene sustento constitucional, siendo el
tributo una de las tantas herramientas al alcance del legislador para la consecución de los
objetivos de nuestra ley fundamental.
La igualdad en materia tributaria como igualdad relativa, lleva implícita la
facultad del legislador de crear categorías de contribuyentes. En este sentido, cabe
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
analizar la razonabilidad selectiva, para juzgar si las distinciones, clasificaciones o
categorías obedecen a motivaciones sustantivas o si, por el contrario, establecen
distinciones con el fin de hostilizar o favorecer arbitrariamente a determinadas
personas o clases. (Del Dictamen del Dr. Esteban Urresti)
Dicho lo cual proponemos la exención impositiva para la inscripción del
conocimiento tradicional en el registro específico a crearse. Pero ocurrida la
negociación, sí se impone -al licenciatario o cesionario interesado en la
comercialización e industrialización extensiva- el pago de la inscripción del contrato
de transferencia y el de las anualidades que pudieren corresponder para mantener el
derecho de exclusiva concedido o licenciado por el pueblo titular de registro.
4
Como un antecedente de sana y respetuosa convivencia, se destaca la legislación canadiense (la First Nations Act) en
la que el término “first nations” alude a los primeros pueblos y civilizaciones del continente con relación a los que
llegaron de una manera más tardía, desplazándolos. Se exterioriza así una comprensión socio-política que se
corresponde con el presente estadio de la civilización, la ciencia política y del desarrollo de los derechos humanos.
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También es cierto que la historia registra hechos que tocaron, en mayor o
menor medida, las bases culturales como la tierra, la naturaleza, la religión o la
lengua. Sin embargo, sin subestimar los peligros de destrucción que amenazan la
supervivencia de los pueblos, lo fundamental es que existe la confianza en la
capacidad de sus miembros de retener su cosmovisión aún bajo las condiciones
transformadas inherentes a una sociedad impregnada de colonialismos.
Esas bases culturales se ha revelado como guías insoslayables hacia un
“Dorado” aún más rico y valioso que todos los tesoros conocidos: la biodiversidad.
Un recurso huidizo y esquivo a las definiciones teóricas: oculto, por evidente;
obvio, sólo a los ojos de quienes comprende su idioma no lingüístico.
Esa guía cultural cuyo valor ha sido comprendido por las sociedades
occidentales no es la mera erudición o información, sino el modo fundamental de
relacionarse -pensar, vivenciar, actuar- con la realidad total, que tiene un
determinado grupo de personas o pueblo, sujeta a la evolución histórica.
Objeto
Todo Pueblo o Nación aborigen puede registrar como conocimiento
tradicional aborigen: símbolos, emblemas, alegorías, signos o diseños gráficos, las
formas arquitectónicas; los procesos y métodos para producir expresiones
tangibles del folclore (por ejemplo, instrumentos musicales, canciones entonadas
con ocasión de los nacimientos, defunciones, partidas de caza y pesca, etcétera);
el alfabeto propio; los procesos ceremoniales y los juegos; las medicinas, las
prácticas médicas, la asistencia sanitaria y los métodos de curación tradicionales;
las recetas y los procesos culinarios; los proverbios, los mitos y las gestas épicas;
prácticas culturales y tecnológicas tradicionales y los productos logrados por su
aplicación; y todo otro saber del origen señalado con actual o posible aplicación
comercial o industrial.
No se consideran conocimientos tradicionales y no son registrables
a) los nombres, palabras y signos que constituyan la designación necesaria
o habitual del producto o servicio a distinguir, o que sean meramente descriptivos
de su naturaleza, función, cualidades u otras características;
•
b) los nombres; palabras, signos y frases que hayan surgido del uso
generalizado por la convivencia con otros Pueblos o Naciones o Comunidades 87
antes de su solicitud de registro;
No pueden ser registrados
a) los conocimientos o tecnologías anteriormente registrados por otro
Pueblo o Nación aborigen, en estos casos se deberá someter la inscripción al
procedimiento señalado en esta ley;
b) las denominaciones de origen nacionales o extranjeras. Se entiende por
denominación de origen el nombre de un país, de una región, de un lugar o área
geográfica determinados que sirve para designar un producto originario de ellos,
y cuyas cualidades y características se deben exclusivamente al medio geográfico.
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b) su inventario y descripción;
c) el secuestro de uno de los objetos en infracción.
Sin perjuicio de la facultad del juez de ordenar estas medidas de oficio,
podrá requerir caución suficiente al peticionario cuando estime que éste carezca
de responsabilidad patrimonial para responder en el supuesto de haberse pedido
el embargo sin derecho.
Responsabilidad solidaria
Aquél en cuyo poder se encuentran objetos en infracción, debe acreditar e
informar sobre:
a) el nombre y dirección de quién se los vendió o procuró y la fecha en que
ello ocurrió, con exhibición de la factura o boleta de compra respectiva;
b) la cantidad de unidades fabricadas o vendidas y su precio con exhibición
de la factura o boleta de venta respectiva,
c) la identidad de las personas a quienes les vendió o entregó los objetos
en infracción.
Todo ello deberá constar en el acta que se levantará al realizarse las
medidas en esta ley.
La negativa a suministrar los informes previstos en este artículo, así como
también la carencia de la documentación que sirva de respaldo comercial a los
objetos en infracción, autorizará a presumir que su tenedor es partícipe en la
infracción. Esos informes podrán ampliarse o completarse en sede judicial tanto a
iniciativa del propio interesado como por solicitud del juez, que podrá intimar a
este efecto por un plazo determinado.
• Legitimación
El licenciatario de un conocimiento tradicional registrado podrá solicitar las
92
medidas cautelares previstas en esta ley, aun cuando no mediare acción por parte
del Pueblo o Nación licenciante. Si no dedujera la acción correspondiente dentro
de los quince (15) días hábiles de practicado el embargo o secuestro, éste podrá
dejarse sin efecto a petición del dueño de los objetos embargados o secuestrados.
De la autoridad de aplicación
Creación de la Dirección Nacional de los Conocimientos Tradicionales
La autoridad de aplicación de esta ley es la Dirección Nacional de los
Conocimientos Tradicionales, dependiente del Ministerio de Economía, la que
resolverá respecto de la concesión de los títulos pertinentes.
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
Registro de Conocimientos Tradicionales Aborígenes
La Dirección Nacional de los Conocimientos Tradicionales, anotará las
solicitudes de registro en el orden que le sean presentadas. A tal efecto, llevará un
Libro rubricado y foliado por el Ministerio de Economía. En este libro se
volcarán la fecha y hora de presentación, su número, los indicadores solicitados
de acuerdo con los efectos, propiedades o prácticas aplicables del conocimiento
tradicional, el nombre y domicilio del Pueblo o Nación solicitante y los contratos
de concurrencia y licencia que se notifiquen.
Certificado de Registro
El certificado de registro consistirá en un testimonio de la resolución de
reconocimiento de la titularidad, acompañado del duplicado de su descripción
por indicadores y llevará la firma del responsable de la Dirección Nacional de los
Conocimientos Tradicionales.
Tasas y anualidades
Las inscripciones de conocimientos tradicionales aborígenes que se
realicen ante la Dirección Nacional de los Conocimientos Tradicionales no están
sujetos al pago de tasas
Las anualidades que correspondan ser abonadas por los licenciatarios
durante el período de vigencia de la licencia será fijada por la reglamentación.
Dichos montos serán actualizados según lo previsto para las multas.
Disposiciones transitorias y derogatorias
Inscripciones anteriores
Los títulos de propiedad intelectual o industrial concedidos con
anterioridad a la entrada en vigencia de esta ley y cuya eficacia no sea atacada por
interesado legítimo dentro del año de entrada en vigencia de esta ley quedarán
firmes hasta su caducidad de acuerdo con las reglamentaciones que, en cada caso, •
le sean aplicables.
93
Entrada en vigencia
La presente ley entrará en vigencia a los treinta (30) días de su publicación
en el Boletín Oficial.
Reglamentación
La presente ley deberá ser reglamentada dentro de los Sesenta (60) días
de su sanción.
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
De forma
Comuníquese, publíquese. Dése a la Dirección Nacional del Registro
Oficial y archívese.
Fundamentos
Ley de Transferencia de Conocimientos y Tecnología Tradicional
Aborigen
Artículo 1. Actos comprendidos
Artículo 2. Requisitos sustanciales
Artículo 3. Consentimiento informado previo
Artículo 4. Requisitos formales
Artículo 5. Aprobación
Artículo 6. Recursos
Artículo 7. Efectos de la no aprobación o no presentación
Artículo 8. Obligaciones fiscales del licenciatario
Artículo 9. Explotación conjunta. Aporte social
Artículo 10. Inscripción
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FUNDAMENTOS
Ante el inminente avance de la globalización, el libre comercio y de la
integración de las economías, uno de los aspectos medulares que es necesario
considerar es la trasferencia de tecnología tradicional: la regulación de la protección,
cesión, licencia, de la explotación de los conocimientos técnicos tradicionales.
Ante todo este conjunto de fenómenos que se desarrollan actualmente, el
Derecho juega un papel trascendental, a efecto de dar una solución a las
necesidades económico-socio-culturales, y para el caso, la figura jurídica medular
es el Contrato de Transferencia de Tecnología.
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
La tecnología es la información, métodos e instrumentos por medio de los
cuales se utiliza los recursos materiales del ambiente para satisfacer diversas
necesidades y deseos. A su tiempo, su transferencia involucra la transmisión del
uso o se autoriza la explotación de tales conocimientos técnicos. Es decir, en este
contrato una de las partes aporta un conjunto de conocimientos, asistencia
técnica y elementos materiales para la producción industrial, mientras que la otra
aporta en contraprestación una remuneración económica.
En lo pertinente a la transferencia de tecnología y conocimientos
tradicionales la legislación de los países proveedores han de regular teniendo
especial resguardo de la brecha cultural –aunque no sea ella intelectual- entre los
Pueblos que suministran y las empresas que solicitan esta particular tecnología.
Cuidar que este tipo de contratos no sea de libre adhesión, tal como afirma Jorge
Otamendi, que la debilidad del contratante local, los efectos de las pautas
contractuales y agregamos: el drenaje de [conocimiento]. Además, la estipulación
de confidencia al receptor, en virtud de la cual éste no puede divulgar los
conocimientos adquiridos a raíz del contrato por su proveedor.
El modelo de autonomía –para estas transferencias- considera los valores
y creencias de los operadores de una relación como el punto de partida moral
insoslayable en la determinación de las responsabilidades de las partes de una
relación social y jurídica en cualquier ámbito. Cuando los valores de ambos
actores se enfrentan directamente, la responsabilidad fundamental consiste en
respetar y facilitar la autodeterminación en la toma de decisiones. La
obligaciones y virtudes de cada una brotan por lo tanto del principio de
autonomía5. El respeto a la autonomía de los actores es un deber y por lo tanto
puede ser superado por otros principios morales.
El principio de autonomía es la base moral de la doctrina del
consentimiento informado y por lo tanto: fundamentado. Una definición de
autonomía podría esbozarse diciendo que la decisión de una determinada
persona es autónoma si procede de los valores y creencias propias de dicha •
persona, se basa en una información y comprensión adecuadas y no viene
impuestas por coacciones internas o externas; debiendo prevalecer en tanto no 95
dañen a terceros6.
5
BEAUCHAMP, Tom; Mc CULLOGH, Laurence. Ética Médica, Madrid: Labor Universitaria. pág 31 y ss.,
1984.
6
BEAUCHAMP, Tom; CHILDRESS, James . Principles of Bioethics, fourth edition, Oxford University Press,
1994
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
7
FADEN, Ruth ;BEAUCHAMP, Tom. A history and theory of informed consent . New York: Oxfor|d
University Press, 1986, p. 237 y ss.
8
Ibid. p. 248.
9
Desde la sicología, la pregunta central es cómo se comprende, poniendo énfasis en los procesos neurofisiológicos
o cognoscitivos ; por su parte, la filosofía referiría a una teoría de la comprensión . Ibid. p. 249.
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
entre lo que una persona interpreta, la representación mental de una situación y
lo que el otro quiso decir ; es imprescindible una efectiva comunicación.
En una pretensión de máxima, se considerará que una persona tiene total
comprensión de su acción si: hay una aprehensión completa y adecuada de todas
las proposiciones relevantes (aquellas que contribuyen a obtener una apreciación
de la situación)que describen correctamente 1) la naturaleza de la acción y 2) las
consecuencias previsibles y posibles resultados que pudieran seguirse de con
motivo de llevarse a cabo o no una determinada acción10. Las ideas de
correspondencia, precisa interpretación, y efectiva comunicación son básicas.
• una acción autónoma que ésta esté libre de influencias por parte de otras
personas; es decir que sea ejecutada libre de coerción11, persuasión o
12
manipulación . Se requiere la libertad necesaria para que las partes, responsables
de dar su consentimiento y concurrir a la formación del contrato, deliberen,
formen sus juicios de valor y luego decidan u ejecute su decisión (conceptos de
deliberación, decisión y ejecución).
El proceso de consentimiento informado, que tiene por protagonistas a
las partes del contrato, es un proceso de comunicación continua, donde ambas
ponen a disposición recíproca, en términos simples, adaptados a los niveles
culturales diversos de cada una, aquella información relevante acerca del objeto,
proceso y finalidad, los riesgos, alternativas y consecuencias, mediando en lo
posible un plazo razonable de reflexión; proceso que culmina con una declaración
de voluntad que plasma la autorización para proceder donde quedará asimismo
acreditado el proceso de información previa al consentimiento.
El consentimiento informado, integra indudablemente, el marco
contractual de la transferencia de tecnología y conocimiento tradicional, en tanto
puede individualizarse con un doble carácter: a) en sentido estricto, como
‘prestación’13 de la que son deudores la partes y de la que derivan sus derechos a la
más competa y veraz información y además, b) en un sentido amplio, como
•
97
10
FADEN, Ruth ; BEAUCHAMP, Tom. A history and theory of informed consent ; New York, Oxford, :
Oxfor|d University Press, 1986, p. 252.
11
La coerción ocurre si una de las partes, intencional y exitosamente influencia a otra mediante una amenaza creíble de
un daño evitable tan severo que la persona es incapaz de resistir o actuar de modo de evitarlo. La manipulación se
caracteriza por lograr que una persona haga aquello que el manipulador desea, sin recurrir a la coerción o la
persuasión sino alterando la percepción de las opciones que se ofrecen a quien debe tomar una decisión.
12
La persuasión refiere a la influencia mediante la apelación a la razón; es el intento exitoso de inducir a alguien
apelando al raciocinio para que ‘libremente’ acepte como propias, creencias, actitudes, valores o acciones
impulsadas por otro. FADEN, Ruth e BEAUCHAMP, Tom ob.cit. p.262-3.
13
Por este motivo es fundamental, el entender que el cómo se brinda la información es una obligación elemental,
derivada -además del actuar ético y por tanto conforme a la reglas de la buena fe de los contratantes- , por lo que
la violación de este precepto entraña, además de una falta ética susceptible de ser evaluada en un procedimiento
disciplinario, un grave incumplimiento contractual
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
Requisitos sustanciales
Los actos jurídicos contemplados en el artículo 1° serán aprobados, si del
examen de los mismos resulta que:
a) sus condiciones han sido consentidas previa información
suficientemente comprendida por las partes contratantes;
b) se prevé el procedimiento de la rendición de cuentas correspondiente
cuando la estipulación de contraprestaciones a favor del proveedor del
conocimiento o tecnología tradicional dependa de porcentaje sobre ganancias del
receptor de la tecnología o conocimiento;
c) el uso que se hará del conocimiento tradicional que es objeto del
contrato será sustentable;
d) la jurisdicción aplicable para el caso de diferencias emergentes del
contrato no podrá ser diferida a jueces extranjeros, ni a árbitros o amigables
componedores extranjeros.
Consentimiento informado previo
•
A los efectos del inciso a) del artículo anterior, se entiende como
consentimiento informado cualquier y todo tipo de información materialmente 99
importante para tomar la decisión de consentir, ella incluye, entre otras cosas,
información sobre el propósito y naturaleza de la aplicación que se dará del
conocimiento tradicional que se transfiere, el alcance de la licencia, transferencia
o cesión respecto del conocimiento o de su uso, los beneficios que las partes
esperan compartir o el carácter de las contraprestaciones que se pretendan pactar,
así como los aspectos del procedimiento a que será sometido o empleado el
conocimiento tradicional que se licencia, transfiere o cede.
La parte receptora deberá comprender la trascendencia del conocimiento
tradicional para la parte proveedora y la cosmovisión en la que esta integrado, y de
que el uso que dará al mismo no la ofende o contradice.
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
Requisitos formales
Junto con los instrumentos de los actos jurídicos que se presenten ante la
Dirección Nacional de los Conocimientos Tradicionales deberán consignarse
con carácter de declaración jurada, los siguientes datos:
a) nombre y domicilio de las partes,
b) indicación de la tecnología o conocimiento cuya licencia o transferencia
es objeto del acto;
c) de tales instrumentos se presentarán copias en –por lo menos-
idioma castellano y en el del Pueblo aborigen que provee el conocimiento o
tecnología tradicional
Aprobación
Los actos jurídicos contemplados en el artículo 1º serán sometidos a la
aprobación de la Dirección Nacional de los Conocimientos Tradicionales.
A los efectos de lo establecido en el párrafo anterior, la Dirección
Nacional de los Conocimientos Tradicionales tendrá un plazo de NOVENTA
(90) días corridos para expedirse respecto de la aprobación. La falta de resolución
en dicho término no significará la aprobación del contrato de transferencia.
Recursos
La resolución denegatoria o falta de la aprobación será apelable ante el
Ministro de Economía dentro de los TREINTA (30) días corridos de notificada
la denegatoria o de transcurrido el plazo establecido en el párrafo anterior, según
el caso. Esta resolución en caso de confirmar la denegatoria de la Dirección
Nacional de los Conocimientos Tradicionales será apelable judicialmente de
acuerdo a lo establecido en la Ley 19.549 sobre Procedimientos Administrativos
ante la Cámara de Apelaciones en lo Federal y Contencioso Administrativo.
• Efectos de la no aprobación o no presentación
100 La falta de aprobación de los actos jurídicos a los que se refiere esta ley o su
falta de presentación podrá ser declarados nulos a petición del proveedor del
conocimiento o tecnología tradicional.
Dicha declaración no afectarán la validez de las prestaciones ya realizadas
a favor del proveedor del conocimiento tradicional, no podrán ser deducidas a los
fines impositivos como gastos por el receptor y la totalidad de los montos pagados
como consecuencia de tales actos será considerada ganancia neta del proveedor.
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
Obligaciones fiscales del licenciatario
El plazo dentro del cual el licenciatario deberá cumplir las cargas fiscales
que correspondan comenzará a correr a partir de la entrega a las partes del
instrumento aprobado.
Explotación conjunta. Aporte social
El conocimiento o la tecnología tradicional aborigen registrado podrá
constituir aporte de capital cuando lo permita la ley de Sociedades Comerciales.
En tales casos la valuación de los aportes también deberá ser aprobada por la
Dirección Nacional de los Conocimientos Tradicionales.
Inscripción
De los contratos que de acuerdo con esta ley sean aprobados, la Dirección
Nacional de los Conocimientos Tradicionales inscribirá en el Registro pertinente
los datos enumerados en el artículo 4° y se hará depositario de un ejemplar
firmado por las partes del contrato.
Los datos mencionado en el artículo 4° estarán disponibles al público a
través del banco de datos a cargo de la Dirección Nacional de los Conocimientos
Tradicionales, el que deberá mantenerse actualizado y será de acceso libre.
De forma
Comuníquese, publíquese. Dése a la Dirección Nacional del Registro
Oficial y archívese.
101
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
Patrimônio Indígena
Eliane Potiguara
a essência indígena é destruída não pode haver peças em museu. “Vejam como
viviam os índios!”, diz o guia turístico. Que hipocresia!
O mesmo acontece com a defesa do meio-ambiente. Não se pode
defender meio-ambiente sem, em primeiro lugar, defender as vidas humanas
daquele espaço físico destruído ou em vias de extinção. Há que educar e salvar a
população daquele espaço para que ela mesma sobreviva aos resultados da
destruição ambiental. Não se coloca a carroça à frente do boi!
Atitudes como essas são xenófobas, discriminatórias, paternalistas:
Mata-se e homenageia-se! Não aludimos às pessoas, mas às políticas
conservadoras do passado que continuam as mesmas.
Sim, as peças e elementos culturais podem ser exaltadas num Museu ou
numa Exposição no Shopping pela história de vida que aquele povo construiu,
beneficiou-se, honrou-se pela sua existência. E não pela sua destruição vitimada
pela colonização, neo-colonização e exploração contemporânea.
O que se reporta aqui é que se quer contribuir com dados éticos para o
futuro, porque se sabe que hoje os museus estão cheios de obras indígenas,
inclusive no exterior, e agora não se pode fazer mais nada.
Sabe-se de vários povos que se têm reportado aos museus para resgate
cultural de um povo que foi muito esfacelado em suas tradições e culturas.
Outro aspecto é que se a história do povo é real e existente e se o mesmo
povo permite as exposições, porque a ela interessa divulgar sua cultura, é válida a
exposição em museus e entidades afins.
Enfim, propriedade intelectual, conhecimentos tradicionais, seres
humanos devem estar inseridos no contexto de uma biodiversidade para que
garanta seus direitos.
No entanto, há povos que preferem manter o segredo de sua cultura como
• foi mencionado há 10 anos atrás no texto a seguir e depois confirmado pelos pajés
106 nas futuras Conferência sobre Conhecimentos Tradicionais, direitos sagrados.
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
1
O Segredo das Mulheres
No passado nossas avós falavam forte
Elas também lutavam
Aí, chegou o homem branco mau
Matador de índio
E fez nossa avó calar
E nosso pai e nosso avô abaixarem a cabeça.
Um dia eles entenderam
Que deviam se unir e ficarem fortes
E a partir daí eles lutaram
Para defender sua terra e cultura.
Durante séculos
As avós e mães esconderam na barriga
As histórias, as músicas, as crianças,
As tradições da casa,
O sentimento da terra onde nasceram, as histórias dos velhos
Que se reuniram pra fumar cachimbo.
Foi o maior segredo das avós e das mães.
Os homens ao saberem do segredo
Ficaram mais forte para o amor, lutaram
E protegeram as mulheres.
Por isso, homens e mulheres juntos
São fortes
E fazem fortes os seus filhos
Para defenderem o segredo das mulheres.
Pra que nunca mais aquele homem branco
Mate a história do índio!
107
1
Texto publicado na cartilha de apoio, um “complemento político” à alfabetização potyguara e a todos os índios do
Brasil de autoria de Eliane Potiguara/1994/apoio Unesco e UERJ.
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
Gravações e acervos a partir da
pesquisa lingüística e cultural como
um passo para revitalização,
fortalecimento e resgate cultural.
Ana Vilacy Galucio
INTRODUÇÃO
Este artigo discute necessidades e possibilidades da documentação
lingüística e cultural envolvendo os povos indígenas no Brasil e o papel
desempenhado pela utilização de gravações e de acervos lingüístico-culturais, em
processos de revitalização, fortalecimento e resgate cultural. A abordagem será
feita a partir de um estudo de caso, apresentando alguns aspectos da experiência
de trabalhos com documentação lingüística e cultural junto aos grupos indígenas
desenvolvidos pela Área de Lingüística do Museu Emílio Goeldi. Esse tipo de
trabalho, hoje, inclui, necessariamente, gravações, especialmente de aspectos da
cultura expressos através da língua.
SITUAÇÃO ATUAL: O que precisa e pode ser feito em termos de documentação
A situação atual das línguas e culturas indígenas no Brasil é crítica, uma
vez que várias das cerca de 160 línguas indígenas ainda faladas hoje no país são
línguas que vivem a ameaça de desaparecer em um futuro não muito distante.
Essa situação ocorre por vários fatores, entre os quais se pode listar, por exemplo,
o número reduzido de falantes de várias dessas línguas e a ruptura na linha de
transmissão para as novas gerações. É o caso da língua Xipáya, no Pará, que tem
•
apenas duas falantes idosas e da língua Puruborá, de Rondônia, também com
apenas dois falantes idosos. Um outro fator que precisa ser considerado é o 109
impacto causado pela expansão econômica desregrada, o que envolve, entre
outras coisas, a atuação não-autorizada de madeireiros e garimpeiros em áreas
indígenas. Essa atuação implica ameaça não somente ao meio-ambiente e à
biodiversidade, mas também à sócio-diversidade, uma vez que afeta diretamente
as populações nativas da região, com suas línguas e culturas.
Essa realidade não é exclusiva do Brasil, existe um quadro mundial, em
que se reporta a perda da diversidade lingüística e cultural, evidenciada,
principalmente, pelo desaparecimento das línguas faladas por povos
minoritários. De um modo geral, uma língua torna-se ameaçada em situações
em que os contextos de uso dessa língua diminuem, o que pode ocorrer, embora
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
1
Para maiores detalhes sobre essa questão da composição e manutenção de acervos e arquivos ver Anthony Seeger,
neste volume.
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
Técnica de Lingüística possui uma coleção de áudio que inclui material, ainda
não totalmente sistematizado, de mais de cinqüenta línguas indígenas brasileiras.
A gravação dos registros lingüísticos e culturais é realizada já há alguns anos,
utilizando gravadores DAT e câmeras de vídeo Hi-8 e, mais recentemente,
gravadores de mini-disco e câmeras mini-DV, microfone profissionais, editores
lineares e não-lineares de vídeo. Atualmente, três projetos efetivos de
documentação lingüístico-cultural estão sendo desenvolvidos no MPEG –
“Documentação de Cinco Línguas Tupi Urgentemente Ameaçadas”,
“Documentação e Descrição do Karo, Brasil” e “Documentação da Língua e
Cultura Aweti”2, este último em parceria com a Universidade Livre de Berlim.
No âmbito de um desses projetos, que inclui a documentação da língua
Sakurabiat, também conhecida como Mekens, de Rondônia, recentemente,
realizamos a compilação de um CD de áudio de músicas do povo Sakurabiat,
reunindo as músicas representativas dos três dialetos da língua ainda falados hoje.
Estamos também trabalhando junto com os Sakurabiat na organização de uma
3
coletânea bilíngüe de algumas de suas narrativas mitológicas tradicionais . O
registro dessas narrativas mitológicas é uma demanda antiga do grupo, uma vez
que apenas quatro pessoas idosas ainda detêm o conhecimento de como contar
esses mitos na língua Sakurabiat. Os Sakurabiat estão conscientes da urgência de
se realizar esse trabalho de documentação, fazem questão absoluta de gravar e
explicar todos os detalhes e querem ter tudo documentado e escrito para que esse
conhecimento não desapareça com os mais velhos, como eles mesmos nos dizem.
Precisamos entender que, com as mudanças estruturais, econômicas e
sociais que afetaram e afetam os grupos indígenas até hoje, a forma tradicional de
transmitir o conhecimento ancestral antes repassado oralmente de geração a
geração também foi afetada. Os grupos indígenas têm plena consciência dessa
realidade e têm buscado, sistematicamente, o apoio de pesquisadores, como
lingüistas e antropólogos para ajudar nesse registro. É claro que o registro escrito
e sonoro per si não garante a manutenção da língua e cultura, mas, por outro lado,
•
esse registro pode ser usado em projetos de revitalização e mesmo de
112 fortalecimento das culturas representadas, além de ajudar a comprovar a origem
do material e os direitos de propriedade intelectual.
O MPEG vem realizando ações experimentais ao lado de outras mais
elaboradas na área de documentação eletrônica de línguas indígenas e eventos
culturais, em conjunto com as comunidades indígenas. Vamos nos reportar a alguns
exemplos desses trabalhos e na resposta provocada nas comunidades envolvidas.
2
Os dois primeiros projetos têm o apoio do Programa de Documentação de Línguas Ameaçadas, da Escola para
Estudos Orientais e Asiáticos da Universidade de Londres, e o terceiro é apoiado pelo Programa DoBes de
Documentação, da Fundação Volkswagen.
3
A edição dessa coletânea tem o apoio da Petrobrás, através da Lei Rouanet de Incentivo à Cultura.
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
Em 2003, gravamos um vídeo no festival de músicas Makurap, realizado na
Área Indígena Guaporé, em Rondônia. Esse trabalho constou de filmagem e
edição, sendo que no trabalho de edição se incluiu legenda e a letra das músicas. Ao
retornar essa gravação para comunidade, observamos que ela gerou estímulo no
interesse na cultura tradicional, entre os Makurap. O comentário do grupo é que
eles gostariam de realizar mais gravações, desta vez com mais cuidado e atenção
para manter o estilo tradicional de ornamentar-se, cantar e dançar em Makurap.
Esse exemplo ilustra como a documentação lingüística e cultural pode funcionar
como estímulo à revitalização, fortalecimento e resgate das culturas tradicionais.
O caso da língua Ayuru também ilustra a utilização de gravações e das
novas tecnologias disponíveis como instrumento de fortalecimento e resgate
cultural. Fitas gravadas com o pajé Ayuru em 1990, por um pesquisador do
MPEG, foram recentemente transferidas para CD e retornadas à comunidade.
Essas gravações continham informações sobre a aprendizagem do pajé Ayuru,
casamento e festas tradicionais, entre outras. A partir do estímulo com o retorno
das gravações, os Ayuru estão interessados em retomar o uso da língua e os
conhecimentos tradicionais.
A cerimônia Kwarup realizada pelo povo Aweti, no parque indígena do
Xingu, foi documentada em vídeo, desde os preparativos da pesca em grande
escala para alimentar os visitantes envolvendo todo o ritual que dura alguns dias, e
terminando no esporte tradicional de lutas entre os homens. Essa documentação
foi feita através do projeto de documentação ampla da língua e cultura Aweti, já
mencionado anteriormente. Quando esse vídeo foi filmado, os Aweti estavam
realizando a cerimônia do Kwarup pela primeira vez depois de 30 anos. A
documentação completa da cerimônia, em todas as suas fases, é uma das
primeiras, se não for a única, documentação extensiva dessa cerimônia, realizada
por vários povos indígenas que vivem no parque indígena do Xingu.
Todas essas experiências têm recebido uma reação muito favorável das
comunidades envolvidas e os resultados produzidos são extremamente populares
não somente entre estas comunidades, mas também, junto a outros grupos •
indígenas da região. Por enquanto, estamos realizando experiências de 113
documentação cultural com grupos indígenas com os quais já trabalhamos na
pesquisa e documentação lingüística e estamos procurando estabelecer diretrizes
metodológicas básicas. Vejamos o caso da gravação de músicas. Para que se
produza uma documentação adequada é necessário investigar a significação
cultural da música na comunidade envolvida e associá-la ao contexto de uso, ou
seja, realizar minimamente um pequeno estudo etnomusicológico, além da
transcrição na língua original e tradução, se possível, das letras. Não é
suficientemente satisfatório, em termos de documentação, efetuar somente a
gravação dissociada das informações e representações pertinentes. Em outras
palavras, é necessário mais que um microfone e um gravador de mini-disco para
se realizar documentação musicológica.
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A questão da documentação de aspectos específicos do patrimônio
cultural imaterial dos povos indígenas no Brasil vem ocupando um espaço
legítimo nas discussões envolvendo patrimônio cultural, através da participação
de representantes do governo, ONGs, pesquisadores e representantes dos povos
indígenas. A utilização desse espaço por todos esses agentes ajuda a realçar o
papel que essa questão representa no atual contexto científico e sócio-econômico.
Existem dois grandes fatores a se considerar quando se discute
documentação: a demanda urgente por parte dos povos indígenas e a
disponibilidade de pessoas e de instituições capacitadas e empenhadas em
desenvolver esse trabalho. Enquanto, por um lado, os povos indígenas estão, cada
vez mais, buscando ter aspectos como língua e cultura (incluindo danças, cantos e
mitos) documentados, por outro lado, ainda não há disponibilidade de pessoas
tecnicamente, qualificadas, para atender a toda essa demanda, na região. Resolver
esse desafio deve ser uma das principais preocupações dos agentes envolvidos.
A documentação lingüística e cultural pode funcionar como um passo
importante na revitalização, fortalecimento e resgate do patrimônio cultural dos
povos indígenas. As gravações presentes em acervos científicos têm sido usadas
como instrumento para tal, em várias partes do mundo. As experiências relatadas
acima ilustram bem como pequenas iniciativas, bem pensadas e estruturadas,
podem desempenhar papel essencial no momento em que vários dos povos
indígenas no Brasil despertam, independentemente, para a necessidade de ter •
suas línguas e outros aspectos da cultura documentados e salvaguardados na 115
forma de registros escritos e áudios-visuais.
Na nossa experiência no MPEG, o consentimento prévio e informado da
comunidade envolvida, bem como, a anuência do órgão governamental relevante,
a FUNAI, no caso dos povos indígenas, são necessários para o bom desempenho
de projetos de documentação, em concordância com os princípios éticos e legais
que regem essas relações e para garantir que os povos indígenas detentores desse
conhecimento tenham seus direitos respeitados. Nesse aspecto, a documentação
cultural e o registro desse material em instituições científicas podem ajudar a
salvaguardar os direitos de propriedade intelectual dos povos indígenas, uma vez
que, assim, o grupo pode comprovar a origem do material.
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
O Jogo de Espelhos: reflexões sobre a
questão da reintegração de gravações
históricas do candomblé
1
baiano nas
comunidades atuais
Angela Lühning
1
Trata-se de uma referência ao projeto de minha autoria, atualmente em fase de andamento, com o título: O jogo
de espelhos: as gravações históricas de Melville Herskovits na percepção e recepção do candomblé baiano hoje.
(Pesquisa apoiada pelo CNPq e pelo PIBIC/UFBA).
2
Exposição “Brasil 500 anos” organizada em São Paulo em 2000. O manto mostrado nesta exposição é originário
do acervo do Museu Nacional da Dinamarca, Copenhagen. É uma capa de penas vermelhas de Guará, coletado
no Brasil entre os séculos XVI e XVII (com 127 x 54 x 25cm). Ver o catálogo da exposição Brazil Soul and Body,
organizado pelo Museum Guggenheim em 2002, p.77.
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
3
Metáfora para a sociedade demais crente na importância dos documentos escritos, em alusão ao termo «cidadão
de papel», cunhado por Gilberto Dimenstein.
4
Infelizmente o contato com arquivos não é muito fácil, sei de diversos casos em que o acesso foi impossível, nem
tanto pelo impedimento da parte de arquivistas, mas sim de regras burocráticas.
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
A idéia do acervo museológico é cunhado em noções de pertencimento e
posse que se baseiam na existência da ação de um colecionador/pesquisador,
responsável pela aquisição de objetos e/ou gravações que por sua vez as entregou
às instituições, em geral européias, nas quais se tornam posse inalienável de
estruturas institucionais, regidas pelo excesso de burocracia, gerando dificuldades
de acesso. Reconhece-se que, sem dúvida, trata-se de materiais bem cuidados,
porém distante de suas raízes, no máximo tentando ganhar funções de
representação simbólica de mundos e culturas desconhecidas, porém, sem, em
geral, conseguir deixar de espelhar laços de dominação cultural/política ainda não
superados. Embora os museus/arquivos tivessem na sua base diversos
colaboradores, em geral, seguem políticas que expressam um pensamento
monolítico que representa algo individual na posse de uma soma de coleções.
Já nas culturas de origem podem existir outras formas de organização do
conhecimento e do acesso ao mesmo, com uma noção do individual e de posse
individual muito menos explícita. Isso leva a outros questionamentos que
complicam o contato entre os detentores de direitos sobre gravações e os
descendentes dos protagonistas destas mesmas gravações.
Quem são hoje os representantes de quem? Quem são hoje os
responsáveis por quem ou o quê? Quem são os possíveis interlocutores entre os
lados envolvidos? Quais as instâncias representativas destas comunidades, nem
sempre tão democráticas, mas cunhadas em outros princípios hierárquicos que
tornam uma simples transposição de experiências e materiais mais complicada do
que imaginado? Como diferenciar um interesse pela reconstrução da história,
algo nem sempre existente, de outros possíveis interesses? Como trabalhar com a
outra dimensão de tempo e com a outra dimensão de representação que os meios
de fixação do som apresentam para os envolvidos?
Para que as reintegrações possam acontecer, não é suficiente decidir
reintegrar, mas, torna-se importante pensar quais pessoas ou estruturas seriam as
mais adequadas para serem depositárias destes conhecimentos ou acervos •
antigos, que, em geral, são representações de um coletivo cultural, mesmo que na
voz de um ou de outro que expressa saberes transmitidos oralmente. Com outras 123
palavras: onde e com quem serão deixadas/arquivadas as cópias de gravações
históricas ou objetos devolvidos, sem repetir simplesmente os formatos
experimentados até então pela história? No caso das casas de candomblé, muitas
delas hoje estão criando memoriais de sua história, visando algo parecido com
pequenos museus. Mas o que acontecerá de fato com as possíveis cópias das
gravações de Herskovits que de fato pertencem à história das casas? Ficarão tão
intocáveis como nos acervos que cuidaram durante muito tempo pelo fato de sua
situação legal não ter sido resolvida? Será que por este motivo não caberia aos
arquivos ou outras instituições “devolver” os respectivos materiais (mediante uma
efetiva identificação que servirá também para os arquivos de origem) já no
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
5
Lembramos de alguns exemplos de tentativas bem sucedidas, como as relatadas no volume Music Archiving in the
World, apresentando trabalhos por ocasião dos 100 anos de existência do arquivo de Fonogramas de Berlim em
2002, mencionando em especial os trabalhos de Seeger e Gray.
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
REFERÊNCIAS
GRAY, Judith.. “Performers, recordist, and audiences”. In: BERLIN,Gabriele;
SIMON, Artur (edit.), Music Archiving in the World. Berlin, : VWB -Verlag
für Wissenschaft und Bildung, 2002. p. 48 -53. (Papers presented at the
th
Conference on the Occasion of the 100 Anniversary of the Berlin
Phonogramm-Archiv).
Sullivan, Edward J. (Edit). Brazil: Body and Soul. New York: Guggenheim
Museum, 2002.
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
Audio And Audiovisual Archives,
Intellectual Property, And Cultural
Heritage: some1comparative
considerations
Anthony Seeger2
Introduction
These are exciting times for the preservation of cultural heritage. Many of
us who have been working in audiovisual archiving for decades are suddenly
encountering large and highly motivated audiences and growing national and
international concern about the safeguarding of the diversity of languages, music,
dance and other local traditions.
Archives in many countries are inventing creative solutions to common
problems that face institutions and local communities (SEEGER and
CHAUDHURI, 2004). At the same time, the member states of UNESCO are
in the process of evaluating and possibly ratifying a new convention on the
safeguarding of oral and intangible heritage. In Brazil, the Museu Paraense
Emilio Goeldi and the University of Para organized this event on intellectual
property and cultural patrimony, at which these remarks were delivered. We
have probably not been as busily involved in these issues since the 1950s.
UNESCO conventions for the preservation of natural and tangible cultural
heritage, such as the Australian barrier reef, the buildings of Ouro Preto, and other
natural areas and important historical sites were passed decades ago. The new
•
document is intended to safeguard what human beings carry in their minds—their
intellectual activities, the languages they speak, and other knowledge passed orally 127
rather than represented in physical objects. A great deal of human knowledge is
1
Trabalho apresentado no Seminário “Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: protecçao do conhecimento
e das expressões culturais tradicionais,” Belem de Pará, Brasil, 15 de Outubro de 2004. O trabalho foi escrito em
Inglês, mas foi apresentada em Português com a distribuição de uma folha de pontos centrais, apresentada em
Apêndice A.
2
Anthony Seeger is an ethnomusicologist, anthropologist, archivist and musician. He was Professor Adjunto of
the Programa de Pós-graduação em Antropologia Social (PPGAS) at the Museu Nacional in Rio de Janeiro
(1975-82), Director of the Indiana University Archives of Traditional Music (1982-1988), Curator and Director
of Smithsonian Folkways Recordings of the Smithsonian Institution in Washington DC (1988-2000), and is
currently Professor of Ethnomusicology at the University of California at Los Angeles. He is the author of a
number of articles on archiving, on intellectual property related to music and archives, and related subjects,
among them Seeger 1992, 2001, 2002 and 2004 as well as Seeger & Chaudhuri 2004.
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
intangible, both in the past and today. But great deals of our oral traditions are
passed through media: they are being transmitted by technologically mediated
oral/aural transmission. Culture bearers are making recordings and those
recordings are eventually employed in the transmission of traditions to younger
generations. Archives can play an important role in this process because they
collect, organize, and store the recordings until they are needed.
Archivists are beginning to see themselves as part of local and national
cultural processes. The theme of the 2003 annual meeting of the International
Association of Sound and Audiovisual Archives (IASA)3, held in South Africa,
was “Archives and Society.” This was the first time IASA, known for its
attention to technical issues, had devoted a conference to the relationship
between archives and the social, political, and cultural processes of local
communities and nation states. What are the roles of archives in countries that
have suffered the kinds of conflict and division created by Apartheid in South
Africa or the huge inequality in income and education found in Brazil? What
does it mean for people who could not even enter the door of archives under
previous régimes to be able to walk in, read the documents, and listen to the
voices of both their oppressors and their own people? What are the structures
and roles of archives in the process of peace and reconciliation? These topics were
new to many IASA delegates, but of urgent importance to citizens of many
nations, including Brazil.
Archives can be disputed resources as well. The deliberate bombing of the
library and archives in Bosnia and the looting and destruction of museums and
other cultural institutions in Iraq have called our attention to the danger of
storing unique information in a single place. These disasters make a
decentralized approach to preserve human wisdom ever more urgent.
Decentralized archives, perhaps using multiple Internet sites for backup, could
also encourage the kind of large-scale sharing and new collaborations, possible
today and essential for access by a broad sector of the population.
•
128
3
The International Association of Sound and Audiovisual Archives (IASA) is the most important organization
for issues relating to the technical aspects of audio preservation and many facets of the organization and
procedures of audiovisual archives.
In addition, IASA has a Research Archive Section, chaired by Anthony Seeger (aseeger@arts.ucla.edu), with
Vice Chair Shubha Chaudhuri (Shubha@ernet.in) and Secretary Grace Koch (grace.koch@aiatsis.gov.au).
Research archives have their own challenges and requirements, some of which have been highlighted by
publications of members of this group, and also in Seeger & Chaudhuri 2004, which is available for free
download on the Internet, as well as in the form of a book.
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
New Audiences for Old Collections and New Collections from Old
and New Communities
As I will discuss below, people are using the audiovisual materials found
in old collections in unexpected new ways. At the same time, thousands of new
collections are being made around the world, either by specialists in
documentation from outside many communities, or by members of communities
documenting themselves without the help of a researcher, documentarian, or
government agency.
An unstated problem with these new uses and new collections is that the
contents of many archives will not survive to become accessible and useful for
future generations. While paper and good ink have a fairly long life, photographs,
audio recordings, video recordings, and electronic files are far less stable. Either
they are fragile themselves—as in the case of wax cylinders, audiotape, CD-Rs and
video images, or the carriers (both hardware and software) are changing so
profoundly that abandoned formats are unplayable. There is another irony here:
many local communities are documenting their own lives and arts for the first
time—but on media that cannot be expected to survive more than a few years.
They are being encouraged to document themselves but there is no similar
movement to enable them to preserve for future generations the documents they
generate. It is much easier to document than to ensure preservation and access over
the long term. Long-term preservation isn’t much fun to think about—it is
difficult, expensive, and requires long-range planning and investment.
Even though we are in the grips of a fascination with the past, and a desire
to capture our cultural diversity as it appears to disappear before our eyes, archives
around the world are suffering from lack of funds, bureaucratic indifference, and
attractive new media projects that governments and NGOs tend to prefer (new
projects give prestige to the donors; ongoing expenses are only a burden). Even
the famous Berlin Phongramm-Archiv, founded in 1900, has lost much of its
•
staff and funding. The Archive of the Instituto de Cultura Popular in Rio de
Janeiro contains many fine collections, but struggles to maintain them and to 129
enlarge its collection. I am certain the same is true about most of the rest of
Brazil’s audiovisual repositories. Around the world, archives struggle to maintain
adequate space and staff to deal with increased expectations of access and use.
This is a very strange situation: just when we recognize the significance of our
intangible cultural heritage many of the institutions, whose work has helped to
preserve part of this heritage, are threatened with loss of funds or closure.
Many audiovisual documents from the late 19th and early 20th century have
simply disappeared—lost to floods, fires, disinterest, and temporary lack of
relevance. Those collections fortunate enough to find their way into professional
archives have suffered a variety of fates—many survive precariously as I have
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
described above. But aside from their fragility, one of the most important things
about these archived materials is that their potential audiences have changed. A
previously unimaginable audience now finds the materials important and useful:
the members of the communities recorded by documentarians (scholars and
others) in the past (this is more fully described in A. (SEEGER, 2001).
Members of communities are consulting archives for a variety of reasons—not
only to revive their past traditions. Here are some examples:
1. The songs of the indigenous peoples in Australia are intimately
associated with geographic space. Many such sacred songs became admissible in
court as evidence for land claims. The “old stories and songs” recorded by
anthropologists suddenly had a new and topical use that profoundly benefited
the communities they recorded. (See, among others, KOCH, 1997)
2. In Cape Town and Durban, South Africa, members of certain
communities that were removed by the Apartheid government in the interest of
ethnic separation are using archives to establish claims to indemnization for their
former homes and belongings.
3. In the USA native communities are using archives to recover
forgotten songs and ceremonies for the purpose of using the songs again in both
traditional and new contexts. But this trend is not restricted to indigenous
communities—many people are discovering the artistry of previous generations
by consulting the collections of audiovisual archives.
4. Also in the USA, communities are using archives to assemble
materials they know will disappear if they are not properly organized and
preserved for the future. The UCLA Department of Ethnomusicology Archive
has projects in several urban communities that are assembling and documenting
their own materials with the assistance of the archive, which has undertaken to
assist in the preservation and “forward migration” of the resulting digital files.
• 5. The speed with which local languages are being lost (dying out
in the literal sense that their last speakers are dying) is alarming. If language is a
130 major carrier of our diverse intangible heritage, the loss of languages needs to be
recognized for the problem it is. In a number of countries archives are being
consulted for the purposes of language strengthening and revival. The linguists
are ahead of the rest of us in their creation of on-line digital repositories for
community access. One of the reasons they are ahead of people in other fields is
precisely the challenge of intellectual property—everyday speech is not usually
copyrightable under national legislation.
6. In Brazil, the rights of indigenous peoples to their cultural
heritage may someday rest on its presence in an archive.
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
I could go on at some length about the possible uses of the materials in
audiovisual archives that were never imagined by their founders. This should be
enough, however, to demonstrate that archives are no longer deserted places
where old stuff of no use is deposited to molder in forgotten corners. Archives
can be lively places, filled eager discovery, where individuals and communities
can come not only to use the materials but also to help the archives staff in their
tasks, and assist in growing new collections.
problems remain: older collections for which such access rights were never clarified
and future access by people and for purposes we cannot imagine today.
a. Older collections are valuable because old recordings often
document traditions that are no longer actively performed. The intellectual
property issues for many of them prevent their wide distribution, even to the
communities where they would be most useful. Legislation should include
some kind of provision for dealing with older recordings—both commercial
and non-commercial—since they represent an important facet of today’s
cultural heritage.
b. The second problem is imagining future accessibility. None of
us knows the technology and needs of future generations, but we must assume
they will be different. We need to create legislation that includes some flexibility
for the long term. Who, for example, should have the rights to the intangible
heritage of people for whom there are no known descendents—it could be a clan,
a community, or a society? What if access to such information could save
millions of lives, or improve the livelihood of people in other groups? It is very
important not to assume we have asked all the right questions and know how
things are to be used in the future. Very intelligent people, a hundred years ago,
could not have imagined the roles their collections would play today in Australia,
Brazil, and elsewhere; thirty years ago most of us could not have imagined the
importance of the Internet in information exchange.
2. Organization. The cataloguing of collections today must
include important fields related to tracing rights—composition or origination
rights, performance rights, and many other kinds of rights that pertain to specific
pieces and collections. This has to be more subtle and extensive than has been
established for commercial recordings in Europe and North America (beware the
limitations of commercial models of metadata). Archives always face much more
complicated issues in cataloguing than libraries of commercial recordings. There
• are many kinds of rights in the world’s societies, and we need to figure out ways to
reflect and respect them in the organization and the cataloguing of our collections.
132
3. Preservation. Who can and should preserve secret materials?
There is no question that some communities have been very happy to find sacred
materials in museums—but should the recordings remain in the archive, or
should they be returned? What should happen to copies? An archive in one
Vanuatu has a special room called the “Taboo Room,” where sacred knowledge
and items can be deposited, but not consulted except by those who have rights to
it. Rights holders take great pleasure to see the room, and to know the
knowledge is there, but not consultable (AMMAN, 2001).
4. Dissemination. Dissemination used to mean circulation in
limited edition LP recordings to a small number of scholars and specialists or
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
publication in specialized books. Today, however, forms of dissemination include
CDs, CD-ROMs, and the Internet. Some “traditional” music has been sampled
and used by popular artists to make extraordinary amounts of money while denying
to the original artists any part of the success and fame. Even when nothing in an
archive has ever been used that way, the suspicion that it COULD be so used
makes work very difficult today. Archives are often criticized because users find it
difficult to access their materials. One of the reasons it is difficult is because of
intellectual property and ethical concerns that archives must deal with every day.
5. Funding. Many funding agencies will only fund archival
projects that have an Internet or mass distributed end. But if the use of the
materials is limited by national legislation or ethical considerations, archives
cannot apply for these sources of funding and the original materials may not be
preserved at all. There has been a lot of emphasis on self-supporting projects for
archives, such as CD recordings of music, but attention must also be given to
their noncommercial, limited distribution holdings as well.
I am not arguing here that intellectual property issues should be
ignored—far from it. But if they are going to be applied broadly to archival
collections, special consideration needs to be given to existing materials whose
status is unclear, and to the difficulty of predicting future uses and needs.
4
The objective was to have all materials on the site available, not only for download by the general public, but
cleared for synchronization with commercial films and other projects. The latter are a lucrative source of money
when they can be arranged.
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
1. Every musician contacted agreed to participate.
2. Many musicians supplemented the original information
collected about the tracks authorized with full translations, artist photographs,
and names of accompanists that may not have been gathered originally.
3. Several artists donated entirely new materials of their own to
the Archives, whose collections were thus enriched—this time by members of
the community rather than research scholars.
The conclusions to be drawn from this experiment in obtaining
intellectual property rights for archived parts of the cultural patrimony of India is
that it is possible to obtain the contracts necessary for paid use of the materials if
the following criteria are met:
1. The archive is given the resources and personnel to track down
the rights holders for parts of its collection.
2. The archive can locate the collectors of the materials (or has
the rights from them already to disseminate the recording).
3. The archive can locate some of the artists or their heirs to ask
permission. This may require travel and patience. Heirs are particularly difficult
to negotiate with, as they are often only interested in money; artists often
appreciate the opportunity for wide dissemination of their art.
4. The contract is clearly written and includes all the rights
required under national legislation (as well as those anticipated by international
legislation being drafted). This contract not only liberates the materials agreed
upon, but also protects the artists’ rights to all the other materials in the archive.
The new contract provides a good chance to review the artists’ recordings and
clarify rights issues.
5. The archive can provide a payment for signing the contract. •
ARCE wanted a total of 500 tracks from its collections for Internet use, to
display a good array of different traditions. At US$25.00/track advance, this was 135
US$12,500, provided by the Smithsonian Institution as an advance. ARCE
selected about 6 tracks per artist or group, thus giving them the equivalent of
US$150.00—a lot of money for performers in many parts of India. While a
payment may not be necessary, it certainly facilitated the contract process.
6. The archive has a way to receive and redirect to the artists
future payments for paid use of the materials, and reports on other uses.
Emerging ethical concerns and changing intellectual property legislation
need to be taken into account when planning the collection, archiving, and
dissemination of the intangible cultural heritage. Archives face many challenges
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
as they try to respond to new uses for their materials and the demands of users for
increased access on the one hand and of the artists for more restricted access on
the other. It is very important that agencies planning documentary projects work
closely with archives to ensure that the appropriate permissions are obtained, and
that the necessary rights can be transferred to archives to ensure access to the
collections (or at least to parts of the collections, as appropriate) in the future.
New legislation regarding IP and cultural patrimony should attend to the
problems of older collections for which no rights were originally obtained, as well
as to the impossibility of predicting the future uses of archived materials.
Archives fall in the middle between the artist and the eventual users of the
materials. They have become parts of what can be called the “technologically
mediated oral/aural tradition” today: a great deal of human knowledge is passed
through recordings to new generations of users. They are required to preserve
the originals, follow existing intellectual property legislation, and to serve new
communities. Yet they are far too often under funded and their potential uses
ignored. The fragility of audiovisual archives, and their significance for the
safeguarding of the intangible heritage must be recognized in all plans to
safeguard the cultural heritage of Brazil. Safeguarding cultural heritage also
requires safeguarding the repositories of the media on which so many
communities are documenting their heritage. These documents will not last
unless a plan is put in place for their preservation and systematic migration to
new formats. Anything less is a cruel deception of the aspirations of the artists
and communities seeking to safeguard their future by documenting their
traditions today.
REFERENCES
•
AMMAN, Using ethnomusicology to assist in the maintenance of Kastom, with
136 special reference to New Caledonia and Vanuatu” In: Lawrence, H. R. (editor)
Traditionalism and Modternity in the Music and Dance of Oceania, Essays in
Honor of Barbara Smith. Sydney : University of Sydney, 2001. p. 151-163.
KOCH, Grace . Music and Land Rights. In : Anthony Seeger (Guest Editor)
Traditional Music in Community Life: Aspects of Performance, Recordings and
Preservation. Cultural Survival Quarterly winter. [s.l. : s.n.] ,1997.
Appendix:
The following document was copied and distributed to the participants of
the Symposium, and serves as a kind of summary in Portuguese of the important
points in the paper: Fonotecas, videotecas, propriedade intelectual e o
patrimônio cultural: algumas considerações comparatives Anthony Seeger,
University of California Los Angeles, <aseeger@arts.ucla.edu>.
Esta folha reúne alguns dos pontos que trato no meu trabalho escrito e 137
outras considerações que surgiram durante o seminário:
a. Quase tudo que está sendo colhido vai desaparecer por falta de
arquivamento cuidadoso, constante, e sério. Os meios são frágeis, os softwares
estão sempre mudando e fazendo com que documentos mais antigos sejam
impossíveis de usar. As máquinas e softwares hoje rapidamente ficam obsoletos e
dependem de uma tecnologia difícil de reproduzir (chips especializados).
b. Até certo ponto, a falta de atenção aos arquivos e a migração
para novas tecnologias no arquivamento de registros do patrimônio cultural das
comunidades é uma traição, e é um novo ataque à viabilidade dessas comunidades
e nações. Sem investir em arquivos e tecnologias de preservação de
documentação os netos, bisnetos, e até os filhos das pessoas documentadas não
vão poder usar os documentos colhidos com tanto cuidado.
3. Legislação sobre propriedade intelectual é uma parte
significativa da economia de várias nações, incluindo os EUA. Por isto o campo é
tão cheio de conflito e de mudanças rápidas de legislação. Estes conflitos
atingem expressões culturais tradicionais, arquivos, o grande publico, e a
independência de nações como o Brasil.
4. Em muitos campos de conhecimento—incluindo museus,
música e plantas, há uma “busca ao ouro” dos direitos sobre propriedade
intelectual. Quem administra instituições ou áreas de conhecimento (como
nações indígenas ou comunidades locais), tem que tomar um atitude defensiva
por um lado e agressiva de outro lado.
5. O assunto é importante demais para ser deixado somente aos
advogados e os políticos precisam ser vigiados.
6. A legislação hoje está sendo modificada como parte de tratados
de comércio, e há uma grande pressão em todos os países para adotar o modelo
padrão da Europa. Isto torna difícil a criação de legislação sui generis ou fora do
padrão internacional do GATT.
• 7. A legislação de propriedade internacional já foi chamada de
racista — mas é fundamentalmente classista — afeta todas as etnias.
138 Historicamente os legisladores são do meio urbano, letrados e burgueses e ignoram
os direitos das populações rurais, não letradas, pobres e de nações não Européias.
Expressões tradicionais e de folclore muitas vezes ficam fora de cogitação.
8. Um movimento contra a nova legislação internacional está
crescendo, mas confronta os interesses econômicos de paises poderosos.
9. O que é “tradicional” fica difícil definir. Em muitos casos, nas
comunidades da região norte, o tradicional de hoje já foi o novo e radical de cem
anos atrás. Valsas, “mazurka” e “polka” já foram novidades a agora viraram
tradição. Há inovação em nações indígenas também. Não existe um momento
tradicional, um jardim do éden, onde houve a inovação pecadora.
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
10. As mudanças na legislação estão atingindo arquivos no
mundo todo, e dificultando a sua operação em todos os seus aspectos—aquisição,
organização e difusão.
11. Hoje é imperativo não somente documentar um evento, mas
também documentar a transferência dos direitos necessários para os usos
cogitados desse material —arquivamento, acesso, difusão. Sem os direitos, o
material e impossível de usar.
12. Não precisamos esperar mudanças de legislação para
transformar nossa ética, e a maneira como agimos a respeito do conhecimento de
todos os tipos. A lei pode seguir a ação de todos nós.
13. Arquivos no Brasil e no mundo todo estão cheios de gravações
sem os devidos direitos para usá-las. A legislação deve admitir o uso de material
antigo cujos direitos não estejam claros e definidos.
14. Um exemplo de busca de direitos para uso de materiais na
Internet na Índia, o Global Sound do Smithsonian Institution, mostra que é
possível obter direitos e criar novas colaborações com artistas em certas situações.
15. Há um grande equivoco no atual movimento de documentar,
junto às comunidades, seu patrimônio cultural.
a. Quase tudo que está sendo colhido vai desaparecer por falta de
arquivamento cuidadoso, constante, e sério. Os meios são frágeis, o software esta
sempre mudando e fazendo documentos impossíveis de usar. As maquinas
rapidamente ficam obsoletas e dependem de uma tecnologia difícil de reproduzir
(chips especializados).
b. Até certo ponto, a falta de atenção aos arquivos e a migração
para novas tecnologias no arquivamento de registros do patrimônio cultural das
comunidades é uma traição, e é um novo ataque à viabilidade dessas comunidades
e nações. Sem investir em arquivos e tecnologias de preservação de •
documentação os netos, bisnetos, e até os filhos das pessoas documentadas não
vão poder usar os documentos colhidos com tanto cuidado. 139
140
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
Patrimônio Magüta: artefatos como
meios de comunicação entre
diferentes contextos sócio-culturais
Priscila Faulhaber1
1
Pesquisadora Titular. Museu Paraense Emílio Goeldi/MCT. Trabalho elaborado a partir de paper apresentado
na Reunião da Anpocs-2004. Seminário Temático “Memória, Patrimônio e sociedade: desafios
contemporâneos” Coordenadores: Regina Abreu, Reginaldo Gonçalves e Manuel Lima Filho
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
2
Em outro trabalho, recuperei o conceito de atualização de Walter Benjamin (2001), dentro da perspectiva da
tradução cultural em Antropologia (FAULHABER, 2004)
3
A idéia de escrever a história para trás, virando o passado para trás, como a bobina de uma película
cinematográfica remonta a Marc Boch, citado por Ginzburg (2002:, p. 15).
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
no sentido da adequação dos conteúdos significativos das narrativas aos contextos
rituais que conferem significados identitários à iconografia inscrita nos artefatos
etnográficos. Nesta perspectiva, não se norteia por uma tentativa de “fidelidade” a
um sentido afirmativo de “memórias individuais”, mas de uma reflexão sobre
aspectos nem sempre conscientes do inconsciente cultural – que aparecem
enquanto “acontecimentos vividos pela coletividade à qual a pessoa sente
pertencer”, e envolvem projeções ou identificações de uma vivência identitária
(POLLAK, 1992, p.201), que pode ser disputada por diferentes facções ou
organizações indígenas.
Entende-se artefato ritual como produto de uma relação do sujeito com seu
objeto, em termos de uma incessante criação simbólica inserida na vida cotidiana, e
dela dissociada quando as peças são coletadas e transformadas em artefatos
etnológicos em coleções museais, que passam, assim, dissociados do contexto
social no qual foram produzidos pelos artesãos Ticuna, a ser vistos dentro de
critérios estéticos ocidentais. Estes critérios estéticos são passíveis de crítica
(EAGLETON, 1993, p. 113), no sentido de visualizar formas outras, não
hegemônicas, de saber e conhecer o mundo, dentro de uma concepção dinâmica
de “esfera pública”, considerando as possibilidades da “razão comunicativa”
“implicitamente antecipada em uma situação real de diálogo, na qual haveria para
todos os participantes uma distribuição simétrica de oportunidades para escolher e
realizar suas falas” (EAGLETON, 1993, p. 291). Tal razão comunicativa
formula-se como um vetor oposto ao daquela que opera para ratificar a dominação.
Nesta perspectiva, uma coleção consiste em um patrimônio cultural que,
deste modo, constitui a identidade cultural. Torna-se, assim, significativa para a
identificação étnica de integrantes de um determinado povo, imaginado como
territorialmente e historicamente delimitado. A eles compete colocá-los em seu
contexto apropriado (HANDLER, 1985, p.193).
Tal coleção reúne um conjunto de artefatos etnográficos cujo valor não se
reduz ao valor de troca, convertido em mercadoria no mercado capitalista, •
devendo ser resguardados os significados e os usos para os integrantes do povo
pelo qual foi concebido, dentro do qual esses significados são transmitidos, de 143
geração a geração, através de rituais e práticas sociais.
A contemplação dos artefatos etnográficos implica a reativação de traços de
memória, em sintonia com o testemunho dos “sobreviventes” de catástrofes sociais,
em termos da recriação do mito em processos histórico-identitários, em atos de
rememoração criativa que permitem juntar os “cacos” do passado revivido e do
presente vivenciado, dentro de uma nova constelação, que não necessariamente
corresponde àquilo que seja esperado pela estética ocidental convencionada.
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
CONTEXTUALIZAÇÃO
4
No CD-Rom Magüta Arü Inü Jogo de Memória: Pensamento Magüta.
são contextualizados os artefatos etnográficos Ticuna, considerados como
documentos estreitamente relacionados com a vida ritual e posicionados um em
relação aos outros no sentido de mostrar a teia de significados imbricada em tais
relações. Eles não são examinados como criações singulares, mas referidos a um
conjunto. A ordem das interpretações dos motivos é estabelecida dentro de um
processo mais amplo de associação entre as observações dos Ticuna e as
representações sociais. Isto é estabelecido dentro de um esforço para
compreender as complexas conexões que estruturam o pensamento Magüta.
Os índios Ticuna afirmam que os desenhos das máscaras são concebidos
em sonhos, quando abrem suas mentes ao pensamento Magüta – o povo pescado
5
no local mítico Eware pelo herói cultural Yoi’i . Trata-se de pensar como
imagens, representadas pela mente durante o sono, devaneio ou estados de
extrema fadiga, servem como base de elaboração da iconografia indígena. À
parte explicações neurológicas, o que interessa reter aqui é que tais imagens são
parte do contexto simbólico, cuja análise permite mostrar como representantes
de povo indígena determinado concebem o Universo e explicam a relação dos
humanos uns com os outros e com a natureza.
A trama narrativa que remete a “enredos recorrentes” é recortada, no
presente trabalho, a partir da performance da Máscara Tchowicu, na festa da
moça Tueguna, do clã arara vermelha, registrada no vídeo etnográfico intitulado
Enepüwa i yüü Tchiga. Festa da Moça no Enepü, filmado em final de julho de
2002. Segundo relato do artesão, tal performance está relacionada às peripécias
de dois irmãos para vingar a morte da irmã assassinada. Este enunciado
relaciona-se com a narrativa mítica sobre três irmãos, filhos da ligação incestuosa
de Lua (masculino) e Sol (feminino). Após ser abandonada por seu irmão, a mãe
• dos três irmãos foi violada por uma onça feroz e a avó criou os irmãos que depois
se transformaram em estrelas. Para evitar o eclipse da Lua gerador de catástrofe, o
144 dia e a noite foram separados, para que Lua e Sol não pudessem mais se
encontrar, e não transgredir, assim, a proibição do incesto. Como os Ticuna
vivem numa situação de contato, são centrais nas suas narrativas figuras
fronteiriças, como o Cobra Norato, que se relaciona ao colonizador, mas também
se refere a identificações primordiais, com os heróis culturais, e o povo Magüta,
bem como, a lugares de ocupação identitária relacionados com os lugares míticos
onde vivem os imortais.
4
Produzido pelo Museu Paraense Emílio Goedli (org.: Priscila Faulhaber). Prêmio Rodrigo de Melo Franco de
Andrade (IPHAN, 2003)
5
A relação entre o simbolismo de desenhos Ticuna e a mitologia deste povo foi considerada em Grüber (1992).
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
A situação vivida é simbolizada com referência a esses enunciados míticos,
correlacionáveis à iconografia inscrita nos artefatos e depoimentos Ticuna, que
expressam como os representantes deste povo interpretam o universo em termos
de sua cultura, de sua organização social e da identidade étnica. Considera-se que
as imagens inscritas na cultura material integram um arquivo imaginário,
concebido aqui como reinterpretável por seus eventuais leitores.
PROCEDIMENTOS
O inventário dos artefatos, com base em pesquisa etnográfica, partiu de
uma contextualização dos artefatos Ticuna, no sentido de avaliar a informação
etnográfica dentro de uma perspectiva comparativa, examinando os artefatos
Ticuna em relação aos seus rituais, suas práticas identitárias sócio-históricas e ao
conhecimento antropológico acumulado sobre este povo, desde a monografia de
Curt Nimuendaju (1952) aos estudos mais recentes (OLIVEIRA FILHO,
1988, CAMACHO, 1995,1996, FAULHABER, 2002).
6
A finalização do inventário foi possível com a aprovação, em 2001, do projeto intitulado “Artefatos rituais e
transformações ambientais da fronteira amazônica” pelo Edital “Conteúdos Digitais” do CNPq. Este projeto
propôs a produção de um CD-Rom para disponibilizar o banco de dados com o acervo Ticuna do Museu Goeldi
a partir da identificação das peças pelos próprios índios Ticuna. Foram identificadas ao todo 96 peças,
compreendidas por indumentárias e instrumentos rituais. Esta identificação contou com a colaboração de
comunidades Ticuna do Brasil e da Colômbia, que foi a base para a elaboração do CD-Rom.
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
7
Escolhido como narrador pelos outros cinco Ticunas que participaram da oficina no Museu Goeldi.
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
animais míticos apresentados pelos bastões esculpidos em madeira, a figura do
peixe flecheiro, esculpido como finalização de um artefato no qual estão
entalhados ombro, braço e mão, semelhantes aos humanos.
As máscaras consistem em “disfarces” através dos quais se encena a relação
entre os homens e com os “donos” de coisa e dos acontecimentos naturais e
sobrenaturais. Estas máscaras utilizam-se dos instrumentos de sopro que servem
como catalisadores de fenômenos climáticos, provocando a disrupção de
catástrofes. Utilizam-se também de símbolos de poder e violência que atuam
sobre o meio ambiente e sobre as relações sociais, como o “pau multiplicador”,
uma analogia do “pênis”, que não é apenas um órgão de reprodução, mas também
uma forma de gerar desordem e destruição.
Na iconografia das indumentárias e das rodas ou escudos estão
representadas em múltiplas formas, estas antigas armas, bem como jogos de
“treinamento de guerra”. Existe uma palavra em Ticuna, (o termo empregado
não é transcrito aqui por uma questão de inexistência, no editor de texto corrente,
do acento apropriado para identificar a oclusiva glotal) que significa “instrumento
ou algo que serve para o treinamento de guerra, para o conhecimento, para o
saber, para a ciência”, utilizado como parte da aprendizagem da criança, para
treinar a pontaria com arco para lançar objetos pontiagudos, envenenados ou não,
a distância. Este termo torna-se relevante para definir os artefatos como
“instrumentos rituais” que aparecem enquanto partes de um jogo de memória e
pensamento utilizado para a transmissão do sistema cultural Ticuna e para
continuidade dos seus processos de identificação.
Esta identificação consiste em uma projeção, no plano mental Ticuna,
para lugares de identidade que não correspondem, necessariamente, aos lugares
míticos. A performance da máscara Tchowicu é um exemplo de como as
peripécias dos heróis culturais se transformam para outros locais, como a “casa da
festa” do inimigo, na qual eles entram por um caminho subterrâneo, para vingar a
morte da irmã assassinada. A iconografia desta máscara contém os símbolos da •
oposição entre os clãs, através dos desenhos da arara (clã da moça) e da onça (clã
do mascarado). Contém, igualmente a simbolização dos artifícios, que permitem 147
ao seu portador manifestar sua condição identitária, como a lacraia, que enuncia a
vontade de envenenar seus opositores, e o ícone, que lhe permite, após matar o
assassino de sua irmã, lograr entrar pelo caminho subterrâneo que lhe possibilita
voltar ao seu próprio lugar, socialmente constituído. A ocupação de novos
contextos culturais e sociais também é uma forma de expressão identitária.
De acordo com Sullivan, a cultura é um processo de conformação a limites
físicos ou simbólicos. Em Wright (1998, apud SULLIVAN, 1988, p.317), a
simbologia da vida é sintetizada como uma sucessão de compartimentos e
recipientes. Esta simbologia aplica-se para o ritual de puberdade Ticuna, uma vez
que o recinto de reclusão da moça, assim como o seu útero, sua vagina, seus canais
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Por meio da prática etnográfica, identificam-se os artefatos Ticuna no que
diz respeito à contextualização dos seus usos rituais. Considerando-se que os
artefatos rituais estudados foram coletados há mais de 60 anos, recorre-se ao
estudo do passado histórico e etnológico e aos contextos vividos pelos Ticuna nos
dias de hoje. Dentro desta abordagem, entende-se patrimônio cultural como algo
produzido culturalmente através de significados culturais inscritos –
iconograficamente – em artefatos etnológicos. A interpretação indígena deste
patrimônio cultural envolve projeções identitárias, com implicações políticas para
os movimentos Ticuna observáveis nas diferentes situações nacionais em que os
representantes deste povo interagem.
Como meios de comunicação, os artefatos rituais são instrumentos de
extensão das funções físicas e mentais. Como artefatos etnográficos, no entanto,
apresentam-se em sua autonomia relativa aos contextos específicos, o que implica
a possibilidade de associação ao conjunto dos artefatos Ticuna em diferentes
museus, bem como a inserção em novos contextos de acordo com critérios
antropológicos, estéticos ou museais – em uma rede de comunicação virtual, com
as possibilidades abertas pela reprodutibilidade de tal informação cultural por
meios editoriais e eletrônicos, o que permite sua utilização pelos próprios artesãos
e professores Ticuna, bem como para programas de disseminação científica ou
exibição pública de patrimônios étnicos ou das formas de expressão próprias ao
povo indígena em questão.
•
A transposição do pensamento indígena para os meios eletrônicos
150 permite, deste modo, a propagação comunicativa de seus conteúdos significativos
para audiências diferentes das previstas nos rituais originais, transmitindo seu
patrimônio para outros contextos. Os conteúdos culturais assim veiculados são
definidos como formas de conhecimento que se deslocam, deslizam e circulam
por diferentes canais comunicantes e distintos itinerários.
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
REFERÊNCIAS
ARNAUD, Expedito. Curt Nimuendaju. Aspectos de sua vida e sua obra.
Revista do Museu Paulista. Nova Série volume 29, 1983-1984. p.55-72.
BENJAMIN, Walter. A tarefa-renúncia do tradutor . In: . HEIDERMANN,
Werner (org.). Clássicos da Teoria da Tradução. Florianópolis: Universidade
Federal de Santa Catarina, 2001.p.189-215. v.1: Alemão-Português.
THE MASK Designs of the Ticuna Curt Nimuendaju Collection” In: MYERS,
Tom; CIPOLLETTI, Maria Suzana (Ed.) Bonn Americanist Studies 36. Artifacts
and Society in Amazonia. Bonn: Verlag Anton Saurwein., 2002. p. 27-45.
154
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
Educação Patrimonial em
Comunidades Quilombolas: o resgate
do saber e do saber fazer louça de
barro das artesãs da região de Porto
Trombetas-PA
Luiz Guilherme Campos Reis
Resumo
Discute, essencialmente, sobre a Educação Patrimonial e o uso da cultura
no processo educativo das comunidades de Porto Trombetas, assim como a sua
responsabilidade na reconstrução da identidade cultural dessas populações. O
Museu Goeldi, como espaço para pesquisa, preservação e conservação da cultura
material e imaterial, cumpre sua função educacional, mesmo que não formal.
Algumas atividades desenvolvidas junto a estas comunidades onde a
(re)construção do conhecimento foi feita por meio da valorização do saber e do
saber fazer, demonstra que, tanto os jovens quanto os idosos, estão sensíveis
quanto a necessidade da manutenção de sua cultura.
Palavras Chave: Arqueologia, Populações tradicionais e Educação
patrimonial.
1
Os trabalhos já desenvolvidos pelos alunos foram: “O Museu da Pessoa”, relatos sobre a história de 12 moradores
da Comunidade de Boa Vista; “Arvore Genealógica”, folheto com linha do tempo dos integrantes do Clube do
Pesquisador Mirim e o casal de escravos que fundaram a comunidade; “Uma manhã diferente”, relato sobre a
visita ao orquidário e Horto da MRN; “arqueologia da Amazônia: aprenda brincando”, kit educativo com um
jogo de trilha e informações sobre arqueologia e meio ambiente; “Nossas primeira palavras no mundo da
cerâmica”, mini-dicionário com os termos mais usados pelas ceramistas da região; “Plantas úteis de Trombetas,
cartilha com informações sobre alguns exemplares da flora da região e seu uso pelos moradores”; “Os caquinhos
de cerâmica da comunidade de Boa Vista”, folheto com historinha sobre os vestígios arqueológicos encontrados
na comunidade; “Passa ou Repassa: Conhecendo a Amazônia”, kit educativo com informações diversas da
Amazônia.
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
estima ou usurpado em seus direitos básicos enquanto cidadão? Esta foi a situação
em que encontramos a maioria destas comunidades que se ressentiam da falta de
apoio para aquisição do direito de usufruir água encanada e energia elétrica em suas
casas. Toda esta situação, muitas vezes, contribuiu para o descrédito e fracasso das
iniciativas anteriores a implantação do Projeto. Outro grande problema foi reverter
a baixa estima que grande parte dos moradores possuíam por acreditar que nunca
poderiam reverter o atual quadro de penúria em que se encontravam. As ações
desenvolvidas no Projeto alcançaram pleno êxito, à medida em que eram
confrontados os avanços obtidos com a conclusão de cada etapa de trabalho, a
partir do momento em que, nas atividades oportunizamos a (re)construção do
conhecimento pautado em situações de observação, discussão e análise crítica,
desenvolvimento do uso de linguagens múltiplas, incentivo ao uso do
conhecimento prévio e da criatividade de cada participante.
Se tomarmos como exemplo as oficinas para as comunidades, no caso a de
cerâmica, identificamos que as técnicas de “fazer louça de barro”, termo usado
pelos próprios comunitários, encontrava-se esquecida e/ou restrita a duas ou três
artesãs da Comunidade do Lago do Moura que, por motivos diversos,
paulatinamente, estavam deixando de confeccioná-las. Para grande parte dos
moradores destas comunidades a confecção de louça de barro não tinha caráter
de bem cultural, mas sim de “coisa de índio”, entenda-se a expressão como algo
ultrapassado, antigo, por isso, sem valor, assim, fabricar louças de barro como
peça utilitária caiu em desuso. Outro fator importante nesta análise do processo
de esquecimento é como competir com as facilidades proporcionadas pela panela
de alumínio. É muito comum nas casas da região dispor nas paredes das cozinhas
as panelas, impecavelmente, areadas e bem arrumadas, isto é motivo de orgulho e
de limpeza. Desta forma as artesãs que ainda praticavam a arte da cerâmica foram
“atropeladas pela modernidade”, com a introdução de novas tecnologias e
costumes condenando, assim, ao esquecimento, este saber tradicional.
O primeiro contato com as artesãs destas comunidades foi realizado
•
através do Clube do Pesquisador Mirim na expectativa de reverter, primeiro
160 entre os jovens, o sentimento de indiferença e até mesmo de discriminação por
este tipo de arte. Assim, diversas visitas foram agendadas, várias delas
aconteceram nas residências destas senhoras que, logo no início, se mostraram
reticentes e até, algumas vezes, envergonhadas ao demonstrar seus
conhecimentos sobre o saber fazer cerâmica. Paulatinamente, durante os
encontros, alguns jovens passaram, também, a fabricar louças de barro e
apresentar nas atividades do Clube.
A produção de cerâmica na região de Oriximiná, oeste do estado do Pará,
caracteriza-se por apresentar técnicas bastante antigas de fabricação e queima.
Na confecção de uma peça as artesãs usam uma argila que, quando queimada, dá
uma tonalidade cinza esbranquiçada diferente da cor ocre das cerâmicas de
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
Icoaraci, região metropolitana de Belém. Outra característica peculiar e muito
antiga é o uso de antiplástico na argila o que não ocorre na cerâmica de Icoaraci.
Isto é determinado pelo próprio processo de queima que é diferente, enquanto
em Icoaraci usa-se o forno, na região de Oriximiná, não. Dentre os antiplásticos
mais usuais na região encontram–se o cariapé2 e/ou cauixi3 ou os dois juntos.
O processo de fabricação da louça de barro abaixo descrito foi
reconstruído por meio de conversas informais com algumas ceramistas das
comunidades do Moura e Boa Vista. Segundo D. Filica, moradora do Lago do
Moura, para tecer uma peça “tudo começa com o preparo da base”, geralmente
em forma circular e, sobre ela, são dispostos os morrões, nome dado pelas artesãs
da região aos rolos de barro feitos a mão, de tamanho e diâmetro de acordo com a
altura final que se deseja a peça. Para unir os morrões usa-se o cuiapé, uma espécie
de espátula feita do fruto da cuieira. Os detalhes adicionados às peças são,
geralmente, feitos no gargalo de potes e bilhas, borda e/ou corpo de panelas,
feitos com o auxílio da unha produzindo um efeito de franja bordada na cerâmica.
Após o tecimento da peça, esta é colocada à sombra para secar. Posteriormente,
passa-se a etapa do polimento e, para isto, usa-se a semente do inajá4 ou outra
semente ou ainda, um seixo lavado, comumente encontrado nas margens dos rios
e lagos da região. Uma técnica curiosa é a pintura com sal realizada pela moradora
do Lago do Moura, D. Nazaré, o que foi socializada aos outros comunitários no
decorrer das oficinas. A técnica consiste em produzir desenhos usando água
salgada aplicada na peça com o dedo. O desenho só irá aparecer, posteriormente,
ao processo de queima. Porém não se deve usar água muito salgada ou com grãos
de sal, caso isto venha a acontecer, ela irá provocar o estouro da peça na hora da
queima, alerta D. Nazaré.
O cozimento ou queima das peças é feito de forma rudimentar a céu
aberto usando a técnica da coivara. Primeiramente, faz-se um pequeno fogo e
próximo a ele são dispostas às peças para que comecem a esquentar. Com a
extinção do fogo e sobre as brasas são dispostas as cerâmicas agora aquecidas e,
sobre estas, o que elas chamam de pau-a-tôa, geralmente, folhas e palhas de •
palmeira, gravetos e cascas de árvores, elementos de rápida combustão.
161
Outra característica muito peculiar da cerâmica da região é o seu possível
uso para cozer alimentos, caso a peça tenha esta finalidade, acrescenta-se mais
uma etapa no processo de fabricação: o de impermeabilização com a resina da
jutaicica5, e isto acontece com a peça logo que sai do fogo. Para D. Nazaré, o
2
O cariapé ou Licania apetalata (E.Mey)Fritsch. Depois de queimada e pilada é adicionada como antiplástico no barro.
3
espongiário (animais constituídos de muitas células) de água doce que depois de pilado é também adicionado
como antiplástico no barro.
4
Inajá (Maximiliana maripa (Aubl.) Drude
5
Jutaicica: resina retirada da árvore do jutaí (Hymenaea courbaril) L., que é empregada na peça de cerâmica para
impermeabilizá-la.
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
6
Existe a crença de que quando a ceramista não pede licença para extrair o barro ou não deixa oferendas, todas as
louças produzidas com aquela argila se quebrarão durante o processo de queima.
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
7 8
ferramentas para aplicação das técnicas de incisão e excisão nas peças. Não pode
faltar, também, o cultivo de ervas usadas na medicina caseira.
Todo este universo é entremeado com crianças, cachorros, galinhas e
patos que dividem o quintal onde a artesã põe para secar, dá polimento e queima
as peças. Assim, não existe local específico de trabalho.
Em decorrência das crescentes encomendas capitaneadas pela MRN,
urge a necessidade de organizá-las socialmente, com local apropriado onde serão
reunidos todos os elementos necessários para o exercício pleno desta arte.
Ocasionalmente, a pedidos, são produzidas encomendas de outros tipos
de peças, o que tem despertado o desejo de ampliar o repertório, aumentando
assim as oportunidades de venda. Atualmente, discute-se criação de uma
cooperativa com espaço físico em uma das comunidades para a exposição dos
produtos. Outra alternativa é a comercialização da produção destas comunidades
em dois espaços, sendo um no aeroporto e outro no Centro Comercial de Porto
Trombetas, ambos cedidos pela MRN.
CONCLUSÕES ARTICULADAS
Sobre os argumentos acima apresentados e levando em consideração o
término do projeto previsto para outubro de 2005, chegaram-se as seguintes
conclusões:
a) a educação patrimonial é um instrumento imprescindível na
(re)construção da memória e resgate da cidadania, porém, faz-se necessário,
também, que esta educação seja conduzida observando as reais necessidades da
comunidade, onde a educação respeite as diferenças, estabeleça o diálogo e
proporcione a participação de todos os atores envolvidos, como vem acontecendo
nas oficinas de cerâmica;
b) o mercado irá determinar, limitar e até mesmo eliminar a produção de •
determinados modelos de cerâmicas em virtude das próprias transformações e
diversificação de uso dos produtos que, via de regra, deixarão de ser utilitários 163
para tornarem-se um elemento decorativo. Neste sentido, nossa preocupação é
alertá-los quanto a esta possibilidade, ressaltando a importância da preservação
do modo tradicional de se fazer cerâmica e do repertório de peças que lhes são
característicos, sendo este o diferencial que permitirá a sobrevivência deste
aspecto de sua cultura e do próprio comércio da cerâmica como alternativa de
geração de renda.
7
Incisão: “técnica de decoração da cerâmica que consiste em apertar um instrumento contra a superfície e deslizá-lo
sobre a peça ainda plástica(não queimada), produzindo linhas ou desenhos em baixo relevo” (MPEG, 1999).
8
excisão: “técnica de decoração feita antes ou depois da queima, que consiste em remover, com a ajuda de um
instrumento, áreas da superfície de acordo com certa forma, tamanho e profundidade” (MPEG, 1999).
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
REFERÊNCIAS
BENATTI, J.H. Formas de acesso à terra e a preservação da floresta amazônica:
uma análise jurídica da regularização fundiária das terras quilombolas e
seringueiras. In: CAPOBIANCO, J.P.R et.al.(org.). Biodiversidade na
Amazônia brasileira: avaliação, uso sustentável e repartição de benefícios. São
Paulo: Estação Liberdade: Instituto Socioambiental, 2001.
CUNHA, M.C da.; ALMEIDA, M.W.B. Populações tradicionais e
conservação ambiental. In: CAPOBIANCO, J.P.R et.al.(org.). Biodiversidade
na Amazônia brasileira: avaliação, uso sustentável e repartição de benefícios. –
São Paulo: Estação Liberdade: Instituto Socioambiental, 2001.
1
Trabalho publicado na Revista da Associação Brasileira de Propriedade Intelectual, no mês de novembro.
2
Acadêmico concluinte do curso de Direito do Centro Universitário do Pará. Bolsista do Núcleo de Propriedade
Intelectual e do projeto de pesquisa “Patentes Biotecnológicas” desta Instituição.
3
Acadêmica do 6º semestre do curso de Direito do Centro Universitário do Pará. Bolsista do Núcleo de
Propriedade Intelectual e do projeto de pesquisa “Patentes Biotecnológicas” desta Instituição.
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
PROPRIEDADE INTELECTUAL
• O Patrimônio Imaterial pode ser considerado um bem, corpóreo ou
incorpóreo, que contribuindo direta ou indiretamente, venha propiciar ao
166 homem o bom desempenho de suas atividades, que tenha valor econômico e que
seja passível de apropriação pelo homem (DI BLASI, 2002).
É nessa perspectiva que, almejando proteção jurídica ao patrimônio
cultural imaterial, passa-se ao estudo do sistema de Propriedade Intelectual.
Assim, a Propriedade Intelectual é o instrumento de proteção da criação
humana, por meio da implementação de direito de apropriação ao homem sobre
suas criações, obras e produções do intelecto, talento e engenho.
O Sistema de Propriedade Intelectual tem como principal objetivo
garantir aos inventores ou responsáveis por qualquer produção do intelecto (seja
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
nos domínios industrial, científico, literário e/ou artístico) o direito de auferir, ao
menos por um determinado período de tempo, recompensa pela própria criação.
A propriedade, no seu sentido lato, como já foi dito, é o poder de uma
pessoa sobre um bem no sentido de usar, fruir e de dispor do bem, recaindo em
bens materiais e bens imateriais. A propriedade dos bens imateriais é regida por
regras específicas constituindo, particularmente, o direito de propriedade
intelectual. No que diz respeito à propriedade intelectual, esta pode ser
conceituada como direito de uma pessoa sobre um bem imaterial. Tal
propriedade é concedida por um período de tempo vindo a cair, posteriormente,
em domínio público, em regra.
Divide-se a Propriedade Intelectual em dois grandes ramos: direitos
autorais e a propriedade industrial. O Direito do autor ou Copyright refere-se aos
trabalhos literários, cinematográficos, fotográficos e aos softwares. Em
contrapartida, a Propriedade Industrial abrange o nome coletivo para conjunto
de direitos relacionados com as atividades industriais ou comerciais do indivíduo
ou companhia. Tratam de assuntos como as invenções; os modelos de utilidade;
os desenhos industriais; as marcas de produto ou de serviço; de certificação e
coletivas; a repressão às falsas indicações geográficas e demais indicações; e a
repressão à concorrência desleal.
Este artigo propõe a utilização do sistema de Propriedade Intelectual
como um dos meios de proteção do conhecimento e das expressões culturais,
especialmente, por meio das Indicações Geográficas, que de muito prestam ao
resguardo aos bens imateriais.
INDICAÇÕES GEOGRÁFICAS
As indicações geográficas são fortes instrumentos de fomento ao
comércio, pois informam ao consumidor a procedência do produto e, •
normalmente, são vistas como sinônimo de qualidade.
167
Constitui a forma de indicação da procedência dos produtos e serviços
com a finalidade de agregar valor e credibilidade ao produto ou a serviço,
conferindo-lhes diferencial de mercado em função das características de seu local
de origem. (HAMES, 1998)
As indicações geográficas são divididas pela doutrina em duas
modalidades: Indicação de procedência - nome geográfico de um país, cidade,
região ou uma localidade de seu território que se tornou conhecido como centro
de produção, fabricação ou extração de determinado produto ou prestação de
determinado serviço; e Denominação de origem - nome geográfico de país,
cidade, região ou localidade de seu território, que designe, produto ou serviço
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
4
A proteção da propriedade industrial tem por objeto as patentes de invenção, os modelos de utilidade, os desenhos
ou modelos industriais, as marcas de fábrica ou de comércio, as marcas de serviço, o nome comercial e as indicações
de proveniência ou denominações de origem, bem como a repressão da concorrência desleal (in verbis).
5
Denominação geográfica é a denominação geográfica de um país, de uma região ou de uma localidade que sirva
para designar um produto originário do mesmo e cuja qualidade ou características se devem exclusivamente ao
ambiente geográfico, compreendidos os fatores naturais e os fatores humanos. ( in verbis)
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
pelo Acordo de Lisboa, ou no plano bilateral, por meio de acordos assinados
bilateralmente entre países.
Outro aspecto a ser levantado é a necessidade de realizar algumas
distinções para que se entenda a indicação geográfica em sua plenitude. Neste
sentido, vislumbra-se ser a marca-sinal utilizado por pessoa física ou jurídica,
para distinguir os seus próprios produtos ou serviços dos produtos e serviços dos
seus concorrentes, enquanto a indicação geográfica é utilizada para indicar que
certos produtos são provenientes de uma certa região.
Ademais, ao contrário das marcas e patentes, as indicações geográficas
podem ser protegidas por legislação sui generis ou decretos (é o caso da França e de
Portugal), por intermédio da lei contra concorrência desleal (quando, por exemplo,
é indicado produto como de uma região da qual não lhe é proveniente), protegidas
também pelo registro de marcas coletivas ou marcas de certificação. (WIPO, 2003)
O caso brasileiro acaba por regular as indicações geográficas utilizando
três vias: a proteção pelo próprio sistema de indicação geográfica; a utilização
subsidiária da proteção por marca, quando se torna comum à exploração do bem;
e o combate por meio da tutela penal de combate a concorrência desleal.
Destarte, o ideal de proteção ao bem imaterial em nosso estudo é a proteção
pela indicação geográfica, denominação de origem ou indicação de procedência,
entretanto, mesmo não sendo possível a utilização deste instituto, como no caso da
ampla utilização do produto ou serviço por regiões fora de sua origem, a legislação
no art. 181, nos dá o caminho da proteção por marca. E nesta particularidade,
sobretudo as marcas classificadas como coletivas ou de certificação.
Cumpre, então, ressaltar que as marcas coletivas servem “para identificar
produtos ou serviços provindos de membros de uma determinada entidade,”
enquanto as marcas de certificação são usadas para “identificar a conformidade de
um produto ou serviço com determinada normas ou especificações técnicas,
notadamente quanto à qualidade, natureza, material utilizado e metodologia
empregada” (DI BLASI, 2002). •
A proteção das indicações geográficas atua, também, através da tutela
169
penal disposta nos artigos 192 a 194, em todos os tipos penais de menor potencial
ofensivo, sujeitos à competência dos Juizados Especiais, sendo cabíveis, também,
a transação penal.6
6
Art. 192. Fabricar, importar, exportar, vender, expor ou oferecer à venda ou ter em estoque produto que apresente falsa
indicação geográfica.
Pena - detenção, de 1 (um) a 3 (três) meses, ou multa.
Art. 193. Usar, em produto, recipiente, invólucro, cinta, rótulo, fatura, circular, cartaz ou em outro meio de divulgação ou
propaganda, termos retificativos, tais como “tipo”, “espécie”, “gênero”, “sistema”, “semelhante”, “sucedâneo”, idêntico",
ou equivalente, não ressalvando a verdadeira procedência do produto.
Pena - detenção, de 1 (um) a 3 (três) meses, ou multa.
Art. 194. Usar marca, nome comercial, título de estabelecimento, insígnia, expressão ou sinal de propaganda ou qualquer
outra forma que indique procedência que não a verdadeira, ou vender ou expor à venda produto com esses sinais.
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
7
Requisitos constantes na Resolução 75 do INPI
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
HORIZONTES DE PROTEÇÃO
A região amazônica é conhecida, mundialmente, pela sua riqueza natural.
Cristiane Fontes, (ISA, 2004), relata que a Amazônia é a maior floresta tropical
do mundo, possuindo de 10% a 20% de 1,5 milhões de seres vivos catalogados,
além de ter “a maior diversidade de primatas, anfíbios, peixes de água doce e
insetos e a terceira maior de aves”. O meio científico mundial venera esses
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
números, procurando de todas as maneiras enriquecer e ganhar status com o
conhecimento dos povos amazônicos.
Porém, faz-se necessário perceber que, assim como as riquezas naturais, a
Amazônia também apresenta um acervo cultural vasto, o qual deve ser protegido
e valorizado pela sua população. É indispensável que os detentores dessa riqueza
cultural comecem a perceber o tamanho do impacto da palavra Amazônia e de tudo
que deriva dessa região, e o quanto podem ser beneficiados com o simples uso deste
nome associado ao produto ou serviço.
Um grande exemplo a ser dado é o Artesanato de Miriti, que surgiu em
1793, durante a realização do primeiro Círio de Nazaré e perdura até os dias
atuais como um dos símbolos desta festa religiosa.
A palmeira do miritizeiro possui o nome científico “Maurita Flexuosa L.”
(site VER-O-PARÁ) e tem uma vasta utilização, além, é claro, da fabricação do
artesanato. Essa cultura vem passando de geração em geração durante muitos
anos e é o grande orgulho para seu povo. Todos os anos, durante o Círio de Nossa
Senhora de Nazaré, a cidade de Belém fica encantada com a arte dos
artesões-miritizeiros. Estes são provenientes, principalmente, de Abaetetuba,
município a 70 quilômetros da capital.
Há algum tempo, a profissão de artesão de miriti e, assim, o uso desse
conhecimento cultural era decorrente de problemas econômicos, associado a
outros trabalhos. Porém, em 2000, o Sebrae-Pará, iniciou o incentivo dessa
cultura com o programa Miriti de Design, dando apoio tecnológico aos artesãos
e, em 2003, surgiu a Asamab (Associação dos Artesões de Brinquedo e
Artesanato de Miriti de Abaetetuba).
Atualmente, muitos vivem somente da fabricação do artesanato de
miriti, acarretando grande desenvolvimento comercial na região, além de
preservar e repassar um patrimônio cultural imaterial que há anos faz parte da
vida dessas comunidades. •
forma naturalista e na forma icônica (grafismos), onde cada símbolo tem seu
próprio significado, sua própria mitologia, trazendo a cada objeto uma
característica peculiar.
Acrescentar a todas as cerâmicas marajoaras essa cultura mitológica,
protegendo-a com os instrumentos da Propriedade Intelectual, seria uma forma
honrosa de preservar a arte local e incentivar o povo que vive nesse lugar.
CONCLUSÕES
1. O patrimônio imaterial é a herança de toda uma evolução
histórica. Sua proteção é imprescindível para a conservação e manutenção dos
conhecimentos e expressões culturais tradicionais. Toda a comunidade, nação
ou estado deve preservar (no presente) seu legado para garantir às futuras
gerações a oportunidade de conhecer os valores e manifestações que deram
existência a sua origem.
2. O sistema de propriedade intelectual, cujo escopo principal é a
proteção e incentivo a toda e qualquer atividade proveniente da criatividade
humana, vem resguardar também o patrimônio cultural imaterial.
3. O estudo deste artigo pauta-se na defesa do sistema de
indicações geográficas como meio de preservação dos bens culturais imateriais.
4. O artesanato de miriti e a arte marajoara são patrimônios
imateriais paraenses, devendo ser protegidos a fim de que essa cultura permaneça
na convivência das gerações futuras.
5. O caso concreto indicará de forma mais clara qual das
modalidades, indicação de procedência ou denominação de origem, servirá para a
tutela deste patrimônio, uma vez que ambas servem para esta proteção.
GUEDES, Silvaneide. Design faz a diferença nas formas do miriti. Disponível em:
<http://www.pa.sebrae.com.br/sessoes/servicos/noticias/noti_det.asp?codnoticia=4
7>. Acesso em : 20/07/2004.
176
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
A Cultura Tradicional e o Direito
Autoral
Bruno Alberto Paracampo Mileo1
Gysele Amanajás Soares2
INTRODUÇÃO
A partir da segunda metade do século XX, vivenciamos um momento de
crescimento da produtividade industrial mundial a partir da aplicação das
tecnologias utilizadas nas indústrias de base e nos processos de produção das
indústrias de bens de consumo. Tal aumento de produtividade causou uma série
de conseqüências desastrosas em escala global, especialmente, para os países em
desenvolvimento, os quais sofreram uma verdadeira “pilhagem” dos elementos de
expressão da cultura de seus povos e comunidades tradicionais, o que resultou não
apenas em degradação do meio ambiente, mas também no aumento da
dependência destes países em relação ao capital internacional e na banalização
ou, até mesmo, na perda do significado de suas práticas tradicionais.
