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Deu no 'New York Times'; e daí?

O furo que derrubou o governador local Eliot Spitzer, enrolado com uma
rede de prostituição para endinheirados, renovou as evidências de que, a
despeito de vexames recentes, o diário americano "The New York Times"
mantém o vigor. Talvez seja a melhor fonte jornalística para se informar
sobre os EUA, é dos melhores jornais do mundo.

Essa condição, contudo, não faz dele um papai-sabe-tudo sobre o Brasil.


Muito pelo contrário, o "NYT" acumula enganos ao se arriscar a falar do
Cristo Redentor com a mesma desenvoltura com que aborda a Estátua da
Liberdade.

Entre os micos célebres, está a cascata de 2004 sobre a dita preocupação


nacional com hábitos etílicos do presidente da República -o que não
justifica o despropósito de Lula de querer expulsar o repórter.

No ano seguinte, o "Times" divulgou uma epidemia de obesidade. Na


primeira página, estampou uma Garota de Ipanema com curvas
renascentistas. Só que ela não era brasileira, mas tcheca.

O mesmo correspondente assinou reportagem que a Folha traduziu, "Índios


da Amazônia recorrem contra a venda de seu DNA". No essencial, a notícia
havia sido publicada uma década antes. Não foram cumpridos
procedimentos como checar todas as informações e ouvir o "outro lado".

Não passa muito tempo sem que a Folha e parcela do jornalismo pátrio
editem textos encorpados para alardear o que o "Times" e outras
publicações estrangeiras pontificam acerca do Brasil.

O historiador britânico Kenneth Maxwell escreveu dias atrás: "Uma das


coisas mais estranhas sobre o jornalismo brasileiro é o fato de que continue
a conferir credibilidade àquilo que os jornais dos Estados Unidos,
especialmente o "New York Times", têm a dizer sobre o país".

O colunista da Folha contou um fiasco do "NYT": do Reino Unido, o jornal


narrou a campanha contra a caça à raposa. A correspondente não flagrou
nenhum caçador ou sabujo, o cão que persegue e mata as raposas. Na
mesma cidade, Maxwell viu quase 300 sabujos "inquietos" reunidos.
A jornalista apurou mal. Maxwell comentou, sobre os moradores: "Não
estou certo de que saibam e muito menos se importem com o que seja o
"New York Times". Uma boa lição para os brasileiros".

O jornal contou com grandes correspondentes aqui, como Tad Szulc e Alan
Riding. Antes de nós, reconheceu importância em Chico Mendes.

Mas tratar com reverência cada citação ao país é sinal de submissão


cultural e jornalística. Sugere provincianismo. Às vezes, o complexo de
inferioridade impede que se note, por trás da grife do "Times", reportagens
tecnicamente malfeitas sobre o Brasil.

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