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CALIBRES DE ALTA ENERGIA OU CALIBRES DE

ALTA VELOCIDADE? PARTE I


Escrito em 04/04/2020 por João Bosco

A relação entre energia cinética e a performance de um calibre nem sempre são


proporcionais, descrubra um pouco mais sobre a performance balística e sua relação com a
velocidade do projetil

1 - INTRODUÇÃO

Quem estuda um pouco mais sobre armas de fogo certamente já se deparou com a
expressão “calibre de alta energia”, se referindo aos calibres de fuzil. Muito possivelmente
você já até empregou essa terminologia, que é recorrentemente utilizada, principalmente
no meio policial. Aliás, o termo “energia” é frequentemente empregado, principalmente nos
estudos relacionados à balística terminal, inclusive em algumas teorias de incapacitação,
como é o caso da teoria da “Transferência de Energia”. A atual legislação é um exemplo, ao
empregar a energia como um dos fatores para definir se um determinado calibre é de uso
permitido ou restrito, conforme estabelecido no Decreto 9.847, de 25 de julho de 2.019:

Art. 2º Para fins do disposto neste Decreto, considera-se:


I - arma de fogo de uso permitido - as armas de fogo semiautomáticas ou de
repetição que sejam:
a) de porte, cujo calibre nominal, com a utilização de munição comum, não atinja,
na saída do cano de prova, energia cinética superior a mil e duzentas libras-
pé ou mil seiscentos e vinte joules;
b) portáteis de alma lisa; ou
c) portáteis de alma raiada, cujo calibre nominal, com a utilização de munição

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comum, não atinja, na saída do cano de prova, energia cinética superior a mil e
duzentas libras-pé ou mil seiscentos e vinte joules;

II - arma de fogo de uso restrito - as armas de fogo automáticas e as
semiautomáticas ou de repetição que sejam:
a) não portáteis;
b) de porte, cujo calibre nominal, com a utilização de munição comum, atinja, na
saída do cano de prova, energia cinética superior a mil e duzentas libras-pé ou
mil seiscentos e vinte joules;
c) portáteis de alma raiada, cujo calibre nominal, com a utilização de munição
comum, atinja, na saída do cano de prova, energia cinética superior a mil e
duzentas libras-pé ou mil seiscentos e vinte joules;
Decreto 9.487, de 25 de julho de 2019 - grifos nossos

Apesar da “Energia” ser um conceito bastante massificado, o presente artigo pretende


mostrar que é utilizado de maneira inadequada na maioria absoluta das vezes. Isso significa
que calibres com energias diferentes podem ter resultados balísticos semelhantes e
também que calibres com mesma energia podem ter comportamentos balísticos
completamente diferentes a depender do que se está analisando.

De antemão já peço desculpas aos leitores que não são familiarizados com a física. Como
“energia” é um conceito físico, não tem como tratar do tema sem explorar essa área do
conhecimento. Vou, entretanto, tentar usar uma linguagem mais simples e trazer exemplos
do mundo real para tornar a análise mais palatável

2 - GRANDEZAS ESCALARES E VETORIAIS

Para se compreender o conceito de energia e a sua relação com a balística, é importante


entender a diferença entre grandezas escalares e vetoriais. Esse assunto é abordado no
primeiro ano do ensino médio, época que pode ser (muito) remota para alguns leitores.
Vamos relembrar, de maneira mais simples.

Grandeza escalar é aquela que é definida tão somente pela sua intensidade (também
chamada de valor ou módulo), como por exemplo, temperatura, distância percorrida, área,
volume, tempo decorrido, dentre outras. Ainda exemplificando, com casos práticos:

Temperatura: “Hoje a temperatura na minha cidade alcançará os 45 graus celsius!”.

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Ao ler essa frase você certamente deve ter pensado no calor que essa previsão
promete, não é? Bastou informar a intensidade.

Distância percorrida: “Hoje vou correr 42 quilômetros”. Novamente, bastou informar a


intensidade para que você saiba exatamente qual será a distância percorrida.

Volume: “Está tão quente que vou beber cinco litros de chopp!”. Eis aqui mais um
exemplo no qual a informação do valor foi suficiente para trazer todas as informações
necessárias para a compreensão. (Ok. Admito que este não foi um bom exemplo, pois
faltou falar qual seria a marca do chopp... rsrsrs)

Grandeza vetorial é aquela que, para ser definida, precisa não só da informação da
intensidade, mas também da direção (eixo) e sentido (de onde para onde). É um conceito
físico pouco compreendido pela população em geral, mas de uso muito comum na física.
Como exemplos de grandezas vetoriais temos o deslocamento, velocidade, aceleração, força,
dentre outros. Novamente exemplificando com casos práticos:

Força: para que você abra uma porta comum, não basta fazer força na porta, mas
também empurrá-la na direção e sentido de abertura.

Deslocamento: “Como faço para chegar no Bar do Bigode? Siga três quarteirões
(intensidade) na Rua Canarinho (direção) seguindo para o centro (sentido)”. Se a única
informação que a pessoa receber for a distância (siga três quarteirões,) certamente a
outra pessoa ficará perdida sem saber onde fica o tal Bar do Bigode.

Algumas grandezas escalares se relacionam com grandezas vetoriais. A distância percorrida


se relaciona com a velocidade multiplicada pelo tempo gasto para percorrer a distância. Por
exemplo, se um carro está se deslocando a 60 km/h, sabemos que a distância percorrida por
ele em três horas será de 180 quilômetros. Repare que não estamos nos referindo ao
deslocamento (grandeza vetorial), pois para isso teríamos que saber qual foi o trajeto inicial e
final. O deslocamento pode ser até mesmo zero, por exemplo caso o carro percorra 150 km
em um caminho e 150 km no mesmo caminho, só que no sentido contrário, retornando ao
ponto de partida.

3 - CONCEITO FÍSICO DE ENERGIA E ENERGIA CINÉTICA

Embora seja um termo de uso comum, o conceito de energia não é algo muito claro para a
maioria das pessoas. Você saberia me dizer o que é energia? Temos uma noção intuitiva de

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energia, muitas vezes se confundindo com outro conceito físico, que é a Potência. Como
ambos se confundem, seguem abaixo suas respectivas definições:

ENERGIA: capacidade de realização de trabalho.

POTÊNCIA: quantidade de trabalho realizado em um determinado intervalo de tempo.

Para auxiliar na compreensão, analise o exemplo a seguir:

Um trator e um carro precisam arrastar cargas idênticas de um ponto a outro de uma


estrada. O trator arrasta a carga em 20 segundos e o carro arrasta a mesma carga pela
mesma distância, porém gasta 90 segundos. Neste caso, ambos realizaram o mesmo
trabalho: arrastar a carga por uma determinada distância. Entretanto, por ser mais
potente, o trator conseguiu arrastar a carga em um tempo muito menor. A energia
empregada em ambos os casos foi a mesma, afinal o trabalho realizado foi o mesmo,
porém a grande diferença reside em COMO essa energia foi empregada. Daí já é
possível perceber que a energia em si não é elemento suficiente para avaliar o
desempenho de várias coisas, sejam elas veículos ou calibres de arma de fogo.

