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ISAAC DIZOLELE MAUNGUDI

EXEGESE DO NOVO TESTAMENTO: ANÁLISE


DO TEXTO DE ATOS 9.1-9

MARÍLIA - SP
2019
ISAAC DIZOLELE MAUNGUDI

EXEGESE DO NOVO TESTAMENTO: ANÁLISE


DO TEXTO DE ATOS 9.1-9

Trabalho apresentado em
cumprimento às
exigências da disciplina
Exegese do NT do Curso
Livre de Teologia EAD
FECP, ministrada pelo
facilitador Marcelo da
Silva Carneiro.

São Paulo
2020
SUMÁRIO

Primeira aproximação..........................................................................................4
I - Tradução..........................................................................................................5
1. Texto grego......................................................................................................5
2. Tradução
literal.................................................................................................5
3.Comparação de traduções................................................................................5
4.Tradução
pessoal..............................................................................................8

II - Análise
literária..............................................................................................10
1.Análise do Gênero
Literário.............................................................................10
2. Análise das
Estruturas..................................................................................10
3. Análise do Contexto
redacional....................................................................13
4. Análise
Extratextual......................................................................................14

III – Análise de
Conteúdo....................................................................................16
1.O mundo do
texto............................................................................................16
2. Análise narrativa de Atos 9.1-
9.......................................................................17

IV –
Hermenêutica..............................................................................................20
1.Teologia do
Texto............................................................................................20
2. Atualização pastoral.......................................................................................21
Referências
Bibliográficas..................................................................................24
5

PRIMEIRA APROXIMAÇÃO

O texto da nossa exegese será At 9.1-9, que trata da conversão de


Saulo. O texto mostra que Saulo tinha a motivação de matar os discípulos de
Jesus, que eram identificados como os do Caminho. Saulo foi até o sumo
sacerdote pedir cartas para as sinagogas em Damasco, afim de que obtivesse
cooperação para o empreendimento contra os seguidores de Jesus. Mas no
caminho para Damasco, Jesus se revelou a Saulo e transforma o seu destino.
A delimitação do texto não apresenta grandes dificuldades. O elemento
principal que nos ajuda a perceber o início do nosso texto é a mudança de
personagens. A parte final do capítulo 8 está tratando a respeito de Filipe e do
Eunuco. E de repente temos uma mudança de personagem no capítulo 9.1,
que é Paulo. O capítulo 8 termina dizendo o seguinte: “Então Filipe apareceu
mais ao norte, na cidade de Azoto. Anunciou as boas-novas ali e em todas as
cidades ao longo do caminho, até chegar a Cesareia” v40. E o capítulo 9
começa da seguinte maneira: “Enquanto isso, Saulo, motivado pela ânsia de
matar os discípulos do Senhor, procurou o sumo sacerdote” v1, indicando uma
clara mudança de assunto.
Em relação ao final do perícope, temos uma mudança de cenário e de
personagem no versículo 10. O texto diz o seguinte: “Havia em Damasco um
discípulo chamado Ananias. O Senhor o chamou numa visão: ‘Ananias!’. ‘Sim,
Senhor!’, respondeu ele”. O versículo 10 inicia em novo ambiente. A cena
mudou do caminho de Damasco, para dentro de Damasco e texto mudou do
encontro de Jesus com Saulo, para o chamado de Deus a Ananias. Esses
elementos parecem ser suficientes para apontar o final da perícope no
versículo 9. Desse modo podemos concluir que a delimitação de 9.1-9 está
correta e forma uma unidade própria.
Para a nossa pesquisa exegética devemos perguntar: Por que Saulo
ansiava pela morte dos discípulos de Jesus? Por que Jesus diz que ele o
perseguia, quando na verdade Saulo perseguia os seus discípulos? Qual é a
importância e relevância dessa narrativa para o livro de Atos, para o Novo
Testamento e para o Cristianismo? Quais desafios esse texto traz para a minha
vida pessoal, a igreja e para a missão da igreja? A experiência de Saulo deve
6

ser um paradigma para as experiências de todos os cristãos de todos os


tempos?
São estes elementos que iremos pesquisar no texto, utilizando
ferramentas do método histórico-crítico e outros modos de análise exegética.

I – TRADUÇÃO

1. Texto Grego

Atos 9.1-9

2. Tradução literal
1Mas Saulo ainda respirando ameaça e assassinato contra os discípulos
do Senhor, indo ao sumo sacerdote 2pediu de ele cartas a Damasco para as
sinagogas, para que se alguns encontrasse sendo do caminho, tanto homens
quanto mulheres, presos levasse para Jerusalém. 3E em o ir (ele) aconteceu
ele aproximar-se de Damasco, e de repente a ele iluminou em volta (uma) luz
de o céu 4e caindo sobre a terra ouviu (uma) voz dizendo a ele: Saulo, Saulo,
por que me persegues? 5E disse: Quem és Senhor? E ele: Eu sou Jesus a
quem tu persegues; 6mas levante-te e entra em a cidade, e será dito a ti o que
a ti é necessário fazer. 7E os homens os que viajavam com ele ficaram
parados, mudos, de um lado ouvindo a voz mas a ninguém vendo. 8E Saulo foi
levantado de a terra, e estando aberto os olhos dele nada enxergava; e
conduzindo pela mão a ele introduziram em Damasco. 9E estava três dias não
vendo, e não comeu nem bebeu.
7

3. Comparação de Traduções

Almeida Revista e Almeida Corrigida Fiel Nova Versão


Atualizada Transformadora

1 Saulo, respirando E Saulo, respirando Enquanto isso, Saulo,


ainda ameaças e morte ainda ameaças e mortes motivado pela ânsia de
contra os discípulos do contra os discípulos do matar os discípulos do
Senhor, dirigiu-se ao Senhor, dirigiu-se ao Senhor, procurou o
sumo sacerdote sumo sacerdote. sumo sacerdote.

2 e lhe pediu cartas E pediu-lhe cartas para Pediu cartas para as


para as sinagogas de Damasco, para as sinagogas em
Damasco, a fim de que, sinagogas, a fim de que, Damasco, solicitando
caso achasse alguns se encontrasse alguns que cooperassem com
que eram do Caminho, deste Caminho, quer a prisão de todos os
assim homens como homens quer mulheres, seguidores do
mulheres, os levasse os conduzisse presos a Caminho, homens e
presos para Jerusalém. Jerusalém. mulheres, que ali
encontrasse, para levá-
los como prisioneiros a
Jerusalém.

3 Seguindo ele estrada E, indo no caminho, Quando se aproximava


fora, ao aproximar-se de aconteceu que, de Damasco, de
Damasco, subitamente chegando perto de repente uma luz do céu
uma luz do céu brilhou Damasco, subitamente brilhou ao seu redor.
ao seu redor, o cercou um resplendor
de luz do céu.

4 e, caindo por terra, E, caindo em terra, Ele caiu no chão e


ouviu uma voz que lhe ouviu uma voz que lhe ouviu uma voz lhe
dizia: Saulo, Saulo, por dizia: Saulo, Saulo, por dizer: “Saulo, Saulo,
que me persegues? que me persegues? por que você me
8

persegue?”.

5 Ele perguntou: Quem E ele disse: Quem és, “Quem és tu, Senhor?”,
és tu, Senhor? E a Senhor? E disse o perguntou Saulo. E a
resposta foi: Eu sou Senhor: Eu sou Jesus, a voz respondeu: “Sou
Jesus, a quem tu quem tu persegues. Jesus, a quem você
persegues; Duro é para ti recalcitrar persegue!
contra os aguilhões.

6 mas levanta-te e entra E ele, tremendo e Agora levante-se e


na cidade, onde te dirão atônito, disse: Senhor, entre na cidade, onde
o que te convém fazer. que queres que eu lhe dirão o que fazer”.
faça? E disse-lhe o
Senhor: Levanta-te, e
entra na cidade, e lá te
será dito o que te
convém fazer.

7 Os seus E os homens, que iam Os homens que


companheiros de com ele, pararam estavam com Saulo
viagem pararam espantados, ouvindo a ficaram calados de
emudecidos, ouvindo a voz, mas não vendo espanto, pois ouviam
voz, não vendo, ninguém. uma voz, mas não
contudo, ninguém. viam ninguém.
8 Então, se levantou E Saulo levantou-se da Saulo levantou-se do
Saulo da terra e, terra, e, abrindo os chão, mas, ao abrir os
abrindo os olhos, nada olhos, não via a olhos, estava cego.
podia ver. E, guiando-o ninguém. E, guiando-o Então o conduziram
pela mão, levaram-no pela mão, o conduziram pela mão até
para Damasco. a Damasco. Damasco.

9 Esteve três dias sem E esteve três dias sem Lá ele permaneceu,
ver, durante os quais ver, e não comeu nem cego, por três dias, e
nada comeu, nem bebeu. não comeu nem bebeu
bebeu. coisa alguma.
9

Nota-se por meio da comparação das traduções que existem algumas


diferencias consideráveis, ainda que de modo geral as três traduções
transmitam as mesmas ideias. Entretanto, duas diferenças merecem nota:
No versículo 5, a versão Almeida Corrigida Fiel traz o seguinte trecho,
“Duro é para ti recalcitrar contra os aguilhões”, as outras versões da
comparação não trazem esse trecho. E o mais interessante é que o texto
grego supra citado também não contém esse trecho. Como essa expressão
não aparece nas outras traduções e nem no texto grego, então na
adotaremos essa expressão na nossa tradução.
No versículo 6 temos novamente uma notável diferença. A verão
Almeida Corrigida Fiel inclui o seguinte trecho: “E ele, tremendo e atônito,
disse: Senhor, que queres que eu faça?”. Novamente esse trecho não
aparece nas outras versões comparadas e nem na versão em grego aqui
traduzida. As outras versões trazem diretamente a orientação de Jesus a
Saulo, enquanto que na Almeida Corrigida Fiel, é Saulo que pede orientação
para Jesus. Pelas mesmas razões mencionadas no parágrafo anterior, não
incluiremos esse trecho na nossa tradução.

