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RESENHA

O violino segundo meus princípios


(Violin Playing as I Teach It) Leopold Auer
Tradução: Luiz Amato e Robert Suetholz

Hermes C. Alvarenga

Este livro, escrito originalmente na que o texto foi concebido em 1920, por um

língua inglesa em 1920 pelo célebre violinista pedagogo que foi contemporâneo de Johannes

e pedagogo russo Leopold Auer (1845-1930), Brahms (1833-1897), que ensinou alguns dos

posiciona-se entre os mais importantes títulos expoentes do cenário violinístico do Sec. XX,

da literatura escrita sobre o violino e sua entre eles Jascha Heifetz (1901-1987), um dos

pedagogia em todos os tempos. A recente edição violinistas mais celebrados da história.

do texto em português, publicada em 2017 pela No primeiro capítulo, Auer relembra

editora Prismas, com tradução de Luiz Amato e sua juventude como estudante de violino e suas

Robert Suetholz amplia positivamente a ainda experiências vividas sob a tutela de grandes

incipiente literatura sobre o violino disponível nomes da época como Joseph Joachin (1831-

em língua portuguesa. 1907) e Jacob Dont (1815-1888). Seu relato

O livro de 148 páginas é dividido em 14 mostra que o ensino do violino naquele período
capítulos que trafegam pela história de vida do era feito majoritariamente por professores

próprio autor enquanto também trata questões privados e em alguns poucos conservatórios em

técnicas de como ensinar e tocar o violino. Seu cidades europeias. Entre esses conservatórios

foco narrativo é pessoal e transparece o tom destacava-se o Conservatório de Paris, fundado

afirmativo de suas convicções, algumas delas em 1795. Auer descreve Paris como: “sonho

potencialmente inadequadas para os dias atuais. que flutuava diante dos olhos de cada estudante,

Entretanto, devemos sempre ter em mente de de cada artista que desejasse reconhecimento”.

Hermes Cuzzuol Alvarenga é Professor Associado de Violino do Departamento de Música, da Universidade


Federal da Paraíba, onde orienta alunos dos cursos de Extensão, Graduação e Pós-Graduação. Natural de Vitória/
ES, em 1980 transferiu-se para João Pessoa/PB passando a integrar a OSPB como violinista. Hermes é Doctor of
Musical Arts pela The University of Iowa, nos Estados Unidos; Mestre em Música pela UFRGS em Porto Alegre
e Bacharel em Música pela UFPB. hcalvarenga@hotmail.com

Claves Vol. 2018 (2018)


2 ALVARENGA. O Violino Segundo Meus Princípios…

Essa afirmação era compreensível, a França controversas, acredito que controversas até

dominava a cultura musical de grande parte da mesmo para o início do Sec. XX, quando o

Europa e o Conservatório de Paris era o que livro foi escrito.

havia de mais prestigioso quando o assunto era Auer escreveu esse texto aos 75

o ensino da música. anos, pouco tempo após sua chegada aos

Para o violinista, seja ele estudante Estados Unidos. Auer lá chegou já trazendo

ou mesmo já um profissional, o livro revela em seu currículo um histórico de sucesso

momentos únicos sobre passagens da vida de como pedagogo, avalizado por sua cátedra

Auer. Seu relato sobre o período como aluno de várias décadas no Conservatório de São

de Joachim é fascinante e culmina quando Auer Petersburgo, na Rússia, onde formou alunos

cita algumas obras que havia estudado com que se destacaram no cenário internacional,

seu mestre, mas não menciona o Concerto em notadamente nos Estados Unidos.

Ré Maior para violino e orquestra de Brahms, O Violino Segundo Meus Princípios

porém observa, que naquele momento este não apresenta características de um método

concerto ainda não havia sido composto. com instruções de como proceder na abordagem

Não menos interessante é sua de questões técnicas e musicais ao violino da

observação já como professor sobre aqueles forma como encontramos em autores como, por

alunos que “embora bem dotados pela natureza”, exemplo, Carl Flesch (1873-1944) no The Art
estariam “sujeitos a certas limitações”. of Violin Playing, escrito posteriormente. Ao

Nesses casos Auer era afirmativo de que eles contrário de produzir um tratado sobre técnica

representavam a maioria e que esses aspirantes a violinística, Auer prefere discorrer sobre suas

violinistas uma vez “suficientemente filosóficos experiências durante sua vida de violinista

para aceitar o veredicto e se resignarem às e professor. Suas observações e instruções

suas limitações”, seriam “excelentes músicos sobre técnica violinística são quase sempre

de orquestras”. Completando esse raciocínio pouco aprofundadas e bastante discursivas nas

Auer afirma: “muitos deles também se dedicam instruções de seu conteúdo e procedimentos.

ao ensino, mas em geral não são muito bem Como notam os tradutores no prefácio da

adaptados para esse trabalho”. Como vemos, o edição brasileira, “não se trata de um método

autor não se ausenta de suas convicções mais como tradicionalmente se conhece”.

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ALVARENGA. O Violino Segundo Meus Princípios… 3

Na distribuição dos capítulos paralisar temporariamente o efeito dessa forma

encontraremos comentários sobre aspectos de nervosismo”. Atualmente há farta literatura,

técnicos como: produção de som, forma de decorrente de estudos e pesquisas sobre a

estudar, sugestões para golpes de arcos bem psicologia da performance, que desmontam

como aspectos da técnica da mão esquerda. A pacificamente essa afirmação.

partir do décimo capítulo a abordagem volta- A tradução para o português desse

se a aspectos mais subjetivos como: escolha importante livro foi feita com esmero pelo

de repertório, estilo, interpretação e questões violinista Luiz Amato e pelo violoncelista

relativas ao psicológico do artista como o “medo Robert Suetholz e representa com fidelidade o

de palco”. É interessante notar a abordagem texto original. Contribuiu muito para o sucesso

de Auer sobre esse aspecto da psicologia da desse trabalho a expertise dos tradutores que

performance citado por último. No capítulo 12, com muita propriedade souberam adaptar o

“Nervo ao Tocar Violino”, Auer relata vários texto original para nosso idioma, contornando

casos de artistas conhecidos e também alunos com maestria as dificuldades inerentes ao tema.

que em diferentes graus de severidade eram O Violino Segundo Meus Princípios

afetados negativamente pelo fenômeno que passa a ser uma importante adição à literatura

usou-se denominar medo de palco. Disse ser para o violino em língua portuguesa e deve ser

interessante a abordagem pois na época ainda considerado título indispensável nas bibliotecas
não havia um foco sistemático em estudos das escolas de música e universidades

no campo voltado para aspectos psicológicos brasileiras nesta versão em português.

envolvidos na performance musical, como


Referência:
ocorre nos dias atuais. O medo de palco
AUER, Leopold. O Violino Segundo Meus
era considerado algo quase que inerente à Princípios. Tradução de Luiz Amato e Robert
Suetholz, Curitiba: Editora Prismas, 2017. 148 p.
atividade, assim sendo, sobreviveriam aqueles Título original: Violin Playing as I Teach It.

capazes de lidar com o stress decorrente da

performance diante de um público ou em

situações similares. Auer afirma: “Minha

opinião é que não existe remédio hipnótico

ou medicinal capaz de curar, ou mesmo de

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