No caso das armas de fogo, a energia na boca do cano a qual nos referimos se trata da
ENERGIA CINÉTICA, que é a parcela de energia relacionada ao movimento de um corpo.
Matematicamente ela é definida como se segue:

Equação 1 – Mostra o cálculo de energia de um corpo em movimento.

Analisando a fórmula podemos perceber algumas coisas importantes:

A energia tem uma relação de proporção direta tanto com a massa, erroneamente
chamada de peso, quanto com a velocidade. Isso significa que se a massa for maior, a
energia será maior. Se a velocidade for maior, a energia será maior. Assim, podemos
variar a energia de duas maneiras diferentes: alterando a massa ou alterando a
velocidade.
O aumento da energia em função da massa é linear, ou seja, a energia aumenta na
mesma medida que a massa aumenta. Se a massa dobra, a energia dobra. Se a massa

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for multiplicada por 4, a energia será multiplicada por quatro. Se a massa for reduzida à
metade, a energia será reduzida à metade.
O aumento da energia em função da velocidade NÃO É linear e sim quadrático, ou seja,
se a velocidade aumentar, a energia aumentará muito mais que a velocidade! Se a
velocidade dobrar, a energia aumentará quatro vezes. Se a velocidade for multiplicada
por 4, a energia será 16 vezes maior! Se a velocidade cair pela metade, a energia será
dividida por 4.

A análise acima é válida para QUALQUER corpo em movimento, seja uma pessoa, um carro
ou um projétil propelido por arma de fogo. É importante lembrar que a energia é uma
grandeza escalar e isso é algo extremamente importante de ser ressaltado. Vamos analisar,
agora, como isso se aplica na balística e o porquê da energia não ser um bom parâmetro
para a comparação dos calibres.

4 - DINAMICA DA FORMAÇÃO DE LESÕES POR PROJÉTEIS PROPELIDOS POR ARMAS DE


FOGO

Na legislação, nas tabelas de munições, nas conversas entre atiradores, policiais e outros
entusiastas de armas de fogo são muito comuns as menções às energias dos calibres.
Muitas vezes, tais menções estão associadas ao desempenho balístico, às lesões produzidas
ou ao alcance dos projéteis.

Por enquanto vamos tratar apenas das lesões produzidas pelos projéteis. Vamos tratar o
assunto de maneira resumida, visto que é um assunto amplo e que daria não um mas vários
artigos. Por ora, vamos tratar dos fenômenos das cavidades temporária e permanente.

Diferentemente de outros instrumentos, que resultam no deslocamento mínimo ou quase


nulo dos tecidos adjacentes à região atingida pelo instrumento, o projétil propelido por
arma de fogo (PAF) produz, além da lesão propriamente dita, uma onda de choque ao
empurrar os tecidos, por meio de uma ação contínua de compressão e esmagamento, que
se desloca radialmente à medida que o projétil avança pelo tecido. Com isso, mesmo tecidos
não diretamente atingidos pelo projétil acabam por perceber a ação do instrumento, não
necessariamente resultando em lesões.

Ao se chocar contra o alvo, parte ou toda a energia cinética contida no projétil se dissipa em
outras formas de energia, como por exemplo energia térmica (calor), energia sonora (som),
deformação dos tecidos (que também pode ser entendida como energia mecânica, desta
vez energia potencial elástica, em função da elasticidade dos tecidos), sendo esta última a
principal causadora da lesão propriamente dita. A elasticidade dos tecidos que compõem o
corpo varia de acordo com a região e estruturas atingidas. Um tecido muscular esquelético
possui fibras mais resistentes e com maior elasticidade que um órgão com maior

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quantidade de água, como o baço, por exemplo. Os ossos possuem maior resistência
mecânica e menor elasticidade, quebrando-se ao invés de expandir. Todos esses fatores
aumentam consideravelmente a compreensão de como é produzida a lesão por tiro.

Além das variações inerentes às diferentes estruturas que compõem o corpo humano,
outras variáveis externas devem ser consideradas, tais como a velocidade, formato,
dimensões e massa do projétil que atinge o corpo. Considerando a mesma região atingida,
projéteis com características diferentes produzem lesões diferentes. Projéteis com as
mesmas características atingindo diferentes regiões produzem lesões diferentes. Tais fatores
obrigam o Perito a analisar diversas variáveis simultaneamente para concluir como se deu o
mecanismo da lesão.

Para melhor compreensão de como se dá a lesão resultante da ação de um PAF, pode-se


dividir esta ação em dois momentos, sendo um deles o instante imediato da ação do projétil,
enquanto a energia ainda está se dissipando nos tecidos, denominado CAVIDADE
TEMPORÁRIA, e o outro aquele encontrado após a estabilização dos tecidos em sua
acomodação pós-perturbação implementada pelo projétil, denominado CAVIDADE
PERMANENTE. Tais momentos serão analisados a seguir.

4.1 - O estudo da cavidade temporária

Conforme explicado anteriormente, a energia do projétil se dissipa no corpo de diversas


formas, sendo uma delas a deformação dos tecidos. As fibras dos tecidos possuem certa
elasticidade, variável de acordo com a estrutura atingida, de maneira que a compressão
produzida pela passagem do projétil se acumula na forma de energia potencial elástica
nessas fibras, sendo então devolvida depois de cessada a expansão produzida pelo projétil,
ocorrendo a reacomodação dos tecidos. Todo esse movimento de expansão e
reacomodação de tecidos é denominado CAVIDADE TEMPORÁRIA, pois ocorre em fração de
segundo, com duração e raio de expansão dependente de diversos fatores, dentre eles a
região atingida, o formato e velocidade do projétil.

Para se ter uma ideia de como é a cavidade temporária produzida pela passagem de um
projétil basta efetuar um tiro em um material que permita a expansão da onda de choque,
mas que não possua elasticidade para a reacomodação do material no trajeto de passagem
do projétil. Vários materiais podem ser empregados neste teste, tais como argila, plastilina
(massa de modelar) ou sabão em barra. Veja na FIGURA 1 a cavidade temporária de um
projétil produzida em um bloco de argila.

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Figura 1 – Fotografia operada durante ensaio prático realizado pelo autor. Note a cavidade
temporária produzida no bloco de argila em virtude da onda de choque gerada pelo projétil.
Perceba que a cavidade temporária é consideravelmente maior que o diâmetro do projétil.

É importante destacar que não se pode associar a cavidade temporária diretamente à lesão
produzida, pois não necessariamente a cavidade temporária resultará em lesão. No caso de
projéteis dotados de menor velocidade, a cavidade temporária terá expansão mais lenta, de
maneira que a elasticidade dos tecidos consegue absorver a energia, dissipando-a pelo
aquecimento das fibras, sendo as lesões observadas somente nas regiões diretamente
atingidas pelo projétil. Já em projéteis com maior velocidade, as dimensões muito maiores
da cavidade temporária, com maior velocidade de expansão, podem resultar em uma
distensão dos tecidos que ultrapassa a capacidade elástica dos mesmos, produzindo lesões
mesmo em regiões não atingidas diretamente pelo projétil. A literatura é consistente neste
sentido, conforme pode ser visto a seguir:

“Se a cavidade temporária for produzida rápida o bastante para ultrapassar a


capacidade elástica do tecido, será capaz de produzir lesões em decorrência do
estiramento provocado. Este efeito é percebido em projéteis de calibres de alta
energia, como os de fuzis, mas não pelos calibres mais comuns de armas curtas.
Para que a cavidade temporária de um projétil seja capaz de produzir um efeito
lesivo, a velocidade do projétil precisa exceder os 2.000 pés por segundo (610 m/s).
Em velocidades menores, desenvolvidas por armas curtas, a cavidade
temporária não possui velocidade suficiente para produzir nenhum efeito lesivo,
portanto qualquer diferença de cavidade temporária produzida por calibres de

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armas curtas é irrelevante.”
(DIMAIO, 2016) – grifos nossos

Importante destacar no texto de Dimaio que o fator preponderante para a formação de


lesões pela cavidade temporária não é a energia e sim a velocidade, como citado por ele em
três momentos, a despeito de ter empregado a denominação “calibres de alta energia”,
exemplificando os fuzis.