4. Tradução pessoal do texto de Atos 9.1-9


1Mas Saulo pretendendo matar os discípulos do Senhor, procurou o
sumo sacerdote. 2Solicitou-lhe cartas para as sinagogas em
Damasco, com intuito de que, se viesse a encontrar os seguidores do
caminho, homens ou mulher, os levasse presos para Jerusalém. 3Ao
aproximar-se de Damasco, de repente uma luz do céu brilhou ao seu
redor. E caindo no chão, ouviu uma voz que lhe disse: “Saulo, Saulo,
porque você me persegue?”,5e Saulo perguntou: “Quem és tu,
Senhor?”, e o Senhor respondeu: Eu sou Jesus a quem você está
perseguindo! 6Levante-se e entra na cidade, lá te dirão o que fazer”.
7Os companheiros de viagem de Saulo, ficaram parados emudecidos,
pois ouviam a voz, mas não viam ninguém. 8Saulo levantou-se do
chão, mas quando abriu os olhos não enxergava nada. Então o
10

guiaram pela mão até Damasco. 9Ele ficou três dias sem enxergar e
não comeu nem bebeu nada.

II – ANÁLISE LITERÁRIA

1.Análise do Gênero Literário


11

Gênero:
O texto de Atos 9.1-9 faz parte do gênero Acta apostolorum ou Atos,
podendo ser caracterizado como parte do pequeno gênero da Tradição
histórico-narrativa, sendo que se caracteriza como o tipo narrativas biográficas
e históricas, relacionado a vocação de uma das principais personagens do
Novo Testamento, que o apóstolo Paulo.
Contexto vivencial:
A inclusão da narrativa a respeito da vocação de Paulo parece apontar
para um contexto tipológico-apologético, que serviria como importante
credencial para o ministério de Paulo. E ao mesmo tempo, esta narrativa
parece apontar também para o contexto de fé em Jesus como Messias, que é
justamente a experiência de Paulo, estabelecendo-se como um modelo para os
judeus e ao mesmo tempo preparando o ambiente do início da missão para
com os gentios. É provável que este texto fosse usado como uma credencial do
ministério e ensino do apóstolo Paulo.

2. Análise das Estruturas do texto

2.1. Estruturas formais do texto


a. subdivisão do texto
Introdução: Mas Saulo pretendendo matar os discípulos do Senhor,
procurou o sumo sacerdote.
Autorização para o Plano: Solicitou-lhe cartas para as sinagogas em
Damasco, com intuito de que, se viesse a encontrar os seguidores do
caminho, homens ou mulher, os levasse presos para Jerusalém.
Início da Execução: Ao aproximar-se de Damasco,
Revelação do Jesus: de repente uma luz do céu brilhou ao seu redor.
Reação de Saulo 1 - Queda: E caindo no chão,
Diálogo de Jesus 1 - Confrontação: ouviu uma voz que lhe disse: “Saulo,
Saulo, porque você me persegue?”,
Reação de Saulo 2 - Questionamento: e Saulo perguntou: “Quem és tu,
Senhor?”,
Diálogo de Jesus 2 - Apresentação: e o Senhor respondeu: “Eu sou
Jesus a quem você está perseguindo!
12

Diálogo de Jesus 3 - Orientação: Levante-se e entra na cidade, lá te


dirão o que fazer”.
Reação dos companheiros 1 - Impacto: Os companheiros de viagem de
Saulo, ficaram parados emudecidos,
Motivo da reação dos companheiros: pois ouviam a voz, mas não viam
ninguém.
Reação de Saulo 3 – Obediência: Saulo levantou-se do chão,
Reação de Saulo 4 – Cegueira: mas quando abriu os olhos não
enxergava nada.
Reação dos companheiros 2 – Apoio: Então o guiaram pela mão até
Damasco.
Conclusão: Ele ficou três dias sem enxergar e não comeu nem bebeu
nada.

b. subdivisão do texto em tópicos


I – Saulo elabora plano contra cristãos
I.1. Saulo procura o sumo sacerdote (v.1)
I.2. Saulo solicita cartas de prisão para cristão (v.2)

II – Jesus se revela a Saulo


II.1. A revelação no caminho de Damasco (v.3)
II.2. Reação de Saulo a revelação (v.4a)
II.3. A pergunta de Jesus à Saulo (v.4b)
II.4. A pergunta de Saulo à Jesus (v.5a)
II.5. A resposta de Jesus à Saulo (v.5b)
II.6. A ordem de Jesus à Saulo (v.6)

III – Os companheiros de Saulo


III.1. A reação dos companheiros de Saulo a revelação de Jesus (v.7a)
III.2. O motivo da reação dos companheiros (v.7b)
III.3. A cegueira de Saulo (v.8a)
III.4. Os companheiros de Saulo o guiam (v.8b)
IV. A duração da cegueira, o jejum e conclusão (v.9)
13

c. Diagramação do texto
Mas Saulo pretendendo matar os discípulos do Senhor, procurou o sumo
sacerdote.
Solicitou-lhe cartas para as sinagogas em Damasco, com intuito de que, se
viesse a encontrar os seguidores do caminho, homens ou mulher, os levasse
presos para Jerusalém.
Ao aproximar-se de Damasco, de repente uma luz do céu brilhou ao seu
redor. E caindo no chão, ouviu uma voz que lhe disse: “Saulo, Saulo, porque
você me persegue?”,
e Saulo perguntou: “Quem és tu, Senhor?”,
e o Senhor respondeu: Eu sou Jesus a quem você está perseguindo!
Levante-se e entra na cidade, lá te dirão o que fazer”.
Os companheiros de viagem de Saulo, ficaram parados emudecidos,
pois ouviam a voz, mas não viam ninguém.
Saulo levantou-se do chão, mas quando abriu os olhos não enxergava nada.
Então o guiaram pela mão até Damasco.
Ele ficou três dias sem enxergar e não comeu nem bebeu nada.

2.2. Paralelismos e Recursos Estilísticos


Não foram encontrados esses elementos na perícope em análise.

2.3. Relações Internas do Texto


Neste texto, fica evidente a oposição entre os planos de Saulo e os
planos de Jesus. Saulo elabora um plano minucioso contra os cristãos, grupo
que ele planejava exterminar completamente e ele coloca o seu plano em ação,
mas no meio do caminho, Deus interrompe esse plano e não apenas o
interrompe, como muda completamente os planos e a direção da vida de
Saulo, tornando-o um seguidor do movimento que ele planejava exterminar.
O eixo central do texto parece consistir na identificação de Jesus com
os seus discípulos. Por duas vezes Jesus equipara a perseguição de Saulo aos
seus discípulos com a perseguição contra si mesmo, “Saulo, Saulo, por que
me persegues?” (v.4), “Eu sou Jesus a quem você está perseguindo!” (v.5),
dizendo nitidamente que perseguir seus discípulos é persegui-lo.

3. Análise Redacional
14

Contexto menor: A narrativa de At 9.1-9 está inserida entre duas perícopes


que fazem menção a pregação do evangelho aos gentios. Na perícope anterior
(At 8.26-40), é narrada a conversão do eunuco etíope e seu batismo, após a
pregação de Filipe. A perícope posterior (At 9.10-19), trata do diálogo de Jesus
com Ananias acerca de Saulo, e neste diálogo, Jesus diz à Ananias que Saulo
“é o instrumento escolhido para levar minha mensagem aos gentios” (v.15).
Analisado por essa perspectiva, a perícope em tela está inserida no contexto
da expansão do evangelho ao mundo gentílico.

Contexto maior: Muitos comentaristas bíblicos concordam em dizer que a


narrativa de At 9.1-9 está inserida no bloco que trata da expansão do
evangelho, da Judéia à Samaria e posteriormente até o mundo gentílico. Os
autores divergem na delimitação precisa destes blocos, porém, concordam
quanto a temática destes blocos. Brodus Hale por exemplo, argumenta que a
perícope em tela, faz parte do bloco que abrange o capítulo 6.8, indo até o
9.31, que diz respeito a inclusão dos “meio-judeus” 1. O comentário esperança
insere o texto em tela no bloco que abrange do capítulo 8 ao 12 que diz
respeito “ao cumprimento da incumbência de ser ‘testemunhas de Jesus na
Judéia e Samaria’”2. Mas não apenas a Samaria é alcançada, mas este bloco
inclui a conversão de um etíope e gentio Cornélio.

Contexto Integral: Há grande concordância de que, “Vocês receberão poder


quando o Espírito Santo descer sobre vocês e serão minhas testemunhas em
toda parte: em Jerusalém, em toda a Judéia, em Samaria e nos lugares mais
distantes da terra” (At 1.8), é um texto chave para a compressão e
interpretação do livro de Atos. A perícope em tela é central quando vista na
perspectiva de At 1.8, pois ele indica a ação direta de Deus no cumprimento do
plano de levar a mensagem do evangelho aos gentios. É na pessoa de Paulo
que o evangelho chega até os confins da terra de maneira mais efetiva e
intencional. Boor comenta que o objetivo de Lucas “não escrever uma ‘história
dos apóstolos’. Importância tem unicamente o curso do evangelho no mundo” 3.
1
Hale, 1983, p.138.
2
Boor, 2002, p.9.
3
Idem, p.8.
15

4. Análise Extratextual

4.1. Comparação sinótica


Este passo é aplicável no caso dos evangelhos sinóticos e portando não se
aplica ao nosso texto.

4.2. Fontes e intertextualidade com outros textos


a) Possíveis fontes com o v.1: Mas Saulo ainda respirando ameaça e
assassinato contra os discípulos do Senhor, indo ao sumo sacerdote.
 alusão a Gl 1.13: Vocês sabem como eu era quando seguia a
religião judaica, como perseguia com violência a igreja de Deus. Não media
esforços para destruí-la.
 alusão a 1Tm 1.13: embora eu fosse blasfemo, perseguidor e
violento.
b) Possível fontes com o v.2: Pediu cartas para as sinagogas em Damasco,
solicitando que cooperassem com a prisão de todos os do caminho, homens e
mulheres, que ali encontrasse, para levá-los como prisioneiros a Jerusalém.
 alusão a At 22.5: O sumo sacerdote e todo o conselho dos líderes
do povo podem confirmar isso. Recebi deles cartas para os nossos irmãos
judeus em Damasco que me autorizam a trazer os seguidores do Caminho de
lá para Jerusalém, em cadeias, para serem castigados.
 alusão a At 26.12: Certo dia, numa dessas missões, dirigia-me a
Damasco, autorizado e incumbido pelos principais sacerdotes.
c) Possível fonte com v.4: Ele caiu no chão e ouviu uma voz lhe dizer: Saulo,
Saulo, porque você me persegue?
 alusão a Mt 25.40: E o Rei dirá: ‘Eu lhes digo a verdade: quando
fizerem isso ao menor destes meus irmãos, foi a mim que o fizeram’.
d) Possível fonte com v.7: Os homens que estavam com Saulo ficaram calados
de espanto, pois ouviam uma voz, as não viam ninguém.
 alusão a Dn 10.7: Somente eu, Daniel, tive essa visão. Os
homens
16

que estavam comigo não viram coisa alguma. De repente, porém, eles se
encheram de terror e correram para se esconder.

III – ANÁLISE DE CONTEÚDO

1. O mundo do texto
17

Atos 9.1-9 tem como tema principal a inesperada conversão de Saulo a


mensagem do Evangelho. Até aquele momento Saulo era identificado como um
ativista inimigo abertamente declarado dos seguidores de Jesus. Ele como um
fariseu zeloso pretendia prender todos que eram identificados como seguidores
de Jesus, entretanto, sua vida sofreu uma reviravolta. Por isso vamos examinar
o contexto geral e específico que emolduram este episódio importante.

1.1. Contexto Geral

Dimensão política: No primeiro século a Palestina sofria grande pressão


tributária do Império Romano, mas além da intensa carga proporcionada pelo
Império, os menos favorecidos também lidavam com a pressão advinda dos
círculos religiosos, por meio da religião institucionalizada, centrada no Templo
de Jerusalém. E esse poder advindo do templo exercia profunda influência na
vida do povo, por causa da sua importância como sinônimo de fé e para noção
e vontade de Deus, “O Templo, tinha, em si, a capacidade de articular a história
de vida das pessoas e, até, manipulá-las” (Henrique, 2014, p.30).
Flávio Henrique menciona que,
o poder religioso e político usavam desse artifício para alcançar
seus objetivos. Ou seja, ludibriavam o povo usando a figura do
Templo, levando em conta o que ele significa para a fé das
pessoas, e assim, justificar sua extorsão e obtenção de lucros
desonestos (Henrique, 2014, p.30)

Dimensão religiosa: Com o intuito de atender aos objetivos desta


exegese, iremos nos limitar destacando um grupo religioso de suma
importância, o grupo dos fariseus, que surgiu por volta de 168 a.C. A origem
desse movimento está intrinsecamente conectada com a invasão dos Sírios em
Jerusalém, obrigando os judeus a trabalhar aos sábados e não passar pela
prática da circuncisão e com o acréscimo de prestarem culto a Zeus (Henrique,
2014.32).
Os fariseus tinham a incumbência de restaurar a religião judaica,
especialmente pela prática dos mandamentos da Lei. Portanto, além da
interpretação da Lei, eles também eram os responsáveis direto pela
fiscalização da mesma. Rapidamente eles transformaram aquilo que deveria
18

servir de restauração, em um legalismo severo (Henrique, 2014, p.34).


Passemos agora ao contexto específico.

1.2. Contexto Específico


Existe uma discussão quanto a data mais provável do livro de Atos.
Mas de modo geral, parece haver uma concordância entre os estudiosos de
que, é improvável uma data posterior a 90 d.C., assim como seja improvável
uma data anterior a 60 d.C. Em concordância do Keener, optamos por atribuir a
data entre o início e meados da década de 70 d.C. (Keener, 2017, p.374).
Segundo Keener, o livro de Atos tem propósito duplo, o jurídico e o
apologético. Em relação ao propósito jurídico, Lucas faz questão de mostrar
que os cristãos são julgados como inocentes em todos os tribunais romanos.
De modo que, não havia qualquer elemento que desabonasse os discípulos
diante da lei romana. Portanto Lucas oferece meios de defesa jurídica aos
cristãos e “abre caminho para que advogados e filósofos cristãos posteriores,
como Tertuliano e Justino Mártir, defenda a tolerância ao cristianismo” (2017,
p.375).
Quanto ao propósito apologético, Lucas, mostra que o evangelho
cristão, confronta todas demais cosmovisões da sua época, a cosmovisão do
Império Romanos, a cosmovisão dos filósofos gregos, os agricultores asiáticos
e outras figuras. E um dos principais temas do livro é o relacionamento entre o
cristianismo e o judaísmo. Lucas busca demonstrar que diferente do que os
judeus pensavam, como no caso de Paulo, que o cristianismo era uma nova
seita a ser combatida, o cristianismo na verdade era que o cumprimento do
Antigo Testamento. Portanto não era uma ameaça as Escrituras do Antigo
Testamento, na verdade era a sua progressão e cumprimento das suas
profecias.
Passemos para a análise narrativa do texto em tela.

2. Análise Narrativa de At 9.1-9

2.1. O texto narrativo


1Mas Saulo pretendendo matar os discípulos do Senhor, procurou o sumo
sacerdote. 2Solicitou-lhe cartas para as sinagogas em Damasco, com intuito
19

de que, se viesse a encontrar os seguidores do caminho, homens ou mulher,


os levasse presos para Jerusalém. 3Ao aproximar- se de Damasco, de repente
uma luz do céu brilhou ao seu redor. E caindo no chão, ouviu uma voz que lhe
disse:
- “Saulo, Saulo, porque você me persegue?”,
5e Saulo perguntou:
- “Quem és tu, Senhor?”,
e o Senhor respondeu:
- Eu sou Jesus a quem você está perseguindo! 6Levante-se e entra na cidade,
lá te dirão o que fazer”.
7Os companheiros de viagem de Saulo, ficaram parados emudecidos, pois
ouviam a voz, mas não viam ninguém. 8Saulo levantou-se do chão, mas
quando abriu os olhos não enxergava nada. Então o guiaram pela mão até
Damasco. 9Ele ficou três dias sem enxergar e não comeu nem bebeu nada.

2.2. Elementos da Narrativa


Narrador – Lucas, onisciente.
Tempo – Indefinido.
Cenário – Próximo de Damasco e em Damasco.
Personagens – Saulo (Protagonista); Jesus (Antagonista); companheiros de
Saulo (Secundários).

2.3. Enredo

Exposição:
O narrador inicia sua narrativa, fazendo um contraponto com a
perícope anterior. Na perícope anterior, ele mostra o avanço do Evangelho em
diversas regiões, incluindo a conversão do eunuco etíope e no capítulo 9, ele
inicia a perícope destacando um opositor a esse movimento de expansão do
Evangelho, que é o Saulo. Enquanto, por um lado, os discípulos, representados
na pessoa de Filipe, estão viajando para muitos cantos para espalhar as boas
novas, temos, outro personagem também viajando, mas com o propósito
oposto. O propósito de Saulo é exterminar a propagação desta mensagem.
20

Então, com intuito de interromper a propagação da mensagem, Saulo


vai até o sumo sacerdote, para obter cartas de autorização para prender e levar
preso para Jerusalém, qualquer um que ele encontrasse no trajeto até
Damasco,
21

que fosse adepto deste movimento que ele estava perseguindo. E depois de
receber essas cartas do sumo sacerdote, ele e seus companheiros partiram em
direção a Damasco.

Tensão:
Saulo no papel do antagonista é surpreendido no meio do caminho
pelo próprio Jesus, no papel de protagonista. A manifestação de Jesus a Saulo,
o leva ao chão e Jesus o questiona, por que ele o persegue. Saulo sem saber
quem, falava com ele, pergunta quem é que fala com ele, então Jesus se
revela a Saulo, dizendo que Ele é Jesus a quem Saulo está perseguindo. E
nesse ponto temos o clímax da narrativa, quando Saulo é derrubado e
confrontado por Jesus.

Resolução:
Nesse confronto, entre Jesus e Saulo, Saulo é vencido. E o Saulo perseguidor
agora é ordenado a se tornar um seguidor da causa que ele perseguia. E sem
qualquer demonstração de resistência, Saulo se rende e obedece ao
comissionamento de Jesus.

