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Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro


Quarta Câmara Cível

Apelação Cível nº 0019177-02.2015.8.19.0007

Apelante 1: APRIL BRASIL TURISMO VIAGENS E ASSISTÊNCIA INTERNACIONAL


S/A E QBE BRASIL SEGUROS

Apelante 2: ALESSANDRA GUIZALBERTH BARBOSA (ADESIVA)


Apelados: OS MESMOS
Origem: JUÍZO DA 1ª VARA CÍVEL DA COMARCA DE BARRA MANSA
Relatora: Desembargadora MARIA HELENA PINTO MACHADO

APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO DO CONSUMIDOR.


RELAÇÃO DE CONSUMO. RESPONSABILIDADE
OBJETIVA. SEGURO VIAGEM. AUTORA QUE
NECESSITOU DOS SERVIÇOS DA RÉ.
INTERNAÇÃO EM CARÁTER
EMERGENCIALMENTE EM HOSPITAL NOS EUA.
NEGATIVA DA SEGURADORA RÉ DO
PAGAMENTO DAS DESPESAS MÉDICAS O QUE
ORIGINOU DIVERSAS COBRANÇA EM NOME DA
AUTORA. FALHA NA PRESTAÇÃO DOS
SERVIÇOS CONFIGURADA. DANOS MORAIS.
OCORRÊNCIA. VERBA INDENIZATÓRIA
MAJORADA DIANTE DAS CIRCUNSTÂNCIAS DO
CASO CONCRETO.
- Cuida-se de ação de indenização por danos
morais e materiais, alegando a autora que
contratou seguro viagem com as rés e que, após
ter sido internada em caráter emergencial em
hospital nos EUA, o que gerou diversas
despesas médicas e hospitalares, teve o
pagamento negado pela seguradora, originando
diversas cobranças em seu nome.
- Sentença de extinção em relação às 1ª, 4º, 5º e
6º rés e de procedência parcial quanto à 2º e 3ª
rés, para condená-las ao pagamento das
despesas médicas junto ao hospital onde a
autora permaneceu internada, mais indenização
por danos morais, no importe de R$8.000,00 (oito
mil reais). Insurgência das partes.
- Evidente relação de consumo, enquadrando-se
a autora no conceito de consumidor descrito no
artigo 2º do Código de Proteção e Defesa do
Consumidor e a ré no de fornecedora, nos
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MARIA HELENA PINTO MACHADO:16591 Assinado em 31/10/2019 11:34:04


Local: GAB. DES(A). MARIA HELENA PINTO MACHADO
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termos do artigo 3º do mesmo diploma legal.


- Da leitura do artigo 14 do CDC, verifica-se que a
responsabilidade do fornecedor de serviços é
objetiva e somente não responderá pela
reparação dos danos causados ao consumidor
se provar que, tendo prestado o serviço, o
defeito inexiste ou o fato é exclusivo do
consumidor ou de terceiro.
- Ausência de prova no sentido de que a autora,
residente nos EUA, não possa arcar com o
pagamento das custas processuais. Elementos
contidos nos autos que indicam padrão de vida
razoável, não se enquadrando a autora no
conceito de hipossuficiente. Impugnação à
gratuidade acolhida. Manutenção.
- Restou evidenciado pelo conjunto dos autos
que a autora necessitou de internação
emergencial para tratamento, bem como a
negativa da seguradora em efetuar o pagamento
das despesas hospitalares, alegando esta,
apenas, que a enfermidade da autora não estava
coberta pela apólice, ante a sua pré-existência,
razão pela qual seria justa sua recursa.
- Não prospera a alegação de preexistência da
enfermidade da autora uma vez que inexiste nos
autos qualquer exame prévio à contratação ou
comprovação da tese de defesa. Súmula 609 do
STJ.
- Outrossim, consta expressamente na apólice,
ao tratar da cobertura de despesas médicas e
hospitalares, as rés se comprometem,
expressamente, a cobrir "crises de enfermidade
crônica e preexistente que ocorrerem durante o
período de viagem, limitado ao capital segurado,
exceto a continuidade e o controle de
tratamentos anterior, check-up e extensão de
receitas”.
- Prova clara no sentido de que se tratou de crise
médica imprevista, o que ensejou sua internação
de emergência.
- Falha na prestação dos serviços. Dano moral in
re ipsa.
- Contratação de seguro viagem que tem por
finalidade tranquilizar o segurado em situações
de risco à sua vida, saúde e patrimônio. Autora
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que, ao ter negada a cobertura de pagamento de