A velocidade de formação da cavidade temporária está associada intimamente à velocidade


do projétil. Quanto mais rápido estiver o projétil, mais rápido ele irá “empurrar” os tecidos e
produzir a cavidade temporária.

4.2 - O estudo da cavidade permanente

Uma vez cessada a cavidade temporária, pela reacomodação dos tecidos, percebe-se o dano
final resultante da ação do projétil, sendo este dano a lesão final propriamente dita,
denominada cavidade permanente, que será sempre menor que a cavidade temporária.
Assim como no caso da cavidade temporária, as dimensões e caraterísticas cavidade
permanente dependerão de diversos fatores (região atingida, velocidade e dimensões do
projétil, etc). Nos casos em que a velocidade do projétil é insuficiente para causar danos pela
cavidade temporária, a cavidade permanente terá dimensões muito próximas às dimensões
do projétil, de forma que projéteis maiores produzem cavidades permanentes maiores.
Projéteis que se expandem resultam em cavidades permanentes maiores que projéteis que
não se expandem. Já nos casos em que a velocidade é suficiente para gerar lesões pelo
mecanismo da cavidade temporária, a cavidade permanente poderá ter dimensões
consideravelmente maiores que o diâmetro do projétil, alcançando regiões não atingidas
diretamente por ele.

A Figura 2 mostra um desenho esquemático explicando a formação das duas cavidades:

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Figura 2 – Desenho esquemático elaborado pelo autor, mostrando a formação das cavidades
temporária e permanente. As setas indicam a distensão e retração dos tecidos devido à
elasticidade deles. Note a compressão e esmagamento dos tecidos à frente do projétil, que
resultará na propagação da onda de choque pelo trajeto do projétil.

5 - TIPOS DIFERENTES DE CALIBRES DE "ALTA ENERGIA"

Você deve ter estranhado o título deste tópico pelo emprego do termo “alta energia”. O
emprego foi proposital. Aqui serão mostrados calibres que são reconhecidamente
denominados de alta energia, comparados com outros calibres de energias semelhantes, ou
até maiores, bem como as diferenças nos seus comportamentos, associadas não só às
diferentes velocidades como também a outros fatores.

Veja a tabela abaixo, mostrando as velocidades, massas e energias dos calibres .223
Remington, 5,56x45mm NATO, .308 Winchester e 7,62x51mm NATO, todas obtidas do site da
Companhia Brasileira de Cartuchos (CBC):

Calibre Velocidade (m/s) Massa (grains) Energia (Joules)


.223 Rem 990 55 1.745
5,56x45mm 995 55 1.763
.308 Win 795 180 3.686
7,62x51mm 850 144 3.372
Tabela 1 – Comparativo das velocidades, massas e energias dos calibres .223 Remington,

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5.56x45mm NATO, .308 Winchester e 7.62x51m NATO.

Agora, observe a tabela abaixo, apresentando as velocidades, massas e energias dos calibres
.44 Remington Magnum (arma com de 24”), .454 Casul e .500 S&W (revólver)

Calibre Velocidade (m/s) Massa (grains) Energia (Joules)


.44 Rem Mag 456 240 1.616
.454 Casul 548 260 2.531
.500 S&W 490 400 3.113
.500 S&W 550 325 3.187
Tabela 2 – Comparativo das velocidades, massas e energias dos calibres .44 Remington
Magnum, .454 Casul e .500 S&W

Observando as tabelas anteriores, é possível notar que todos os calibres na primeira tabela
apresentam velocidades consideravelmente superiores aos 600 m/s descritos por Dimaio
como a velocidade mínima necessária para que cavidade temporária do projétil seja capaz
de produzir lesões. Isso não significa que os calibres mostrados na Tabela 1 sejam mais ou
menos eficazes que os calibres mostrados na Tabela 2, mas sim que a atuação deles se dá de
maneira diferente.

Tomem-se como exemplo os calibres .223 Remington (1.745 Joules) e .454 Casul (2.531
Joules). Repare que o segundo apresenta energia consideravelmente maior que o primeiro,
embora não receba a denominação de “calibre de alta energia”, que normalmente é
empregada no caso do calibre .223 Remington. Isso mostra que o que torna os calibres ditos
de “alta energia” especiais não é exatamente a energia e sim outros fatores que trazem
vantagens táticas, a depender do emprego.

6 - MUITO ALÉM DA ENERGIA

Outras diferenças entre esses calibres devem ser observadas, tais como a massa, formato e
dimensões do projétil. Na Tabela 1, os projéteis apresentam massa consideravelmente
menor, ponta mais afinada, diâmetro menor, comprimento maior, com o corpo oblongo. Na
Tabela 2 os projéteis apresentam massa maior, ponta achatada, diâmetro maior e
comprimento mais próximo do diâmetro, com formato mais “quadrado”. Veja na Figura 1 a
comparação entre projéteis de calibres .223 Remington, e.454 Casul:

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Figura 3 – Mostra um projétil de calibre .223 Remington ao lado de um projétil de calibre .454
Casul, ambos em escala entre si.

Ao analisarmos a arquitetura dos dois projéteis mostrados na Figura 1 percebemos


diferenças claras. O projétil de calibre .223 Remington possui o comprimento
aproximadamente 3,7 vezes maior que o diâmetro, conferindo um formato alongado ao
corpo do projétil. Este formato alongado faz com que o projétil tenha uma aerodinâmica
muito melhor, pela melhora do coeficiente balístico, porém faz também com que tenha
uma estabilidade menor, demandando uma velocidade de rotação maior para maximizar o
efeito giroscópico. O princípio é o mesmo da alavanca. Quanto maior o comprimento da
alavanca, maior será a força que ela irá fazer. A ponta mais fina favorece a penetração, uma
vez que a pressão é inversamente proporcional à área. A base do projétil possui um chanfro,
chamado boat tail (do inglês, cauda de barco), que visa minimizar a turbulência atrás do
projétil, conferindo mais estabilidade. Observe também a presença de uma cinta no terço
inferior do projétil. Esta cinta, além de permitir melhor crimpagem da boca do estojo ao
projétil, se torna um ponto de fragilidade quando o projétil tomba.