Desfecho:
Esse encontro gerou marcas em Saulo, ele ficou cego, de modo que precisou
ser conduzido até Damasco pelos seus companheiros e lá permaneceu cego
durante três dias, sem comer e sem beber. A intenção maligna de Saulo foi
frustrada e ele foi transformado num seguidor de Jesus.
22

IV – HERMENÊUTICA

1. Teologia do Texto

A graça soberana
O texto de At 9.1-9 expõe de maneira clara, pelo menos dois temas que
são bastante enfatizados tanto no próprio livro de Atos, como nos escritos
paulinos. O primeiro desses temas é a graça soberana na salvação. Ainda que
essa expressão não esteja mencionada ipsis litteris no texto, a presença e a
força deste tema no texto é inevitável.
Saulo está resolutamente decidido a prender os cristãos e ele está
empenhado nessa missão. Mas, contra toda a sua firme resolução, Deus
interfere nos seus planos e os frustra completamente. Deus revela que sua
vontade não pode ser frustrada. Na epístola aos efésios, o apóstolo trata deste
assunto, “Mesmo antes de criar o mundo, Deus nos amou e nos escolheu em
Cristo para sermos santos e sem culpa diante dele. Ele nos predestinou para
si, para nos adotar como filhos por meio de Jesus Cristo, conforme o bom
propósito de sua vontade” (1.4-5). É a soberania de Deus que governa os
planos humanos e não o contrário.
Mas a soberania de Deus não aparece sozinha, ela aparece vinculada a
graça de Deus. A graça de Deus nesse texto é evidenciada de maneira
formidável, levando-se em conta os antecedentes de Saulo. Saulo desejava
nada menos que a morte dos cristãos. Ele queria destruí-los. Ele era um
perseguidor implacável dos cristãos. Estamos falando de alguém
declaradamente inimigo de Cristo. Mas é justamente alguém como Saulo que
Cristo resolve escolher e salvar.
Não existe outra explicação, a não ser a preciosa graça. Por isso na
mesma carta aos efésios no capítulo 2.1-5 o apóstolo diz que estávamos
espiritualmente mortos, por natureza erámos filhos da ira, “Mas Deus é tão rico
em misericórdia e nos amou tanto que embora estivéssemos mortos por causa
de nossos pecados, ele nos deu vida juntamente com Cristo. É pela graça que
vocês são salvos!” (v4-5).
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Na carta a Tito 3.4-7, o apóstolo repete a mesma ideia, a nossa inteira


falta de qualificação diante de Deus para sermos aceitos e a inteira atuação da
graça de Deus para a nossa salvação.

A união mística
O segundo tema teológico muito importante no texto é o tema da união
mística. Por duas vezes Jesus se identifica intimamente com os seus
discípulos. Isso pode ser observado na impressionante declaração que ele fez
à Saulo, “E caindo no chão, ouviu uma voz que lhe disse: ‘Saulo, Saulo, porque
você me persegue?’, e Saulo perguntou: ‘Quem és tu, Senhor?’, e o Senhor
respondeu: Eu sou Jesus a quem você está perseguindo!” (At 9.4-5).
De acordo com as essas palavras de Jesus, aqueles que são seus
discípulos estão espiritualmente unidos a ele de tal maneira que persegui-los
equivale a perseguir ao próprio Jesus, como se ele e os seus discípulos fossem
uma coisa só.
Não é a primeira vez que Jesus se identifica dessa forma com os seus
discípulos. Em Mateus 25.31-46 (Morton, 2010, p.3332), Jesus disse que todo
bem feito a seus irmãos e todo bem recusado a ser feito a seus irmãos, no final
é bem feito a ele e/ou bem recusado a ser feito a ele. Nas epístolas a metáfora
usada frequente por Paulo, referindo-se aos cristãos, é a do corpo de Cristo (cf.
Romanos 12.5; 1Co 10.16; 12.27; Ef 1.22; 5.22; Cl 2.17-19).
Isto quer dizer que aqueles que creem em Jesus estão profundamente
unidos a ele, a ponto de ele os identificar como seu próprio corpo. Como disse
Desmond Alexander, “Embora ele use a figura de duas maneiras ligeiramente
diferentes... em que Cristo é o corpo todo e os cristãos estão nele...em que
Cristo é a kephalê do corpo, que pode ter sentido tanto de ‘cabeça’ quanto... de
fonte ‘fonte de vida’” (2009, p.1046).

2. Atualização Pastoral

Essa compreensão do texto pode ser aplicada de diversas maneiras, a


fim de ser objetivo, vou me ater em fazer duas atualizações pastorais em
relação a missão da igreja no mundo. Em primeiro lugar, o texto em análise nos
expõem diante de um mundo necessitado de salvação. O texto em tela nos
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fornece respostas às três perguntas: (1) Por que a salvação é necessária? Os


versículos 1 e 2 nos apresentam um Saulo em completa oposição a Deus.
A Escritura diz que aqueles que não são salvos estão inimizade contra
Deus. Ainda que uma pessoa não faça as mesmas coisas que Saulo fazia, isto
não muda a sua condição de inimizade em relação a Deus. Por isso necessita
de salvação. Vivemos num mundo em oposição a Deus, um mundo que não
ama a Deus e portanto necessita de salvação. A igreja é chamada a ser esse
agente de proclamação da salvação revelada em Jesus Cristo.
(2) Como a salvação é recebida? A salvação é fruto da graça soberana.
Nenhum ser humano pode salvar-se. Como fica evidente neste texto, a
salvação é uma obra monergista, isto é, é uma prerrogativa completamente
Divina. E uma pessoa só pode ser salva mediante a revelação de Jesus. Sem o
conhecimento da Pessoa de Jesus, não é possível receber a salvação. Esse
elemento é muito importante, principalmente numa época em que movimentos
de crescimento de igreja usam de todo tipo de pragmatismo para atrair
pessoas. Entretanto, precisamos nos lembrar de que a salvação é uma obra
soberana, a igreja é chamada a fazer a Pessoa e a obra de Jesus conhecida,
mas é Deus quem salva por graça soberana.
(3) Quais são as evidencias de salvação? O texto mostra que, após ouvir
a voz, Saulo creu nas palavras de Jesus e obedeceu a ordem de Jesus. A fé de
Saulo em Jesus está implícita na sua obediência ao levantar-se e fazer o que
Jesus havia ordenado. Jesus disse, “Vós sois meus amigos, se fizerdes o que
eu vos mando” (Jo 15.14). Esse elemento pode nos ajudar a ter discernimento,
em tempos como estes em que parece ter se tornado moda pessoas se
declararem evangélicas, quando o estilo de vida delas, em nada condiz com o
evangelho. É o caso de muitas celebridades, que se dizem evangélicas, mas
que seguem nas velhas práticas completamente inconsistentes com o
chamado de Jesus.
Em segundo lugar o texto em tela chama a nossa atenção a um
problema muito latente em nossa sociedade, que é o problema da
discriminação e perseguição. Saulo representa um movimento religioso
repressor e perseguidor em nome de Deus. Uma religião que não salva, mas
que mata. Uma religião que não edifica, mas destrói, não liberta mas aprisiona,
não gera vida, mas gera morte, não respira compaixão, mas respira ameaça.
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E como igreja em 2020, a pergunta que temos que nos fazer é, temos
sido promotores salvação, estamos aliados aos que são perseguidos ou somos
nós que nos tornamos os perseguidores e os assassinos daqueles que
discordam de nós? Será que em nome de Deus não nos tornamos
perseguidores daqueles que tem opção sexual diferente da nossa, daqueles
que tem crenças religiosas diferentes das nossas? Será que não nos tornamos
perseguidores quando invadimos centros de umbanda e destruímos tudo em
nome de Deus?
Uma parte significativa daquela que se declara igreja evangélica precisa
ser salva desse projeto religioso perseguidor, que busca se impor pela força,
pela violência, por meio da opressão. Esse é o modelo completamente oposto
ao modelo de Jesus. Esse sistema religioso que respira ameaça, que produz
perseguição religiosa não é o caminho de Jesus. Os que são do caminho de
Jesus estão entre os perseguidos e não entre os perseguidores. Que Deus nos
ajude como igreja a ser instrumentos de salvação em nossa sociedade e não
de perseguição e morte.
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ALEXANDER, T. Desmond; Brian S. Rosner. Novo dicionário de teologia


bíblica. São Paulo: Vida, 2009.

BÍBLIA de Estudo de Genebra. 2ª ed. São Paulo: Cultura Cristã, 2009.

BÍBLIA de Estudo palavras – chave. Hebraico-Grego. 3ª ed. Rio de Janeiro:


CPAD, 2012.

BÍBLIA sagrada. Nova Versão Transformadora. São Paulo: Mundo Cristão,


2016.

BOOR, Werner de. Comentário Esperança. Curitiba: Editora Evangélica


Esperança, 2002.

HALE, Broadus David. Introdução ao estudo do Novo Testamento. Rio de


Janeiro: Junta de Educação Religiosa e Publicações, 1983.

HENRIQUE, Flávio. Introdução do Novo Testamento. Faculdade Teológica Sul


Americana, 2014.

KEENER, Craig S. Comentário Histórico-Cultural da Bíblia. Novo Testamento.


São Paulo: Vida Nova, 2017.

MORTON, Timothy S. The Treasury of Scripture Knowledge, Enhanced, v1.2.


2010.

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