despesas médicas em valores altíssimos, sofreu
abalo e angustias no período de convalescência.
- Abalo da reputação da autora no País onde
reside, diante das diversas cobranças dos
valores devidos ao hospital que lhe foram
enviadas.
- Indenização fixada na sentença que merece ser
majorada, diante da situação narrada nos autos.
- Em obediência aos princípios da razoabilidade
e proporcionalidade, entendo que o valor de
R$15.000,00 (quinze mil reais), se mostra mais
adequado e de acordo com as circunstâncias do
caso em concreto.
DESPROVIMENTO DO RECURSO DAS RÉS.
APELAÇÃO ADESIVA PROVIDA PARA MAJORAR
A VERBA INDENIZATÓRIA.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos da Apelação Cível nº


0019177-02.2015.8.19.0007, onde são Apelantes APRIL BRASIL TURISMO
VIAGENS E ASSISTÊNCIA INTERNACIONAL S/A, QBE BRASIL SEGUROS
S/A e ALESSANDRA GUIZALBERTH BARBOSA e Apelados OS MESMOS,

ACORDAM os Desembargadores que compõem a Quarta Câmara


Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, por unanimidade de
votos, em conhecer dos recursos para negar provimento ao primeiro (rés)
e prover o da autora, nos termos do voto da Relator, adiante transcrito.

RELATÓRIO

Trata-se de ação de indenização por danos materiais e morais


ajuizada por ALESSANDRA GUIZALBERTH BARBOSA em face de
CLICKTRIP AGÊNCIA DE VIAGENS E TURISMO LTDA, CORIS BRASIL S/A
TURISMO VIAGENS E ASSISTÊNCIA INTERNACIONAL, QBE SEGUROS
BRASIL S/A, HIGHT LIGHT VIAGENS E TURSIMO LTDA, NASCIMENTO
TURSIMO LTDA e ALINE BANEDO, narrando a autora que adquiriu um pacote
de viagem para Fort Myers, no oeste da Flórida, com seguro viagem da 4ª e 5ª
rés.
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Aduz que, em setembro de 2014, após sentir fortes dores


abdominais, buscou atendimento médico, que fora regularmente coberto pela
seguradora.

Sustenta que, novamente acometida de dores, em 13/11/14, a


autora foi submetida a intervenção cirúrgica, a qual foi objeto de negativa de
cobertura por se tratar de doença preexistente, segundo alegação da
seguradora, tendo a autora sido cobrada, insistentemente, no importe de
US$29.297,18, referentes as despesas médicas, o que gerou o deslocamento
de sua mãe até a Flórida, tendo realizado gastos com passagens e aluguel de
veículo um total de R$2994,28.

Requer o pagamento de U$29.297,81, a ser convertido para moeda


nacional, referente ao valor da cirurgia, além do reembolso de R$2994,28
referente à passagem e aluguel de veículo pela mãe da autora.

Pugna, ainda, pela condenação das rés ao pagamento de


indenização por morais a serem arbitrados pelo Julgador.

Decisão deferindo a gratuidade de justiça, no indexador 242.

Contestação da ré Coris Brasil S/A, cuja denominação correta é April


Brasil Turismo Viagens e Assistência Internacional S/A, arguindo preliminar de
falta de interesse processual, ressaltando que é fornecedora de serviços de
assistência de viagens, sendo representante comercia da terceira ré (QBE),
sendo essa a responsável pelo contrato celebrado, eis que esse não se
confunde com o serviço de assistência em viagens, exclusiva atividade da
Empresa Ré April.

No mérito, narra, em apertada síntese, que foi prestada, em todo


momento, assistência à autora, certo que a partir do momento que deixou de
assisti-la foi porque sua enfermidade estava excluída do contrato de seguro.

Sustenta a ré que jamais descumpriu suas obrigações, apenas


seguindo as condições do contrato aderido pela autora, ressaltando que não se
aplica, no caso em concreto, o CDC nem a inversão do ônus da prova.

Por fim, diz que não restou configurado dano moral, pugnando pela
improcedência do pedido (index 258).

