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assimetria

DOS POSSÍVEIS em que existe); e «Sócrates era um modo aproximado, a distinção tradicional
chinês» exprime um juízo problemático, se acei- entre cognição e sensação. Nesta última cate-
tarmos que Sócrates era possivelmente chinês, goria incluem-se não apenas os diversos tipos
apesar de ser efectivamente grego (apesar de no de experiências perceptivas obtidas por meio
mundo actual Sócrates ser grego, há alguns das diversas modalidades sensoriais (por
mundos possíveis nos quais é chinês). Esta ter- exemplo, experiências auditivas como o acon-
minologia era usada por Kant e outros filósofos tecimento que consiste em ouvir uma certa sin-
do passado, mas caiu em desuso. DM fonia de Beethoven, experiências visuais como
o acontecimento que consiste em ver um lápis
assimetria Ver SIMETRIA. vermelho, experiências olfactivas, experiências
tácteis, etc.), como também sensações em sen-
associatividade, leis da A fórmula (p ∧ q) ∧ r tido estrito (por exemplo, sensações álgicas),
é logicamente equivalente à fórmula p ∧ (q ∧ certas emoções e outros acontecimentos psico-
r). Equivalentemente, a fórmula (p ∧ q) ∧ r ↔ lógicos. (É muito provável que esta taxonomia
p ∧ (q ∧ r) é uma tautologia. De igual modo, (p do mental em termos de atitudes e experiências
∨ q) ∨ r é logicamente equivalente a p ∨ (q ∨ não seja suficientemente precisa e que existam
r). Estas são as denominadas leis associativas casos de fronteira; todavia, isso não a torna
da conjunção, respectivamente disjunção. As uma classificação útil.)
leis associativas também são válidas na LÓGICA A razão para a escolha do termo «atitude
INTUICIONISTA. proposicional» é, como indicado pela sua
A noção de associatividade exposta está estrutura, dupla. Por um lado, trata-se de esta-
intimamente ligada à noção de operação associa- dos psicológicos atitudinais, pelo menos se
tiva. Uma operação binária, *, dum conjunto A considerarmos apenas os estados paradigmáti-
para ele próprio é uma operação associativa se, cos mencionados e outros estados que lhes são
para todos os elementos a, b, c ∈ A, (a * b) * c = de alguma maneira próximos. Tal significa que
a * (b * c). Em tal caso não é ambíguo omitir os se trata de estados que envolvem de algum
parêntesis e escrever a * b * c. Ver também CÁL- modo uma «tomada de posição» em relação a
CULO PROPOSICIONAL, TAUTOLOGIA, ÁLGEBRA DE algo: aceitar, rejeitar, hesitar, ser indiferente,
BOOLE, LÓGICA INTUICIONISTA. FF estar em dúvida, etc. Por outro lado, o objecto
dos estados mentais (aquilo que se aceita, rejei-
assunção Em lógica, mesmo que SUPOSIÇÃO. ta, etc.) é identificado como uma PROPOSIÇÃO,
ou seja, algo que é semanticamente avaliável e
atitude proposicional Termo introduzido por que tem um VALOR DE VERDADE de uma forma
Bertrand Russell para designar uma das duas absoluta, não relativizada por qualquer contex-
categorias centrais de estados e acontecimentos to ou propósito.
psicológicos em que se tornou habitual dividir Exemplos de atitudes proposicionais são
a totalidade dos fenómenos mentais; talvez em assim, além de crenças e desejos, pensamentos,
virtude do papel que desempenham na explica- juízos, receios, perplexidades, ansiedades,
ção do comportamento racional, considera-se esperanças, memórias, conhecimentos, etc.
usualmente que as crenças e os desejos são Alguns desses estados psicológicos, como é em
estados mentais paradigmáticos da categoria geral o caso de juízos e pensamentos, são esta-
das atitudes proposicionais. dos ocorrentes, ou seja, episódios mentais
A outra classe de estados mentais é a classe conscientes e imediatos (como, por exemplo, o
das experiências; ou, usando um termo um pensamento que acabou de me ocorrer de que
pouco mais restritivo mas também frequente, a hoje é feriado); outros, como é em geral o caso
classe das sensações. Este género de bipartição de crenças e receios, são estados meramente
dos fenómenos mentais reflecte, pelo menos de disposicionais, ou seja, estados normalmente

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atitude proposicional

inconscientes e de mais longa duração que Noutras versões, as atitudes proposicionais são
consistem em propensões (não necessariamente relações indirectas entre pessoas (organismos,
manifestadas) para aceitar, rejeitar, recear, etc., etc.) e proposições, mediadas por um terceiro
algo (a crença de que a Torre Eiffel é maior do tipo de entidades; estas entidades podem ser
que o dedo mindinho de Gottlob Frege, por diversas coisas, conforme a teoria particular
exemplo, é um estado mental que me pode defendida: representações mentais, frases de
seguramente ser atribuído; muito embora, até uma linguagem natural, frases da «linguagem
ao momento, eu nunca tenha pensado nisso). do pensamento», etc.
De acordo com uma conhecida concepção Muitos filósofos e linguistas pensam que a
acerca das atitudes, à qual se pode chamar concepção relacional das atitudes proposicio-
relacional, o estado psicológico em que estou nais é fortemente suportada por considerações
quando acredito que Claudia Schiffer é boa relativas à forma lógica e à semântica das fra-
envolve uma certa RELAÇÃO, de índole positiva ses que usamos habitualmente para atribuir
(a relação de acreditar), que se estabelece entre atitudes proposicionais a pessoas e a outros
mim e uma certa proposição, a proposição de organismos. Os estados mentais mencionados
que Schiffer é boa. A relação em questão não é poder-me-iam ser linguisticamente atribuídos
entre mim e um objecto físico, a Schiffer em por alguém (que falasse português) através do
carne e osso (caso contrário, muita gente talvez uso de frases como (respectivamente) «JB
procurasse, só por essa razão, estar imediata- acredita que Claudia Schiffer é boa», «JB quer
mente em tal estado psicológico!); a relação é que Claudia Schiffer se molhe da cabeça aos
entre mim e um objecto abstracto, aquela pro- pés», e «JB duvida que Deus exista». A ideia é
posição. A proposição é o CONTEÚDO (ou o então a de considerar tais relatos de atitudes
SIGNIFICADO) da minha crença; e esta será uma como tendo a forma lógica de predicações diá-
crença verdadeira se, e só se, a proposição for dicas. Tal como uma frase como «Claudia
uma proposição verdadeira. Analogamente, o Schiffer detesta Naomi Campbell» deve ser
estado mental em que estou quando quero que vista como formada a partir do preenchimento
Claudia Schiffer se molhe da cabeça aos pés de um predicado diádico, o predicado «detes-
envolve uma certa relação, igualmente de índo- ta», por um par ordenado de termos singulares,
le positiva, mas de diferente natureza (a relação os nomes «Claudia Schiffer» e «Naomi Camp-
de desejar), que se estabelece entre mim e uma bell», também uma frase como «JB acredita
certa proposição, a proposição de que Schiffer que Claudia Schiffer é boa» deve ser vista
se molhe da cabeça aos pés; a proposição é o como formada a partir do preenchimento de
conteúdo do meu desejo, e este será um desejo um predicado diádico, o verbo psicológico
realizado se, e só se, a proposição for verdadei- «acredita», por um par ordenado de termos
ra. Do mesmo modo, o estado em que estou singulares, o nome «JB» e o termo complexo
quando duvido que Deus exista envolve uma «que Claudia Schiffer é boa».
certa relação, desta vez de índole negativa, O discernimento de uma estrutura desta
pelo menos à luz de um certo conceito de natureza nas frases de atitude é muitas vezes
dúvida (a relação de duvidar), que se estabele- justificado com base em observações acerca do
ce entre mim e uma certa proposição, a propo- comportamento inferencial das frases. Por
sição de que Deus existe; a proposição é o con- exemplo, tal como uma consequência lógica
teúdo da minha dúvida, e esta será uma dúvida (por generalização existencial) da frase «Clau-
fundada ou legítima se, e só se, a proposição dia Schiffer detesta Naomi Campbell» é a frase
for uma proposição falsa. Em algumas versões «Claudia Schiffer detesta alguém», também
do ponto de vista relacional, as atitudes propo- uma consequência lógica (por generalização
sicionais são relações directas, não mediadas, existencial) da frase «JB acredita que Claudia
entre pessoas (organismos, etc.) e proposições. Schiffer é boa» é a frase «JB acredita em

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atitude proposicional

algo»; e esta última frase, tomada em conjun- tudes proposicionais que as tornam distintas
ção com uma frase como «Richard Gere acre- das experiências e sensações.
dita que Claudia Schiffer é boa», tem como A primeira é a de que as atitudes são esta-
consequência lógica a frase «Há algo em que dos psicológicos que envolvem necessariamen-
JB e Gere ambos acreditam». Ora, alega-se que te a cognição, no seguinte sentido particular:
a validade de inferências deste tipo ficaria por um organismo estar num desses estados impli-
explicar se uma estrutura daquele género não ca a posse e o exercício pelo organismo de
fosse reconhecida nas frases originais. Sem determinados conceitos. Por exemplo, só posso
entrar em certos refinamentos e complicações ser correctamente descrito como estando no
irrelevantes para os nossos fins, considera-se estado mental de acreditar que os pinguins são
que a forma geral de uma atribuição de atitude peixes se tiver o conceito de um peixe (e o
┌ ┐
é dada no esquema s V que p , em que a letra conceito de um pinguim); ou seja, se eu de
esquemática s é substituível por um termo sin- alguma maneira souber o que é um peixe (o
gular (por exemplo, «JB»), V por um verbo de que é um pinguim). E uma pessoa só pode ser
atitude (por exemplo, «acredita»), e p por uma correctamente classificada como querendo que
frase (por exemplo, «Schiffer é boa»); deste a neve seja removida da estrada se tiver inter
┌ ┐
modo, que p é a forma geral de um termo alia o conceito de neve, se de algum modo
obtido pela prefixação do operador monádico souber o que é a neve. Por isso é que, para
«que» a uma frase p. E, pelo seu lado, a semân- tomar um caso extremo, não seria correcto
tica das frases de atitude tem naturalmente de atribuir a um antigo general romano (digamos)
respeitar estes factos acerca da sua estrutura. uma crença cujo conteúdo fosse especificado
Assim, a referência do termo singular que através de uma frase portuguesa como «A
substitui s é um sujeito apropriado de atitudes aritmética pura é incompleta» ou «A água é
(pessoa, organismo, sistema), a referência do H2O». Em contraste com isto, a presença de
predicado diádico que substitui V é uma rela- ingredientes conceptuais não é de forma algu-
ção psicológica (por exemplo, a relação de ma exigida, em geral, para que um organismo
crença), e┌ a referência

do termo singular que seja correctamente descrito como estando num
substitui que p é uma proposição, a proposi- estado psicológico pertencente à outra catego-
ção┌ que p. Por┐ conseguinte, uma frase de atitu- ria de estados, como tendo uma certa experiên-
de s V que p é verdadeira se, e só se, a pessoa cia ou sensação. Por exemplo, uma criatura
(organismo, etc.) referida por s estiver na rela- (por exemplo, um corvo) pode ser correcta-
ção psicológica referida por V com a proposi- mente descrita como estando numa certa oca-
┌ ┐
ção referida pelo termo que p . sião a ver a neve a ser removida da estrada,
Em suma, considerações deste teor acerca sem que a fruição de tal experiência visual
da forma lógica e da semântica de frases de implique qualquer posse pelo organismo do
atitude são tomadas por muitos filósofos como conceito de neve. Isto permite distinguir o
sancionado o ponto de vista relacional sobre as acontecimento mental de ver, uma experiência,
atitudes. Deve-se, no entanto, dizer que isto do acontecimento mental de ver que, uma ati-
está longe de ser consensual. Por um lado, há tude proposicional. Uma criatura pode ver a
filósofos que não consideram de forma alguma neve a cair sem saber o que é a neve, mas não
legítimo inferir observações acerca da metafí- pode ver que a neve está a cair sem ter o con-
sica das atitudes a partir de observações acerca ceito de neve. Ambos os acontecimentos men-
da forma lógica e da semântica de frases de tais são cognitivos no sentido genérico em que
atitude. Por outro lado, outros filósofos rejei- ambos envolvem a aquisição e o processamen-
tam simplesmente a análise sintáctico-semân- to de informação proveniente do meio ambien-
tica esboçada para atribuições de atitude. te; mas só o segundo acontecimento envolve a
Há duas características importantes das ati- cognição no sentido particular utilizado.

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atitude proposicional

Outra distinção interessante do mesmo tivas à sua fenomenologia, às características


género é aquela que se pode fazer entre: a) A puramente subjectivas desses estados. Há cer-
memória proposicional, um estado mental em tamente casos mistos. Presumivelmente, de um
que uma pessoa está quando, por exemplo, se lado, há ansiedades proposicionais (digamos),
lembra que ontem choveu; e b) A memória de como a ansiedade de Schiffer de que a passa-
acontecimentos, um estado em que uma pessoa deira não se desmorone subitamente; e, do
está quando, por exemplo, se lembra de ontem outro lado, há ansiedades não proposicionais,
estar a chover. como é talvez o caso da ansiedade súbita de
Uma pessoa pode estar no primeiro estado Schiffer por um gelado (ou então, mais plausi-
sem estar no segundo; e há animais que, apesar velmente, o caso de ansiedades sem quaisquer
de poderem presumivelmente estar no segundo objectos identificáveis). Do mesmo modo, ele
estado, não têm um repertório conceptual que há o «amor» proposicional ou o gostar que, um
lhes permita estar no primeiro. estado em que uma pessoa está quando, por
A segunda característica distintiva das ati- exemplo, gosta que Schiffer pinte às vezes os
tudes é a sua já aludida propriedade de ser lábios de púrpura; mas há também o género
invariavelmente possível atribuir-lhes conteú- mais vulgar de amor, o amor objectual ou o
dos proposicionais, itens aos quais a verdade e gostar de, um estado em que uma pessoa está
a falsidade são primariamente atribuíveis. A quando, por exemplo, simplesmente gosta de
minha crença de que Schiffer é boa, a dúvida Schiffer. O primeiro género de ansiedade ou de
do leitor de que Schiffer seja boa e o desejo da amor seria presumivelmente classificável como
mãe da Schiffer de que ela seja boa, são esta- uma atitude proposicional; o segundo não. Em
dos psicológicos diversos que ocorrem em cria- todo o caso, a aparente existência de experiên-
turas igualmente diversas, mas que têm em cias e sensações com um conteúdo proposicio-
comum um determinado conteúdo: a proposi- nal não milita contra o princípio de discrimina-
ção de que Schiffer é boa. E a propriedade que ção proposto: ter uma proposição como con-
cada um daqueles estados mentais tem de ter teúdo é apenas uma condição necessária para
essa proposição como conteúdo é uma proprie- um estado mental ser uma atitude proposicio-
dade essencial, ou constitutiva, do estado men- nal. E a aparente existência de atitudes com
tal em questão, no sentido em que ele deixaria alguns elementos fenomenológicos também
de ser o estado que é se não tivesse o conteúdo não milita contra o princípio de discriminação
que de facto tem. proposto: ter uma certa fenomenologia é ape-
Em contraste com isto, sensações e expe- nas uma condição necessária para um estado
riências não têm (muitas vezes) qualquer con- mental pertencer à classe das experiências.
teúdo proposicional. Considere-se o estado Algumas das considerações precedentes
mental em que estive quando, durante algum sugerem a seguinte metodologia mínima para a
tempo, senti uma dor lancinante no joelho individuação de atitudes proposicionais.
esquerdo ao descer umas escadas; não tem Podemos discriminar entre atitudes com base
qualquer sentido atribuir um conteúdo seman- nos seguintes dois parâmetros: A) Em termos
ticamente avaliável a um estado mental deste do conteúdo das atitudes; B) Em termos do
género. O que é maximamente relevante para modo psicológico das atitudes.
estados mentais desta classe, e praticamente O parâmetro A é aquele que está operativo
irrelevante para atitudes proposicionais, é antes quando, por exemplo, distinguimos entre os
a sua fenomenologia: a maneira como uma dor seguintes estados: a crença de Gere de que
é sentida, como é ter uma determinada sensa- Schiffer é boa, a crença de Schiffer de que
ção ou experiência. Com efeito, as experiências Campbell é boa e a crença de Campbell de que
e sensações parecem identificáveis, pelo menos Gere é bom (desta vez, JB não entra na histó-
parcialmente, com base em considerações rela- ria!); apesar destes estados pertencerem ao

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atitude proposicional

mesmo modo ou tipo psicológico — todos são samentos-espécime, os quais ocorrem em men-
crenças, são estados mentais distintos em vir- tes distintas e em ocasiões possivelmente dis-
tude de terem conteúdos distintos (e têm con- tintas. Tais acontecimentos-espécime são parti-
teúdos distintos em virtude de serem acerca de culares mentais, entidades irrepetíveis, par-
pessoas distintas: Schiffer, Campbell e Gere). cialmente individualizáveis pela identidade da
O princípio genérico utilizado é o seguinte: mente em que ocorrem e pelo intervalo de
uma condição necessária para a identidade de tempo durante o qual ocorrem. Ou seja, tais
atitudes é a identidade de conteúdo proposicio- acontecimentos-espécime são os valores da
nal. Por outro lado, o parâmetro B é aquele que variável livre x ao figurar em frases abertas
está operativo quando, por exemplo, distin- como «x é um pensamento de que Schiffer é
guimos entre os seguintes estados: a crença de boa». Por outro lado, pode também dizer-se
Gere de que Schiffer é boa, o desejo da mãe da que há aí um único tipo de estado ou aconteci-
Schiffer de que Schiffer seja boa e a dúvida de mento mental, apenas um pensamento-tipo, o
Campbell de que Schiffer seja boa; apesar des- pensamento de que Schiffer é boa, o qual é
tes estados terem o mesmo conteúdo — a pro- exemplificado por aqueles três pensamentos-
posição de que Schiffer é boa, são estados dife- espécime. Pensamentos-tipo são universais
rentes em virtude de estarem subsumidos por mentais, entidades repetíveis (no sentido de
modos psicológicos distintos (crença, desejo, exemplificáveis) e abstractas, que não têm
dúvida). O princípio genérico utilizado é o qualquer localização numa mente particular e
seguinte: uma condição necessária para a iden- qualquer duração no tempo. Em geral, tipos ou
tidade de atitudes é a identidade de modo psi- categorias mentais, tipos de acontecimentos ou
cológico. Uma questão interessante, e bastante de estados mentais, são simplesmente classes
debatida, consiste em determinar se os parâme- de particulares mentais, classes de aconteci-
tros mencionados, além de introduzirem condi- mentos-espécime ou estados-espécime (actuais
ções necessárias para a identidade de atitudes, e possíveis). Ou, se preferirmos, os tipos men-
introduzem também condições suficientes; ou tais são PROPRIEDADES, algo exemplificável por
seja, se a identidade de modo psicológico e a estados ou acontecimentos mentais específicos;
identidade de conteúdo, além de separadamen- ou seja, trata-se de propriedades como aquela
te necessárias, são também conjuntamente que é expressa ou referida por um predicado ou
suficientes para a identidade de atitudes. frase aberta como «x é um pensamento de que
A distinção TIPO/ESPÉCIME, notoriamente Schiffer é boa», designadamente a propriedade
aplicável ao caso de itens linguísticos como de ser um pensamento de que Schiffer é boa (e
palavras e frases, aplica-se igualmente a esta- esta propriedade é predicável de cada um dos
dos ou acontecimentos mentais em geral e a três estados-espécime mencionados). Em
atitudes proposicionais em particular. Ela dá segundo lugar, podemos ter tipos mentais mais
assim origem a uma distinção importante entre inclusivos do que aquele. Considere-se o pen-
universais mentais (estados-tipo ou aconteci- samento, que tenho numa certa ocasião, de que
mentos-tipo) e particulares mentais (estados- Schiffer é boa; e o pensamento, que tenho nou-
espécime ou acontecimentos-espécime). Eis tra ocasião, de que o prazo para entregar este
dois exemplos que ilustram a distinção. Em artigo já terminou; e ainda o pensamento, que
primeiro lugar, considere-se o pensamento, que tenho numa ocasião distinta, de que a conjectu-
tenho numa certa ocasião, de que Schiffer é ra de Goldbach é falsa. Há aqui três aconteci-
boa; e o pensamento, que Campbell tem numa mentos mentais particulares, três pensamentos-
certa ocasião, de que Schiffer é boa; e ainda o espécime (os valores da variável livre x numa
pensamento, que Gere tem numa certa ocasião, frase aberta como «x é um pensamento»), mas
de que Schiffer é boa. Há aqui três estados ou um único tipo de acontecimento mental, o tipo
acontecimentos mentais particulares, três pen- pensamento (a propriedade expressa ou referi-

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atitude proposicional

da por um predicado ou frase aberta como «x é exemplar é verdadeiro.)


um pensamento», a propriedade de ser um pen- Finalmente, há que referir uma última
samento). Estes tipos mentais são mais inclusi- característica importante das atitudes proposi-
vos do que os anteriores, no sentido em que a cionais (todavia, trata-se desta vez de uma
classe de particulares mentais que consiste em característica que partilham com as experiên-
todos aqueles, e só naqueles, pensamentos de cias e sensações). É a propriedade que cada
que Schiffer é boa está incluída na classe de uma das atitudes proposicionais tem de ter um
particulares mentais que consiste em, e apenas certo papel funcional, de estar associada a uma
em, pensamentos. (É agora claro que a discus- certa estrutura de causas e efeitos. O papel fun-
são anterior acerca do modo como atitudes cional de uma atitude é a rede característica de
devem ser individualizadas diz respeito a atitu- conexões causais em que ela entra, a maneira
des no sentido de atitudes-tipo; isto é, a ques- como ela interactua causalmente com dados
tão era a de determinar sob que condições é provenientes do meio ambiente, com outros
que duas atitudes-espécime devem ser agrupa- estados mentais, e com o comportamento. Con-
das sob o mesmo tipo ou categoria.) sidere-se, por exemplo, a crença que tenho de
A distinção entre tipos de estado mental e que daqui a pouco vai chover. Grosso modo, o
estados-espécime é notoriamente utilizada para papel funcional desta crença seria especificado
discriminar entre os dois géneros habituais de através da consideração de factos do seguinte
FISICALISMO (ou de materialismo) acerca do género: a) o facto de a crença ser habitualmente
PROBLEMA DA MENTE-CORPO: o fisicalismo causada por um certo tipo de input sensorial (por
tipo-tipo e o fisicalismo exemplar-exemplar. exemplo, a minha percepção visual de nuvens
Segundo a doutrina fisicalista tipo-tipo, cada cinzentas no céu); b) o facto de a crença ser
tipo de estado ou acontecimento mental (por habitualmente uma causa, bem como um efeito,
exemplo, o tipo DOR) é idêntico a um certo tipo de certos outros estados mentais (por exemplo,
de estado ou acontecimento físico no corpo ou um efeito da crença de que nuvens cinzentas no
no cérebro (por exemplo, o disparar de um céu prenunciam chuva); e c) o facto de a crença,
dado neurónio); se preferirmos, aquilo que é em interacção com outros estados mentais (em
identificado no fisicalismo tipo-tipo são PRO- particular, certos desejos), dar habitualmente
PRIEDADES: propriedades mentais, como a pro- origem a um certo comportamento: tomada em
priedade de ser uma dor, e propriedades físicas, conjunção com o desejo de não me molhar (e
como a propriedade de ser um disparar de um com outros estados mentais), ela pode-me levar
dado neurónio. Segundo a doutrina fisicalista a ir buscar um chapéu-de-chuva.
exemplar-exemplar, cada estado ou aconteci- Diversas posições teóricas são possíveis em
mento-espécime que ocorre na mente (por relação ao estatuto a desempenhar por tal noção
exemplo, uma determinada dor que sinto numa de papel funcional no âmbito de uma teoria das
certa altura) é idêntico a um certo estado ou atitudes e de outros estados mentais. Um ponto
acontecimento-espécime que ocorre no corpo de vista influente é o de que o papel funcional de
ou no cérebro (por exemplo, um determinado uma atitude determina inteiramente a identidade
disparar de um dado neurónio no meu cérebro da atitude: nada mais há a dizer acerca da atitude
naquela ocasião); se preferirmos, aquilo que é do que aquilo que se diz numa caracterização do
identificado no fisicalismo exemplar-exemplar seu papel funcional. Esta concepção, que recebe
são particulares: particulares mentais e particu- a designação de FUNCIONALISMO, está normal-
lares físicos. (Obviamente, a primeira doutrina mente associada a uma doutrina HOLISTA acerca
é mais forte do que a segunda: se propriedades da atribuição de estados mentais: só é possível
mentais são idênticas a propriedades físicas, classificar uma criatura como estando num cer-
então determinam uma e a mesma classe de to estado mental com base numa identificação
particulares, e assim o fisicalismo exemplar- de uma galáxia de outros estados mentais,

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atómica, frase

intenções de comportamento, etc. Noutro ponto atomismo lógico» foi a designação que Russell
de vista, mais fraco, a ideia é a de que os deu aos resultados da sua filosofia (em particu-
papéis funcionais servem apenas para determi- lar, nos domínios da filosofia da linguagem, da
nar a identidade dos tipos ou categorias men- filosofia do conhecimento e da ontologia)
tais; por exemplo, servem apenas para caracte- compreendidos entre os anos de 1905, data da
rizar a propriedade geral de ser uma crença, publicação de «On Denoting», e 1918, data da
aquilo que todas as crenças têm em comum. publicação de «The Philosophy of Logical
Em particular, nesse ponto de vista, os papéis Atomism». Assim, esta designação abrange um
funcionais das atitudes não são vistos como conjunto vasto de doutrinas e de teses que, no
determinando os conteúdos das atitudes. Ver entanto, se entrecruzam para constituir um cer-
também ESTADO MENTAL; PROPRIEDADE; TIPO/ to ponto de vista filosófico consistente. De
ESPÉCIME; FUNCIONALISMO; PROPOSIÇÃO; CON- entre estas doutrinas e teses, é importante a
TEÚDO; FISICALISMO. JB conexão entre a filosofia da linguagem e a filo-
sofia do conhecimento — conexão que caracte-
Dretske, F. 1993 Explaining Behaviour. Cambridge, riza, de resto, um dos pontos cruciais da filoso-
MA: MIT Press. fia do atomismo lógico de Russell.
Fodor, J. 1987. Psychosemantics. Cambridge, MA: À filosofia do atomismo lógico preside a
MIT Press. concepção segundo a qual é possível e desejá-
Harman, G. 1973. Thought. Princeton: Princeton vel fazer uma análise lógica da linguagem cor-
University Press. rente de tal forma que se determinem quais são
McGinn, C. 1982. The Character of Mind. Oxford: os «átomos» linguísticos, ou seja, aqueles ter-
Oxford University Press. mos que são simples e não analisáveis. Estes
termos correspondem a entidades, a «átomos»,
atómica, frase Ver FRASE ATÓMICA. igualmente simples, no mundo extralinguístico.
Esta análise é possível e desejável dado que a)
atomismo Ver HOLISMO. existe uma identidade estrutural entre a estrutu-
ra da nossa linguagem (quando completamente
atomismo lógico Este artigo tem um duplo analisada) e a estrutura da realidade extralin-
objectivo. Em primeiro lugar, caracterizar aqui- guística que supostamente representa (o que
lo que ficou conhecido por «filosofia do ato- explica a possibilidade da análise); e que b) a
mismo lógico» de Bertrand Russell, em segun- realização da paráfrase da linguagem corrente
do, mostrar como algumas das ideias cruciais numa linguagem logicamente perfeita (na qual
daquela filosofia inspiram a corrente da semân- consiste a análise) lança luz sobre a estrutura
tica contemporânea segundo a qual não é eli- real, escondida sob a estrutura aparente, da lin-
minável da linguagem a função semântica guagem corrente (o que explica a desejabilida-
puramente referencial. Esta ideia contraria a de da análise).
forma mais comum de interpretar a filosofia do Assim, Russell considera que a estrutura
atomismo lógico, segundo a qual se extraem da gramatical da linguagem que usamos todos os
filosofia de Russell argumentos que mostram dias não coincide normalmente com a sua
justamente o resultado inverso daquele que estrutura lógica e que, por isso, é necessário
queremos estabelecer, a saber, que é possível proceder-se à análise lógica da linguagem, a
eliminar a função referencial da linguagem. qual supostamente torna manifesta a verdadei-
Justificaremos depois como se torna aparente- ra, real e profunda estrutura da linguagem que
mente possível que a filosofia do atomismo usamos para falar acerca do mundo. A estrutura
lógico conduza à extracção de dois resultados gramatical de uma frase é, então, encarada
contraditórios. como enganadora, aparente e superficial, ao
Análise lógica da linguagem «Filosofia do contrário da sua estrutura lógica, que se encon-

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