Já o projétil de calibre .454 Casul apresenta comprimento aproximadamente 1,5 maior que o
diâmetro apenas. Com um formato mais “redondo”, a estabilidade é favorecida, enquanto o
coeficiente balístico é consideravelmente prejudicado. Justamente pelo formato do projétil
favorecer a estabilidade, a base pode ser reta. A ponta achatada reduz a pressão e,
consequentemente a penetração. Apresenta também a cinta para crimpagem, mesma
forma que o projétil de calibre .223 Remington, só que neste caso, em função do maior
diâmetro do projétil, tal cinta não atua como ponto de fragilidade.

7 - CONCLUSÃO... por enquanto!

Até o momento foram mostradas apenas as características dos calibres ditos de alta energia,
tentando demonstrar que este não é um parâmetro adequado para a comparação de
calibres. Já foi possível perceber que a energia depende tanto da massa quanto da
velocidade, porém tais fatores contribuem de maneiras diferentes. Calibres podem possuir a
mesma energia, porém com velocidades maiores ou menores, sendo essa velocidade um
fator importante na dinâmica da produção da lesão. Destaca-se que o assunto da dinâmica
da produção da lesão também não foi esgotado, bem como outros aspectos relacionados a

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esses calibres. Falaremos adiante sobre as características desses calibres em alvos rígidos,
como madeira e chapas metálicas, e alvos moles, como o corpo humano e meios líquidos.
Por ora, espero que já esteja se acostumando a deixar de se referir aos calibres de fuzil como
calibres de alta energia e passando a se reprogramar para denomina-los calibres de alta
velocidade.

Estreitamento da borda da boca do estojo

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CALIBRES DE ALTA ENERGIA OU CALIBRES DE
ALTA VELOCIDADE? PARTE II
Escrito em 23/04/2020 por João Bosco

1 - INTRODUÇÃO

Na PARTE I do nosso estudo, abordei as diferenças entre os conceitos de alta energia e alta
velocidade, demonstrando que dois calibres podem ter a mesma energia e características
completamente diferentes. Você viu que a energia é uma grandeza escalar e a velocidade
uma grandeza vetorial e percebeu como isso se relaciona ao comportamento do projétil.
Nessa segunda parte vamos abordar os aspectos relacionados à balística externa dos ditos
“calibres de alta energia”, comparando, novamente, os dois universos compreendidos na
mesma faixa de energia: os calibres cujos projéteis possuem velocidade maior e massa
menor e os calibres cujos projéteis possuem velocidade menor e massa maior.

Novamente teremos que lançar mão da física na nossa análise, uma vez que o conceito de
energia cinética é um conceito da mecânica clássica. Não obstante, novamente tentarei
“amaciar” o conteúdo para torná-lo compreensível mesmo aos leitores que não tem muito
traquejo com as ciências exatas!

2 - BALÍSTICA EXTERNA E O COMPORTAMENTO DINÂMICO DOS PROJÉTEIS


PROPELIDOS POR ARMAS DE FOGO

2.1 - Forças que atuam sobre o projétil

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Qualquer corpo em deslocamento no ar estará sujeito a pelo menos duas forças: a força da
gravidade e a resistência do ar. A Força da Gravidade, ou peso, depende de dois fatores, que
são a massa do corpo e a aceleração da gravidade:

Equação 1 – Mostra a fórmula de cálculo da força da gravidade.

A aceleração da gravidade é a mesma para todos os corpos, com valor aproximado de 9,8
m/s2. A aceleração é a variação da velocidade de um corpo, ou seja, a rapidez com que a
velocidade aumenta ou diminui. Se dois corpos possuem a mesma aceleração, sofrerão igual
acréscimo na sua velocidade em um mesmo intervalo de tempo. Isso significa dizer que se
formos considerar apenas a força da gravidade, dois corpos abandonados da mesma altura
sempre caem juntos, ao mesmo tempo, pois a variação da velocidade deles é a mesma,
independentemente da massa! Isso só é possível no vácuo, pois quando consideramos um
corpo em queda livre na atmosfera, teremos a atuação da força de resistência do ar. Para
comprovar o que acabei de comentar, sugiro que você assista ao vídeo abaixo, que mostra
um experimento em que algumas penas são abandonadas juntamente com uma bola de
boliche em uma câmara de vácuo:

https://www.youtube.com/watch?v=JcmqfzGFhqQ

Quando estudamos física na escola sempre fazemos questões “desprezando a resistência do


ar”, mas na vida real percebemos que a resistência do ar não é nada desprezível e atua de
maneira diferente para objetos diferentes. Na verdade, os principais fatores que interferem
na resistência do ar são a densidade e a forma do objeto. Se considerarmos objetos com
formatos e densidades próximos, entendemos que a resistência do ar atuará de maneira
bastante semelhante nos dois objetos.

Ainda tratando da gravidade, considerando projéteis de calibres diferentes, como por


exemplo o .223 Remington e o .454 Casull, faço a seguinte pergunta:

Considerando que seja efetuado um tiro com uma arma em calibre .223 Remington e um
tiro com uma arma em calibre .454 Casull, ambos os tiros com os canos à mesma altura e na

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horizontal, ou seja, paralelos ao solo, qual dos dois projéteis irá tocar o chão primeiro? Para
refrescar a sua memória, mostro os dados balísticos dos dois calibres na tabela abaixo:

Calibre Velocidade (m/s) Massa (grains) Energia (Joules)


.223 Remington 990 55 1.745
.454 Casull 548 260 2.531
Tabela 1 – Mostra os dados balísticos dos calibres .223 Remington e .454 Casull.

Se você respondeu que será o de calibre .454 Casull, errou... Se respondeu que será o de
calibre .223 Remington, errou também! A resposta é: os dois tocarão o chão AO MESMO
TEMPO! Se analisar o que foi explicado antes irá entender! A aceleração da gravidade para os
dois projéteis é a mesma. A área e a densidade dos dois é relativamente próxima, de forma
que a resistência do ar nos dois casos será semelhante! A velocidade na boca do cano é
indiferente, no caso do tiro na horizontal. Se o tiro for com o cano em ângulo, a componente
vertical da velocidade do projétil mais rápido fará toda a diferença. O objetivo dessa
pergunta foi só demonstrar que a ação da gravidade é a mesma para qualquer calibre de
arma de fogo. Você mesmo pode fazer esse teste usando dois projéteis ou duas pedras de
massas bem diferentes!

A outra força que atua no projétil em deslocamento no ar já foi comentada. É a resistência


do ar, que é diretamente proporcional à velocidade do corpo, ou seja, quanto maior a
velocidade, maior é a resistência do ar. Novamente lembrando das aulas de física, que
consideravam esse fator nulo, o gráfico mostrado na Figura 1 mostra que na vida real não é
nem um pouco desprezível! No caso dos projéteis propelidos por armas de fogo, a
resistência do ar é proporcional à velocidade ao quadrado. Veja:

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Figura 1 – Gráfico demonstrando a diferença na trajetória do projétil em relação à resistência
do ar. Cálculo realizado para um projétil de calibre .380 Auto com projétil de 95 gn e ângulo
de tiro de 30o.

Analisando o gráfico é possível perceber que o alcance do projétil em questão seria de mais
de 12 km desprezando a resistência do ar e é de em torno de 750 metros, considerando esse
fator, mostrando que não é nada desprezível!

2.2 - A influência do formato do projétil e o coeficiente de arrasto

Como foi visto anteriormente, a aceleração da gravidade imprime aos corpos em queda livre
a mesma aceleração, entretanto a velocidade de queda varia de acordo com a resistência do
ar, que depende, dentre outros fatores, da forma do corpo que se desloca. Essa dependência
do formato do corpo é denominada Coeficiente de Arrasto (Ca). No nosso cotidiano vemos a
influência deste coeficiente, seja no formato de um veículo esportivo, de uma ave ou na
posição de um ciclista em uma prova de velocidade. Nos três exemplos, percebe-se um
formato que tende a ser mais achatado e comprido, conforme se nota na Figura 2:

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Figura 2 - Mostra as linhas de escoamento do ar em torno de um automóvel esportivo, um
velociclista e uma ave.

Este formato mais alongado produz um arrasto menor pois o ar “desliza” contornando o
corpo, produzindo menos turbulência. Nos corpos com formato menos aerodinâmico essa
turbulência gera um vácuo atrás do corpo que o “arrasta” no sentido contrário ao
movimento, vindo daí o termo Coeficiente de Arrasto.

Figura 3 - Mostra o deslocamento de três corpos com formatos diferentes no ar. O arrasto é
tão maior quanto maior for a turbulência gerada atrás do corpo.

A Figura 4 mostra os Coeficientes de Arrasto de várias geometrias. Quanto maior é o

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coeficiente, maior é o arrasto gerado no deslocamento do corpo:

Figura 4 - Mostra o coeficiente de arrasto para vários formatos de corpos.

É importante destacar que o arrasto e o comportamento do ar em torno do projétil


dependem da velocidade de deslocamento dele. Se o projétil é mais lento, o arrasto é menor
e o ar consegue contornar mais facilmente o corpo. Em velocidades maiores, o ar tem
menos facilidade em contornar o projétil, gerando um arrasto maior. Este tema é
brilhantemente tratado pelo colunista Luiz Gaspar no seu livro “Anotações sobre a doutrina
policial – Volume 2”, abaixo transcrito:

Quando um projétil se desloca à velocidades subsônicas, o escoamento de ar ao


seu redor pode ser considerado incompressível, ou seja, o projétil literalmente
empurra o meio ao seu redor de maneira que o ar se desloca e se molda ao
escoamento. Esta variação de pressão ocorre até mesmo adiante do projétil (...).
Quando tratamos de um regime de velocidade supersônico, o comportamento do
meio é modificado. Neste caso, a velocidade do projétil é muito alta para que o ar
ao seu redor possa responder a tempo, contornando o projétil. Não há
modificação no meio adiante do projétil. Uma vez que o escoamento não pode se
adaptar à modificação de pressão, o projétil “colide” com o ar, que é forçado a
modificar suas propriedades de pressão, temperatura e densidade, de uma
maneira violenta e irreversível, denominada onda de choque. A compressibilidade
e a presença de ondas de choque são as principais características de um regime
supersônico.
(MARIZ, 2019)

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Complementando a explicação de MARIZ(2019), veja a figura Figura 5 da mesma fonte que
ilustra a questão:

Figura 5 - Mostra as ondas de choque e o comportamento do projétil em regime


supersônico no ar.

2.3 - A resistência do ar e o Coeficiente Balístico (CB)

O coeficiente de arrasto é um elemento importante na determinação de como o projétil


vencerá a resistência do ar, mas não é o único. Essa facilidade em vencer a resistência do ar é
denominada Coeficiente Balístico (CB), que é expresso como se segue:

Equação 2 - Determinação do coeficiente balístico de um corpo.

Como se percebe, o coeficiente balístico relaciona-se à forma, à densidade e ao


comprimento do corpo. A dependência da forma já foi explicada anteriormente, quando
tratamos sobre o Coeficiente de Arrasto. A densidade está relacionada à inércia do corpo,
uma vez que quanto maior for a densidade de um corpo, maior será a massa contida no
mesmo volume e, consequentemente, a inércia. A dependência do comprimento do corpo é
mais um fator que se relaciona ao formato, uma vez que já foi demonstrado que corpos mais

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oblongos geram um menor coeficiente de arrasto.

Considerando a relação entre a densidade, massa e dimensões de um corpo, e considerando


também que o volume de um corpo com geometria simples é a área dele multiplicada pelo
comprimento, é possível transformar a Equação 2 pela substituição expressa na Equação 3:

Equação 3 - Relação entre a densidade, massa, área da seção transversal e comprimento de


um corpo.

Portanto:

Equação 4 - Coeficiente Balístico expresso em função da massa, Coeficiente de Arrasto e


área da seção transversal de um corpo.

Analisando a Equação 4 percebe-se a contribuição da massa no Coeficiente balístico. Essa


contribuição, conforme explicado anteriormente, se deve à maior inércia do corpo, que é a
tendência dele se manter no estado de repouso ou movimento em que se encontra. Pode,
grosso modo, ser entendida como a dificuldade de parar um corpo em movimento.

Uma outra forma de se entender o Coeficiente Balístico é a capacidade de um corpo manter


a sua energia cinética, uma vez que a perda de energia em virtude do atrito do corpo com o
ar será menor.

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Até o momento é importante que você tenha entendido os conceitos aqui tratados, não só
por se relacionarem à balística externa como também por serem inteiramente aplicáveis à
balística terminal, conforme será demonstrado na terceira parte do estudo.

3 - BALÍSTICA EXTERNA DE CALIBRES DE “ALTA ENERGIA”

Uma vez apresentado o embasamento teórico da balística externa de projéteis propelidos


por armas de fogo, vamos agora aplicar tais princípios aos calibres ditos “de alta energia”,
sempre trabalhando com os dois “tipos” de calibres apresentados na primeira parte, a saber:

Calibres de maior velocidade e menor massa, notadamente os calibres de fuzil;


Calibres de menor velocidade e maior massa.

3.1 - Considerações a respeito do formato dos projéteis

Você já viu anteriormente a importância da forma e massa de um projétil na balística


externa. Novamente vamos recorrer aos calibres .223 Remington e .454 Casull apenas para
uma comparação mais concreta, sendo possível estender o raciocínio para os demais
calibres com as mesmas características. Para ilustrar, vamos observar novamente os
formatos dos projéteis desses calibres:

Figura 6 – Mostra um projétil de calibre .223 Remington ao lado de um projétil de calibre


.454 Casul, ambos em escala entre si.

Observando a Figura 6 é possível notar que o formato do projétil de calibre .223 Remington é
mais oblongo, consequentemente com coeficiente balístico maior, enquanto que o de
calibre .454 Casull é mais “quadrado”, gerando um coeficiente balístico menor. É importante
ressaltar que, apesar do coeficiente balístico ser proporcional à massa, o formato do projétil é

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um fator importante tanto no Coeficiente de Arrasto quanto na área, analisando a Equação
4.

3.2 - Considerações a respeito da velocidade dos projéteis

Observando a Tabela 1 percebe-se que a velocidade do projétil de calibre .223 Remington é


de 995 m/s enquanto que a velocidade do projétil de calibre .454 Casull é de 548 m/s. Ambos
os projéteis são supersônicos, entretanto a velocidade do primeiro é quase o dobro da
velocidade do segundo. Associando esta informação aos coeficientes balísticos de ambos,
podemos inferir que isso interfere diretamente na curva balística dos dois calibres, conforme
é possível notar na Figura 7.

Figura 7 – Curvas balísticas de projéteis de calibres .223 Remington (1738 joules) e .454 Casull
(2536 Joules), gerado a partir do site http://gundata.org.

Analisando a Figura 7 é possível perceber que o alcance de projéteis de calibre .454 Casull é
sensivelmente inferior ao alcance de projéteis de calibre .223 Remington, apesar da energia
ser consideravelmente maior. Além disso, a trajetória do .223 Remington é mais tensa, ou
seja, mais aproximada de uma linha reta, do que a trajetória do .454 Casull. Isso se deve
tanto à maior velocidade inicial do projétil de calibre .223 Remington, que faz com que ele
percorra uma distância maior em um tempo menor, quanto ao seu maior Coeficiente
Balístico, que faz com que o projétil consiga ter menor perda de energia cinética por atrito
com o ar. Não se esqueça que a energia cinética do calibre .454 Casull é consideravelmente
maior que a do calibre .223 Remington! Isso é mais um fator que demonstra que a energia
cinética não é um bom parâmetro de comparação de desempenho de calibres.

4 - CONCLUSÃO... AINDA POR ENQUANTO...

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Nesta segunda parte do artigo mostramos as diferenças na balística externa dos ditos
calibres de “alta energia”, demonstrando que a energia não é um fator preponderante no
comportamento dinâmico do projétil. Foi possível perceber que fatores como o formato e
velocidade do projétil são muito mais importantes na trajetória do que a energia em si. Na
terceira parte do artigo serão analisados os aspectos relacionados à balística terminal desses
calibres. Você verá que alguns aspectos abordados na balística externa também são úteis na
balística terminal, principalmente nas lesões em tecidos moles. Quem sabe, até lá você já
estará convencido em não empregar mais o termo calibres de alta energia e substituirá por
calibres de alta velocidade!

BIBLIOGRAFIA

GUNDATA. Gundata. Disponivel em: <http://gundata.org>. Acesso em: 2020 abril 21.

MARIZ, L. G. R. Anotações sobre a doutrina policial: Balística. 1ª Edição. ed. Brasília: Do


Autor, v. 2, 2019.

Muitas vezes utilizado erroneamente como sinônimo de massa

Para entender melhor sobre o escoamento laminar e turbulento de fluidos, pesquise sobre o
Número de Reynolds.

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CALIBRES DE ALTA ENERGIA OU CALIBRES DE
ALTA VELOCIDADE? PARTE III
Escrito em 05/08/2020 por João Bosco

A terceira parte do nosso estudo mostra as diferenças nas características das lesões dos
calibres de baixa e alta velocidade, demonstrando que o mecanismo de produção dessas
lesões não está relacionado à energia e sim à velocidade do projétil.

1 - INTRODUÇÃO

Na primeira parte do nosso estudo, abordei as diferenças entre os conceitos de alta energia
e alta velocidade, demonstrando que dois calibres podem ter a mesma energia e
características completamente diferentes. Você viu que a energia é uma grandeza escalar e
a velocidade uma grandeza vetorial e percebeu como isso se relaciona ao comportamento
do projétil. Na segunda parte abordei os aspectos relacionados à balística externa dos ditos
“calibres de alta energia”, comparando, novamente, os dois universos compreendidos na
mesma faixa de energia: os calibres cujos projéteis possuem velocidade maior e massa
menor e os calibres cujos projéteis possuem velocidade menor e massa maior. Vimos que os
formatos dos dois tipos de projéteis são bastante diferentes.

Nesta terceira parte trabalharemos os aspectos relacionados à balística terminal desses


calibres, especialmente na dinâmica da produção da lesão decorrentes desses dois tipos de
calibres ditos “de alta energia”.

2 - MECANISMO DE PRODUÇÃO DE FERIMENTOS DE TIRO

Diferentemente de outros instrumentos, que resultam no deslocamento mínimo ou quase

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nulo dos tecidos adjacentes à região atingida pelo instrumento, o projétil propelido por
arma de fogo (PAF) produz, além da lesão propriamente dita, uma onda de choque ao
empurrar os tecidos, por meio de uma ação contínua de compressão e esmagamento, que
se desloca radialmente à medida que o projétil avança pelo tecido. Com isso, mesmo tecidos
não diretamente atingidos pelo projétil acabam por perceber a ação do instrumento, não
necessariamente resultando em lesões.

Por serem dotados de massa e velocidade, os projéteis possuem, portanto, energia cinética,
que é uma das formas de energia mecânica. Ao se chocar contra o alvo, parte ou toda a
energia cinética contida no projétil se dissipa em outras formas de energia, como por
exemplo energia térmica (calor), energia sonora (som), deformação dos tecidos (que
também pode ser entendida como energia mecânica, desta vez energia potencial elástica,
em função da elasticidade dos tecidos), sendo esta última a principal causadora da lesão
propriamente dita. A elasticidade dos tecidos que compõem o corpo varia de acordo com a
região e estruturas atingidas. Um tecido muscular esquelético possui fibras mais resistentes
e com maior elasticidade que um órgão com maior quantidade de água, como o baço, por
exemplo. Órgãos ocos como o pulmão ou a bexiga, apresentam comportamentos diferentes
de órgãos sólidos, como o fígado, baço e rins. Os ossos possuem maior resistência mecânica
e menor elasticidade, quebrando-se ao invés de expandir. Todos esses fatores aumentam
consideravelmente a compreensão de como é produzida a lesão por tiro.

Além das variações inerentes às diferentes estruturas que compõem o corpo humano,
outras variáveis externas devem ser consideradas, tais como a velocidade, formato,
dimensões e massa do projétil que atinge o corpo. Considerando a mesma região atingida,
projéteis com características diferentes produzem lesões diferentes. Projéteis com as
mesmas características atingindo diferentes regiões produzem lesões diferentes.

Para melhor compreensão de como se dá a lesão resultante da ação de um PAF, pode-se


dividir esta ação em dois momentos, sendo um deles o instante imediato da ação do projétil,
enquanto a energia ainda está se dissipando nos tecidos, denominado CAVIDADE
TEMPORÁRIA, e o outro aquele encontrado após a estabilização dos tecidos em sua
acomodação pós-perturbação implementada pelo projétil, denominado CAVIDADE
PERMANENTE. Tais momentos serão analisados a seguir.

2.1 - O estudo da cavidade temporária

Conforme explicado anteriormente, a energia do projétil se dissipa no corpo de diversas


formas, sendo uma delas a deformação dos tecidos. As fibras dos tecidos possuem certa
elasticidade, variável de acordo com a estrutura atingida, de maneira que a compressão
produzida pela passagem do projétil se acumula na forma de energia potencial elástica
nessas fibras, sendo então devolvida depois de cessada a expansão produzida pelo projétil,

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ocorrendo a reacomodação dos tecidos. Todo esse movimento de expansão e
reacomodação de tecidos é denominado CAVIDADE TEMPORÁRIA, pois ocorre em fração de
segundo, com duração e raio de expansão dependente de diversos fatores, dentre eles a
região atingida, o formato e velocidade do projétil.

Para se ter uma ideia de como é a cavidade temporária produzida pela passagem de um
projétil, basta efetuar um tiro em um material que permita a expansão da onda de choque,
mas que não possua elasticidade para a reacomodação do material no trajeto de passagem
do projétil. Vários materiais podem ser empregados neste teste, tais como argila, plastilina
(massa de modelar) ou sabão em barra. Veja na Figura 1 a cavidade temporária de um
projétil produzida em um bloco de argila.

Figura 1 - Fotografia operada durante ensaio prático realizado pelo autor. Note a cavidade
temporária produzida no bloco de argila em virtude da onda de choque gerada pelo projétil.
Perceba que a cavidade temporária é consideravelmente maior que o diâmetro do projétil.
(Fonte: acervo do autor)

2.2 - O estudo da cavidade permanente

Uma vez cessada a cavidade temporária, pela reacomodação dos tecidos, percebe-se o dano
final resultante da ação do projétil, sendo este dano a lesão final propriamente dita,
denominado cavidade permanente, que será sempre menor que a cavidade temporária.
Assim como no caso da cavidade temporária, as dimensões e caraterísticas cavidade
permanente dependerão de diversos fatores (região atingida, velocidade, e dimensões do

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projétil, etc).

A Figura 2 mostra um desenho esquemático explicando a formação das duas cavidades:

Figura 2 – Desenho esquemático mostrando a formação das cavidades temporária e


permanente. As setas indicam a distensão e retração dos tecidos devido à elasticidade
deles. Note a compressão e esmagamento dos tecidos à frente do projétil, que resultará na
propagação da onda de choque pelo trajeto do projétil. (Fonte: acervo do autor)

3 - FERIMENTOS DE TIRO PRODUZIDOS POR PROJÉTEIS DE BAIXA VELOCIDADE

Com base no exposto até agora, é possível entender como se dá a dinâmica de produção de
lesão dos projéteis de baixa velocidade, principalmente se observarmos o que a literatura
informa sobre o tema:

“Se a cavidade temporária for produzida rápida o bastante para ultrapassar a capacidade
elástica do tecido, será capaz de produzir lesões em decorrência do estiramento provocado.
Este efeito é percebido em projéteis de calibres de alta energia, como os de fuzis, mas não
pelos calibres mais comuns de armas curtas. Para que a cavidade temporária de um projétil
seja capaz de produzir um efeito lesivo, a velocidade do projétil precisa exceder os 2.000 pés

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por segundo (610 m/s).

Em velocidades menores, desenvolvidas por armas curtas, a cavidade temporária não possui
velocidade suficiente para produzir nenhum efeito lesivo, portanto qualquer diferença de
cavidade temporária produzida por calibres de armas curtas é irrelevante.” (DIMAIO, 2016)

Como brilhantemente explicado por DiMaio, a produção ou não de lesão decorrente da


cavidade temporária dependerá da VELOCIDADE do projétil e não da sua ENERGIA.
Curiosamente, no início do texto ele mesmo usa o termo “alta energia”, entretanto se refere
à velocidade do projétil e não energia. Talvez isso de deva ao costume de se empregar essa
terminologia mais popular, apesar de não adequada. Como mencionado por DiMaio,
velocidades inferiores a 2000 fps são geralmente insuficientes para resultar em lesão, de
forma que a cavidade permanente será resultante apenas da ação direta do projétil. Os
danos decorrentes apenas da ação mecânica do projétil são denominados, pelo mestre Doc
Maniglia, “danos primários”,

Para melhor ilustrar o tema, imagine uma corda submetida a uma tração gradual. Ela vai se
esticando vagarosamente até suportar uma determinada carga. Agora imagine que uma
carga um pouco menor que a corda suportou fosse bruscamente aplicada. Neste caso,
apesar de ser uma carga menor do que a suportada pela corda, a velocidade com que a
tração foi exercida foi grande o suficiente para ultrapassar a capacidade elástica da corda,
resultando na sua ruptura.

No caso dos projéteis de baixa velocidade, o estiramento dos tecidos acontece em


velocidade inferior à necessária para ocasionar o rompimento dos tecidos. Com isso, o
ferimento resultante terá tamanho próximo ao do projétil, considerando não só o seu
diâmetro como o seu comprimento, uma vez que pode ocorrer a perda de estabilidade com
consequente tombamento do projétil.

Mesmo no caso dos projéteis expansivos, ainda assim não haverá alteração da velocidade de
formação da cavidade temporária, ou seja, o tamanho da lesão resultante será pouca coisa
maior que aquela resultante de projéteis ogivais. Essa diferença de tamanho pode até não
ser perceptível, a depender do tecido lesionado. O tombamento do projétil não representa
grande alteração, uma vez que, como já discutido anteriormente, os projéteis são mais
“quadrados” de maneira que não há muita diferença entre o seu diâmetro e comprimento
(Figura 3).

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Figura 3 – Mostra um projétil de calibre .454 Casull comparando o seu diâmetro com o
comprimento. Nota-se que o comprimento não chega a ser nem o dobro do seu diâmetro.

Quando um projétil de baixa velocidade atinge um osso, a fragmentação dependerá


principalmente da massa do projétil. Projéteis mais leves, tais como nos calibres 7.65mm
Browning ou mesmo .380 Auto, raramente conseguem produzir a fragmentação de grandes
ossos, como o fêmur ou úmero. Já projéteis mais pesados conseguem produzir a
fragmentação do osso, entretanto os fragmentos gerados serão grandes e lançados a
pequenas distâncias justamente por causa do seu tamanho.

A fragmentação dos projéteis não é um elemento desejável nos calibres de baixa velocidade.
Como os danos por eles produzidos são apenas os primários, o desejável é que possuam
maior penetração. Para isso, precisam manter a massa e, consequentemente, a inércia.

4- FERIMENTOS DE TIRO PRODUZIDOS POR PROJÉTEIS DE ALTA VELOCIDADE

Como vimos anteriormente, não há muita diferença entre o diâmetro e o comprimento de


projéteis de calibres de baixa velocidade. Já nos projéteis de calibres de alta velocidade, a
diferença entre o diâmetro e comprimento do projétil é considerável, chegando a mais de
três vezes em alguns casos. Na parte anterior deste artigo, vimos que isso acontece para que
haja redução do CA (coeficiente de arrasto) e aumento do CB (coeficiente balístico),
tornando o projétil mais eficiente para atravessar o ar.

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Figura 4 – Mostra um projétil de calibre .223 Remington comparando o seu diâmetro com o
comprimento. Nota-se que o comprimento é mais de três vezes maior do que o diâmetro,
visando melhorar o CB (coeficiente balístico).

Quando um projétil com o formato mostrado na Figura 4 atinge um meio mole como o
corpo humano, a estabilidade fica prejudicada, em virtude do maior arrasto produzido pelos
tecidos. O projétil até consegue percorrer um determinado trecho ainda com estabilidade,
mas depois tomba, oferecendo a sua área lateral perpendicularmente ao deslocamento.
Vimos na Parte II desse estudo que o formato do corpo possui grande interferência no
arrasto. Neste caso do tombamento do projétil, o arrasto que era pequeno antes do
tombamento, passa a ser enorme quando o projétil tomba, empurrando uma grande massa
de tecidos a grande velocidade, resultando em uma cavidade temporária enorme e
com velocidade de formação muito maior do que dos calibres de baixa velocidade,
justamente por causa da maior velocidade do projétil. Essa distância necessária dentro do
corpo para que ocorra o tombamento do projétil e magnificação do dano é denominada
“neck” (do inglês, pescoço). Veja este efeito na Figura 5:

Figura 5 – Mostra o tombamento do projétil ocorrido após o neck. Este tombamento, aliada à
alta velocidade do projétil, produz uma grande cavidade temporária de maneira muito
rápida.(Fonte: acervo do autor)

Essa formação do neck está aliada a diversos fatores, que fazem com que ele seja maior ou
menor, tais como a velocidade do projétil, formato do projétil, o passo de raiamento da arma
e a consistência da região anatômica.

Projéteis mais velozes resultam em neck mais longo. Projéteis mais compridos possuem
menos estabilidade, portanto neck mais curto. Considerando o mesmo tipo de projétil,
armas com passo de raiamento menor impõem rotação mais rápida ao projétil,
aumentando a sua estabilidade e, consequentemente o neck. Regiões anatômicas mais

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moles conseguem desestabilizar o projétil mais rápido, resultando em um neck menor. Os
danos resultantes do estiramento dos tecidos em virtude da cavidade temporária são
denominados “danos secundários”.

A imagem mostrada na figura seguinte ilustra o diagrama mostrado na Figura 5:

Figura 6 - Mostra a sobreposição do diagrama mostrado na Figura 5 em um ferimento real.


Perceba que grande lesão produzida no trecho de tombamento do projétil. (Fonte: acervo
do autor)

A região de formação do neck interfere sobremaneira na gravidade da lesão. Indivíduos mais


magros podem sofrer menos lesões do que indivíduos mais corpulentos, caso o neck seja
muito longo, uma vez que pode ocorrer a transfixação do corpo antes do tombamento do
projétil. Por outro lado, se o neck for muito curto, a maximização da lesão pode acontecer
antes de atingir a profundidade onde se encontram os vasos sanguíneos mais calibrosos,
principalmente no caso de tiros que incidem lateralmente no corpo.

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Esta formação do neck é um fator de grande importância nos calibres de alta velocidade,
entretanto não é o único a produzir danos. Quando um projétil de alta velocidade atinge um
osso, a grande fragmentação tanto do osso quanto do projétil aliada à velocidade que tais
fragmentos serão impulsionados aumenta consideravelmente a gravidade da lesão,
resultando nos “danos terciários”. Quando um ou mais ossos dos membros são atingidos, a
laceração tecidual pode ser tão ampla a ponto de praticamente resultar em uma
amputação traumática do membro, que ficará preso ao corpo tão somente por retalhos de
pele e músculos, como mostrado na figura seguinte:

Figura 7 - Mostra um ferimento produzido por projétil de alta velocidade atingindo o úmero.
A – Ferimento de entrada. B – Ferimento de saída. C – RX do segmento. Note a grande
laceração resultante da projeção dos fragmentos ósseos no entorno da lesão. (Fonte: acervo
do autor)

Outra característica comum dos projéteis de alta velocidade é a fragmentação do projétil,


que ocorre de maneira diferente para projéteis encamisados ou softpoint/polymertip. Nos
projéteis encamisados, percebe-se o tombamento mostrado na Figura 5, com uma grande

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pressão exercida na lateral do projétil pela resistência dos tecidos. Como o comprimento do
projétil é muito maior que o diâmetro, ocorre a fragmentação do projétil, geralmente em
dois fragmentos, ainda com velocidade suficiente para penetrar mais nos tecidos. A cinta de
crimpagem dos projéteis, que é um anel recartilhado no ponto de estreitamento que
coincide com a boca do estojo, maximiza a possibilidade de fragmentação do projétil.

Figura 8 - Cinta de crimpagem do projétil de calibre 5.56x45mm NATO. Este é um ponto de


fragilidade do projétil, favorecendo a sua fragmentação quando ocorre o tombamento no
interior do corpo.

Nos projéteis softpoint/polymertip, O próprio formato do projétil favorece a sua expansão e


fragmentação antes mesmo que ocorra o tombamento. A Figura 9 mostra a ação de um
projétil expansivo de alta velocidade em uma barra de sabão.

Figura 9 - Mostra a cavidade temporária de um projétil softpoint de alta velocidade em uma


barra de sabão. Nota-se que a ação principal da cavidade temporária ocorre em

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profundidade menor do que nos projéteis encamisados.

Quando a entrada de um projétil de alta velocidade se dá em uma região que tenha um


osso plano próximo da superfície, como é o caso da cabeça ou da região do esterno, a
fragmentação óssea ocorre também projetando fragmentos no sentido contrário à entrada
do projétil. Este efeito ocorre devido à alta velocidade do projétil, de forma que antes mesmo
de atravessar o osso já produz a fragmentação. Os fragmentos são lançados no sentido
contrário da mesma forma que a água é lançada no sentido contrário de uma pedra lançada
em um lago. Esses fragmentos ósseos lançados ao contrário resultam em um grande
ferimento de entrada, como é visto na Figura 10, a seguir:

Figura 10 - Grande ferimento de entrada no esterno, produzido por projétil de calibre 5.56x45
mm NATO. (Fonte: acervo do autor)

5 - CONCLUSÕES

Espera-se que com a leitura das três partes desse estudo tenha ficado claro que o que

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determina as características da lesão não é propriamente a energia do projétil e sim a sua
velocidade. Foram mostradas as diferenças entre as lesões de calibres de alta e baixa
velocidade e os efeitos internos no corpo, podendo-se resumir da seguinte maneira:

Projéteis de baixa velocidade:

São aqueles com velocidade inferior a 2000 fps (610 m/s);


Produzem apenas danos primários, que são aqueles decorrentes da ação mecânica
direta do projétil;
Os danos secundários e terciários, que são respectivamente os produzidos pela
cavidade temporária e pela fragmentação do projétil e ossos, não resultam em lesões
significativas;
O tombamento do projétil não é um fator de grande relevância na característica da
lesão;
Produzem pequena ou nenhuma laceração tecidual.

Projéteis de alta velocidade:

São aqueles com velocidade superior a 2000 fps (610 m/s);


Produzem danos primários, secundários e terciários;
O tombamento do projétil é um fator importante no resultado da lesão;
A distância necessária para o tombamento do projétil é denominada “neck”;
Produzem lesões com laceração tecidual significativamente maior do que os projéteis
de baixa velocidade.

As considerações acima, embora importantes, servem para nortear os conceitos


relacionados à lesão e não devem ser levados como números mágicos ou absolutos. Como já
exaustivamente foi comentado, os fatores que resultam nas lesões são múltiplos e devem
ser analisados caso a caso, ou seja, pode acontecer de um projétil com velocidade um pouco
inferior a 2000 fps se comportar como projétil de alta velocidade ou um projétil com
velocidade um pouco superior se comportar como um projétil de baixa velocidade. O
importante é entender os conceitos relacionados às lesões e seus mecanismos de produção.
Outro ponto importante é entender que a energia não é um bom parâmetro para
comparação de calibres, uma vez que a mesma energia pode trazer resultados diferentes e
inconsistentes. Em breve pretendo retomar o assunto com um viés mais prático, realizando
experimentos para demonstrar as diferenças nas características das lesões para projéteis de
baixa e alta velocidade.

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