Contestação da ré High Light Viagens e Turismo, arguindo preliminar


de ilegitimidade passiva, posto que a culpa exclusiva pelos eventos narrados
na petição inicial deve ser imputada à 2ª e 6ª rés.

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Sustenta que inexiste nexo de causalidade, o que afasta o dano


moral, acrescentando que os documentos acostados à inicial em língua
estrangeira devem ser, obrigatoriamente, traduzidos para o idioma nacional
(index 380).

Defesa da ré Clicktrip Agência de Viagens e Turismo Ltda, arguindo


preliminar de ilegitimidade passiva e, no mérito, sustentando ausência do nexo
de causalidade, posto que ocorreu culpa exclusiva da vítima e de terceiro.

Refuta as indenizações pretendidas e pugna pela improcedência do


pedido (index 410).

Contestação da ré Nascimento Turismo Ltda, impugnando,


preliminarmente, a gratuidade de justiça concedida à autora e arguindo sua
ilegitimidade passiva ad causam.

No mérito, sustenta que inexiste solidariedade entre as agências de


viagens pelos vícios decorrentes dos serviços prestados por terceiros, quais
seja, as seguradoras rés.

Diz que inexiste obrigação de indenizar, ante a inexistência de


qualquer falha na prestação de seus serviços, pugnando pela improcedência
do pedido.

Réplica, às fls. 446/454 (index 466).

Contestação da ré Aline Canedo Souza, suscitando preliminar de


ilegitimidade passiva, requerendo seja reconhecida, a incompetência relativa
do juízo da Comarca de Barra Mansa, para processamento e julgamento do
feito.

Ainda em preliminar, impugna a gratuidade concedida à autora,


argumentando que a mesma não comprovou sua hipossuficiência.

No mérito, a ré sustenta que a doença da autora era pré-existente,


razão pela qual não se encontrava coberta pelo seguro viagem, ressaltando
que, no caso em concreto, não se aplica a regra da inversão do ônus da prova.

Diz, por fim, que inexiste qualquer comprovação que a ré tenha


praticado atos que pudesse causar dano moral à autora, pugnando pela
improcedência do pedido (index 481).

Réplica, às fls. 510/519 (index 534).

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Manifestação das partes, em provas, nos indexadores 558, 560 e


562, quedando-se inertes às demais rés.

Sentença prolatada às fls. 538/540 (index 565), cujo dispositivo


abaixo transcrevo:

“(...)
Acolho a impugnação à gratuidade de justiça oposto pela
8ª ré. Com efeito, a histórica narrada na inicial e
reafirmada na réplica à contestação da 8 8 ré
demonstram que o núcleo familiar da autora possui
condições financeiras suficiente para que a mesma se dê
ao luxo de não exercer qualquer atividade laborativa
mesmo morando nos Estados Unidos, vindo a celebrar
cerimônia de casamento naquela localidade, com a
presença da família da noiva (aparentemente o pai da
mesma foi o próprio celebrante). Inclusive, a autora
reconhece que comprou imóvel naquele país, onde
aparentemente firmou domicílio. Adite-se que não indicou
a renda familiar atual, nem comprovou com o empréstimo
do aludido imóvel. Assim, entendo que os elementos
contidos nos autos indicam padrão de vida razoável e
Inexistência atual de hipossuficiência econômica que
justifique a manutenção da JG deferida. Assim, indefiro o
benefício da parte autora relativamente aos atos
processuais futuros e eventuais ónus sucumbenciais.
(...)
Ante todo o exposto, extingo o feito sem resolução de
mérito com relação às rés CLICKTRIP, HIGH LIGHT,
NASCIMENTO TURISMO e ALINE CANEDO, considerando
sua ilegitimidade passiva ad causam, condenando a autora
ao pagamento de honorários em favor de seus patronos
no valor de R$ 954,00 para cada parte.
No mais, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE O PEDIDO
condenando as rés APRIL BRASIL TURISMO VIAGENS E
ASSISTÊNCIA INTERNACIONAL S/A e QBE SEGUROS BRASIL
S/A, solidariamente, a realizar o pagamento das despesas
da autora junto ao Lee Memorial Health System
decorrentes do atendimento prestado durante sua
internação no período de 13/11/2014 a 15/11/2014,
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inclusive consulta médica, intervenção cirúrgica,


