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E-book: BARROS, D.M.V. et al. (2011) Educação e tecnologías: reflexão, inovação e práticas. Lisboa: [s.n.

ISBN: 978-989-20-2329-8

A Realidade Aumentada no Ensino de Ciências: tecnologia e aplicações.

Aguinaldo Robinson de Souza – Depto de Química – UNESP -FC- arobinso@fc.unesp.br


Antônio Carlos Sementille – Depto de Computação – UNESP – FC –
semente@fc.unesp.br

Wilson Massashiro Yonezawa – Depto de Computação - UNESP-FC -


yonezawa@fc.unesp.br

1. Introdução

Os computadores estão presentes no ambiente escolar desde os últimos 35


anos. O computador pessoal surgiu em meados da década de 70 e desde
então os avanços e inovações tecnológicas associadas aos computadores
foram explorados de alguma forma na educação. Inicialmente as aplicações
educacionais exploraram a capacidade de cálculos e armazenamento de dados
dos computadores. Neste período, houve uma preocupação com o
desenvolvimento de conteúdo, uma vez que a mídia digital oferecia um
potencial enorme para armazenamento em um espaço reduzido. Isso é
percebido observando o desenvolvimento das mídias de armazenamento ao
longo dos últimos 20 anos, desde o disquete, disco rígido, passando pelo CD,
DVD, no armazenamento baseado em memória flash e Blue-Ray, e agora com
o conceito de computação na nuvem (cloud computing). Aplicações multimídia,
que manipulavam textos, áudio, imagens e vídeos, na forma digital, gravadas
em CD ou DVD são exemplos deste período. Com o aparecimento das redes
de computadores, o uso educacional explorou a característica de
compartilhamento de recursos computacionais. Por meio das redes de
computadores, era possível a troca de informações de um computador para
outro e isso abriu um novo leque de oportunidades na educação. Na década de
90 com a expansão da Internet, a comunicação foi o principal elemento
explorado. No inicio do século 21, com o surgimento da chamada Web 2.0, o
foco foi ampliado e passou a incluir a colaboração.

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Figura 1 – Fases do uso dos computadores na educação

A Figura 1 descreve cada fase e os aspectos que influenciaram o uso dos


computadores nessas fases. Observe que cada fase aproveitava os aspectos
chave da fase anterior, incluindo um novo aspecto na sua época. De certa
forma, o que se percebe é um amadurecimento da área, isto é, de como o
computador, ou seja, a tecnologia, vista aqui como ferramenta, deve ser
explorada na educação. Observa-se um deslocamento do uso da ferramenta
“computador” como elemento de auxilio no processo para uma ferramenta
direcionada para ao resultado do processo. Em vez de ajudar a tornar o
processo de educação melhor, o computador está se voltando para como
tornar o resultado da educação, algo melhor. Postman (Postman, 1994),
comenta, “quando uma tecnologia entra em um ambiente, o resultado não é um
ambiente antigo acrescido da tecnologia, mas um ambiente totalmente
diferente”. A tecnologia não apenas evoluciona o ambiente, ela revoluciona.
Desta forma, o computador não é mais utilizado para a alfabetização ou para o
letramento do indivíduo, mas para o resultado em tornar o individuo letrado.
Não querendo discutir aqui o objetivo da educação do ponto de vista ético e
moral, mas do ponto de vista prático, de fazer conceber soluções melhores,
diríamos que o uso dos computadores na educação será caracterizado pela
inovação (Figura 2). A inovação, como resultado do processo e não como o
processo. A possibilidade de usar plenamente e estender o uso dos
computadores; não mais para assimilar conteúdos e conhecimento, mas para
aplicar e gerar novos conhecimentos.

Figura 2 – Próxima fase no uso dos computadores na educação

O que temos disponível hoje, em termos de computadores, são máquinas


extremamente poderosas quanto à capacidade de processamento e

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armazenamento, aliadas com uma infra-estrutura de comunicação de dados.


Atualmente podemos criar aplicações que necessitam de cálculos matemáticos
complexos, que não eram possíveis de serem desenvolvidas há alguns anos
atrás. Um exemplo está no processamento de imagens em tempo real. Esta
tarefa exige que o computador trate pelo menos 24 frames por segundo.
Dependendo do tamanho de cada frame (imagem), isto é, o número de pontos
individuais que formam a matriz que representa uma imagem, o computador
precisa processar rapidamente informações sobre milhões de pontos.

Ao longo do tempo o termo computador, ou tudo aquilo que é possível de se


produzir com um computador, passou a fazer parte de um contexto mais
amplo, denominado Tecnologia da Informação e Comunicação ou TIC. O
termo TIC pode ser definido como o conjunto das tecnologias digitais para
aquisição, processamento, armazenamento e transmissão de informações em
formato digital. O uso educacional das TIC é um grande desafio para os
educadores, mas também oferece inúmeras oportunidades.

Dentre as inúmeras inovações tecnológicas que surgiram nos últimos anos, na


computação, a Realidade Aumentada (RA) apresenta um potencial para ser
explorado na educação, em especial em ensino de ciências.
No presente artigo iremos apresentar as possibilidades, oportunidades e
aplicações da realidade aumentada no ensino de ciências. Este tema encerra
domínios do conhecimento que vão desde os procedimentos algorítmicos de
resolução de problemas com diferentes heurísticas, passando pelo
desenvolvimento de estratégias para a apresentação de conceitos de áreas
como a Química, a Física, a Biologia e a Matemática na sua forma mais
completa e abrangente e pela Ciência da Computação tanto do ponto de vista
de desenvolvimento de software como de hardware específicos. O objetivo,
portanto é familiarizar o leitor com a tecnologia de RA e de como esta pode ser
inserida em atividades dentro da sala de aula no processo de ensino e de
aprendizagem de conceitos científicos.

2. Realidade aumentada

A Realidade Aumentada é uma variação dos Ambientes Virtuais (AV) ou


também conhecida como Realidade Virtual (RV). Na RV o usuário está imerso
dentro de um ambiente sintético e enquanto permanece nesse ambiente, não
pode ver o mundo real ao redor dele (Azuma, 1997).
Azuma (1997) declara que ao contrário da RV, a RA permite que o usuário veja
o mundo real acrescido de objetos virtuais, compostos ou sobrepostos com o
real. Desta forma, a RA complementa ou suplementa a realidade em vez de
substituí-la. Para Kirner e Sicoutto, a RA possibilita o enriquecimento do
ambiente real com objetos virtuais, por meio do uso de algum dispositivo
tecnológico, funcionando em tempo real (Kirner e Sicoutto, 2007).

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A Realidade Aumentada (RA) pode ser definida como a sobreposição de


objetos virtuais tridimensionais, gerados por computador, com um ambiente
real, por meio de algum dispositivo tecnológico. A RA mistura imagens reais
com elementos virtuais, criando um ambiente misto em tempo real. Desta
forma, podemos dizer que uma aplicação de RA consiste da captura da
realidade, do processamento da imagem, da inserção, na imagem, de
elementos virtuais, e da visualização da realidade acrescida dos elementos
virtuais gerados pelo computador. A Figura 3 mostra um exemplo de aplicação
de RA desenvolvida pela empresa GE, disponível na Internet, relacionado à
produção e uso racional de energia.

Figura 3 – Exemplo de RA1


(Fonte: http://ge.ecomagination.com/smartgrid/#/augmented_reality)

A Figura 4 mostra onde estão situadas as aplicações baseadas em RA. Nos


extremos estão o ambiente real e o ambiente totalmente virtual, isto é, um
ambiente gerado e mantido inteiramente no computador. As aplicações de RA
se estabelecem dentro do intervalo entre o real e o virtual. Este intervalo entre
o real e o virtual foi denominado por Milgram e Kishino como “virtualidade
continua” (Milgram e Kishino, 1994).

Figura 4 – Faixa de aplicação da RA (adaptado de Milgram e Kumio, 1994)

Desta forma, as principiais características de um sistema de RA são: a


combinação do real e do virtual, a interação em tempo real e o uso de objetos

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Foto de um dos autores deste texto.

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em 3D (terceira dimensão). O conceito de “tempo real” é critico dentro do


contexto da RA, uma vez que todo processo que envolve a captura da imagem,
rastreamento, processamento e a visualização precisa ocorrer em tempo real.
A Figura 4 apresenta os componentes de aplicação de RA. O conjunto formado
pelo hardware é composto pela câmera de vídeo, pelo computador e por um
monitor de vídeo. O software conta com uma biblioteca de funções de RA ou
toolkit e da aplicação propriamente dita. No exemplo da Figura 4, a câmera
captura a imagem de uma mesa no mundo real. Sobre a mesa, encontra-se um
marcador, ou seja, uma referencia para que o software reconheça onde deve
ser inserido um objeto virtual. A imagem capturada pela câmera é processada
no computador onde a aplicação de RA realiza a identificação do marcador e
projeta um objeto virtual sobre ele. Uma nova imagem, formada pela imagem
geral adicionada com o objeto virtual é gerada e exibida em um monitor de
vídeo.

Figura 5 – Componentes de uma aplicação de RA.

Um dos problemas nas aplicações de RA é a identificação dos objetos na cena.


Isso ocorre porque nem sempre os objetos, ou marcadores, estão fixos. No
exemplo da Figura 5 a câmera pode estar fixa, mas o marcador poderia ser
movimentado sobre a mesa. Em geral, utiliza-se algum processo de
rastreamento. O rastreamento pode ser realizado por meio de diferentes
dispositivos que fazem uso de princípios mecânicos e/ou físicos. O
rastreamento óptico é uma das técnicas utilizadas. Neste tipo de rastreamento
são empregadas, geralmente, técnicas de visão computacional para realizar a
operação (Kirner e Sicoutto, 2007). Novamente, no exemplo da Figura 5, a
imagem capturada é digitaliza e analisada por um software instalado no
computador. Basicamente, o processo de análise consiste em procurar o
padrão do desenho estampado no marcador, na imagem capturada e a partir
daí, identificar sua posição.

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A forma do desenho no marcador determina o tipo de ação que o computador


deve executar. Um exemplo dessa ação seria substituir a área da imagem
digital, onde está o desenho do marcador, por outro desenho gerado pelo
computador. Em situações onde o uso de marcadores não é possível, outras
técnicas de rastreamento óptico também podem ser empregadas. A análise
de características do ambiente como a procura por contornos e/ou cores
também podem ser utilizadas. Técnicas de análise de características naturais,
como corpos, rostos e mãos também estão sendo desenvolvidas. A
combinação de técnicas de rastreamento incorporando diferentes técnicas
como, por exemplo, rastreamento óptico e magnético, compõe uma nova
abordagem.

Milgram e Kishino (1994) discutem uma forma de classificação dos


mostradores (“displays”) utilizados nas aplicações de RA. Na forma mais
simples estão os monitores de vídeo comuns, que funcionam como “uma janela
para o mundo”. Já o chamado “display” montado na cabeça “HMD – Head-
Mounted Display” permite um nível de imersão mais elevado do que o monitor
de vídeos comuns. Uma variação dos HMDs, é a que permite ver através
deles. Neste caso as imagens geradas pelo computador são exibidas
diretamente numa tela transparente a frente dos olhos. São como óculos,
cujas lentes funcionam com monitor de vídeo.
Outras variações que utilizam monitor de vídeos comuns e/ou HMDs, também
são possíveis. A principal mudança está no nível da apresentação gráfica e na
intensidade de imersão. Por exemplo, o nível de imersão poder variar do
completamente imerso até o parcialmente imerso. Na imersão total, o nível do
ambiente pode variar do totalmente gráfico gerado pelo computador até o nível
parcialmente gráfico.

Figura 6 – Ambiente gráfico x Imersão.

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3. Desenvolvimento de aplicações de RA
Como qualquer outro software, o desenvolvimento de aplicações de RA requer
ferramentas. Em geral, na produção de um software, é comumo uso de um
ambiente integrado de desenvolvimento ou IDE (Integrated Development
Environment). Eclipse e Visual Studio, são exemplos de IDE, cujo propósito é
facilitar a edição e compilação do software. Dentro desses ambientes de
desenvolvimento são incorporadas algumas bibliotecas de software. O papel
dessas bibliotecas é oferecer suporte na implementação das funções que a
aplicação ira realizar, tais como: capturar uma imagem e exibir um gráfico em
3D. Um dos objetivos dessas bibliotecas é facilitar o desenvolvimento evitando
que o programador tenha que se preocupar com detalhes específicos do
problema em vez de se concentrar na solução do problema.
Entretanto, no caso da RA, nem sempre, apenas uma biblioteca de software
acomoda todas as funções necessárias ao desenvolvimento da aplicação.
Desta forma, é preciso reunir um conjunto de bibliotecas, cada uma delas
especializada em uma parte das funcionalidades que englobam a RA. Dentro
deste contexto, algumas bibliotecas de RA são gratuitas. As bibliotecas pagas
oferecem mais funcionalidades no desenvolvimento de aplicações de RA, tais
como, permitir o uso de múltiplos marcadores em cena ou oferecem recursos
avançados de rastreamento dos marcadores, além de suporte e atualizações
constantes.
Em geral, o desenvolvimento de aplicações profissionais em RA utiliza
bibliotecas de software proprietárias, isto é, não gratuitas. Porém dentro da
comunidade de software livre (open software) é possível encontrar bibliotecas
gratuitas. Diversas bibliotecas gratuitas estão á disposição. Neste caso, a
definição de quais delas utilizar é uma tarefa delicada e que necessita de
suporte de um especialista na área de computação.
Para que as aplicações em RA sejam possíveis, é necessário o suporte de
bibliotecas gráficas – visto que a RA é também uma tecnologia de
processamento de objetos digitais virtuais. Nesse contexto, a biblioteca
gratuita mais comum que exerce tal função é conhecida como GLUT (OpenGL
Utility ToolKit) (OpenGL, 2010). O GLUT fornece uma interface para a
biblioteca OpenGL. A biblioteca gráfica OpenGL permite a criação de modelos
gráficos, enquanto que a GLUT, oferece uma Interface de Programação de
Aplicação (API - Application Programming Interface) com funcionalidades para
implementação e uso de menus, botões e suporte a joystick. Apesar de não ser
um aplicativo de código aberto, a GLUT pode ser utilizada livremente.
Além do GLUT e OpenGL, é preciso contar com outra biblioteca de software. A
biblioteca ARToolKit (2005),uma biblioteca de software livre, implementando
por Hirokazu Kato e utilizado atualmente por pesquisadores do Laboratório
Tecnológico de Interface Humana (HITL), na Universidade de Washington,
opera através de técnicas de visão computacional, processamento de imagens
e programação. Nesse contexto, por meio de técnicas de visão computacional,
a biblioteca ARToolKit oferece funções que permitem rastrear rapidamente e
calcular a posição real da câmera e de seus marcadores de referência em
tempo real, possibilitando que o programador acrescente objetos virtuais sobre

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estes marcadores no mundo real resolvendo, assim, uma das maiores


dificuldades no desenvolvimento de aplicações de RA. Desta forma, a
biblioteca ARToolKit, consiste na principal biblioteca utilizada no
desenvolvimento de aplicações de RA. A FLARToolKit (2010) é outra opção
de biblioteca de RA, constituindo uma implementação da ARToolKit para o
desenvolvimento de aplicações de RA com base na tecnologia Adobe Flash.
Entretanto, a utilização do ARToolKit sem nenhum outro complemento torna-se
limitada. A utilização da biblioteca gráfica OpenSceneGraphic ou OSG (2010),
também de código aberto e multiplataforma, disponibiliza um conjunto de
ferramentas para o desenvolvimento de aplicações gráficas de alto
desempenho. A OSG ainda oferece um recurso denominado grafo de cena,
uma estrutura de dados que permite a organização hierárquica de objetos que
constituem a cena. Parte-se do princípio que uma cena é normalmente
decomposta em várias partes diferentes, que precisam ser “ligadas” de alguma
forma.
Um grafo de cena é, então, um grafo em que cada nó representa uma das
partes em que a cena pode ser dividida. Dessa forma, a rigor, um grafo de
cena é um grafo acíclico direcionado que estabelece uma relação entre os nós
(partes da cena). Assim, forma-se o contexto para a utilização da biblioteca
OsgArt (2010). Essa biblioteca facilita o desenvolvimento de aplicações de RA,
combinando as funções de detecção e rastreamento de marcadores do
ARToolKit com as funções para construção de modelos virtuais da biblioteca
OSG (OpenSceneGraph) . A Osgart apresenta alta qualidade na composição
(renderização) dos objetos virtuais e permite ainda a importação e exportação
de arquivos gerados por softwares gráficos como o 3D Studio Max e Maya. A
respeito das características do OsgArt, destacam-se: a facilidade de integração
com vídeos, suporte a várias entradas de vídeo, suporte a técnicas de
renderização de sombras, suporte a múltiplos marcadores, sendo constituída a
partir do paradigma orientado a objeto, e também possui suporte a várias
linguagens de programação. O contexto que envolve as diferentes bibliotecas
de software para o desenvolvimento de uma aplicação de RA pode ser
observada na Figura 7.

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Figura 7 – Bibliotecas de software em uma aplicação de RA.

4. Realidade Aumentada na educação

A tecnologia de RA está madura o suficiente para ser aplicada em uma ampla


gama de domínios de aplicação (Billinghurst, 2010). A educação é uma das
áreas onde a RA em potencial. Billinghurst (2010) caracteriza três diferentes
razões que tornam a RA apta para uso na educação: a) suporte para uma
interação mais fluida entre o ambiente real e o virtual; b) a utilização de
metáforas oferecidas pelas interfaces tangíveis para manipulação de objetos; c)
a capacidade de uma transição mais tranqüila entre a realidade e a
virtualidade. Exemplos de aplicações de RA na educação podem ser
encontrados em: Magic Book (Billinghurst, Kato, Poupyrev, 2001) e Magic Lens
(Looser, Grasset, Billinghurst, 2007).
Conforme discutido no tópico anterior, um dos pontos chave de um sistema de
RA é a questão do rastreamento de objetos na cena. Tal operação requer um
conjunto de software e hardware. O rastreamento trata, entre outras coisas, da
identificação do(s) objeto(s). A forma mais comum é o rastreamento óptico.
Informações do mundo real são capturadas através de imagens que são
enviadas para um computador. As imagens são analisadas de forma que
determinados elementos contidos na cena possam ser identificados como, por
exemplo, padrões baseados em formas. Tais imagens podem ser obtidas por
diferentes processos. O mais comum são imagens geradas por câmeras
digitais convencionais que utilizam a luz visível. Entretanto é possível explorar
outros comprimentos de onda para gerar imagens, como por exemplo, na faixa
do infravermelho. De qualquer forma, independentemente do tipo de técnica
utilizada para ser obter a imagem, esta compõe o elemento base a ser
analisado.
Os principais desafios no processo de rastreamento dizem respeito à
velocidade e a precisão com que o sistema identifica o elemento desejado

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dentro de uma cena. Considerando que o contexto da cena é dinâmico


devemos incluir diversos complicadores no processo. Um índice de precisão
por ser composto por intermédio de métricas tais como a taxa de falsas
positivas ou falsas negativas que a uma determinada técnica de rastreamento
produz. Técnicas de rastreamento como maior grau de precisão,
provavelmente requerem mais elementos de hardware e software, o que
elevará os custos de aquisição, utilização e manutenção. A escolha de uma
técnica ou tecnologia de RA vai depender claramente do tipo de aplicação, do
domínio ou contexto onde a RA será utilizada. Por exemplo, aplicações de RA
na área militar ou médica possuem características diferentes das aplicações de
RA para as áreas de entretenimento ou educação. Em geral, sistemas de RA
para uso militar ou medicina, que tratam de vidas humanas, são sistemas
críticos caracterizados por atenderem requisitos rígidos de desempenho,
precisão, confiabilidade e segurança. Um exemplo de aplicação da RA é
mostrado na Figura 8. Neste exemplo, uma imagem gerada pelo computador é
sobreposta numa imagem real do paciente em uma mesa de cirurgia. A
imagem gerada pelo computador mostra áreas do cérebro do paciente, o que
facilita o trabalho do cirurgião.

Figura 8 – Imagens sobrepostas


(Fonte: Project on Image Guided Surgery, 2010)

No caso das aplicações educacionais, as características importantes são: o


conteúdo e suas diferentes formas, simulações, a interação com o usuário e a
possibilidade de experimentação. No mundo digital, os conteúdos assumem
diferentes formas, como textos, gráficos, animações, imagens, vídeo e som.
Desta maneira é possível oferecer um mesmo conteúdo em diferentes
formatos. Assim, diferentes estilos de aprendizagem fazem uso de diferentes
formatos do mesmo conteúdo. Quanto às simulações, os ambientes virtuais
possibilitam, por exemplo, o desenvolvimento de uma experiência controlada
do mundo real. Isso pode útil para que os usuários ou alunos aproximem o
mundo conceitual, mais abstrato, do mundo real. Além disso, as simulações
permitem situações do tipo “what-if”, ou seja, “o que acontece se ..?”. Desta
maneira, o aluno pode experimentar e observar novas situações sem medo de
errar, o que claramente é benéfico para o processo de ensino e aprendizagem.

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A interação permite que o aluno não somente utilize o ambiente, como também
altere o comportamento do mesmo.
Os ambientes virtuais proporcionados pela RV e RA estimulam alguns dos
sentidos do corpo humano, como a visão e a audição. Porém, o sentido tato
nem sempre é estimulado. Uma das maneiras para tornar mais significativo
para o usuário na utilização dos sistemas baseados em computadores,
explorando, além da visão e audição, o sentido do tato, surgiu com o conceito
de “interfaces tangíveis”. Para Ullmer & Ishii (2000), “uma interface tangível
oferece uma forma física para a informação digital, empregando-se artefatos
físicos, tanto para a representação como para o controle da mídia
computacional. Interfaces tangíveis correlacionam a representação física com a
representação digital...”. Desta forma, existe uma relação entre um objeto
virtual e um objeto real. Manipulando o objeto real controla-se o objeto virtual.
Um exemplo seria o “pad” do console de videogame Wii. Através da
manipulação espacial deste objeto real, é possível controlar o objeto virtual
num jogo.
Em Falção (2007) são descritos projetos de uso das chamadas interfaces
tangíveis na educação. Algumas dessas pesquisas integram a RA com as
interfaces tangíveis. Para Falção (2007), “As interfaces tangíveis introduzem
formas de interação inovadoras que podem ser mais naturais ao ser humano, e
têm se difundido em vários campos, inclusive na Educação”.

Como um exemplo de aplicação da RA em ensino de ciências, sugerimos o


desenvolvimento das atividades propostas no projeto Scimorph descritas no
site http://scimorph.greatfridays.com/. Neste site encontramos três aplicações
da RA no ensino de conceitos na área de Biologia e de Física desenvolvidas
com a utilização de material de fácil acesso e de um computador conectado a
rede internet e uma câmera de vídeo.
Na área de Biologia é apresentada uma investigação sobre micróbios e na área
de Física são apresentadas duas investigações: uma sobre a gravidade e outra
sobre sons. Ao usuário é disponibilizado um marcador, Figura 9, que será
utilizado nas diversas aplicações do software de RA disponibilizado no site e ao
lado está o personagem que este representa.

Figura 9. Marcador utilizado nas aplicações e o personagem Scimorph.

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No desenvolvimento das atividades são propostos diversos sites na internet


onde o estudante poderá utilizar como guia ou como estratégia de consulta no
desenvolvimento dos conceitos envolvidos como, por exemplo, o site na NASA
que envolve atividades sobre os efeitos da gravidade no personagem
Scimorph. Este personagem é um avatar que responde aos diferentes
ambientes em uma série de atividades em que é exposto. Os ambientes
virtuais presentes nas jornadas são ricos em conceitos científicos. O
personagem enfrenta situações que possibilitam a discussão para a solução
dos problemas através de ferramentas interativas baseadas na RA. O principal
objetivo em cada atividade é estimular as discussões entre as crianças e
professores sobre os conceitos científicos apresentados em cada situação. O
personagem pode ser considerado como uma sonda do ambiente estudado,
pois através da modificação de suas características físicas pode levar à
resolução, pelo estudante, de uma forma dedutiva, do problema apresentado.

As atividades a serem desenvolvidas nesta aplicação requerem do estudante


uma atitude crítica em relação às possíveis escolhas no desenvolvimento dos
experimentos propostos. Uma destas atividades requer que o estudante avalie
as diferentes situações e faça previsões quando o personagem Scimorph
realiza experimentos no planeta Terra, na Lua, em Júpiter e no espaço. As
atividades experimentais e investigativas têm como foco a discussão, a
resolução de problemas, observações, a pesquisa, a sugestão de explicações
usando conhecimento científico e como a ciência pode nos auxiliar no
entendimento dos fenômenos observados.

Podemos vislumbrar muitas outras aplicações da RA no ensino de ciências


como na área da Química com a construção de modelos moleculares e o
ensino da Tabela Periódica dos Elementos Químicos, onde neste caso os
marcadores seriam os símbolos dos elementos. O marcador para o elemento
lítio seria o seu símbolo na Tabela Periódica, ou seja, Li. A partir do símbolo Li,
o estudante terá à sua disposição um marcador que possui todas as
características químicas e físicas deste elemento podendo então experimentar
possíveis combinações com outros elementos químicos.

Na Matemática podemos experimentar o desenvolvimento de aplicações na


Geometria como, por exemplo, o estudo de sólidos geométricos. Um marcador
seria utilizado para cada sólido e a partir deste marcador o estudante poderá
visualizar todas as suas propriedades. Na Figura 10 apresentamos um possível
marcador para o cubo.

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Figura 10. Um marcador para o cubo.

No ensino de Física podemos desenvolver um aplicativo sobre o pêndulo onde


o estudante poderá experimentar diversas situações como, por exemplo, qual o
efeito da variação dos parâmetros: massa do corpo e comprimento do fio, nos
períodos de oscilação do pêndulo. As equações do movimento do pêndulo
podem ser “adicionadas” ao marcador e assim, o usuário poderá experimentar
várias situações experimentais desde as que podem ser realizadas num
laboratório físico como em situações onde o arranjo experimental seja de difícil
confecção em ambiente real. No caso de pêndulos acoplados ou compostos, a
explicação das observações fica prejudicada devido ao grande número de
parâmetros que estão correlacionados. Em outra atividade como no estudo do
pêndulo relativístico, fica impossível a sua realização num laboratório real e, no
entanto na aplicação em RA o estudante poderá realizar vários experimentos
com este instrumento com certa facilidade. Na Figura 11 apresentamos a
equação que poderá ser “adicionada” ao marcador do pêndulo. Na expressão
abaixo L é o comprimento do fio, g a aceleração da gravidade e T o período de
oscilação do pêndulo.

Figura 11. Expressão para o período do pêndulo.

5. Considerações finais
A RA oferece oportunidades e abre novas perspectivas no campo educacional,
em especial, no ensino de ciências. A crescente disponibilidade de
equipamento de TI como computadores, laptops, câmeras e vídeos, o aumento
do poder computacional e a redução dos custos, tornam a RA cada vez mais

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acessível para uso na educação. Embora o desenvolvimento de software para


RA ainda represente um desafio, espera-se em futuro próximo, surjam novas
ferramentas e/ou ambientes integrados de desenvolvimento de software
específicos para RA, facilitando assim a construção de aplicações
educacionais. Como qualquer nova tecnologia dentro da TI, a adoção da RA na
educação é apenas uma questão de tempo e de oportunidades.

Referências

ARToolKit. (2005) “ARToolKit”. Disponível em:


http://www.hitl.washington.edu/artoolkit/. Acesso em 08 de março de 2005

Azuma, R. T.; A Survey of Augmented Reality. Presence: Teleoperators and


Virtual Environments 6, 4 (August 1997), 355-385.

Billinghurst, M. Augmented Reality in Education. Online:


http://it.civil.aau.dk/it/education/reports/ar_edu.pdf. Acessado em outubro de
2010.

Billinghurst, M.; Kato, H.; Poupyrev, I. The MagicBook: A Transitional AR


Interface. Computers & Graphics. Vol.: 25, Issue 5. P. 745-754. 2001.

Falção, T. P. R. Design de interfaces tangíveis para aprendizagem de conceitos


matemáticos no Ensino Fundamental. Dissertação de Mestrado. Universidade
Federal de Pernambuco. CIN. Ciência da Computação. 2007.

FLARToolkit. Online: http://www.libspark.org/wiki/saqoosha/FLARToolKit/en.


Acessado em outubro de 2010.

Kirner, C.; Siscoutto, R. “Fundamentos de Realidade Virtuale Aumentada”, em


Realidade Virtual e Aumentada: Conceitos, Projeto e Aplicações. Pré-Simpósio
IX Symposium on Virtual and Augmented Reality. Petrópolis. 2007.

Looser, J.; Grasset, R.; Billinghurst, M. A 3D Flexible and Tangible Magic Lens
in Augmented Reality. 6th IEEE and ACM International Symposium on Mixed
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