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Direitos
Humanos das
Mulheres
LEILA PAIVA e
LANA RÉGIA SOUZA
Copyright © 2020 by Fundação Demócrito Rocha
Raymundo Netto
Gerente Editorial e de Projetos
Marisa Ferreira
Coordenadora de Cursos
Joel Bruno
Designer Instrucional
Leila Paiva
Coordenadora de Conteúdo
Raymundo Netto
Coordenador Editorial
Andrea Araujo
Editora de Design e Projeto Gráfico
Miqueias Mesquita
Designer
Daniela Nogueira
Revisora
Carlus Campos
Ilustrador
Luísa Duavy
Produtora
Fernando Diego
Analista de Marketing
O
tema da violência doméstica e Sabe-se pelos dados, sobretudo se
familiar não é novo. Para muitas avaliarmos os dados dos últimos quatro
mulheres no mundo, ficar em anos, que as mais atingidas por essa for-
casa significa um risco muito ma de violência são as mulheres. Ainda
maior do que estar nos espaços públicos. assim, é importante considerar que ho-
Esse espaço que, por vezes, é tratado como mens e minorias sexuais e de gênero tam-
sagrado ou necessariamente amoroso se bém podem ser alvo dessas agressões.
demonstra mais violento sobretudo para
mulheres e crianças. Todos os dias, milha-
res de mulheres são agredidas somente
porque são mulheres – essa é a crescente e
assustadora violência de gênero.
A Organização das Nações Unidas
(ONU) conceitua violência de gênero como
“qualquer tipo de agressão física, psi-
cológica, sexual ou simbólica contra
alguém em situação de vulnerabilidade
devido a sua identidade de gênero ou
orientação sexual”.
A
concepção de Direitos Humanos
adotada pela academia, no pla-
no internacional, não é unânime,
razão pela qual definimos estes
como uma sequência positivada de di-
reitos e liberdades básicas de todos os
seres humanos, englobando, sobretudo,
o direito à livre expressão de pensamento,
à igualdade perante a lei e o acesso a estes
direitos, que surgem como normativa inter-
nacional no período posterior às duas gran-
des guerras mundiais. Adota-se, portanto,
a concepção normatizada na Declaração
Universal dos Direitos Humanos (DUDH), de
1948, e ratificada na Declaração dos Direitos
Humanos de Viena (DDHV), de 1993.
A
Convenção sobre Eliminação de a Mulher, que ocorreu em 1994 em Belém,
Todas as Formas de Discrimina- Pará, que definiu o fenômeno como “uma
ção Contra as Mulheres (CEDAW, ofensa à dignidade humana e manifesta-
em língua inglesa, Convention on ção das relações de poder historicamen-
the Elimination of All Forms of Discrimina- te desiguais entre mulheres e homens”.
tion Against Women) foi promulgada em Para entender essa relação de poder his-
1979 pelas Nações Unidas; no Brasil, foi pro- tórica, mas não óbvia, é preciso avançar no
mulgada pelo Decreto nº 4.377, de 13 de se- conceito específico e trazer para o debate
tembro de 2002. Chamado de Convenção outros documentos que ajudam a entender
das Mulheres, é o primeiro tratado interna- a prática mundial da violência doméstica.
cional sobre Direitos Humanos de Mulheres No Brasil, temos dois grandes marcos
e define em seu artigo 1º: normativos. A Lei Maria da Penha e a Lei
Artigo 1º – Para os fins da presente Con- do Feminicídio, que serão detalhadas nos
venção, a expressão “discriminação contra módulos seguintes.
a mulher” significará toda a distinção, ex- Neste momento, é importante chamar
clusão ou restrição baseada no sexo e que atenção para as características desses dois
tenha por objeto ou resultado prejudicar marcos normativos nacionais. A Lei Maria
ou anular o reconhecimento, gozo ou exer-
cício pela mulher, independentemente de
da Penha, que completa 14 anos, foi de
seu estado civil, com base na igualdade do extrema relevância para demonstrar a exis-
homem e da mulher, dos direitos humanos tência desse tipo de delito no interior das
e liberdades fundamentais nos campos po- “famílias” brasileiras e tipifica como crime
lítico, econômico, social, cultural e civil ou da violência doméstica. No imaginário na-
em qualquer outro campo.
cional, reinava a ideia de que o lar guardava
Outro documento relevante para con- as relações sagradas e, por conseguinte, har-
ceituar a violência contra a mulher é a mônicas. Essa Lei prestou esse indispensável
Convenção Interamericana para Preve- serviço, descortinando a triste realidade dos
nir, Punir e Erradicar a Violência Contra altos índices de violência contra a mulher.
MOVIMENTOS
de reivindicações sobre as relações de
produção. É evidente que o papel e a força
SOCIAIS
da mulher nas relações de trabalho preci-
sam ser debatidos e questionados. O país
A
tem números preocupantes. Há carência de
pauta da igualdade de gênero tem grande luta por melhorias na participação
mexido com diversos setores dos da mulher no mercado de trabalho. Dados
movimentos sociais. Não por aca- do IBGE indicam, de forma geral e sem re-
so, a existência da pluralidade de cortes por níveis, que as trabalhadoras
pautas é nítida, mas as constantes transfor- brasileiras recebem, em média, 20,5%
mações também são bem claras. menos que os homens.