internação, medicamentos e demais encargos que venham
a ser cobrados pelo aludido hospital, demonstrando nos
autos a quitação de tal débito, no prazo de 15 dias a
contar do trânsito em julgado; bem como, a pagar
reparação por danos morais arbitrada em R$ 8.000,00 a
ser devidamente atualizada a partir desta data e acrescida
de juros de mora de 1% a.m. desde a citação.
Condeno as rés April e OBE ao pagamento de custas e
honorários de sucumbência em favor da autora arbitrados
em 10% sobre o valor dado à causa.
Certificado o trânsito em julgado, nada sendo requerido
em 8 meses, dê-se baixa e arquivem-se. Noticiado o
pagamento espontâneo da condenação, expeça- mandado
de pagamento
em favor do credor e/ou seu patrono, intimando-o para
dizer se outorga q tação no prazo de 5 dias, valendo seu
silêncio como anuência. Nada mais havendo, dê-se baixa e
arquivem-se.
PRI.”

Diante dos embargos de declaração ofertados pela ré QBE (index


575), a r. sentença restou integrada pela decisão do indexador 580, nos
seguintes termos:

“(...) Acolho os embargos de declaração de fls. 548/549, a


fim de sanar a omissão no dispositivo da sentença de fls.
538/540, para que conste: "No mais, JULGO
PARCIALMENTE PROCEDENTE O PEDIDO condenando as
rés APRIL BRASIL TURISMO VIAGENS E ASSISTÊNCIA
INTERNACIONAL S/A e QBE SEGUROS BRASIL S/A,
solidariamente, a realizar o pagamento das despesas da
autora junto ao Lee Memorial Health System decorrentes
do atendimento prestado durante sua Internação no
período de 13/11/2014 a 15/11/2014, inclusive consulta
médica, intervenção cirúrgica, Internação, medicamentos
e demais encargos que venham a ser cobrados pelo
aludido hospital, considerando como limite de indenização
o valor da franquia atualizado na data do pagamento,

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devendo demonstrar nos autos a quitação de tal débito,


no prazo de 15 dias a contar do trânsito em julgado; bem
como, a pagar reparação por danos morais arbitrada em
R$ 8.000,00 a ser devidamente atualizada a partir desta
data e acrescida de Juros de mora de 1¢ a. m. desde a
citação.
No mais a sentença alvejada deve permanecer tal como foi
lançada.”

Inconformadas, apelam as 2ª e 3º rés, insistindo que na doença pré-


existente da autora, ressaltando que é da essência do contrato de seguro a
possibilidade de limitação, pela operadora, dos riscos cobertos pelo contrato,
que, diga-se logo, nada representa de abusivo ou exageradamente vantajoso
para a demandada.

Sustenta que o contrato de seguro, portanto, não admite


interpretação extensiva, certo que a apólice, licitamente, limita os riscos
cobertos e a seguradora não pode responder por outros, sob pena de acabar
comprometendo o mutualismo, no qual se baseia toda operação de seguros.

Diz que a demonstração de ausência de um dos requisitos


essenciais faz com que o pedido de indenização pelos supostos danos morais
sofridos pela apelada perca por completo o seu cabimento, pugnando pela
reforma da sentença (index 582),

Contrarrazões, às fls. 572/576 (index 604).

Apelação adesiva, às fls. 578/584, refutando, preliminarmente, a


cassação do benefício da gratuidade de justiça anteriormente deferida.

No mérito, pugna pela majoração do dano moral (index 610).

Contrarrazões, nos indexadores 620 e 625.

Este é o relatório.

VOTO

Os recursos devem ser conhecidos diante da presença de seus


requisitos intrínsecos e extrínsecos.

A r. sentença merece retoque, como veremos.


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Inicialmente, não há de ser ressaltado que, apesar de estarem os


documentos que instruem a inicial redigidos em língua estrangeira, não se
contesta a sua validade, bem como seria possível observar que se trata de
documento expedido por ente médico com valores apontados e data
correspondente.

Assim, não se afigura razoável negar-lhe eficácia de prova tão-


somente pelo fato de ter sido o mesmo juntado aos autos sem se fazer
acompanhar de tradução juramentada, máxime quando não resulte referida
falta em prejuízo para quaisquer das partes, bem como para a escorreita
instrução do feito.

Para além disto, as rés não negam o fato de que autora foi
submetida a colecistectomia (cirurgia para remoção de vesícula) em hospital
nos EUA. Portanto, além de restar incontroverso este tópico, também se
encontra devidamente comprovado nos documentos do indexador 30.

A respeito, anote-se o seguinte julgado neste sentido:

AgInt no REsp 1328809/DF, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA,


PRIMEIRA TURMA, julgado em 25/04/2017, DJe
05/05/2017
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. REVALIDAÇÃO DE
DIPLOMA ESTRANGEIRO. DOCUMENTO REDIGIDO EM
LÍNGUA ESTRANGEIRA DESACOMPANHADO DA
RESPECTIVA TRADUÇÃO JURAMENTADA. ÓRGÃO
JULGADOR QUE NÃO VÊ OBSTÁCULO PARA A SUA
COMPREENSÃO. VALIDADE NÃO CONTESTADA PELA PARTE
ADVERSA. DOCUMENTO COM EFICÁCIA DE PROVA.
APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO PAS DE NULITTÉ SANS GRIEF. 1.
De acordo com julgado desta Corte, "Em se tratando de
documento redigido em língua estrangeira, cuja validade
não se contesta e cuja tradução não é indispensável para a
sua compreensão, não é razoável negar-lhe eficácia de
prova. O art. 157 do CPC, como toda regra instrumental,
deve ser interpretado sistematicamente, levando em
consideração, inclusive, os princípios que regem as
nulidades, nomeadamente o de que nenhum ato será
declarado nulo, se da nulidade não resultar prejuízo para
acusação ou para a defesa (pas de nulitté sans grief). Não

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havendo prejuízo, não se pode dizer que a falta de


tradução, no caso, tenha importado violação ao art. 157
do CPC" (REsp 616.103/SC, Rel. Ministro Teori Albino
Zavascki, Primeira Turma, DJ 27/09/2004, p. 255). 2.
Agravo interno a que se nega provimento.

Outrossim, inexiste prova nos autos de que a autora faça jus ao


benefício da gratuidade de justiça. De acordo com a narrativa dos autos,
verifica-se que a autora fixou residência nos Estados Unidos da América, vindo
a celebrar cerimônia de casamento naquela localidade, tendo inclusive
reconhecido que adquiriu imóvel em tal País (fls. 514, index 534).

Importante ressaltar que a autora não apontou sua renda familiar


atual, nem comprovou com o empréstimo para aquisição do imóvel referido,
indicando os elementos contidos nos autos padrão de vida razoável, o que
afasta a hipossuficiência econômica.

Assim, mantém-se a cassação de gratuidade de justiça deferida à


autora.

Suplantadas tais preliminares, passa-se ao exame do mérito.

Com efeito, verifica-se que a relação jurídica entre as partes é de


consumo, ex vi dos artigos 2º e 3º, da Lei 8.078/90, daí que a empresa/apelada
responde objetivamente e a ela cabia, por força do disposto no art. 14 § 3º, do
mesmo diploma legal, o ônus de demonstrar alguma causa excludente de sua
responsabilidade, provando que não houve qualquer falha na prestação do
serviço, ou seja, que deu a assistência devida à família enquanto retida no
Aeroporto Internacional Tom Jobim, isto que não fez.

Aplica-se à hipótese a teoria do risco do empreendimento, que só


deve ser afastada se comprovado que o defeito inexiste ou que decorreu de
fato exclusivo da vítima ou de terceiro (art. 14, § 3º, do CDC). Nesse aspecto,
ressalte-se que o fato de o fato de terceiro só rompe o nexo causal se o fortuito
for externo, isto é, não decorrer de atividade normalmente desenvolvida pelo
fornecedor.

Alegam as primeiras apelantes que a recusa do pagamento das


despesas hospitalares se deu diante da doença pré-existente da autora, o que
não restou comprovado nos autos, ressaltando que não forma realizados
exames para avaliar os riscos das coberturas e a existência, ou não de doença
pré-existente.

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Outrossim, embora seja de conhecimento que a formações de


pedras na vesícula se dê de forma gradual, sendo crível que a autora já
possuísse tal quadro de saúde antes de partir em viagem, é certo que a
necessidade da cirurgia se tomou emergencial mais de seis meses após o
início da viagem e do primeiro contrato celebrado entre as partes, o que
demonstra a boa-fé por parte da autora.

Impende acrescentar que ao tratar dos riscos cobertos para a


cobertura de despesas médicas e hospitalares as rés expressamente se
comprometem a cobrir "crises de enfermidade crônica e preexistente que
ocorrerem durante o período de viagem, limitado ao capital segurado, exceto a
continuidade e o controle de tratamentos anteriores, check-up e extensão de
receitas” (item 2.1.1, fls. 289, index 287).

Portanto, analisando as provas acostadas aos autos, em especial


os prontuários apresentados pela autora, verifica-se que se tratou de crise
imprevista o que ensejou sua internação em caráter emergencial para a
retirada da vesícula.

Assim, resta configurada a responsabilidade das primeiras


apelantes ao pagamento das despesas médicos hospitalares cobradas pelo
Lee Memorial Health System, no importe de U$29.297,81, referentes ao valor
da cirurgia que necessitou a autora, devendo ser acrescentado que o referido
débito já foi quitado como informa a autora e comprovado no indexador 598.

No que tange aos danos morais, a autora narra ter experimentado


diversos transtornos em razão das cobranças efetivadas pelo hospital,
acrescentando que a contratação do seguro foi para lhe tranquilizar durante
sua estadia nos Estados Unidos, o que não ocorreu no caso em concreto.

Extrai-se que a negativa de cobertura contratual não só provocou


transtornos no período de convalescência da autora, como abalou sua boa
reputação no país onde estava residindo, diante de insistentes cobranças de
valores muito altos por parte do hospital.

Assim posta a questão, restou incontroverso que as empresas rés


não agiram de forma correta e adequada, acarretando à autora sérios
transtornos que não podem ser considerados como mero aborrecimento, haja
vista que, conquanto tivessem sido regularmente adquirido o seguro viagem, foi
surpreendida com a negativa da seguradora e má prestação do serviço, isto
que configurou o dano moral.

Passa-se agora ao exame da verba fixado pelo Juízo a quo a título


de indenização por danos morais.

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No que concerne ao quantum indenizatório, deve o magistrado estar


atento aos critérios indicados pela doutrina e jurisprudência e observar os
princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, não se afastando, ainda, do
caráter punitivo-pedagógico da condenação, em consonância com o postulado
da vedação ao enriquecimento sem causa, de modo que a sua fixação sirva de
desestímulo à conduta lesiva, mas, ao mesmo tempo, não gere o
enriquecimento sem causa do consumidor.

Outrossim, o juiz, ao arbitrar o dano moral, deve pautar-se pela


reprovabilidade da conduta ilícita, pela duração e intensidade do sofrimento da
vítima e, igualmente, pela capacidade econômica do responsável pela conduta
lesiva e pelas condições pessoais do ofendido, em respeito ao artigo 5º, V, da
CRFB/88.

No caso em comento, entendo mais justo seja fixada a indenização


em R$15.000,00 (quinze mil reais), tendo por norte os princípios da
proporcionalidade e da razoabilidade, além de sopesar a capacidade
econômica das partes, a natureza e a extensão da lesão sofrida, sem violar o
princípio da vedação ao enriquecimento sem causa.

Vale consignar que os consectários legais foram bem analisados


pelo nobre e culto sentenciante e aplicados na decisão de mérito vergastada,
razão pela qual é mantida, na sua integralidade.

Por conta de tais fundamentos, voto no sentido de NEGAR


PROVIMENTO AO RECURSO DAS PRIMEIRAS APELANTES E PROVER A
APELAÇÃO ADESIVA DA AUTORA PARA MAJORAR A VERBA
INDENIZATÓRIA PARA R$15.000,00 (QUINZE MIL REAIS), na forma acima
explicitada.

Rio de Janeiro, 30 de outubro de 2019.

Desembargadora MARIA HELENA PINTO MACHADO


Relatora

____________________________________________________________________________
Secretaria da Quarta Câmara Cível
Rua Dom Manuel, 37, Sala 511 – Lâmina III
Centro – Rio de Janeiro/RJ – CEP 20010-090
3 - Tel.: + 55 21 3133-6294 – E-mail: 04cciv@tjrj.jus.br – PROT. 553

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