Dessa forma, a questão da proteção dos conhecimentos e da cultura
tradicional se torna uma preocupação mundial. Todavia, os países em
desenvolvimento têm um compromisso ainda maior com a proteção desses
saberes, pois são estes os países que apresentam maior sociodiversidade, fato que
garante, historicamente, uma maior riqueza de culturas, significando um grande
e diversificado patrimônio cultural a ser preservado.
Portanto, levantamos, principalmente, a questão para discussão neste
artigo: como determinar, nos termos da legislação vigente, a autoria das formas
de expressão da cultura tradicional, sabendo-se que estas são de autoria coletiva, •
quando a lei brasileira de Direito Autoral (Lei nº 9.610/98) define, em seu artigo
11, que autor “é a pessoa física criadora de obra literária, artística ou científica”? 177
Para nortear nossas reflexões, temos como objetivo geral: Apontar
caminhos para que seja possível a proteção da cultura tradicional por meio da
atual legislação de Direito Autoral brasileira, respeitando a forma de organização
1
Acadêmico do 5º semestre de Direito do Centro Universitário do Pará (CESUPA) e Bolsista do Núcleo de
Propriedade Intelectual dessa instituição.
2
Mestranda em Direito das Relações Sociais – UNAMA; Especialista em Gestão Escolar – UNAMA;
Especialista em Teoria Antropológica UFPA; Bacharel e Licenciada Plena em História – UFPA; Professora de
Metodologia do Trabalho Científico – CESUPA e Assessora do Núcleo de Propriedade Intelectual – CESUPA.
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
DIVERSIDADE CULTURAL
A diversidade cultural nos parece um tema familiar, ao menos sob o
•
aspecto ideológico da história do Brasil.
180 Durante um longo período, tivemos presente em nossa história oficial o
mito da democracia racial que afirmava a mais harmônica convivência entre as
três "raças" que formavam a população brasileira: o índio, o negro e o branco.
Como "prova" principal desta democracia vivenciada no país estava, saltando a
nossos olhos, a miscigenação do povo brasileiro.
Corroborado por vasta produção historiográfica tal mito traduziu os
interesses das classes dominantes em esconder uma história marcada pelo
etnocentrismo europeu e, posteriormente, pelo preconceito generalizado ante as
culturas nativas.
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
Ao mesmo tempo em que se afirma a coexistência pacífica das três
culturas que fundaram a nação, o governo brasileiro sempre deu pistas de que o
território nacional não era esse "paraíso das raças".
E este é um outro traço característico da nossa história: as constantes
tentativas, por parte das classes dominantes, de promover uma integração nacional.
No período colonial, há, por parte dos missionários, a intenção de
converter os nativos ao cristianismo e aos costumes europeus. Posteriormente, os
conflitos de grupos sociais que marcaram o período imperial, como a
Cabanagem, sempre, fortemente, reprimidos pelo governo em nome da ordem
do Império, também tentaram mascarar as diferenças culturais existentes no país.
E, posteriormente, com o ideário de república, surge a tarefa de tentar eliminar a
identificação entre mestiçagem e desenvolvimento cultural, a fim de construir um
novo referencial de cultura para o país.
É aqui, neste momento que nos deparamos com a diversidade cultural posta
como um problema para aqueles que a qualquer custo, como as classes dominantes
brasileiras, propõem uma integração. Sobre esta questão afirma Monteiro:
As diferenças culturais emergem como problemas sempre que,
pessoas, grupos ou instituições estão empenhados em integrar em
um todo mais ou menos homogêneo - nação, sociedade brasileira,
cidadania, etc - as diferenças de hábitos, visões de mundo e valores
distribuídos em um dado espaço geográfico. Assim, pode-se dizer
que, enquanto as diferenças culturais constituem um fato coetâneo
das sociedades humanas, o problema da diversidade só se põe em
circunstâncias muito particulares, nas quais um tipo específico de
relação social voltada para a integração das diferenças, prevalece.
(MONTEIRO, 2001, p. 40).
A partir da Constituição de 1988 é possível perceber uma inovação acerca
da questão da diversidade cultural em seus artigos 215 e 2163 que reconhece a •
pluralidade cultural brasileira e incentiva a preservação da cultura nacional.
181
3
Art.215- O Estado garantirá a todos o pleno exercício dos direitos culturais e acesso à fontes de cultura nacional,
apoiará e incentivará a valorização e a difusão das manifestações culturais.
Art.216 – Constituem patrimônio cultural brasileiro, os bens de natureza material e imaterial, tomados
individualmente ou em conjunto, portadores de referência à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos
formadores da sociedade brasileira, nos quais se incluem:
I – as formas de expressão;
II – os modos de criar, fazer e viver;
III – as criações científicas, artísticas e tecnológicas;
IV – as obras, objetos, documentos, edificações e demais espaços destinados às manifestações
artístico-culturais;V – os conjuntos urbanos e sítios de valor histórico, paisagístico, artístico, arqueológico,
paleontológico, ecológico e científico.
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
PROPRIEDADE INTELECTUAL
Como o próprio nome demonstra, a Propriedade Intelectual tem como
objetivo proteger as criações do intelecto seja de natureza artística ou científica.
Parte-se do pressuposto de que para se criar algo é desencadeada uma série de
esforços decorrentes dos anos de estudos e de vivências do criador, oriundos de
suas emoções, de seu impulso criativo e dos próprios trabalhos científicos, de
pesquisa ou empíricos, além de envolver certos custos a serem arcados. Assim,
Del Nero (1998, p. 38) coloca que:
Propriedade Intelectual refere-se a "idéias", "construtos", que são,
• essencialmente, criações intelectualmente, construídas a partir de formas de
182 pensamento que se originam em um contexto lógico ou, socialmente, aplicáveis ao
conhecimento técnico-científico, desencadeando ou resultando uma inovação.
Pode-se dizer, da mesma forma como é expressa pela Teoria da
Propriedade de Locke (2002: 38), que o direito a propriedade existe pelo único
fundamento do trabalho humano, que, neste caso, é o trabalho intelectual:
4
Por conta dessa dualidade direito patrimonial e direito moral, existiu uma discussão doutrinária acerca da
natureza jurídica do Direito Autoral, se ele seria eminentemente um bem patrimonial ou um direito
personalístico. (HAMMES, 1998, p. 41)
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
Segundo o artigo 7º da Lei de Direito Autoral Brasileira, são "obras
intelectuais protegidas as criações do espírito, expressas por qualquer meio ou
fixadas em qualquer suporte, tangível ou intangível, conhecido ou que se invente
no futuro", como as obras literárias, obras dramáticas, obras musicais,
coreografias fixadas por escrito, composições musicais, desenhos, pinturas,
gravuras, esculturas, fotografias, dentre outros.
Apesar das formas de expressões da cultura tradicional constarem,
predominantemente, na enumeração exemplificativa do artigo 7º, a Lei traz
algumas implicações legais que dificultam a proteção das expressões culturais
advindas de Conhecimentos Tradicionais, contudo contornáveis, permitindo
uma certa proteção desde que ocorra a materialização do patrimônio imaterial.
Entende-se por isto, justamente, o incentivo a produção de bens, inspirados
na cultura tradicional, que possam vir a ser protegidos pela lei de direitos autorias
tal como ela se encontra atualmente, ou seja, fixar canções tradicionais, passar
coreografias de danças tradicionais para o papel, escrever obras literais sobre lendas
e costumes da comunidade, bem como poesias tradicionais.
É evidente que esta não é a forma ideal de salvaguarda da cultura
tradicional, como o imprescindível sistema sui generis para a proteção dos
Conhecimentos Tradicionais, mas pode ser uma possibilidade à disposição das
comunidades e povos tradicionais para o registro do seu patrimônio cultural e
capaz de aumentar a auto-estima dos seus integrantes, mostrar o valor de sua
cultura, transmitir as tradições para as próximas gerações ou para os que não
pertencem ao seu meio social, registrar a cultura para além do tempo, verificando
suas transformações e realçando a diversidade cultural do país. 5
5
Um exemplo mais antigo é do poeta clássico Homero, que registrou mitos da Grécia antiga em duas obras “A
Odisséia” e “A Ilíada”. Há quem defenda que ele nunca existiu e que é apenas um pseudônimo para vários poetas
anônimos por causa de lacunas e diferenças em seus escritos, porém, de qualquer forma, graças a esses mitos
estarem escritos é que chegaram até o homem moderno.
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
6
Por mais que a Lei de Direito Autoral, na alínea “h”, inciso VIII, do seu artigo 5º, conceitue a obra coletiva como
aquela “criada por iniciativa, organização e responsabilidade de uma pessoa física ou jurídica, que a publica sob
seu nome ou marca e que é constituída pela participação de diferentes autores, cujas contribuições se fundem
numa criação autônoma”, existe uma omissão quanto as obras de comunidades tradicionais, a não ser que elas
estejam organizadas como pessoa jurídica.
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
A grande incompatibilidade, no que tange as disposições legais sobre
obras coletivas, talvez seja a insistência em entender como coletivo a soma de
indivíduos, esquecendo-se do caráter copertencente (ou seja, coletivo e
indissolúvel), bem como, transcendental e sagrado de tais práticas culturais.
Diferentemente das expressões do folclore, que são tidas como de
domínio público, a cultura tradicional tem uma autoria determinável, ou seja,
pertence a uma respectiva comunidade ou a um respectivo povo. Contudo, é
impossível considerar a titularidade do Direito Autoral a uma única pessoa, já
que, se existiu um autor, ele se perdeu no tempo e, durante séculos, os indivíduos
da coletividade deram sua contribuição pessoal para que a prática tradicional
fosse, de tal forma, como é identificada atualmente.
Então, mesmo em trabalhos individuais, como o artesanato e outros, o
autor reproduz o processo que seus antepassados faziam e que outros membros da
comunidade também reproduzem, visto que são de elementos que já se
encontram prontos no patrimônio cultural da comunidade e o individuo só tem o
trabalho de os materializar. (BAPTISTA e VALLE, 2004)
Se aceito o argumento falacioso de que os conhecimentos tradicionais são
meras idéias, significaria que, de acordo com o inciso I do artigo 8º, não seriam
considerados como objeto de proteção do Direito Autoral. Assim lendas
poderiam integralmente se tornar livros, músicas tradicionais poderiam ser
gravadas ou utilizadas no arranjo musical de outras composições e a autoria seria
de uma única pessoa, que poderia ou não pertencer à comunidade ou ao povo,
sem o devido reconhecimento à coletividade detentora dos conhecimentos.
Obviamente que o autor teve trabalho para escrever, gravar ou fixar a obra e,
em alguns casos, isso também poderia significar um certo trabalho de pesquisa.
Além disso, a Lei de Direito Autoral trata também dos direitos conexos, que são os
direitos de intérpretes, produtores e executores que, pelo que dispõe o artigo 89,
têm direitos sobre seu trabalho por agregar valores à obra. Mas, de qualquer forma,
a comunidade, cuja cultura tradicional foi acessada e utilizada, poderia e deveria ser •
aceita, senão legalmente, pelo menos moral e eticamente como co-autoras.7
187
Pelo que foi exposto quanto à autoria, o meio pelo qual as formas de
expressão da cultura tradicional pudessem ser protegidos pelo Direito Autoral é
ou um individuo se responsabilizando pela organização da materialização do
patrimônio cultural tradicional, ou a coletividade se organizando como pessoa
jurídica. Para tanto, também seria recomendável seguir certos procedimentos
utilizados para acesso e uso de conhecimentos tradicionais associados a recursos
do patrimônio genético: um pedido de anuência prévia da coletividade precedido
por explicações detalhadas e acessíveis da obra que se pretende realizar;
7
Art. 5º, inciso VIII, alínea “a” da Lei de Direito Autoral: quando é criada em comum, por dois ou mais autores.
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
Por fim, percebe-se que a lei autoral como se encontra permite uma certa
proteção á cultura tradicional, porém sem ser o que realmente as comunidades
tradicionais desejariam. O ideal seria que a legislação sofresse certas
flexibilizações que permitissem uma proteção maior.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Com base nas discussões levantadas neste artigo, apontamos para as
seguintes considerações:
1) é de grande importância repensar acerca de determinadas
categorias cristalizadas na literatura acadêmica, tais como: “cultura popular”,
“cultura erudita”, “diversidade cultural”, “cultura”, entre outros, a fim de evitar
que tais categorias se transformem em objetos auto-evidentes;
2) os discursos uniformizantes das classes dominantes brasileiras
ao longo do processo de construção da história oficial do país devem ser
relativizados e transplantados para contextos sócio-políticos mais amplos;
3) a concepção de diversidade cultural está intimamente ligada a
valorização da cultura tradicional e o aumento da auto-estima das comunidades
detentoras destas culturas, uma vez que, para assegurar a co-existência de culturas
plurais, é necessário que as mesmas sejam vistas como igualmente importantes;
4) é importante ressaltar que os elementos da cultura tradicional
agregam valor à produção industrial e comercial, mas não tem preço
suficientemente alto de mercado e, portanto, merecem a devida proteção jurídica;
5) destacamos a possibilidade de proteção das formas de expressão
da cultura tradicional por meio dos mecanismos da Propriedade Intelectual, dentre
eles o Direito Autoral, cogitando-se a melhor forma de acordo com o sujeito que
• acessará a cultura tradicional e a finalidade a qual se destina tal acesso;
REFERÊNCIAS
BLASI, Gabriel Di et. All. Propriedade Industrial. Forense: Rio de Janeiro, 2000.
193
Propriedade Intelectual e Patrimônio Cultural: proteção do conhecimento e das expressões culturais tradicionais
Reminiscências das Guerras: estudo
das armas das coleções etnográficas
dos povos indígenas das guianas
Carlos Eduardo Chaves1