Em 2005, durante o 10º Encontro Femi- Todavia, há que se provocar nos
nista Latino-Americano e do Caribe, por movimentos sociais um debate sobre as
ocasião do debate sobre a inclusão ou não relações de poder que estão postas: poder
de transexuais em encontros feministas, político, religioso, intelectual e científico,
uma discussão importante revela a pre- econômico, questões estruturantes que
sença da pluralidade de realidades ao se abrangem a desigualdade de gênero in-
dialogar com o termo gênero. serida em um contexto global no qual se
Joan Scott afirma: “Gênero é um elemento encontram temas como cultura patriarcal,
constitutivo das relações sociais baseado racismo, meio ambiente, qualidade de vida,
nas diferenças percebidas entre os sexos... desigualdade econômica e outros proble-
o gênero é uma forma primária de dar mas sociais evidenciados.
significado às relações de poder”. (1995, p.86). É preciso trazer ainda para o debate do
Se durante o debate sobre a transe- enfrentamento da violência os temas do
xualidade surgiu uma nova questão para
compor a discussão sobre gênero e feminis-
fortalecimento da condição de mulher. A
questão da representatividade feminina, o FICA A DIA
mo, também reacendem questões antigas direito à participação, à livre manifestação
VIOLÊNCIA CONTRA
como: quais as articulações possíveis com e expressão e à inspiração por parte de
A MULHER? DENUNCIE!
o debate do feminismo? Que outros movi- outras mulheres nos mais diversos modelos
mentos se articulam com o tema? femininos postos na sociedade. Para ligar gratuitamente (chamada a
Se os movimentos sociais forem entendi- O processo de empoderamento das cobrar de telefone fixo) da Suíça para
dos como grupos aliados em torno de uma classes desfavorecidas também precisa a Central de Atendimento à Mulher
causa social, de uma luta política, esse leque compor o debate. De fato, a violência domés- no Brasil: ligue 0800.555.251, tecle 1
pode ser ampliado. Se o tema for agregado tica tem reflexos na vida das mulheres de di- para português, novamente 1 (opção
à garantia dos direitos humanos, é possível ferentes formas. Falar em enfrentamento da Brasil Direto/chamada a cobrar) e
se aliar aos diversos feminismos que têm violência pressupõe garantir a vida, garan- digite 61-3799-0180.
surgido, como o feminismo indígena, entre tir o domínio sobre a sua própria vida e o Para ligar para o plantão do
outros, e provocar mudanças sociais. Essa direito de tomar decisões sobre o que lhe Consulado (somente denúncia de
ampliação parece urgente para dar conta da diz respeito. Esse é o empoderamento al- violência contra a mulher ou outro
diversidade de desafios presentes. mejado por diferentes mulheres no mundo. tipo de emergência): 079-830-3556
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Nações Unidas para o Desenvolvimento
(PNUD) e pela ONU Mulheres sobre direitos
políticos das mulheres, o Brasil ocupa o
9º lugar entre 11 países da América La-
tina em participação política. O estudo
mostrou ainda que no Brasil é relevante a
“condição precária da participação política
formal das mulheres. Nas demais dimen-
sões, houve avanços, mas é na política que
D
direção à paridade de gênero e, para isso,
iante da necessidade de amplia- é fundamental que ocorram mudanças ins-
ção do fenômeno da violência titucionais, sejam estabelecidos compro-
doméstica contra mulheres para missos sólidos e atuação coordenada entre
o início de sua superação, pode- distintas entidades”.
-se dizer que o que se busca, para além de O que não podemos esquecer é que,
cessar a violência, é permitir que mulheres quando se fala em representatividade fe-
possam criar uma ambiência em que coleti- minina e empoderamento de meninas e
vamente possam agir de forma a não serem mulheres, estamos falando da constru-
inferiorizadas pelo seu gênero e possam ção de uma sociedade mais livre e de-
participar ativamente dos debates sociais, mocrática, de um país com mais justiça
influenciando no modo de vida social. social em que modelos femininos pos-
De acordo com Andrea Cornwall, “o ver- sam ser símbolos de inspiração para
dadeiro empoderamento deve ser visto meninas e mulheres de outros mode-
como uma estratégia feminista que promova los de masculinidade e de compromis-
mudanças nas relações de poder estruturais sos éticos com o fim da impunidade no
que produzem desigualdade e opressão”. tema da violência de gênero.
A ampliação da representatividade so- O período de pandemia tem demonstra-
cial da mulher na política, por exemplo, é do que o tema é global e precisa de políticas
essencial para que sejam pontuadas ques- internacionais, reconhecendo as diferenças
tões referentes à luta histórica das mulheres locais. Criar maneiras seguras para que as
por igualdade e reconhecimento. mulheres possam pedir ajuda, denunciar
No Brasil, ainda estamos longe de ga- e depois serem colocadas a salvo de seu
rantir essa ambiência – talvez isso responda agressor precisam compor as pautas de for-
aos números desafiadores da violência de mulação de políticas públicas.
ILUSTRADOR
CARLUS CAMPOS
Artista gráfico, pintor e gravador, começou
a carreira em 1987 como ilustrador no jornal
O POVO. Na construção do seu trabalho, aborda
várias técnicas como: xilogravura, pintura,
infogravura, aquarelas e desenho. Ilustrou
revistas nacionais importantes como a Caros
Amigos e a Bravo. Dentro da produção gráfica
ganhou prêmios em salões de Recife, São Paulo,
Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul.